Rocha 2016 Bachelard

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BACHELARD: O CONTEXTO DO RACIONALISMO EPISTEMOLÓGICO NA


FILOSOFIA DAS CIÊNCIAS
Gabriel Kafure da Rocha1
Marina Ferreira de Sousa2
Rosimar Emilia Xavier de Sousa3

RESUMO

O presente artigo pretende esclarecer a problemática da epistemologia como fundamento


para a compreensão filosófica das ciências. Para isso, contamos com a visão do filósofo
francês Gaston Bachelard (1884-1962), focando principalmente no seu texto O
racionalismo aplicado (publicado em 1949) e a sua teoria que busca demonstrar a
complexidade presente nas linhas de pensamento construídas na história da filosofia: o
empirismo e o racionalismo.

Palavras-chave: Bachelard; Racionalismo, Epistemologia.

RÉSUMÉ

Ce article vouloir pour clarifier le probléme de l'épistémologie comment une base pour la
compréhension philosophique de la science. Pour cela, nous avons la vision du philosophe
français Gaston Bachelard (1884 à 1962), se concentrant principalement sur votre texte
Le Rationalisme appliquée (publié en 1949) et sa théorie qui cherche à démontrer la
complexité présente dans les lignes de pensée construite dans l'histoire de la philosophie:
l'empirisme et le rationalisme.

Mots-clés: Bachelard; Rationalisme Épistémologie.

Introdução

O presente artigo, visa entender a relação da natureza do racionalismo com um


racionalismo mínimo da via regional para multiplicar e afinar a racionalidade. Por se
tratar de uma atividade estruturante, o racionalismo integral é integrar os diferentes
axiomas de bases diferentes do pensamento., para isso nos valemos principalmente da
leitura do livro O racionalismo aplicado, uma das últimas obras diurnas de Bachelard
antes que iniciasse seus trabalhos sobre a poética e o imaginário. Logo, partiremos do

1
Doutorando em Filosofia pela UFRN, Professor de Filosofia do Instituto Federal do Sertão
Pernambucano.
2
Graduada em Filosofia pela UFPI.
3
Graduanda em Filosofia pela UFPI.

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conceito de filosofia da ciência, para conceituarmos a epistemologia de Bachelard no


contexto da racionalidade científica da época.
A filosofia das ciências consiste em uma das mais antigas áreas da filosofia, proto-
iniciada por Aristóteles, a mesma começou a ser dividida na modernidade a partir do
pensamento cartesiano: a teoria do conhecimento4 e a epistemologia. A epistemologia
deve mostrar basicamente a região em que se dá a justificação e a objetividade do
conhecimento científico, a qual Bachelard vai considerar como direcionamento
fundamental para a ciência. Já a teoria do conhecimento se valerá da discussão dos
aspectos que são considerados a base da realidade desvendada pela ciência, ou seja os
métodos racionais e experimentais pelos quais o conhecimento se dá. Logo, estas áreas
do conhecimento, ao se preocuparem com a reflexão a respeito da construção das ciências,
metodologias e suas implicações, na relação inerente com as próprias ideologias de uma
época ou sociedade, são fundamentais para compor boa parte da filosofia das ciências.
"Mas a epistemologia histórica já nos ensina que a ciência é professa por sacadas, por
mutações abruptas, por reorganizações de seus princípios: em suma, pela dialética
franca." (Lecourt, 1978, p. 77)
A filosofia então mostra o movimento de que, para pensar sobre a os fundamentos
da ciência, é preciso se valer não só de resultados necessários para a ciência, mas também
na verdade, de examinar o processo do conhecimento em seus diversos aspectos. Para
Bachelard, conhecer é analisar como apreender a realidade, ou ainda mesmo, apropriar-
se espiritualmente do objeto, no sentido de entender as camadas que constituem sua
realidade. Isso acaba por desconstruir a ideia de que esse processo pressupõe dois
elementos, o sujeito e o objeto, num sentido unívoco, ora, o algo que se conhece é um
processo simultâneo do objeto que se faz conhecido e do sujeito que conhece. Nesse
sentido, o objeto,
localiza um substantivo no vocabulário mais que uma coisa no universo. O
objeto designado por isto, mesmo apontado pelo dedo indicador, é, no mais
das vezes, designado numa linguagem, num mundo do nominativo. Diante de
um objeto que me designam por seu nome usual, nunca sei se é a coisa ou o
substantivo que vem pensar em mim, ainda esta mistura de coisa e substantivo,
informe, monstruosa, em que nem a experiência, nem a linguagem são dados
em sua ação superior, em seu trabalho de interpsicologia efetiva. (Bachelard,
1977, p. 67).

4
Segundo Vadée "A teoria da aproximação é uma teoria do conhecimento. A chave é não distinguir entre
estes diferentes termos: teoria do conhecimento, epistemologia, filosofia da ciência" (Vadeé, 1975, p. 43),
contudo, sabemos que existe nuances entre esses termos a serem esclarecidos, por isso como o próprio
Vadeé afirmará mais à frente, a epistemologia é o estudo sobre as aproximações entre essas teorias.

