Projeto de Pesquisa - Marina
Projeto de Pesquisa - Marina
Projeto de Pesquisa - Marina
ESCOLA DE ENGENHARIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
Usina termelétrica a partir de biogás como solução para redução dos impactos
ambientais oriundos do gás metano oriundo de aterros sanitários: um estudo de caso
feito no aterro sanitário do Ecotres - Conselheiro Lafaiete
Belo Horizonte
2024
Marina Teixeira de Freitas
Usina termelétrica a partir de biogás como solução para redução dos impactos
ambientais oriundos do gás metano oriundo de aterros sanitários: um estudo de caso
feito no aterro sanitário do Ecotres - Conselheiro Lafaiete
Orientador:
Coorientador:
Belo Horizonte
2024
(Espaço para dedicatória)
.
AGRADECIMENTOS
“epígrafe.”
autor
RESUMO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................20
CAPÍTULO 1 – A USINA TERMOELÉTRICA EM FOCO...................................................24
1 – Organização do trabalho operacional e ferramentas de gestão de segurança.....................26
1.1 Quadro de funcionários.......................................................................................................26
2 – O recorde.............................................................................................................................32
3.3 Objetivos.............................................................................................................................54
INTRODUÇÃO
O lixo tem sua história iniciada muito antes do que se pode imaginar. No início dos tempos, a
partir Durante o Paleolítico e parte do Neolítico o homem era nômade - Moravam em cavernas,
sobreviviam da caça e pesca, vestiam-se de peles e formavam uma população minoritária sobre a
terra. Qunado a comida naquele lugar esgotava, migrava-se para outros locais, e os seus "lixos",
deixados sobre o meio ambiente, eram logo decompostos pela ação do tempo.
Naturalmente, esse desenvolvimento foi se acentuando com o passar dos anos. A população
humana foi aumentando e, com o advento da revolução industrial - que possibilitou um salto na
produção em série de bens de consumo - a problemática da geração e descarte de lixo teve um
grande impulso. Porém, esse fato não causou nenhuma preocupação maior: o que estava em alta
era o desenvolvimento e não suas consequências.
"O lado trágico dessa história é que o lixo é um indicador curioso de desenvolvimento de uma
nação. Quanto mais grandiosa for a economia, mais lixo o país irá produzir. Ë o sinal de que o
país está crescendo, de que as pessoas estão consumindo mais. O problema está ganhando uma
dimensão perigosa por causa da mudança no perfil do lixo. Na metade do século, a composição
do lixo era predominantemente de matéria orgânica, de restos de comida. Com o avanço da
tecnologia, materiais como plásticos, isopores, pilhas, baterias de celular e lâmpadas são presença
cada vez mais constante na coleta.
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O quadro de funcionários próprios da usina era composto por 46 pessoas, divididas entre
os setores de operação, manutenção, planejamento e administrativo. Além do quadro próprio a
empresa contava com cerca de 20 funcionários terceirizados divididos entre as atividades de
limpeza, manutenção e portaria.
Durante o período da pesquisa, a usina operou em regime ininterrupto onde havia a
divisão entre funcionários que trabalham em horário administrativo e em turnos. O trabalho
em turno era delegado à equipe de operação, que possuía pelo menos três pessoas escaladas
em cada turno. Os demais operadores e restantes do quadro da empresa trabalhavam no
horário administrativo.
O foco desta pesquisa era a equipe de operação. No entanto, em alguns momentos houve a
participação da equipe de manutenção, uma vez que há atividades e processos em que eles
estão diretamente envolvidos.
A equipe de operação era subdividida entre as áreas de tratamento de água; caldeira;
turbina; painel mecânico e supervisão. Até os últimos dias de coleta de campo, ela
contava com 1 supervisor; 5 operadores de turbina; 2 operadores de painel; 2
operadores de caldeira; 4 operadores de T.A. (Tratamento de Água); 8 mantenedores; 1
pessoa responsável pela geração solar; e 1 pessoa alocada na área para trabalhar na área
administrativa, conforme Figura 2. Destes operadores, dois atuavam também como
operadores-programadores. Um dos operadores de turbina se desligou da empresa durante a
pesquisa, restando apenas 4 operadores de turbina. Além de atuarem nessas funções, a maioria
desses operadores encontravam-se em treinamento, sendo que havia 2 operadores treinando
painel; 6 operadores treinando caldeira; e 2 operadores treinando turbina. Dos mantenedores
que não estavam em treinamento, quando necessário, atuavam no T.A. (Tratamento de
Água), 1 pessoa que se encontrava em treinamento para essa área; 1 pessoa na turbina; e 2
mantenedores na caldeira, sendo que estes também
encontravam-se em treinamento nessa área.
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O setor de operação era responsável por executar a operação dos equipamentos quando
solicitado pelo sistema, testar os equipamentos quando a usina estava em stand by e solicitar
as manutenções necessárias para garantir o bom funcionamento da usina quando havia
demanda de produção de energia térmica.
O ingresso no setor
A contratação dos profissionais era realizada através de concurso público. Os
candidatos aprovados na seleção podiam ser direcionados para a função de técnico
mantenedor ou técnico operador e realizavam um curso de formação inicial na escola da
empresa.
Havia também, até meados dos anos de 1990, através de uma parceria realizada com o
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), alguns trabalhadores que ingressaram
na empresa por essa via, onde os candidatos aprovados em processo seletivo do SENAI
entravam para realizar o treinamento de eletricista ou mecânico, passando por estágios na
manutenção, para posteriormente realizarem avaliações a fim de que fosse concretizada a
contratação. Após alguns anos na função e de acordo com as demandas, estes podiam optar
por se transferirem de setor passando a atuar na operação.
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A formação
A concessionária de energia possui uma unidade de formação profissional própria e
era responsável por treinar os novos operadores e realizar os treinamentos de reciclagem
periódicos de todos os profissionais. Apesar de o treinamento inicial ocorrer nesta unidade de
formação, era na própria usina que eles adquiriam os conhecimentos sobre operação de uma
usina termoelétrica, pois o treinamento inicial recebido era voltado para operação de usinas
hidrelétricas e trabalho com eletricidade.
Na usina, os novos operadores começavam os seus treinamentos teóricos e práticos,
atuando sob supervisão nas atividades da área de recebimento de óleo e tratamento de água.
Conforme as demandas surgiam no setor e de acordo com o desenvolvimento da experiência,
avaliada pelo supervisor de operação, estes passavam a atuar posteriormente na área da
caldeira, turbina e por fim, no painel mecânico.
Os trabalhadores
O setor de operação era composto por um supervisor de operação e operadores
programadores, operadores de painel mecânico, operadores de turbina, operadores de caldeira
e operadores de tratamento de água e recebimento de óleo. Acima do supervisor encontrava-
se o gerente da unidade.
O supervisor era responsável pela gestão das atividades de operação. Os operadores
programadores possuíam a função de realizar a gestão das permissões de trabalho (PT) e
auxiliar na programação das manutenções dos equipamentos da operação. Assim, eles
constituíam um elo entre a manutenção e a operação. As demais funções eram encarregadas
de executar as atividades de operação.
