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Editora Chefe

Patrícia Gonçalves de Freitas


Editor
Roger Goulart Mello
Diagramação
2023 by Editora e-Publicar Lidiane Bilchez Jordão
Copyright © Editora e-Publicar Dandara Goulart Mello
Copyright do Texto © 2023 Os autores Patrícia Gonçalves de Freitas
Copyright da Edição © 2023 Editora e-Publicar Roger Goulart Mello
Direitos para esta edição cedidos à Editora Projeto gráfico e edição de arte
e-Publicar pelos autores Patrícia Gonçalves de Freitas

Revisão
Os Autores

Open access publication by Editora e-Publicar

PSICOLOGIA E CULTURA: ABORDAGENS, REFLEXÕES E IMPLICAÇÕES DA


PSICOLOGIA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA, VOLUME 1.
Todo o conteúdo dos capítulos desta obra, dados, informações e correções são de
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Conselho Editorial

Adilson Tadeu Basquerote Silva – Universidade Federal de Santa Catarina


Alessandra Dale Giacomin Terra – Universidade Federal Fluminense
Andréa Cristina Marques de Araújo – Universidade Fernando Pessoa
Andrelize Schabo Ferreira de Assis – Universidade Federal de Rondônia
Bianca Gabriely Ferreira Silva – Universidade Federal de Pernambuco
Cristiana Barcelos da Silva – Universidade do Estado de Minas Gerais
Cristiane Elisa Ribas Batista – Universidade Federal de Santa Catarina
Daniel Ordane da Costa Vale – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Danyelle Andrade Mota – Universidade Tiradentes
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Deivid Alex dos Santos - Universidade Estadual de Londrina
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Edilene Dias Santos - Universidade Federal de Campina Grande
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Janeiro
Ernane Rosa Martins - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás
Ezequiel Martins Ferreira – Universidade Federal de Goiás
Fábio Pereira Cerdera – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Francisco Oricelio da Silva Brindeiro – Universidade Estadual do Ceará
Glaucio Martins da Silva Bandeira – Universidade Federal Fluminense
Helio Fernando Lobo Nogueira da Gama - Universidade Estadual De Santa Cruz
Inaldo Kley do Nascimento Moraes – Universidade CEUMA
Jaisa Klauss - Instituto de Ensino Superior e Formação Avançada de Vitória
Jesus Rodrigues Lemos - Universidade Federal do Delta do Parnaíba
João Paulo Hergesel - Pontifícia Universidade Católica de Campinas
Jose Henrique de Lacerda Furtado – Instituto Federal do Rio de Janeiro
Jordany Gomes da Silva – Universidade Federal de Pernambuco
Jucilene Oliveira de Sousa – Universidade Estadual de Campinas
Luana Lima Guimarães – Universidade Federal do Ceará
Luma Mirely de Souza Brandão – Universidade Tiradentes
Marcos Pereira dos Santos - Faculdade Eugênio Gomes
Mateus Dias Antunes – Universidade de São Paulo
Milson dos Santos Barbosa – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba
- IFPB
Naiola Paiva de Miranda - Universidade Federal do Ceará
Rafael Leal da Silva – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Rodrigo Lema Del Rio Martins - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Willian Douglas Guilherme - Universidade Federal do Tocantins

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

P974

Psicologia e cultura: abordagens, reflexões e implicações da psicologia na


sociedade contemporânea - Volume 1 / Organizadoras Cristiane Elisa Ribas
Batista, Jaisa Klauss, Patrícia Gonçalves de Freitas. – Rio de Janeiro: e-Publicar,
2023.

Livro em Adobe PDF


ISBN 978-65-5364-208-9
Inclui Bibliografia

1. Psicologia. 2. Cultura. 3. Pesquisa. I. Batista, Cristiane Elisa Ribas


(Organizadora). II. Klauss, Jaisa (Organizadora). III. Freitas, Patrícia Gonçalves
de. IV. Título.

CDD 150
Elaborada por Bibliotecária Janaina Ramos – CRB-8/9166

Editora e-Publicar
Rio de Janeiro, Brasil
[email protected]
www.editorapublicar.com.br
2023
Apresentação

É com grande satisfação que a Editora e-Publicar apresenta a obra intitulada


“Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da psicologia na sociedade
contemporânea, Volume 1”. Neste livro engajados pesquisadores contribuíram com suas
pesquisas. Esta obra é composta por capítulos que abordam múltiplos temas da área
Desejamos a todos uma excelente leitura!

Editora e-Publicar
Sumário
CAPÍTULO 1 ........................................................................................................................... 10
DOENÇA DE PARKINSON E O PERFIL NEUROPSICOLÓGICO DE PACIENTES NESTA
CONDIÇÃO ............................................................................................................................. 10
Daniele de Fátima de Paiva Abreu

CAPÍTULO 2 ........................................................................................................................... 17
A PSICOLOGIA DOS SUPER-HERÓIS: IMPACTOS DA MÍDIA DE SUPER-HERÓIS NO
COMPORTAMENTO PRÓ-SOCIAL ..................................................................................... 17
Yanne Pacheco Barboza de Lira
Ana Luiza Romão Braz
Lara Camelo Oliveira
Edson Felipe Vieira Silva
Isabella Leandra Silva Santos

CAPÍTULO 3 ........................................................................................................................... 29
O QUE É ABUSIVO: UMA REVISÃO SOBRE RELACIONAMENTOS ABUSIVOS ...... 29
DOI 10.47402/ed.ep.c2311283289 Daniela Zibenberg
Letícia Bandeira de Mello da Fonseca Costa

CAPÍTULO 4 ........................................................................................................................... 46
O AUMENTO DO USO DE ANTIDEPRESSIVOS E ANSIOLÍTICOS PÓS PANDEMIA E
SEUS IMPACTOS ................................................................................................................... 46
DOI 10.47402/ed.ep.c2311294289 Ellen Oliveira Araújo
Gabriella Silva Ramos
Julia Silva Carrijo
Luan Mendes de Freitas
Mayara Beatriz Carvalho Gonçalves
Nayara Sílvia Santos
Janaina Jácome dos Santos

CAPÍTULO 5 ........................................................................................................................... 60
MODOS DE CONSUMO: A INFLUÊNCIA DA INDÚSTRIA CULTURAL NA
CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ................................................................. 60
DOI 10.47402/ed.ep.c2311305289 Thiago Frederik Mendes Batista
Jaciany Soares Serafim

CAPÍTULO 6 ........................................................................................................................... 70
INTEGRAÇÃO DA ESPIRITUALIDADE NO ATENDIMENTO PSICOLÓGICO:
BENEFÍCIOS, DESAFIOS E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO................................... 70
DOI 10.47402/ed.ep.c2311316289 Kahlinne Rocha Brandão
Ramon Silva Silveira da Fonseca

CAPÍTULO 7 ........................................................................................................................... 90
COMPORTAMENTOS ANTISSOCIAIS NA ADOLESCÊNCIA ........................................ 90
Daniele de Fátima de Paiva Abreu
Willian Miguel de Araujo Pontes
CAPÍTULO 8 ........................................................................................................................... 98
ENTENDENDO A MISOGINIA ONLINE: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS ........................ 98
Taciane Cavalcanti do Amaral Mota

CAPÍTULO 9 ......................................................................................................................... 105


REFLEXÕES SOBRE A PESQUISA QUALITATIVA EM PSICOLOGIA ....................... 105
Taciane Cavalcanti do Amaral Mota

CAPÍTULO 10 ....................................................................................................................... 113


A PRÁTICA DA TENDÊNCIA ATUALIZANTE PELAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
NO ENFRETAMENTO DOS DESAFIOS PARA A PERMANÊNCIA NO ENSINO
SUPERIOR............................................................................................................................. 113
DOI 10.47402/ed.ep.c23113510289 Iarley Pereira de Sousa
Leilane Menezes Maciel Travassos
Romércia Batista dos Santos

CAPÍTULO 11 ....................................................................................................................... 129


ANÁLISE DA ATIVIDADE DE TRABALHO DE UMA TECNÓLOGA EM RADIOLOGIA:
ESTUDO DE CASO .............................................................................................................. 129
Edizângela de Fátima Cruz de Souza

CAPÍTULO 12 ....................................................................................................................... 137


EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO PELA FACULDADE CESUSC EM PSICOLOGIA DO
ESPORTE............................................................................................................................... 137
DOI 10.47402/ed.ep.c23113712289 Rita Adriana Melo Sterling
Marília Santos do Amaral
Guilherme Ribeiro Soares
CAPÍTULO 1
DOENÇA DE PARKINSON E O PERFIL NEUROPSICOLÓGICO DE PACIENTES
NESTA CONDIÇÃO

Daniele de Fátima de Paiva Abreu

RESUMO
A doença de Parkinson é uma doença lentamente progressiva e degenerativa caracterizada por tremores em
repouso, rigidez muscular, movimentos lentos e diminuídos. Tendo em vista o aumento significativo da sua
prevalência nas ultimas décadas, o presente capítulo objetivou a priori compreender as manifestações clínicas, os
critérios diagnósticos e a importância da neuropsicologia dentro na DP. Contudo, foi observado que a
neuropsicologia atua de forma singular no diagnóstico, no processo de reabilitação e intervenção comportamental,
visando sempre à recuperação da saúde do paciente. Espera-se que o capítulo possa trazer uma contribuição para
alunos e professores que pretendam entender os ângulos da DP no âmbito neuropsicológico.

PALAVRAS-CHAVE: DP. Neuropsicologia. Diagnóstico.

1. INTRODUÇÃO

A doença de Parkinson (DP) ou mal de Parkinson é uma patologia de origem


neurológica, lentamente progressiva e degenerativa de uma região conhecida como substância
negra, presente no sistema nervoso central (SILVA et al., 2021). A sua descrição remonta a
1817, quando James Parkinson descreveu os sintomas cardinais desta doença, mais tarde
designada com o seu nome (KEMPSTER et al., 2007).

É considerada a segunda enfermidade neurodegenerativa mais comum na população


idosa, apresenta-se de forma crônica e progressiva, devido à diminuição do neurotransmissor
dopamina nos gânglios da base (CHOU, 2020). O Estudo de Fatores de Risco Global Burden
of Dissasse Study de 2016 ressaltou que, entre os distúrbios neurológicos conhecidos e
estudados pela ciência, sabe-se que a DP é considerada a que mais cresce em prevalência,
incapacidades e mortes ao longo dos anos (RIEDER, 2020).

Foi estimado que 6,1 milhões de indivíduos em todo o mundo tiveram um diagnóstico
de DP em 2016, 2,4 vezes mais que em 1990 (DORSEY et al., 2018). Essa prevalência
crescente foi atribuída ao aprimoramento de métodos diagnóstico, ao envelhecimento da
população com o aumento da expectativa de vida e, possivelmente, à maior exposição ambiental
(MARRAS et al., 2018). A DP surge geralmente entre os 50 e os 80 anos de idade, com um
pico na sétima década de vida, sendo mais prevalente nos homens (GOETZ, 2011).

Os pesquisadores Silva et al. (2015) explanam que um dos grandes desafios desse século
é a criação de estratégias para o cuidado da população idosa que apresenta diversas

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 10


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
particularidades e ainda uma elevada prevalência de doenças crônicas degenerativas e
incapacitantes. Fadiga, constipação, disfagia, dificuldades urinárias, disfunção sexual,
hipotensão ortostática, sintomas sensoriais dolorosos e a dermatite seborreica são outros sinais
que o portador da doença de Parkinson pode apresentar (CHOU, 2020).

De fato, a teoria mais aceita de acometimento do SNC pela DP parte da descrição dos
seis estágios anátomo-patológicos da deposição dos corpos de Lewy, feita pelo neuroanatomista
alemão Heiko Braak em 2003 (Brandão, xx). Reconhece-se que a DP seja, na verdade, uma
doença que se distribui sistemicamente e envolve tanto neurônios dopaminérgicos quanto não
dopaminérgicos (serotoninérgicos, colinérgicos, noradrenérgicos), assim como sítios no SNC e
extra-SNC (MCCANN; CARTWRIGHT; HALLIDAY, 2016).

2. AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA NA DOENÇA DE PARKINSON

A avaliação neuropsicológica abrangente de pacientes com DP é um processo


dispendioso, que demanda tempo prolongado, e requer avaliações de um ou mais profissionais
de saúde altamente especializados (BRANDAO, 2021). Há grande heterogeneidade na escolha
dos testes neuropsicológicos para uso na prática clínica, e ainda carece a recomendação formal
de uma bateria sensível o suficiente para identificar déficits mais sutis. Tem sido recomendado
que os instrumentos cognitivos sejam selecionados a partir da disponibilidade de dados
normativos adequados à população local (AARSLAND et al., 2021).

As diretrizes separaram o processo de avaliação de transtornos cognitivos associados à


DP em dois níveis: nível I, diagnosticado com testes de rastreio simples, rápidos, facilmente
reprodutíveis e transculturalmente adaptados; e nível II, diagnosticado com uma bateria mais
abrangente de testes validados localmente, que forneceriam estimativas válidas dos déficits
cognitivos relacionados à DP. Logo, esses testes, segundo os especialistas, devem abranger pelo
menos cinco domínios cognitivos.

A Escala de Avaliação Cognitiva da Doença de Parkinson (Parkinson's Disease -


Cognitive Rating Scale, PD-CRS) é um exemplo de instrumento de avaliação cognitiva global,
que acolhe os domínios cognitivos predominantemente comprometidos na DP (BOBADILLA
et al., 2013). A PD-CRS é composta por nove subtestes, e inclui a avaliação dos domínios
cognitivos "frontal-subcortical" e "cortical posterior". A pontuação do escore "frontal-
subcortical" é composta por testes de atenção sustentada, memória operacional, evocação
imediata e tardia de memória verbal, fluência verbal alternada, fluência verbal de ações e
desenho do relógio espontâneo (BRANDÃO, 2021).

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 11


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
3. ASPECTOS FISIOLÓGICOS E NEUROANATÔMICOS DA DP

Do ponto de vista fisiopatológico, a DP é caracterizada pela morte precoce dos


neurônios dopaminérgicos da substância negra (pars reticulada), gerando como consequência
a redução drástica dos níveis de dopamina no corpo estriado (JANKOVIC; TOLOSA, 2007).
Estudos patológicos recentes (JANKOVIC et al., 2020) em humanos e em modelos animais
evidenciam que neurônicos não dopaminérgicos em outras regiões (como o núcleo dorsal do
vago, locus coeruleus e núcleos da rafe) também estão envolvidos (MARTINS, 2021).

Os neurônios dopaminérgicos envolvidos nos circuitos motores principais inervam


primordialmente os núcleos da base (corpo estriado, os segmentos externo e interno do globo
pálido e o núcleo subtalâmico), assim como os alvos das suas projeções (tálamo e córtex motor,
por exemplo), servindo como moduladores dos circuitos córtico-estriatais (JANKOVIC;
TOLOSA, 2007).

4. ASPECTOS COGNITIVOS DA DP

Considera-se que a perda de neurônios dopaminérgicos na substância negra e a


consequente disfunção do córtex pré-frontal desempenham papel importante no déficit
executivo na DP (KALLIA et al., 2015). Os déficits cognitivos também decorrem da disfunção
colinérgica, observável na doença (COLLOBY et al., 2016; O'CALLAGHAN et al., 2017).

A disfunção cognitiva decorre do comprometimento de circuitos não motores corticais


e subcorticais (MARTINS, 2021). De fato, os núcleos da base interagem com diversas porções
do córtex frontal e do sistema límbico, desempenhando um papel na regulação de funções
cognitivas e afetivas (JANKOVIC; TOLOSA, 2007).

As alterações na DP ocorrem gradual e progressivamente ao longo dos anos e diversas


funções cognitivas são prejudicadas (HALLIDAY et al., 2014). Os déficits são considerados
essencialmente de natureza executiva (AARSLAND et al., 2010; O'CALLAGHAN et al.,
2017), afetando a capacidade de planejamento, o controle cognitivo, a elaboração de conceitos,
a iniciação, o controle inibitório (PILLON et al., 1993; O'CALLAGHAN et al., 2017), a
organização e a regulação do comportamento direcionado para objetivos (GRAY et al., 2007),
a memória de trabalho e de curto prazo (WOODS et al., 2003; O'CALLAGHAN et al., 2017)
e a atenção (O'CALLAGHAN et al., 2017).

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 12


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
5. TRATAMENTO

Em detrimento da ausência de marcadores biológicos, não é possível realizar um


diagnóstico precoce e primário, deixando a cargo da atenção secundária diagnosticar e visar a
um tratamento cujo objetivo seja reduzir a progressão da doença e controlar a sintomatologia
(PINHEIRO; BARBOSA, 2018). Atualmente, existem estudos que demonstram o uso do
inibidor da MAO-B, como a Selegilina e Resagilina, provocam um efeito sintomático suave,
retardando a necessidade do uso da Levodopa por um intervalo médio de nove meses.

A Amantadinatem a função de atuar aumentando a liberação de dopamina nos sítios de


armazenamento e bloqueando a receptação de dopamina pelas terminações pré-sinápticas.
Estudos comprovaram que, nos estágios iniciais da doença, esse medicamento é eficaz em 2/3
dos pacientes (HOMAYOUN, 2018). A levodopa foi o primeiro fármaco usado eficazmente
para o tratamento da DP e, mais de 50 anos após a sua introdução, permanece o mais eficaz no
tratamento dos sintomas motores (GRAY et al., 2014).

O atendimento multidisciplinar associa a medicina convencional à outras áreas,


principalmente, a fonoaudiologia e a fisioterapia. Com o avanço das ciências, a busca por
tratamentos alternativos se intensificou, visando a promover o conforto e o bem-estar do
enfermo, sem a necessidade de aumentar a quantidade de fármacos (CABREIRA, 2019). Dessa
forma, fisioterapias alternativas, o uso de canabidiol e a homeopatia podem ser utilizados como
forma de ajudar na recuperação cognitiva (PEREIRA et al., 2019).

6. CONCLUSÃO

Diante do exposto, observa-se que diagnóstico da DP é complexo e baseado nos


sintomas clínicos apresentado pelo paciente e não há possibilidade de realização de exames
específicos para o mesmo, o que o torna normalmente tardio. Porém, existe medicamentos,
como por exemplo, o Levodopa, que pode melhorar significativamente a qualidade de vida dos
portadores da doença.

As alterações cognitivas na DP, apesar do destaque para as alterações motoras, têm


efeitos incapacitantes, levando ao isolamento social e a pouca integração nas atividades
cotidianas, com impacto variável sobre a qualidade de vida. Nesse sentido, a Neuropsicologia
atua, de forma singular, no diagnóstico, no processo de reabilitação e intervenção
comportamental, visando sempre à recuperação da saúde do paciente.

Ademais, espera-se que o presente capítulo que possa aguçar o interesse de


pesquisadores que pretendam aprofundar os conhecimentos acerca do transtorno. Dessa forma,

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 13


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
sugerem-se futuras pesquisas que possam elucidar principalmente as funções executivas da DP,
e que outros estudos que contemplem este conteúdo possam ser esperados no futuro.

REFERÊNCIAS

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Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 16


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
CAPÍTULO 2
A PSICOLOGIA DOS SUPER-HERÓIS:
IMPACTOS DA MÍDIA DE SUPER-HERÓIS NO COMPORTAMENTO PRÓ-
SOCIAL 1

Yanne Pacheco Barboza de Lira


Ana Luiza Romão Braz
Lara Camelo Oliveira
Edson Felipe Vieira Silva
Isabella Leandra Silva Santos

RESUMO
As mídias de super-heróis estão cada vez mais presentes na indústria do entretenimento contemporâneo, seja nos
filmes, séries e histórias em quadrinhos. Mas quais são seus impactos psicossociais na audiência? O presente
estudo objetivou apresentar sumariamente os efeitos das mídias de super-heróis na pró-sociabilidade, ou seja, o
conjunto de atitudes e comportamentos com a intenção de ajudar outras pessoas. Inicialmente foi apresentado o
panorama histórico dos super-heróis, desde sua origem moderna até os estudos iniciais no contexto da psicologia.
Especificamente tratando da pró-sociabilidade, pesquisas contemporâneas demonstram que mídias retratando
esses personagens tem impactos positivos de curto e longo prazo nessa variável. Finalmente, foram apresentadas
possibilidades de intervenção utilizando mídias de super-heróis, através do projeto “Super-heróis da Vida Real:
Desenvolvendo a pró-sociabilidade em Alunos do Ensino Médio com Mídias de Super-heróis”. É possível concluir
que, através de suas mensagens positivas (e.g. ajudar os outros), a mídia de super-heróis é eficaz em promover
comportamentos e atitudes pró-sociais.

PALAVRAS-CHAVE: Super-heróis. Pró-sociabilidade. Mídia.

1. INTRODUÇÃO

Dentre os inúmeros gêneros presentes na mídia contemporânea, as obras de super-heróis


estão entre as mais populares, alcançando cada vez mais números maiores na indústria do
entretenimento. Em 2022, por exemplo, o top 10 de maiores bilheterias mundiais da história do
cinema era dominado por quatro filmes de super-heróis, com o universo cinematográfico da
Marvel sendo a série de filmes mais popular usando a mesma métrica (BOX OFFICE MOJO,
2022; NAVARRO, 2022).

Apesar dessa popularidade nas mídias audiovisuais, os super-heróis modernos surgiram


nos quadrinhos com o Super-homem, personagem da DC comics que trouxe à tona as três
características que até hoje definem uma parcela considerável das narrativas de heróis: uma
identidade secreta, um conjunto específico de poderes e uma fantasia (GIBSON et al., 2016).

1
Programa de Bolsas de Extensão - Universidade Federal da Paraíba.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Mas muito além da imagem, o super-herói está associado a uma série de conceitos e
características no imaginário popular.

Numa discussão mais detalhada das funções psicossociais dos super-heróis, Kinsella e
colaboradores (2015) apresentam três características principais das histórias de heróis presentes
na cultura humana: esses personagens auxiliam a vida daqueles ao seu redor, os motivando a
ser pessoas melhores; eles representam os ideais de moralidade do contexto social; e,
finalmente, heróis protegem as pessoas, estando esse significado presente na própria etimologia
da palavra.

Corroborando essa discussão, Rosenberg (2013) aponta que a fascinação do público por
super-heróis se dá principalmente por seus aspectos positivos, por representarem versões ideais
de moralidade e cuidado dos que precisam. Contudo, o quão presentes estão esses assuntos nas
obras de heróis contemporâneas? Num estudo focado nos filmes de super-heróis, Bauer e
colaboradores (2016) observaram 12 temas positivos mais retratados durante essas obras, sendo
eles: ajudar e proteger o público, relacionamentos positivos, trabalho em equipe, personagens
femininas fortes, orientação, autossacrifício, importância da inteligência em comparação com
a força física, se responsabilizar pelas próprias ações, organização, superação de obstáculos,
honestidade, e decidir não fazer algo errado.

Mas esses temas positivos apresentados pela mídia de super-heróis de fato podem ter
impactos psicossociais na audiência? O Modelo Geral da Aprendizagem (GLM; BUCKLEY;
ANDERSON, 2006), corrobora teoricamente essa possibilidade. O GLM é uma metateoria que
expande o Modelo Geral da Agressão (ANDERSON; BUSHMAN, 2002) para responder a
seguinte pergunta: como variáveis biopsicossociais e de desenvolvimento impactam a
probabilidade de comportamento, tanto numa situação específica quanto a longo prazo
(GREITEMEYER, 2011)? Assim, o GLM postula que variáveis pessoais (características do
indivíduo) e situacionais (características do ambiente) impactam o estado interno do sujeito
(cognição, afeto e excitação), que, por sua vez, afetam os processos de tomada de decisão e
avaliação que geram um comportamento condizente com todas essas variáveis (BARLETT;
ANDERSON, 2012).

Dentro do GLM, uma das fontes de aprendizagem oferecidas pelo ambiente é a


exposição à mídia: a curto prazo, os efeitos comportamentais ocorrem através de seu impacto
em cognições, afetos e excitação, enquanto a longo prazo, a mídia é capaz de gerar mudanças
em traços, crenças, atitudes e scripts comportamentais (PROT et al., 2014). Se uma criança

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cresce assistindo um desenho onde um super-herói sempre protege as pessoas, por exemplo, ela
pode desenvolver a crença de que ajudar quem precisa é um comportamento nobre, e ser mais
favorável a agir de maneira pró-social em seu dia-a-dia.

O presente estudo terá como foco exatamente esse comportamento pró-social, ou seja,
qualquer ação realizada de modo voluntário que objetiva beneficiar outra pessoa ou grupo
(EISENBERG et al., 2006), especificamente tratando de como as mídias de super-heróis o
afetam. Desse modo, num primeiro momento será discutida a linha temporal dos estudos
psicológicos acerca de super-heróis, seguindo para uma exposição de estudos acerca da relação
entre esses personagens e o comportamento pró-social, e por fim, apresentando um projeto de
intervenção desenvolvido acerca do tema.

2. PSICOLOGIA E SUPER-HERÓIS: ASPECTOS HISTÓRICOS

A primeira história do personagem Super-homem foi publicada em 1938 pela editora


DC Comics, nos Estados Unidos, dando início à chamada “Era de ouro” dos quadrinhos de
heróis, o primeiro formato a popularizar esses personagens (NEVINS, 2017). Tal era foi
caracterizada pelo super-herói fantasiado, que enfrentava vilões e salvava a humanidade com
seus poderes supernaturais (NEVINS, 2017). Essa foi a primeira vez que os gêneros de ficção
científica e investigação criminal convergiram nos quadrinhos, o que pode ter contribuído para
o seu sucesso (NEVINS, 2017).

A partir de então, os super-heróis, em suas mais diferentes formas e narrativas,


dominaram a mídia popular e, como consequência, geraram o interesse da psicologia,
especialmente a social, que tem como uma de suas áreas de estudo o impacto da mídia na
sociedade (ALEXANDRE, 2001). Sendo o público infanto-juvenil um grande consumidor do
gênero de super-heróis (CORREA; CASTRO, 2019), tanto nos quadrinhos quanto em outras
mídias, torna-se especialmente relevante o estudo desse impacto, uma vez que tal público é
mais suscetível ao processo de socialização por estar em processo de desenvolvimento.
(ALEXANDRE, 2001).

No entanto, os estudos psicológicos a respeito dos impactos das mídias de super-herói


no século XX, quando estes surgiram, são escassos. Isso pode ser explicado, primeiramente,
pelo fato de que a psicologia social, também nascida naquele século, costumava se dedicar,
inicialmente, ao estudo de temas à época considerados mais relevantes, como o racismo, as
crenças sociais e o preconceito (LANE, 2017). Esta ciência passou a se dedicar mais ao estudo
das mídias apenas no início do século XXI, quando houve um maior acesso da população e

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começou-se a discutir seus efeitos, especialmente para tentar explicar fenômenos sociais, como
o da violência (VALA; MONTEIRO, 2013).

A segunda possibilidade para o aumento de estudos sobre os super-heróis pela


psicologia no século XXI é o crescimento de sua popularidade; os personagens, que alcançavam
apenas leitores de quadrinhos à época de sua criação, na contemporaneidade atingem os mais
diversos públicos ao terem sido levados para a televisão e, especialmente, aos cinemas; nota-se
que o sucesso de bilheteria alcançado nas últimas décadas por filmes desse gênero levou os
personagens à maior popularidade desde a sua criação.

Apesar de sua escassez, estudos relevantes foram feitos no século XX, aos quais é válido
discutir. A começar por um estudo realizado por Levinzon (1990), que pretendia entender os
significados dos desenhos de super-heróis veiculados na televisão para crianças brasileiras de
diferentes classes sociais e de ambos os sexos; Concluiu-se que os aspectos que mais chamavam
a atenção neste tipo de mídia eram a luta, a separação entre bem e mal e a onipotência dos
personagens; comprovou-se a hipótese, ainda, de que a diferença de sexo e classe social mudava
o significado atribuído à mídia assistida, tendo cada criança a interpretado conforme o seu
próprio desenvolvimento afetivo e cognitivo. E observou-se, ademais, que a mídia de super-
heróis poderia ocasionar impacto positivo, possibilitando um maior manejo da agressividade e
permitindo à criança desenvolver valores com os quais pudesse se identificar.

A respeito da diferenciação entre os super-heróis de ambos os gêneros, um estudo de


Young (1993) analisou quadrinhos da Marvel para a comparação entre personagens femininos
e masculinos, observando haver menor representação das mulheres em termos de quantidade
de heroínas e que, mesmo quando estas eram tão poderosas quanto os homens, eram raramente
chamadas em contextos em que era necessário restaurar a ordem nas histórias. Além disso,
mostrou-se que heroínas eram no geral representadas como tendo menos força e energia do que
os seus pares do sexo oposto. O estudo concluiu que os papeis de gênero sociais, que
estabelecem o sexo feminino como frágil, têm impacto no contexto das histórias de heróis em
quadrinhos, o que pode retroalimentar, para os consumidores, este estereótipo.

No entanto, como mencionado anteriormente, a psicologia social costuma levantar a


preocupação com os efeitos negativos da mídia, especialmente aqueles relacionados à
violência; Dessa forma, Levin e Nancy (1995) realizaram um estudo sobre a preocupação de
professores a respeito do consumo das crianças das séries de super-heróis, pois acreditavam que
poderiam ser a causa de brincadeiras agressivas e as influenciando a ver os personagens como

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modelos de comportamento. Tal discussão relaciona-se aos estudos feitos na atualidade, em que
procura-se entender em que medida a violência apresentada nas telas, quando utilizada em
comportamentos pró-sociais, pode influenciar o espectador à agressividade ou se a
interpretação da moral positiva dos heróis geraria um comportamento mais voltado à pró-
sociabilidade (SANTOS et al., 2018).

Nesse sentido, Fonville e Afflerbach (1995) argumentam que a agressividade das


brincadeiras de super-heróis, quando bem manejadas, auxiliam as crianças a satisfazerem suas
necessidades de ter poder físico, social e psicológico. Para isso, segundo as autoras, elas devem
ser orientadas, no ambiente escolar, a brincar com limites estabelecidos de segurança, em um
ambiente preparado, utilizando os personagens e histórias de super-heróis no contexto cotidiano
e aprendendo a solucionar conflitos de maneira pacífica.

Por fim, um estudo de Bauer e Dettore (1997) discorre a respeito das brincadeiras de
super-heróis por crianças, concluindo que elas podem trazer benefícios, contribuindo para a
cooperatividade e aprendizado dos valores morais. O artigo também ensina como essas
brincadeiras podem ser conduzidas por professores para o alcance de resultados positivos, sem
que haja foco na violência.

Dessa forma, é possível que a psicologia apresenta uma relação complexa com as mídias
de super-heróis, mas que, quanto mais recentes os estudos, mais se observa uma tendência à
valorização do impacto positivo destas para o público infantojuvenil. Essa relação entre o
consumo dessas mídias e o comportamento pró-social será discutida mais detalhadamente a
seguir.

3. SUPER-HERÓIS E COMPORTAMENTO PRÓ-SOCIAL

Como discutido no tópico anterior, têm-se estudado por muitos anos os efeitos positivos
e negativos das mídias de super-heróis. Nesse cenário, apesar da recente valorização do impacto
positivo, grande parte das pesquisas se concentram no lado negativo do consumo desse
conteúdo, principalmente na investigação do seu efeito no comportamento violento. Por isso,
faz-se necessária a elaboração de estudos que analisem a contribuição positiva que esse
conteúdo tão popular poderia ter para a sociedade.

Um desses formatos midiáticos com super-heróis são os jogos eletrônicos. O estudo de


Happ et al. (2013), por exemplo, analisou os efeitos da empatia com o tipo de personagem
controlado em jogos violentos. Foi observado que jogar com heróis, como o Super-homem,
resultou em maior comportamento pró-social do que ao utilizar vilões, como o Coringa. A

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empatia também causava impactos diferenciados a depender da condição: desse modo, no papel
de herói, a empatia fez com que os jogadores tivessem uma percepção menos agressiva e
exibissem mais comportamentos de ajuda, e no de vilão, que adotassem uma visão mais hostil
e, devido ao passado violento ou negativo deste, que os jogadores apresentassem uma
justificativa para exibir comportamentos violentos.

Ainda se tratando de jogos eletrônicos, o jogo Hall of Heroes foi utilizado para o
treinamento de habilidades sociais de adolescentes por meio da execução de uma série de
missões heroicas que envolviam trabalho em equipe com outros estudantes (DEROSIER;
THOMAS, 2019). Assim, foi evidenciado que os jovens que participaram tiveram uma melhora
significativa não só em suas habilidades interpessoais, mas também em expressar emoções,
aceitar afeto, diminuindo sentimentos ansiosos e depressivos (DEROSIER; THOMAS, 2019).

Já o estudo de Santos et al. (2018) contribui para o tema numa perspectiva geral ao
trazer que o consumo de mídia de super-heróis não é capaz de predizer o comportamento pró-
social ou agressivo, entretanto, consegue estimular esses comportamentos. Constatou-se que as
meninas com maior contato com mídias de super-heróis apresentaram maiores escores de pró-
sociabilidade, com o oposto ocorrendo nos meninos. Enquanto isso, os garotos apresentaram
mais comportamentos agressivos quando comparados às meninas. Sendo duas possibilidades
discutidas pelos autores para esse resultado: meninas reagem mais a situações pró-sociais e
compreendem melhor o que foi exibido nos programas de super-heróis.

Sobre a temática, Cingel et al. (2020) observaram que as garotas tinham altos níveis de
comportamento pró-social e níveis similares de sentimentos agressivos em relação aos garotos.
Sendo que a presença de violência na série de super-heróis resultou em intenções maiores de
pró-sociabilidade dos participantes do que na ausência desse fator. Além disso, apenas os
adolescentes do sexo masculino apresentaram maior intenção pró-social significativamente na
condição de violência comparado ao sem violência, não sendo constatado efeitos antissociais
nas condições com ou sem violência. Sendo assim, os autores discutiram a possibilidade de os
adolescentes conseguirem compreender que a violência foi usada para ajudar as pessoas, por
isso o aumento pró-social, e ressaltaram o efeito moderador do gênero, tendo em vista que, por
exemplo, é aceito socialmente o comportamento agressivo masculino, ao contrário do feminino,
sendo esse público mais influenciado por esse tipo de mídia.

É importante também considerar o impacto do conteúdo violento de super-heróis a


depender da faixa etária do público. Nesse sentido, Coyne et al. (2017) analisaram os efeitos

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das mídias de super-heróis no comportamento agressivo, pró-social e defensivo das crianças
em idade pré-escolar. Após um ano da coleta inicial, foi observada uma relação entre o consumo
da mídia e o aumento da agressão física e relacional nos participantes, e nenhum efeito na pró-
sociabilidade ou no comportamento de defesa. Isso foi justificado, por exemplo, pelo
desenvolvimento cognitivo incompleto, portanto, da não separação do conteúdo e da realidade,
a não diferenciação entre agressão e pró-sociabilidade, assim como por estarem na idade de
formação de esquemas referente ao comportamento em sociedade.

A extensa popularidade das obras com super-heróis e sua representação social faz com
que mesmo imagens desses heróis impactem o comportamento, ao menos de curto prazo, dos
sujeitos. De maneira análoga, foram realizados dois experimentos com figuras de heróis no
intuito de investigar os efeitos tanto na pró-sociabilidade quanto no sentido na vida. Os dados
mostraram o aumento de intenção e comportamento pró-social nos participantes, contribuindo
para o pressuposto que esse tipo de mídia poderia estimular comportamentos pró-sociais na
população (VAN TONGEREN et al., 2018).

Nessa mesma perspectiva, Mesurado et al. (2019) buscaram investigar a eficiência do


programa virtual Hero para a promoção de comportamentos pró-sociais em adolescentes através
de emoções como empatia, gratidão e perdão. O programa foi recebido positivamente e cumpriu
o propósito, estimulando o comportamento pró-social relativo a estranhos e familiares, porém
não obteve o mesmo efeito direcionado para amigos. Os autores também verificaram a eficácia
do programa no Uruguai e na Argentina com resultados similares no aumento da pró-
sociabilidade nos participantes, as mulheres apresentaram níveis maiores nos dois países,
semelhante às pesquisas discutidas anteriormente (MESURADO et al., 2020).

Portanto, os estudos demonstram que as mídias de super-herói podem promover o


aumento no comportamento pró-social e incentivar emoções positivas, também diminuindo
sentimentos como a ansiedade. Por outro lado, é importante ter em vista os possíveis impactos
negativos, como o comportamento agressivo, para que esse conteúdo possa ser utilizado de
forma benéfica à sociedade, alavancando a pró-sociabilidade e contribuindo para a redução de
comportamentos hostis na população.

4. DESENVOLVENDO UMA INTERVENÇÃO PARA PROMOÇÃO DE PRÓ-


SOCIABILIDADE

Historicamente, mídias que envolvem super-heróis, possuem narrativas que trazem


ações que visam beneficiar outras pessoas sem ganho próprio. Desse modo, essas obras podem

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servir como fonte de inspiração para o público, podendo assim, promover o aumento de
comportamentos pró-sociais e relações interpessoais positivas. Com essas ideias em mente, foi
concebida uma intervenção objetivando a promoção de pró-sociabilidade utilizando mídias de
super-heróis, intitulada "Super-heróis da Vida Real": Desenvolvendo a pró-sociabilidade em
Alunos do Ensino Médio com Mídias de Super-heróis.

A intervenção executada tinha como público-alvo estudantes de ensino médio de escolas


cidadãs integrais públicas, sendo a parte central de um projeto de extensão focado no tema.
Anteriormente ao desenvolvimento das atividades propriamente ditas, foram realizados não só
o contato com uma instituição interessada, mas também o planejamento em volta do material
específico a ser utilizado. As atividades foram desenvolvidas em duas turmas do segundo ano
do ensino médio, gerando um total de quatro momentos de 50 minutos para cada turma, sendo
um encontro por semana. Em cada visita foi utilizado um formato diferente de mídia
(quadrinhos, filmes e séries), e abordado um aspecto relacionado ao comportamento pró-social.