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A natureza da razão, nessa disseminação do que ela constrói como conceito, torna-
se ciência na medida que ela relaciona a teoria efetivamente com a realidade, sabendo ser
aplicada aos avanços tecnológicos, valorizando resultados práticos e acabando por não
voltar a refletir sobre si. Por isso, Bachelard costuma dizer que a filosofia não acompanha
a ciência, no sentido de fazer jus a própria complexidade da atualidade. “A ciência não
tem a filosofia que merece” (Bachelard, materialismo, p. 30). A sociedade, por sua vez,
espera que ciência seja provedora de um conhecimento aplicável que revolucione o curso
da história. A razão, nesse sentido social, é uma necessidade voltada para eficiência,
utilidade e produção.

O juízo de valor que a sociedade traça perante a educação acaba por ser
abarcado na filosofia bachelardiana como uma relação entre a ciência e o
ensino, de modo que é preciso estar atento à premissa ligada principalmente ao
erro. Visto que o posicionamento diante dele precisa superar a sua
representação enquanto obstáculo a ser descartado, para então desconstruir a
imagem própria do erro em direção a uma dimensão em que nele está um dos
aspectos mais valiosos do processo do conhecimento. (Rocha, 2017, p. 232)

Entender que a ciência é mais que uma atividade que produz conhecimento social
aplicável e seguro é a chave para refletir qual o fim da técnica e assim poder direcioná-la
para um conhecimento mais humano e melhor distribuído. Se a ciência tem como
proposta atingir esse patamar de estabilidade, ética, neutralidade ou não, então esse
conhecimento precisa ir além das conclusões certas, do propósito de sua aplicabilidade e
mesmo das condições sob as quais entende os fenômenos. Ora, para obter conhecimento
diferencial, ou mesmo para produzir um conhecimento novo nesta era de
desencantamento, é preciso saber se utilizar da imaginação e construir o próprio
fenômeno. Um primeiro exemplo dessa tendência se deu na própria história antiga da
filosofia, quando uma ideia de chamar átomo a partícula indivisível da matéria veio a
tornar-se uma realidade, ainda que abstrata, na contemporaneidade. Ora, tal descoberta
veio abalar totalmente as próprias noções de concreto e abstrato, de modo que a matéria,
hoje não é mais do que uma ideia: energia. Desta maneira, não há exclusividades na
ciência contemporânea, ora, é preciso repensar as variantes dos métodos científicos, fazer
com que o senso comum seja também esclarecido por uma ciência como estética da
inteligência.
Numa proporção cada vez maior, os grandes avanços científicos têm feito os
filósofos pensar mais complexamente a ciência. Nesse sentido, a filosofia é muito mais
um a posteriori da ciência. Portanto, filosofia e a ciência são expressões da mesma

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necessidade básica, a necessidade de compreender o mundo, compartilhar essas


descobertas para o bem da humanidade.
Este artigo objetiva então enfatizar que ciência e filosofia vivem em função uma
da outra, que em todas as descobertas feitas pela ciência, a filosofia tem sido e continuará
sendo suporte para os cientistas obterem êxitos em suas pesquisas, mas que isso tem
potencialmente a possibilidade de tornar o mundo uma eterna reinvenção que contribuirá
para um meio de vida melhor. Para Bachelard, nossa vida pode ser então comparada como
um molde com o cotidiano das ideias vão sendo modeladas e regidas pelo espírito
científico. Para nos ajustarmos aos próprios pensamentos do tempo, segundo ele, a nossa
vontade deve ir sempre além, como uma busca que quer questionar como é a melhor
forma de viver com aquilo que sonhamos ou acreditamos. Aí entra um aspecto
fundamental, de que o lado noturno da psiquê humana é justamente a imaginação, aquela
que foi renegada durante toda a história do conhecimento e que se mostra como
fundamental na complementariedade epistemológica criativa. Na visão dele, os sonhos
são a nossa maior base para as virtudes e as realizações dos planos científicos e
existenciais.
Quanto mais entendermos, mais crescemos em conhecimento, esta vasta dimensão
das depurações das ilusões do espírito e de sua fenomenologia, tem que ao mesmo tempo
aceitar a realidade de que sonhando estamos crescendo em conhecimento. Assim,
Bachelard acreditava que é a partir do devaneio solitário que somos capazes de desvendar
com inúmeras façanhas os desafios da realidade.

1. A epistemologia bachelardiana

Epistemologia, e o que se encontra no centro da radiação do trabalho, é o que


se espalha partir da qual progressivamente e simultaneamente domínios
extremamente variados e inesperados vão em muitas direções: a epistemologia
ou análise das características essenciais das ciências contemporâneas, história
das teorias científicas, filosofia da nova mente científica, filosofia geral,
análise de produções de imaginação e poesia, nova crítica literária, filosofia
estética, ética da cultura, ética do sonhar acordado (Vadeé, 1975, p. 36).