Bom dia
O Bom Dia é um e-mail que deveria ser lido por todos os trabalhadores da usina, não
se restringindo apenas ao setor de operação, no início de suas jornadas de trabalho onde havia
informações sobre as atividades realizadas na usina que necessitam de atenção, como
manutenções em andamento, finalizadas e necessitadas; e medidas de segurança tomadas em
decorrência de algum evento. Também eram informados sobre a ocorrência de acidentes e
recados da gerência ou superintendência.
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Folha de Verificação
As leituras diárias de campo deveriam ser realizadas diariamente por cada operador do
turno. Essa tarefa tinha o objetivo de verificar se os parâmetros dos equipamentos se
encontravam com os valores especificados que eram anotados em um documento chamado
Folha de Verificação.
Nota de serviço
A nota de serviço era um documento digital que deveria ser preenchido toda vez em
que havia a necessidade de solicitação de manutenções. As tarefas de leituras diárias de
campo e os testes de equipamento eram grandes responsáveis pela identificação desses
reparos, portanto, era comum notas de serviço serem abertas após a realização dessas tarefas.
Treinamentos de operação
Os operadores permaneciam em constantes treinamentos relacionados a operação dos
equipamentos. Estes treinamentos envolviam a leitura das Uts e acompanhamento prático dos
operadores mais experientes. Após uma avaliação do supervisor, estes passavam a
desempenhar atividades de operação do equipamento a que eram designados para treinamento
sob supervisão de um operador experiente.
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Momento de segurança
Às segundas-feiras antes dos trabalhadores da usina começar as suas atividades, o
gerente da unidade realizava uma reunião de segurança com o objetivo de apresentar algum
assunto para reflexão dos trabalhadores. Esse assunto podia ser algum acidente ocorrido na
unidade ou em outras empresas ou questões de saúde apresentados através da leitura de textos,
apresentação de slides ou vídeos.
Equipamentos de Proteção
Os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) eram utilizados obrigatoriamente
quando havia necessidade. São eles: capacete isolante; protetor auricular; óculos de proteção;
uniforme anti propagação de chamas; luva de algodão; luva de borracha isolante; luva de
proteção (cobre e protege as outras duas); cinto paraquedista; bota de proteção; máscara de
proteção.
Além dos EPIs, o uso dos Equipamentos de Proteção Coletiva (EPCs) era obrigatório
quando havia a necessidade de acordo com a tarefa, como as fitas de isolamento de área e
cerquites.
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Treinamentos de segurança
Algumas Normas Regulamentadoras estabeleciam a periodicidade de treinamentos de
segurança. Na usina, ocorriam os treinamentos da NR 10, NR 20, NR 33 e NR 35 ministrados
pelos próprios trabalhadores da usina aptos para isso. Além de possuir o conteúdo
estabelecido por essas normas, esses treinamentos de segurança continham assuntos
relacionados aos problemas da usina, casos de incidentes e situações vivenciadas pelos
trabalhadores.
2 – O recorde
A usina estudada atingiu o recorde de seis anos consecutivos sem acidentes com
afastamento, quase chegando a sete anos. De acordo com os registros de acidentes da empresa
fornecidos pela CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), o último acidente com
afastamento foi registrado em 2013 (Figura 2). Portanto o recorde ocorreu de 2013 a 2019 e
era admirado por toda a empresa que considerava a unidade estudada um exemplo de
segurança para todas as outras unidades.
24
1
A Fundacentro é uma instituição pública Federal que tem por atribuição realizar pesquisas, estudos e promover
ações educativas relacionadas à saúde e segurança dos trabalhadores.
26
Este capítulo apresenta uma breve revisão de literatura sobre cultura de segurança e
gestão baseada nos indicadores para auxiliar na compreensão das discussões realizadas nesta
pesquisa. É importante esclarecer que a base deste trabalho está fundamentada na abordagem
dos fatores humanos e organizacionais da segurança para que se possa compreender a
interação entre os trabalhadores, incluindo gestores, na segurança, bem como a relação da
segurança com as outras áreas da gestão, identificando condições que podem favorecer ou
dificultar a evolução da cultura de segurança. Dessa forma, busca-se discorrer de forma ampla
os aspectos centrais da cultura de segurança baseada nessa abordagem.
ambos ocorridos em 1986. Os investigadores desses desastres evidenciaram que havia uma
incompatibilidade entre as maneiras de fazer e de pensar compartilhadas entre os
trabalhadores e a segurança das operações (ICSI, 2017). A cultura de segurança é
desenvolvida através das práticas dos trabalhadores, sendo essas maneiras de pensar e de agir;
ou seja, é construída pelo coletivo (SIMARD, 2010). Atualmente, há mais de 50 definições de
cultura de segurança (ICSI, 2017), no entanto essa pesquisa ficará restrita ao conceito trazido
pela abordagem dos Fatores humanos e Organizacionais da Segurança Industrial (FHOSI).
Esse conceito surgiu como uma alternativa às abordagens tradicionais de segurança
que eram fortemente utilizadas nas empresas e organizações de alto risco e que consideravam
de forma limitada a dimensão humana no desenvolvimento da segurança (ROCHA et al.,
2016).
A construção de uma cultura de segurança exige uma abordagem cultural na gestão da
segurança, pelo fato de envolver relações entre trabalhadores que muitas vezes apresentam
diferentes lógicas dentro de um mesmo sistema. Dessa forma, é evidente que não é uma tarefa
fácil construir essa unidade de cultura. No entanto, cabe ressaltar que é a dinâmica das
relações entre os trabalhadores responsáveis pela construção da cultura de segurança que
possibilita que as maneira de pensar e de agir se tornem coletivas, compartilhadas, recíprocas
e aceitas (SIMARD, 2010).
A cultura de segurança se interessa, portanto, pela articulação da responsabilidade da
segurança através dos ofícios e da organização. Isso é possível ser observado em organizações
muito confiáveis, ou seja, com bons resultados de segurança, onde há o compartilhamento dos
objetivos de segurança por todos os trabalhadores (DANIELLOU; BOISSIÈRES, 2010). O
alinhamento é um caminho construído pelos dois lados, o da alta gerência com os objetivos da
organização, e da base, representando o que os operadores esperam da empresa
(AMALBERTI, 2016).
Além das interações entre os trabalhadores que colaboram para o aprendizado, o
desenvolvimento de uma cultura de segurança repousa também sobre a experiência repetida
de comportamentos convergentes os quais podem ser os diferentes sinais utilizados pelos
trabalhadores, como mensagens, formas de escuta, decisões, alocações de recursos; e os sinais
emitidos pela direção e a hierarquia na mesma direção. E sabendo que essas convergências
não ocorrem de forma espontânea, a cultura de segurança deve supor que as contradições
possam ser esclarecidas e debatidas e que as arbitragens sejam explícitas e periodicamente
reexaminadas (DANIELLOU; DUGUÉ; GRALL, 2010). Essas arbitragens são as regulações
que os trabalhadores utilizam para lidar com as contradições. Portanto, para que a cultura de
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segurança possa se desenvolver ela precisa de espaços onde seja possível o surgimento de
conflitos construtivos (ANTONSEN, 2009).
