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Pre, Pro e Simbióticos e o Impacto sobre a Saúde Intestinal

Os avanços na compreensão da microbiota intestinal e sua relação com


a saúde têm sido extraordinários nas últimas décadas. A microbiota, composta
por uma variedade de bactérias que habitam nosso intestino, desempenha um
papel crucial em uma série de processos fisiológicos, incluindo a digestão,
metabolismo de nutrientes e regulação do sistema imunológico (Gibson et al.,
2017).
Quando essa comunidade bacteriana está em desarmonia, ocorre o que
chamamos de disbiose, o que pode levar a uma série de problemas de saúde.
Refere-se a um desequilíbrio na microbiota intestinal que pode estar associado
a várias condições gastrointestinais, incluindo doença inflamatória intestinal
(DII), síndrome do intestino irritável (SII), má alimentação, idade avançada,
estresse, gastroparesia – disfunção no esvaziamento gástrico – e estado
imunológico comprometido (Gibson et al., 2017).
O conceito de disbiose é reconhecido na literatura médica, onde é descrito
como uma quebra no equilíbrio entre bactérias intestinais protetoras versus
prejudiciais. O Comitê da Fundação de Roma reconhece que a microbiota pode
estar perturbada em distúrbios gastrointestinais funcionais e sugere que uma
abordagem de tratamento potencial seja corrigir a disbiose. No entanto, o
diagnóstico da disbiose é uma área emergente na prática clínica e, embora não
exista um teste diagnóstico padronizado universalmente aceito, existem métodos
sendo desenvolvidos e validados para esse fim (Shaw et al., 2016; Simrén et al.,
2013; Tamboli et al., 2004)
O Teste de Disbiose GA-map, por exemplo, é um novo teste diagnóstico
que traça o perfil da microbiota intestinal usando amostras fecais para identificar
e caracterizar a disbiose. Este teste utiliza sondas de DNA visando uma ampla
gama de bactérias e fornece uma pontuação do Índice de Disbiose, que avalia
algoritmicamente a abundância e o perfil bacteriano fecal, indicando potencial
desvio clinicamente relevante da normobiose. A validação do teste de disbiose
GA-map mostrou que ele pode detectar disbiose em uma proporção significativa
de pacientes com SII e DII em comparação com indivíduos saudáveis. Isto
sugere que a avaliação da microbiota utilizando tais estratégias de diagnóstico
podem ser úteis para monitorizar regimes de tratamento e melhorar as
abordagens terapêuticas. Todavia, é importante notar que embora este teste
tenha se mostrado promissor, o diagnóstico de disbiose ainda não é uma parte
rotineira da prática clínica, e mais pesquisas e validações são necessárias para
estabelecer critérios diagnósticos padronizados e integrar tais testes em fluxos
de trabalho clínicos regulares (Casén et al., 2015).
Diante desse contexto, surgem os prebióticos, probióticos e simbióticos
como potenciais elementos-chave na promoção da saúde intestinal e no
restabelecimento do equilíbrio da microbiota.
Os prebióticos são definidos como substratos seletivamente utilizados por
microrganismos hospedeiros, conferindo um benefício à saúde. Essa definição,
atualizada pela Associação Científica Internacional para Probióticos e
Prebióticos (ISAPP, na sigla em inglês), amplia o conceito de prebióticos além
apenas de carboidratos não digeríveis para potencialmente incluir substâncias
não carboidratos e aplicações em locais do corpo além do trato gastrointestinal
(Gibson et al., 2017).
Há linhas de pesquisa que difundem que os benefícios à saúde
associados ao consumo de prebióticos incluem modulação da microbiota
intestinal, aumento da produção de ácidos graxos de cadeia curta e prevenção
de distúrbios como câncer de cólon, síndrome do intestino irritável, diabetes e
obesidade. Os prebióticos também são conhecidos por estimular o crescimento
de bactérias benéficas como bifidobactérias, o que pode melhorar a saúde do
hospedeiro (Paulo et al., 2021; Ricke et al., 2020; Roberfroid, 2007).
As fibras alimentares que metabolizadas por bactérias benéficas na
microbiota do intestino grosso podem ser classificadas como prebióticos, com
oligossacarídeos resistentes como frutanos e galactanos sendo bem
documentados como prebióticos na literatura. A eficácia dos prebióticos no
manejo de condições como constipação funcional tem sido explorada, embora
mais pesquisas sejam necessárias para estabelecer seu papel em cenários
clínicos semelhantes (Erhardt et al., 2023; Rezende; Lima; Naves, 2021)
É importante notar que enquanto a dose diária de um prebiótico não é um
determinante do efeito prebiótico, o índice prebiótico, definido como o aumento
no número absoluto de bifidobactérias dividido pela dose diária de prebiótico
ingerido, sugerindo que mesmo com doses menores, se o índice prebiótico for
alto, ainda pode-se haver um impacto significativo na promoção das
bifidobactérias no intestino e, consequentemente, na saúde intestinal. A
utilização seletiva de prebióticos por microrganismos hospedeiros benéficos é