O debate acerca da epistemologia é algo que vem sendo discutida pelos mais
diversos filósofos, a filosofia francesa contemporânea vem encontrando respostas bem
diferenciadas por filósofos como Foucault, Canguilhem e o próprio Bachelard como um
dos precursores dessa tendência de alargar a epistemologia para a história do pensamento

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e aqui, entendido basicamente em volta do diálogo das ciências humanas com o


conhecimento e suas formas de apreensão. É inegável que a contribuição do filósofo para
o estudo dessas teorias que vieram a trazer novos horizontes para a natureza do
racionalismo. O mesmo percorreu não só nas bases da teoria do conhecimento, mas leu e
se utilizou de fórmulas da matemática e da física através das demonstrações do espaço-
tempo da relatividade einsteiniana e do comportamento dos elementos infinitesimais
dissertando sobre essas questões com intersecções poéticas e literárias. Levando o saber
filosófico partir da concepção de um outro ponto, realizando assim alterações em três
séculos do racionalismo.
Para o desenvolvimento do seu pensamento, o filosofo sofreu também a influência
da época do pensamento do também filósofo Henri Bergson (1959-1941), a respeito da
inteligência, relacionada como uma evolução criadora. Contudo, com diferenças
marcantes principalmente a respeito do princípio da continuidade, que é descartado por
Bachelard em favor da descontinuidade (tais argumentos encontram-se principalmente
nos livros A dialética da duração e a Intuição do instante), ele se tornou assim, um dos
principais opositores críticos de Bergson.
Bachelard tinha como preocupação principal, perceber que as distorções no ensino
das ciências são muitas vezes frutos das próprias verdades científicas. Ora, as pesquisas
podem se comportar de maneira diferente daquilo do que estão sendo disseminadas no
ensino, pois por si só, a educação em sua tendência de conservação substancial, chega
sem a curiosidade e a inventividade do cientista.
O autor também acredita que a teoria einsteiniana se torna mais significativa que
a “revolução copernicana” na medida em que a partir dessa concepção do espaço-tempo
que a ciência inaugura, se torna uma verdadeira pluralidade dimensional. Modificando os
próprios conceitos vigorantes da epistemologia. Fazendo também com o que se tenha
novos limites do racionalismo, empirismo e do próprio realismo.

O empirista tem o costume de dizer ao racionalista: “Sei o que você vai dizer.”
A isto deve responder o racionalista: “Bem, então você é tão racionalista
quanto eu sobre o assunto que discutimos.” Mas o outro prossegue: “E você,
racionalista, não adivinha o que eu vou dizer.”' — “Sem dúvida, responde o
racionalista, mas adivinho que você vai falar fora do assunto que nós
discutimos. (Bachelard, 1977, p. 67)

Sendo assim, num contexto de ironia e paradoxo são encaradas as filosofias da


ciência ultrapassadas que até hoje ficam sem prática, Bachelard acaba propondo uma
contra partida a essas concepções clássicas e mesmo demasiadamente lógicas da teoria

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do conhecimento, no ao chamado racionalismo aplicado, como modelo da filosofia da


ciência contemporânea. Bachelard acredita que o que havia de mais importante na ciência
moderna da época era a hipótese e a capacidade dialética da racionalidade formulá-la.
Sendo esse um momento único, é nele pois que se permite que a experiência se dê por
meio da verificação na realidade. Sendo ainda essa mesma produção de uma realidade
nova, pensada pela ciência e recebendo o sentido também pela filosofia, ou seja, sendo
compreendida e disseminada filosoficamente.
Como pudemos ver de início, não são apenas as consequências desastrosas de um
racionalismo dogmático que trouxeram problemas para todas as áreas, como vem sendo
discutido até então, a própria ciência vem sendo bastante atingida. Os próprios saberes se
questionaram sobre as suas ideias e convicções formando novas perspectivas que tentam
sintetizar aspectos qualitativos-quantitativos. Contudo, segundo Bulcão (2009), quando
Bachelard afirma que cada ciência possui um campo específico, ela quer dizer que jamais
se chegará a alguma ideia nova, ou certeza concreta se, ao pesquisar uma área específica,
ao misturar-se com todos os conhecimentos. Ora, não é simplesmente sintetizar tudo o
que foi produzido ou mesmo depurar totalmente a ciência como um saber único, é
necessário parar para analisar o que cada área com seu método pode contribuir para se
chegar a uma aproximação da realidade, na qual tanto se tem dúvidas, mas também se
encontra respostas provisórias. Quando Bachelard se opôs aos princípios do
espiritualismo francês5, não havia dúvidas de que para se chegar ao conhecimento,
primeiramente era necessária a experiência. Pois, através da experiência se exprime a algo
que primeiramente fora concebido por meio de alguma ideia. O saber e a prática são algo
diferentes, porém complementares e indissociáveis.