Podem-se observar quatro tipos de cultura de segurança definidos de acordo com as
interações entre os trabalhadores e com o envolvimento desses trabalhadores em relação à
responsabilização pela segurança, conforme Figura 4 (SIMARD, 2010).
trabalhadores dando espaço e autonomia a eles, de forma com que todos estejam envolvidos
(NASCIMENTO et al., 2016).
Ao contrário de uma cultura gerencial onde a liderança age de modo diretivo
descendente (top down), na cultura integrada de segurança os gestores líderes ao mesmo
tempo em que atuam de modo diretivo também atuam de modo participativo/ascendente
(bottom up) (SIMARD, 2010). Trata-se de uma gestão baseada na articulação equilibrada
entre o ascendente e o descendente (NASCIMENTO et al., 2016) onde há a dinâmica top
down enquadra as orientações, definições de objetivos e alocação de recursos; e a dinâmica
bottom up engloba o retorno de informações advindas da realidade do trabalho de campo
como, por exemplo, retorno de experiência em relação aos eventos indesejáveis; alertas sobre
regras desconexas com a realidade e ações de risco; dentre outros (DANIELLOU; DUGUÉ;
GRALL, 2010).
Os modos de pensar da liderança, em uma cultura de segurança integrada, são
marcados pela presença de três traços: a oposição à ilusão de controle e ao viés do otimismo,
o que faz com que haja a consciência de que más surpresas podem acontecer a qualquer
momento e para lidar com elas é necessário manter sempre um alto nível de vigilância tanto
da hierarquia quanto dos trabalhadores2; a certeza de que o controle de riscos nunca é
confiável e que sistema se torna confiável através de um processo de melhoria contínua; e a
adoção de um estilo de liderança diretiva-participativa, onde há a colaboração da hierarquia e
dos trabalhadores (SIMARD, 2010), sendo a segurança um assunto de todos (NASCIMENTO
et al., 2016).
Essas importantes convicções levam a liderança a praticar o gerenciamento de
segurança apresentando os seguintes pontos: a atribuição da segurança como um dos
principais valores da organização; a construção da credibilidade da administração para ganhar
a confiança e o respeito dos trabalhadores a fim de contar com a participação destes; a oferta
de meios que suscitam a participação dos trabalhadores; e a oferta de meios que suscitam a
aplicação de regras e procedimentos (SIMARD, 2010).
A participação dos trabalhadores na gestão de segurança se manifesta de duas
maneiras: na aplicação de regras e procedimentos e na proatividade para a segurança
individual e coletiva. Os trabalhadores, portanto, participam à sua maneira, articulando a
segurança normatizada e a
2
Como todos os esforços possíveis são feitos para manter a segurança, essa forma de pensar favorece a aceitação
dos acidentes que porventura aconteçam. No entanto, pouco se diz como lidar com a situação tratada nesta
dissertação: os sentimentos e forma de agir quando a segurança atinge um desempenho tão elevado que passa a
31
ser festejada como recordes!
32
segurança em ação ((DANIELOU et al., 2010), as quais são duas vias fundamentais para a
construção da segurança (NASCIMENTO et al., 2016).
A segurança normatizada é aquela proporcionada pelas regras, normas, procedimentos,
leis e a segurança em ação é aquela atribuída à inteligência adaptativa dos trabalhadores
(AMALBERTI, 2016), ou seja, é a capacidade individual de expertise dos trabalhadores
(AMALBERTI et al., 2018). Nessa articulação, os trabalhadores dispõem de margens de
manobra, de liberdade de ação com a possibilidade de construção das regras de trabalho de
modo contínuo (FALZON; 2016).
Dessa forma, na cultura integrada de segurança, os gestores estimulam e canalizam a
capacidade de iniciativa dos trabalhadores como estratégia para fortalecer o nível de
conformidade das regras (SIMARD, 2010), ou seja, favorecendo a participação dos
trabalhadores para que as regras se tornem pertinentes a eles. É um estado em que a
organização se desenvolve através da integração de processos reflexivos abertos à inovação
dos próprios trabalhadores (FALZON, 2016). As iniciativas de segurança dos trabalhadores
ou das equipes a partir das explicitações de suas dificuldades ou de sugestões dadas por eles
se tornam um objeto de avaliação, de registro e de compromisso a fim de dar uma resposta
(DANIELLOU; DUGUÉ; GRALL, 2010). É este o estado que deve ser buscado pelas
organizações.
receberem certificações de programas de gestão. Essas taxas podem englobar incidentes como
acidentes, quase acidentes, bem como falhas de processo e outros fatores estabelecidos pelas
organizações.
Os indicadores de segurança podem ser divididos em reativos e proativos. Os
indicadores reativos são os que se baseiam nos acidentes, doenças e outros resultados
indesejados, como exemplo as estatísticas sobre ocorrência de acidentes, ou seja, são eventos
que já aconteceram. Em relação aos indicadores proativos, estes se relacionam com potenciais
eventos que podem acontecer antecipando-os permitindo aos gestores o acompanhamento dos
objetivos de segurança (PERNAS, 2012).
As taxas de frequência e de gravidade são os indicadores de segurança mais
frequentemente monitorados os quais se enquadram como indicadores reativos.
diagnósticos muito simples para acidentes de processo, sendo que estes possuem um conjunto
de origens e causas técnicas organizacionais que devem ser levadas em consideração;
reforçam ações que tratam o comportamento humano levando a subestimação de ações sobre
as instalações da empresa (DANIELLOU; SIMARD; BOISSIÈRES, 2010).
A história dos acidentes industriais retrata a armadilha que os indicadores de
segurança oferecem através dos casos de empresas que passaram um longo período de tempo
sem a ocorrência de acidentes ou incidentes reforçando o fato de que mesmo que os
números expressos em indicadores retratem um cenário com resultados positivos os acidentes
graves podem ocorrer como, por exemplo, na plataforma Deepwater Horizon e na Refinaria
Texas City, empresas que estavam há anos sem acidentes (RODRIGUES et al., 2011; BP,
2007; BP 2010). Portanto, essas ações voltadas para a melhoria da segurança e que utilizam
indicadores para análise e decisão sobre quais ações devem ser implementadas são
ineficientes, uma vez que contemplam apenas uma parte dos problemas e não evitam
acidentes com consequências graves e menos frequentes (HUDSON, 2007). Para atingir essa
eficiência na gestão de segurança, os incidentes menos graves e quase acidentes devem ser
tratados conforme o nível de relevância e influência que cada um possui para a geração de
acidentes graves (MERCADO, 2019).
Além dessa limitação que os indicadores sofrem em relação à realidade em relação aos
riscos de acidentes, eventos como quase acidentes e falhas de processo podem também não
ser revelados pelos indicadores de gestão habituais, uma vez que muitos deles são conhecidos
pelos operadores de campo, mas não se revelam espontaneamente pelos sistemas de
informação existentes (DANIELLOU; SIMARD; BOISSIÈRES, 2010) mostrando-se
ineficientes também em captar as situações de campo (AVEN; KROHN, 2014).
Portanto, sabendo que aspectos importantes dos riscos não são contemplados pelos
números, é necessário que os sistemas de gestão de segurança evoluam no sentido de se evitar
uma gestão de segurança baseada apenas em indicadores, onde se caminha para uma cultura
gerencial de segurança, uma vez que esse tipo de gestão pode ignorar um risco real ou levar a
tomadas de decisões baseadas em crenças e suposições (AVEN; KROHM, 2014).
dele. Após a segunda Revolução Industrial, no final do século XVIII, os riscos e a segurança
passaram a preocupar não só aqueles que faziam o trabalho, como também, aqueles que o
projetavam ou administravam (HOLLNAGEL, 2014).