No primeiro momento com os alunos, foi apresentado o projeto e a equipe de trabalho.


Além disso, foi desenvolvida a primeira atividade, intitulada “como super-heróis se relacionam
com a pró-sociabilidade?”. Para essa tarefa, foram oferecidos trechos de quadrinhos e cada
aluno deveria escolher uma cena que representasse o que é ser um super-herói. Ademais, foi
utilizado uma tabela contendo os temas positivos mais evidentes em mídias de super-heróis,
desenvolvida por Bauer et al. (2016), para mitigar a conversa, todavia, se alguma das cenas
escolhidas não fosse uma representação de algum tema, daria início a uma discussão sobre o
porquê o aluno teve aquela escolha.

Na segunda atividade, intitulada “Super-heróis e empatia”, foram exibidas cenas de


filmes. Em seguida, a turma foi dividida em grupos de 3 a 5 alunos, sendo abordado o conceito
de empatia e buscando ações empáticas nas cenas. Logo após, os grupos começaram a construir
um cartaz ou um pôster sobre a relevância da empatia na vida cotidiana, trazendo como foco
principal a escola, buscando gerar reflexões de como agir de forma empática pode melhorar o
dia-a-dia das pessoas ao nosso redor.

Já na terceira atividade, “super-heróis e comportamento pró-social no dia-a-dia”, foi


exibido um episódio de desenho animado de super-herói, e cada aluno deveria fazer anotações
sobre os acontecimentos que eles julgassem pró-sociais. Com isso, os alunos foram
incentivados a contarem o que haviam anotado para conversarmos como cada uma das ações
anotadas poderia se transformar em uma boa ação. Dessa maneira, cada um poderia pensar

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sobre como ações pró-sociais são positivas, tanto para quem a pratica, quanto para outras
pessoas. Por fim, o quarto encontro foi utilizado para discutir as atividades em sua totalidade,
permitindo que os alunos compartilhassem a sua impressão sobre o projeto.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo central discutir a relação entre a pró-sociabilidade
e a mídia de super-heróis, divididos entre três tópicos que focalizavam na linha temporal de
estudos com a temática, alguns exemplos das pesquisas e ao final, projeto de intervenção
realizado a partir dessa mesma questão. A partir da discussão apresentada, é possível concluir
que os objetivos foram cumpridos.

No primeiro momento, foi possível observar a origem da primeira história relacionada


a Super-Heróis da DC Comics, nos Estados Unidos, e como que seguiu a estruturação de
interesse da psicologia sobre essas figuras “do bem”, bem como estes se tornaram uma fonte
de interesse do público infanto-juvenil. Com as poucas presenças no século XX, devido à
divergência de estudos presentes no meio da psicologia social, o século XXI demonstrou maior
dedicação de estudos nessa área, em especial com o aumento da popularidade dos super-heróis
em mídias além dos quadrinhos (COLE, 2018).

Pensando no segundo tópico, focou-se em mais detalhes em relação a estudos realizados


com diferentes tipos de mídias de super-heróis associados com a pró-sociabilidade, sejam com
jogos ou mídias no geral. Um dos exemplos apontados mostra como o consumo desse meio não
pode predizer o comportamento pró-social ou agressivo, mas que é um meio que pode incitar
essas condutas (SANTOS et al., 2018): assim, mesmo que as mídias de super-heróis não sejam
uma causa direta, elas podem ser um fator de risco para a expressão comportamental.

Já o último ponto apresentou de maneira detalhada a descrição de uma intervenção


aplicada entre alunos do ensino médio, utilizando-se dessas mídias de super-heróis. Apesar
desta se apresentar como uma forma prática de aplicar os temas abordados, também é possível
encontrar limitações: a intervenção em questão foi aplicada apenas com alunos de ensino médio.
Estudos futuros podem abordar a temática com públicos mais novos, adaptando as atividades
para outras faixas-etárias e suas especificidades.

Também é necessário ressaltar que ainda existem lacunas nos estudos psicológicos sobre
super-heróis, principalmente graças a escassez de pesquisas existentes no contexto brasileiro.
Além disso, muitos dos estudos prévios utilizam amostras pequenas, afetando o poder
estatístico das análises: acerca do tema, Kim e colaboradores (2020), por exemplo, recomendam

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que pesquisas experimentais focadas na mídia devem utilizar no mínimo 100 participantes por
condição (e.g. um estudo com grupo experimental e controle contaria com 200 sujeitos). Esse
aspecto deve ser considerado em estudos posteriores.

A partir das questões apontadas anteriormente, ainda é importante salientar que a


temática pode gerar uma diversa gama de perguntas em estudos futuros. Alguns exemplos são
como diferentes heróis podem influenciar no comportamento pró-social e como a utilização de
diferentes tipos de mídias de super-heróis, tais como animações, longa metragens ou jogos
podem afetar a relação entre esses personagens e a pró-sociabilidade. Por fim, a inclusão de
outras variáveis, tais como a personalidade e a fase de desenvolvimento do sujeito, também é
recomendada, a fim de aprofundar mais essa área de pesquisa e trazer resultados cada vez mais
esclarecedores.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
DOI 10.47402/ed.ep.c2311283289

CAPÍTULO 3
O QUE É ABUSIVO:
UMA REVISÃO SOBRE RELACIONAMENTOS ABUSIVOS 2

Daniela Zibenberg
Letícia Bandeira de Mello da Fonseca Costa

RESUMO
Relacionamentos abusivos são um tema recorrente e crescente, por exemplo nas redes sociais. Contudo, não há na
literatura uma definição clara e uniforme a respeito das características que definem relacionamentos como
abusivos. Diante disso, o presente estudo buscou estudar, a partir de uma análise de literatura, definições de
relacionamentos abusivos. Encontrou-se que tais relacionamentos devem ser caracterizados por uma dinâmica de
poder e domínio, exercida por meio de algum tipo de violência. Discute-se a diferença destes relacionamentos para
violência doméstica e violência conjugal, e sua designação para além de relacionamentos amorosos heteroafetivos.

PALAVRAS-CHAVE: Relacionamento abusivo. Violência conjugal. Violência contra a


mulher.

1. INTRODUÇÃO

Em 2010, uma pesquisa no site de busca Google pelo termo exato “Relacionamento
abusivo” decorreria em 73 resultados distribuídos em 8 páginas. A mesma pesquisa em 2015,
no entanto, decorreria em 136 resultados, distribuídos em 13 páginas. E, se feita em 2021,
decorreria em 187 resultados, distribuídos em 19 páginas. É evidente, portanto, o aumento de
produções e conteúdos sobre relacionamentos abusivos na mídia, com resultados em sites de
busca como o Google aumentando em mais de 200% em uma década. Deste modo, apesar de
relacionamentos abusivos não serem uma invenção nova (eg.: ALMEIDA, 2001), sua
nomenclatura vem sendo popularizada recentemente.

Relacionamento abusivo é um tema recorrente nas mídias sociais, por exemplo a hashtag
#relacionamentoabusivo no Instagram em 2022 contou com mais de 600 mil resultados de
busca. As postagens, no entanto, muitas vezes se entrelaçam com outras definições e
diagnósticos, como relacionamentos com narcisistas, relacionamento tóxico, dependência
emocional, depressão e ansiedade. Contudo, não há definição que operacionalize o que são
relacionamentos abusivos em manuais estatísticos de diagnóstico ou documentos legais (eg.:
CID-11, DSM-5, Código Civil), e este construto ainda é pouco explorado cientificamente.

2
Programa fomentador: CAPES; CNPQ.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Desse modo, o presente estudo procurou definir relacionamentos abusivos a partir de uma
investigação de definições de relacionamentos abusivos na literatura.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2. 1. RELACIONAMENTO ABUSIVO, DEFINIÇÕES E NOMENCLATURAS

Relacionamentos abusivos são, muitas vezes, descritos como compostos por ciclos de
violência que se repetem (NORONHA; DOURADO, 2012). Fases de tensão, agressão e
conflito, são seguidas por fases de desculpas e reconciliação, repletas de juras de amor e
promessas de mudança e melhora. Enquanto a reconciliação é denominada “lua de mel”, os
conflitos ocorrem de maneira crescente, com um aumento da tensão, podendo gerar
consequências cada vez mais graves e fatais. Contudo, não é evidente se o ciclo engloba apenas
a violência física ou também os demais tipos de violência (eg.: moral, patrimonial, psicológica
e sexual).

O entendimento do termo “relacionamento abusivo” pode se dar a partir do


desmembramento de suas partes. Relacionamento é compreendido a partir do “ato de se
relacionar”, ou seja, de criar vínculos e ligações, enquanto o verbo abusar é caracterizado por
atitudes de “valer-se ou aproveitar-se” a partir de práticas que “causam ou podem causar dano”
(FERREIRA, 2009). Deste modo, o relacionamento abusivo seria aquele pautado em uma
relação que causa prejuízos a um ou a ambos os sujeitos a partir da existência de um vínculo
entre eles.

Jovens da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) atribuíram em uma pesquisa 19


indicadores de um relacionamento abusivo, que foram divididos em 5 principais núcleos de
significação: ciúmes, comportamento controlador, violências, características do perpetrador e
vivências da vítima (SOUZA, 2018). Na compreensão das estudantes entrevistadas, no
relacionamento abusivo existe uma relação de vítima-perpetrador, como também práticas de
violências na relação.

O termo relacionamento abusivo é frequentemente utilizado como uma forma de


descrever um tipo de relacionamento atravessado por práticas de violência, mas sem que haja
de fato uma descrição específica desse construto. Dada a, por vezes ausência, por vezes
diversidade de definições e termos adotados como sinônimos para relacionamentos abusivos na
literatura (SOUSA, 2018), destaca-se a importância de padronização da definição desse
conceito como uma forma de descrever um tipo de relacionamento. A falta de uma definição
uniforme e clara sobre esses relacionamentos pode dificultar a distinção de relacionamentos

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 30


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
saudáveis para abusivos, e, consequentemente, prejudicar o apoio e tratamento dado tanto às
vítimas, quanto aos abusadores.

Um termo que se confunde com relacionamentos abusivos é, por exemplo, o conceito


de violência doméstica. Isto ocorre porque a violência doméstica é um tipo de violência
vivenciado “entre indivíduos com laços de conjugalidade, namoro, parentesco civil, natural ou
afetivo” (PEREIRA, 2015, p. 717), constituindo então atos de violência que ocorrem a partir
da existência de uma relação vincular. Ademais, em Santos (2019), por exemplo, a autora
mistura os termos “crimes passionais", “feminicídio”, “relacionamentos tóxicos”, “ciúme
patológico" e “relacionamento abusivo” para abordar a questão da violência contra as mulheres.
No entanto, questiona-se se relacionamento abusivo cabe como um sinônimo para todos esses
termos.

Dada a falta de consenso a respeito da definição de relacionamentos abusivos e a


multiplicidade de termos adotados para descrevê-lo, objetivou-se investigar definições de
relacionamentos abusivos na literatura. Para além da definição, explorou-se os métodos
utilizados nas pesquisas, o tipo de violência que os constitui, e os sujeitos que podem estar
envolvidos em um relacionamento abusivo,

2.2 Gênero e abuso

Frequentemente ocorre um atravessamento do gênero nos relacionamentos abusivos.


Isso porque muitas vezes esses relacionamentos são tidos como algo que ocorre na dinâmica
conjugal de um casal heterossexual, em que a assimetria de poder leva em conta a cultura
machista, recaindo sempre sob o homem dominador e a mulher passiva (FERREIRA et al.,
2021). A cultura machista e patriarcal impõe a desigualdade entre os gêneros (FERREIRA et
al., 2021). Nessa visão, é o homem quem assume as posições de poder: no trabalho, em cargos
políticos, até repercutir na família como chefe da mesma, e na relação conjugal, como quem
“manda”. Nesse sentido, a violência contra a mulher é histórica, fruto de anos de desigualdade
de gênero.

Ainda, a mulher costuma ser responsabilizada pela manutenção do relacionamento


(ARAÚJO, 2008) e permeada por crenças românticas idealizadas, em que o amor romântico se
torna um dispositivo cultural e psicológico para a manutenção da violência conjugal
(GNOATO, 2021), no qual se crê que o amor será capaz de transformar o parceiro, e que dessa
vez será diferente. Com isso, a violência contra a mulher frequentemente é usada como
sinônimo de relacionamento abusivo (eg.: ZANINI et al., 2018). Porém, não se sabe se toda

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 31


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
violência contra a mulher constitui um relacionamento deste tipo, e, por outro lado, se
necessariamente precisa haver violência contra a mulher para que o relacionamento seja
abusivo.

Somente no setor de acolhimento Centro de Referência Especializado em Atendimento


à Mulher em Situação de Violência no Pará, entre 2015 e 2018, foram atendidas 805 vítimas de
violência doméstica e na maioria dos casos a vítima sofreu mais de uma agressão simultânea
(ROCHA et al., 2021). Ademais, a cada 15 segundos, uma mulher é vítima de violência física
no Brasil (WAISELFISZ, 2012). Diante de tais dados alarmantes a respeito da violência contra
a mulher e do feminicídio, a maior parte de discursos e atenção a respeito de relacionamentos
abusivos, seja no meio científico ou não, são despendidos sobre o gênero feminino. Assim, o
interesse é no bem-estar da mulher de sair da relação abusiva e manter sua vida preservada, não
atendo-se a preocupações anteriores como a própria definição do relacionamento abusivo e seu
acometimento em outras relações para além das amorosas heterossexuais.

2.3 Mensuração e investigação

A multiplicidade de termos e definições utilizados para abordar relacionamentos


abusivos acompanha também a mensuração e investigação clínica desse construto.
Tipicamente, para definir que sujeitos pertencem à categorias diagnósticas são apresentados
critérios diagnósticos aos quais o indivíduo deve corresponder. Os instrumentos são formulados
com base nestes critérios diagnósticos, e podem ser aplicados de maneira direta ou indireta para
concluir a hipótese diagnóstica. O instrumento precisa ser preciso para que seja capaz de
distinguir entre o diagnóstico e os diagnósticos diferenciais, isto é, condições que compartilham
alguns dos sintomas de um quadro clínico. Sendo assim, a definição da categoria diagnóstica
deve ser clara e precisa para que o instrumento possa acessá-la e avaliá-la. Ou seja, neste caso,
é preciso uma definição clara de relacionamentos abusivos.

Na Escala de Atitudes para Mulheres sobre a Permanência em Relacionamentos


Abusivos – AMPRA (GOMES, 2018) o respondente assinala o quanto concorda ou discorda
de afirmações que versam sobre motivos para a permanência em relações abusivas, como a
proteção dos filhos, opinião de outras pessoas e sentimentos como culpa e medo. A Escala de
Táticas de Conflitos Revisada (PAIVA; FIGUEIREDO, 2006) acessa a quantidade de
ocorrência de comportamentos do respondente e seu companheiro a respeito de negociação,
agressão psicológica, violência física e suas consequências, e coerção sexual.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
A Escala Abuso em Relacionamento Íntimo (TOSTA; CASSEPP-BORGES, 2021)
acessa a frequência de comportamentos do respondente e do companheiro que compreendem
violência física, violência psicológica e atitudes controladoras. A Escala de Crenças sobre
Violência Conjugal (MOURA et al., 2022) avalia crenças sociais e culturais sobre violência
conjugal, a partir da legitimação e banalização de pequenas violências, da violência contra a
mulher, pela atribuição a causas externas e preservação da privacidade familiar.

Diante disso, os instrumentos são capazes de acessar aspectos que constituem


relacionamentos abusivos, como a violência, mas não discriminam diretamente qual
relacionamento é e qual relacionamento não é abusivo. Isso é, o respondente precisaria atingir
a pontuação máxima na escala para estar num relacionamento abusivo, ou bastaria atingir uma
pontuação mínima? Trata-se de um construto categórico ou contínuo? Uma das barreiras para
definir pontuações e parâmetros de normalidade em instrumentos é justamente a ausência de
uma definição clara e uniforme de relacionamento abusivo. Ou seja, quais características e a
frequência das mesmas devem ocorrer em um relacionamento para que este se configure como
abusivo.

3. PRESENTE ESTUDO

A falta de uma definição precisa e uniforme do que são relacionamentos abusivos


prejudica enormemente a prática de uma psicologia e demais saberes baseados em evidências.
A ausência de comunicação entre as pesquisas, dada a multiplicidade de definições e
nomenclaturas adotadas como sinônimos de relacionamentos abusivos, afeta na construção de
instrumentos para investigação de relacionamentos abusivos, tal como nas intervenções e
tratamentos escolhidos. Além disso, para que pesquisas futuras avancem na caracterização de
vítimas, abusadores, causas e consequências de relacionamentos abusivos, é imprescindível que
se tenha uma definição exata do que são estes relacionamentos. Com isso, o objetivo do presente
estudo foi investigar definições de relacionamentos abusivos na literatura a fim de se formular
uma definição integrada de relacionamentos abusivos.

4. MÉTODO

O presente estudo consistiu em uma revisão de literatura. Foi feita uma busca eletrônica
nas bases de dados Google Scholar, SciELO e PePSIC, utilizando as palavras-chaves
“relacionamento abusivo”. Foram adotados os critérios de inclusão: artigo no idioma Português,
publicado no período entre 2017 e 2021 e conter as palavras chaves no título. Foram
encontrados inicialmente 34 artigos (Google Scholar= 34; SciELO= 0; PePSIC= 0).

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Foram excluídos os artigos repetidos e aqueles que não apresentavam uma definição
sobre relacionamentos abusivos. Também não foram incluídos na análise monografias, teses,
dissertações, citações e trabalhos disponíveis apenas em anais de pesquisas. Dois trabalhos não
estavam disponíveis para acesso. Assim, foram selecionados dez trabalhos.

Os trabalhos selecionados foram analisados a partir dos seguintes parâmetros:


metodologia científica adotada, definição do conceito de relacionamento abusivo, se na
definição de relacionamento abusivo encontra-se menção de violência física e o tipo de vínculo
que existe entre os indivíduos em uma relação abusiva (ex: conjugal heterossexual, conjugal
homossexual, familiar ou outro).

5. RESULTADOS

Foram comparadas as definições de relacionamento abusivo dos dez trabalhos


analisados (Tabela 1). Também verificou-se a exigência da presença de violência física para
configurar tais relacionamentos e a metodologia adotada em cada artigo. Encontrou-se
definições distintas para os relacionamentos abusivos, mas que sempre perpassam o abuso e a
violência.

Tabela 1: Características dos Artigos e Definição de Relacionamentos Abusivos nos Artigos Revisados.

Para ser abusivo, deve


Ano Autor Metodologia Definição
haver violência física?
Relacionamentos em que há presença de violência
e abusos, marcados por discussões, chantagem e
insegurança. Se dá a partir do excesso de domínio
Marina Não necessariamente. Pode
Relato de sobre o outro. A vítima tem sofrimento, impacto na
2021 D’Agostini haver violência física e/ou
experiência vida social, perda da liberdade e espontaneidade
et al. psicológica.
em detrimento da imposição do parceiro. Uso
indevido, impróprio, excessivo ou incorreto de
alguém.
Raquel G. Não necessariamente. Pode
Abordagem O relacionamento abusivo é marcado por excesso
S. A. haver violência física,
2019 metodológica de poder. Se inicia de maneira mansa, manifestada
Fernandes psicológica, sexual,
descritiva em atitudes de controle.
et al. patrimonial ou moral.
Homens utilizam do seu poder para influenciar
Não necessariamente. Pode
Juliana M. Pesquisa as mulheres e usam da violência para
2018 haver violência física e/ou
Cruz et al. qualitativa dominação dentro dos
psicológica.
relacionamentos.
Presença de violência psicológica e emocional em
Amanda relações afetivas. Além disso, pode ocorrer Não necessariamente. Ênfase
Análise de
2019 Santos et violência física, ciúme, limitar autonomia, e dada a violência psicológica e
discurso
al. diminuir autoestima. Deve haver intimidade entre emocional.
vítima e agressor.
Mulheres são desqualificadas por seus
Descritivo-
companheiros e submetidas a agressões e Não necessariamente. Pode
Francisco interpretativo,
2021 violências físicas e/ou psicológicas em seu haver violência física,
V. da Silva prioritariamente
cotidiano, como, por exemplo, humilhações, psicológica e/ou sexual.
qualitativo
atitudes de interdição e controle.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Pesquisa
pesquisa
Gisele V. qualitativa- Relações marcadas por desequilíbrio de poder de Não necessariamente. Pode
2019 Leandro et quantitativa, um dos parceiros em detrimento do outro, controle haver qualquer tipo de
al. com exagerado e domínio de um parceiro sobre o outro. violência.
levantamento
de dados
Isadora E.
S. Ribeiro Não necessariamente. Os
e Gilmar Resenha de obra Relacionamentos amorosos marcados por ciclo de autores destacam, contudo, a
2018
A. Júnior violência e relações de poder. agressão como parte do ciclo
de violência.
Viviane S. Relacionamentos marcados por violência,
Revisão de Não necessariamente. A
Carvalho e dominação, manipulação, e desqualificação na
2022 bibliografia violência pode ser física,
Talita M. tentativa de controle do outro. Ênfase às relações
narrativa psicológica, financeira, etc.
M. Freitas familiares e á violência intrafamiliar.
Não necessariamente.
Camila D.
Destaca-se, além do abuso
M. Lopes e Análise do Relacionamento marcado por relações de poder,
2021 físico, o abuso emocional,
Ingrid P. Comportamento com a presença de reforço positivo e negativo.
psicológico, sexual,
Silva
financeiro ou patrimonial.
Déborah Relacionamentos destrutivos, inicialmente
Pesquisa Não necessariamente. Ênfase
2020 C. de S. idealizados pela influência do amor romântico e
bibliográfica dada a violência psicológica.
Silva et al. pela cultura do machismo e da violência.
Fonte: Autoria própria com dados da pesquisa (2023).

As definições também foram comparadas quanto ao tipo de relacionamento que pode


ser considerado abusivo (Figura 1). A maior parte dos artigos somente considera
relacionamento abusivo o relacionamento amoroso heterossexual, isso é, que se dá entre
homem e mulher, no qual geralmente o homem é o abusador e a mulher a vítima. No entanto,
um artigo contempla relacionamentos amorosos de qualquer configuração, e três artigos
assumem como relações abusivas outras relações além da relação amorosa, sendo que um artigo
inclui também relacionamentos familiares, e dois artigos incluem qualquer tipo de relação,
como amizades e relações de trabalho.

Figura 1: Gráfico de Tipo de Relacionamento Contemplado na Definição de Relacionamento Abusivo.

Fonte: Dados da pesquisa (2023).

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Foi feita uma nuvem de palavras (Figura 2) com as principais palavras usadas para
definir, descrever e explicar relacionamentos abusivos nos artigos selecionados. O tamanho das
palavras corresponde a frequência de citação das mesmas nos artigos. Além disso, as cores
utilizadas na nuvem correspondem às categorias de palavras. Foi feita uma análise qualitativa
agrupando as palavras em categorias mais abrangentes, nomeadamente: Atos de violência,
Características do relacionamento, Características do abusador, e Características da vítima
(Tabela 2).

Figura 2: Nuvem de palavras organizadas por frequência e categoria usadas para descrever e definir
relacionamentos abusivos.

Fonte: Autoria própria com dados da pesquisa (2023).


Nota: Palavras na cor rosa: categoria Atos de violência; Palavras na cor roxa: categoria Características do
relacionamento; Palavras na cor laranja: categoria Características do abusador; Palavras na cor verde: categoria
Características da vítima.

Tabela 2: Categorização de palavras usadas para definir relacionamentos abusivos.


Categoria Palavras Cor
Atos de violência violência, controle, dominação, feminicídio, manipulação, abuso, Rosa (#f92772)
agressividade, agressão, assédio, ciclo, humilhação, aprisionamento,
chantagem, checagem, coerção, descredibilidade, desqualificação,
imposição, isolamento, lesão, limitar, objetificação, ofensa, proibição,
seguir, vigilância, xingamento, desrespeito, dissimulação.
Características do brigas, discussão, desgaste, grito, silencioso, tóxico, jogo, intimidade, Roxo (#a581ff)
relacionamento poder.
Características do possessividade, ciúme, arrependimento, desconfiança, raiva, remorso, Laranja (#fd9720)
abusador drogas, indiferença, álcool.
Características da culpa, constrangimento, dependência, insegurança, medo, sofrimento, Verde (#a6e22a)
vítima adoecimento, ansiedade, danos, idealização, passividade, romantização,
vergonha.
Fonte: Autoria própria com dados da pesquisa (2023).

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
A violência e a dominação podem ser vistas na nuvem de palavras como palavras de
maior frequência de citação e, portanto, importância na configuração e caracterização de um
relacionamento como abusivo. Ademais, os atos de violência contemplando não somente a
violência física, as características do relacionamento marcadas por poder, jogos e conflitos, as
características do abusador como sujeito ciumento e raivoso, e as características da vítima como
indivíduo culpado, dependente, perpassado por fantasias e afetos negativos, caracterizam a
visão de relacionamentos abusivos nos artigos analisados.

6. CONCLUSÃO

O presente estudo procurou revisar na literatura as definições de relacionamentos


abusivos. A partir da análise de dez artigos, discute-se os principais elementos constituintes
destes relacionamentos.

As definições do construto apresentadas nos estudos encontrados não foram uniformes.


Destacando as semelhanças presentes nas definições, conclui-se que para ser considerado um
relacionamento abusivo, deve haver uma dinâmica de poder e domínio, exercida por meio da
violência. Assim, propõe-se a definição de relacionamentos abusivos como relacionamentos
marcados por dinâmicas de poder e domínio, exercidas por meio de algum tipo de violência.

A partir da síntese dos estudos encontrados, sugere-se que um relacionamento abusivo


pode ocorrer em qualquer tipo de relacionamento, não só em relacionamentos amorosos. Os
abusos também não são exclusivos de relacionamentos heterossexuais e as vítimas nem sempre
são do gênero feminino. Sendo assim, relacionamentos abusivos podem ocorrer em qualquer
relacionamento, sendo familiar, amizade, de trabalho, amoroso, etc; Quando relacionamento
amoroso, podem ocorrer em relacionamentos formados por quaisquer configurações relativas à
orientação sexual (eg.: homem-mulher, homem-homem, mulher-mulher); E tanto a vítima,
quanto o abusador do relacionamento podem ser de qualquer gênero.

Apesar da existência dessa pluralidade no que se refere ao tipo de relacionamento, com


base nos artigos estudados, foi possível observar características comuns dessas relações que
apontaram para dinâmicas abusivas. Assim, a categoria de Características do Relacionamento
dá ênfase em aspectos negativos de interação como “brigas, discussão, desgaste, grito”,
apontam para relações pautadas em posturas conflituosas e combativas. Já características como
“tóxico, jogo, poder” indicam a existência de dinâmicas relacionais pouco salutares, onde
comportamentos aparentemente menos belicosos também promovem vivências de insegurança,
instabilidade e violência.

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 37


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
De forma semelhante, observou-se que na maioria dos artigos a definição de
relacionamento abusivo estava relacionada à vivência de violência, caracterizando a categoria
mais prevalente e importante analisada neste estudo: os Atos de Violência. Muitos artigos
ressaltaram inclusive que essa violência não é necessariamente física, mas manifesta-se por
meio de manipulações, controle, e pelo exercício de poder entre o agressor e a vítima,
caracterizando-se como violência psicológica. A violência psicológica costuma ocorrer de
forma sutil ou subliminar, por meio de gestos, palavras e comportamentos que não deixam
marcas aparentes (MELLO, 2022).

Deste modo, notou-se uma preocupação dos autores em apontar não só os aspectos
relacionados a violência física, mas também a dinâmica psicológica encontrada na relação
abusiva. A violência psicológica tem se tornado cada vez mais objeto de estudo no campo das
ciências sociais, ganhando reconhecimento social e respaldo legal com a criação da Lei n.
14.188/2021, que tipifica como crime o dano emocional resultante da vivência dessa forma de
violência pelas mulheres (MELLO, 2022).

A segunda maior categoria de palavras e elementos que definem os relacionamentos


abusivos é a categoria Vítima. São palavras relacionadas a emoções e sentimentos (culpa,
constrangimento, insegurança, medo, vergonha, ansiedade), mecanismos cognitivos
(idealização, romantização) e indicativos de saúde ligados a prejuízo na vida como um todo
(sofrimento, adoecimento, danos, passividade, dependência). Nota-se que tais atributos dizem
respeito à vítima durante o relacionamento abusivo, e não aspectos da vítima que constituem
um perfil propenso a se envolver nestes relacionamentos. Ademais, grande parte dos estudos
destacaram a dificuldade da vítima de se perceber em um relacionamento abusivo, o que
impacta na construção e aplicação de instrumentos para avaliar e identificar relacionamentos
abusivos, assim como na procura por serviços de saúde para tratamento, por exemplo, de
traumas muitas vezes deixados nessas relações (SILVA, 2018).

Ressalta-se a maior importância e prevalência de palavras ligadas às características da


vítima em comparação com as características do abusador, a partir da comparação de categorias
criadas e analisadas neste estudo. A maior relevância dada, portanto, às características da
vítima, tem implicações nas diretrizes de tratamento e recuperação de pessoas que passaram
por tais relacionamentos. Isso é, o tratamento passa a ser mais direcionado à vítima, que, além
de se recuperar dos traumas deixados pelo relacionamento, precisa mudar suas escolhas de
parceiros românticos (SILVA, 2018), e não ao abusador, que precisaria mudar aspectos como
traços de personalidade, crenças centrais, resolução de conflitos e impulsividade, ou seja, deixar

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 38


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
de ser abusivo. Com isso, alerta-se para o risco de culpabilização da vítima de se submeter a tal
situação e manter-se num relacionamento abusivo e danoso (PEIXOTO; NOBRE, 2015;
SOMMACAL; TAGLIARI, 2017).

Setenta por cento dos artigos analisados destacaram a dificuldade da vítima em perceber
que está em um relacionamento abusivo (D’AGOSTINI et al., 2021; SANTOS et al., 2019;
CARVALHO; FREITAS, 2022; SILVA, 2021; SILVA et al., 2020; FERNANDES et al.,
2019). Por exemplo, Leandro et al. (2022) e Carvalho e Freitas (2022) destacam a forma quase
imperceptível que o relacionamento abusivo começa, modificando as configurações do
relacionamento de forma sutil. Ainda, comportamentos abusivos são muitas vezes naturalizados
ou romantizados (FERNANDES et al., 2019; SILVA et al., 2020), entendidos muitas vezes
como formas de cuidado. Tais dados alertam para um dos obstáculos que constituem a
dificuldade da vítima em romper o relacionamento e/ou procurar ajuda relativa a uma queixa
relacional. Destaca-se portanto a importância de amigos e familiares interferirem no
relacionamento e alertarem para o perigo da integridade física e mental da vítima. Além disso,
a falta de percepção sobre estar em um relacionamento abusivo também se constitui como uma
limitação para a construção de instrumentos de autorrelato para avaliação de abusos em
relacionamentos.

Em relação aos atributos do abusador, a categoria contém palavras ligadas a emoções e


sentimentos (raiva, remorso, arrependimento), ao uso de drogas (álcool, drogas) e a formas de
tratamento da vítima (possessividade, ciúme, desconfiança, indiferença). Apesar de ser comum
que parceiros que façam uso abusivo de substâncias, como álcool e outras drogas, apresentem
condutas agressivas e violentas (SILVA, 2014; SILVA, 2020), não é mandatório que esse
diagnóstico esteja presente para definir um relacionamento como abusivo. Ou seja, existem
relacionamentos abusivos nos quais não há uso de álcool e outras drogas por parte do abusador,
e apenas o uso abusivo de substâncias não caracteriza um relacionamento como abusivo. O
mesmo vale para a presença de ciúme. Sentir ciúmes pode ser um gatilho para o uso de violência
em relacionamentos (KYEGOMBE, 2022; PICHON et al., 2020), o que justifica a relação entre
tais conceitos, mas é o ato de violência que irá caracterizar o relacionamento como abusivo, e
não apenas o sentimento de ciúmes. Já os sentimentos de raiva, remorso e arrependimento, são
inerentes ao “ciclo da lua de mel” presente em tais relacionamentos (NORONHA; DOURADO,
2012) e, assim, são esperados como elementos constituintes destas relações.

No presente estudo, setenta por cento dos artigos descreveram os relacionamentos


abusivos a partir de uma perspectiva amorosa e heterossexual, por meio de uma dinâmica

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
conjugal. Assim, observou-se que na maioria dos artigos não há uma diferenciação entre
violência conjugal e relacionamento abusivo, sendo termos frequentemente utilizados como
sinônimos pelos autores. Em Falke et al. (2009, p. 86), as autoras apontam que a “violência
conjugal é evidenciada pela constituição da dinâmica de interação entre o casal que alimenta e
perpetua as características do vínculo violento”, forma similar como o relacionamento
abusivo é abordado pelos autores nos artigos analisados no presente estudo.

Contudo, apesar das similaridades entre esses dois conceitos, compreende-se que os
relacionamentos abusivos podem englobar as demais relações, não sendo exclusivamente
resultante de uma dinâmica conjugal. Ademais, apesar de muito relacionada, relacionamentos
abusivos também não podem ser compreendidos como sinônimo de violência contra a mulher,
porque o conceito engloba todo tipo de relacionamento e gênero, seja ele homoafetivo, familiar,
ou de demais configurações, onde nem sempre a vítima será uma mulher.

Ainda, entende-se que os relacionamentos abusivos também não estão restritos aos
casos de violência doméstica, pois apesar deste conceito considerar de forma mais ampla os
atos de violência que não se restringem somente às relações conjugais e contra as mulheres, se
limitam aos casos de violências que ocorrem no ambiente familiar. Segundo Diniz e Angelim
(2003, p. 22) exemplos de violência doméstica são “abuso sexual de crianças e adolescentes,
incesto, estupro conjugal, espancamento, abuso de idosos”. As autoras postulam que, diferente
de simples atos de violência que ocorrem no ambiente doméstico, ainda permeia um cenário
complexo onde a lealdade familiar impossibilita o rompimento desse ciclo de violência.

Portanto, destaca-se a importância de diferenciar o conceito de relacionamento abusivo


dos demais conceitos relacionados às práticas de violência, promovendo maior consciência
acerca desses fenômenos e de formas de intervenção. A partir da definição sugerida de
relacionamentos abusivos como relacionamentos marcados por dinâmicas de poder e domínio,
exercidas por meio de algum tipo de violência, enquadra-se a violência doméstica, a violência
conjugal, e a violência contra a mulher como tipos de relacionamentos abusivos. Sugere-se que
o uso do termo relacionamentos abusivos vise nomear relacionamentos marcados por dinâmicas
abusivas de modo abrangente e não-excludente a partir de suas especificidades.

Este estudo apresenta limitações. A definição de marcadores restritos para a presente


pesquisa de revisão limitou o alcance da mesma. Além disso, há limitações quanto aos próprios
artigos analisados. Ressalta-se que, no presente estudo, não foi analisado um grande volume de
artigos. Quando inseridos os critérios de pesquisa deste estudo, não foi encontrado um grande

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
número de pesquisas, o que sugere a necessidade de mais estudos sobre a temática de
relacionamentos abusivos em uma perspectiva científica. Ainda, nenhum dos artigos analisados
utilizou-se de método quantitativo ou de entrevistas qualitativas, ou seja, nenhum artigo
abordou participantes, para explorar representações sociais ou pessoas que tivessem passado
por relacionamentos abusivos, para a definição do construto. Todos os artigos contavam com
método não-experimental e nenhum realizou estudos longitudinais. Ademais, nenhum estudo
abordou relacionamentos abusivos em casais não-monogâmicos.

Estudos futuros devem superar as limitações deste, ampliando o método, a partir da


inclusão de novas palavras chaves e marcadores de pesquisa, para acessar um maior número de
artigos sobre essa temática. Também podem ser abordados estudos em outras línguas, além da
língua portuguesa. Além disso, sugere-se a estudos futuros que investiguem mais as
características do abusador, abordem relacionamentos abusivos em casais não monogâmicos e
outras configurações de relacionamentos amorosos, e acessem, por meio de entrevistas e
questionários, participantes para estudos experimentais e/ou empíricos para a definição e
validação do construto relacionamento abusivo.

O presente estudo trouxe avanços para a cientificidade do conceito de relacionamentos


abusivos e formulou uma definição uniforme para tal construto. Assim, procura-se facilitar a
identificação destes relacionamentos em contextos, como jurídico, psicologia e psiquiatria
clínica. O reconhecimento de um relacionamento abusivo em um paciente ou cliente auxilia em
um tratamento de saúde mais apurado, tal como na formulação de laudos e pareceres precisos.
Espera-se também, com este estudo, auxiliar na criação de instrumentos que investiguem a
presença de relacionamentos abusivos, sobretudo medidas indiretas, como testes de associação
implícita, e entrevistas que acessem amigos e familiares da vítima, dada a dificuldade de auto-
percepção de estar em um relacionamento assim. Por fim, reflete-se que “O amor não é cruel/
Nós somos cruéis/ O amor não é um jogo/ Fomos nós que fizemos um jogo do amor” (KAUR,
2017, p. 155).

