Sergio Lima - Monografia - 30.05.2018 - Versão Final
Sergio Lima - Monografia - 30.05.2018 - Versão Final
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São Paulo
2018
SÉRGIO FERREIRA DE LIMA
São Paulo
2018
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3
CONCLUSÃO............................................................................................................ 36
BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................... 38
INTRODUÇÃO
A necessidade de luz para o caminho daqueles que vagam por essa terra sem
destino e nem sabem como resistir às lutas durante essa caminhada é uma questão
que precisa ser tratada continuamente, doutra feita restará o caos que arranca do
indivíduo a esperança de que vida em comunidade lhe seja útil, deixando de existir o
sentimento de "pertença" e a alegria de viver.
Diante desse quadro sucinto do perverso esquema social, por nossa condição
cristã de ser, não podemos ficar inertes, sem contribuir com proposta de melhoria das
relações sociais a partir do meio onde vivemos. Trata-se de entender melhor o que é
a cidadania como princípio da vida comunitária e, principalmente, promover quem
possa difundir seus valores nessa sociedade tão frágil e carente.
Por fim, mesmo que não esgotando o assunto, mas tentando cumprir os
objetivos propostos, esperamos sensibilizar, especialmente aqueles que desenvolvem
sua vocação no cuidado pastoral quanto ao seu relevante papel perante a sociedade
onde o Criador os designou para estarem pastores(as).
1. CONCEITO DE CUIDADO PASTORAL
"E ele mesmo concedeu alguns para apóstolos, outros para profetas, outros
para evangelistas e outros para pastores e mestres".1
1 Ef 4.11.
2 Sathler-Rosa, 2010, p. 27.
3 Libanio apud Sathler-Rosa, op. cit.
6
Vê-se, assim, que a imagem e função do pastor encontram íntima ligação com
a cultura judaica e prática de povos da antiguidade ao reconhecer como pastoreio a
responsabilidade atribuída a alguém de participar e zelar pela vida do povo.4
Analogamente, se o cuidador do povo é um pastor, as pessoas são as suas ovelhas.
O Novo Testamento traz Cristo como o Bom Pastor, ou seja, o modelo pastoral
é expresso pela pessoa e prática de Jesus.5 No Evangelho de João encontramos
Jesus falando de si como pastor: "Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas
ovelhas. [...] assim como o Pai me conhece a mim, eu conheço o Pai; e dou a minha
vida pelas ovelhas".6 O texto bíblico traz o Mestre mostrando o extremo do ministério
pastoral: o bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas. Dar a vida pelas ovelhas é cumprir
com os mandamentos da lei divina, onde além de amar a Deus sobre todas as coisas,
expressa-se tal abnegação no amor ao próximo, tal qual se valora a própria vida. Dar
a vida é sinônimo de dedicação e cuidar de pessoas exige do cuidador essa
dedicação: é uma ação pastoral.
Sathler-Rosa cita o teólogo uruguaio Julio de Santa Ana para explicar que o
termo pastoral se tornou mais frequente nas Américas do Sul e Central, a partir da
década de sessenta, principalmente na Igreja Católica Romana.8
Diz, ainda:
João Calvino, nas Institutas, enfatiza as funções principais dos pastores como
sendo:
atribuições são exclusivas dentro de um grupo, de forma que sejam suficientes os que
exercerão aqueles específicos serviços em meio aquele mesmo grupo.
12 I Co 12.29-30.
13 Googliff apud Sathler-Rosa, 2010, p. 44-45.
9
detectadas. Mesmo quando percebidas, não são cuidadas de imediato, tanto pela
desinformação, quanto pelo preconceito da natureza dessas doenças que são
associadas a pessoas incapazes.
por essas pessoas, mas a fonte deverá ser interditada e ela mesma ser transformada
pelo bem da comunidade. Tal percepção se reflete no cuidado pastoral, que não
apenas se sensibiliza com o indivíduo, mas se importa com o universo ao redor deste,
sendo tanto a pessoa como seu mundo obras do mesmo Deus Criador, quem chama
uns para pastores e mestres. Neste sentido, comenta Sathler-Rosa: “Agentes
pastorais, clérigos e leigos, devem ser encorajados a assumir sua vocação e
ministérios na sociedade e não apenas nos círculos de suas igrejas locais”.19
Entendendo que todo local possui uma história onde foi forjado um conjunto
de normas para manutenção da sociedade ali existente, o cuidado pastoral,
obrigatoriamente, deverá levar o povo cristão a conhecer essas normas e, sobretudo,
analisá-las sob a ótica do próprio Deus, exposta nas Escrituras Sagradas. Mais uma
vez conhecer a sociedade onde os membros da igreja estão inseridos faz parte do
cuidado pastoral. Conforme Peterson: “O trabalho pastoral é local”.26 Conhecer a
sociedade inclui tanto o aspecto físico/geográfico quanto o cultural/legal. Toda
sociedade possui elementos de ordem jurídica que visam proteger o grupo e o
ambiente, sendo comum o interesse da maioria dos membros, senão de todos, em
preservar essa ordem para seu próprio bem. Cuidar dos outros visando o próprio bem
se alinha completamente ao texto das Escrituras Sagradas, referido pelo evangelista
Marcos, onde Jesus diz: "amarás o teu próximo como a ti mesmo".27
O homem não vive só. Viver só não é bom para o homem. O próprio Deus
assim o declarou: "Não é bom que o homem esteja só".28 E lhe providenciou
companhia, completando esse homem em sua natureza comunitária. Assim, o homem
vive sempre se relacionando com o lugar onde está e com as outras pessoas desse
mesmo ambiente. Quanto ao lugar, o homem precisa dele para garantir seu sustento,
desde as mais primitivas atividades extrativistas, como colher frutos de plantas
nativas, beber água de uma mina, caçar animais selvagens como o javali, mas
também desenvolvendo agricultura, plantando enormes áreas com milho, soja, trigo,
arroz, utilizando água dos rios para irrigação, água que represada também gira
turbinas que geram eletricidade, e com ela iluminam cidades, acionam motores,
constroem indústrias para produzir toda sorte de bens.