Herbert William Heinrich foi um influente especialista na área da segurança e exemplo
histórico da preocupação com a prevenção de acidentes. Suas reflexões têm sido a base do
ensino e das práticas relacionados à segurança há muitas décadas (MANUELE, 2011;
BUSCH, 2021). Ele atuou como Superintendente Adjunto da Divisão de Engenharia e
Inspeção da Travellers Insurance Company, uma empresa que existe ainda hoje e que oferece
seguros de acidentes para indústrias de diversos setores. A função de Heinrich era revisar
relatórios e recomendações dos fiscais que coletavam as informações diretamente nas
empresas, acrescentando melhorias e escrevendo uma carta ao segurado. Ele também
participou de vários estudos relacionados a segurança dentro da Travellers, deixando como
legado duas das metáforas mais icônicas da segurança: a Teoria dos Dominós e o Triângulo
ou Pirâmide de Acidentes (BUSCH, 2021).
Um dos objetivos dos seus primeiros estudos era descobrir os custos diretos e indiretos
dos acidentes. Com a intenção de formular algo prático para que seus clientes pudessem usar
em suas práticas diárias e para gerar economia a longo prazo para a empresa onde trabalhava,
ele avaliou as causas de acidentes a partir dos registros dos seguros industriais que ele coletou
no final da década de 20 (DEKKER, 2018). Foram estudadas as causas de 75.000 acidentes e
os primeiros resultados desse estudo foram publicados no “The 44rigino f Accidents”, em
março de 1928, onde foi apresentada proporção 88:10:2 que postula que a proporção de
causas diretas de acidentes são 88% atribuídos a “atos inseguros”, 10% a “condições
inseguras” e 2% são acidentes inevitáveis (BUSCH, 2021).
No mesmo ano, mais tarde, Heinrich apresentou a proporção 1:29:300 (Figura 5),
outra ideia publicada no artigo “The Foundation of a Major Injury”, baseada em algumas das
descobertas feitas no artigo anterior (BUCSH, 2021). De acordo com a sua teoria, a cada 300
acidentes, 29 acidentes apresentam ferimentos leves e 1 ferimento grave (MANUELE, 2011;
HOLLNAGEL, 2014; DEKKER, 2018; BUSCH, 2021). Essa pesquisa mostrou que houve
muito mais acidentes sem ferimentos do que acidentes com ferimentos, sejam eles, leves ou
graves e deu origem a famosa Pirâmide de Acidentes.
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algo sério (BUSCH, 2021), portanto as ações de prevenção devem dar mais atenção à pequena
parte da base que se refere aos eventos que se as circunstâncias se modificassem um pouco,
acidentes mais sérios poderiam ter acontecido (ICSI, 2019). Ou seja, a base da pirâmide
necessita passar por um filtro.
Em verdade, a pirâmide de acidentes precisa evoluir para o Diamante de Prevenção
(figura 8), uma vez que a base da pirâmide necessita ser filtrada. É necessário que se
compreenda que alguns eventos menores apresentam alto potencial para ser sérios. Esses
devem ser compreendidos, observados, analisados e desvendados (ICSI, 2019), ou seja, esses
eventos merecem atenção e tratamento para a prevenção efetiva.
Alguns caminhos podem ser adotados para promover a compreensão das situações ou
eventos menores que estão na base do Diamante e que podem evoluir para eventos maiores
com consequências graves, como por exemplo, analisar a atividade sob o olhar da Ergonomia
Francesa buscando identificar como os trabalhadores se desdobram para atingir os resultados
desejados em determinada tarefa, o que interfere nessa dinâmica e como eles conseguem ter
bons resultados. Promover Espaços de Debate sobre o Trabalho (EDT) é outro caminho que
pode ser adotado e que possibilita o tratamento desses eventos do Diamante de Prevenção.
Também é possível através da avaliação e da discussão dos sinais fracos, uma vez que isso
possibilita a promoção do aprendizado coletivo acerca dos pequenos sinais que antecedem os
eventos, educando a percepção de risco dos trabalhadores.
42
A pesquisa que deu origem a esta dissertação foi realizada em uma usina produtora de
energia térmica localizada em Juatuba, Minas Gerais. Apesar de a planta e alguns
equipamentos importantes serem bastante antigos e de estarem sofrendo considerável
concorrência com as usinas eólica e solar na época da pesquisa, a usina em estudo continuava
à disposição do sistema elétrico brasileiro. A idade da planta, a complexidade da operação e
manutenção dos equipamentos, e um período de cinco anos3 consecutivos sem acidentes com
afastamento, chamaram a atenção para uma investigação.
Por esse motivo, gestores da usina buscaram ajuda acadêmica para compreender a
relação entre o período sem acidentes com afastamento e as reuniões setoriais do setor de
operação. Este contato inicial possibilitou a formação de um comitê gestor da pesquisa,
formado por pesquisadores da Fundacentro-MG, Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) e Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), para acompanhar o trabalho
acadêmico e prático realizado pela autora.
O momento em que a usina enfrentava também era um fator relevante desse contexto.
A planta estava com a operação e o quadro de funcionários reduzidos, com previsão de
aposentadoria de trabalhadores experientes. Apesar disso, mesmo com a baixa solicitação de
operação para fornecimento de energia elétrica ao sistema, a usina mantinha as suas
atividades diárias concentradas na manutenção, testes de equipamentos e treinamentos. Um
fato evidente é o trabalho coletivo que caracterizava o estado de manutenção da usina em
conservação
3
Quando a pesquisa foi solicitada pelos gestores, a usina já tinha completado cinco anos de recorde. Ao longo da
investigação de campo, foi possível acompanhar a marca de seis anos consecutivos e um acidente dias antes da
usina completar sete anos sem acidentes consecutivos.
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parcial. No entanto, ainda não eram bem compreendidos como os fatores que colaboram para
a configuração dessa coletividade se combinavam e se transformavam diante deste contexto.
Apesar de a concessão da usina finalizar em 2023, foi decidido pela direção da
concessionária o encerramento das atividades em dezembro de 2019 devido aos elevados
custos do petróleo e aumento da oferta de energias alternativas.
“[...] Eu não entendo qual é a organização que eles têm para poder trabalhar do
jeito que eles trabalham e conseguir passar por isso sem se acidentar” (Técnico de
Segurança, 13 anos de experiência).
“[...] Eles “quebram o pau”, discutem, mas no final eles chegam em uma conclusão
que tudo indica que é a melhor para aquela situação que está sendo tratada” (Técnico
de Segurança, 13 anos de experiência).
Essa hipótese era baseada no conhecimento que ele possui em relação à bibliografia
sobre segurança, especialmente a espaços de debate sobre o trabalho e seus benefícios para a
segurança no trabalho.