1.1 A Epistemologia e filosofia das ciências

A epistemologia, dentro da filosofia da ciência, tem como objetivo levar a um


esclarecimento do real ponto de vista da reflexão científica, pois só dela pode-se chegar
a uma total conclusão sobre concepção científica. Sendo que, para ela, sempre serão
necessários maiores esclarecimentos que justifiquem as posições epistemológicas, já que

5
Uma síntese do pensamento de Émile Meyerson e Auguste Comte, no qual "A corrente do espiritualismo
era constituída por pensadores que defendiam uma doutrina idealista, sem interesses especulativos, mas
cujo objetivo maior era combater o 'materialismo dos filósofos iluministas'". (BULCÃO, 2009, p. 20).

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para se ter um amplo entendimento da ciência é preciso saber reconhecer que as tarefas
são contínuas e cumprir e questioná-las é assumir a necessidade da descontinuidade para
o surgimento do novo.
Os conceitos científicos na ciência contemporânea procedem por rectificações
e complexificações. Na discussão das relações da verdade e da realidade no
conhecimento científico, os filósofos sofrem de um vício radical: não entram
suficientemente nos processos de conhecimento científico exceto por raras
exceções (Vadee, 1975, p. 39).

Por mais que as visões da história das ciências sejam diferentes em cada época,
pois se tem problemas distintos que exigem a ruptura com a época anterior, ainda assim
não se admite que, ainda que o mesmo pensamento de décadas atrás, persista nos dias de
hoje, contudo, se refletirmos o ponto da epistemologia em questão, vimos que as
mudanças existem no sentido de uma trans-racionalidade.
A trans-racionalidade é estabelecida, escreve Bachelard, após um longo
trabalho teórico através de uma organização algébrica. Não tem nada a ver com
uma correspondência vaga estabelecida por um empirismo sem escrúpulos no
início do conhecimento. (Lecourt, 1978, p. 72)

Não seria errado, em se admitir que para se comparar algo é preciso,


primeiramente fazer muitas análises e se obter uma real e concreta conclusão dos fatos.
Para se estabelecer a essência do conhecimento científico, deve-se pesquisar, analisar,
refletir e chegar um contexto real a qual se é buscado. Evitando-se qualquer tipo de
sujeição que possa impedir o crescimento da ciência.
Qual sentido tem o verdadeiro conhecimento científico? Segundo o próprio
Bachelard, não se pode chegar a lugar algum se todos os métodos não forem bem
estruturados. Algo mal elaborado jamais poderá ser bem sucedido. Bachelard também
percebeu que a disciplina da própria filosofia das ciências era sempre relegada, deixada
de lado ou para segundo plano no campo da própria prática científica. Contudo, mais do
que nunca, hoje, principalmente na física é pela filosofia ou mesmo metafísica que os
esforços não são meramente reduzidos a nada, e ideias não são vazias e os próprios
laboratórios vem sendo cada vez menos equipados e cada vez mais embasados na reflexão
metafísica.
Sem dúvida, nasce daí a grande necessidade de buscar e estar cada vez mais
capacitado para que possamos aprender o novo a partir da própria reflexão filosófica que
os cientistas estão se apropriando e a filosofia está muitas vezes deixando de lado, pelo
fato de ter destruído a metafísica e considerando-a como acabada, quando na verdade suas
bases estavam equivocadas, mas sua prática nunca deixará de ser inerente ao saber e
pensar humano, situando-se profundamente para captar o mais essencial.
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Diversos a tantas opiniões é impossível não ficar confuso, já dizia Bachelard:


Apenas [se] tem resolvido consagrar suas forças a vida filosófica nova,
vinculada a cultura científica, quando recebe os conselhos, mais contraditórios:
Seja preciso, diz o técnico, nada de detalhes supérfluos diz o matemático,
traduza em linguagem usual toda essa matemática, diz o psicólogo, façamos
compreender a essência de relatividade, da mecânica dos quanta, da mecânica
ondulatória, diz o empirista da vida comum, sem refletir que nenhuma dessas
disciplina tem a menor influência sobre a vida comum. (Bachelard, 1951, p.
5).

Digamos que a escola da filosofia a qual devemos nos vincular é a da filosofia da


ciência contemporânea, mas na realidade o difícil e o verdadeiramente essencial, torna-
se um pouco limitado a tantas questões mostradas assim por Bachelard.
Para Bachelard, nem os cientistas, nem os filósofos conhecem os verdadeiros
objetivos da epistemologia. Para entender a todos os argumentos é preciso manusear tudo
em formas de fatos. O que é estranho e talvez impossível, portanto, há um contraste no
que pode ser a filosofia epistemológica desde que ela se beneficie de outros saberes como
a própria psicologia e também a educação. Há grande necessidade de rever a todos os
conceitos, pois assim chegaremos a caracterização da real situação a ciência em termos
teóricos, práticos e pedagógicos. Segundo Bachelard, uma epistemologia que aprenda à
dialética do pensamento científico é aquela na qual se induz, estimula e incentiva-se a
busca de novas causas e problemas a serem formulados.
Conforme diz Bachelard: “A doutrina de uma razão absoluta e imutável é uma
filosofia superada” (BACHELARD, 1975, p. 28). Assim sendo, a razão que não seja
sujeita a mudar, mas sim ser permanente e constante, acima das opiniões, levará ao
conhecimento científico simplesmente dogmático. É a consciência construída
intersubjetivamente como processo dos progressos do espírito científico que mostra que
a relação é o verdadeiro sentido do conhecimento.
Sabendo-se que para Bachelard, apesar das críticas entre o realismo e idealismo,
estes são as essências da filosofia científica, pois se tem um esclarecimento na medida
que reconhecendo como a causa da existência das ideias, representa-se o dinamismo do
conhecimento que completa-se. Fica sendo relativo às filosofias então, demonstrar as
transformações da essencialidade do pensamento, pois Bachelard considera que um dos
obstáculos do conhecimento é justamente o apego às tradições, voltadas para o empírico
e o racional puros.
Bachelard constrói sua filosofia de modo que às vezes ele postula como uma
hipótese de trabalho que a imaginação é uma força principal e, finalmente, seu
método "empírico-postular" leva a uma filosofia mista, imprimindo tanto
realismo como o idealismo. (PIRE, 1967, p. 199)