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CAPÍTULO 4
O AUMENTO DO USO DE ANTIDEPRESSIVOS E ANSIOLÍTICOS PÓS
PANDEMIA E SEUS IMPACTOS

Ellen Oliveira Araújo


Gabriella Silva Ramos
Julia Silva Carrijo
Luan Mendes de Freitas
Mayara Beatriz Carvalho Gonçalves
Nayara Sílvia Santos
Janaina Jácome dos Santos

RESUMO
O presente trabalho buscou compreender como a pandemia da COVID-19 levou ao aumento do uso de
medicamentos como ansiolíticos e antidepressivos, os problemas do autodiagnóstico, os impactos que a
automedicação tem na vida dos sujeitos, além de descrever como ocorre o processo de mal uso, a fim de identificar
formas de reduzir a dependência e conscientizar a população sobre os riscos do uso inadequado e prolongado das
medicações. O trabalho se estrutura com a revisão bibliográfica e análise de dados coletados através de uma
pesquisa com profissionais médicos, psicólogos e farmacêuticas, que tem contato direto com esses pacientes. Com
a pesquisa realizada e o exame dos textos teóricos (ALVES, 2021), (FÁVERO, 2018) que embasaram o trabalho,
identificou-se que como esperado, houve o aumento do uso dos ansiolíticos e antidepressivos durante a pandemia
da COVID-19, como também o aumento pela busca solitária do autodiagnóstico, o despreparo das equipes que
atendem os pacientes em tratamentos de quadros ansiosos e depressivos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), e
ainda ressalta a importância de se manter o acompanhamento médico tal como o acompanhamento psicológico
dos sujeitos acometidos por esses transtornos e assim garantir que o uso de medicamentos controlados seja
acompanhado mais de perto e que não ultrapasse o tempo extremamente necessário para tratar os sintomas e, evitar
abusos e dependência.

PALAVRAS-CHAVE: Medicalização. Ansiolíticos. Antidepressivos. Pandemia. COVID-19.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho aborda uma questão atual na recém realidade pós pandêmica, que
aponta indícios de um possível aumento no uso de ansiolíticos e antidepressivos. Devido a
pandemia pelo COVID-19, mudanças drásticas e repentinas se fizeram presentes na vida de
milhões de pessoas no mundo e no Brasil não foi diferente, e muitos viram nos medicamentos
uma forma de lidar com essa fase.

As doenças mentais mais frequentes são a depressão e os transtornos de ansiedade,


atingindo 10-15% da população mundial, considerando a estimativa de que 350 milhões de
pessoas no mundo sofram com a depressão (PREVEDELLO, 2017, apud PIGA, 2021). Os
antidepressivos e ansiolíticos, muito utilizados no tratamento desses transtornos, são uma busca
frequente de muitas pessoas, diagnosticadas ou não.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Os medicamentos psicotrópicos atuam no Sistema Nervoso Central e podem ser
classificados nas categorias ansiolíticos-sedativos, antidepressivos, estabilizadores do humor e
antipsicóticos ou neurolépticos, atuando no controle da ansiedade com efeitos sobre as
emoções, o humor e o comportamento (FIGUEIREDO, 2015, apud FÁVERO et al., 2017).O
principal representante são os benzodiazepínicos, um dos mais prescritos atualmente, como
Diazepam, Clonazepam, Alprazolam e Midazolan (CARVALHO et al., 2016, apud FÁVERO
et al., 2017).

Tendo em vista as definições dos medicamentos psicotrópicos, ao decorrer do trabalho


será abordado tópicos que buscam compreender de que forma os efeitos da pandemia levaram
ao aumento do uso desses fármacos, identificar os problemas do autodiagnóstico, mal uso e
dependência, e como reduzi-los. A fim de demonstrar de forma empírica o estudo dos autores
citados, foi realizada uma pesquisa que consiste no envio de um questionário para psiquiatras,
psicólogos e farmacêuticos com questões que remetem ao aumento do uso desses
medicamentos. Desse modo, a importância deste estudo está em compreender os impactos do
aumento no uso de psicotrópicos e promover a busca por formas de minimizá-los.

2. A PANDEMIA E A MEDICALIZAÇÃO

A pandemia da COVID-19 trouxe prejuízos reais à vida das pessoas, como a perda de
familiares e amigos, o risco eminente de morte, o desemprego, as medidas sanitárias para evitar
o contágio e transmissão da doença, que incluíam o uso de máscaras e distanciamento social,
além da passagem de algumas empresas para o home office e das escolas para o ensino remoto.
Todas essas mudanças bruscas afetaram a saúde mental e o comportamento dos indivíduos, que
encontraram nas medicações, como antidepressivos e ansiolíticos, certo alívio e condições
psíquicas para enfrentar o momento. Com isso, algumas pesquisas buscam entender os impactos
que essas medicações têm provocado na vida dos indivíduos, e já se pode observar alguns dados
estatísticos a respeito do tema.

Segundo relatado por Melo et al. (2022), foi realizado um estudo transversal via redes
sociais que contou com a participação de 349 pessoas, com idade entre 18 e 35 anos. Todos
responderam a um questionário sociodemográfico e a perguntas sobre o uso de antidepressivos
e ansiolíticos, nos resultados, obtiveram os seguintes dados: 71 pessoas (20,3%) faziam uso de
antidepressivos e/ou ansiolíticos durante a pandemia. Destes, 20,5% faziam uso de ansiolíticos,
31,8% de antidepressivos e 28,4% de ambos concomitantemente. Os medicamentos mais

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
relatados foram clonazepam na classe de ansiolíticos e a fluoxetina na classe de antidepressivos
(MELO, 2022).

Com a análise de Alves (2022), observa-se que momentos estressores são


desencadeantes ou agravantes dos transtornos mentais, e em consequência disso ocorre muitas
vezes o abuso de álcool, cigarro, medicamentos e drogas ilícitas. Especialmente nos últimos
dois anos, com tantas perdas, é possível entender a importância de se falar sobre o consumo,
uso e abuso desses medicamentos durante a pandemia, assim como os fatores críticos para o
aumento da medicalização associada ao uso de psicofármacos (ALVES, 2022).

De acordo com Ribeiro et al. (2020) os problemas psicológicos são realidades


recorrentes da pandemia. Para Carvalho (2021) o cenário provocou um aumento do consumo
de ansiolíticos e antidepressivos, e os estudos apontados revelam que houve prolongamento de
crises de ansiedade, suicídio e depressão.

Segue abaixo o quadro com os dados de um levantamento feito pela Consulta Remédio
e publicado pela revista Medicina S/A:

Figura 1: Buscas comparativas antes e durante a pandemia no período de – 08/20 a 02/21 em relação ao ano
anterior (08/19 a 02/20), seis meses antes de iniciar a pandemia.

Fonte: Medicina/AS (2021).


Os dados apresentados mencionam a comparação de antes e durante a pandemia no
período de 08/20 a 02/21 em relação ao ano anterior (08/19 a 02/20), seis meses antes de iniciar
a pandemia, demonstram a notória elevação no consumo após a chegada da COVID-19 no
Brasil. Esse aumento pode estar justamente relacionado com os acontecimentos cada vez mais
frequentes de ansiedade e depressão no país, diante do isolamento e distanciamento social, por
conta das medidas preventivas contra a contaminação, além das incertezas de futuro provocadas
pela pandemia.

Segundo dados Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC)


da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), relatados no portal de notícias R7, entre

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 48


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
1º de janeiro de 2014 e 31 de dezembro de 2021 o Brasil comprou 345,5 mil caixas de cinco
dos ansiolíticos (benzodiazepínicos) mais vendidos: Alprazolam (Frontal), Bromazepam
(Lexotan), Clonazepam (Rivotril), Diazepam (Valium) E Lorazepam (Lorax). Em 2020,
primeiro ano da pandemia de Covid-19, as vendas desses cinco princípios ativos somaram 47,3
milhões, uma alta de 4,26% em relação ao ano anterior.

Ao analisar esses dados, é possível perceber que houve um considerável aumento do


uso de antidepressivos e ansiolíticos com a pandemia. Dessa forma, é importante entender como
o autodiagnóstico, tão frequente entre as pessoas, impacta nesses índices.

3. A MEDICALIZAÇÃO E O AUTODIAGNÓSTICO

Vasconcelos et al. (2009) traz a ideia de que, com a evolução das tecnologias, vários
sites especializados em autodiagnóstico surgiram na internet. Ele ainda diz que é perceptível
como os consumidores em saúde tendem à solidão e à busca solitária de informações a respeito
de como estão. Tudo isso pode fazer com que as pessoas fiquem perdidas em meio a tantos
aconselhamentos, que por vezes não são reais ou são alarmistas.

Melo et al. (2021) citando Garcia LP, Duarte E. (2020), relata sobre o conceito de
“infodemia”, termo que tem por significado o excesso de informações, nem sempre verdadeiras,
que ocorrem em resposta a situações graves como, por exemplo, a pandemia. Com isso, Melo
et al. (2021) comentam que o resultado desse estímulo e exposição a esse tipo de informações
pode ser um impulso tanto coletivo como individual a um autodiagnóstico, que leva ao uso,
sem comprovação médica/científica, de medicamentos. Vale ressaltar a fala de Domingos et al.
(2017), que no Brasil ocorreu uma avalanche de informações, medo e incertezas contribuindo
para a busca irracional nas farmácias.

De acordo com artigo publicado pela Organização Mundial da Saúde (1998) conceitua-
se a auto medicalização como sendo a seleção de medicamentos para tratar doenças
autodiagnosticadas ou sintomas. Segundo Domingos et al. (2017), os remédios são parte
importante para tratamento de doenças e melhora na qualidade de vida dos indivíduos. Porém,
o uso desses medicamentos de modo irresponsável e sem uma orientação médica pode trazer
prejuízos para a saúde. Esses autores também alertam que em decorrência da auto
medicalização foi gerado um aumento nas vendas de medicamentos, assim como crescem
também as anomalias derivadas, como resistência bacteriana e outras reações adversas.

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 49


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Por fim, conforme artigo publicado pela Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da
Saúde (2012), a auto medicalização (problema muitas vezes gerado pelo autodiagnóstico) pode
acarretar uma série de problemas como agravamento de doenças preexistentes.

Caso seja feita uma combinação errada entre medicamentos, pode-se gerar
consequências, tendo como exemplo reações alérgicas, dependência de medicamentos e até a
morte. Importante destacar que todos os remédios possuem efeitos colaterais. Tendo isso em
mente, aquilo que se imagina ser a solução, pode se tornar um grave problema. Vale ressaltar
que somente médicos podem diagnosticar doenças e indicar tratamentos e/ou medicações.

Um estudo realizado em Curitiba (Paraná) e citado por Alves et al. (2021), em 2017,
constatou que 84,4% das indicações de uso de psicofármacos, em especial os ansiolíticos, foram
realizadas por médicos, principalmente clínicos gerais (47%), psiquiatras (25%) e neurologistas
(15,6%). Os entrevistados que tinham recebido o medicamento de conhecidos somavam 25%,
e 15,6% disseram ter usado sem prescrição. Algumas das queixas que levaram ao uso foram a
insônia (62,5%), depressão (53,1%) e ansiedade (43,8%), embora alguns dos entrevistados
tivessem usado sem acompanhamento profissional e possivelmente sem terem diagnóstico. O
tempo de uso ultrapassava um ano em 68,7%, sendo que 30% relataram tentativa de parar com
o uso. Como justificativa, relataram a volta das queixas, como nervosismo e insônia.

Tendo em vista o atual problema do autodiagnóstico e uso incorreto dessas medicações


controladas, convém entender como se caracteriza a dependência medicamentosa e buscar
possíveis intervenções.

4. DEPENDÊNCIA MEDICAMENTOSA E POSSÍVEIS INTERVENÇÕES

Para o psiquiatra Guido Boabaid May (2022), do corpo clínico do Hospital Israelita
Albert Einstein, em entrevista relatada pelo portal de notícias R7, é possível que muitos
brasileiros que usam esses medicamentos não necessitem deles ou estejam fazendo mal uso, e
também ressalta que a maioria dessas pessoas usam sem acompanhamento psiquiátrico. May
(2022) ressalta ainda que os benzodiazepínicos causam tolerância e possível abuso e
dependência, e por isso não são todos os indivíduos que podem usá-los, como aqueles que
possuem histórico de abuso de substâncias e com alguns tipos de transtorno.

Segundo a Clínica Jequitibá (2020) o abuso de substância é caracterizado pelo uso


incorreto da medicação e em excesso, chegando assim, em algum momento, ao ponto de a falta
dessa substância causar abstinência. Por mais que o vício possa estar relacionado às drogas

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
ilícitas, esquece-se que o vício em drogas lícitas como os medicamentos causa danos parecidos
a estes usuários.

A abstinência surge pela interrupção das medicações após 5 a 10 dias, o que causa
impacto na vida social do indivíduo por seus sintomas como a irritabilidade, estresse, insônia,
à sudoração (transpiração excessiva), agitação, náusea, dores no corpo a até mesmo às
convulsões, lembrado que cada organismo reage de uma maneira diferentes, então esses
sintomas não são padronizados; o recomendado é que essa retirada de medicação seja gradual,
com orientação e acompanhamento médico por volta de 8 meses (CARLINI et al., 2001).

De acordo com estudo realizado por Orlandi e Noto (2005), citado por Higa (2018), essa
dependência está ligada a diversos fatores: médicos, como a indicação inadequada da
medicação, falha na orientação e manutenção da prescrição sem um planejamento prévio do
tempo de tratamento; e do usuário, com o uso inadequado da medicação, aumento da dosagem
por iniciativa própria, uso de artimanhas para conseguir o receituário e a não realização do
acompanhamento psicológico.

Dessa forma, ao se considerar os efeitos prejudiciais que o uso inadequado das


medicações psicotrópicas pode provocar no indivíduo, é imprescindível que estratégias sejam
pensadas para reduzi-lo. “Há a necessidade de garantir acesso a essas medicações, mas de
acordo com protocolos de tratamentos previamente aprovados a serem empregados por
profissionais treinados nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) (ROCHA; WERLANG, 2012,
apud TÁVORA, 2018, p.10).

Conforme relatado em pesquisa de Távora (2018) na UBS São Francisco de Pedra


Branca (São Paulo), notou-se a prevalência de pacientes que iam à unidade para renovar a
receita dos medicamentos psicotrópicos sem acompanhamento adequado. Como intervenção a
esse problema, foi proposto a revisão de prontuários e consultas individuais quando o paciente
procurasse a UBS para renovação da medicação, sendo feita também uma busca ativa desses
pacientes pelos agentes de saúde. Távora (2018) também relata que nessas consultas
individuais, além de avaliar o uso da medicação também é estimulado o desmame
medicamentoso, quando necessário. O autor reforça que todos os profissionais envolvidos no
atendimento devem estar aptos a realizar o acolhimento do paciente.

Além da renovação dos receituários de psicotrópicos sem a devida avaliação do paciente


pelo médico, a falta de acompanhamento psicológico também é um grande fator que pode levar

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
ao abuso desses medicamentos, tendo em vista a importância da ação conjunta do tratamento
medicamentoso e psicológico.

Em projeto de intervenção realizado por Higa (2018) no Centro de Saúde Paranapanema


em São Paulo, notou-se alto índice de dependentes em antidepressivos e benzodiazepínicos.
Dentre as estratégias pensadas, destacam-se o matriciamento de profissionais da Estratégia de
Saúde da Família (ESF) para realização de prescrições mais adequadas e a criação de grupos
de saúde mental que estabeleçam um trabalho conjunto que envolva tanto o tratamento
medicamentoso quanto psicossocial. Além disso, também buscou-se fazer a reavaliação pelos
profissionais e garantir o retorno dos pacientes de Saúde Mental para o acompanhamento.

Por fim, é importante que haja uma conscientização acerca do uso de ansiolíticos e
antidepressivos pela população. Conforme proposto por Higa (2018) no projeto de intervenção,
os pacientes devem compreender seu adoecimento mental, o porquê do uso do medicamento,
seus efeitos e, principalmente, precisam estar conscientes de que o tratamento não é feito apenas
ingerindo os medicamentos, mas também através do acompanhamento psicológico adequado.

Desse modo, após a obtenção de dados de diversos autores sobre a temática, é


importante analisar o estudo prático realizado com profissionais que possuem contato direto
com os pacientes, seja na venda desses medicamentos ou na entrega de receitas e atendimento
psicológico. Busca-se assim, relacionar os resultados obtidos pela pesquisa e os estudos
realizados pelos autores referenciados.

5. AMOSTRA E DISCUSSÕES: RESULTADOS DA PESQUISA

A pesquisa foi aplicada via google forms e contou com a participação de seis
profissionais, incluindo psicólogos, psiquiatras e farmacêuticos. Todos eles possuem entre oito
e vinte anos de experiência em suas respectivas áreas e foram escolhidos devido a suas áreas de
atuação na saúde. As perguntas realizadas se relacionam com as questões tratadas no referencial
teórico, sendo relacionadas principalmente às causas e impactos da medicalização. Consistem:

1. Percebeu aumento na procura por antidepressivos e ansiolíticos após a pandemia?

2. Qual das duas classes de medicamentos notou maior procura?

3. Qual público mais consome esses medicamentos?

4. Qual a faixa etária das pessoas que mais buscam esses medicamentos?

5. Sobre o aumento da procura após a pandemia: Caso souber, informar os medicamentos


mais usados.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
6. Em sua prática, você notou os seguintes problemas: automedicação, dependência, mau
uso, abuso, uso inadequado, não sei informar ou não notei, no que se refere à medicalização de
antidepressivos ou ansiolíticos?

7. Caso tenha identificado dependência, mal uso ou abuso, indique os medicamentos mais
recorrentes e explique.

8. Quais os principais diagnósticos dos pacientes que fazem uso de ansiolíticos e de


antidepressivos?

9. De acordo com as vivências em sua área de atuação, quais as queixas que mais incitaram
o aumento da procura por antidepressivos e ansiolíticos após o surgimento da pandemia?

10. Você notou ou o paciente relatou impactos dessa medicalização na vida pessoal e
profissional?

11. Na sua opinião, de que formas é possível reduzir essa dependência em


antidepressivos ou ansiolíticos?

Os resultados da pesquisa realizada apontam que de fato houve um aumento na procura


por antidepressivos e ansiolíticos após a pandemia, cujos dados confirmam a pesquisa realizada
por Carvalho (2021) que citou esse crescimento na procura por medicamentos psicotrópicos
perante a situação que as pessoas viveram por conta do COVID-19.

Figura 2: Percebeu aumento na procura por antidepressivos e ansiolíticos após a pandemia?.

Fonte: Autoria própria (2022).

Ao serem perguntados sobre as causas que motivaram o uso desses fármacos, os


entrevistados concordaram que houve grande influência da pandemia, como o medo de se
infectar, a solidão, a morte dos familiares, ansiedade, insegurança, aflição pela falta de

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perspectiva ao futuro e os sintomas psiquiátricos pós pandemia. Dessa forma, compreende-se
que essas mudanças repentinas afetaram de forma significativa a vida das pessoas, causando
desafios e angústias que ocasionaram em uma maior busca pelo uso de ansiolíticos para uma
melhor qualidade de vida.

Segundo 66,7 % dos entrevistados, a classe de medicamentos que teve uma maior
procura por parte dos consumidores nesse período pós pandemia foram os antidepressivos. Já
16,7% disseram que a alta do consumo foi de ansiolíticos, enquanto os outros 16,7% afirmaram
que a busca desses medicamentos ocorreu da mesma forma, havendo um nivelamento entre
eles.

Figura 3: Qual das duas classes de medicamentos notou maior procura?.

Fonte: Autoria própria (2022).

Segue os dados obtidos das perguntas relacionadas à faixa etária e gênero mais
observados nos pacientes.

Figura 4: Qual a faixa etária das pessoas que mais buscam esses medicamentos?.

Fonte: Autoria própria (2022).

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Figura 5: Qual público mais consome esses medicamentos?.

Fonte: Autoria própria (2022).

Ao questionar o sexo e faixa etária das pessoas que mais buscaram adquirir e consumir
essas medicações, 100% dos participantes da pesquisa responderam que os maiores
consumidores desses remédios são mulheres que possuem entre 32 e 45 anos de idade.

Sobre o aumento da procura de medicações após a pandemia, questionou-se quais


remédios foram mais procurados e vendidos. Como resultado, entre os mais procurados estão
os citados por Melo et al. (2022): Fluoxetina e Clonazepam. Além desses, os entrevistados
apontaram outros medicamentos, como: Rivotril, Zolpiden, Sertralina, Pregabalina, ISRS,
IRSN, Escitalopran e Citalopram.

Em relação aos possíveis problemas provocados pela medicalização, as respostas


destinadas a ‘dependência’ foram de 66,7%, sendo que 33,3% responderam ‘mal uso’.

Figura 6: Em sua prática, você notou os seguintes problemas no que se refere à medicalização de
antidepressivos ou ansiolíticos?.

Fonte: Autoria própria (2022).

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Quando questionado sobre os medicamentos mais recorrentes no caso de identificação
de dependência, mal uso ou abuso, a resposta mais colocada foi benzodiazepínicos como
Clonazepam, Diazepam e também Zolpidem.

Nota-se que são remédios utilizados para insônia e efeito calmante, o que leva à
necessidade de utilizá-los para regular o sono, como o Zolpidem, um medicamento bastante
ressaltado em uma das respostas: ‘Muitas pessoas relataram dependência dele para conseguir
dormir!’. Percebe-se que essas pessoas não conseguem dormir à noite sem o uso da medicação,
e isso se reflete no proposto pela Clínica Jequitibá (2020), em que o abuso de substância se
manifesta pelo uso incorreto da medicação, chegando assim ao ponto de a falta da substância
causar abstinência.

Quando perguntados sobre os principais diagnósticos dos pacientes que fazem o uso de
antidepressivos e ansiolíticos, foram confirmadas as expectativas, tendo em mente, que as
doenças mentais mais frequentes são depressão e os transtornos de ansiedade (PREVEDELLO,
2017, apud PIGA. 2021), algo amplamente relatado pelos entrevistados, acrescentando a isso,
síndrome do pânico e dores crônicas.

Também foi questionado se os profissionais notaram ou ouviram relatos dos pacientes


sobre os efeitos provocados pela medicalização. Dos quatro entrevistados, foram obtidas três
respostas afirmativas. Dentre as respostas, está o estado de apatia, esquecimento, confusão,
perda de memória e os efeitos colaterais já previstos por certos medicamentos.

Tendo em vista esses impactos, muitas vezes decorrentes do mal uso dos psicotrópicos,
também foi questionado sobre as possíveis alternativas para reduzir essa dependência. Uma das
respostas foi “profissionais mais capacitados para saber orientar o paciente”, o que condiz com
os estudos de que a dependência está ligada a fatores médicos como a indicação inadequada da
medicação, falha na orientação e manutenção da prescrição sem um planejamento prévio do
tempo de tratamento (ORLANDI; NOTO, 2005, apud HIGA, 2018).

Os outros entrevistados concordaram que a principal forma de reduzir o risco de


dependência é fazendo o acompanhamento psicológico, e não somente o tratamento
medicamentoso, que deve ser seguido corretamente pelas orientações do médico. Isso se revela
na pesquisa de Távora (2018) na UBS São Francisco de Pedra Branca, em que se notou a
prevalência de pacientes que iam à unidade para renovar a receita dos medicamentos
psicotrópicos sem acompanhamento adequado.

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Por fim, foi colocado que o desmame deve ser feito com acompanhamento médico
sempre que possível, assim como a realização de práticas como o exercício físico regular,
atividades de lazer e alimentação adequada. Dessa forma, fica evidente os riscos do uso
inadequado dos psicotrópicos e a necessidade de seguir corretamente a orientação médica,
assim como a importância do acompanhamento psicológico.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho teve por objetivo compreender como ocorreu o aumento do uso de


ansiolíticos e antidepressivos, assim como seus impactos. Os objetivos levantados, portanto,
foram respondidos, visto que os estudos citados no referencial teórico e os resultados da
pesquisa evidenciaram que o aumento de fato ocorreu, revelando uma série de questões
relevantes sobre o tema.

Entendeu-se que a pandemia pelo COVID-19 trouxe uma série de consequências que
afetaram a saúde mental das pessoas, o que acarretou na busca pela medicalização. Também se
revelou que este uso, quando realizado de forma incorreta, pode levar ao abuso de
medicamentos e uma possível dependência. Além disso, através dos estudos foi possível
concluir que o desmame deve ser incentivado nos casos em que for possível, e que o
acompanhamento psicológico é de suma importância para o tratamento efetivo dos pacientes,
realizado juntamente com o uso de medicamentos indicados pelo médico.

Dentre os desafios observados na construção do referencial teórico está a escassez de


artigos publicados sobre o tema, já que é um assunto recente trazido pela pandemia. Em relação
aos resultados obtidos através do formulário enviado para os profissionais da saúde que fizeram
parte da pesquisa, também se observou algumas dificuldades. As respostas abertas foram bem
sucintas, provavelmente por ser um assunto novo que ainda traz muitos questionamentos e que
pode ter provocado certo receio nos entrevistados, por medo de generalizar o perfil dos
pacientes que procuraram os psicotrópicos.

Dessa forma, a importância do trabalho está em propiciar a reflexão e debate sobre o


tema com o auxílio dos estudos dos autores e dos resultados da pesquisa que foram
apresentados, tendo em vista que a pandemia é um tema recente que ainda resulta em muitos
estudos e questionamentos sobre seus impactos na saúde mental das pessoas.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
DOI 10.47402/ed.ep.c2311305289

CAPÍTULO 5
MODOS DE CONSUMO:
A INFLUÊNCIA DA INDÚSTRIA CULTURAL NA CONSTRUÇÃO DA
IDENTIDADE DO JOVEM

Thiago Frederik Mendes Batista


Jaciany Soares Serafim

RESUMO
Os fenômenos midiáticos contribuíram para modificar a relação estabelecida entre o homem e o mundo. A
identidade deste cenário está marcada pela Indústria Cultural do consumo que provê o que se consome seja
simbólico ou materialmente, bem como a maneira de lidar com o não consumo, tendo em vista as vicissitudes que
abarcam o social. A juventude em situação de vulnerabilidade social vivencia a experiência do consumo em
processos que acentuam a relação com o mundo do trabalho para consumir. Objetivo: Analisar a construção da
identidade do jovem influenciada pela Indústria Cultural. Metodologia: Estudo de abordagem qualitativa, com
pesquisa de campo de corte transversal. Os dados foram coletados por meio de entrevista semiestruturada e
interpretados pela análise de conteúdo. A amostra foi constituída por 06 jovens estudantes da Educação para Jovens
e Adultos (EJA), de uma escola pública da cidade de Montes Claros - MG. Resultados: Foi possível se criar as
categorias de análise ‘Mídias sociais e suas utilizações’: Identificação das mídias utilizadas e seus modos de uso,
os quais compreendem o aparelho celular, internet e televisão; ‘As motivações e as viabilidades do consumo’: se
pautam na baixa renda e restrição financeira; ‘Consumo e sua relação com a identidade’: identidade de trabalhador
como via de acesso ao consumo. Considerações finais: Os resultados encontrados contribuíram para um
aprofundamento nos estudos sobre a Indústria Cultural e a massificação do consumo pela via dos veículos de
comunicação e sua conexão com a identidade dos jovens. Igualmente, pensar como em uma sociedade capitalista
os jovens constroem suas identidades com base nos modos de consumo.

PALAVRAS-CHAVE: Indústria Cultural. Identidade. Juventude.

1. INTRODUÇÃO

Com a ascensão dos meios de comunicação, as relações de produção e consumo


passaram a transcorrer as vivências coletivas e individuais, moldando assim, as identidades e
as configurações sociais. As mídias por sua vez, trataram de modificar a relação estabelecida
entre aquilo que se deseja com o que se consome, bem como a maneira de lidar com o não
consumo, tendo em vista a vulnerabilidade social (SANTOS; BRAMBILLA, 2017). A partir
disso o consumo se aferra ao conceito de Indústria Cultural, se materializando sobretudo na
publicidade e sustentando um caráter fundamental do capitalismo (ADORNO;
HORKHEIMER, 1985).

Conceitua-se Indústria Cultural pela produção em larga escala de bens culturais e


artísticos para fins de comercialização para as massas, que por sua vez, se tornam objeto dessa
indústria, fomentando a perpetuação do consumo e status quo capitalista, como escrito na obra
Indústria Cultural do ano de 1986 (RIBEIRO; ABECHE, 2013). Assim, o consumo se coloca
socialmente como um comportamento cultural e social constitutivo da formação subjetiva do

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indivíduo e do grupo social ao qual pertence. Tomados pela ideologia consumista, difundida
pelas mídias, o indivíduo cria identificações e constrói identidades através do reconhecimento
social e dos pares (CASTRO, 2014).

Por meio das escolhas que fazemos sobre como organizar e preencher o espaço onde
vivemos, como nos vestimos, os lugares que frequentamos, as comidas que elegemos
e as que rejeitamos, dentre outras escolhas, criamos significados e alimentamos
circuitos simbólicos. Sendo assim, nossas práticas de consumo vão muito além do
aspecto material, pois o que comunicamos se torna simbólico, representativo de um
estilo de vida, uma maneira de ser e de agir (CASTRO, 2014, p. 61).
Se por um lado o consumo contribui na construção de uma identidade social e cultural
através da identificação, por outro é preocupante, já que nem sempre é possível se consumir,
tendo em vista os empecilhos inerentes às classes socialmente e economicamente minoritárias;
fruto da categoria dialética inclusão/exclusão.

É, sobretudo, nas periferias das grandes cidades de baixa renda e maior dificuldade
econômica que se concentram os jovens que compõem uma das parcelas da população brasileira
em maior situação de vulnerabilidade 3. Como dispositivos desta Indústria Cultural, os veículos
de comunicação de massa, tais como a televisão, o cinema, o rádio, revistas, jornais e a internet,
objetivam a atração máxima de compradores dos produtos ali veiculados (THIAGO; RUSSO;
JUNIOR, 2016).

A perspectiva de uma constituição da subjetividade humana formada a partir de um


contexto social e histórico é a grande referência para que se pense nas relações de
interdependência e identificações (RIBEIRO; ABECHE, 2013). A partir das considerações
supracitadas, é relevante levantar o questionamento a respeito do consumo de modo geral, como
fator constituinte do processo identificatório coletivo e individual, de jovens, sobretudo aqueles
pertencentes a contextos de vulnerabilidade social e vítimas de movimentos excludentes da
Indústria Cultural. Diante do exposto, surgiu o questionamento: A Indústria Cultural influencia
na construção da identidade de jovens em situação de vulnerabilidade social? O objetivo desta
pesquisa foi o de analisar a construção da identidade do jovem influenciada pela Indústria
Cultural.

3
O conceito de vulnerabilidade é explorado por duas categorias distintas podendo ser compreendida
primeiramente pela integração à exclusão no que concerte a atividade laboral e da inserção ao isolamento na
ordem da sociabilidade básica. Dessa forma, a vulnerabilidade reside no fato de que o trabalho se torna
insuficiente diante do que se pode perceber de fragilidades inerentes às posições sócio econômicas desfavorecidas
(CARINHANHA; PENNA; OLIVEIRA, 2014).

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2. MATERIAIS E MÉTODOS

Tratou-se de um estudo de abordagem qualitativa, com pesquisa de campo e de corte


transversal, com Análise do Conteúdo de Bardim, empregando-se uma entrevista
semiestruturada com 17 questões abertas, construída pelos pesquisadores. O projeto foi
encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Associação Educativa do Brasil onde
aprovado previamente para a realização do estudo, com o CAAE 86332517.0.0000.5141 na
data de 27/03/2018.

A amostra foi constituída por saturação composta por 06 jovens (05 homens e 01
mulher) estudantes na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) com idade entre 18
a 27 anos, de uma escola pública na cidade de Montes Claros – MG. Nesta pesquisa,
compreendeu-se que os participantes possuíram similaridades nas respostas, uma vez que a
amostra apresenta a faixa etária, local de moradia e vulnerabilidades similares.

A coleta dos dados foi realizada durante o mês de julho de 2018, aplicada pelos próprios
investigadores, com aproximadamente 40 minutos de duração, em local seguro e sigiloso. As
entrevistas foram gravadas em aparelho celular da marca LG e desgravadas após a transcrição.
Os participantes foram informados do procedimento através da leitura, explicação e assinatura
do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

O presente estudo preconizou a Resolução 466/12 da Comissão Nacional de Ética em


Pesquisa - CONEP. Os riscos foram considerados mínimos, considerando o constrangimento
dos participantes pelo cunho das perguntas. Assim sendo, prevendo esse risco e pensando na
possibilidade de evitá-lo, foi esclarecido o real objetivo dessa pesquisa, bem como da entrevista,
como modo de amenizar eventuais riscos, com possível desistência em qualquer momento.

3. RESULTADOS

A partir da interpretação dos dados foi possível construir as seguintes categorias:

I. Mídias sociais e suas utilizações: Identificação das mídias utilizadas pelos jovens e seus
modos de uso, os quais compreendem o aparelho celular, internet e televisão;

II. As motivações e as viabilidades do consumo: As motivações e impossibilidades de


consumo e o que se consome se justificam na baixa renda e restrição financeira;

III. Consumo e sua relação com a identidade: A identidade de trabalhador como via de
acesso ao consumo.

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3.1 Mídias sociais e suas utilizações

Os jovens demonstraram conhecimento sobre as mídias sociais que se distancia do


conceito da palavra mídia enquanto um veículo de comunicação para vender bens de consumo.
Mídia foi associada a um status quo ocupado por celebridades, possuindo um sentido de um
espaço virtual, que durante um período de tempo, produz “pessoas famosas”. Em sua maioria
relataram ter acesso à mídia (a esse status) através do aparelho celular, internet e televisão, no
entanto, há ainda aqueles que dizem não ter esse acesso.

Esta concepção de mídia como um lugar ocupado por celebridades e foco de atenção se
apresenta como fato de interlocução com a sociedade do espetáculo, considerada como a forma
mais contemporânea da indústria cultural. Sociedade do espetáculo pode ser compreendida
como mecanismo de supervalorização da imagem em detrimento do discurso (KEHL, 2015).
Este lugar ocupado por celebridades é difundido pela televisão; veículo eleito pelos
adolescentes como meio de comunicação mais utilizado entre eles, o que corrobora a afirmação
de que “a televisão é a mais espetacular tradução da indústria cultural” (KEHL, 2015).

Outras mídias tais como o cinema, jornal impresso, rádio, revistas não foram
mencionadas. O não uso do jornal impresso ilustra o quadro de um país onde 27% da sua
população é composta por analfabetos funcionais (LEITE; MARTINS; PINHEIRO, 2018).
Neste cenário, o uso exacerbado dos veículos de comunicação digitais como a televisão e a
internet, em detrimento do jornal impresso parece refletir o imediatismo das relações sociais
atuais agravadas pela mídia, bem como uma reformulação das noções de tempo e espaço
(SOUSA; MORAIS; PRIOR, 2015). Estas relações e novos modos de consumo são
responsáveis pela produção de uma sociedade hedonista onde o hiperconsumo fomenta a
satisfação imediata das necessidades (VIEIRA; MARTINS; BRUGNEROTTO, 2018). Num
outro modo de compreender, estas necessidades refletem as experiências vivenciais e as suas
condições sociais, exercendo influência significativa na maneira como o sujeito se molda e,
consequentemente, as suas ações sociais e seus habitus (BOURDIEU, 2017).

Quando questionados sobre o tempo de utilização destas mídias, a resposta


predominante é a de que há uma conciliação entre o tempo de uso destas mídias com o trabalho,
sendo que as utilizam em horário contraposto à atividade laboral. O fenômeno da inserção
juvenil no mercado de trabalho constitui-se como uma condição necessária à complementação
da renda familiar. No caso dos participantes desta pesquisa situa-se em torno de uma renda
mensal familiar de meio a um salário mínimo. As principais atividades laborais são

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desenvolvidas em oficinas mecânicas, loja de vestuário e supermercado varejista (LEITE;
SILVA, 2016).

3.2 As motivações e as viabilidades do consumo

Ao investigar os fatores que motivam e que impossibilitam os jovens ao consumo e o


que se consome, percebeu-se que a restrição financeira foi o principal fator motivador, sendo
que parte do dinheiro proveniente da atividade laboral, ora é investido em alimentos e produtos
de higiene pessoal, ora em produtos e artigos do vestuário. Conforme entrevistado 1:

Dificuldade, sei lá [...] Crise. Falta de dinheiro, né?! (risos) [...] Não compro tudo o
que eu quero, né [...], mas eu compro tudo o que eu preciso [...] O básico né!? Feira,
essas coisas [...] Iogurte, essas coisas naturais todo mundo gosta de usufruir, né... É
coisa básica mesmo pra comer bem, mas a gente compra uma coisinha melhor quando
o bolso deixa comprar (Entrevistado 1, 2018, entrevista concedida em 17/09/2018).
Do mesmo modo, o Entrevistado 2:

Consumir é coisa diária, igual lanche, essas coisas do dia a dia [...] Normal [...] Porque
a renda tá baixa, não tá dando pra comprar ainda não, uai, porque é muito caro né, tem
coisa que não tá no orçamento que a gente ganha, mas a gente faz o que pode, o que
dá e quando dá e mesmo assim, depois de ajudar em casa com o básico (Entrevistado
2, 2018, entrevista concedida em 17/09/2018).
A baixa renda obtida pela atividade laboral foi o principal fator para a impossibilidade
de se consumir o que deseja. A vulnerabilidade social, situação que se inserem os adolescentes,
é condição multidimensional e complexa que dificulta o acesso de grande parte da população a
alimentação. Por vulnerabilidade social compreende-se por uma expressão de segregação social
e de não contemplação dos seus direitos fundamentais (ROSANELI, 2015).

Entretanto, no caso desta pesquisa, a amostra parece ter a pobreza como uma condição
de agravo, já que o alimento aparece como um principal item de consumo entre os entrevistados.
O investimento em alimentos, bem como relatados por alguns adolescentes diz de uma
insegurança alimentar 4 que se insere em suas experiências corpóreas de submissão e
subalternidade na dinâmica social dominante (SAWAIA apud BERTINI, 2014).