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“[...] Eu comecei a ver características daquilo que o Raoni descreveu como espaço
de debate sobre o trabalho na reunião setorial que acontecia aqui [no setor de
operação]. Se é isso aqui que o Raoni viu lá na França e que vale tanto para
segurança, de repente a gente tem alguma coisa aqui que ultrapassa o tempo que eu
estou aqui na usina e que vem se construindo ao longo desse tempo. Uma forma de
trabalhar, que é construída coletivamente entre eles e que tem valido para a
segurança tanto quanto para os procedimentos. [...] Por isso que eu acreditei que
havia ali [na reunião setorial de operação] uma demanda que poderia ser
explorada e que de repente ajudaria a explicar porque a gente fica tanto tempo sem
acidente mesmo no ambiente que tudo indica que nós estamos em uma situação
onde o risco está aí presente e o acidente pode acontecer” (Técnico de Segurança,
13 anos de experiência).
4
A palestra foi apresentada pela pesquisadora. A escolha deste tema ocorreu devido ao fato de que alguns
documentos já estavam sendo analisados, dentre eles os registros de acidentes e as atas da reunião setorial de
operação. E após várias entrevistas com os trabalhadores, observação dos documentos e das discussões nas
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Dias depois da SIPAT, um trabalhador confessou que concorda com o cuidado que se
deve ter com os bons resultados de segurança exemplificando um acidente que aconteceu com
ele, que poderia ter gerado afastamento e acabado com o recorde comemorado pela usina se
ele tivesse optado por relatar. Mas, não foi o que aconteceu.
Ao aprofundar essa questão com os trabalhadores em entrevistas e na reunião setorial
de operação, emergiram outros casos de acidentes que ocorreram durante os últimos seis anos
e que repercutiram com discórdias entre os trabalhadores em relação a necessidade de
afastamento e um caso de silenciamento de um acidente para evitar o fim do recorde e a
responsabilidade por isso. Dessa forma, foi constatada a necessidade de aprofundamento
dessa questão, uma vez que tal situação pode representar o início de um estágio patológico
prejudicial à cultura de segurança. A hipótese defendida aqui é a de que o recorde pode
influenciar os trabalhadores nas suas decisões de registro.
3.3 Objetivos
reuniões setoriais, foi observado que na usina ainda aconteciam acidentes, mas eles não eram aparentemente tão
graves para entrarem na contagem do recorde.
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para analisar o processo técnico e produtivo a partir de entrevistas. É importante também que
se levantem os traços do funcionamento da empresa, como características da população, da
produção, indicadores de saúde e segurança, etc. Outro ponto importante são as observações
abertas, as quais podem ser realizadas ao mesmo tempo em que se interage com os
trabalhadores a fim de identificar um pré-diagnóstico. A partir disso, é possível definir um
plano de observações sistemáticas focando tudo que interage com as hipóteses já levantadas
com o objetivo de validar esses dados. Os registros das situações são recursos indispensáveis
para o sucesso da análise os quais contam com gravações das entrevistas individuais, coletivas
e de autoconfrontação, filmagens das situações de trabalho e fotografias. Dessa forma, tem-se
um diagnóstico a respeito da situação analisada, bem como um diagnóstico global sobre a
influência da organização (GUÉRIN et al., 2001).
Portanto, a abordagem metodológica utilizada para coleta de dados nessa pesquisa foi
baseada na AET com o intuito de identificar os principais fatores técnicos e organizacionais
que influenciam na segurança. Em um primeiro momento, buscou-se familiarizar com os
processos e contexto para posteriormente aproveitar todas as oportunidades de análise sem a
preocupação de seguir as etapas em uma sequência lógica, uma vez que o percurso de uma
pesquisa de campo é sempre incerto (TAROZZI, 2011), utilizando-se de recursos como
câmeras, gravador e caderno de anotações. Buscou-se abordar o maior número possível de
trabalhadores, respeitando aqueles que não se dispuseram para participar das entrevistas.
Para a análise dos dados, o conceito da GT foi utilizado como base. Trata-se de uma
metodologia que preconiza o surgimento de uma teoria complexa e articulada que nasce a
partir dos dados que emergem no campo através das observações acompanhadas de uma
reflexão do pesquisador. Os dados coletados na realidade vivida pelo pesquisador
fundamentam essa teoria emergente, ou seja, ela é uma teoria enraizada, firme à terra que
pode ser entendida como a realidade (TAROZZI, 2011).
O percurso da pesquisa foi dotado de um “vai e vem” no sentido de seguir um ponto
de partida de forma não ordenada e constante, retornando em algumas passagens, mas sempre
em um nível diferente e mais alto (TAROZZI, 2011) para entender a realidade de trabalho,
aprofundar os casos e construir a teoria.
49
Através dos registros de acidentes, é notável que a usina vem construindo ao longo dos
anos boas práticas que favorecem a segurança, uma vez que os resultados apontam que houve
poucas ocorrências ao longo dos últimos 10 anos.
Os acidentes mais graves que ocorreram na história da usina foi um acidente com
queimaduras geradas por um arco elétrico, em 2003, com 90 dias de afastamento; e um
acidente com esmagamento e fratura do polegar, em 2009, com 77 dias afastamento. Em
2006, houve uma morte em acidente de trânsito, que não consta no gráfico mostrado
anteriormente (item 2.1.3) uma vez que este se trata apenas de acidentes com afastamento.
Essas ocorrências fazem parte dos acidentes que incidem sobre o indicador de acidentes com
afastamento, bem como acidentes com tempo de afastamento menores, como por exemplo,
um acidente com incidência de corpo estranho no olho de um mecânico em 2001, com 4 dias
de afastamento; um ferimento no dedo, em 2008, com 2 dias de afastamento; e uma contusão
do dorso e do ombro durante uma movimentação de carga em 2009, com 3 dias de
afastamento. O último acidente com afastamento registrado ocorreu em 2013 com um
terceirizado em outra unidade da mesma gerência. O quadro abaixo sintetiza esses exemplos
de acidentes com afastamento.
53
Em 2015, a direção homenageou a usina com um troféu pela chegada aos 3 anos
consecutivos sem acidentes com afastamento. O mesmo ocorreu nos anos seguintes dando à
usina o “status” de exemplo de segurança. Após o último acidente com afastamento registrado
em 2013, outros acidentes ocorreram nos últimos anos, no entanto, sem afastamento, como
um acidente em 2017 com um operador que sofreu queda ao pisar na tampa de um poço
levando a escoriações nas costas e membros inferiores; e outro que ocorreu no mesmo ano
com um operador que sofreu corte no dedo necessitando realizar suturas no local do
ferimento; e em 2018 ocorreu um acidente com um mecânico que sofreu queda de mesmo
nível causando inchaço das mãos e dores fortes nos braços e ombros. Com exceção deste
último, esses acidentes foram registrados através de um formulário para registro e
comunicação de eventos, sejam eles, acidentes ou quase acidentes.
“[...] Na hora que eu caí, acho que o braço abriu, aí eu travei. E não fui parar lá em
baixo” (Operador de caldeira, 6 anos de experiência).
Segundo este operador, sua perna bateu nos degraus de uma escada que há neste acesso que
ficou com um hematoma e inchaço. Após isso ele comunicou o incidente ao técnico de
segurança e buscou atendimento médico logo em seguida. Ao ser atendido, foi tirada uma
radiografia da perna do operador que foi avaliada pelo médico, cuja decisão após essa
avaliação e do questionamento a respeito da atividade do operador foi de fazer a liberação
para o retorno ao trabalho, não necessitando de afastamento.