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Em vista de que não é fácil apresentar as características da filosofia da ciência,


não existe um real conceito que estabeleça e analise claramente as características do
racionalismo. A filosofia, portanto, que tanto se busca a si mesma, precisa adquirir várias
consciências para se chegar a uma renovação. Deve-se então analisar a construção e a
técnica que tende a reunir o saber, e com isso não desprezar tais conhecimentos que
passaram a cair no esquecimento, como a própria alquimia e outros saberes rejeitados na
modernidade.

2. Racionalismo e empirismo

Em lugar de partirmos da experiência imediata devemos seguir o movimento


epistemológico inverso, voltando-nos para o abstrato e dele indo até a
experiência, a fim de ordena-la. Esse é o "racionalismo aplicado" de Bachelard.
(BULCÃO, 2009, p. 59)

Quando a epistemologia estuda a origem, estruturações, métodos e validez do


conhecimento, ela ganha um destaque de sendo seu problema central, compreendido
como a condição da possibilidade da própria ciência. A questão é, em que medida essas
respostas poderão ser obtidas por formas de pensamento empíricas ou racionais? Essas
inquietações vão muito além de possibilidades criticistas ou sintéticas do empirismo e
racionalismo. No que tange a diferença dos mais diversos conhecimentos, que vão desde
memória, informação, formas diretas e indiretas de como se dá o aspecto relacional do
sujeito ou objeto.
Se essas tendências do pensamento, até então norteadas pelo Racionalismo e o
Empirismo, eram ditas então como filosofias que fundamentavam as teorias científicas
dos Séculos XVII ao XIX, elas passaram a não explicar mais a complexidade das ciências
contemporâneas. Diante disso, o Racionalismo aplicado, proposto por Bachelard, começa
a explicar as ciências contemporâneas. “Na cultura científica tornamo-nos
necessariamente o sujeito consciente do ato de compreender. E se o ato de compreender
supera uma dificuldade, a alegria de compreender compensa todos os pesares”
(BACHELARD, 1977, p. 224).
O filosofo Bachelard destacou o tema da construção do objeto científico, como
praticamente seu eixo central, o mesmo refletiu sobre a grande diferença de dois tipos de
conhecimento; o espontâneo e o científico. Atualmente, a ciência se coloca como uma

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construção intensa e difícil, realizada através do diálogo entre técnica e razão,


considerado como pensamento científico. Já quando Bachelard demonstra que o trabalho
da ciência, é por sua vez, uma ordem construída aleatoriamente, ou seja, algo que apesar
de já ter uma forma e molde histórico, é na relação implícita entre a distância da ciência
e senso comum que se dá o conhecimento espontâneo.
A observação, enquanto a construção do objeto, vai ainda mais além quando aceita
o conhecimento comum, indagando em saber a participação do sujeito na construção do
saber. Se esse for negligenciado pela tradição positiva que entendia no sujeito mero
receptor das verdades objetivas, então o conhecimento científico será avaliado como algo
imposto.
Naturalmente, se alguém se puser a observar-se, descobrirá certa pluralidade
de filosofias associadas a uma noção rigorosa. Faz-se uma opção filosófica
apenas por necessidades polêmicas. Mas perante a realidade, o mais resoluto
dos lógicos organiza suas fórmulas no centro de um psicologismo implícito; o
simbolista mais convencionalista recorre a exemplos reais, bem
materializados; o realista atribui o absoluto às suas verificações empíricas.
(Bachelard, 1977, p. 25)

