Direito Civil IV - Aula 02 - Unidade 02

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Unidade II – POSSE

2.1 Conceito de posse: corpus e animus. Posse como Direito das Coisas,
excluída do rol dos Direitos Reais. 2.2 Teorias sobre a posse: Savigny x Jhering.
2.3 Natureza jurídica da posse no Direito Civil brasileiro. 2.4 Objeto da posse.
2.5 Classificação da posse. 2.6 Posse, propriedade e detenção. 2.7 Função
social da posse: posse agrária, posse agroecológica e o direito à moradia.
Posse - Introdução

 Pluralidade semântica do vocábulo:


 posse como propriedade (fulano possui uma
casa);
 posse como instituto de direito público (os EUA
têm a posse da base de Manta, no Equador);
 posse como exercício do direito de família
(posse do estado de casados);
 posse como instituto de direito administrativo;
 posse como elemento de tipo penal (posse
sexual mediante fraude) etc.
Posse - Fundamento
 Quando alguém exerce poderes sobre uma coisa, exteriorizando
a titularidade de um direito, a ordem jurídica permite-lhe, por esse
simples fato, que os continue a exercer, sem exigir maior
justificação.

 Jus possessionis/posse formal: posse autônoma,


independentemente de qualquer título. Direito fundado no fato
da posse. Situação possessória: posse por mais de ano e dia,
manda e pacífica.

 Jus possidendi/posse causal: direito à posse, conferido ao


portador de titulo devidamente transcrito, bem como ao titular de
outros direitos reais. A posse não tem qualquer autonomia,
constituindo-se em conteúdo do direito real.

 Ambas são protegidas pelo direito.


Posse – Teorias sobre a posse
 Teoria subjetiva (Savigny):
 Posição autônoma da posse, afirmando categoricamente a existência
de direitos exclusiva e estritamente resultantes da posse.
 Conjugação de dois elementos:
 o corpus, elemento objetivo que consiste na detenção física da coisa
(elemento material);
 o animus, elemento subjetivo, que se encontra na intenção de exercer sobre a
coisa um poder no interesse próprio e de defende-la contra a intervenção de
outrem (elemento espiritual).

 Animus domini: vontade de ter a coisa como sua.


 Sem o corpus, inexiste posse. Sem o animus, não existe posse, mas mera
detenção.
 Ex.: locatário, comodatário, depositário, mandatário.

 Não admitia o desdobramento da situação possessória, por posse de


outrem.
 Posse passou a ser vislumbrada como uma situação fática merecedora
de tutela.
Posse – Teorias sobre a posse
 Teoria objetiva (Ihering):
 Não confere importância ao animus.
 Posse como exteriorização da propriedade.
 Elemento objetivo: a posse se revela na maneira como o proprietário
age em face da coisa. Corpus enquanto conduta do dono.
 Não reconhece autonomia da posse. Os interditos proibitórios nascem
da propriedade e não da posse em si mesma.
 Tem posse quem se comporta como dono, e nesse comportamento já́
está incluído o animus. Corpus constitui o único elemento visível e
suscetível de comprovação.
 A posse só é protegida porque representa a forma como o domínio se
manifesta.
 Destinação econômica da coisa.
 A posse converte-se em detenção, segundo Ihering, pela incidência de
obstáculo legal. Ocorre quando a lei desqualifica a relação para mera
detenção em certas situações.
Posse – Teorias sobre a posse
 Teoria sociológicas:
 Posse como autonomia em face da propriedade.
 Caráter econômico e função social da posse.
 Fortalecimento da posse, permitindo-se que, em alguns casos e diante
de certas circunstancias, venha a preponderar sobre o direito de
propriedade.
 À luz de uma teoria material dos direitos fundamentais, as teorias de
Savigny e Ihering não são mais capazes de explicar o fenômeno
possessório.
 Art. 1.228, §4º. O proprietário também pode ser privado da coisa se o
imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de
boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e
estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e
serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico
relevante.
Posse – Conceito
 A posse (tanto de coisa móvel como de coisa imóvel) é situação
jurídica de fato apta a, atendidas certas exigências legais,
transformar o possuidor em proprietário (situação de direito real).
(NERY, Nelson).
 A posse é o exercício de fato, em nome próprio, de um dos poderes
inerentes ao domínio.
 Nem todo estado de fato, relativamente à coisa ou à sua utilização,
é juridicamente posse. Ás vezes o é. Outras vezes não passa de
mera detenção, que muito se assemelha à posse, mas que dela
difere tanto na essência, como nos efeitos.
 Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o
exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à
propriedade.
 Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em
relação de dependência para com outro, conserva a posse em
nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.
Posse – Conceito
 Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou
tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos
violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a
clandestinidade.