Poderá esse homem por algum tempo praticar as atividades acima sozinho,
contudo, necessariamente, nalgum momento, haverá de encontrar outras pessoas no
exercício dessas atividades, colhendo frutos da mesma árvore, ou bebendo da mesma
mina d’água, ou plantando milho na mesma gleba de terras, ou trabalhando na mesma
indústria. O homem precisa se relacionar com outras pessoas enquanto busca
assegurar seu próprio sustento. Se relacionando com outras pessoas também
passará a nutrir sentimentos de apreço, como amizade, dedicação, amor, bem como
perceberá outros em sentidos opostos, como inveja, ciúmes, medo, raiva. Enquanto
se relaciona com o meio ambiente, o homem poderá fazê-lo de forma sustentável,
para que os recursos não se esgotem, nem a transformação produzida seja
prejudicial, enquanto o mesmo homem, contudo, poderá ignorar tais cuidados e
destruir os recursos naturais úteis para muitas pessoas.
28 Gn 2.18.
15
Desde que o homem passou a viver em maior número nas cidades, resultado
do êxodo rural, sua forma de vida e interdependência quanto aos demais o levou a
adotar uma nova condição: a de cidadão. Agora, a convivência desses cidadãos
depende do respeito às regras ajustadas para esse fim, e dentre elas, o de
representatividade e direção. Para elaborar essas normas os cidadãos escolherão
pessoas que se responsabilizarão por esse processo, e até mesmo o processo de
escolha dessas pessoas será conduzido por normas. Votar e ser votado são direitos
e, ao mesmo tempo, deveres dos cidadãos. Exercer os direitos e deveres de cidadão
constitui a cidadania. Cabe-nos, pela oportunidade, relacionar a enorme relevância do
interesse dos cidadãos, tanto em se dispor como candidato a assumir postos de
representação atentando para competência que implicam a referida função, quanto,
primordialmente, por se tratar de tarefa da totalidade dos demais indivíduos votantes,
analisarem se os candidatos poderão dignamente representá-los. Qualquer dos dois
compromissos que não sejam assumidos "poderão" prejudicar toda a comunidade.
Ressalte-se que cidadania não é apenas exercer o direito de votar e ser votado como
representante de um grupo de pessoas, mas é todo o processo de avaliação da
condição humana e situação ambiental, e, consequentemente, o implemento de
normas que visam o aprimoramento dessas condições.
Da terra o homem retira tudo o que precisa para sobreviver. Se tudo da terra
fosse retirado, faltariam ao homem condições para continuar existindo. Partindo
dessas duas afirmações, deduz-se que não poderá o homem permitir que sua fonte
natural de bens se torne extinta, pois significaria sua própria extinção. Percebe-se uma
necessidade clara de equilíbrio, de modo que quando o homem retira algo da terra,
ela deve ser compensada para que sua capacidade de servir seja preservada. Se o
homem retira água limpa do rio, deve devolvê-la limpa da mesma forma que a tomou.
Quando o homem cortar árvores para fazer móveis, precisa reflorestar de forma que
o equilíbrio na produção de oxigênio e temperatura do solo logo sejam restaurados e
possam as gerações futuras também fazer móveis de madeira. É assim que Leonardo
Boff enxerga a Terra, como sendo ela mesma um organismo vivo, que possui
dignidade e deve ser respeitada:
Ser cidadão implica em convivência com outros cidadãos, afinal não temos
cidades de um só habitante. Já disse o poeta Mário Quintana: "A arte de viver é
simplesmente a arte de conviver... simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!".33
Assim como é devido o respeito ao meio ambiente, pela manutenção de seu valor
como ente vivo, a vida comunitária impele o homem a praticar o respeito às pessoas,
de sorte que o oposto certamente o levará à ruína.