Contudo, a epistemologia bacherladiana coloca o próprio sujeito como uma


“cidade científica” que em um processo ativo de construção racional e técnica, ergue os
próprios fenômenos estudados, como também a própria objetividade científica. A partir
desse pensamento, se considera a informação de que não há nem objeto nem sujeito
construídos de forma prévia, sendo ambos formados ao longo do processo. Bachelard
acredita que a ciência atualmente não tem mais como objetivo a descoberta de fenômenos
ou descrição das leis, e sim formular organização racional que sejam tecnicamente
realizáveis.
O filosofo Bachelard acredita que as filosofias das ciências “tradicionais” não são
adequadas ao pensamento científico contemporâneo, por isso estão em constante
evolução. Contudo, é importante também pensar que é até racional esperar que a filosofia
do passado não caiba agora como modelo ou paradigma, contudo é insustentável perceber
que a filosofia do passado fazia seu papel para a época, e a de hoje não o faça.
Por isso, o empirismo e o racionalismo têm que continuar a estabelecer um diálogo
permanente. O racionalismo aplicado procura dialetizar o pensamento e esclarecer a
experiência, existe uma certa imbricação entre razão e experiência, mas é a ciência
contemporânea que não pode ser entendida como dois pontos de partida diferentes –
Razão ou Experiência – disputa que caracterizou os Séculos XVII, XVIII e XIX, o melhor
é abarcar o contemporâneo científico e popular da razão e da imaginação.

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2.1 A relatividade na ciência contemporânea

É a partir das constatações anteriores que podemos conceber que a ciência


contemporânea é tão dinâmica que permite que o homem entre em mundo novo, de
pluralidade, em que o real rompe com a ideia de alternância. O cientista pode possuir
várias perspectivas do real, sem deixar a coerência de lado, percebendo que a dialética
não necessita de síntese, como é o caso das dialéticas negativas da contemporaneidade.
Contudo, “o detalhe que dita à lei, é a exceção que se torna a regra e que não é em plena
luz, é ao lado da sombra que o raio, ao difratar-se, nos confia seus segredos”.
(BACHELARD, 1975, p. 90). Ora, o real imediato e aparente não contribui para o
desenvolvimento da ciência, toda regra tem sua exceção e toda exceção muitas vezes é a
chave para o aparecimento da “novidade” de novas regras e leis, é nos detalhes das
exceções que as leis fazem a diferença na sua capacidade de dar conta da complexidade
da realidade.
É justamente isso que a Teoria da Relatividade de Einstein constituiu para
Bachelard, uma verdadeira “revolução” que abalou os alicerces da Física newtoniana e
apontou para uma mudança muito mais significativa do que a Teoria copernicana foi para
a Filosofia kantiana. O entendimento de que a força é uma relação em que não há mais
materialidade possível com a realismo da energia, o espírito científico e a sua aceitação é
a possibilidade do conhecimento. A epistemologia de Bachelard está no movimento de
colocar o problema e não somente em resolvê-lo, isso tudo partindo do princípio de que
tudo está aberto. A ciência não passa a existir somente como algo “dado” de imediato,
tornando assim cada vez mais abstrata. Diante disso, a ciência deixa de estar na própria
finalidade, passando de um conhecimento desinteressado para se transformar em um ato
de criação real.
Recuperando as raízes do Pensamento Epistemológico de Bachelard com
penetração, o Sr. Georges Canguilhem traz de volta a três axiomas: o primado
teórico do erro - a depreciação especulativa da intuição. [...] Não podemos
expressar melhor que toda a reflexão de Bachelard sobre a ciência seja
controlada pela percepção de uma articulação fundamental da razão em outra
que não é a realidade de Meyerson, nem a negação lógica, mas uma força viva,
interior ao espírito. (GAGEY, 1969, p. 36)

É importante destacar ainda que a epistemologia de Bacharelad seja importante,


contribuindo para um reflexo crítico da ciência demonstrando também o seu papel que

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não tem mais como objetivo buscar o fundamento ou limite do conhecimento científico,
tendo assim uma maior reflexão voltada para análise da prática real e concreta dos
cientistas. Diversos pensadores comungaram com o pensamento de Bachelard, como é o
caso de Bourdieu e Canguilhem. O primeiro acreditava que o fato é conquistado,
construído e constatado, o que significa afirmar que o fato não é “factum”, não é “dado”,
nem “fenômeno”; o “racionalismo aplicado” é sim o único capaz de restituir
completamente a verdade da prática científica ao associar intimamente os “valores de
coerência” com a “fidelidade ao real” (Cf. BOURDIEU, 1976, p. 83). Enquanto
Canguilhem acreditava que o pensamento de Bachelard eram axiomas, que iriam
demonstrar os meios com muito cuidado e dedicação, da forma de coleta e comprovação.
Canguilhem, separou os eixos principais para as verdades axiomáticas presentes no
pensamento de Bacharelad, que são: - A primeira, acreditar que não existe uma primeira
verdade e sim um primeiro erro, onde a verdade não faz sentido caso não exista uma
polêmica; O segundo eixo, é diante do campo das intuições em que as mesmas são vistas
como úteis, mas sua utilidade existe para ser depois destruídas. Nesse sentido, esses
axiomas, podem ser convertidos nessas fórmulas:

- “Em todas as circunstâncias, o imediato deve ceder o lugar ao construído” (Bachelard.


1975, p. 144) e;

- “Qualquer dado deve ser encontrado como resultado” (BACHELARD. 1975, p. 57).;

- Já o terceiro e último axioma é relativo à “Posição do objeto como perspectivas das


ideias” (BACHELARD. 1975, p. 246).