Os entrevistados com faixa etária entre 18 e 19 anos consideraram bens de vestuário


como principais produtos consumidos, enquanto outros poucos mais velhos, além de também
consumirem bens de vestuário, também mencionaram produtos alimentícios. Assim,
compreende-se que o consumo de ambos os tipos de produtos mencionados se configuram nas

4
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE, 2010), Montes Claros apresenta 36,3% de
famílias com renda de até ½ salário mínimo.

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dimensões material e cultural, pois ao consumirem alimentos satisfazem suas necessidades
objetivas, enquanto os bens de vestuário os completariam em sentido material da expressão das
suas imagens sociais fomentadas pelo mercado da moda difundido pelos meios de comunicação
de massa (MARTINS; MARTINS, 2017).

A insatisfação apareceu como sentimento mais evidente diante da impossibilidade de


consumo e se apresentou como fator precedente ao sentimento de conformidade. Em resposta
ao sentimento de conformidade, notou-se que os adolescentes recorrem ao trabalho como um
meio na direção de um fim, neste caso, sobre o consumo do que se deseja é expresso pelo
Entrevistado 1:

Eu nem vou olhar [...] Eu nem vou, nem olho. Eu só vou comprar uma coisa quando
eu sei que vou chegar, comprar e levar [...] porque chegar numa loja, e fica ‘ah eu
quero comprar esse tênis aqui’ e não tem dinheiro não, eu nem vou e a gente fica sem
graça passando vontade na frente do vendedor e ele achando que eu vou poder levar
[...] (Entrevistado 1, 2018, entrevista concedida em 17/09/2018).
E também corroborado pelo Entrevistado 4:

Uá! Eu me conformo. Porque tipo assim, eu não vou fazer nada demais [...] E aquele
trem, eu vou correr atrás. Trabalhar e levantar o dinheiro pra eu conseguir comprar o
que eu tô querendo. Não tem jeito, tem que trabalhar porque é a única coisa que vai
me dar dinheiro pra me sustentar (Entrevistado 4, 2018, entrevista concedida em
17/09/2018).
O consumo mensal foi a principal resposta em questionamento quanto à frequência que
consomem, onde percebeu-se uma satisfação diante da possibilidade de obtenção de um produto
desejado, ainda que mensalmente. Tal periodização vincula-se à condição de assalariado, com
recebimento mensal de “pagamento” pela mão de obra vendida (grifo nosso). Nesse sentido, o
trabalho pode ser compreendido como um atributo constituinte no processo de construção de
uma identidade desse adolescente e de sua representação social (DUTRA-THOMÉ; KOLLER,
2014).

Outro ponto relevante observado foi o de que os jovens não mencionaram alguns bens
de consumo, tais como o cinema, lazer, livros, cursos, viagens e curso superior, pois não são
contemplados em suas experiências nos seus contextos socioeconômicos, o que parece
restringir por estas vias de manifestação subjetiva como possibilidade de sublimação
(COELHO; PAULA, 2017). Quando questionados sobre os produtos que gostariam de
consumir e não consomem, os adolescentes do sexo masculino relataram desejo de consumo de
motocicleta e mais produtos de vestuário pessoal, sendo que a única entrevistada do sexo
feminino relatou desejo de consumo de produtos de vestuário, bem como produtos de cuidados
estéticos como maquiagem e cabelo.

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O trabalho, portanto, é materializado como meio de obtenção de renda para aquisição
de produtos desejados, e como uma via de expressão simbólica e de representação do seu lugar
no meio em que se insere. Nesta relação, percebeu-se que esta expressão do desenvolvimento
da atividade laboral recebe considerável influência de veículos midiáticos de comunicação
como a televisão e a internet (COELHO; PAULA, 2017).

3.3 Consumo e sua relação com a identidade

Por toda a análise exposta até este ponto do texto, pode-se inferir que estes jovens
vivenciam situações de vulnerabilidade social agravada pela situação de pobreza, que produz
uma “consciência homogeneizada”, conformismo, o que conduz ao trabalho como via de acesso
ao consumo, ainda que tenha restrições. Essa situação de conformismo funciona segundo
comportamentos que agradem à sociedade e na condição de produção e de representação de
indivíduos que se localizam mais na heteronomia do que na autonomia (ENRIQUEZ, 2014).
Neste sentido, a responsabilidade da qualidade e da quantidade do consumo é significada de
modo individual, a-crítico e a-histórico (SAWAIA apud BERTINI, 2014).

É através do trabalho que estes adolescentes se veem em espaço onde podem construir
seus modos de ser no meio em que se inserem, a partir da sua submissão às necessidades
externas (NETO et al., 2015). Assim, pode-se entender que estas identidades circunscritas no
campo do trabalho são fruto do processo de vulnerabilização, fragilização e diminuição da
capacidade de consumo e da supervalorização das expressões laborais dos indivíduos, “o
trabalho que era tão desvalorizado nas sociedades antigas, torna-se um elemento
fundamentalmente integrador da sociedade, isto é, permite efetivamente a uma sociedade
engendrar, ou reforçar os laços sociais” (ENRIQUEZ, 1999, apud NETO et al., 2015).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Indústria Cultural e a difusão de bens pelos meios de comunicação de massa, tem


moldado de maneira significativa os modos de consumo e a constituição das identidades
coletivas e individuais. O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise de como
os diferentes modos de consumo exercem influência na construção das identidades de
adolescentes em situação de vulnerabilidade social.

Os resultados mostraram que essas identidades, por ora dissidentes, se ancoram numa
consciência homogênea ao trabalho como via de acesso aos ícones vendidos pela publicidade,
sobretudo pelos meios de comunicação de massa. Estes ícones identificados em entrevistas, se

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
definiram como roteadores da Indústria Cultural da moda e da alimentação, este último,
justificando as situações de pobreza e vulnerabilidade social identificadas.

Outrossim, a experiência vivida em campo de pesquisa, revela o espaço dessa área de


atuação em Psicologia para o diálogo com as políticas públicas; um espaço que permite
potencializar o reconhecimento do lugar dos jovens enquanto sujeitos, cuja expressão se torna
de suma importância na compreensão da influência do consumo no seu processo de
subjetivação, sobretudo na construção das suas identidades. Contudo, apesar do alcance dessa
pesquisa, o trabalho obviamente não se esgota aqui, mas merece a realização de novas pesquisas
alinhados com o combate a estigmatização das situações de vulnerabilidade e risco social, na
desconstrução de preconceitos e a promoção do bem-estar psíquico.

Por fim, o objeto mais consumido na relação dos jovens participantes desta pesquisa
está atrelado ao símbolo da categoria trabalho, entretanto, esses não apresentaram nas falas ou
possíveis interpretações para esta representação de si, mas enquanto um trabalhador sem
liberdades de escolha de consumo, conformado ao consumo restrito.

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ENTREVISTA CONCEDIDA

ENTREVISTADO 1. Modos de consumo. Entrevista concedida a Thiago Frederik Mendes


Batista. Montes Claros. 19/09/2018.

ENTREVISTADO 2. Modos de consumo. Entrevista concedida a Thiago Frederik Mendes


Batista. Montes Claros. 19/09/2018.

ENTREVISTADO 4. Modos de consumo. Entrevista concedida a Thiago Frederik Mendes


Batista. Montes Claros. 19/09/2018.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
DOI 10.47402/ed.ep.c2311316289

CAPÍTULO 6
INTEGRAÇÃO DA ESPIRITUALIDADE NO ATENDIMENTO PSICOLÓGICO:
BENEFÍCIOS, DESAFIOS E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO

Kahlinne Rocha Brandão


Ramon Silva Silveira da Fonseca

RESUMO
O objetivo deste artigo é apresentar uma revisão integrativa da literatura concernente à integração da dimensão
religiosidade/espiritualidade na prática clínica psicológica, investigando os benefícios da integração da R/E no
setting terapêutico, os desafios encontrados pelos profissionais de psicologia para o manejo das questões
religiosas/espirituais e as estratégias de intervenção clínica que estão sendo utilizadas pelos profissionais. A
pesquisa bibliográfica realizada nos portais eletrônicos PePSIC, SciELO e Google Acadêmico resultou na seleção
de 9 artigos na língua portuguesa e publicados no período de março de 2017 a 2022, além de outros artigos
anteriores, uma tese de doutorado e um livro considerados pertinentes ao trabalho. A literatura analisada aponta
haver resultados positivos na abordagem da R/E no processo psicoterápico, quando os pacientes trazem questões
de cunho religioso/espiritual ao setting, por se tratar de uma dimensão humana, indispensável à compreensão
integral de sua subjetividade. Assinala, ainda, haver muitos desafios enfrentados pelos profissionais no manejo de
tais questões; contudo, constata-se a existência de diversos protocolos e ferramentas que já vem sendo utilizados
como estratégias de intervenção na prática clínica.

PALAVRAS-CHAVE: Espiritualidade. Intervenção clínica. Psicologia clínica. Psicoterapia.


Religiosidade.

1. INTRODUÇÃO

O tema da inter-relação entre religiosidade/espiritualidade e saúde vem pouco a pouco


atraindo o interesse dos profissionais da saúde mental no Brasil. Ainda que a investigação seja
escassa, verifica-se que estão surgindo diversos estudos, livros e discussões nesse campo e que
vários profissionais começam a levantar a bandeira da importância de essa dimensão
religiosa/espiritual ser também discutida no âmbito científico. Assim, no Brasil a R/E vem
sendo cada vez mais levada em conta nos cuidados da saúde mental, notadamente, na seara da
psiquiatria, da psicologia, da enfermagem etc., o que se justifica haja vista que a população
brasileira é majoritariamente religiosa.

A pesquisa não pretendeu se estender muito na investigação da importância da dimensão


religiosa/espiritual para saúde mental das pessoas, por considerar que as implicações da R/E na
saúde física e mental já são alvo de numerosas publicações científicas, sendo, aqui, considerado
algo evidenciado e de modo geral aceito no campo teórico, ainda que reconheça que, em sendo
mal utilizada a dimensão religiosa/espiritual também pode promover malefícios para as
pessoas, quando, por exemplo, as crenças são geradoras de culpa e ansiedade. Visou mais
especificamente destacar a importância da integração da R/E na prática clínica psicológica, no

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sentido da abordagem de tais questões quando se faz necessário ao processo, ou seja, quando
surgem no setting terapêutico por serem importantes para os pacientes.

Razão pela qual, a partir de uma revisão integrativa da literatura nacional concernente à
integração da dimensão religiosa/espiritual dos pacientes no atendimento psicológico, a
presente pesquisa teve por objetivo responder aos seguintes questionamentos: A
religiosidade/espiritualidade vem sendo considerada importante e favorável no contexto
psicoterapêutico? Existem razões para não se menosprezar a dimensão religiosa/espiritual no
âmbito psicoterapêutico? Os psicólogos estão abertos a abordar as questões referentes à R/E
trazidas ao setting pelos pacientes? Encontram-se capacitados para tal abordagem? Quais as
dificuldades e os desafios que se apresentam quando o profissional adentra nessa seara? E
quanto aos limites éticos? Existem recursos terapêuticos ou intervenções disponíveis para
auxiliar a abordagem da R/E na psicoterapia? Atualmente, quais abordagens levam em
consideração a dimensão religiosa/espiritual no tratamento dos pacientes?

Trata-se de uma pesquisa qualitativa e descritiva que buscou averiguar como a temática
da religiosidade/espiritualidade vem sendo atualmente considerada pelos teóricos e
profissionais da psicologia, bem como verificar quais as abordagens psicoterapêuticas estão
mais voltadas a essa integração; em outras palavras, o que as principais linhas de psicoterapia
pensam a respeito. Para tanto, desenvolveu três eixos de investigação, a fim de melhor organizar
o levantamento e a reflexão do assunto: 1) os benefícios da integração da R/E na prática clínica;
2) os desafios encontrados pelos psicólogos na abordagem da R/E de seus pacientes; e 3) as
possíveis estratégias de intervenção clínica quanto à R/E. Desse modo, através dos referidos
eixos, a pesquisa buscou, de forma sintética, traçar o panorama da temática acima exposta,
conforme o contexto da psicologia praticada no âmbito nacional.

Nessa mesma ordem, levantou como hipóteses que: 1) existem benefícios advindos da
integração da R/E na prática clínica, 2) os desafios encontrados pelos psicólogos na abordagem
da R/E de seus pacientes podem ser superados, 3) algumas estratégias de intervenção clínica
quanto à R/E já estão sendo utilizadas pelos profissionais.

A pesquisa justifica-se pela importância do enfoque da R/E no atendimento psicológico;


sendo, também, útil para incrementar as discussões em torno do assunto, ainda escassas no
âmbito acadêmico brasileiro.

2. MÉTODO

A fim de atingir os objetivos desse artigo, foi utilizado unicamente o método de

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pesquisa bibliográfica, de caráter qualitativo e descritivo, tratando-se de uma revisão integrativa
da literatura brasileira concernente à temática da integração da espiritualidade no atendimento
psicológico, através da qual foram investigados seus benefícios e desafios, bem como eventuais
estratégias de intervenção clínica. Tal revisão utilizou artigos levantados nos portais eletrônicos
PePSIC, SciELO e Google Acadêmico, selecionando-se a princípio apenas artigos na língua
portuguesa e publicados no período de março de 2017 a 2022, os quais foram lidos na íntegra.

A busca dos artigos ocorreu no mês de março de 2022 da seguinte forma: primeiramente
foram lançadas as palavras-chave “psicologia AND religião”, “psicologia AND religiosidade”,
“psicologia AND espiritualidade”, “psicologia AND espiritual”, sendo repetida a mesma
sequência trocando-se o primeiro termo por “psicoterapia”, “saúde mental” e “atendimento
psicológico”. Após exclusão dos títulos que não atendiam ao período delineado e/ou publicados
em língua estrangeira, assim como os repetidos e aqueles cujos resumos assinalavam temática
que extrapolavam o interesse da presente pesquisa, foram selecionados 9 artigos, apontados nas
referências. A fim de incrementar a pesquisa, foram selecionados, nas mesmas bases acima
mencionadas, alguns artigos anteriores a 2017 considerados pertinentes ao trabalho e
igualmente apontados nas referências. Alguns dos artigos selecionados, não obstante
publicados em outros campos (medicina, psiquiatria e enfermagem), dizem respeito à temática
de interesse do presente artigo.

Além dos referidos artigos, a pesquisa também fez uso do livro Diante do Mistério
Psicologia e Senso do Religioso (org. MASSIMI; MAHFOUD, 1999) e da tese de doutorado
intitulada Religiosidade/espiritualidade em uma amostra nacional de psicólogos brasileiros:
perfil e implicações na prática profissional (publicada em 2019), os quais proporcionaram aos
autores um aprofundamento e uma reflexão original do assunto ao sintetizar o material coletado.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para o bom entendimento da pesquisa, cumpre, primeiramente, esclarecer acerca dos


conceitos de religião, religiosidade e espiritualidade, já que ainda é inexistente um consenso
científico quanto ao significado de cada uma dessas categorias (RADDATZ; MOTTA;
ALMINHANA, 2019), o que pode gerar alguma confusão em torno de tal conceituação, a qual
vem sendo subjetivamente elaborada pelos pesquisadores e teóricos do assunto. Raddatz, Motta
e Alminhana (2019) chamam também a atenção para o fato de que na prática clínica cabe ao
profissional tão-somente acolher o sentido que a R/E tem para o paciente, ou seja, o seu ponto
de vista acerca da dimensão religiosa/espiritual, e não tentar pré-estabelecer seu significado.

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Portanto, na pesquisa busca-se conceituar tais categorias apenas didaticamente.

Lucchetti et al. (2010), em seu artigo, trazem de forma bastante sintetizada os conceitos
de religião, religiosidade e espiritualidade. Para esses autores, a religião é “o sistema organizado
de crenças, práticas, rituais e símbolos designados para facilitar o acesso ao sagrado, ao
transcendente”, ou seja, diz respeito à institucionalização das crenças e práticas religiosas.
Nessa mesma linha, para Oliveira e Junges (2012), o conceito de religião “refere-se ao aspecto
institucional e doutrinário de determinada forma de vivência religiosa”. A religião, portanto, é
definida como um conjunto estruturado de crenças e rituais que visam a conexão com o
transcendente.

Por outro lado, os conceitos de religiosidade e espiritualidade são de ordem mais


subjetiva. Para Lucchetti et al. (2010), a religiosidade diz respeito à maneira como o indivíduo
acredita e pratica suas crenças religiosas, que pode ser mediante sua participação numa
instituição religiosa (por exemplo, templo, igreja, etc.) ou mesmo através de práticas pessoais
(por exemplo, orações, leituras, etc.), sem necessariamente se vincular a uma organização
religiosa. Nas palavras dos referidos autores, a religiosidade “pode ser vista também como o
enaltecimento de alguma prática religiosa, no sentido de valorização da experiência, não
estando ligada necessariamente a nenhuma religião específica”.

Já a espiritualidade é definida como uma busca pessoal pelo significado e sentido da


vida, ou seja, diz respeito à relação do indivíduo com o sagrado ou transcendente, o que pode
ou não ocorrer através de práticas ou atividades religiosas (religiosidade), bem como também
independe da existência ou participação em instituições/organizações religiosas (religião)
(LUCCHETTI et al., 2010). Depreende-se, portanto, que a experiência da espiritualidade não
está necessariamente vinculada a instituições religiosas, rituais, dogmas etc., sendo entendida
como uma relação pessoal com o sagrado/transcendente, isto é, a busca pela conexão com um
poder ou força que o indivíduo considere existir acima de si próprio, visando encontrar um
sentido existencial.

Assim sendo, diferentemente da religião, que se reporta ao caráter institucional, a


religiosidade e espiritualidade referem-se a uma dimensão essencialmente experiencial
(OLIVEIRA; JUNGES, 2012), isto é, dizem respeito a experiências subjetivas do ser humano,
razão pela qual tais conceitos devem, segundo tais autores, “levar em consideração a forma
como o sujeito se deixa afetar e como interpreta essas experiências, e o que ela produz enquanto
sentido para a sua vida”. Portanto, serão esses dois últimos conceitos que farão parte da presente

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
pesquisa, utilizando-se o termo combinado “R/E” para religiosidade/espiritualidade;
terminologia que vem sendo adotada na literatura contemporânea, visando abordar suas
relações.

Segundo os apontamentos de Cunha e Scorsolini-Comin (2019b), a utilização desse


termo combinado tem por objetivo abranger a subjetividade dos fenômenos vivenciados,
porquanto “o que está em discussão nos estudos não são os fenômenos em si, mas a relação
vivenciada pelas pessoas quanto as suas questões religiosas/espirituais e a repercussão na saúde
física e mental, o que inclui também os ateístas e agnósticos”.

3.1 Benefícios da integração da R/E na prática clínica

Segundo Oliveira e Junges (2012), a Psicologia vem se lançando no estudo da R/E e de


sua relação com a saúde mental, o bem-estar psicológico e a integração do ser humano em todas
as suas dimensões: biológico, psicológica, social e espiritual. Isto porque o papel da
espiritualidade na saúde mental já vem sendo vastamente analisado no campo científico,
havendo diversa pesquisas à disposição que demonstram a relação positiva entre R/E e saúde
de uma forma geral. Os referidos autores mencionam, ainda, que a Organização Mundial de
Saúde (OMS), em 1988, incluiu a espiritualidade no conceito multidimensional de saúde;
considerando-a como “um conjunto de todas as emoções e convicções de natureza não
material”, porquanto se reporta a questões subjetivas como, por exemplo, o sentido da vida.

Nessa mesma linha, Lucchetti et al. (2010) apontam que alguns estudos vêm
evidenciando a relação entre R/E e saúde mental, já tendo sido demonstrado haver “menor
prevalência de depressão, menor tempo de remissão da depressão após o tratamento, menor
prevalência de ansiedade e menor taxa de suicídio”, bem como a relação da espiritualidade com
“melhor qualidade de vida e maior bem estar geral”, além de outras comprovações científicas
no campo dos distúrbios físicos. Portanto, os autores recomendam que o clínico deva conhecer
tais evidências a fim de perceber suas repercussões na saúde do paciente. Ora, ainda que tais
destaques e evidências correlacionando R/E e saúde/qualidade de vida estejam no campo da
medicina, pode-se observar sua importância, igualmente, na prática clínica psicológica, haja
vista a integração biopsicossocial/espiritual do ser humano, conforme acima pontuado.

Ademais, Raddatz, Motta e Alminhana (2019) esclarecem, com base em pesquisa


estrangeira levantada, que os pacientes geralmente esperam dos profissionais que os tratam a
abertura para ouvir seus questionamentos de cunho religioso/espiritual, tais como “por que isto
está acontecendo comigo agora?”, “existe um Deus?”, “caso exista, ele estará lá quando eu

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
morrer?”, haja vista que esses pacientes tendem a fazer uso da dimensão religiosa/espiritual
como estratégia para enfrentar o estresse decorrente de situações delicadas envolvendo a saúde-
doença. Essa estratégia de enfrentamento do estresse através da utilização das crenças religiosas
e espirituais vem sendo denominada de “Coping Religioso/Espiritual”, a qual, segundo os
autores, pode acarretar benefícios ou malefícios no tratamento dos pacientes, uma vez que o
coping negativo pode acarretar insatisfação, infelicidade ou ansiedade por medo de punição ou
perseguição, por exemplo; razão pela qual, os profissionais precisam estar atentos a essas
questões religiosas/espirituais de seus pacientes (RADDATZ; MOTTA; ALMINHANA, 2019).

Nessa mesma linha, Peres, Simão e Nasello (2007) trazem a importância da abordagem
da R/E no tratamento de TEPT (transtorno de estresse pós-traumático), haja vista que diante de
traumas psicológicos as pessoas tendem a buscar novos sentidos e significados em suas vidas,
a fim de ressignificar as experiências sofridas, que são caracterizadas, sobretudo, pelo
sentimento de desamparo. Ademais, conforme apontam os autores, estudos empíricos já
demonstraram que o tratamento pós-trauma, visando a superação dos efeitos psicológicos
traumáticos, pode se beneficiar do manejo da R/E, já que o acesso a essa dimensão promove “o
sentido de amparo, suporte e esperança” útil na recuperação e no restabelecimento do
sentimento de proteção para os pacientes. Para tanto, faz-se necessário que o profissional possua
abertura e prontidão para lidar com as perguntas existenciais dos pacientes.

Além disso, já se sabe o quanto a consideração das crenças religiosas/espirituais dos


pacientes no setting ajuda na sua adesão/colaboração ao processo psicoterapêutico e nos
resultados positivos das intervenções utilizadas; isso porque, sendo uma dimensão que também
pertence ao mundo subjetivo dos indivíduos, as crenças religiosas/espirituais possuem
influência direta no processamento cognitivo dos pacientes (julgamentos e processamento de
informações), conforme destacado no estudo de Peres, Simão e Nasello (2007).

Oliveira e Junges (2012), em seu estudo, aduzem que, na prática clínica, o acolhimento
e a escuta da dimensão da R/E dos pacientes pelo profissional favorecem “uma intervenção
qualificada no campo da espiritualidade”; assim, mediante tal atitude, a integração da dimensão
espiritual torna-se mais fácil e ajuda no processo de autoconhecimento e de autonomia
promovida aos pacientes. Todavia, conforme ressaltado por Cunha e Scorsolini-Comin (2019b),
“na maioria das vezes, a R/E não se trata do foco do atendimento, mas emerge como
possibilidade de ancoragem do sujeito em sua história de vida, em suas diferentes experiências
e também como recurso para o enfrentamento de situações e eventos de vida considerados
adversos”.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Ora, diante de sua experiência clínica, os referidos autores observaram que os pacientes
costumam justificar a origem de seus problemas por meio de explicações de ordem espiritual,
psicológica ou orgânica, a depender do seu nível educacional, cultural ou religioso
(CAMBURY; AMATTUZZI; ANTUNES, 2006). Diante disso, consideram que, para o clínico
abordar as crenças religiosas/espirituais no processo terapêutico de modo adequado, faz-se
necessário que ele primeiramente se desligue de suas imagens pré-estabelecidas, ou seja, de
suas concepções pessoais acerca das diversas organizações religiosas, pois somente através de
uma atitude neutra o profissional tem condições de compreender a vivência religiosa/espiritual
dos pacientes (CAMBURY; AMATTUZZI; ANTUNES, 2006; LOPEZ, 1999).

Portanto, esses e outros desafios profissionais na integração da R/E à clínica psicológica


são mais explorados no próximo tópico.

3.2 Desafios encontrados pelos psicólogos na abordagem da R/E de seus pacientes

Raddatz, Motta e Alminhana (2019) alertam para o fato de que, não obstante as
evidências sobre a importância da R/E na saúde, na prática clínica ainda há barreiras entre os
profissionais da saúde e os pacientes na abordagem dessa temática, sendo que alguns
profissionais, por falta de treinamento adequado, acabam por deixar de ouvir seus pacientes em
relação às suas crenças religiosas/espirituais, criando, assim, uma lacuna à compreensão
integral da demanda sob seus cuidados. Assim, apontam haver “uma espécie de ‘círculo
vicioso’ entre falta de treinamento e insegurança de inserir a temática R/E na prática clínica”,
e que isso acontece não somente no âmbito da medicina como na área da saúde de modo geral.
Por outro lado, ponderam que alguns profissionais, quando se permitem adentrar nessas
questões de R/E junto a seus pacientes, acabam ressignificando suas próprias crenças.

Desse modo, destaca-se a carência de treinamento ou capacitação como um dos maiores


desafios encontrados pelos psicólogos e psicoterapeutas, que se sentem inseguros e/ou
despreparados para a abordagem da R/E de seus pacientes quando tal demanda surge na clínica.
Valendo, ainda, salientar que a necessidade de tratar das questões envolvendo a R/E no setting
terapêutico pode surgir de forma muito sutil, como por exemplo através de conversas informais
ou de demandas implícitas por parte do paciente (RADDATZ; MOTTA; ALMINHANA,
2019), o que muitas vezes faz com que o profissional não considere a relevância em integrar
tais demandas no atendimento psicoterapêutico.

Percebe-se, portanto, que a falta de capacitação profissional ou formação acadêmica


para a abordagem da R/E faz com que a prática clínica psicológica vá de encontro às

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
necessidades demonstradas por muitos dos pacientes quanto a tocar na temática de suas
atividades e crenças religiosas/espirituais.

Nesse ponto, assinala-se que uma das maiores preocupações dos profissionais da saúde
em tratar da temática em questão é ultrajar a ética profissional, receando, por exemplo, que seus
pacientes percam o senso de realidade ao abordarem sua R/E (RADDATZ; MOTTA;
ALMINHANA, 2019). Todavia, apesar de louvável o cuidado em não extrapolar os limites
éticos, tal preocupação dos profissionais advém da falta de treinamento nessa seara e de
capacitação quanto à forma adequada para lidar com essas questões nos tratamentos a que se
dedicam (no caso, em atendimento psicológico/psicoterapêutico), acarretando a lacuna acima
mencionada. Além do que, há também o bom senso a ser levado em conta nesse enfoque da
R/E do paciente, tendo em vista que em determinados momentos torna-se inadequado sua
abordagem; por exemplo, “em situações extremas como acidentes e eventos isquêmicos
coronarianos”, que podem promover o sentimento de medo, caso as questões de ordem
espiritual partam do profissional (LUCCHETTI et al., 2010).

No que tange à discussão ética da integração da R/E no atendimento psicológico, os


estudos encontraram alguns posicionamentos norteadores interessantes. Peres, Simão e Nasello
(2007), por exemplo, aduzem que explorar crenças religiosas e espirituais pode favorecer o
processo psicoterapêutico, todavia, lançam a pergunta acerca de “quais são os limites entre o
médico/psicólogo e o cliente que consideram temas religiosos e espirituais”. Por outro lado,
ponderam que a inclusão da categoria diagnóstica denominada “Problema Religioso ou
Espiritual” no DSM-IV 5 justifica a abordagem dos temas religiosos e espirituais na consulta e
no tratamento psiquiátrico/psicológico. Não obstante, alertam para o fato de que essa integração
da R/E na psicoterapia exige “profissionalismo ético, alta qualidade de conhecimento e
habilidades para alinhar as informações coletadas sobre as crenças e valores” a fim de
proporcionar benefícios ao processo terapêutico; tendo em vista que, sem essa atitude ética por
parte do profissional, alguns problemas podem acabar surgindo na abordagem inadequada da
R/E, violando a liberdade do paciente e/ou a neutralidade do profissional, inerentes ao contrato
terapêutico (PERES; SIMÃO; NASELLO, 2007). Ao final, esses autores concluem que os
psicoterapeutas precisam estar confortáveis com as questões existenciais e espirituais

5
O DSM-V igualmente dispõe sobre Problemas Relacionados a Outras Circunstâncias Psicossociais, Pessoais e
Ambientais, trazendo em seu código V62.89 (Z65.8) o denominado Problema Religioso ou Espiritual, como uma
categoria que pode ser usada quando o foco da atenção clínica for um problema religioso ou espiritual, incluindo-
se, a título de exemplos, experiências de perda, questionamento da fé, conversão a nova fé religiosa ou
questionamento de valores espirituais (tendo ou não relação com alguma igreja ou instituição religiosa organizada)
que podem estar causando sofrimento ao indivíduo.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
levantadas no setting pelos pacientes, havendo um dever ético em respeitar as opiniões e crenças
religiosas dos pacientes, com empatia, ainda que possua entendimento divergente em virtude
de suas crenças pessoais. Levantam, ainda, alguns fatores que dificultam essa integração: “a
orientação tradicional de escolas psicoterápicas de que a espiritualidade está fora da esfera da
investigação e de conhecimento, a ausência de programas de supervisão e treinamento e o
desconforto com os temas espirituais e religiosos por parte dos educadores e profissionais”.

Depreende-se, portanto, que a relação entre R/E e prática clínica vem sendo evocada
significativamente nos últimos tempos no Brasil (CUNHA; SCORSOLINI-COMIN, 2019a).
Todavia, esses autores alertam para o fato de ainda haver uma lacuna na formação acadêmica
no que tange à referida temática, posto que os psicólogos recém-formados não se sentem
preparados para lidar com as questões religiosas e espirituais trazidas pelos pacientes ao setting
terapêutico, em seus discursos e experiências relatadas, e temem se envolver em dificuldades
ético-profissionais caso adentrem nessa seara. Isso porque os profissionais atentam-se,
principalmente, para o disposto no art. 2, item b, do Código de Ética do Psicólogo (CEP),
segundo o qual é vedado ao psicólogo “Induzir a convicções políticas, filosóficas, morais,
ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do
exercício de suas funções profissionais” (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005).
Ocorre que, conforme pontuado pelos referidos autores, “as recomendações éticas existem no
sentido de que o profissional não ‘influencie’ ou ‘induza’ seu paciente/cliente a determinados
posicionamentos religiosos ou práticas espirituais, o que não significa desconsiderar ou
negligenciar essa dimensão na escuta clínica”.

Entretanto, o que acontece na prática clínica é certo receio de abordar a dimensão da


R/E por parte dos profissionais que não se sentem à vontade com esse manejo ou mesmo que,
preferindo se resguardar de possíveis sanções éticas, afastam-se completamente dessa discussão
(CUNHA; SCORSOLINI-COMIN, 2019a). Razão pela qual, os mencionados autores
denunciam que, diferentemente do que ocorre no exterior, na literatura nacional ainda existe
muito tabu acerca dessa necessidade de discutir o tema desde a formação acadêmica em
Psicologia. Nesse ponto, como um vislumbre de avanço, ressaltam que, em 2013, o Sistema de
Conselhos de Psicologia, em seu Posicionamento para a questão da Psicologia e R/E, dispôs
que: “Pautar-se na obrigatória laicidade não implica negar uma interface que pode ser
estabelecida pela psicologia e a religião, e pela psicologia e a espiritualidade”; e que, em 2016,
após realizar diversos debates acerca da interface entre psicologia, religiosidade/espiritualidade
e saúde mental, o Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP) publicou a coleção

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Psicologia, laicidade e as relações com a religião e a espiritualidade, a qual “apresenta a
necessidade de promover uma formação e discussão mais adequadas dos profissionais de
Psicologia quanto ao tema” (CUNHA; SCORSOLINI-COMIN, 2019a).

Esmiuçando ainda os escritos de Cunha e Scorsolini-Comin (2019a), esses autores


assinalam, apropriadamente, que a R/E do próprio psicoterapeuta já foi constatada como um
fator que pode influenciar a relação psicoterápica, inclusive induzir o profissional a “ser
tendencioso ou a elevar a quantidade de intervenções sobre o tema, provocando incômodos nos
pacientes/clientes” em decorrência de conflitos de sentimentos e de identificação. Desse modo,
chamam a atenção para a necessidade de o profissional ficar atento também à sua própria R/E,
a fim de estabelecer uma relação terapêutica ética com os pacientes. Aqui vale ressaltar a
distinção entre a abertura do profissional à dimensão R/E que se apresente no atendimento
psicológico e o equivocado direcionamento do profissional para tal abordagem. Ou seja, a
possibilidade de abrir espaço para essa dimensão no setting através de uma escuta atenta não
significa que o profissional deva necessariamente incentivar um relato concernente à R/E, tendo
em visa que a demanda deve partir do paciente. Logo, nas palavras de Cunha e Scorsolini-
Comin (2019a), “recomenda-se a escuta da R/E como possibilidade, mas nem sempre como
uma necessidade, o que irá depender do modo com que o próprio sujeito traz a sua narrativa e
a conduz no espaço clínico”.

De outro giro, para Lopez (1999), um dos grandes desafios para o psicólogo clínico na
abordagem da R/E é a falta de eixos referenciais que o orientem a considerar as experiências
religiosas/espirituais dos pacientes quando surgem no setting terapêutico, ou seja, que o ajudem
em seu raciocínio avaliativo diante das narrativas dos pacientes. Essa lacuna no embasamento
teórico faz com que o profissional tente realizar suas considerações de cunho avaliativo à luz
de sua abordagem teórica; ocorre que as abordagens psicológicas geralmente não contemplam
as questões concernentes à R/E, deixando o profissional à deriva, buscando referenciais em
outras disciplinas ou em sua experiência pessoal (LOPEZ, 1999), arriscando a neutralidade
necessária.

Em face de tais dificuldades quanto aos referenciais para avaliação da experiência


religiosa/espiritual na clínica psicológica, Lopez (1999) destaca o modelo das quatro atitudes
básicas nessa abordagem e seus efeitos na atuação clínica proposto por David M. Wulff, as
quais representam diferentes modos de se posicionar diante das questões de cunho religioso:
negação literal, afirmação literal, interpretação redutiva e interpretação restauradora.

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A atitude de negação literal manifesta-se quando os profissionais “reduzem a religião a
um conjunto de afirmações irracionais a serem extirpadas ou apropriadas pelas ciências e
esclarecidas racionalmente”, de modo que a religiosidade dos pacientes é ignorada por ser
considerada um sintoma a ser ultrapassado ou, ainda, um sinal de irracionalidade e imaturidade
psicossocial. Em contraposição, na atitude de afirmação literal, típica dos fundamentalistas e
dos religiosos ortodoxos, os conhecimentos científicos só são aceitos se estiverem alinhados
com as próprias crenças do profissional, que tendem, igualmente, a trabalhar de modo restrito
haja vista que rejeitam as demais opiniões e crenças religiosas, em detrimento dos preceitos de
neutralidade e aceitação total do paciente. A atitude de interpretação redutiva – que, juntamente
com a negação literal, excluem a realidade transcendente – busca interpretar os conteúdos
religiosos unicamente sob perspectivas científicas (eventos psicológicos, biológicos, históricos
etc.), por considerar a religião como fenômeno social ingênuo e ultrapassado. Por sua vez, a
atitude de interpretação restauradora – que, como a afirmação literal, afirma a realidade
transcendente (todavia, sem julgar as ideias ou objetos religiosos) – tende a reorganizar os
objetos da fé religiosa restaurando a ligação com a realidade transcendente (LOPEZ, 1999).

Segundo Lopez (1999), na perspectiva restauradora, os conteúdos religiosos “não são


reduzidos a termos puramente cognitivos, mas se engajam na vida interna e expressam
sentimentos, valores e esperanças que organizam e regulam o fluxo das interações dos sujeitos”;
ademais, tal atitude reflete uma posição de maior maturidade psicológica na abordagem da R/E,
sendo crítica e, ao mesmo tempo, flexível em face dos conteúdos religiosos, além de revelar um
bom conhecimento de si e do outro e ser assumida com responsabilidade (LOPEZ, 1999). Em
suas palavras:

A atitude de interpretação restauradora implica humildade epistemológica. As


realidades da religião, rituais, símbolos e metáforas são reconhecidos em sua
multidimensionalidade e a pessoa vivencia o poder iluminativo e a densidade dos
símbolos. Cliente e psicólogo abrem-se aos mitos, rituais e pensamentos metafóricos
abordando a religião por seus referenciais experienciais: sentimentos profundos e
estados internos que vão desde vivências cotidianas a estados transcendentais, sutis
ou claramente reconhecidos como místicos. Essa posição exige que o cientista tenha
clareza quanto à sua posição religiosa e esteja livre para afirmá-la e incluí-la, de forma
adequada em seu trabalho (LOPEZ, 1999, p. 81).
Por fim, a autora pondera que a interpretação restauradora é uma posição que nos coloca
diante do mistério, implicando numa abertura para a ausência de respostas e de certezas
absolutas, tão significativo no trabalho clínico, por se tratar de uma interpretação simbólica.
Indica que a integração da experiência religiosa na prática clínica psicológica exige que o
profissional se mantenha aberto para metáforas e símbolos (LOPEZ, 1999), considerando a
transcendência enquanto dimensão psíquica humana e lidando com a espiritualidade de forma

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
amadurecida e sem julgamentos ou ilusões (CAMBURY; AMATTUZZI; ANTUNES, 2006).