“[...] Tirei radiografia e o cara [médico] disse que não precisava de atestado não. E
disse que estava tranquilo. Foi só uma batida, né? Não ia gerar afastamento. [...]
No outro dia eu estava aqui partindo a usina, andando para lá e para cá. Foi só
uma pancada. Quando eu caí eu bati minha canela em um degrau de ferro, ficou um
pouco inchado, nem gelo eu coloquei. No outro dia não tinha mais nada na canela.”
(Operador de caldeira, 6 anos de experiência).
55
O operador relata que ele retornou à usina no mesmo dia, porém, como estava no final
do seu turno, ele não retomou a atividade de operação de caldeira, ficando na sala de controle.
“Já estava no fim do dia, né? E eu fiquei na sala. Nem voltei para área não. O
pessoal que assumiu lá a partida” (Operador de caldeira, 6 anos de experiência) .
“[...] Na época, o pessoal disse assim: “você não está querendo afastar para não
perder o índice [recorde]”. Eu disse que não foi nada disso e que o médico disse que
eu tinha condições de voltar ao trabalho. O pessoal estava achando que eu não
queria me ausentar para a gente não perder os 3, 4, 5 anos sem acidentes com
afastamento. [...] A gente estava naquele negócio de conseguir o índice, né. Não sei
se na época já tinha 3 e ia para o quarto ano. Ou já tinha o quarto e ia para o
quinto. Se caracterizasse como acidente com afastamento ia para a estaca zero, né.
Eu disse: “não teve nada disso”. Se eu não estiver sentindo boa condição de
trabalhar eu não vou vim. Não estou preocupado com índice. Estou preocupado
com a saúde” (Operador de caldeira, 6 anos de experiência).
“Então, é aí que tá. Você é uma médica. Acabei de chegar aqui na frente e te falei
que estou com dor de barriga hoje. Você pode até me perguntar detalhes do produto
dessa dor de barriga, do resultado dessa dor... Você não viu. Você está acreditando
no que eu estou te falando. Aí você entende assim: “ah, então tá bom, eu vou te dar
15 dias de afastamento”. O outro é aqui: “estou com um corte no meu dedo”. E aí,
o que você faz? Sou operador. E o que isso aí implica? Nada. Ou ele pode falar
assim: “ah, isso aqui vai acabar comigo...”. A decisão é dele. Ninguém colocou
nada na cabeça dele. Eu não estava na porta do consultório para conversar com o
médico. O gerente não estava lá. A decisão foi dele” (Técnico de Segurança, 12
anos de experiência).
Eles também acreditam que este contexto de um resultado de segurança valorizado por
todos os motiva a “colaborarem” com esforço para a fim de que o recorde seja mantido.
No caso do acidente discutido aqui, o fato de ter sido um acidente em um local onde a
queda no chão pudesse causar danos maiores ao acidentado devido à altura entre o acesso à
tubulação e o chão do subsolo levou alguns trabalhadores a suporem que o acidentado
estivesse sentindo fortes dores na perna e que isso poderia ser motivo de afastamento. O
entendimento desses trabalhadores pode ser explicado pelos casos de acidentes anteriores ao
recorde onde o acidentado foi afastado após uma queda sem ferimentos visíveis.
“[...] Você já viu a altura lá [do local do acidente]? Ele podia ter quebrado a perna”
(Mecânico, 13 anos de experiência).
Com o passar dos dias, este caso foi esclarecido através das reuniões setoriais e
conversas informais considerando esse argumento de que, na verdade, a gravidade deste caso
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está no potencial do acidente que poderia ter acontecido e que poderia voltar a acontecer caso
não houvesse o reforço da tampa no devido local.
“Comigo foi de leve a médio, porque teve uma pancada na canela. Mas ele tem
potencial para ser mais grave. Porque se eu não tivesse travado na tampa ali eu
tinha caído em cinco metros, meu pé podia ter ficado preso numa escada e o corpo
ter ido, se eu tivesse caído direto eu poderia ter quebrado algum membro inferior”(
Operador de caldeira, 6 anos de experiência).
Este caso ilustra o fato de que, por trás de alguns acidentes, o recorde pode aparecer
como elemento causador de discórdia entre os trabalhadores da usina, uma vez que houve
acusações a respeito da influência do acidentado na decisão do médico quanto ao afastamento.
Quando a usina não está em funcionamento gerando energia para o sistema elétrico, ou
seja, em conservação parcial, a operação e a manutenção se responsabilizam por garantir que
a usina esteja em boas condições para operar quando for solicitada pelo sistema. Para isso, a
equipe de operação realiza os testes nos equipamentos além de identificar quais os
equipamentos necessitam de reparo. E a equipe de manutenção se responsabiliza por realizar
as manutenções solicitadas pela operação ou as que já são programadas pelo setor. Os
operadores são divididos em turnos e no horário comercial, sendo que nos turnos fica pelo
menos um operador de cada área (tratamento de água; caldeira; turbina e painel mecânico) e
no horário comercial, além dos operadores do turno ainda se encontra um operador-
programador e o supervisor de operação.
Em um dia durante o segundo turno da usina em conservação parcial, o operador do
painel mecânico estava na sala de controle e teve que ir à área da turbina para trocar um
cilindro de hidrogênio. Para realizar essa tarefa, ele precisava girar uma válvula que estava
muito apertada dificultando a sua atividade. Então, ele teve a ideia de ir até a oficina pegar um
tubo para ser utilizado como alavanca com o objetivo de facilitar a abertura da válvula.
Quando ele utilizou o tubo, ao bater com a mão no tubo para empurrar uma chave de abrir
válvula, ele sofreu um corte no dedo devido a uma rebarba neste tubo. Na verdade, a
válvula não estava
58
rígida. O operador estava tentando girar ela para o lado contrário de abertura. Além disso,
essa não é uma tarefa rotineira do operador de painel.
Segundo este operador, como houve sangramento e o corte foi um pouco profundo ele
decidiu buscar atendimento médico para dar alguns pontos. O procedimento da empresa, em
caso de acidentes, é buscar o atendimento na rede pública, mas este foi realizado em um
hospital particular devido à demora no atendimento no estabelecimento público onde ele já
havia passado pela triagem e classificado como “verde” pelo hospital, o que quer dizer que
não era grave e não necessitava de urgência. Ao ser atendido, o operador recebeu dez micro
pontos no dedo.
“Quando tem acidente o plano de atendimento manda levar para lá [rede pública].
[...] O atendimento muito demorando, muita gente na fila... Na triagem dele
[operador], ele precisava tomar uns pontinhos no dedo, mas mesmo assim foi
classificado como verde. Ele ia ficar lá para o fim da fila. Não era tão urgente”
(Operador de caldeira, 6 anos de experiência).
“Eu ainda acho que era para ter afastado” (Mecânico, 13 anos de
experiência).
Ao compreender com esses trabalhadores o motivo pelo qual eles acreditam que o
afastamento deveria ter sido dado ao acidentado o fato de ter tido um corte com necessidade
de sutura apareceu como critério de afastamento, uma vez que eles acreditam que poderia
haver o
59
risco de infecção durante a atividade, sendo, portanto, necessário o afastamento de alguns dias
para que o ferimento se cicatrizasse como verbalizado por um trabalhador.