Ora, o conhecimento como aproximação entre erros e verdades é justamente


espacial, ou seja, relativo a perspectiva da posição não neutra do cientista que o construiu.
É valido lembrar que o materialismo racional e o racionalismo aplicado são as grandes
premissas que norteiam a epistemologia de Bachelard, ratificando a sua ideia de que a
racionalidade é uma construção que tem como resultado novas posições e perspectivas
para a ciência sempre progredirem.
Desse modo, a relatividade se coloca como uma extensão da compreensão das
noções da própria racionalidade. Certos hábitos enraizados de realismo colocam o objeto
como raiz e razão de suas qualidades. Contudo, a relatividade, ao contrário, tenta uma

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educação que não considera mais funções totalizadoras, ela só coloca a relação de
reciprocidade entre suas variáveis. Bachelard considera que o realismo se coloca como
um julgamento primordial de uma realidade íntima e individualizante, ele tenta
sistematizar predicados como relações e não como propriedades substancializadas.
"A relação insere-se no princípio essencial da discursividade do pensamento
racional que afronta os pressupostos apriorísticos bem como o determinismo mecanicista.
(CARVALHO, p. 32) A questão da relação, no que tange o pensamento bachelardiano, é
que não é uma simples questão de medida física dos espaços entre objetos, mas sim algo
que afeta o ser das coisas. Não é à toa que alguns comentadores, como o próprio Bourdieu,
consideram que em Bachelard o real é relacional, pois o que se crê como consequência
metafísica não é mais do que um ponto de partida para a coerência ontológica da
matemática, da psicologia e da própria filosofia. Eis então que há muito mais para se
pesquisar e se aprofundar nesse sentido.

Considerações finais

E se nos restringirmos a esses fatos, separando-os tanto das condições técnicas


do seu exame como das condições teóricas de sua investigação, voltamos
justamente a substituir conclusões por resultados. Pelo contrário, deveríamos
sistematicamente mostrar e demonstrar que resultados são conclusões, são
respostas a questões bem formuladas, a questões científicas. (BACHELARD,
1977, p. 46).

Segundo o próprio Bachelard, é preciso estabelecer as características de uma


autêntica história das ciências. Esta, para ser uma historiedade original, deve analisar
todos os fatos científicos do passado para, a partir de toda sua análise, chegar a uma
explicação clara da complexidade da ciência atual.
Conhecendo bem todas as construções teóricas de hoje, temos a total possibilidade
de compreender melhor a evolução e a superação das dificuldades da ciência. É claro que
há uma dificuldade em acompanhar o próprio progresso científico, visto que suas
verdades chegam tão depuradas até nós. Mas não há dúvida de que a construção do
conceito, pela filosofia, é uma aproximação com a veracidade subjetiva e científica de
nós mesmos, na medida em que não há teoria fixa como totalidade dos fatos.
É preciso então, estabelecer que todas as descobertas são possíveis na medida em
que hajam formações progressivas e rupturas com as teorias anteriores. Para Bachelard,
a história da ciência pode ser normativa, mas é preciso julgar, pois não teria sentido

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simplesmente descrever os fatos sem uma crítica que mostrasse o fundamento e a validade
das descobertas científicas. Na dúvida que a observação traz, segundo ele, o sentido não
existe sem que a pessoa queira, faça algo, busque e questione e analise os fatos
fundamentais.
Bachelard diz:

Trata-se, de fato, de mostrar a ação de uma história julgada, uma história que
deve ter como objetivo distinguir o erro e a verdade, o inerte e o ativo, o nocivo
e o fecundo... Na história das ciências é necessário compreender, porém
também julgar” (BACHELARD, 1972, p. 142).

O fato em questão é que o conhecimento por si só, somente trás dele o que
compreendemos. Julgar pré-compreensões se tornaria no mínimo dogmático, desse modo
é que a crítica vai exercendo a prática de um pensamento científico. Logo, é necessário
que a história das ciências dê o devido valor a epistemologia, visto que, assim como a
teoria do conhecimento, ela visa indicar os reais valores científicos que perpassam pela
ciência atual.
A indagação de Bachelard, portanto, é a de que a epistemologia tem que ser
histórica, mas também estabelecer uma filosofia adequada a ela. Nesse sentido, que torne
explícito as características da atividade acadêmicas, mas também que esteja atenta as suas
condições reais. Esse é o dinamismo necessário ao racionalismo para que ele seja vigente
na inserção do saber científico ao mundo da cultura.
É por conta disso que Bachelard toma a posição de ‘filósofo do não’, quando ele
destaca que na filosofia da ciência é preciso mudanças e revoluções que busquem
desenvolver melhor os limites e da ciência atual. Tornando-a mais ampla com as
contribuições das ciências humanas, das chamadas psicanálises indiretas do próprio
conhecimento.6
Perceber esse movimento como continuidade é negar o próprio processo dialético
do pensamento, tornando-o infértil, inerte, imóvel. Negar a própria pluralidade da
dialética, se apropriar, vislumbrar e mesmo criar nuances de seu próprio método é não