um aspecto chave de sua função, e essa fermentação seletiva pode levar a
efeitos positivos na saúde (Gibson et al., 2017; Ricke et al., 2020; Roberfroid,
2007).
Os probióticos são microrganismos vivos que, quando administrados em
quantidades adequadas, podem conferir um benefício à saúde do hospedeiro.
Eles podem influenciar a fisiologia intestinal tanto diretamente quanto
indiretamente, por meio da modulação do ecossistema endógeno ou do sistema
imunológico. Os probióticos são derivados de alimentos tradicionalmente
fermentados, de comensais benéficos ou do ambiente, e atuam por meio de
mecanismos diversos que afetam a composição ou função da microbiota
comensal e alteram as respostas epiteliais e imunológicas do hospedeiro
(Gasbarrini; Bonvicini; Gramenzi, 2016; Marteau et al., 2001; Sanders et al.,
2013).
Evidências clínicas apoiam o uso de cepas específicas de probióticos para
diversas condições gastrointestinais. Por exemplo, Saccharomyces boulardii e
Enterococcus faecium SF 68 demonstraram prevenir ou encurtar a duração da
diarreia associada a antibióticos, e S. boulardii pode prevenir a recorrência da
diarreia associada ao Clostridium difficile. Além disso, leites fermentados
contendo Lactobacillus rhamnosus GG têm sido utilizados para reduzir a duração
da diarreia em lactentes com enterite por rotavírus. (Marteau et al., 2001).
A seleção de um probiótico deve ser baseada na(s) cepa(s) específica(s)
e nas evidências que apoiam seu uso para a condição em tratamento, pois os
efeitos dos probióticos são específicos da cepa e nem todos os probióticos são
adequados para todas as condições. A dosagem de probióticos pode variar
dependendo da cepa e da indicação clínica, mas geralmente é medida em
unidades formadoras de colônias (UFCs), com doses variando tipicamente de
bilhões a dezenas de bilhões de UFCs por dia. (Marteau et al., 2001; Sanders et
al., 2013).
Os simbióticos se referem a suplementos nutricionais que combinam
probióticos e prebióticos em uma forma de sinergia, daí o nome simbióticos. O
conceito é baseado na ideia de que a adição de prebióticos aos probióticos pode
melhorar a sobrevivência e implantação de suplementos alimentares
microbianos vivos no trato gastrointestinal, estimulando seletivamente o
crescimento e/ou ativando o metabolismo de uma ou de um número limitado de
bactérias promotoras da saúde. O componente prebiótico é tipicamente uma
fibra ou oligossacarídeo que fornece um substrato para as bactérias probióticas,
que são microrganismos vivos que podem conferir benefícios à saúde.
A justificativa por trás dos simbióticos é que as substâncias prebióticas
podem ajudar a apoiar o crescimento dos organismos probióticos tanto dentro
do produto quanto depois de ingeridos, fornecendo um ambiente mais favorável
no intestino para a colonização dos probióticos. Isso pode potencialmente
aumentar a eficácia dos probióticos e estender os benefícios à saúde para o
hospedeiro.
Ao considerar o uso de simbióticos na prática clínica, é importante
selecionar produtos com base nas evidências que apoiam a combinação
específica de cepas probióticas e fibras prebióticas que eles contêm. A dosagem
e a razão probióticos:prebióticos podem variar dependendo do produto e da
indicação clínica, e devem ser baseadas em pesquisas clínicas que demonstrem
eficácia para o resultado de saúde específico almejado.
Sintetizando, prebióticos, probióticos e simbióticos podem melhorar a
microbiota intestinal por meio de vários mecanismos. Os prebióticos são
seletivamente utilizados por bactérias benéficas do intestino, promovendo seu
crescimento e atividade, o que pode levar a um equilíbrio mais favorável da
microbiota intestinal. Os probióticos, que são microrganismos vivos, podem
adicionar diretamente à população de bactérias benéficas no intestino,
potencialmente restaurando e mantendo um equilíbrio saudável da microbiota.
Eles também podem modular a resposta imune e aprimorar a função de barreira
intestinal. Já os simbióticos, que combinam prebióticos e probióticos, são
projetados para melhorar a sobrevivência e colonização de bactérias probióticas
no intestino, fornecendo-lhes um substrato de crescimento específico. Ainda,
existindo a hipótese efeitos sinérgicos, já que o componente prebiótico apoiaria
o crescimento das bactérias probióticas, potencialmente resultando em uma
microbiota intestinal enriquecida e mais equilibrada (Markowiak; Śliżewska,
2017; Yadav et al., 2024)
Contudo, é fundamental destacar a necessidade premente de pesquisas
adicionais na área em questão visando trazer luz aos mecanismos de ação, a
eficácia e a segurança desses suplementos. A investigação científica contínua é
essencial para aprimorar nossa compreensão e aproveitar todo o potencial
desses recursos na promoção da saúde gastrointestinal e no bem-estar geral da
população.

Referências

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