“Teve que dar ponto. Podia ter infeccionado” (Mecânico, 13 anos de experiência).
“Assim, a minha atividade, como é aqui no painel, unidade parada, é mais aqui no
painel. Não tem muito trabalho manual igual vai na caldeira. Então eu também não
usaria a mão de forma que pudesse abrir o ponto e infeccionar o machucado,
entendeu? Eu podia continuar trabalhando com aqueles pontinhos” (Operador de
painel, 30 anos de experiência).
“[Sobre o corte do operador] foram micro pontos, realmente não atrapalha... Isso
pelo o que você está dizendo sobre a atividade dele” (Médico, 8 anos de
experiência).
“O cara não quer destruir [recorde] uma coisa que é tão valorizada pelo grupo que
ele faz parte. Que é ficar sem acidente, de mostrar que aqui se faz diferente com
relação à segurança e que isso tem dado certo. Porque ninguém aqui perderia o
emprego por isso. Agora, eu vi o que aconteceu com o operador. Ele poderia, se ele
quisesse, ter afastado [...]. Eu só posso levantar hipóteses. Eu acredito [...] que ele
não quis ser a pessoa que iria acabar com essa marca que tanto eles se orgulham.
Agora, você sabe o que aconteceu no dia? Ele estava girando a válvula para o lado
errado” (Técnico de segurança, 12 anos de experiência).
60
“[Sobre pessoas pedirem afastamento] ah, tem demais. Tem gente que pede para
afastar sim, principalmente perto de feriado. [...] Agora, para não afastar, nunca
vi” (Médico, 8 anos de experiência).
Este é mais um caso que retrata o impacto que o recorde pode gerar no coletivo de
trabalho uma vez que, neste caso, também houve esse murmúrio e discordâncias em relação
ao critério de afastamento utilizado no caso. Esse impacto pode não ser observado em todos
os casos uma vez que tudo indica que isso ocorra quando há ambiguidade interpretativa a
respeito dos acidentes.
Alguns trabalhadores
Alguns trabalhadores
argumentaram que o médico não
argumentaram que o médico não
Repercussão interna deu afastamento em decorrência
deu afastamento em decorrência de
de suposta influência do
suposta influência do acidentado
acidentado
No Quadro 3, uma síntese dos principais elementos que envolveram os dois casos de
acidentes sem afastamento detalhados acima, evidenciando: as consequências de cada
acidente para o acidentado; as decisões tomadas pelos acidentados após os acidentes; as
decisões dos
62
médicos que atenderam os trabalhadores; os critérios que os médicos utilizaram para tomar as
decisões; os critérios utilizados pelo coletivo para defender o afastamento; as razões para a
adoção dos critérios de afastamento pelo coletivo; e os posteriores esclarecimentos que
ocorreram sobre cada acidente para que o coletivo compreendesse os motivos pelo não
afastamento.
“Só mais esse ano sem acidente” (Engenheiro gestor, 13 anos de experiência).
“Porque se eu for no hospital e tiver que afastar, quantos dias de afastamento vai
ser? Aí a usina vai zerar aquela placa ali, então eu fiquei na dúvida. [...] Mas se
fosse em outra situação, se não tivesse isso aí [o recorde] eu iria [...]” (Mecânico,
12 anos de experiência).
64
Ao expor os motivos pelos quais o levou a tomar essa decisão de não comunicar as
dores no braço e no ombro, ele se preocupou com a questão do tempo sem acidentes com
afastamento que a usina atingiu, pois ele não queria ser a pessoa responsável pela quebra do
recorde. Na verdade, ele não tinha certeza se o médico daria a ele o afastamento, mas para
evitar o que para ele é um constrangimento, ele preferiu suportar a sua dor até o final do dia.
Segundo ele, essa dor foi suportável porque naquele período ele estava fazendo atividades
administrativas as quais não requeriam esforço físico como uma atividade de manutenção.
Após a sua jornada de trabalho ele foi até a uma farmácia comprar remédios para amenizar as
suas dores.
“Se tivesse em uma atividade que me demandasse fazer assim um pouco mais de
esforço eu acho que não conseguiria fazer. [...] Atividade de desmontar
equipamento, mais braçal mesmo. Essa semana eu estava fazendo coisa mais
administrativa mais no computador. Estava mais tranquilo [...] (Mecânico, 12 anos
de experiência).
Caso ele quisesse ser atendido por um médico para que o seu estado fosse avaliado ele
teria que registrar o seu acidente através do procedimento de comunicação da usina, porém
nem mesmo esta comunicação formal ele quis fazer, uma vez que, segundo ele, para ele o
acidente que aconteceu naquele dia foi muito imprevisto e pessoal. Na visão dele, o fato de
ser pessoal marcaria a sua imagem caso o recorde fosse quebrado. Além disso, ao fazer essa
comunicação formal ele teria que passar por uma investigação de acidentes realizada pela
CIPA que analisaria o ocorrido e naquele momento em que ele escorregou ele estava usando o
seu tênis de uso pessoal. O que ele chama de acidente pessoal é explicado por ele como um
acidente em que ele ajudou a provocar. No acidente dele o lodo, o tênis sem uma boa
aderência e a sua decisão de correr possibilitaram a ocorrência do acidente.
“[...] Como foi uma coisa muito mais pessoal ali... [...] Tem acidente que não tem
jeito. Acontece. Você tá ali, entendeu? No processo ali... Mas o acidente ali que
você foi a causa raiz disso ali, você carrega isso aí, é complicado” (Mecânico, 12
anos de experiência).
Este caso retrata o peso que o recorde pode gerar para os trabalhadores da usina uma
vez em que há a preocupação em relação a repercussão interna e externa gerada pela quebra
do recorde e o sentimento de fracasso perante os colegas. Este peso pode não recair sob todos
os trabalhadores ou em qualquer tipo de acidente uma vez que quando se trata de
acidentes
65
notavelmente graves, ou seja, aqueles com ferimentos que incapacitam o retorno ao trabalho,
podendo apresentar também perdas materiais, não há dúvidas quanto ao afastamento.
Fazer parte do coletivo que colabora para que o recorde a cada dia seja superado
aparece como uma decisão realizada pelo mecânico no momento em que surge o
questionamento quanto ao rompimento desta imagem da usina. Isso demonstra que o coletivo
age com coerção, mesmo que de forma involuntária. É possível fazer uma alusão ao mundo
do esporte onde a dificuldade que os protagonistas possuem em relação à derrota está ligada a
posição que essa condição assumiu na cultura contemporânea ocidental onde a derrota é a
sombra social (RUBIO, 2006).
Por trás do peso há, portanto, a grande responsabilidade que os trabalhadores sentem de
sempre agir de modo que um acidente não aconteça e devido à forma com que a quebra do
recorde pode repercutir dentro da unidade. Isso revela a dificuldade tanto do ponto de vista
individual como social em lidar com uma expectativa não realizada (RUBIO, 2006).