3.3 Estratégias de intervenção clínica quanto à R/E

Oliveira e Junges (2012) levantam a importância de o psicólogo, em sua prática clínica,


saber lidar de forma adequada com os sentimentos espirituais e comportamentos religiosos dos
pacientes, haja vista que um vínculo terapêutico baseado na empatia e na confiança é
fundamental para o desfecho do tratamento psicoterapêutico; sendo a sua orientação e
capacidade de abertura que irá possibilitar ou não o olhar para a dimensão da R/E no setting
terapêutico. Para tanto, os autores fornecem algumas dicas de questionamentos (extraídas de
outros estudos) que podem nortear a investigação do papel da R/E para o paciente como, por
exemplo, durante a anamnese: “o paciente tem alguma forma de espiritualidade/religiosidade?”,
“pertence a uma comunidade religiosa?”, “tem alguma crença espiritual que possa influenciar
nos cuidados médicos?”, “qual a importância que o paciente atribui a estes aspectos da vida?”,
“o paciente usa a religião ou a espiritualidade para ajudá-lo a lidar com sua doença, seu
sofrimento, ou essas são fontes de estresse?”, etc.

Por outro lado, vale frisar que nem sempre os pacientes, ainda que religiosos, estão
abertos para intervenções envolvendo a R/E; sendo útil ao terapeuta que solicite a seus pacientes
que avaliem a inter-relação entre suas queixas clínicas e suas experiências religiosas/espirituais,
ajudando-os a perceber o papel da espiritualidade em sua vida (CAMPOS; RIBEIRO, 2017).
Ademais, esses autores apontam que, quando essas experiências são importantes para o
paciente, a tendência é que as traga gradualmente para a terapia, na medida em que percebem
a abertura do próprio terapeuta.

Nesse ponto vale frisar que determinadas abordagens psicológicas estão lançando um
olhar para a R/E na prática psicoterapêutica. Campos e Ribeiro (2017) relatam que algumas
abordagens teóricas de psicologia são mais favoráveis à integração da R/E na psicoterapia,
sendo a linha humanista uma das que mais consideram os temas religiosos/espirituais
importantes à prática clínica, porquanto o conceito de empatia torna-se um recurso para o
acolhimento da espiritualidade. Campos e Ribeiro (2017) trazem, ainda, que uma outra forma
de integração da R/E vem ocorrendo nas denominadas psicoterapias adaptadas à fé
(notadamente na esfera da Terapia Cognitivo-Comportamental), que, segundo apontam,
“mantêm os componentes básicos das abordagens seculares, e fazem modificações para
acomodar espiritualidade e religiosidade”.

Já a Logoterapia é citada por Nascimento e Caldas (2020) como sendo uma das

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
perspectivas teóricas que abordam a espiritualidade, posto que para Viktor Emil Frankl
(fundador da Logoterapia e Análise Existencial) o ser humano, além das dimensões física
(corpo) e psíquica (mente), também possui uma dimensão espiritual (ou noética), sendo dotado
de uma vontade de sentido que o orienta intencionalmente para sua realização. Destarte, a
Logoterapia tende a considerar a R/E “não como uma dimensão sobrenatural ou
necessariamente religiosa, mas como dimensão antropológica e ontológica, o que vai para além
da regulação das instituições religiosas e da normatividade disciplinar no âmbito acadêmico das
ciências da religião” (NASCIMENTO; CALDAS, 2020). Paulino (2019) expõe que na visão
de Frankl a religiosidade influencia o sentido da vida e as escolhas individuais, sendo uma
decisão pessoal do indivíduo, desencadeada por suas experiências, e não um aspecto inato do
ser.

A espiritualidade apresenta-se como um aspecto importante também na perspectiva da


teoria junguiana, uma vez que na visão de Carl Gustav Jung, criador da Psicologia Analítica, a
psique individual é estruturada não somente pelas camadas consciente e inconsciente pessoal
(constituído por complexos), como também pelo inconsciente coletivo ou impessoal
(constituída por arquétipos – sendo o principal deles o Self, arquétipo da totalidade do ser,
eminentemente associado ao arquétipo de Deus, ou Imago Dei). Ademais, para Jung a
psicoterapia tem por objetivo favorecer o processo de desenvolvimento psicológico (processo
de individuação), que ocorre mediante a conexão do ego individual com o Self, ou seja através
do estabelecimento de um diálogo entre as estruturas consciente (ego) e inconsciente (Self).
Portanto, depreende-se que a psicoterapia junguiana valoriza a experiência consciente da R/E
(NASCIMENTO; CALDAS, 2020), sendo essa conexão ou experiência denominada por Jung
de transcendência.

A seu turno, Ferreira et al. (2020) apontam que na teoria junguiana leva-se em conta a
importância da espiritualidade no processo psicoterapêutico, haja vista que Jung incluiu em sua
obra diversas reflexões acerca da influência do fenômeno religioso no psiquismo dos pacientes.
Portanto, para Jung, a atitude religiosa teria “uma função psíquica de incalculável alcance”,
capaz de favorecer a individuação (JUNG, 1995, p. 44, apud FERREIRA et al., 2020).

No artigo de Cunha e Scorsolini-Comin (2019a), rico em informações acerca das


estratégias, intervenções e protocolos disponíveis à abordagem da R/E, destaca-se o uso de
recursos metafóricos ou mesmo de esclarecimentos de passagens bíblicas para pacientes
fundamentalistas como forma de confrontar, respeitosamente, suas crenças e comportamentos;
isso visando a ampliação de seu autoconhecimento. Citam, a título de exemplo, um autor que

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
utilizou a prece/reza como elemento de aproximação com uma paciente esquizofrênica,
viabilizando o estabelecimento do vínculo terapêutico; uma vez estabelecido o rapport, a
paciente se sentiu acolhida, bem como foi possível a reformulação de sentidos/significados.
Conclui-se que, nesse caso, a crença religiosa/espiritual da paciente serviu de “ponte” para o
processo terapêutico, haja vista a importância que ela lhe atribuía.

De outro giro, Peres, Simão e Nasello (2007) trazem em seu estudo a “neuroimagem da
religiosidade e estados alterados de consciência” o resultado de algumas pesquisas envolvendo
os estados alterados de consciência (EACs) e seu uso em psicoterapia, que revelam a influência
das experiências em tais estados na mudança de comportamento. Apontam, inclusive, que
diversos autores já comprovaram a efetividade da utilização do EAC como ferramenta para
formação de novos padrões de pensamento, sentimento e comportamento através da percepção
de imagens mentais; isso porque “diferentes estados de consciência podem promover novas
percepções a respeito de um mesmo fenômeno e, conseqüentemente, novos estados emocionais
favoráveis a superação de dificuldades e sofrimentos no âmbito psicológico”.

Uma estratégia de intervenção que recentemente vem sendo adotada é a Intervenção


RIME (Relaxamento, Imagens Mentais e Espiritualidade), desenvolvida e aperfeiçoada pela
Dra. Ana Catarina Araújo Elias, com base na teoria junguiana. Trata-se de “uma psicoterapia
breve, de caráter complementar, desenvolvida para ambiente hospitalar, que integra as técnicas
de relaxamento, imaginação dirigida e elementos da espiritualidade, em uma abordagem
simbólica e transpessoal” (ELIAS, 2019). Segundo Marques e Goto (2021), a intervenção
RIME é o principal instrumento no manejo da espiritualidade no setting hospitalar, sendo
praticada sobretudo por enfermeiros e/ou equipe multidisciplinar. Referem ainda que, segundo
estudos analisados, tal intervenção se revelou apta a promover bem-estar, empoderamento e
autovalorização aos pacientes, como também um melhor enfrentamento do luto pessoal.

Contudo, a referida intervenção vai mais além, posto que também pode ser utilizada
como técnica adjuvante à psicoterapia realizada em consultório particular, visando fortalecer
os recursos psíquicos saudáveis e a resiliência, bem como promover qualidade de vida frente
ao adoecimento (ELIAS, 2019). Segundo a autora, por se tratar de uma psicoterapia breve, a
RIME pode ser aplicada por todos os profissionais da área de saúde, tanto em situação de
cuidados paliativos, como também em situação de possibilidades de cura, promovendo “a
conexão com a sabedoria interna, com o Sagrado, para minimizar angústias, ressignificar a dor
psíquica, a dor espiritual, ou um foco de sofrimento definido pelo paciente” (ELIAS, 2019).

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Retomando Cunha e Scorsolini-Comin (2019a), os autores citam que práticas de
meditação tais como mindfulness e conscious awareness também podem ser considerados como
instrumentos que favorecem a incorporação da R/E na prática clínica; mencionando que a
meditação mindfulness, derivada do Budismo, tem por objetivo terapêutico a regulação da
atenção plena, o desenvolvimento de atitude de tolerância e a redução da evitação
comportamental; enquanto que a conscious awareness é “entendida como a consciência da
existência, das sensações, dos pensamentos e dos sentimentos, que inclui sintonia e
receptividade ao universo”, sendo os níveis de awareness presentes na literatura judaico-cristã
como reflexo de desenvolvimento espiritual.

Por outro lado, boa parte dos estudos analisados apontam a necessidade de treinamento
para que os profissionais adquiram competências para lidar com o tema da R/E, uma vez que,
nas palavras de Campos e Ribeiro (2017), “muitos terapeutas não sabem como compreender
seus clientes quando estes trazem suas experiências espirituais, nem reconhecer o sagrado
quando este se manifesta na relação terapêutica”. Esses autores também alertam para o fato de
que psicoterapeutas não treinados podem, inclusive, prejudicar seus clientes na medida em que
deixam de reconhecer a validade de suas vivências espirituais e/ou, de forma antiética, tentam
impor seus próprios valores seculares (CAMPOS; RIBEIRO, 2017).

A respeito da temática da espiritualidade no meio acadêmico, Lucchetti et al. (2010),


ressaltam que os cursos relacionados à espiritualidade já vêm sendo oferecidos na maioria das
universidades norte-americanas e britânicas no campo da Medicina, assim como vários centros
universitários no mundo têm se interessado e pesquisado sobre esse assunto. Paulino (2019)
assinala que o Brasil ocupa o 5º lugar no ranking mundial de publicações acadêmicas em R/E
e saúde (ranking liderado pelos EUA), sendo que o número de pesquisas nessa área vem
aumentando consideravelmente desde os anos 80.

Raddatz, Motta e Alminhana (2019), por sua vez, assinalam algumas alternativas
propostas por outros autores referindo-se à inclusão da espiritualidade nas discussões
acadêmicas: o oferecimento na matriz curricular de assuntos que reforcem a importância do
tema da R/E na prática profissional, bem como o oferecimento de cursos de extensão e estágios
complementares previstos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Superior, e
a possibilidade de um diálogo transversal quanto à importância do tema R/E na educação.

Na tese de Paulino (2019), foi ressaltado que a Psicologia da Religião – caracterizada


como um campo de aplicação da psicologia ao estudo do comportamento religioso – não se

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
vincula a uma religião em particular, mas se trata de uma disciplina científica que busca analisar
e entender o fenômeno da religião mediante teorias, intuições, técnicas e métodos psicológicos;
“não teria como objeto a religião ou o transcendente, mas sim disposições humanas que
capacitam ou não a vivência de fenômenos religiosos de ordem pessoal, social ou cultural, que
geralmente estão relacionadas a uma dimensão transcendente, como Deus”.

Não obstante a vasta produção brasileira em Psicologia da Religião, a autora também


chama a atenção para o fato de que o tema ainda é pouco contemplado na formação acadêmica.
“Esse desconhecimento, somado ao preconceito e ao silêncio presentes no meio acadêmico e
científico sobre o tema da religião, impede uma discussão mais aberta e dificulta elaborações e
assimilações das vivências espirituais” (PAULINO, 2019).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verifica-se que em todos os artigos revisados há uma percepção positiva acerca da


integração de temas religiosos e espirituais no atendimento psicológico, apontando benefícios
para o processo psicoterapêutico e desenvolvimento psíquico do paciente, assim como também
para o estabelecimento de uma relação terapêutica baseada na compreensão do paciente em sua
integralidade e para uma maior adesão ao processo terapêutico, haja vista ser a R/E uma
dimensão do ser humano que, portanto, não pode ser deixada de fora do setting. Isso porque a
espiritualidade de modo geral é entendida como a busca de significado e de sentido para a vida.

O respeito às crenças religiosas e espirituais dos pacientes é visto como fundamental na


psicoterapia; todavia, a temática só deve ser abordada caso a necessidade seja demonstrada pelo
próprio paciente, conforme os estudos levantados assinalam de modo unânime. Destarte, a
religiosidade/espiritualidade – ou o sagrado – é compreendida como uma dimensão mais
profunda da condição humana, fazendo parte da subjetividade dos pacientes, que, em
atendimento psicológico, podem ansiar por essa integração. Por outro lado, obviamente, não
cabe ao profissional confrontar nem tentar influenciar nem induzir os pacientes a suas próprias
convicções religiosas/espirituais, sendo esta vedação preconizada pelo Código de Ética do
Psicólogo (CEP). A maioria dos estudos revisados chamam a atenção para o fato de que os
psicólogos ainda têm bastante receios em abordar a R/E na clínica, quer seja por medo da não
aprovação pelos seus pares e pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), quer seja por falta de
preparo teórico-técnico para se sentir à vontade com tal abordagem na prática profissional.

Segundo Paulino (2019), esse receio é gerado pela interpretação equivocada do código
de ética, o que reforça a necessidade de haver formação/treino dos profissionais de psicologia

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
nesse campo de atuação. Ora, para a autora, “ao profissional é vedada todo tipo de imposição,
o que não significa que ideias e práticas filosóficas, políticas e religiosas não possam ser
discutidas respeitosamente na clínica”; desse modo, nem o acolhimento e nem mesmo a
investigação desta dimensão R/E dos pacientes estariam vedados ao profissional.

O estudo acima referido ressalta ainda a importância de se ter em mente que todo
relacionamento terapêutico é uma experiência transcultural; sendo assim, as crenças religiosas
ou antirreligiosas dos profissionais podem interferir no encontro clínico com os pacientes, bem
como afetar o processo terapêutico. Em suas palavras de alerta, “há importância também no
debate para a prática clínica tendo em vista que o fosso entre R/E e psicoterapia ainda é grande
e contribui para que muitos não busquem auxílio na terapia acreditando que não terão o respeito
e a inclusão dessa dimensão”. Na tese da referida autora, foi constatado um fato interessante:
que 63,7% dos profissionais têm interesse em receber treinamento sobre R/E no curso de
Psicologia e 68% gostariam de se aperfeiçoar no tema concernente à correlação entre saúde,
psicologia e R/E. Contraditoriamente, percebe-se uma “carência na oferta de disciplinas ligadas
ao tema durante a formação do psicólogo: apenas 13% das Instituições de Ensino Superior
públicas e 16% das instituições privadas incluem a temática em seus currículos na graduação
de Psicologia”. E mais, essa lacuna nos currículos brasileiros de psicologia significa uma
indiferença quanto ao tema da R/E, decorrente de uma perspectiva que “ainda não compreendeu
que a ciência e a religião não precisam ser vistas em conflito” (PAULINO, 2019).

Um dos maiores desafios que os estudos indicam é a lacuna metodológica para a


abordagem da R/E pelos profissionais. Todavia, foi constatado que já existem diversos
protocolos e ferramentas que são usadas como estratégias de intervenção clínica em se tratando
de questões de ordem religiosa/espiritual. Para Cunha e Scorsolini-Comin (2019a), o
conhecimento de tais estratégias permite aos profissionais de psicologia se sentirem mais
habilitados para o manejo das questões de R/E trazidas por seus pacientes, sem, contudo, reduzir
o processo psicoterapêutico, visto que haveria uma legitimação dessa dimensão na esfera
cientifica. Os mencionados autores consideram que essas intervenções, técnicas e instrumentos
oferecem um conhecimento mínimo e ético sobre a temática da R/E tão necessário na clínica,
posto que geralmente há uma dificuldade em manejar tais assuntos. Todavia, interessante
repetir o alerta dos autores, por sua importância prática:

Assim, mais do que a busca por intervenções e protocolos, deve-se promover uma escuta
aberta para questões envolvendo a R/E, de modo que as ferramentas descritas nessa categoria
possam ser facilitadoras do processo, e não mecanismos diagnósticos ou que ofereçam um

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
retrato avaliativo do sujeito. Tais ferramentas ou técnicas não excluem a necessidade de uma
reflexão constante e densa sobre o tema, até mesmo para a tomada de decisão sobre atuar ou
não na prática clínica. (CUNHA; SCORSOLINI-COMIN, 2019a)

Em outro estudo, a mesma dupla de autores sinaliza ser recomendado que o psicólogo
também saiba reconhecer a sua própria R/E, não negligenciando tal dimensão em si mesmo,
bem como afirmam que a discussão desse tema no campo acadêmico permitiria melhor reflexão
acerca do modelo biomédico seguido pela ciência psicológica, “onde a busca por evidências e
um ‘enquadramento’ do que é saudável ou doente desconsideram, por vezes, o saber tradicional
e cultural por trás das religiões, negligenciando a possibilidade de serem saberes distintos, mas
que falam sobre a mesma condição humana”. Além do que, permitiria, igualmente, “criar um
clima de tolerância e de respeito pelas diferenças, o que também ajudaria a combater
preconceitos” (CUNHA; SCORSOLINI-COMIN, 2019b).

Por sua vez, Marques e Goto (2021) sinalizam a necessidade da adoção de um novo
paradigma na atuação dos profissionais de saúde, cujas práticas ainda estão atreladas ao
paradigma tradicional biomédico da saúde ou, quando muito, ao paradigma biopsicossocial,
que vem possibilitando estratégias e recursos terapêuticos mais integrativos quanto à R/E.
Todavia, segundo os referidos autores, na perspectiva biopsicossocial a dimensão
religiosa/espiritual é considerada apenas um aspecto social ou psíquico e não uma esfera
própria; razão pela qual o manejo da R/E que vem ocorrendo ultimamente ampara-se no
chamado “paradigma emergente”, pelo qual o ser humano é entendido como ser complexo,
intersubjetivo, imprevisível e integral. Assim, essa nova perspectiva vai além da biopsicossocial
por levar em conta a complexidade do ser humano (MARQUES; GOTO, 2021). Em outras
palavras, essa nova premissa ou visão de mundo advém do paradigma da ciência contemporânea
emergente que, de acordo com Vasconcellos (2020), trata-se de um pensamento sistêmico e se
constitui de três novos pressupostos epistemológicos que vêm sendo adotados conjuntamente
pelo cientista/profissional: a crença na complexidade, em todos os níveis da natureza; a crença
na instabilidade do mundo, em processo de tornar-se; e a crença na intersubjetividade, como
condição de construção do conhecimento do mundo. Portanto, a psicologia enquanto campo
eminentemente científico precisa atualizar seus pressupostos, incorporando essa nova visão de
mundo que começa a ser vislumbrada pela ciência contemporânea; incluindo-se, aí, a integração
da dimensão religiosa/espiritual na prática clínica psicológica, ao buscar entender o ser humano
em sua complexidade.

Por fim, outro fator de dificuldade no manejo da R/E, conforme apontado em quase

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
todos os artigos revisados, é a falta de treinamento dos psicólogos clínicos recém habilitados
na profissão. Acusa-se uma lacuna nos cursos de graduação no que tange à referida temática.
Contudo, verificou-se que, mais recentemente, estão surgindo no país a oferta de cursos de pós-
graduação que visam o treinamento e a formação em integração da R/E na prática clínica para
os profissionais da área da saúde, em cujos programas são incluídas disciplinas como a
Psicologia da Religião e a interface entre Psicologia e Espiritualidade; o que pode suprir a
referida lacuna na formação dos profissionais que tenham percebido a importância da aquisição
de tais competências.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
CAPÍTULO 7
COMPORTAMENTOS ANTISSOCIAIS NA ADOLESCÊNCIA

Daniele de Fátima de Paiva Abreu


Willian Miguel de Araujo Pontes

RESUMO
Os comportamentos antissociais em jovens e adolescentes têm sido motivo de crescente preocupação e debate na
sociedade atual. O presente capítulo objetivou a priori exprimir algumas especificidades do comportamento
antissocial na adolescência e discutir concepções teóricas que contribuem com a complexidade e prevalência desse
quadro na sociedade. Espera-se que o capítulo contribua com a literatura e que possa trazer uma contribuição para
os interessados que pretendam compreender o fenómeno antissocial na fase da adolescência no âmbito psicológico.

PALAVRAS-CHAVE: Comportamento Antissocial. Adolescência. Teorias.

1. INTRODUÇÃO

Entende-se comportamento agressivo como aquele direcionado para outro indivíduo


que representa uma intenção imediata para ferir, em que o perpetrador acredite que irá atingir
o alvo e que este se motive a esquivar (ANDERSON; BUSHMAN, 2002). Já quanto ao
comportamento violento, ou a violência propriamente, indica uma agressão cuja meta consiste
em um dano extremo (PIMENTEL, 2004).

Outros comportamentos, como dirigir embriagado ou participar em gangs, constituem


violações jurídicas, as quais quando cometidas por menores de idade, considerando,
necessariamente, o sistema penal de cada país, classifica-se como comportamentos de
delinquência juvenil, que também são comportamentos antissociais ou comportamentos-
problema ou mesmo comportamentos socialmente desviantes (PIMENTEL, 2004). Nesse
mesmo período podem ser observados alguns comportamentos antissociais transitórios, como
a presença de rebeldia e de alterações comportamentais, que podem ser considerados como
parte do desenvolvimento do adolescente (BORDIN; OFFORD, 2000).

De toda forma, o período da adolescência trata-se de um período da vida marcado pelas


transformações biológicas da puberdade e por alterações biopsicossociais, que envolvem
momentos de crises associadas a definições de identidade sexual, profissional e de valores
(DAVIM et al., 2009).

Incontestavelmente, o uso de álcool e de drogas ilícitas vem sendo considerado como


um dos principais correlatos da violência, da delinquência, do comportamento antissocial, em
geral. Outrossim, há dados indicativos de que meninos e homens são, em média, fisicamente e

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
verbalmente mais agressivos do que as meninas e mulheres, apresentando mais problemas
externalizantes, como hiperatividade, quebra de regras e comportamentos agressivos e
antissociais (SHAFFER; KIPP, 2010). Desse modo, objetivou-se apresentar as principais
teorias psicológicas e sociológicas que explicam os comportamentos antissociais na
adolescência.

2. DEFINIÇÕES

De acordo com Silveira, Zappe e Dias (2015) o comportamento antissocial na


adolescência pode ser definida como um encadeamento de comportamentos que transgredem
as normas e valores prescritos na sociedade, podendo colocar em risco a integridade física e
psicológica do indivíduo antissocial e também das outras pessoas que o cercam. Nesse sentido,
os autores ainda acrescentam que os comportamentos antissociais podem ser motivados por
diferentes fatores, como raiva, busca de recompensa, hostilidade, vandalismo, mentira e
manipulação.

À vista disso, Dias, Oliveira-Monteiro e Aznar-Farias (2014) citam a importância do


período da adolescência, dado que é uma fase em que os jovens se deparam com diversas
mudanças físicas, emocionais e sociais. Dessa forma, entende-se que esses indivíduos são mais
propensos a comportamentos considerados atípicos, de modo que transgressões na adolescência
são comuns nessa fase da vida, sendo fonte de aprendizagem e de obtenção de novas formas de
socialização, como aponta Benavente (2002).

Concretamente, comportamentos antissociais incluem o uso de drogas, o


comportamento agressivo e violento, a delinquência, a participação em gangues e outros
comportamentos criminosos como o roubo ou o furto, que podem também ser considerados
delitivos ou socialmente desviantes (GOUVEIA et al., 2009; PIMENTEL, 2004).

3. TEORIAS CLÁSSICAS

3.1 Teoria da Associação Diferencial

A teoria da associação diferencial é uma teoria criminológica apontada por Edwin H.


Suntherland (1939/1947), onde ele afirma que o comportamento antissocial é apreendido a
partir das interações com outras pessoas enredados em condutas criminosas, conforme
Matsueda (1982) e Matsueda (1988). Deste modo, a socialização num grupo que adota modelos
culturais contrários à honestidade e ao respeito das leis engendra o criminoso (LIMA et al.,
2017).

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Além disso, de acordo com Lima et al. (2017), Sutherland compreende que o
comportamento desviado de um sujeito não pode ser relacionado a déficits de inteligência dos
infratores, nem mesmo ao fato de estarem incluídos em classes desfavorecidas
socioeconomicamente, pois a aprendizagem dos valores criminais podem ser adquiridos através
de qualquer cultura.

Nesse ínterim, a teoria da associação diferencial nos diz que o crime não é hereditário
ou um comportamento emitido de forma irracional, mas sim uma atitude aprendida. Outrossim,
Lima et al. (2017) salientam que, consoante o autor da teoria, o processo de aquisição dos
comportamentos criminosos abarcam todas as estruturas implicadas em qualquer outro
aprendizado.

3.2. Teoria da Aprendizagem Social Cognitiva

Formulada por Albert Bandura (1925-2021), a teoria da aprendizagem social propõe que
os jovens adquirem comportamentos antissociais através da observação e imitação dos
comportamentos daqueles que fazem parte do seu ciclo social, como pais e amigos. Desse
modo, o adolescente que convive em um ambiente com pessoas que possuem comportamentos
agressivos de forma contínua será propenso a replicar comportamentos antissociais, conforme
aponta Vieira (2007).

Além disso, fatores como o sexo e os papéis ocupados pelo modelo observado surgem
como importantes no processo de aprendizagem, pois Vieira (2007) também expõe que crianças
do sexo masculino são reforçadas a ter o comportamento do pai, enquanto as meninas são
reforçadas a fazer o mesmo perante a mãe. Nesse sentido, a criança do sexo masculino tende a
observar e aprender mais comportamentos agressivos emitidos pelo pai, mesmo que a mãe
demonstre as mesmas condutas.

3.3 Teoria da Anomia Social

De acordo com Esteves (2014), a teoria da anomia social é uma teoria com fundamentos
sociológicos formulados por Enuke Durkheim (1858-1917) e Robert King Merton (1910-2003).
Esta teoria implica em dizer que a escassez de normas societais consistentes geram
comportamentos antissociais.

Durkheim refere-se a anomia como uma quebra da capacidade de uma sociedade para
regular os impulsos naturais dos indivíduos em face a concepção de objetivos culturalmente
mal concebidos nas rápidas mudanças sociais (COTE, 2002; BERMBURG, 2002, apud

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ESTEVES, 2014, p. 22). Nesse sentido, Durkheim deu início à teoria acreditando que o
comportamento humano era fortemente atrelado a fatores sociais.

Posteriormente, Merton continuou o desenvolvimento da teoria com o objetivo de


explicar os motivos que levam a determinadas sociedades possuírem taxas consideráveis de
crimes. Em vista disso, argumentou que o crime e o delito são intrínsecos a sociedades
igualitárias, uma vez que são colocados objetivos que todos devem alcançar, no entanto, os
modos legítimos de alcançá-los não estão postos para todas as pessoas.

Desse modo, indivíduos objetivam alcançar aquilo que é culturalmente valorizado na


sua sociedade, entretanto ao falhar na tentativa de alcançar essas metas, mediante as
oportunidades limitadas, desenvolve-se uma tensão (strain), uma situação de anomia,
possibilitando o indivíduo adotar o ‘comportamento delitivo’ como resposta (MICHENER;
DELAMATER; MYERS, 2005, apud ESTEVES, 2014, p. 23).

4. TEORIAS DESENVOLVIMENTISTAS

4.1 Modelo Integrador de Elliott

O modelo integrador de Elliot teve como objetivo integrar diferentes perspectivas


teóricas, como a teoria de Aprendizagem Social Cognitiva de Bandura e a Teoria da Anomia
social de Merton para explicar as causas do comportamento antissocial, segundo Esteves
(2014).

Assim, Esteves (2014) reforça que os três fatores apresentados por Elliot para explicar
a falta de vínculo do sujeito com a sociedade foram: (1) a aflição entre as metas e os meios,
tendo em vista que o êxito acadêmico pode depender de fatores relacionados à oportunidade;
(2) desordem social; (3) pouca fomentação de práticas socializadoras adequadas na família e na
escola, causando pouca abertura para estabelecer vínculos. Além disso, o autor ainda aponta
que para Elliott, a falta de vínculos não é o bastante para justificar o surgimento da conduta
desviante, também enfatizando a influência do contato com grupos desviantes. Desse modo,
um elemento a mais é necessário para que apareça a desvio: o sujeito deve entrar em contato
com grupos desviantes, que reforcem e lhe induzam a realizar condutas problemas
(FERNANDES, 2014).

4.2 Modelo da coerção de Patterson

Proposto por Patterson et al. (1989), o modelo da coerção apresenta uma perspectiva
desenvolvimentista, buscando as raízes do comportamento antissocial nas primeiras etapas da

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vida (REID; EDDY, 1997; SANTOS, 2008 apud ESTEVES, 2014, p. 20). Assim, o modelo
propõe que os comportamentos dos pais diante dos comportamentos problemáticos emitidos
pelas crianças são essenciais de modo que essa interação envolve coerção.

Desse modo, Esteves (2014) ainda acrescenta que para Patterson et al. (1989) o
comportamento antissocial advém e progride em quatro fases, sendo: (1) ambiente familiar; (2)
ambiente escolar; (3) afiliação com pares desviantes; (4) início da vida adulta. A primeira
envolve atividades parentais inapropriadas na infância, além da falta de normas claras que
reforcem o surgimento e continuidade de bons comportamentos. A segunda sucede da falta de
habilidades socialmente aceitáveis estabelecidas pelo ambiente familiar, de modo que a criança
passa a ter dificuldades para interagir com os colegas, assim como para desenvolver habilidades
acadêmicas. A terceira, por sua vez, decorre do fracasso escolar e da rejeição por parte dos
outros alunos, constituindo o sentimento de desamparo. O quarto e último abarca as fases
anteriores e se relaciona com a dificuldade em se ajustar para a vida adulta, como em relação
ao trabalho e a vida convencional, acarretando comportamentos antissociais e possíveis
envolvimentos com álcool e outras drogas.

5. FATORES CONTEXTUAIS

Os fatores contextuais, ou ambientais, também desempenham um papel importante no


desenvolvimento dos comportamentos antissociais, como a agressão e a delinquência. Dentre
estes fatores, pode-se destacar a influência de estilos parentais inadequados, excessiva
permissividade, status socioeconômico ou a exclusão social (DURAN-BONAVILA et al.,
2017). Por exemplo, estes autores verificaram empiricamente em sua pesquisa que a exclusão
social e o baixo nível socioeconômico se relacionaram com a agressão e a delinquência numa
amostra de mais de mil jovens espanhóis com idades compreendidas entre 12 a 21 anos.

Outro fator estudado para desencadeamento do comportamento antissocial é o


crowding, ou seja quando um ambiente está denso de pessoas, geralmente isso provoca estresse
e leva ao comportamento agressivo, que é uma das variáveis ambientais mais estudadas pelos
psicólogos sociais, juntamente com o calor, como um dos fatores contextuais desencadeadores
da agressão (RODRIGUES; ASSMAR; JABLONSKI, 2000). O aumento da densidade
populacional pode levar também ao aumento da violência, a agressão na sua forma mais
extrema como o assassinato. Esta variável tem sido estudada cientificamente há muito tempo,
como relacionada ao estresse (SOUTHWICK, 1971) sobretudo nos grandes centros urbanos,
nas metrópoles.

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Pode-se citar, além do crowding, do calor, das altas temperaturas, também o barulho
como um dos fatores contextuais desencadeadores do comportamento antissocial da agressão
(KUO; SULLIVAN, 2001). Estes autores ainda destacam que a influência destes fatores neste
comportamento antissocial já é empiricamente bem estabelecida.

Por fim, percebe-se que uma análise abrangente do comportamento antissocial deve
considerar além dos traços de personalidade ou da inteligência, fatores contextuais ou
ambientais, comumente estudados pela psicologia ambiental, a exemplo do ambiente físico,
pois são importantes na determinação do comportamento.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo principal deste trabalho foi o de compreender o comportamento antissocial


na adolescência através de uma perspectiva psicológica, com ênfase no indivíduo, mas se levou
em conta também teorias sociológicas, com ênfase no grupo e na sociedade. Ademais, é
importante salientar a existência dos aspectos circunstanciais como preditores dos
comportamentos antissociais persistentes, que incluem desde a violência familiar até problemas
escolares (BOER et al., 2013).

Diante do exposto, fica evidente que o comportamento antissocial na adolescência, em


geral, encontra uma grande parte da sua explicação em fatores relacionados com fatores
individuais e contextuais, possuindo características que colocam determinados indivíduos em
maior risco de se envolverem neste tipo de comportamentos (MORGADO, 2016).

Ademais, espera-se que o presente capítulo possa aguçar o interesse de pesquisadores


que pretendam aprofundar os conhecimentos acerca dos comportamentos antissociais em
jovens. Dessa forma, sugerem-se futuras pesquisas que possam elucidar principalmente e que
outros estudos que contemplem este conteúdo possam ser esperados no futuro.

REFERÊNCIAS

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
CAPÍTULO 8
ENTENDENDO A MISOGINIA ONLINE:
ASPECTOS PSICOSSOCIAIS

Taciane Cavalcanti do Amaral Mota

RESUMO
Com o advento das tecnologias, a misoginia online surgiu, em detrimento disso, estudos foram desenvolvidos e
comprovaram o aumento dos casos de violência contra mulheres nas mídias sociais. Tendo isso em vista, podem
ser citadas várias pesquisas realizadas a fim de estudar esse fenômeno. Esses estudos são na área de masculinidade
tóxica, misoginia online, assédio online, revenge porn, gendertrolling e ódio contra a mulher. Essa problemática
é alarmante, pois a misoginia sofrida no mundo offline, também está presente no mundo online, e com isso,
surgiram diversas formas de opressão para a mulher também nas plataformas digitais. Portanto, serão discutidas
as diversas formas de misoginia na internet, como os infratores agem em casos reais, os diversos contextos
relacionados e a luta feminista para a libertação das mulheres.

PALAVRAS-CHAVE: Mulheres. Misógino. Online.

1. INTRODUÇÃO

O revenge porn, gendertrolling, abuso verbal, assédio sexual online, sextortion,


manipulação de fotos, doxxing e cyberstalking são alguns dos tipos de violência online sofrida
por mulheres, mas que geram repercussões além do contexto digital, no contexto offline
também (GING; SIAPERA, 2018).

Com o avanço das tecnologias, foram criadas novas formas de misoginia, que só foram
possíveis através das novas possibilidades tecnológicas. Para a exemplificação desse fato, é
possível citar a pesquisa de Ging (2017), em seu estudo sobre a Manosfera, constatou que
homens betas autodescritos utilizam discursos misóginos em certos espaços online a fim de
promover que esses espaços continuem sendo masculinos e que a mulher se mantenha fora
desses ambientes virtuais.

Tendo isso em consideração, outros pesquisadores estudam temáticas relacionadas


como: Karla Mantilla (2013) sobre o gendertrolling; Banet-Weiser e Miltner (2016) no estudo
da masculinidade tóxica; Vickery e Everbach (2018) sobre misoginia; Jane (2016) com sua
pesquisa sobre o ódio misógino em contexto online e por fim, pode-se citar também, Filipovic
(2007) com o comparativo da existência da misoginia na online e o assédio sofrido no offline.

2. MISOGINIA ONLINE

É alarmante a quantidade de mulheres que sofrem com a misoginia online, em um


espaço que deveria ser participativo e aberto a todos, já que segundo Lawson (2018), no início

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
do uso da internet, existia a ideia de que "os espaços digitais proviriam uma utopia livre de
desigualdades onde as subjetividades flexionadas por raça, gênero, sexualidade, habilidade e
classe poderiam ser fluidas ou totalmente apagadas". Entretanto, a realidade das plataformas
digitais é totalmente diferente.

Para estudar as realidades virtuais, Espaig (2018) desenvolveu um estudo sobre o “trash
talk”, essa pesquisa foi realizada em uma comunidade de jogos online que incentiva a
desigualdade de gênero. Já o estudo de Semenzin e Bainotti (2020), pesquisou sobre a
divulgação de imagens íntimas de mulheres de forma não consensual em grupos de Telegram.
Além desses, também pode ser relatado os estudos de Ging (2017); Hess e Flores (2016) sobre
“Cum tribute”, que é a ejaculação na imagem da pessoa, em telas de smartphones ou fotos.
Diante desse cenário preocupante, é crescente o número de casos envolvendo a misoginia no
contexto online, sendo o Brasil um dos países mais desiguais do mundo em relação a gênero,
segundo o relatório de 2010 da ONU.

É visto que, mulheres e meninas que expõem suas opiniões publicamente online
enfrentam abusos, em detrimento da discriminação sexual e de gênero presente amplamente no
mundo offline e se mostra também no contexto online, conforme exposto no site Medium
(2018). Esse ódio contra mulheres pode gerar consequências negativas e esses impactos foram
investigados, a fim de analisar o que a misoginia online acarretou às mulheres que sofreram
com esse tipo de violência.

Pois, segundo uma pesquisa realizada pela Anistia Internacional (2017), cerca de 76%
das mulheres participantes disseram já ter sofrido algum tipo de abuso ou de assédio no meio
digital e que isso as levaram a mudar o modo de usar as plataformas midiáticas, como
restringindo publicações. Além disso, 61% das mulheres que sofreram os efeitos da misoginia
online disseram ter apresentado sintomas de baixa autoestima e perda da autoconfiança como
consequência da violência sofrida.