 A posse não é o exercício do poder, mas sim o poder propriamente


dito que tem o titular da relação fática sobre um determinado bem,
caracterizando-se tanto pelo exercício como pela possibilidade de
exercício. Ela é a disponibilidade e não a disposição; não é,
necessariamente, o efetivo exercício.

 Posse é “uma situação de fato, em que uma pessoa, que pode ou


não ser a proprietária, exerce sobre uma coisa atos e poderes
ostensivos, conservando-a e defendendo-a” (CAIO MÁRIO) e
“exercitando sobre ela ingerência socioeconômica” (FARIAS,
ROSENVALD).
Posse e Detenção
 Para Savigny, o corpus identifica somente a detenção:
 Esta se eleva a posse quando se lhe acrescenta o animus especifico, ou
seja, o animus domini.
 Para Ihering, ambas se constituem dos mesmos elementos:
 o corpus, elemento exterior, e o animus, elemento interior, os quais se
acham intimamente ligados, de modo indissociável, e se revelam pela
conduta de dono.
 o que distingue a posse da detenção é um outro elemento externo e,
portanto, objetivo: dispositivo legal.
 Detenção como uma “posse degrada”.

 Não é possuidor o servo na posse, aquele que a conserva em nome de


outrem ou em cumprimento de ordens ou instruções daquele em cuja
dependência se encontre. O possuidor exerce o poder de fato em
razão de um interesse próprio; o detentor, no interesse de outrem.

 “Fâmulos da posse”: direito de exercer a autoproteção do possuidor,


quanto às coisas confiadas a seu cuidado, consequência natural de
seu dever de vigilância.
Posse e Detenção
 São situações de detenção: i) fâmulo da posse (art. 1.198, CC); ii)
atos de mera tolerância (art. 1.208, CC); e iii) a situação de quem
adquire a posse com violência ou clandestinidade, enquanto essas
não cessam (art. 1.208).

 Não há posse de bens públicos, principalmente depois que a


Constituição Federal de 1988 proibiu a usucapião especial de tais
bens (arts. 183 e 191). Se há tolerância do Poder Público, o uso do
bem pelo particular não passa de mera detenção consentida.