6
Analisando a influência de Freud sobre Bachelard, é possível ver que este último considera que as forças
psíquicas atuam sobre o ato de conhecer e constituem-se também em obstáculos para a objetividade
científica. Em outras palavras, a psicanálise é uma saída a curto prazo para o ato do conhecimento.
Bachelard compreendeu muito bem que a complexidade do ato de conhecer é mostrada pela minuciosa
análise da razão como totalidade da vida, incluindo a psique. O ser, como totalidade de possibilidades do
conhecimento, precisa de uma psicanálise que afaste seus obstáculos, véus e interferências na história. O
inconsciente coletivo (e nisso, a influência junguiana se mostra mais predominante na filosofia
bachelardiana) produz valores muitas vezes imutáveis que desvelam momentos de evolução científicas
permeados de valores psíquicos. Por isso, cada etapa do conhecimento merece uma espécie de psicanálise.

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questionar-se filosoficamente perante os problemas científicos. Ora, se não observarmos


que a ciência atual é viva e está em contínuo processo de construção, então ignoraremos
que essa dimensão atual é fruto da negação de métodos já usados no passado.
Assim, na medida em que descobrimos que a revolução científica é um reconstruir
frequente das mudanças que desatualizam os modelos vigentes e que são condição para a
evolução e reforma do pensamento, então é nesse alerta que Bachelard mostra a
necessidade do preenchimento e esvaziamento das construções científicas. A
racionalidade é sim a condição para a cientificidade do conceito. É preciso refletir para
medir e não medir, pois da maneira que observamos algo em sua complexidade, nunca é
exatamente o que ele realmente seja. Entretanto, deve-se buscar resultados exatos, e
soluções para se resolver, com previsão, e chegar a uma experiência a qual se quer atingir
o conhecimento objetivado.
Em vista desse estudo diverso da racionalidade bachelardiana, percebemos que
uma das intenções de Bachelard foi mostrar a representação social da ciência sobre o
trabalho dos cientistas. A especialização que eles chegaram, reconhecem a interferência
subjetiva deles, da maneira como lidaram com os obstáculos epistemológicos e por sua
vez, como conseguiram construir novos objetos científicos ao superar seus obstáculos.
Comparando como em diferentes épocas, ideologias em que houveram aspectos da
racionalidade que foram além do óbvio, é possível então, se utilizando da imaginação e
da dialética, chegar sempre a novas respostas.
Para Bachelard, a evidência da objetividade como conquista sobre a subjetividade
é o que dá os dados de análise para a própria construção das etapas que compõe a
construção do objeto científico. Na epistemologia, a objetividade tem o aspecto de uma
vitória em relação ao conhecimento, pois é quando os próprios erros involuntários são
depurados.
Entretanto, os aspectos qualitativos também são alcançados pela racionalização
das técnicas da objetividade. A qualidade vai se tornando cada vez mais precisa diante do
que Bachelard concebe como a crença de que há uma essencialidade na tendência absoluta
da quantidade.
Por meio de elaborações de técnicas e experiências, chegamos então ao que
consideramos como ciência contemporânea. Uma construção histórica, coletiva (pois é
também parte de uma interpretação filosófica), que poderá ser finalmente valorizada
como uma beleza pancalista fundamental. Ou seja, a ciência é também uma maneira de
reconhecer que o universo é belo, a ciência é estética e deve ser conhecida e reconhecida

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concebendo a complementariedade e o valor artístico da sua própria criação teórica e


prática.
Basicamente, para Bachelard, os valores epistemológicos da ciência são
ineficazes quando produzida pela razão matemática dela mesma, e que se é
assim eles devem excluir os antivalores que são o empirismo e realismo, mas
então também os valores psicológicos do devaneio, contudo essas são regras
fundamentalmente práticas para uma vida feliz da mente imaginativa solitária.
(VADEÉ, 1975, p. 160)

Enfim, podemos concluir que de fato, ao analisar as ideias vista pelo autor em
questão, vimos que a epistemologia bachelardiana é importante, porque ela contribuiu
mesmo com algumas críticas para a ciência contemporânea e atual, promovendo um
crescimento do espírito do conhecimento científico. Que as técnicas usadas precisam ser
cada vez mais eficientes para se alcançar as metas, e criticamente se transformarem em
um conhecimento. Só então, a epistemologia encontra mais espaço, com a observação de
que a filosofia da ciência nos deixa um legado de que precisamos tornar nossa realidade
mais artística e científica. A construção de novos conceitos é fundamental, avançar cada
vez mais deixando o devaneio do conhecimento garantir que a ciência não se torne
simplesmente reprodutiva. Pois só assim, se pode reconhecer a verdadeira dinamologia
do conhecimento esclarecida então pelo próprio Bachelard.

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Referências

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VADEÉ, Michel. Bachelard ou Le Nouvel Idealisme Epitemologique. Paris: Editions


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