Tendo isso em vista, é notável que o espaço online tem se tornado cada vez mais
heteronormativo e hegemonicamente masculino, de acordo com Drakett et al. (2018). Se
tornando um espaço em que a masculinidade tóxica vem crescendo segundo Han (2018), pois
são vistos, de modo recorrente tweets que culpam e envergonham mulheres que sofreram
estupros, dos quais possuem mais retuítes do que aqueles que defendem essas sobreviventes de
violência sexual. (STUBBS-RICHARDSON et al., 2018).

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Diante do exposto, é estimado que existam cerca de 400.000 tweets caluniosos
diariamente, segundo dados da Felmlee et al. (2020). Pois, segundo Naughton (2016), o Twitter
se transformou em um amplificador, sendo então, as mensagens postadas nessa plataforma,
espalhadas rapidamente sem custo algum.

3. ASSÉDIO ONLINE

O assédio online ocorre diariamente, podendo ser observado que o ódio cibernético de
gênero aumentou de forma muito acentuada desde 2011 (JANE, 2016). Existem evidências em
relação ao discurso de ódio nocivo, o qual envolve comunidades cada vez mais amplas,
acarretando o assédio de gênero cada vez maior do que quando comparado a literatura
acadêmica anterior (HERRING, 2002). O estudo da Pew Research Center (2017) encontrou
evidências de que 21% das mulheres que participaram do estudo, relataram já ter sofrido
violência sexual online, representando o dobro quando comparado aos homens participantes
desse mesmo estudo.

Sendo consenso a existência de um padrão de gênero associado a esse tipo de violência,


o gênero masculino, utilizando-se da violência como forma de controle e intimidação do gênero
feminino, que na hierarquia do poder na sociedade, é visto com assimetrias (HERRING, 2002).
Tendo isso em vista, um exemplo de assédio online sofrido é o da deputada Diane Abott –
primeira deputada negra do Parlamento Reino Unido – em que recebeu mais de 8.000 tweets
em menos de 6 meses, com mensagens de conteúdo abusivos, no ano de 2017.

Além disso, outros dados apontam que 45% dos assédios de gênero, ocorrem
virtualmente (DIREITO DAS MULHERES, 2021), dos quais, estão fundamentados na
realidade offline, em que nas experiências próprias do cotidiano, as mulheres sofrem com o
sexismo advindo de uma sociedade patriarcal (MEGARRY, 2014).

Os tipos de assédio no mundo virtual são diversos, como por exemplo, os agressores
fazem xingamentos a aparência da mulher e a sua inteligência, como também, as ameaçam de
morte (CHEN et al., 2020). Além disso, já foram relatados diversos casos de assédio em
aplicativos de relacionamento ou sites de namoro (THOMPSON, 2018), e abusos sexuais
através de imagens (UHL et al., 2018).

4. MOVIMENTO FEMINISTA DE COMBATE A MISOGINIA

O movimento da primeira onda feminista, surgiu com ideias de adquirir direitos de


cidadania para as mulheres, como por exemplo, as sufragistas que lutaram pelo direito ao voto

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
feminino. Outros pontos marcantes foram o direito da mulher a possuir propriedades, reforma
de vestuário, direito a divórcio, custódia de filhos, controle da natalidade, entre outros.

O movimento da segunda onda feminista, que ocorreu a partir de 1960, foi um


movimento voltado para a libertação de mulheres, luta por direitos e combate a violências como
estupro, violência doméstica e o assédio sexual no trabalho. Já a terceira onda, teve o
surgimento em torno do ano 1988, com uma enorme mudança cultural, as mulheres podiam
praticar esportes, ter vida sexual de forma normalizada, trabalhar fora de casa e etc.

Já o movimento da quarta onda, que começou aproximadamente a partir de 2008, teve


avanços significativos no mundo online com os avanços proporcionados pela globalização.
Foram criados movimentos por jovens feministas como campanhas no Twitter, blogs e posts
nas redes sociais com assuntos como aborto, igualdade de direitos, assédio em vias públicas,
assédio no ambiente de trabalho, cultura do estupro, violência sexual nos campos universitários,
assassinatos de mulheres, entre outros.

Portanto, com a expansão da internet, as mulheres conseguiram exercer o contrapoder.


Desenvolvendo a autonomia e espaço de fala, com a utilização das redes de comunicações, que
podem ser caracterizadas como fontes de poder na sociedade atual (RODRIGUES et al., 2014).
Diante do exposto, para que aconteça o rompimento do poder predominante, são desenvolvidos
os movimentos sociais, organizados através das redes de comunicação sem fio e plataformas
digitas, que produzem valores e objetivos de transformação da sociedade atual, esquivando-se
do domínio dos detentores de poder institucional (CASTELLS, 2013).

Entretanto, existem lugares em que o movimento feminista ainda não conseguiu


realmente adentrar, como em países islâmicos, dos quais as mulheres não são vistas com a
igualdade devida, não tendo os seus direitos como ser humano respeitados. Portanto, essa
realidade deve ser mudada através das lutas feministas, que buscam a libertação das mulheres
que sofrem essa opressão (LANGNER, 2015).

Sendo então, a luta pela igualdade e liberdade (GOHN, 2013) as principais pautas do
movimento feminista, tendo em vista que “O feminismo se tornou a palavra (e o estandarte)
comum contra todas as causas de opressão feminina e a qual cada mulher, ou categoria
feminina, vincularia seus temas e reinvindicações” (CASTELLS, 2001).

5. CONLUSÃO

Compreende-se, diante do exposto, a seriedade da misoginia online e a necessidade de


esforços para seu combate, com intuito de promover a minimização da problemática nos

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
diversos caminhos. Pode ser observado então, como os movimentos feministas têm grande
relevância social e são fundamentais na luta pela igualdade de gênero. Tendo atuações em
diversas frentes, como: campanhas de hastags, ações coletivas de ativismo digital feminista,
intervenções legais - como a punição devida dos perpetradores da misoginia - e o
desenvolvimento de estratégias para o combate a misoginia online.

Portanto, diante do exposto, o movimento online #MeToo é um exemplo que obteve


grande repercussão na luta contra as violências sexuais e de gênero, obtendo grande
visibilidade. Entretanto, ainda existe um longo caminho a ser percorrido para que a igualdade
de gênero seja uma realidade e que a misoginia acabe, tanto online quanto offline.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
CAPÍTULO 9
REFLEXÕES SOBRE A PESQUISA QUALITATIVA EM PSICOLOGIA

Taciane Cavalcanti do Amaral Mota

RESUMO
Esse trabalho trata sobre reflexões acerca da pesquisa qualitativa em psicologia, a qual discute significados,
crenças, atitudes e subjetividades, a fim de estudar os fenômenos sociais. Para esse tipo de pesquisa, existem
diversas técnicas utilizadas nas ciências sociais, mas serão discutidas nesse momento apenas a análise de conteúdo,
a entrevista semiestruturada, o grupo focal, a observação participante e, por fim, a pesquisa intervenção.

PALAVRAS-CHAVE: Pesquisa Qualitativa. Psicologia. Análise de Conteúdo. Entrevista


Semiestruturada. Observação Participante.

1. INTRODUÇÃO

A pesquisa qualitativa em psicologia trabalha com os significados, motivos, aspirações,


crenças, valores e atitudes (MINAYO, 2007). A partir disso, são estudados os fenômenos
humanos e sociais, com a intenção de interpretar a realidade que nos rodeia. Para Godoy (1995)
a pesquisa qualitativa:

[...] não procura enumerar e/ou medir os eventos estudados, nem emprega
instrumental estatístico na análise dos dados. Parte de questões ou focos de interesses
amplos, que vão se definindo a medida que o estudo se desenvolve. Envolve a
obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo
contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os
fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação
em estudo (GODOY, 1995, p. 58).
Tendo isso em vista, é compreendido o caráter discursivo e polissêmico (TAQUETTE;
MINAYO, 2016) da pesquisa qualitativa, a qual possui um abrangente escopo, que são
estudados pela literatura especializada (BICUDO; COSTA, 201; PATTON, 1990; LINCOLN;
GUBA, 1985). Tendo nesse tipo de pesquisa, diferentes perspectivas, modalidades, desenhos,
técnicas, abordagens, investigações, compreensões e etc (GONZÁLEZ, 2020). Portanto, a fim
de explorar e refletir sobre a temática, serão apresentados alguns dos métodos da pesquisa
qualitativa utilizados em psicologia.

2. ANÁLISE DE CONTEÚDO

É visto que, o método da análise de conteúdo surgiu das tentativas de analisar a bíblia
sagrada, e depois foi usado com outros intuitos, aplicado a psicologia clínica e a psicanálise,
por exemplo. O método de análise de conteúdo pode ser realizado tanto na pesquisa quantitativa
quanto na qualitativa, entretanto, com diferentes aplicações. Além disso, pode ser utilizada na

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
pesquisa quali-quantitativa, nesse tipo de pesquisa, são utilizados recursos estatísticos e
abordagem qualitativa, segundo Triviños (1987).

A autora Laurence Bardin, em seu livro sobre a análise de conteúdo de intitulado de


“L'analyse de contenu” de 1977, compreende que esse método serve para analisar as
comunicações, principalmente o conteúdo das mensagens, ressaltando-se assim o uso desse
método para a pesquisa qualitativa. Além disso, esse livro é considerado um manual para a
compreensão da operacionalização do método, os princípios e conceitos fundamentais
(CARDOSO; OLIVEIRA; GHELLI, 2021).

Sendo então, a análise de conteúdo uma metodologia de análise de dados que atua na
exploração de mensagens e informações, em trabalhos de natureza fenomenológica, dialética,
etnográfica, entre outras (MORAES, 1999). A qual tem como principais técnicas a análise
categorial; análise do discurso; análise de avaliação; análise de anunciação análise de expressão
e, por fim, a análise das relações (BARDIN, 1977).

Em relação as etapas de uso da análise de conteúdo, a pré-análise se caracteriza pela


organização do material e por reunir as técnicas que serão utilizadas para se alcançar as
informações, estabelecendo o corpus da investigação. Para constituir o corpus, existem regras,
a primeira entre elas é a regra da exaustividade, que implica em acesso a todos os elementos do
corpus.

A segunda regra é a da representatividade, em que a amostra deve ser uma parte


representativa do universo inicial. A terceira regra diz respeito a homogeneidade, em que os
documentos selecionados devem obedecer a critérios. E, por fim, a quarta regra é relacionada a
pertinência, em que os documentos deve ter uma correspondência em relação ao objetivo da
pesquisa.

3. A ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA

A entrevista semiestruturada é importante para a coleta de informações, sendo um


método de pesquisa adequado para o desenvolvimento de estudos que buscam resolver
problemas e perguntas na ciência (MCGRATH; PALMGREN; LILJEDAHL, 2019) utilizada
em muitas áreas, dentre elas, a psicologia. É observado então, que a entrevista semiestruturada
pode ser utilizada como único método ou como um método de apoio (MANZINI, 2012).

É interessante observar que nesse tipo de pesquisa o informante também elabora o


conteúdo e não somente o pesquisador, o que enriquece grandemente a entrevista, pois dessa

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
forma o entrevistado sai da posição passiva e fica em uma posição ativa também, o que pode
resultar em grandes contribuições para a pesquisa.

Dando início a atividade, o pesquisador pode visitar a comunidade com o intuito de


compreender se será bem aceita a realização da entrevista, bem como, obter informações
necessárias sobre o local, selecionar os informantes e realizar a elaboração prévia do roteiro de
perguntas (BATISTA; MATOS, NASCIMENTO, 2019).

Ao iniciar a entrevista, o pesquisador deve explicitar para o investigado seus objetivos


e gravar a entrevista mediante a aprovação do participante, para que dessa forma, no momento
do estudo se tenha todo o material na íntegra, além de realizar anotações sobre observações
importantes. Havendo assim, o enriquecimento do conteúdo, pois se compreendem também os
aspectos individuais daquele participante.

Além disso, tendo em vista o bom andamento da pesquisa, é necessário que o


investigador promova uma experiência agradável e harmônica para o entrevistado,
demonstrando que o que ele tem a contar é relevante e interessante para que o informante
mantenha o interesse e espontaneidade.

Por fim, compreende-se a existência de vários tipos de perguntas que o pesquisador pode
fazer, se ele for da linha fenomenológica deve buscar descobrir os significados dos
comportamentos das pessoas, já a sócio-histórica está em busca de saber as razões do fenômeno
social, o método dialético realiza análise aprofundada dos fenômenos sociais.

4. GRUPO FOCAL

O grupo focal traz a necessidade de se articular os aspectos cognitivos e emocionais por


meio de reflexões, tendo como referencial teórico a psicologia sócio-histórica, com as ideias de
Vygotsky. É compreendido a necessidade de se promover momentos em que seja possível
expressar sentimentos, expectativas, posicionamentos, articulando assim, a emoção e a
cognição.

Essa técnica foi introduzida em 1940 e é trabalhada em várias áreas, como: pesquisas
sociais, marketing, propaganda, comunicação (STEWART; SHAMDASANI, 1990). O baixo
custo da utilização dessa técnica, aliada ao alto nível de dados confiáveis, fez com ela fosse
amplamente utilizada nas pesquisas de marketing (SILVA; TRAD, 2005), e também para os
campos da pesquisa social.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
A metodologia do grupo focal visa interações espontâneas sobre um tema em específico,
fazendo com que os participantes se sintam confortáveis em compartilhar suas opiniões e fazer
contribuições ao grupo, além de considerar as diferentes visões dos sujeitos e dos grupos sociais
a que pertencem (TANAKA; MELO, 2004).

As interações podem ocorrer entre o pesquisador e o pesquisado e também entre os


próprios pesquisados, porém, buscando-se manter o foco em um tema específico. É função do
pesquisador evitar distrações, auxiliando o grupo a manter o foco no tema e analisar os gestos
e os significados das falas dos participantes do grupo focal. Além disso, também é função do
pesquisador criar um ambiente que seja agradável para os participantes, para que possam
discutir e falar sobre os seus pontos de vista (MINAYO, 2000).

Em relação a aplicação, a metodologia do grupo focal é aplicada com o intuito de que


os participantes compreendam a própria experiência, levando em consideração as perspectivas
cognitivas e emocionais relacionadas, baseando-se na comunicação e interação (KITZINGER,
2000). Um exemplo de utilização da técnica, é que inicialmente seja aplicado um questionário
com questões básicas, depois solicitado que os participantes respondam as questões propostas,
realizando-se dinâmicas relacionando a trajetória pessoal dos participantes com as práticas que
estão sendo discutidas dependendo do contexto.

Por fim, podem ser realizadas análises dos núcleos de significação, em que é aberto um
espaço de diálogo para expressar sentimentos, experiências, valores, afetividade e reflexões
articulando a cognição e emoção. Buscando compreender, de acordo com a teoria Vygotskiana,
o percurso de vida e seu desenvolvimento pessoal e profissional, reconhecendo suas bases
afetivo-volitiva.

5. OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

A observação participante é uma técnica que vai muito além do descrever, é a busca
minuciosa sobre o fenômeno como o seu todo (RICHARDSON et al., 2012) procurando
explicar, identificar o sentido e a dinâmica do que se está observando, em busca de compreender
as pessoas e suas atividades na realidade da ação, onde o investigador tem contato direto com
os observados e recolhe os dados de forma sistemática, a qual passa por processos de validação
e controle.

O investigador é quem recolhe os dados e os interpreta, com ênfase na interpretação


individual, para fazer isso é necessário consciência e compreensão sobre os significados de
ações e interações sociais, tendo a habilidade em estar com as pessoas em campo, observando

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
de forma sistemática. Tendo em vista a sistematização da observação, Leininger (1985)
desenvolveu um método que contém quatro fases: observação inicial, observação inicial com
alguma participação, participação com alguma observação e observação reflexiva.

Já para Lapassade (1991), existem três tipos de observação participante, sendo elas:
observação participante periférica: o qual o observador apresenta certa implicação no grupo; a
observação com participação ativa, em que o observador participa das atividades; e por fim, a
observação participante total, que possui indicação de estudos etnometodológicos.

É necessário haver flexibilidade, como por exemplo no grau de participação do


observador, como citado anteriormente pela literatura especializada. Como também, é
necessário haver a escuta e observação dos comportamentos por parte do observador e o
estabelecimento de uma relação de confiança entre o pesquisador e o participante (BERNARD,
2006).

Por fim, é compreendido que para a realização do estudo é utilizado o caderno de campo
para fazer as notas, tendo como foco os objetivos, para evitar a dispersão, além de tempo de
duração de atividades flexível. Tendo isso em vista, é acentuada a grande importância da
realização de notas de modo sistemático, para conseguir refletir posteriormente sobre a
experiência a que foi observada.

6. PESQUISA-INTERVENÇÃO

A pesquisa-intervenção aborda a perspectiva sócio-histórico-política - a qual possui


forte influência do movimento institucionalista, (ROCHA; AGUIAR, 2003) - construindo
novas bases para as ações dos psicólogos nas instituições, utilizando-se das pesquisas de campo,
a qual entende o papel do pesquisador no sentido de modificar o objeto de estudo no campo,
produzindo assim conhecimento.

Tendo como alvo desordens para então realizar análises visando otimizar recursos e
relações, tendo como objetivo também a mudança da ordem social com a articulação da teoria
e da prática para promover transformações sociais e políticas, se preocupando com o coletivo.

A pesquisa-intervenção tem caráter socioanalítico, o qual indaga sobre a ordem da


relação que exclui os sujeitos, com intuito transformador da realidade social e política. A
concepção de sujeito e grupo faz uma crítica a teorias estruturalistas, a equivalência sujeito-
indivíduo e a noção de consciência unitária, pois considera os sujeitos e grupos como sendo
heterogêneos, subjetivos, plurais, contendo multiplicidade. Tendo isso em vista, a relação entre

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
pesquisador, participante e fenômeno é determinante para os caminhos da pesquisa (AGUIAR;
ROCHA, 1997).

A pesquisa-intervenção amplia o nível de análise para o microssocial, realizando


pesquisas de campo com a utilização de diários de campo, que atuam como ferramenta do
pesquisador no campo (KROEF; GAVILLON; RAMM, 2020) levando então o debate acerca
dos conhecimentos do pesquisador, seus desejos, angústias, dificuldades e avanços.
(PEZZATO; L’ABBATE, 2011)

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse trabalho foram apresentadas reflexões acerca de alguns tipos de pesquisa


qualitativa utilizados na psicologia e nas ciências humanas de forma geral e considerações
acerca da polissemia que caracteriza esse tipo de pesquisa. Além da discussão sobre o contato
do pesquisador com a situação estudada, a subjetividade dos participantes e pesquisador podem
ser descritos como a noção-chave, promovendo uma ampla compreensão dos fenômenos em
estudo.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
DOI 10.47402/ed.ep.c23113510289

CAPÍTULO 10
A PRÁTICA DA TENDÊNCIA ATUALIZANTE PELAS PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA NO ENFRETAMENTO DOS DESAFIOS PARA A PERMANÊNCIA
NO ENSINO SUPERIOR

Iarley Pereira de Sousa


Leilane Menezes Maciel Travassos
Romércia Batista dos Santos

RESUMO
As pessoas com deficiência tiveram seu direito de acesso ao ensino superior e técnico de nível médio, no Brasil,
com o advento da Lei n. 13.409/2016, que incluiu estes cidadãos no rol dos tutelados pelo sistema de cotas. No
entanto, muitos são os desafios que as pessoas com deficiência enfrentam para permanecer no ensino superior.
Este estudo objetivou discutir a percepção que os discentes com deficiência dos cursos de graduação do Centro de
Ciências Jurídicas e Sociais (CCJS) da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), possuem desses
desafios e quais as estratégias de enfrentamento são criadas por eles O marco teórico utilizado foi a Abordagem
Centrada na Pessoa, de Carl R. Rogers, especificamente, discutindo-se o conceito de tendência atualizante. A
pesquisa teve caráter básico, de abordagem qualitativa e descritiva, tendo como amostra, sete pessoas com
deficiência, entre 18 e 53 anos, sendo quatro do sexo feminino e três do sexo masculino. Seis dos participantes
ingressaram na universidade por meio do sistema de cotas para pessoas com deficiência; dois possuem deficiência
visual, um possui deficiência auditiva e quatro possuem deficiência física. Para coleta de dados, aplicou-se uma
entrevista semiestruturada. Os dados coletados foram submetidos a uma análise de dados qualitativa, por meio da
análise de conteúdo de Bardin (2016). Os principais desafios identificados foram: as dificuldades financeiras,
demonstrando que a pobreza e a deficiência são marcas de uma sociedade desigual; problemas de infraestrutura
da instituição e na falta de estratégias pedagógicas adequadas por parte dos docentes; falta de abertura no meio
acadêmico para acolher e conviver com a diversidade que gera o preconceito e a exclusão; dentre outras. Como
estratégias de enfrentamento identificou-se a tendência atualizante, um fator protetivo (religiosidade) e a presença
de grupos de apoio (família, amigos), embora os participantes não os identifiquem como tal porque a visão é que
um grupo de apoio é algo institucional e, neste sentido, os participantes pouco conseguem identificar a sua
existência, no âmbito acadêmico.

PALAVRAS-CHAVE: Percepção. Desafios. Enfrentamento. Educação Inclusiva. Tendência


Atualizante.

1. INTRODUÇÃO

1.1 O acesso ao ensino superior das pessoas com deficiência

As discussões referentes aos direitos educacionais das pessoas com deficiência


começam com a elaboração dos conceitos de educação especial, dividida em suas categorias:
educação exclusiva e educação inclusiva.

Segundo o art. 58 da Lei n. 9394/1996 (Diretrizes e Bases da Educação Nacional),


educação especial seria a área da Educação que possui a finalidade de acompanhar e
proporcionar a aprendizagem das pessoas com necessidades educacionais especiais, entre elas,
as pessoas com deficiência. Segundo Sousa (2013), o objetivo é que as pessoas com deficiência

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
tenham acesso à educação e possam ser instruídas, segundo seu ritmo e seus processos próprios
de aprendizagem. A educação especial se subdivide em duas modalidades: a educação exclusiva
e a educação inclusiva.

A educação exclusiva entende que as pessoas com deficiência devem todas estudar nos
mesmos locais, adaptados a promover sua aprendizagem de forma especializada. Assim, por
exemplo, pessoas dom deficiência visual devem todas serem reunidas num mesmo instituto
especializado em educá-las, como nos chamados Institutos de Cegos (SOUSA, 2013).

A educação inclusiva, segundo Sousa (2013), defende um processo de inclusão das


pessoas com deficiência na rede regular de ensino, independentemente, do nível escolar. O
convívio escolar nas salas regulares de ensino, teria papel importante, no processo de
aprendizagem das pessoas com deficiência, além de promover em todas as pessoas, com ou sem
deficiência, os valores de igualdade e de respeito, a ideia de que todos são cidadãos, têm os
mesmos direitos e podem desenvolver suas capacidades, se forem respeitados em sua dignidade
e se forem oferecidos os meios necessários. As situações específicas de aprendizagem das
pessoas com deficiência seriam contempladas por meios acessórios, como as salas de
Atendimento Educacional Especializado (AEE) que funcionam em contraturno do período em
que a pessoa com deficiência está matriculada na sala regular e do apoio de monitores.

O art. 6.º da CRFB/88, formalizou o direito a educação como direito social de todos os
cidadãos brasileiros, independente, de seu nível econômico, crenças, identidades culturais ou
deficiências. A CRFB/88 ainda diz que é dever do Estado garantir a educação inclusiva a todos
que dela precisem (art. 208, III). Este direito também é garantido pela Lei de Diretrizes e Bases
da Educação, Lei n. 9394/1996 (art. 58, 59 e 60).

No Brasil, está em vigor a Lei n. 12.711, de 29 de agosto de 2012, que estabeleceu regras
para o que se conhece por “sistema de quotas” para o ensino superior, apresentando os critérios
de acesso, nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível
médio, para grupos vulneráveis socialmente. A princípio, esta ação afirmativa estatal abrangia
apenas pessoas oriundas de escolas públicas, de baixa renda, negros, pardos e indígenas.

No entanto, em 28 de dezembro de 2016, esta referida lei sofreu alterações advindas da


Lei n.º13.409, de modo que as pessoas com deficiência também se tornaram beneficiadas pelo
“sistema de quotas”. Este fato representou uma reparação histórica a um grupo de pessoas,
costumeiramente, vitimado pela segregação e pela exclusão social.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Observou-se que apesar de ter o direito ao acesso ao ensino superior nos últimos anos,
há poucos alunos com deficiência nas universidades brasileiras. Poderiam ser apontados
diversas explicações para este fato e todas, passariam, necessariamente, pelo caráter de exclusão
impregnado nas sociedades capitalistas, em que as pessoas com deficiência cumprem: uma
função econômica, como parcela de um exército reserva e uma função ideológica, sendo
mantidas numa posição de inferioridade.

No entanto, a ideia aqui não é discorrer sobre esta constatação, mas sobre a permanência
das pessoas com deficiência dentro das universidades do país, considerando as estratégias de
enfretamento dos inúmeros desafios encontrados por estas pessoas ao cursarem o ensino
superior. Desafios que vão desde uma infraestrutura e currículos inadequados até a realidade da
reprodução da segregação social no meio universitário.

Dessa forma, se propõe aqui uma reflexão sobre a questão da inclusão social das pessoas
com deficiência no ensino superior, a partir dos conhecimentos da Abordagem Centrada na
Pessoa (ACP) desenvolvida por Carl Rogers, com foco no conceito de tendência atualizante,
como elemento de contribuição para o enfrentamento dos desafios, por parte das pessoas com
deficiências.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP)

A abordagem centrada na pessoa (ACP) foi concebida por Carl Rogers, como fruto de
sua atuação profissional. Pertence as teorias de base existencial humanista e fenomenológica,
assim como a Gestal-Terapia, de Fritz Perls e a Logoterapia, de Viktor Frankl. Rogers
desenvolve o seu pensamento a partir de duas tendências: a tendência a realização, que seria
característica da vida orgânica e a tendência formativa, própria do universo.

A tendência a realização, também chamada de tendência atualizante, seria a capacidade


que todo indivíduo possui de crescer, de realizar-se, de construir-se. Seria uma capacidade
positiva de todo ser, ou seja, o organismo tende a progredir e não a destruir-se, tende a
preservar-se e evoluir, não ao caos. Nas palavras do próprio Rogers (2009, p. 40):

Podemos dizer que em cada organismo, não importa em que nível, há um fluxo
subjacente de movimento em direção à realização construtiva das
possibilidades que lhe são inerentes. Há também nos seres humanos uma
tendência natural a um desenvolvimento mais completo e mais complexo. [...]
A tendência realizadora pode, evidentemente, ser frustrada ou desvirtuada, mas
não pode ser destruída, sem que se destrua também o organismo (ROGERS,
2009, p. 40).

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Rogers (1983) afirma que as pessoas possuem dentro de si, diversos recursos para
modificar seus autoconceitos, suas atitudes e seu comportamento autônomo. Estes recursos são
ativados se houver um clima que propicie esta realidade.

Já a tendência formativa não seria algo de cada organismo, mas no próprio Universo.
Para Rogers (2009), o Universo não estaria tendendo para o caos, a desordem e a destruição,
no que comumente se chamada de entropia. Ao contrário, o universo teria uma tendência
constantemente atuante em direção a uma ordem crescente e a uma complexidade
interrelacionada, visível tanto no nível orgânico como no inorgânico. Esta também poderia ser
chamada de sintropia (ROGERS, 2009).

Dessa forma, é fácil perceber que a ACP possui uma imagem positiva do ser humano.
O homem não é um indivíduo doente, patológico, mas alguém, essencialmente bom. O objetivo
da psicoterapia é potencializar o que o indivíduo possui de bom. Portanto, não se demora nas
imperfeições do homem, mas em suas virtudes e capacidades.

Outra questão importante é a centralidade no presente da pessoa e não em seu passado.


O indivíduo é levado a liberdade e a autoconsciência para que, ele mesmo, encontre respostas
as suas perguntas e resoluções para seus problemas, a partir da autorreflexão e da busca do que
ele mesmo possui de instrumentos para enfrentar as situações que lhe ocorrerem (ROGERS,
2009).

Rogers (1983) apresenta a necessidade da formação para que o indivíduo possa viver
em harmonia e congruência consigo mesmo. Para tanto, seria necessária, entre outros fatores, a
tendência realizadora.

Aplicando a teoria rogeriana à educação inclusiva, observa-se que Rogers (1985)


afirmava que o grande desafio das instituições de ensino seria proporcionar um ambiente
favorável, onde os docentes e discentes sintam-se livres para novas descobertas, sem que sofram
nenhum tipo de censura ou pressão externas, de modo que cada um seja o que é, sem se enganar.
Rogers (1985) propõe o que chamou de aprendizagem autoiniciada, que une sentimento e
intelecto. Seria uma aprendizagem socialmente útil porque incorpora um processo de mudança
no indivíduo, que aprende a aprender e se abre para novas experiências e novos conhecimentos.
A aprendizagem depende da experiência pessoal do discente, da vivência integralizada das
experiências. É essa atmosfera que a educação inclusiva precisa proporcionar, para que haja
efetiva aprendizagem.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Para Almeida (2002), Rogers defende que os docentes que exploram a pessoa criativa
de seus alunos, possibilitam um ambiente de liberdade de expressão e respeito mútuos. E essa
atmosfera é essencial para a educação inclusiva. A valorização do afeto é determinante, pois o
ato de aprender reúne aspectos cognitivos, mas também afetivos.

Lima, Barbosa e Peixoto (2018) escrevem que o modelo autoiniciado, caracterizado pela
aprendizagem de forma significante e centrada na pessoa, permite que todo e qualquer
indivíduo, independentemente de suas limitações, sejam biológicas ou cognitivas, se adapte às
modificações próprias da vida, de forma contínua, pois a vida é feita de mudanças, o que hoje
é estabelecido como certo, pode mudar amanhã. Onde existir um ser fenomenológico, haverá
mudanças. Não existem seres estáticos.

Zimring (2010) afirma que Rogers sugere, a partir de seu conceito de “não-diretividade”
e de sua experiência clínica, que os docentes deveriam ter posturas similares a um terapeuta no
trato com seus discentes, fazendo uso das atitudes facilitadoras (a autenticidade, a empatia e a
aceitação incondicional). Assim, o professor acolheria e compreenderia seu aluno, oferecendo
estima e presença nas experiências de novas descobertas, o que consolidaria uma aprendizagem
verdadeira. Para tanto, o professor deveria trabalhar a autenticidade, a empatia e a aceitação
incondicional em si mesmo, para adquirir uma atitude humanizada. Percebe-se o quanto essa
concepção é necessária à educação inclusiva.

A autenticidade, também chamada de sinceridade ou congruência, é a capacidade que o


docente ou o terapeuta deve ter de ser ele mesmo, sem máscaras, sem subterfúgios e sem
fingimentos. Ele deve ser o mais verdadeiro possível, removendo entraves de caráter pessoal e
profissional. Ser transparente seria a capacidade de conhecer o fluxo da vivência que ocorre
no seu íntimo, um fluxo marcado pela complexidade e pela mudança contínua, afirmou
Rogers (1977). Se o discente percebe esta verdade por parte do docente, ele também tenderá a
ser verdadeiro em suas colocações.

A segunda atitude facilitadora seria a aceitação incondicional, também chamada de


interesse ou consideração. Não seria uma convivência pacífica com um indivíduo em um
momento específico, no caso na aula, mas uma aceitação de cada elemento da experiência que
o discente vive. O docente aceitaria e acolheria o que quer que o discente seja na sala de aula.
Esse acolhimento incondicional e total possibilita a mudança positiva do discente. O interesse
do docente é uma consideração integral do discente, não pode ser nem possessivo, nem
condicionado a algo (ROGERS, 1977)

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
A terceira atitude facilitadora é a compreensão empática ou simplesmente, empatia. É
uma aproximação do professor da vivência do aluno, num processo de percepção e de
experimentação dos significados dessas vivências, objetivando uma devolutiva de sentido.
Seria confirmar que, ao ser compreendido, o indivíduo existe (ROGERS, 1977).

O próprio Rogers (1983, p. 38) deixa claro que “se as pessoas são aceitas e consideradas,
elas tendem a desenvolver uma atitude de maior consideração em relação a si mesmas.”

Souza, Lopes e Silva (2013) afirmam que Rogers entende que o ato de aprender é
peculiar, individual, singular, de modo que a vivência subjetiva precisa ser considerada. O
discente assimila apenas o que lhe convém, o que relaciona ao seu contexto e dá importância.
O docente precisaria aceitar incondicionalmente o discente, em seus medos, hesitações e ritmo
de aprendizagem.

Ainda prelecionam Lima, Barbosa e Peixoto (2018) que Rogers dá ênfase a inclusão
como um processo, que conjectura uma evolução permanente, antecipando a concepção do “eu”
do indivíduo estabelecido neste processo. As pessoas se constituem, no cotidiano, por meio das
interações que estabelecem, conforme se tornam um “outro” para algum sujeito, perfazendo um
entrelaçado de “eus”. Ou seja, o “eu” (componente individual) articula-se com o “outro”,
formando conexões. Quanto mais entrelaçado com diversas pessoas, mais os indivíduos
evoluem, por meio da interação social.

Desse modo, ou seja, acolhendo a pessoa em sua integralidade, valorizando suas


potencialidades, é possível favorecer a aprendizagem. Essa é a grande mudança que precisa ser
posta em prática na educação inclusiva, para promover o crescimento de cada indivíduo.

3. METODOLOGIA DA PESQUISA

Para corroborar a hipótese de que a tendência atualizante pode de Rogers pode colaborar
para que as pessoas com deficiência desenvolvam estratégias de enfrentamento aos desafios
para a sua permanência no ensino superior, aplicou-se uma pesquisa com discentes do Curso
de Bacharelado em Direito do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais (CCJS) da Universidade
Federal de Campina Grande (UFCG).

A pesquisa teve caráter básico, de abordagem qualitativa e descritiva, tendo como


amostra, sete pessoas com deficiência, entre 18 e 53 anos, sendo quatro do sexo feminino e três
do sexo masculino, escolhidas aleatoriamente, entre os discentes matriculados no semestre
letivo 2020.1. Como critérios de inclusão escolheu-se: matrícula ativa num dos cursos de
graduação do CCJS/UFCG, diversidade dos tipos de deficiência, independentemente, do

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
discente ter sido aprovado no sistema de cotas ou não e do período que o aluno estivesse
cursando. Adotou-se como critério de exclusão, que os participantes sejam maiores de idade,
ou seja, tenham 18 (dezoito) anos completos ou mais.

Seis dos participantes ingressaram na universidade por meio do sistema de cotas para
pessoas com deficiência; dois possuem deficiência visual, um possui deficiência auditiva e
quatro possuem deficiência física. Para coleta de dados, utilizou-se uma entrevista
semiestruturada composta por quatro questões: uma perguntou se a pessoa identificava algum
desafio à sua permanência no seu curso e ter uma boa aprendizagem; outra sobre que
dificuldades eram percebidas pelas pessoas com deficiência no seu curso e para a sua
aprendizagem; outra sobre como elas enfrentam essas dificuldades e a última, se a pessoa
conhecia alguma rede apoio diante do enfrentamento desses desafios percebidos.

Os dados coletados foram submetidos a uma análise de dados qualitativa, por meio da
análise de conteúdo de Bardin (2016). Entre os objetivos da pesquisa, estava compreender se,
na fala das pessoas com deficiência, há elementos do conceito rogeriano de tendência
atualizante, na criação de estratégias de enfrentamento para sua permanência no ensino
superior.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 A percepção das pessoas com deficiência quanto aos desafios que enfrentam no ensino
superior

Quando da aplicação da entrevista semiestruturada, segundo instrumento utilizado nesta


pesquisa, a primeira questão que a mesma trazia não indagava diretamente quais os desafios
que as pessoas com deficiência enfrentavam, para que não se enviesasse as respostas.
Perguntou-se, então, se o participante identificava alguma dificuldade para permanecer no seu
curso e ter uma boa aprendizagem. Todos os participantes responderam que sim. No entanto,
apenas três deles, já apontaram algumas dessas dificuldades, na resposta desta questão. Os
demais apenas afirmaram a existência.

A segunda questão da entrevista semiestruturada perguntava quais eram as dificuldades


que os participantes percebiam existir para que permanecessem em seu curso e tivessem uma
boa aprendizagem. Apesar de alguns terem citado outros pontos, quase todas as respostas se
concentraram nos problemas de infraestrutura da instituição e na falta de estratégias
pedagógicas adequadas por parte dos docentes. Isso significa que, apesar do direito ao acesso
das pessoas com deficiência à educação, independentemente do nível e modalidade, estar

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
assegurado juridicamente, na prática, as instituições e os docentes não estão preparados para
oferecer um ensino de qualidade e o necessário para que estas pessoas tenham sua dignidade
humana respeitada.

Barros, Silva e Costa (2015) escrevem que embora já se tenha um efetivo jurídico-
institucional de políticas alinhadas com as propostas e objetivos defendidos pela educação
inclusiva, existe uma distância razoável entre as ações político-jurídicas e o a realidade nos
ambientes escolares. As autoras apontam que não se podia ter outro resultado que essa
discrepância, visto que estes postulados oficiais são oriundos de um mundo globalizado e
neoliberal e que, no fim, a educação inclusiva pode estar, na verdade, restringindo a efetividade
da inclusão.