 Civil e Processo civil. Recurso especial. Ação possessória. Possibilidade


jurídica do pedido. Bem imóvel público. Ação ajuizada entre dois
particulares. Situação de fato. Rito especial. Inaplicabilidade. — A ação
ajuizada entre dois particulares, tendo por objeto imóvel público, não
autoriza a adoção do rito das possessórias, pois há mera detenção e
não posse. Assim, não cumpridos os pressupostos específicos para o rito
especial, deve o processo ser extinto, sem resolução de mérito,
porquanto inadequada a ação. Recurso especial provido. (STJ. REsp
998409. Rel. Min. Nancy Andrighi. Terceira Turma. J.13/10/2009. DJ.
03/11/2009)
Posse - Objeto
 Podem ser objeto da posse apenas as coisas corpóreas, aquelas
que podem ser visualizadas e tocadas (posicionamento dominante).
 Pretensão possessória decorrente da posse mediata ou imediata
sobre o bem.
 Ex. locatário, comodatário, usufrutuário – a posse não é sobre o direito
real ou obrigacional, mas sobre a própria coisa.
 O objeto da posse está no âmbito dos direitos reais e dos direitos
obrigacionais que implicam o exercício de poderes sobre uma
coisa.
 Há, entretanto, posicionamentos mais amplos. Destinação
econômica.
 Ex.: direitos do autor, propriedade intelectual, direito de uso sobre linha
telefônica.
 Hipóteses em que se poderia vislumbrar o exercício dos poderes de fato
sobre bens imateriais, partindo-se do pressuposto de que a posse não se
resumo à apropriação física da coisa.
 Súmula 193, STJ. O direito de uso de linha telefônica pode ser adquirido
por usucapião.
Posse – Natureza Jurídica
 Posse é um fato ou um direito?
 Para Ihering, a posse é um direito (interesse juridicamente
protegido).
 Há a corrente que entende a posse como um fato, pois não tem
autonomia nem valor jurídico.
 Para Savigny, a posse é fato e direito.
 Posse seria um fato na origem e um direito nas consequências, pois
confere ao possuidor a faculdade de invocar os interditos possessórios
quando o estado de fato for objeto de violação, sem que isso implique
qualquer ligação com o direito de propriedade e a pretensão
reivindicatória dela emanada (FARIAS, ROSENVALD).
 Sendo um direito, é direito real ou obrigacional?
 Para Savigny, é os dois.
 Para Ihering, é direito real.
Posse – Natureza Jurídica
 A pretensão de classifica-la como direito pessoal esbarra na própria
definição deste: relação ou vinculo jurídico que confere ao credor o
direito de exigir do devedor o cumprimento da prestação.
 CC/02: Não a incluiu no rol de direitos reais.
 A posse não é direito real, mas sim direito especial. É um instituto
jurídico sui generis.
 Conclusão “de que a posse é uma estrutura que não se
transformou totalmente numa instituição jurídica, uma vez que a
efetividade jurídica continua se apoiando na realidade social, o que
a faz infensa a sistematizações rígidas... O ser uma estrutura que não
se transformou totalmente numa instituição jurídica é o que explica
as singularidades da posse, que, desde o direito romano, ora é
disciplinada como estado de fato real, ora é regulada com
abstração, mais ou menos intensa, desse aspecto, como se fora um
instituto jurídico perfeito à semelhança do direito subjetivo”.
(HERNANDEZ GIL).
 A posse do bem se refere a uma dimensão de factualidade
contraposta a um reino estático de formas oficiais (FARIAS,
ROSENVALD).
Posse – Natureza Jurídica

 Manifestação plural da posse.


 Primeira dimensão: Quando o proprietário é possuidor de seu próprio
bem. Posse como um direito real na visão restrita do art. 1.196, CC.
Quando o proprietário exerce a posse, manifesta o domínio sobre o bem
por um direito real que se visualiza na situação possessória. Posse civil,
adquirida pelo título, sem a necessidade de exercício de atos físicos ou
materiais.
 Segunda dimensão: Posse vislumbrada como relação jurídica de direito
real ou obrigacional, quando emanada, por exemplo, de contrato de
usufruto, penhor, enfiteuse, promessa de compra e venda ou comodato,
onde o objeto é a coisa e não o direito em si. Tornam-se possuidores, sem
ser proprietários. A posse não é a mesma coisa que exercício do direito
de propriedade, mas se materializa na prática de qualquer ato por meio
do qual a propriedade se exterioriza.
 Terceira dimensão: Dimensão possessória que não se localiza no universo
dos negócios jurídicos que consubstanciam direito subjetivos reais ou
obrigacionais. Posse emanada exclusivamente de uma situação fática e
existencial, de apossamento e ocupação da coisa, cuja natureza
autônoma escapa do exame das teorias tradicionais. Função social da
posse. Posse como direito autônomo à propriedade, que representa o
efetivo aproveitamento econômico dos bens para o alcance de
interesses sociais e existenciais merecedores de tutela.

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