Leonardo Boff mostra em seu livro A Terra na Palma da Mão - Uma Nova
Visão do Planeta e da Humanidade um enfoque de esperança de que o homem pode
se aperceber da grande responsabilidade que possui de zelar pela conservação do
planeta e de todos que nele habitam, e que precisa buscar uma vida mais simples
para aproveitar mais o curto espaço consciente de sua existência no tempo.40 Exercer
os deveres e usufruir dos direitos de cidadão constituem a lógica da sobrevivência
social. Certo é que a sociedade não tem vivido de maneira muito lógica, e quanto mais
incrementada de interesses econômicos, a maiores riscos ela tem se exposto, como
a desordem que gera violência, que gera medo e diminuição do interesse pelo bem
comum.
41 Is 55.8;9.
42 Sathler-Rosa, 2010, p. 121.
43 Peterson, 2006, p. 161.
44 Peterson, op. cit.
25
Eis que o cuidado pastoral pode nutrir as instituições com pessoas que
valorizam e se esforçam para promoverem o Reino de Deus nessa terra, cônscios da
Muitas das vezes o auxílio necessário não está dentro da comunidade, mas
deverá por ela mesma ser buscado onde a sociedade tiver estabelecido sua
disponibilidade. Tratam-se de recursos médicos, transporte público, habitação, lazer,
trabalho, enfim, coisas que todas as pessoas carecem, mas que nem sempre têm o
acesso, sequer, à informação de que a superação de tais necessidades deve
corresponder a obrigações já cumpridas, como o pagamento de impostos, e, portanto,
deveriam estar acessíveis a todos.
Conhecer essa dura realidade que separa pessoas simples de seus direitos é
cuidado pastoral. Ajudar as ovelhas a encontrarem os recursos de que necessitam
num mundo de tanta desigualdade, onde aqueles que os detêm cobram acima do
justo preço para disponibilizá-lo, é tarefa essencialmente pastoral. Para tal exercício,
o pastor precisa conhecer tanto as pessoas da comunidade quanto o meio onde
vivem, e também o conjunto de normas que as inter-relacionam para promover o
devido cuidado em favor das mesmas.
Todos estamos fixados num local, cuja base é a casa onde moramos, que fica
numa rua, de um bairro, de uma cidade, de um Estado num país, que se estende ao
local de trabalho e/ou estudos. A partir desse raio de ação, desenvolvemos
cotidianamente relações com o meio ambiente que abrangem os odores sentidos, os
29
O pastor Antônio Carlos Costa, por sua experiência na luta pelos direitos dos
menos favorecidos, expressa em sua obra Convulsão Protestante – Quando a
Teologia Foge do Templo e Abraça a Rua sua interpretação do trecho da carta paulina
mencionado acima:
51 Rm 12.2.
52 Costa, 2015, p. 31.
30
O Rev. Costa destaca que “o reformador João Calvino denunciava com paixão
e rigor os salários baixos e a condição de vida imposta pelos mais ricos aos pobres
trabalhadores assalariados do século 16”.54 Estamos no século XXI e estas denúncias
têm de continuar a serem feitas, porque inúmeras pessoas não são motivadas a
exercer seu papel na sociedade como cidadãos, dignos de direitos, cumpridores de
suas obrigações. O cuidado pastoral deve assumir o espírito denunciador dos
reformadores do século XVI, e continuar a estimular a luta pela justiça, para promoção
do Reino de Deus.
56 Petinelli, 2017.
57 Ibid, 2017.
58 Fl 3.20.
32
59 Aurélio,1999, p.1.625.
60 Barroco, 2016, p. 7.
33
pensar e medo de ser excluído do grupo ao qual pertence por externar posição
diferente dos conceitos já preestabelecidos.
Mais uma vez podemos aduzir que é vocação do pastor o ensino às ovelhas
do rebanho o valor da igualdade por meio do repartir o pão, do serviço ao próximo, do
perdão, da fome e sede por justiça, orientações essas dadas por Jesus Cristo
relatadas no Evangelho de Mateus.65
65Excerto do Evangelho de Mateus nos capítulos 5 a 7, conhecido pela tradição da Igreja como “O
Sermão do Monte”.
35
paulino: "E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação
da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade
de Deus".66
66 Rm 12.2.
CONCLUSÃO
Atinente à proposta deste trabalho, podemos com ele perceber que o cuidado
pastoral é um ofício de designação divina, tendo as pessoas que o receberam por
vocação precioso dever de construir uma comunidade cristã, criar a saúde relacional,
curar as almas feridas, nutrir e suster a fé dessa comunidade.
67 2Co 5.10.
37
BIÉLER, André. O humanismo social de Calvino. 2ª edição. São Paulo: Pendão Real,
2009.
CALVINO, João. A verdadeira vida cristã. 3ª edição. São Paulo: Novo Século, 2003.
SOUZA, Isabela Augusta Andrade. O preconceito nosso de cada dia: um estudo sobre
as práticas discursivas no cotidiano. 2008. 168p. Tese (Doutorado em Psicologia
Social), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.