É de suma importância, visualizar as falas dos participantes, dada a riqueza dos


depoimentos, conforme se apresenta no recorte da narrativa do Entrevistado 1 (2020,
informação verbal concedida em 12/04/2020): “os recursos e a pouca atenção dada pela
instituição e por alguns professores faz com que a pessoa muitas vezes se sinta menosprezado
só por causa da deficiência que possui. Isso muitas vezes faz com que falte estímulo e vontade
para estudar e seguir em frente”

A fala deixa nítido que tanto os problemas estruturais como a “falta de atenção” de
alguns professores têm gerado um sentimento de desestímulo ao participante, inclusive,
sentindo-se excluído por causa de sua deficiência. Ou seja, a falta de abertura no meio social
para acolher e conviver com a diversidade, gera o preconceito e a exclusão.

O Entrevistado 5 (2020, informação verbal concedida em 19/04/2020), que possui


deficiência visual, apontou como principal problema, os instrumentos de avaliação que não
estão adequados às suas necessidades educacionais. Ela relata (2020):

A maior dificuldade são as provas, pois na maioria das vezes os professores elaboram
provas com letras muito pequenas para haver economia de papel. E isso me causa
muita dificuldade no momento de ler a prova com nitidez, causando assim prejuízo
no meu desempenho no momento da avaliação. O ideal é que houvesse prova
ampliada. Tenho dúvidas se os professores sabem da existência de alunos portadores
de necessidades especiais no campus. Acredito que não (Entrevistado 5, 2020,
informação verbal concedida em 19/04/2020).

Três participantes trouxeram a realidade da dificuldade de locomoção, por morarem em


outros municípios, diferentes de onde se localiza o CCJS/UFCG. Os três possuem deficiência
física e relataram muitos percalços que enfrentam para continuar estudando. Neste sentido,
destaca-se a fala do Entrevistado 3 (2020):

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Desde o início venho tendo uma enorme dificuldade em questão ao deslocamento
todos os dias da minha residência, até a universidade, pois moro em outra cidade, onde
faço um percurso de 2 horas, dela até Sousa, já vi algumas formas cabíveis para mudar
isso, mas infelizmente foi sem sucesso, principalmente a de mudar de cidade, só que
como sou deficiente e dependente de muita ajuda, para isso acontecer, tinha que vim
minha família comigo, onde seria uma coisa nova pra todos, tornando-se assim, cada
vez mais complicado, enfim levando em consideração, que essa rotina se torna muito
cansativa, criando assim também um cansaço mental, dificultando um pouco na
aprendizagem. Segundamente, queria ressaltar também que a universidade não é
totalmente acessível, tanto que evito até sair de sala, pois o calçamento não é bom no
deslocamento (Entrevistado 3, 2020, informação verbal concedida em 12/04/2020).
Observa-se, ainda, que a fala do entrevistado 3 (2020) reforça as dificuldades da
estrutura da instituição, apontando a carência no tocante a acessibilidade em todo o campus. No
entanto, a questão da acessibilidade será melhor abordada quando se discutir as respostas
referentes ao terceiro instrumento da pesquisa.

Também foram apresentadas dificuldades que não dizem respeito a questões ligadas à
deficiência, mas que são preocupações do cotidiano de uma instituição de ensino superior,
como: métodos pedagógicos de alguns professores, número elevado de alunos nas salas, pouco
acesso à extensão e à pesquisa, pouco material disponível e, muitas vezes desatualizado, para
as demandas do Curso de Direito.

Salienta-se, ainda, as dificuldades de caráter subjetivo, que os participantes colocaram.


O Entrevistado 2 (2020, informação verbal concedida em 12/04/2020) disse: “não tenho uma
boa e suficiente integração com a turma ao qual estou inserido, tem as exceções, claro [...], me
causa de certa forma um isolamento e pode acrescentar uma margem negativa no meu
desempenho de aprendizagem.”

O discente não quis aprofundar sobre o que lhe causava este desconforto emocional, se
era vítima de preconceito, por exemplo. Dois participantes colocaram situações que enfrentam
em suas famílias. Já o Entrevistado 4 (2020) revelou um sentimento de inferioridade com
relação aos seus colegas de turma, ao passo que, trouxe o elemento das ausências em sala por
conta do acompanhamento médico que realiza diante da sua deficiência. Ela respondeu (2020):

O sistema de cotas é uma oportunidade única de acesso ao ensino superior mas uma
grande parte dessas pessoas que entram por meio dela não tem uma preparação
adequada para acompanhar o intelecto de outros colegas. No meu caso, a minha
deficiência acabou interferindo bastante no âmbito acadêmico devido as inúmeras
vezes que faltei nas instituições de ensino para fazer o tratamento dela (Entrevistado
4, 2020, informação verbal concedida em 19/04/2020).
Nota-se, portanto, que há uma grande diversidade de dificuldades percebidas, seja no
âmbito acadêmico, social, familiar ou subjetivo, desde desafios de estrutura da instituição à
problemas quanto as posturas docentes. Esse fato demonstra que a permanência das pessoas

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
com deficiência no ensino superior é um tema que merece um aprofundamento e uma atenção
maior por parte de pesquisadores e profissionais. As barreiras enfrentadas não são uniformes e
nem possuem explicações simples. Mas é preciso conhecê-las, para que se possa estudar e
propor soluções reais e satisfatórias.

4.2 As estratégias de enfrentamento aos desafios utilizadas pelas pessoas com deficiência

A terceira pergunta da entrevista semiestruturada indagava como os participantes


enfrentavam as dificuldades que eles percebiam para permanecer no ensino superior e ter uma
boa aprendizagem. É aqui que a pesquisa identifica a tendência atualizante, postulado da teoria
rogeriana, já discutida na fundamentação deste trabalho. De fato, consegue-se identificar
diversas estratégias que remetem à capacidade de crescimento, de desenvolvimento e de
superação das adversidades, nas falas dos participantes.

Santana (2013) cita que diversas sociedades possuem como padrão cultural a construção
de que somente uma pessoa que tenha plena atividade de suas funções atinge suas atribuições
sociais. No entanto, defende que essa condição cultural não pode impedir que o indivíduo se
torne agente ativo e transformador de sua própria vida. Destaca, ainda, que Rogers fazia
referência ao ser humano como agente transformador e ativo de sua vida.

Rogers e Kinget (1965/1979) dizem que:

[...] a tendência à atualização é a mais fundamental do organismo em sua totalidade.


Preside o exercício de todas as funções, tanto físicas quanto experienciais. E visa
constantemente desenvolver as potencialidades do indivíduo para assegurar sua
conservação e seu enriquecimento, levando-se em conta as possibilidades e limites do
meio (ROGERS; KINGET, 1965/1979, p. 41).
Dessa forma, percebe-se que embora seja inerente a cada pessoa, a tendência atualizante,
pode sofrer limitações dependo do meio em que o indivíduo se encontra. Assim, não se pode
adotar uma postura de acomodação, como se bastasse à pessoa com deficiência “exercitar” sua
tendência atualizante para que todos os desafios fossem vencidos. Faz-se necessário ação
efetiva no sentido de garantia de respeito à dignidade e cidadania destas pessoas. Essa causa
precisa ser assumida pelo Estado, pela sociedade e por todos os cidadãos.

Passa-se a apresentar as respostas dos participantes, para que melhor se visualize o que
se discorreu até agora sobre a tendência atualizante no enfrentamento dos desafios. Assim
respondeu o Entrevistado 1 (2020, informação verbal concedida em 12/04/2020): “Fé em Deus.
Também tenho muita vontade de vencer na vida. Sempre com muita humildade e respeito vou
procurar conversar com aqueles (as) que possa melhorar essa situação. E se precisar usarei a lei
ao meu favor.”

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
O Entrevistado 2 (2020, informação verbal concedida em 12/04/2020): respondeu:
“Procuro me esforçar o máximo possível para solucionar parte desses problemas, buscando me
adaptar a esta nova realidade, esta ‘nova universidade’, tentando o máximo possível desafiar a
desmotivação e frustrações nesta nova fase acadêmica.”

Urbano e Machado (2018) afirmam que a tendência atualizante permite que o ser
humano desenvolva suas potencialidades a partir de suas necessidades reais e assim, possa fazer
suas escolhas, crescendo e se desenvolvendo. E que o faz sem que tenha que abdicar do que
considera enriquecedor para si. É o que se pode observar nas falas dos entrevistados 1 (2020) e
2 (2020) citadas nos parágrafos anteriores.

Já o Entrevistado 6 (2020, informação verbal concedida em 20/04/2020) deixou mais


evidente a utilização da tendência atualizante no processo de enfretamento: “Tendo foco e me
mantendo firme, sabendo diferenciar as diversidades que encontro na frente sempre em busca
de conseguir meus objetivos. Mesmo com tantas batalhas vencerei.”

Observa-se na fala acima, o que Rogers e Kinget (1965/1979) afirmam. Os autores


dizem que o ser humano possui em si condições únicas quando à responsabilidade e a
segurança. Seus comportamentos e atitudes positivos tendem a ser ressaltados diante de
questões negativas.

A tendência atualizante também é encontrada no discurso do Entrevistado 4 (2020,


informação verbal concedida em 19/04/2020): “o acesso que tive a educação não é suficiente e
tão pouco preparatório para um curso superior, contudo, procuro adquirir o conhecimento
perdido para acompanhar com uma menor dificuldade.”

Pode-se perceber, na fala acima, o que Justo apud Urbano e Machado (2018) traz sobre
a tendência atualizante. O ser humano, em sua totalidade, apresenta “uma tendência essencial
a adaptar-se, situar-se e ampliar-se a novas necessidades, de modo a propiciar o seu
crescimento. A Tendência à Atualização conduz o ser humano a fortificar-se quanto a sua
autonomia” (URBANO; MACHADO, 20018, p. 5). As ações humanas serão vistas como
necessidades em acrescer, independentemente da reação, pois todo indivíduo possuiria a
realização de seus potenciais como algo necessário (JUSTO, 1987, apud URBANO;
MACHADO, 2018).

Observou-se, ainda, que os participantes ressaltam em suas falas, a importância dos


grupos de apoio social em que se inserem. O grupo mais relevante é a família. Os entrevistados
4 (2020) e 7 (2020) citam que a família ajuda com as questões financeiras. Já o entrevistado 3

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 123


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
(2020) fez o seguinte depoimento, onde se percebe a tendência atualizante, além do apoio
familiar e do fator protetivo da religiosidade:

Primeiramente, pelo fato de querer muito e por ter sido uma coisa que sempre esteve
incluído em meus sonhos e planos, conquistar não fácil, então não é agora que vou
desistir, segundo também por minha família, que junto comigo estão fazendo o
possível para que mais essa conquista seja realizada. Com fé e determinação, Deus
vai me ajudar a chegar lá! (Entrevistado 3, 2020, informação verbal concedida em
12/04/2020, grifo nosso).
O Entrevistado 6 (2020, informação verbal concedida em 20/04/2020) cita seu esposo e
suas colegas de classe como apoio social para enfrentar as adversidades que encontra no curso:
“Procuro estudar e resolver as questões de acordo com minha limitação. E quando há realização
de outra atividade, peço auxílio do meu esposo que também estuda na mesma sala que eu, ou
então das minhas amigas.”

Portanto, os participantes apresentam dois grupos de apoio social: família e amigos de


sala e um fator protetivo: a religiosidade (Entrevistados 1 e 3, 2020, informação verbal
concedida em 12/04/2020).

A quarta questão da entrevista semiestruturada remetia ao apoio social diretamente.


Perguntou-se se o participante conhecia alguma rede de apoio que possa te ajudar nesse
processo de enfrentamento. Apesar de terem citado a família e os colegas de sala como apoio
social, eles não conseguem percebê-los como tal. Os participantes deixaram evidente que
entendem como apoio social como algo de caráter institucional. Tanto que dois citaram as
iniciativas do CCJS/UFCG como apoio social: o psicólogo do Programa de Atendimento ao
Estudante (Entrevistado 2, 2020) e o Núcleo de Assistência Estudantil (Entrevistado 6, 2020).

Chamou atenção, o fato de que a maior parte dos participantes não conhecem ou
afirmam não existir nenhum apoio social. Três (42,8%) dizem não saber informar se existe
alguma rede de apoio e dois (28,6%) afirmam não existir nenhuma rede. O entrevistado 6 (2020,
informação verbal concedida em 20/04/2020) ainda lamenta as poucas bolsas que a
universidade disponibiliza e que “a burocracia é tão grande, que infelizmente desmotiva a
pessoa a buscar.”

Por fim, o único participante a citar o Serviço de Psicologia oferecido pelo Programa de
Atendimento ao Estudante (PAE), no caso, o Entrevistado 2 (2020), não o faz com segurança e
confessa que ainda não buscou essa ajuda:

Fui informado que existe um profissional na instituição disponível nesta área,


creio eu que seja um psicólogo, mas pela indisponibilidade de tempo, ainda não
tive a oportunidade de buscar ajuda, sei que sinto a necessidade de um diálogo,

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 124


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
um desabafo, tipo assim, mas infelizmente nunca busquei essa possibilidade
(Entrevistado 2, 2020, informação verbal concedida em 12/04/2020).
Em suma, o principal apoio social para os discentes com deficiência do CCJS/UFCG é
o grupo familiar, seguido do grupo de amigos. No entanto, não são identificados como tais
porque a visão é que um grupo de apoio é algo institucional e, neste sentido, os participantes
pouco conseguem identificar a sua existência, no âmbito acadêmico. Como a pesquisa possuiu
um viés mais voltado a instituição, é possível que isso tenha gerado alguma dificuldade de
compreensão da questão, no sentido de somente se pensar nos grupos de apoio social como
aqueles que são institucionais.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa pretendeu discutir a percepção dos desafios que as pessoas com
deficiência vivenciam para permanecer no ensino superior e suas estratégias de enfrentamento,
especialmente, depois que este direito lhes foi assegurado com a Lei n. 13.409, de 28 de
dezembro de 2016, que alterou a Lei n. 12.711, de 29 de agosto de 2012, incluindo as pessoas
com deficiência no rol de beneficiados pelo sistema de quotas do ensino superior, seja em
universidades federais, seja nas instituições federais de ensino técnico de nível médio.

Dessa forma, a pesquisa propôs uma reflexão sobre a questão da inclusão social das
pessoas com deficiência no ensino superior, a partir dos conhecimentos da Psicologia,
especificamente da Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) desenvolvida por Carl Rogers. A
pesquisa sugeriu que os alunos com deficiência se utilizam tendência atualizante, como um
possível elemento de contribuição para o enfrentamento dos desafios. Além disso, a pesquisa
identificou a importância dos grupos de apoio social neste enfrentamento, notadamente, da
família, dos amigos e dos grupos religiosos.

O objetivo geral foi alcançado, visto que se identificou os principais desafios percebidos
pelas pessoas com deficiência que são alunas dos cursos de graduação do CCJS/UFCG e suas
formas de enfrentamento. Uma diversidade de desafios foram apontadas: as dificuldades
financeiras, que demonstram que a pobreza e a deficiência são marcas de uma sociedade
desigual; problemas de infraestrutura da instituição e na falta de estratégias pedagógicas
adequadas por parte dos docentes; falta de abertura no meio acadêmico para acolher e conviver
com a diversidade que gera o preconceito e a exclusão; problemas com os instrumentos
avaliativos que careciam de adaptações às necessidades educacionais das pessoas com
deficiência; dificuldades de locomoção, por parte dos que moram em outros municípios,

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 125


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
diferentes de onde se localiza o CCJS/UFCG e as dificuldades de caráter subjetivo
(relacionamento com os colegas, problemas familiares, etc.).

Como estratégias de enfrentamento identificou-se a tendência atualizante, a presença de


grupos de apoio (família, amigos) e um fator protetivo (religiosidade), embora para os discentes
com deficiência do CCJS/UFCG, estes grupos não são identificados como tais porque a visão
é que um grupo de apoio é algo institucional e, neste sentido, os participantes pouco conseguem
identificar a sua existência, no âmbito acadêmico. Encontrou-se, ainda, na fala das pessoas com
deficiência, elementos do conceito rogeriano de tendência atualizante, na criação de estratégias
de enfrentamento, conforme já foi citado anteriormente.

A Psicologia precisa, cada vez mais, discutir e pautar temas de relevo social, como os
direitos das pessoas com deficiência, cumprindo um importante papel na sociedade,
contribuindo como ciência e profissão, como se esboçou, nesta pesquisa.

REFERÊNCIAS

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histórica. In: PLACCO, V. M. N. S. (Org.). Psicologia & educação: revendo contribuições.
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BRASIL. Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação


nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm>. Acessado
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BRASIL. Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades
federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm>.
Acessado em: Nov. 2019.

BRASIL. Lei nº 13.409, de 28 de dezembro de 2016. Altera a Lei nº 12.711, de 29 de agosto


de 2012, para dispor sobre a reserva de vagas para pessoas com deficiência nos cursos técnico
de nível médio e superior das instituições federais de ensino. Disponível em: <

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 126


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jurídica. 2013. 105 p. Originalmente apresentada como dissertação de mestrado. PPGD/UFPB,
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professor-aluno. Revista de Ciências Humanas. v.13. n.2. Viçosa, 2013. p.407-420

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ZIMRING, F. Carl Rogers. Tradução e organização: Marco Antonio Lorieri. Recife: Fundação
Joaquim Nabuco; Massangana, 2010.

ENTREVISTA CONCEDIDA

ENTREVISTADO 1. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no


enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 12 de abril de 2020.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
ENTREVISTADO 2. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no
enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 12 de abril de 2020.

ENTREVISTADO 3. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no


enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 12 de abril de 2020.

ENTREVISTADO 4. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no


enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 19 de abril de 2020.

ENTREVISTADO 5. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no


enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 19 de abril de 2020.

ENTREVISTADO 6. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no


enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 20 de abril de 2020.

ENTREVISTADO 7. A prática da tendência atualizante pelas pessoas com deficiência no


enfrentamento dos desafios para a permanência no ensino superior. Entrevista concedida a
Iarley Pereira de Sousa. Sousa, 20 de abril de 2020.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
CAPÍTULO 11
ANÁLISE DA ATIVIDADE DE TRABALHO DE
UMA TECNÓLOGA EM RADIOLOGIA:
ESTUDO DE CASO

Edizângela de Fátima Cruz de Souza

RESUMO
O objetivo do presente trabalho foi analisar a atividade trabalhista de uma profissional da área de saúde, visando
compreender os aspectos relacionados ao sentido e significado do trabalho que exercem forças significativas na
realização do trabalho e da profissão como um todo. Para tanto, o instrumento utilizado foi uma entrevista
semiestruturada com um total de oito perguntas abertas sobre a atividade de trabalho. A participante entrevistada
foi uma tecnóloga em radiologia. A análise mostrou que a profissional considera que o trabalho é algo vital para o
ser humano e que é preciso possuir um sentido e um significado para que este trabalho seja gratificante. Pode-se
concluir com o presente trabalho, portanto, que a entrevistada é uma pessoa realizada em sua vida profissional, a
qual ela atribui sentidos e significados, buscando-se aprimorar cada vez mais em sua área.

PALAVRAS-CHAVE: Psicologia do Trabalho. Análise de Trabalho. Radiologia.

1. INTRODUÇÃO

O trabalho exerce muita influência na vida humana, dessa forma, deve ser considerado
dentro de sua característica de produção e reprodução social, sua natureza e sua relação de
sentido e significado para o ser humano que fundamentam sua relação com a profissão que
realiza (BERNARDO et al., 2017).

O tecnólogo em radiologia, foco de estudo do presente trabalho, é o profissional que


realiza exames de diagnóstico ou de tratamento, processamento de imagens e/ou gráficos,
planejamento de atendimento, organização área de trabalho, equipamentos e acessórios.
Também atua na operação de equipamentos, preparação de paciente para exame de diagnóstico
ou de tratamento, na orientação de pacientes, familiares e cuidadores e trabalham com
biossegurança (CBO, 1985).

A profissão de Tecnólogo em Radiologia surgiu com a descoberta dos raios-x no final


do século XIX por Wilhelm Conrad Rontgen, um físico alemão. Essa descoberta gerou uma
revolução na área da medicina e caracterizou o surgimento de uma especialização médica
chamada radiologia, que proporcionou novas formas de diagnose, como a tomografia
computadorizada, ressonância magnética, ultrassonografia e a medicina nuclear (FRANCISCO
et al., 2005).

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 129


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
A profissão é regulamentada pela Lei Nº 7.394, de 29 de outubro de 1985, a qual também
determina os direitos de jornada de trabalho de 24 horas semanais, piso salarial garantido por
lei de no mínimo dois salários mínimos com adicional de insalubridade de 40%, devido aos
diversos riscos decorrentes do trabalho, cuja relação se dá com as exposições ocupacionais e
torna obrigatórias as inspeções de saúde e uso de dosímetros de radiação (BRASIL, 1985). A
exposição à radiação pode levar a danos no DNA, reações e danos teciduais e, principalmente,
câncer (OKUNO; YOSHIMURA, 2010; OKUNO, 1988).

A relação de importância, sentido e significado do trabalho com o homem é


demonstrada pelo fato de que por mais frustrante, difícil e cansativo que a atividade possa ser
ou se tornar com o decorrer do tempo, ainda existem coisas que causam prazer, seja a
recompensa social, financeira ou a sensação de realização profissional e pessoal, sendo o
trabalho, portanto, uma produção humana acima de tudo (BERNARDO et al., 2017).

Mesmo havendo vários estudos diferentes sobre sentidos e significados, há algo em


comum entre eles: esses são produzidos pelos sujeitos a partir de suas experiências concretas
na realidade (TOLFO et al., 2005). Os significados são construídos coletivamente em um
determinado contexto histórico, econômico e social concreto, ao passo que os sentidos são
caracterizados por ser uma produção pessoal em função da apreensão individual dos
significados coletivos, nas experiências do cotidiano. Sendo que essas transformações que os
sentidos e significados sofrem são construídos por meio de uma relação dialética com a
realidade.

O trabalho pode ser visto e sentido em perspectivas distintas, o qual pode estar associado
a significados de tortura e sofrimento mencionados anteriormente. No entanto, a capacidade de
transformar a natureza também é geradora de significados (CODO, 1997) como justiça,
possibilidade de segurança e de autonomia, de autodesenvolvimento, de relacionamentos
satisfatórios, dentre muitos outros (MORIN, 2001). Ao serem atribuídos significados e sentido
positivos ao trabalho, certamente, sucede-se as tentativas gerencialistas de “motivar” os
trabalhadores.

Codo (1997, p. 26) faz menção que o trabalho pressupõe “[...] uma relação de dupla
transformação entre o homem e a natureza, geradora de significado”. É por meio do trabalho
que o ato de dar significado à natureza se concretiza; de mesmo modo a relação sujeito-objeto
é mediada pelo significado.

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 130


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Essa relação de sujeito-objeto tem relação aos valores de satisfação. Para Hackman e
Oldhan (1975), Morin (1996) define o sentido do trabalho como uma estrutura afetiva formada
por três componentes: o significado, a orientação e a coerência. O significado refere-se às
representações que o sujeito tem de sua atividade, assim como o valor que lhe atribui.

O valor traz como enfoque a satisfação, aquilo o qual se é atribuído algo, e essa relação
de satisfação do trabalho e desempenho estão relacionadas não só ao contexto pecuniário, mas
também aos processos motivacionais entre indivíduo e objeto, visto também por Vroom (1964),
principal expoente da Teoria da Expectância, o processo motivacional é desenvolvido conforme
as percepções que o indivíduo tem da relação entre os esforços que conscientemente estima que
deve realizar para alcançar um determinado objetivo, ou meta, e o valor que lhes atribui.

Para Robbins (2002), a motivação, em termos visíveis nas organizações, é o processo


responsável pelo qual se infere a intensidade, direção e persistência dos esforços de uma pessoa
para o alcance de determinada meta. Assim como indivíduos motivados se mantêm na
realização da tarefa até que seus objetivos sejam atingidos (ROBBINS, 2002).

A motivação tem relação com o sentido de ser, alguns autores trazem o enfoque da
importância desse sentindo, dessa satisfação para que se possa exercer suas atividades e a
influência desse sentido fora do contexto trabalho, como relata Antunes (2000) destaca a relação
entre sentido e trabalho na atual realidade social em uma perspectiva sociológica, para que
exista uma vida cheia de sentido fora do trabalho, é necessária uma vida dotada de sentido
dentro do trabalho, levando em consideração o fato de que além de fonte de sustento, é fonte
de interação e contato social e dá a sensação de se possuir um objetivo (MORIN 1996, 2001).

O trabalho não é apenas visto como algo individual, de forma que ele alcança outras
perspectivas, como meio social, família, e traz um impacto ao alcance social. Para Dejours
(1987), o trabalho precisa fazer sentido para o próprio sujeito, para seus pares e para a
sociedade. O sentido do trabalho é formado por dois componentes: o conteúdo significativo em
relação ao sujeito e o conteúdo significativo em relação ao objeto.

O profissional que entende aquilo que faz, que encontra o sentindo na produção entende
a relação de fazer para transformar, e o contexto do impacto não só no individual, mas o meio
ao qual convive, a análise do trabalho visa sempre, de qualquer modo, compreender para
transformar (SANTOS, 2006).

O trabalho perpassa por mudanças ao longo do tempo, além do contexto da globalização


e em um contexto de forte competição em mercados globais, levando as empresas a acelerarem

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 131


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
sua produtividade e, em muitos casos, vendo o trabalhador como um meio de produção, sem
levar em conta seus aspectos psicológicos, emocionais ou mesmo comportamentais. Para
Assunção (2003), essas exigências culminam como sendo fatores intervenientes na produção e
que podem incorrer em incidentes e variações, mudando, assim, a situação de trabalho.

O objetivo do seguinte trabalho, portanto, foi analisar a atividade trabalhista de um


profissional da área de saúde, visando compreender os aspectos relacionados ao sentido e
significado do trabalho que exercem forças significativas na realização do trabalho e da
profissão como um todo. Para a realização da análise, deve-se compreender não só o trabalho
em si, mas a atividade e a subjetividade envolvida, a diferença entre o trabalho prescrito e o
real, a organização do trabalho e o contexto que ele se desenvolve (SANTOS, 2006).

2. ANÁLISE DOS DADOS

O trabalho para a entrevistada significa ser algo vital à vida do indivíduo, acrescentando
a este termo, que toda atividade, seja esta remunerada ou não, é considerada trabalho. De acordo
com Neves et al. (2017) este tem relação com a perspectiva histórica, com o desenvolvimento
de como ocorre as relações de trabalho e a organização da sociedade, englobando diversos
sentidos que influenciam formação da identidade e dos papéis executados pelo homem no meio
o qual está inserido. Portanto, definir o que é trabalhar é uma tarefa complexa, que possui muitas
faces, e que necessita de diferentes concepções para seja compreendido.

Assim, como é de grande importância, para a profissional exercer o trabalho, essa atribui
a uma pessoa que não desempenha atividades no decorrer do dia, uma função vegetativa, não
fazendo nada.

A atividade de trabalhar para Neves et al. (2017) envolve de maneira geral a


transformação do ser humano e da natureza, de acordo com a necessidade deste, sendo esta
tarefa, fundamental para a continuidade da vida do indivíduo. Além disso, com o capitalismo o
trabalho passou a ser mais favorável para uma determinada classe social, com a exploração de
grupos que sobrevivem do trabalho, e de outros que acumulam recursos, levando à perspectiva
negativa do trabalho.

Diante do exposto na entrevista, percebe-se que há uma relativa quantidade de


atividades exercidas pela interrogada, esta executa funções no setor de radiologia, ministra aulas
e faz pesquisas. Ademais, no relato feito pela profissional, é notável que em todos os campos
de trabalho que esta atua, enfatiza a relação existente com outras pessoas, o que é fundamental
para um bom desempenho.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
As relações de trabalho, segundo Ésther (1998), envolvem algumas esferas como a
organização do processo de trabalho, a gestão da força de trabalho, as condições de trabalho e
os processos de regulação de conflitos. A primeira, se refere ao que é o determinado trabalho,
aos métodos e como os cargos se conectam, a segunda, está associada ao gerenciamento de
recursos humanos, a terceira, envolve aspectos peculiares do trabalho do empregado, incluído
à sua subjetividade, e a última, tem a finalidade de equilibrar e proteger uma estrutura social
que possui diferentes interesses e desigualdade de poder.

Outro tópico relevante abordado na entrevista foi sobre como se dá o processo de


aprendizagem do trabalho, sendo colocado o fator da importância do conhecimento adquirido
na graduação para o desempenho do trabalho e a necessidade de estar se atualizando nos
conteúdos relacionados à sua profissão.

Ainda, de acordo com Souza, Carrieri e Pinheiro (2009), essa relevância da inovação
do conhecimento ocorre pelas modificações nas relações de trabalho, o mercado fica mais
exigente, levando o indivíduo a buscar a sua qualificação profissional.

A partir da resposta da entrevistada acerca do significado em que seu trabalho possui


para ela mesma, foi possível identificar que o exercício profissional pode estar relacionado com
diversas atribuições psicológicas e sociais, como a motivação e a socialização.

Dessa forma, isso é enfatizado por Morin (2001), uma vez que defendeu que, para os
trabalhadores, sua atividade não se restringe apenas à remuneração, mas concebem também que
pode ser um fator determinante para alcançar seus objetivos de vida e se constituir como gerador
de interações sociais.

Enquanto ao que diz respeito ao significado em que seu trabalho apresenta para outras
pessoas, é viável observar que a profissional demonstra a necessidade de ter seu exercício visto
como importante para sociedade. Segundo Tolfo e Piccinini (2007), isso acontece devido ao
fato de que, para o trabalhador, se sua atividade não for considerada útil e não oferecer
contribuições para a população, deixa de fazer sentido. Sendo assim, para o trabalho possuir
sentido, ele precisa abranger as dimensões individuais, sociais e organizacionais.

Além disso, é notório que os pontos positivos do trabalho da entrevistada superam os


negativos, o que, para Dejours (1992), é indispensável para que não o considere como apenas
pela condição da obrigatoriedade, ignorando, assim, os seus aspectos integradores e
abandonando seu lado individual e social.

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 133


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
3. CONCLUSÃO

A entrevista realizada com a tecnóloga em radiologia analisou seu campo de atividade,


bem como sua rotina de trabalho, pretendendo compreender o sentido e o significado da
realização do seu trabalho.

A profissional, que desenvolve seu trabalho como tecnóloga em radiologia há um ano,


considera que o trabalho é algo vital para o ser humano e que é preciso possuir um sentido e
um significado para que este trabalho seja gratificante.

Apesar de possuir mais dois vínculos empregatícios na área, ela avalia cada um, citando
seus pontos positivos e negativos, e afirma que traz grandes contribuições para a sociedade. Por
outro lado, cita como ponto negativo a falta de tempo disponível para aproveitar o tempo de
folga.

Pode-se concluir com o presente trabalho, a entrevistada é uma pessoa realizada em sua
vida profissional, a qual ela atribui sentidos e significados e busca se aprimorar cada vez mais
em sua área. Como toda e qualquer atuação profissional, existem pontos positivos, aqueles que
levam a aos trabalhadores a procurarem sempre otimizar o desempenho, e também pontos
negativos, que podem desmotivar, mas que também podem mover para buscar melhorias

REFERÊNCIAS

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DOI 10.47402/ed.ep.c23113712289

CAPÍTULO 12
EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO PELA FACULDADE CESUSC EM
PSICOLOGIA DO ESPORTE

Rita Adriana Melo Sterling


Marília Santos do Amaral
Guilherme Ribeiro Soares

RESUMO
O presente relatório tem por objetivo descrever e analisar as intervenções realizadas em um clube de remo com
finalidade de alto rendimento, da cidade de Florianópolis. Para isso, foi necessário fazer uma breve revisão
científica e histórica sobre esse tipo de esporte e o local onde são feitas as suas práticas, incluindo aspectos
objetivos e subjetivos do desporto. Foi levado em consideração o mapeamento feito no Estágio Básico I sobre o
local e suas atividades, tendo em conta os comportamentos de todos que interagem dentro do clube de remo, sendo
eles praticantes do esporte ou não, levando em conta a rotina de treinamentos, atuação dos técnicos, a atuação da
diretoria na tomada de decisões dentro da instituição e, principalmente, a relação das pessoas que praticam o
esporte com a finalidade de competições de alto rendimento e as mulheres familiares que fazem o apoio aos
trabalhos realizados dentro do clube. Sendo assim, houve base suficiente para poder desenvolver intervenções
psicológicas adequadas dentro da psicologia, com uma abordagem cognitiva e social do esporte, envolvendo o
grupo paralímpico e o grupo olímpico, ambos existentes dentro do clube, a fim de, tentar promover mudanças que
podem ser temporárias ou permanentes dentro do contexto em que foi realizado o Estágio Básico II.

PALAVRAS-CHAVE: Esporte. Atletas. Atletas Paralímpicos.

1. INTRODUÇÃO

O esporte de alto rendimento tem seu destaque no bem-estar físico, psicológico, social
e, por assim dizer, educativo desde os tempos antigos em que na antiga Grécia já era algo ligado
diretamente à qualidade de vida (MEDEIROS; LACERDA, 2020). Em território brasileiro,
Santa Catarina entra na história como sede de eventos esportivos no remo no ano de 1915, mas
outras localidades do Brasil já́ tinham suas atividades neste esporte aquático desde 1894, onde
o então governador da época Hercílio Luz, teve grande influência na inserção do remo no
Estado de Santa Catarina (DUTRA, 2019).

Tendo o remo no contexto dos esportes de alto rendimento, há que considerar que o
stress é uma constante, já que o atleta para chegar a determinados limites e conseguir alcançar
os seus objetivos, pode vivenciar em alguns momentos transtornos de ansiedade bem como
outros, diretamente ligados à vida de quem tem esta rotina diária de produção esportiva
(COLAGRAI et al., 2022). A liderança exercida, é um dos fatores que pode influenciar na vida
do atleta de alto rendimento, ocupando um papel fundamental no trabalho psicológico desses,
para que assim possam atingir o seu potencial máximo e identificar os melhores métodos para

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
trabalhar no esporte em equipe, sendo esta uma ferramenta fundamental para um bom
rendimento de todos os envolvidos (SONOO; HOSHINO; VIEIRA, 2008).

Visando acompanhar o remo de alto rendimento, no âmbito cognitivo, este estágio tem
por função, colocar em prática ações da psicologia do esporte que possam causar alterações
positivas permanentes ou temporárias dentro de um clube do Sul de Santa Catarina utilizando
técnicas psicológicas da teoria cognitivo comportamental e da psicologia social do esporte com
os atletas, líderes da diretoria, técnicos, atletas e as mulheres familiares que acompanham
aqueles que praticam o remo.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A diferença entre psicologia clínica e psicologia do esporte

Ao observar que há um desafio a ser superado, a psicologia do esporte encontra espaço


para atuar de forma a potencializar habilidades através do trabalho psicológico com ênfase em
áreas cognitivas, comportamentais, emocionais e tudo o que envolve o pensamento e como esse
pode afetar a vida diária de um atleta, principalmente com as pressões que acontecem no
momento pré competitivo e para isso, tanto o treino físico, como o treino psicológico, são
importantes para o bom rendimento e alcance de objetivos de cada competidor (CRP SP, s/a,
s/p). Neste sentido,

As habilidades psicológicas são adquiridas e aprimoradas através do trabalho do atleta


nos treinos e também através de experiências em competições. Assim como as
habilidades físicas, e psicológicas devem ser incorporadas no treinamento diário e ser
integradas em um ambiente de aprendizagem que proporcione o desenvolvimento de
aspectos físicos e emocionais do atleta de forma que seja indissociável da parte
mental. O treino das habilidades psicológicas procura fazer com que o indivíduo
identifique, em seu comportamento, na relação de suas expectativas, objetivos e
potencialidades, os sinais para desenvolver caminhos para reagir e lidar com o
momento da competição e com as pressões que o acompanham muito antes da
competição (CRP SP, n.d, n.p).
As ações do psicólogo do esporte, vão muito além do espaço clínico no contexto de
consultório, sem entrar em detalhes sobre o passado de cada atleta englobando uma série de
atividades que vão desde o acompanhamento singular, até as atividades realizadas em grupo ou
ainda fazendo conexões dentro da instituição para que esse os/as remadores/ras, consigam
atingir níveis satisfatórios de conquistas com o menor stress e melhor rendimento sendo essas
ações as seguintes, segundo o Conselho Regional de Psicologia (CRP, n.d, n.p) do Estado de
Santa Catarina:

As ações dos psicólogos do esporte podem ser concentradas em: a) Desenvolvimento


dos níveis motivacionais para aprimoramento das sessões de atividades físicas, dos
treinamentos e das competições; b) Regulação dos focos de atenção e de
concentração; c) Regulação emocional e dos níveis de ativação; d) Desenvolvimento

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
de habilidades de autoavaliação e de avaliação esportiva de atletas; e) Facilitação de
processos de comunicação funcional entre os membros de equipes esportivas; f)
Desenvolvimento de compreensão de táticas de jogo, por atletas jovens; g) Aumento
de habilidades de resolução de problemas e de tomada de decisões; h) Consolidação
de autoconfiança para alcance de objetivos esportivos realistas; i) Seleção de atletas;
j) ou ainda, busca de equilíbrio psicológico nos ajustes entre atletas que possuem
funções complementares, isto é, em esportes coletivos, identificação dos atletas que,
por suas características de personalidade, podem melhorar ou prejudicar os padrões
de jogo da equipe ao jogarem juntos, o que ocorre, por exemplo, quando a máxima
eficiência tática de uma equipe é conseguida quando ela mescla atletas de definição
com atletas de articulação (CRP SC, n.d, n.p).
Como observado na citação acima, a psicologia do esporte tem a possibilidade de
trabalhar com instituições como um todo, indo além do indivíduo tendo um olhar sobre o todo
como forma de expressão de benefício onde é inserida.

2.2 Remo paralímpico

O Brasil fez história no remo paralímpico desde a sua inclusão nos jogos de Pequim, em
2008, com a paratleta Josiane Lima que conquistou a medalha de bronze para o País juntamente
com outro participante no Double Skiff (2X), sendo ela atleta do (Clube de Regatas Aldo Luz
(CRAL). Este feito se estende ao ponto de poder-se dizer que tanto no paralímpico quanto nas
olimpíadas, foi a primeira vez que o Brasil subiu ao pódio para receber medalhas com o remo
brasileiro (BRASIL, 2020).

No contexto dos paraesportes, os atletas são divididos segundo a sua dificuldade motora
sendo categorizados pela sua limitação física em que o PR1 (Para remo) ou TA (Trunks and
Arms) está designado à tripulação masculina ou feminina remando com o assento fixo com
encosto, o PR2 ou AS (Arms and Shoulders) sendo designado a movimentos de tronco e braço
com assentos fixos e barcos Double Skiff e o PR3 ou LTA (Legs, Trunks and Arms) que está
para o uso de pernas, tronco e braços com assento deslizante e conta com um timoneiro para
guiar o grupo e somente 50% da guarnição pode ter deficiência visual. A classificação se dá
não somente pela lesão corporal do atleta, mas como esta lesão afeta a remada do atleta (CBR,
2021).

Os paratletas enfrentam uma grande discriminação social pela sua condição física, e é
no esporte que eles conseguem superar muitas vezes esta discriminação devido as suas
limitações através dos feitos para conquistar o seu lugar no pódio porém, muito mais que um
ganho de medalhas e troféus, é necessário construir um espaço de visibilidade e valorização
como atleta, e também como cidadão (BRAZUNA; CASTRO, 2001).

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
As experiências e as perspectivas de vida, fazem toda a diferença na maneira como o
atleta e o paratleta irão impulsionar o seu trabalho físico e mental durante a sua trajetória no
esporte nos quais, os afetos marcam presença na vida e as emoções podem servir como

potencialidades na melhora da qualidade física. Sendo assim, alguns aspectos como a


autoaceitação, as relações positivas, a autonomia, o domínio do ambiente, o propósito de vida
e o desenvolvimento pessoal fazem parte de um bem-estar psicológico positivo com atitudes
positivas que refletem diretamente na preparação técnica, física e mental dos atletas
(MEDEIROS; LACERDA, 2020).

As potencialidades para que um atleta paralímpico sirva como exemplo para atletas
olímpicos que tem tendência à baixa autoestima precisam ser estimuladas, uma vez que esses
paratletas são considerados exemplos de luta, constância e tantos outros fatores positivos que
podem servir de um apoio psicológico para aqueles que querem atingir as suas metas, mas não
conseguem por questões psíquicas e não físicas porém, é impossível negar que existem fatores
desafiadores na relação entre o olímpico e o paralímpico tais como: estigma, opressão e
discriminação, que ainda precisam ser socialmente superados (BRAZUNA; CASTRO, 2001).

Mesmo com diversos fatores que impactam os processos psicológicos e sociais, há uma
mudança importante quando há interação grupal entre atletas com deficiências e diferentes
capacidades físicas com o restante dos atletas durante os treinamentos, sendo observado nesta
interação, a diminuição da distância social e ampliação do contato pessoal entre os grupos, o
aumento às potencialidades e a capacidade de trabalho de equipe como um todo, contribuindo
com a redução dos casos de discriminação e com a expansão do nível de entendimento sobre as
dificuldades e sucessos do outro entre os atletas; trata-se de um importante trabalho de
unificação dos grupos, com o objetivo de impulsionar a equipe como um todo a trabalhar
coletivamente para alcançar as metas almejadas para o clube que atuam (SOUZA; MARQUES;
FERMINO, 2020).

2.3 Ansiedade no esporte de alto rendimento

Sendo o remo um esporte de alto rendimento que envolve movimentos amplos, com
capacidades aeróbicas e anaeróbicas, atividades técnicas e táticas para um bom
desenvolvimento, os treinamentos vão desde atividades específicas para a melhora da técnica
da remada, à atividades estressantes de alta velocidade envolvendo alguns elementos químicos
corporais que sofrem alterações hormonais, como no caso da leptina de plasma que dependendo

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da quantidade de stress, age influenciando psicologicamente em cada atleta (MAESTU;
JURIMAE; JURIMAE, 2005).

A leptina age diretamente no Sistema Nervoso Central (SNC) de maneira a aumentar o


gasto energético afetando a ingestão de alimentos quando há um trabalho físico intenso,
trabalhando diretamente com os fatores endócrinos e de metabolismo portanto, fatores
estressantes de atividades físicas, afetam diretamente a leptina que por sua vez, faz com que
haja uma diminuição de injeção e vitamina no corpo, afetando diretamente o SNC aumentando
assim o stress nos praticantes de esportes intensos e por sua vez, afetando a rotina alimentar dos
atletas devido o fator ansiolítico produzido com stress (ROMERO; ZANESCO, 2006).

Porém, a ansiedade não deve ser vista no esporte como um fator meramente negativo, e
sim como um fator positivo quando bem medida e controlada em esportes de alto rendimento,
já que estruturas rígidas com regras pré-estabelecidas fazem parte do dia a dia dos atletas que
devem obedecer a códigos rigorosos para poder atingir as suas metas. Porém, fatores
alimentares, de stress e de ansiedade acabam sendo alterados com os treinamentos intensos,
principalmente quando não há uma moderação entre os treinamentos e os fatores que elevam a
ansiedade, atingindo diretamente o atleta que aumenta o grau de ansiedade a um nível de
transtorno psicológico, como é o caso da teoria da “inversão, da ansiedade multidimensional,
da catástrofe e das zonas individualizadas de performance”, afetando diretamente o seu
rendimento no preparo para as competições (MEDEIROS; LACERDA, 2020, p. 191).

Para o psicólogo do esporte Eli Straw (2021) existem cinco razões que interferem
diretamente sobre a ansiedade do atleta de alto rendimento, que são: a) questões cognitivas as
quais envolvem a preocupação sobre a perfeição, o medo de cometer erros, o medo de sentir
vergonha e a baixo autoestima; b) a resposta comportamental em relação ao perfeccionismo; c)
a baixa autoestima; d) a falta de preparo para a competição, seja em questões físicas e/ou
mentais; e) lembrança dos fracassos anteriores. Visto isso, é compreensível que alguns atletas
expressam comportamento mais agressivo ao terminarem as suas competições, o que requer
muitas vezes a atuação da psicologia do esporte (STRAW, 2021).

2.4 A importância dos líderes no esporte de alto rendimento

O técnico de um esporte de alto rendimento exerce o papel de líder e faz parte de um


todo com responsabilidades elevadas, cobranças de grande porte por parte da diretoria de onde
trabalha, metas bem estabelecidas e funções que exigem grande empenho para poder atingir os
objetivos traçados pela instituição no qual exerce as suas funções. Portanto, necessita atuar de

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
forma precisa nas suas decisões, seja na maneira como trata os atletas ou a si mesmo para poder
atingir o alto rendimento, estabelecido com uma liderança ativa e assertiva (SONOO;
HOSHINO; VIEIRA, 2008).

Além das funções habituais, o técnico é quem conduz o treinamento dos atletas sendo
responsável por dirigir o grupo dentro de um centro de treinamento, responsável por manter um
bom relacionamento entre os praticantes de esporte, não deixando que aconteçam atos de
discriminações mantendo assim, um clima amistoso e de bom conviver entre os atletas, evitando
que elementos negativos influenciem na diária de vida de treinos dos que estão praticando para
competir, tais como raça, idade ou condição física que não podem ser objetos de discriminação
dentro do esporte (MEDEIROS; LACERDA, 2020).

A sinergia exerce um papel importante para conduzir uma equipe de remadores, já que
os técnicos são responsáveis não somente por criar um time, mas fortalecê-lo dentro do que ele
significa para o lugar de trabalho e a grande importância que exerce naquele lugar, porém essa
sinergia não acontecerá se somente uma das partes for a que instrui. Faz-se necessário,
promover espaços de escuta para o atleta, incentivando a troca de informações durante os
treinos de forma clara, assim como na transmissão das ordens sobre os trabalhos que serão
executados, causando desta maneira, uma melhor fluência de comunicação evitando emoções
negativas que não irão ajudar o time a crescer como o esperado tais como a apatia, a ansiedade,
a produção de frustrações e a produção de raiva em determinados atletas (WALINGA, 2001).

As discussões e elementos que possam afetar um ou mais integrantes da equipe, podem


levar o grupo todo a falhar e há uma grande probabilidade de isso acontecer, caso o problema
não seja resolvido de maneira efetiva e positiva para todos, porém, uma equipe que tem boa
sinergia entre si e com o seu líder, tem grandes possibilidades de sucesso não só no trabalho
como equipe, mas também como indivíduos, podendo cada um chegar além dos próprios
limites, como esclarece Goleman (1998).

Como “parceiro” partidário ao trabalho do técnico, os timoneiros são guias que exercem
funções primordiais aliadas aos desejos e parâmetros estabelecidos pelo treinador da equipe,
fazendo com que o barco ande e se comunique de forma adequada e satisfatória para o alcance
dos objetivos traçados e para tanto, reuniões constantes e instruções são passadas aos timoneiros
para que esse, possa agir como um segundo técnico dentro do barco, fazendo com que todos os
integrantes estejam dentro de um padrão e prontos para agir quando necessário. É o timoneiro
que irá se comunicar com os oficiais de prova dentro da água, bem como se assegurará de que

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
o material de uso do barco que timonear, esteja devidamente armazenado e em bom estado após
o seu uso, sendo responsável por todo o desenvolvimento dos integrantes do barco desde antes
da entrada na água, até o seu final, quando o material é guardado na garagem de remos,
desempenhando um papel de apoio importantíssimo na vida laboral do técnico (SEQUIN,
2018).

2.5 A importância da relação entre os membros da Diretoria

Para que um clube de remo se forme, é necessário que haja uma estrutura bem
organizada que possa gerenciar contratos, administrar os gastos de forma clara para todos,
estabelecer regras de conduta do local e do esporte como um todo, tomar ações que impulsione
o crescimento tanto da estrutura física estrutural dos clubes de remo quanto do esporte em si,
traçar estratégias junto ao técnico para garantir um bom andamento físico, social e psicológico
dos frequentadores dos associados e praticantes dos clubes de remo, regular questões desde
sociais até questões pertinentes aos cuidados e melhores interesses dos seus praticantes e da
instituição (KZN, 2012).

Considerando que esse grupo de pessoas que formam uma das lideranças mais
importantes dentro de um clube no que diz respeito a tomadas de decisões, é possível afirmar
que para o melhor interesse de todos no local, é imprescindível uma boa convivência tanto entre
as pessoas que interagem no próprio grupo formador da diretoria, como com atletas
participantes do local, com a Confederação Brasileira de Remo (CBR), e também com outros
clubes locais, a fim de manter uma harmonia entre todos, impulsionando potencialidades para
que os desportistas tenham oportunidades para alcançar grandes metas ao longo de sua trajetória
com o conhecimento previamente adquirido, já que é formada geralmente, por ex praticantes
ou praticantes ativos do esporte (FERGUSON, 2021).

Para que o grupo de uma diretoria funcione bem, é importante que haja diálogo,
flexibilidade para escutar outras opiniões, saber trabalhar em grupo para poder fazer uma boa
liderança, entender da área que está liderando e, principalmente do esporte que está dirigindo
para que as decisões possam ser benéficas para todos (NAVARRO, 2012). Somado a essa teoria
de trabalho colaborativo, Mello et al. (2014) ressaltam que saber aceitar opiniões contrárias, ser
flexível, reconhecer que as pessoas que compõem esse grupo são diferentes, tendo cada uma
delas uma história diferente de vida, mas que estão inseridas em um local que luta por um bem
comum, ter condições de dar feedback dentro de uma ética sabendo colocar-se de maneira
respeitosa de forma que todos possam refletir sobre os pontos de vista de quem os coloca, saber

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distribuir tarefas e trocar ideias de forma construtiva, compõem as características básicas de um
grupo que está pronto para agir em conjunto e fazer o local crescer.

2.6 Vida social e esporte de alto rendimento

Para Burlot, Richard e Joncheray (2016) os atletas de alto rendimento, tem pouca ou
nenhum tempo para poder ter uma vida social fora do espaço de tempo de treino, levando uma
vida sumamente estrita de horários, repleta de regras e muita tensão para poder ter algum tempo
para si ou para outros fora das inúmeras atividades diárias, esses competidores precisam
inventar maneiras de poder estar mais próximo de familiares, amigos e até para ter um tempo
de qualidade sem stress para si.

Elencando a ideia de que o atleta de alto rendimento é um ser que vive dentro de uma
realidade social e cultural, há a percepção de que nem todo atleta de alto rendimento visa
somente a busca pela vitória, mas em muitos casos, está em busca do prazer em adquirir uma
melhor saúde corporal bem como, a superação dos seus limites e para isso, é fundamental o
apoio de fatores externos sendo um deles, a busca por uma atividade prazerosa em um tempo
livre que também possa lhe proporcionar prazer e o apoio no meio em que vive, não se limitando
isso somente ao local das práticas, porém buscando incentivos externos na família e no meio
que vive (RUBIO, 2019).

Por outro lado, o meio em que o atleta de alto rendimento está inserido, é um meio que
não permite uma vida cheia de acontecimentos sociais, permitindo uma rede de comunicação
com rotinas diferenciadas de um trabalhador comum, tendo uma vida social que é afetada ao
chegar ao fim de carreira pela aposentadoria, pois, a separação dos colegas para assumir novos
ritmos com novas perspectivas chega a ser tão assustadora para alguns, que eles resistem ao
máximo ao afastamento tanto dos colegas de treinos, como das rotinas assumidas ao longo da
vida, gerando muitas vezes, sofrimento psicológico que vão de leves a graves, e que podem
levar o atleta a ter dificuldades na relação com álcool e outras drogas e drogas por não suportar
ter que assumir uma posição diferenciada no seu dia a dia (AGRESTA; BRANDÃO; NETO,
2008).

2.7 A memorização como fator de importância e independência psicológica

Se minhas conquistas forem percebidas e minhas dificuldades compreendidas, eu sei


quem sou (AMIRALIAN, 2004, p. 24).
A orientação espacial, é sumamente importante para pessoas com deficiência visual
permitindo que tenham mais independência no local onde escolhem estar, podendo ultrapassar
as barreiras do medo e insegurança, assim como transitar e atuar como pessoa de direito nas

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suas escolhas. Neste sentido, é muito importante, a maneira como é feita essa orientação, já que
deve incluir desde palavras claras, para especificar os objetos que estão ao redor da pessoa com
baixa visão ou cega, até a forma como a pessoa é conduzida, uma vez que através da indução
correta, é possível transmitir um sentimento de segurança caracterizando assim, a possibilidade
da sensação de independência desejada por muitas pessoas cegas ou com baixa visão. Portanto,
a inclusão social em atividades físicas, é muito importante tanto para a família do deficiente
visual, quanto para o atleta que se sentirá mais confiante nas práticas ao conseguir atingir um
grau de independência satisfatório durante as atividades físicas, já que as conquistas pessoais
exercem um grau elevado na percepção pessoal e social nestes casos (MARTINS; BORGES,
2012).

Como cita Samulski e Noce (2002), realizar uma intervenção psicológica com paratletas
voltada a técnicas de relaxamento, visualização, concentração, motivação e que possam
alcançar níveis de estado emocional que proporcionem um bom controle emocional, é uma
forma de motivação não somente para trabalhos individuais, mas também em trabalhos grupais.

E o mesmo é observado quanto à importância de trabalhos de memória e motivação no


esporte de alto rendimento com atletas olímpicos (VIEIRA et al., 2010). Para Teitelbaum
(1999) a mente humana pode ser comparada a um computador recheado de informações e essas
informações quando são colocadas de forma visível, tornam-se mais fáceis de serem lembradas,
por isso escrever e deixar claro em algum lugar as atividades, é uma maneira de fazer com que
o cérebro se organize melhor quanto ao tempo e espaço, essa técnica é relevante para trabalhar
tanto de forma individual, quanto em grupos e, principalmente, quando há processos educativos
envolvidos.

A maneira como é feito o acesso a esta memória também é algo a ser explorado, uma
vez que tanto a forma com que é feita a escrita, quanto as cores e imagens que são utilizadas
para transpor momentos importantes de forma visual, podem ter um poder enorme de
memorização ao se fazer um mapa de ação para cada pessoa (TEITELBAUM, 1999).

3. CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTÁGIO

O clube onde foi realizado o estágio de psicologia do esporte, localiza-se na região


central da ilha de Florianópolis, oferecendo todos os benefícios e facilidades para atender atletas
de alto rendimento, contendo materiais adequados para treinamentos em simuladores de remo
em dias de chuva, bem como os barcos necessários para a prática do esporte remo nos dias em
que as condições do tempo permitem a prática ao ar livre, além de ter um quadro de

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funcionários, voluntários e diretoria que permite à instituição realizar as suas atividades de
forma producente dentro das especificações da Confederação Brasileira de Remo (CBR), no
que diz respeito ao esporte olímpico e suas especificidades. Para o paralímpico de remo, ainda
fazem-se necessárias algumas adaptações para pessoas com deficiências físicas, como um
banheiro adaptado para os cadeirantes e sinalização no piso para os cegos ou pessoas com baixa
visão que compõem a equipe de paralímpicos praticantes de remo.

As fontes de renda do CRAL e de alguns atletas paralímpicos, são vindouras de doações,


patrocínio da Prefeitura Municipal, do programa governamental Bolsa Atleta de alguns atletas
paralímpicos, apoio da Fundação Municipal de Esporte, das rendas advindas de aluguel de
espaço para colocação de barcos olímpicos de remo na garagem do clube e do aluguel de duas
salas comerciais do clube localizados fora do CRAL.

4. ATIVIDADES REALIZADAS

Com base nas atividades de observação realizadas no primeiro semestre do Estágio


Básico I, a estagiária elaborou um projeto de intervenção que engloba a participação dos setores
como um todo de maneira que possam um dar suporte ao outro, dentro das suas limitações e
conhecimento dos que frequentam o CRAL. As atividades realizadas foram de estímulo às
lideranças para tomadas de decisões, de forma que deixassem mais visíveis e claros os objetivos
a serem traçados pelos demais, causando assim um impacto psicológico positivo para aqueles
que precisavam cumprir suas tarefas para atingir as metas traçadas, trabalhando diretamente
questões de ansiedade com esse ato.

Construiu-se um espaço de acolhimento para os/as atletas e diretores com a finalidade


de diminuir tensões, ansiedades, mediar situações de crises e atuar por meio de manejo do stress,
elemento muito comum em esporte de alto rendimento.

Para uma melhor fluência do trabalho durante o desenvolvimento do estágio, foi


incentivado entre atletas e lideranças a leitura e compreensão da diferença entre psicologia
clínica e psicologia do esporte. Trabalhou-se, ainda, a importância do esporte paralímpico
dentro do clube, demonstrando o quanto esse esporte pode ser um elemento importante no
desenvolvimento de atividades com o esporte olímpico, trazendo reflexos muito positivos no
desenvolvimento psicológico dos atletas, diminuindo questões de discriminação e ampliando
os conhecimentos sobre a importância de um bom espaço de convivência social entre ambos os
estilos de competidores.

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
5. PROJETO E ANÁLISE DE INTERVENÇÃO

O cube em questão, atende atletas de alto rendimento com diferentes idades e


habilidades físicas, sendo que a maioria participante está na categoria Master, além disso, possui
diferentes tipos de lideranças, cada uma direcionada a um objetivo para atender determinadas
demandas específicas dentro das metas estabelecidas para 2022 e 2023 pela equipe técnica e
diretoria. Para que fosse elaborada uma proposta de intervenção para esse local, foi feita a
observação dos movimentos de reconhecimento dos próprios grupos e indivíduos como um
todo, e avaliadas as demandas existentes no período do Estágio Básico II. Através das
entrevistas, acolhimentos, observações e acompanhamento das atividades do clube, foi possível
criar um vínculo entre a estagiária e os membros participantes do clube, fortalecendo a
possibilidade da aplicabilidade de um projeto para o segundo semestre de 2022 no clube.

Considerando questões comportamentais e sociais do esporte de alto rendimento, a


abordagem escolhida para este trabalho foi a cognitivo comportamental e social do esporte, por
trazer aspectos que despertam as ações e reações dos envolvidos com o clube de regatas
escolhido, a partir de estímulos fornecidos pelas lideranças e atletas.

Ficou claro que para resolver problemas e assimilar novas ações psicológicas, os
integrantes do grupo de WhatsApp criado pelo técnico local, agem e se reconhecem como um
grupo, o que possibilita a perspectiva psicológica comunitária de trabalho para a aplicação do
projeto do Estágio Básico II, em que são estimuladas a consciência crítica e ético-solidárias.
Uma vez que salienta a importância dos participantes e parceiros do clube reconhecerem a
história e posições da comunidade em que estão inseridos, bem como poder fazer
transformações neste espaço, conforme citam Pinheiros, Barros e Colaço (2012, p. 194) nos
seus estudos sobre Psicologia Comunitária e técnicas para o treinamento de grupos. Porém, foi
preciso fazer um trabalho de reconhecimento da importância do trabalho de grupo, de
diminuição de ansiedade e manejo do stress nos trabalhos efetuados entre a diretoria e o técnico
principal, sendo essa uma fragilidade que afetava os próprios integrantes desse grupo
específico.

Para trabalhar dentro do contexto proposto pensando no amparo psicológico para este
projeto, foram planejadas as seguintes ações:

• Elaborou-se um quadro com a foto das lideranças principais do Clube para que todos
pudessem identificar e recorrer aos membros da diretoria e aos dois técnicos, delimitando de
forma visível, quem exerce cada função dentro do clube e potencializando essas lideranças,

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
fortalecendo a sinergia entre os próprios membros da diretoria, técnicos e os/as atletas do Clube
de Regatas;

• Foi criada uma rede de apoio aos atletas e às mulheres familiares que acompanham esses
atletas fortalecendo os vínculos e diminuindo as ansiedades, principalmente, nas épocas de
competições;
• Criou-se com essa rede de apoio do clube, uma manhã de sábado que juntamente com os
técnicos, diretoria e famílias, os/as atletas do paralímpico e olímpico que já possuem domínio
dos barcos, pudessem dirigir-se a um local remando fazendo assim, atividades ligadas ao remo
direcionadas pelos técnicos de forma conjunta, tendo como término um almoço entre as
famílias. Ampliando, dessa maneira, a troca de informações das dificuldades, barreiras,
limitações e aumentando o vínculo entre o grupo paralímpico, olímpico e lideranças.

Nas questões financeiras referentes às responsabilidades da estagiária, foram utilizados


recursos próprios básicos para a construção da sequência de fotos de identificação dos membros
de diretoria e técnicos do clube, bem como os materiais necessários para a colocação deste
material na parede escolhida pela diretoria para a instalação destes quadros. Assim como, os
laços cor de rosa para o evento do Outubro Rosa e, por conseguinte, a viabilização de
informações que ressaltassem a importância em diferenciar psicologia clínica de psicologia do
esporte e gastos referentes ao transporte próprio para acompanhar atividades relacionadas ao
remo fora do clube.

Em agosto, foi realizado um café da manhã pós treino e reunião com as atletas do 8+
para analisar junto com elas o nível de ansiedade dessas, e amenizar questões sobre o tema em
pré-competições. Após falar sobre os benefícios e malefícios da ansiedade pré-competição e os
benefícios da visualização antes da regata, foi realizada a escuta de cada atleta no que se refere
aos seus sentimentos frente a um momento competitivo muito visado pela cidade de
Florianópolis, a ser enfrentado em dois dias. Com base em cada relato, foi realizado um
aconselhamento psicológico grupal refletido nos textos citados no início da reunião e, em
seguida, outros aconselhamentos feitos de maneira individualizada, frente a diferentes formas
de estarem enfrentando a mesma situação de ansiedade antes da competição marcada. Para
reforçar a reflexão sobre ansiedade e visualização pré-competições, foi enviado via eletrônica
um vídeo feito por um atleta olímpico baseado em experiências próprias e com bases científicas.

No mesmo mês, iniciou-se um processo de entrevistas semiestruturadas


individualizadas, envolvendo questões previamente estabelecidas e outras originadas durante o

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
momento da entrevista com atletas paralímpicos e olímpicos. A escolha pelos atletas foi
aleatória, mas também por vezes por pedido técnico, somada à procura espontânea de alguns
atletas por aconselhamento psicológico no tocante à orientação do tempo e espaço para a
aplicação do esporte com maior eficiência com a finalidade de alcançar os objetivos de treino
com melhor eficiência física, psicológica e social, diminuindo problemas de stress e ansiedade.
Este tipo de entrevista foi uma ferramenta importante de acesso às informações nas ações
individuais de cada atleta e paratleta, para que pudessem ser aplicadas intervenções psicológicas
com ambos os estilos de esporte de forma adequada, dentro das necessidades de cada um e
atendendo os objetivos a serem alcançados pela instituição, respeitando as ações e escolhas de
cada desportista.

Dentro deste propósito foram realizadas atividades de aconselhamento psicológico


diretivo utilizando um calendário norte americano, contendo 31 dias do mês, dividido por dias
e quatro semanas, nos quais eram inseridas as atividades que viriam a ser praticadas no mês de
agosto, contendo no máximo quatro palavras por dia citado, alguns símbolos, utilizando letra
de forma e com diferentes cores para acessar a memória do atleta de forma mais rápida. Foi
feita para o paratleta “X” uma proposta de plano de ação para realizar as suas atividades sem o
stress da expectativa do que poderia vir a acontecer tentando desta maneira, organizar os dias,
horas, datas, nomes de cada treino de forma que assim, houvesse menos ansiedade na
distribuição de horários no seu dia a dia e, também, houvesse a ativação mais rápida da
memórias quanto aos treinos que poderiam vir e suas ações. Isso foi realizado baseando-se nas
ideias de Teitelbaum (1999), que afirma que ao colocar o que é importante de forma clara em
um papel de maneiras diferentes para cada atividade, o que precisa ser lembrado virá à tona de
maneira prática com menor esforço mental.

O mesmo método foi utilizado com outra remadora que tinha dificuldade em lembrar de
organizar os seus dias e treinos devido a sua nova forma de organizar a sua vida diária, e acabava
frustrando-se em relação às exigências da prática do remo, versos ter que lembrar de cada
atividade, data ou hora para treinar dentro da sua nova maneira de viver. Segundo Teitelbaum
(1999) o cérebro funciona como um database, repleto de informações que acionado por
diferentes maneiras de composições visíveis em vez de palavra, pode aumentar
consideravelmente o poder de memorizar as coisas causando menores frustrações.

Com os paratletas com deficiência visual ou baixa visão, a partir da observação dos
relatos de cada um e notado que todos tinham a mesma demanda que era a necessidade de
realizar atividades de forma independente, ao mesmo tempo percebendo que esses estavam

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
muito atrelados ao técnico ou seus cuidadores, foi realizada uma atividade de reconhecimento
e familiarização espacial com o local de maneira a fazer com que cada um pudesse conhecer as
dependências do clube de remo que atuavam de maneira mais acessível e confortável.
Possibilitando assim, a circulação pelos espaços físicos de maneira mais livre e independente,
verificando a presença ou ausência de outros remadores ao seu redor, favorecendo a
socialização e o entrosamento com outros remadores e remadoras no ambiente da prática
esportiva escolhida, visando também a inclusão social entre os atletas, como bem citado por
Gesser, Bock e Lopes (2020) sobre a emancipação do sujeito e a importância que isso temna
interação das suas práticas exercidas e o seu entorno, indo exatamente a favor do que é
requisitado pela Associação Catarinense de Integração ao Cego (ACIC) que reforça a
importância não só da independência do cego por onde transita, mas também o olhar
descapacitista sobre os praticantes de esporte nessas categorias.

Ainda em setembro, foram iniciadas atividades para concretizar a primeira e segunda


propostas de intervenção psicológica propostas para o clube, com base no que foi observado no
primeiro semestre. Foi realizada a preparação do quadro da diretoria e da comissão técnica para
ser colocado na parede para a visualização dos participantes e não participantes do clube de
remo escolhido para esse estágio, a fim de observar os efeitos que poderia causar à todos da
instituição e visitantes do local. Atividade esta que levantou, além do objetivo proposto,
bastante questões sobre a importância da própria imagem de forma bem diferenciada para cada
membro das fotos e a dificuldade em chegar a acordos grupais para resolver problemas simples.
A partir dessa atividade foi realizada a primeira reunião com o setor de marketing e de eventos
do clube para começar a alinhar os preparativos do “Outubro Rosa” e seus impactos na
psicologia social aplicada para a instituição, levando em consideração todas as ideias e
propostas para o evento.

No mesmo mês, ao observar que no remo olímpico ainda havia dúvidas sobre a
psicologia do esporte e a psicologia clínica, foi distribuído por meios sociais uma reportagem
contendo os benefícios da psicologia do esporte e a sua diferença quanto à psicologia clínica,
enfatizando que na psicologia do esporte não é aplicado um tratamento, mas um
acompanhamento psicológico com objetivos bem definidos em prol do bem do atleta e o local
onde treina, o que ajudou, de certo modo, na amplitude desse olhar sobre os trabalhos a serem
efetuados dentro do clube de remo. Essa amplitude de olhar, aparentemente, estendeu-se sobre
a diretoria possibilitando uma melhor abordagem para dar continuidade às propostas feitas para
esse estágio. Isso abriu campo para que o acompanhamento aos atletas na última etapa do

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
Estadual de Remo 2022, acontecesse de modo mais fluido pois, tanto atletas, quanto diretoria e
técnicos, compreenderam a diferença entre a psicologia do esporte e clínica, colaborando para
que o estágio de psicologia do esporte acontecesse de maneira atuante com os atletas.

No primeiro semestre, visando as questões sociais da psicologia do esporte, foi criado


um grupo de apoio para o clube de remo e esse por sua vez, criou a ideia de um evento para o
Outubro Rosa abrangendo tanto atletas, paratletas, diretores, técnicos como também os
visitantes do local, como as suas famílias visando assim, além de aumentar a visibilidade sobre
a importância em fazer o teste preventivo de câncer de mama, também possibilitar momentos
saudáveis de interação entre atletas, familiares e o grupo como um todo fora dos horários de
treino.

Apoiando-se na ideia do Grupo de Apoio denominado Staff, foi realizado um trabalho


de conscientização da importância da diretoria trabalhar em grupo para tomar decisões, de
maneira que ao organizar o evento do Outubro Rosa, tanto diretores, presidente e técnicos de
remo, tiveram que reconhecer-se como grupo para poder melhorar a comunicação entre as
lideranças com o objetivo de reconhecer que existe um outro que precisa que todos trabalhem
em conjunto, não deixando todas as responsabilidades do evento para a diretoria de eventos,
como habitualmente atuam. Dificuldades na comunicação inicialmente foram encontradas, mas
com o trabalho de mediação da estagiária realizado na reunião, foi possível fazer com que todos,
de uma maneira ou outra se manifestassem e participassem das tomadas de decisões.

Para o mês de outubro, dentro da proposta original de intervenção psicológica, foi


realizado o acompanhamento dos atletas no período pré e pós competições no dia da regata do
Campeonato Estadual de Remo na cidade de Blumenau. Devido às condições precárias do local
de competição, somada à ansiedade esperada para o período pré competitivo no esporte de alto
rendimento, foram realizadas várias orientações e aconselhamentos psicológicos, mediação em
situações de crise, trabalho de incentivo à diminuição do stress e acolhimentos para que os/as
competidores/as, pudessem sair desse evento desportivo preparados para enfrentar uma nova
rotina de treinos pós competição de maneira saudável mentalmente.

Constatou-se que o evento “Outubro Rosa”, proporcionou um apoio emocional muito


importante para os que se encontravam desanimados com os resultados da última competição,
bem como causou um impacto muito positivo na diretoria que precisou trabalhar em conjunto,
escutando as ideias e opiniões uns dos outros, abrindo espaço para a escuta, abrindo o olhar
para novas perspectivas para que o evento pudesse ser realizado. Houve um trabalho conjunto

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entre os técnicos do paralímpico e olímpico em algo que não era especificamente uma atividade
de competições como o rotineiro, entrando em acordos para poder fazer com que as atividades
acontecessem de maneira não só a concretizar uma ideia, mas também a impulsionar um
trabalho em conjunto com a sociedade e a instituição como um todo.

Nesse dia, movimentou-se todos os setores do clube, desde os que atendem somente a
questões sociais até os grupos técnicos. Os simuladores de remo, denominados remo
ergométricos, foram transportados ao trapiche da Avenida Beiramar enquanto os atletas e
participantes do evento foram caminhando até o local, alguns carregando um remo do clube e
outros somente acompanhando, mas todos em grupo. Ao chegar no local, o técnico do
paralímpico organizou as equipes em grupos de quatro pessoas para remar ao princípio e
posteriormente, foi convidando pessoas que estavam assistindo somente para poder
experimentar o simulador de remo. Várias pessoas de diferentes idades participaram do evento,
gerando não somente a importância da conscientização sobre a prevenção do câncer de mama,
mas também trazendo mais visibilidade sobre o esporte remo praticado dentro do CRAL,
especificamente. Após o evento, todos retornaram ao clube e fizeram uma confraternização com
um almoço preparado por todos em suas casas e levado até o local.

Percebeu-se que a música exerceu um papel importante, tanto nos preparativos para a
saída dos atletas, quanto durante o evento e após o evento, tendo diferentes intensidades para
cada momento, conforme cita Duarte (2009) sobre os efeitos da música nos diferentes contextos
dentro de uma perspectiva psicológica no esporte. A partir dela foram alavancadas emoções de
alegria, entrosamento, diminuição do stress, estímulos excitatórios necessários para fazer as
atividades propostas e, posteriormente, trouxe tranquilidade ao ambiente na hora do almoço
entre as famílias, fazendo uma espécie de retorno à tranquilidade antes que todos regressassem
aos seus lares.

Ao observar o êxito do Outubro Rosa e os benefícios para a sociedade tanto no âmbito


de movimentação familiar, como com o entrosamento com as pessoas que ali passavam, a
prefeitura de Florianópolis resolveu convidar o clube para fazer parte do Novembro Azul que
tem como objetivo, trabalhar para a conscientização sobre a prevenção do câncer de próstata.
Para esse evento, como não houve um tempo de preparação adequado como no Outubro Rosa,
o nível de stress entre organizadores aumentou consideravelmente, já que foi preciso montar
uma estrutura gigantesca em apenas três dias. Sendo assim, comprova-se que há uma
necessidade de tempo maior para poder movimentar tantos setores dentro do clube, com o

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
menor stress possível e distribuição de funções com maior amplitude, perfazendo um trabalho
em equipe mais bem balanceado e com maior êxito.

Ainda em novembro, a estagiária participou de um curso de 4 horas na ACIC para


aprender um pouco mais sobre as especificidades das pessoas cegas, no tocante a apresentação
do local de esporte na chegada de um atleta deficiente visual e, com isso, contribuir com a
sensação de liberdade dos participantes de remo, bem como tentar fazer com que a socialização
entre atletas olímpicos e paralímpicos, seja mais fluida, desconstruindo a ideia de deficiência
enquanto problema e incapacidade e tentando construir uma ideia de unidade.

Os professores de mobilidade visual da ACIC, propuseram-se a ir até o CRAL e lá


realizaram um curso sobre como tornar a vida da pessoa cega dentro do clube mais acessível,
desmistificando tabus sobre o que pode e o que não pode ser falado a um cego na hora de
apresentar um local, a fim de melhorar a mobilidade do deficiente visual, dentro da garagem de
remo. Estiveram presentes o técnico do paralímpico de remo, o seu assistente que também é
paralímpico, duas professoras de Educação Física que também são atletas do clube e a estagiária
de psicologia do esporte.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O atleta de alto rendimento passa por situações de stress diariamente, seja em questões
físicas como psicológicas afirma Colagrai et al. (2022) e isso pode estar ligado ao fator
ansiedade que como citam Medeiros e Lacerda (2020), nem sempre deve ser tomado como um
fator negativo nesse tipo de categoria esportiva. Ao mesmo tempo, para um bom andamento e
sinergia entre os atletas, as lideranças exercem funções importantes no manejo do stress e
condução dos níveis de ansiedade uma vez que a flexibilidade na tomada de decisões e uma boa
escuta, podem fazer a diferença entre ganhar ou perder, unir ou separar o grupo (NAVARRO,
2012) ao mesmo tempo que as mesmas lideranças ao incentivarem atividades sociais, estão
contribuindo para a aproximação dos atletas às suas famílias e amigos, considerando que na
vida diária de treinamentos, não resta muito tempo para o convívio social (BURLOT;
RICHARD; JONCHERAY, 2016).

As mesmas lideranças ao diminuírem a distância entre atletas e paratletas, estão não


somente fazendo um trabalho social humanizado, mas também elevando o grupo a um nível de
trocas de experiências muito saudável que só vem a contribuir para o crescimento do grupo.

As maiores dificuldades encontradas nesse estágio, foi a de fazer entender que há


diferença entre psicologia do esporte e psicologia clínica, a ampliação do conhecimento sobre

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psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.
a psicologia do esporte uma vez que eu já havia trabalhado por muitos anos na área técnica de
alto rendimento no remo olímpico, lidar com os picos de estresse dentro de uma rotina de treinos
e competições, mediar situações de conflito hierárquico entre equipe alinhada para competição,
conflitos interpessoais do local, lidar com a possibilidade do campo que é vasto e abrange vários
setores de lideranças e diferenciar o lugar da psicologia do esporte e social e a psicologia clínica.

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VIEIRA, L. F. et al. Psicologia do esporte: uma área emergente da psicologia. Psicol. Estud.
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2022.

Editora e-Publicar – Psicologia e Cultura: Abordagens, reflexões e implicações da 156


psicologia na sociedade contemporânea, Volume 1.

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