“Eu acho que é uma marca bacana, mas é uma responsabilidade muito grande que
a gente tem para poder manter isso aí. [Quando acontece um acidente]. Você acaba
ficando exposto. [...] A questão de afastar: você fez a usina perder ali 6 anos sem
acidente. Não sei. É uma coisa que para mim ficaria essa marca aí. [...] O pessoal
aqui, até em tom de brincadeira, ficaria [dizendo] “o cara que zerou a placa ali”.
Então você acaba levando um pouco essa marca. [...] Então eu tenho essa
preocupação. Eu acho que todo mundo tem essa preocupação. Ninguém quer
carregar isso” (Mecânico, 12 anos de experiência).
“Teve uma ocorrência e ele [operador] foi imprudente, né? [...] Um procedimento
errado dele. A usina funcionando. [...] Ele tinha que trocar o filtro [de óleo, de acordo
com o procedimento]. Mas, não precisava trocar o filtro porque não estava sujando
[de óleo]. [...] O outro operador já tinha olhado isso e falou que não precisava. Ele
foi trocar o filtro. Não esperou um ajudante. Para trocar, tinha o procedimento que
você tinha que esperar decantar [o óleo] e ele não esperou. E, na hora, ele abriu
uma válvula errada para ele escorrer [o óleo] mais rápido. Aí ele abriu essa válvula
para ele abrir a tampa [do reservatório]. E nele abrir a tampa com um machado ou
algo assim [porque estava com vácuo], esse óleo veio e derramou no corpo dele e
no rosto, inclusive. E atingiu o outro ajudante lá. Aí ele lavou o rosto, mas o erro
dele foi lavar o rosto com produto químico, no caso um desengraxante. Até que ele
[desengraxante] não atinge a pele, mas aí deu conjuntivite química. O médico
deu dois dias [de
66
afastamento] para ele. Aí ele veio trabalhar. [...] Aí ele teve que voltar no médico
para renunciar aquele atestado. Aí ele conseguiu anular o atestado de afastamento.
Foi um acidente. Não foi nada grave, mas teve isso aí do desconforto do recorde”
(Programador de Manutenção, 30 anos de experiência).
“Parece que quanto maior o recorde, maior o desconforto [de sofrer um acidente]”.
(Programador de Manutenção, 30 anos de experiência)
67
Após o almoço, por volta das 13h, uma equipe de auxiliares mecânicos, parte do
quadro de funcionários terceirizados fixos, estava realizando uma atividade já programada
quando foram interrompidos por um gestor que solicitou o exercício de outra demanda.
Tratava-se de um serviço de recolhimento de resíduos de materiais composto por pallets,
tábuas e fragmentos de madeira. Foi contratada também uma empresa terceirizada de
transporte de resíduos. A equipe tinha que colocar essa sucata dentro de uma caçamba tipo
roll on.
Então, a equipe se dirigiu até o local para recolher os resíduos. No momento em que
eles chegaram lá, o entrevistado relatou que estava chovendo forte e que eles esperaram a
chuva amenizar. Nesse pequeno período de tempo, a equipe responsável pelo serviço tentou
negociar com o gestor e com o motorista do caminhão para que essa atividade fosse realizada
em outro dia, uma vez que, segundo ele, o tempo era muito curto. No entanto, essa negociação
não foi possível porque a empresa de transporte cobraria por mais um dia de aluguel e o
gestor da usina não liberou mais um dia de contratação.
“A caçamba chegou umas 13h. Só que até 16:30 era um tempo curto para a gente
carregar. [...]Eu falei que não dava para a gente fazer aquele trem naquele prazo
não. [...]Eu falei com o caminhoneiro”. "Isso aqui não aconteceu de a gente
carregar carga no mesmo dia não". Aí ele foi lá e falou que ligou no patrão dele. Só
que aí ele falou que se pegasse e deixasse a caçamba tinha que pagar mais por dia
que ela ia ficar. Aí não sei como aconteceu, ninguém concordou aqui [na empresa].
Isso aí eu não sei como funciona isso” (Auxiliar mecânico, 7 anos de experiência).
Segundo outro gestor, a empresa poderia ter comparecido no período da manhã, mas
chegaram à usina após o almoço. Como a negociação não foi possível e eles precisavam
retirar os resíduos naquele mesmo dia para não perder o contrato, foi decido que o serviço
deveria ser realizado naquele espaço de tempo disponível.
A equipe, portanto, deu início ao recolhimento dos resíduos por volta das 13:30. A
estratégia adotada por eles para cumprir a atividade a tempo foi a de intensificar a velocidade
e
68
de colocar a maior quantidade de material possível com a ajuda de uma garra que veio na
caçamba. No entanto, não era possível carregar alguns resíduos com essa garra, sendo
necessária a movimentação da sucata com as próprias mãos.
“O que nós fizemos, com aquela pressa também, né, de carregar porque já era
quase final de expediente e estava muito molhado, folha, pedra... Aí a gente começou a
jogar rápido. Entendeu? [...] Veio uma caçamba com garra, aí pegou por cima [ele
se refere ao monte de sucata que estava no chão]. Aí ficou foi os “final” que não
tem como pegar com a garra [ele se refere ao restante de sucata que sobrava no
chão]. Estava podre e quebrava [por isso não tinha como pegar com a garra]”
(Auxiliar mecânico, 7 anos de experiência).
Durante a atividade, um dos terceirizados teve que entrar e circular dentro da caçamba
e em cima de pilhas de sucata para auxiliar os colegas. Por volta das 14:55, ele escorregou e
pisou com força em uma tábua com prego que perfurou o solado da sua botina atingindo o seu
pé esquerdo próximo ao dedo médio do pé. Segundo ele, houve sangramento e dores no local
do ferimento, então ele comunicou a ocorrência a um dos gestores que o levou a um posto de
saúde próximo.
“[...] Nós jogamos a parte maior dos pallets todas lá dentro. Só que tinha muita
folha e molhado, né? E a gente estava pegando elas no final. Aí de repente eu fui lá
e escorreguei em um pallet. [...] Aí tinha uma tábua com prego e eu pisei em cima.
Aí quando eu fiz assim já estava escorrendo sangue. Tinha furado o meu pé. Eu
falei: nossa! Aí daí para lá a gente ligou aqui no gestor. Aí o ele veio cá e me levou
para a assistência e depois me levou para a Policlínica” (Auxiliar mecânico, 7 anos
de experiência).
No atendimento, o médico limpou a ferida e aplicou uma injeção para aliviar dores,
determinou dois dias de afastamento e prescreveu duas doses de vacina antitetânica para
serem tomadas na manhã do dia seguinte. Segundo o trabalhador acidentado, no momento em
que o médico informou sobre a necessidade de afastamento o mesmo chegou a alegar que
aquele ferimento não o impediria de trabalhar, porém o médico permaneceu com a sua
decisão.
“Eu falei [para o médico: Não, eu posso ir trabalhar normal" (Auxiliar mecânico, 7
anos de experiência).
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Ao expor os motivos que o levou a dizer ao médico que o afastamento não seria
necessário ele se preocupou com o resultado atingido pela empresa. Naquele dia, havia
poucos dias para a usina atingir 7 anos sem acidentes com afastamento e ele não queria
prejudicar esse resultado.
“É chato porque eu não queria que... Quebrou o recorde de acidente por causa de
mim. É chato. Eu não fiquei gostando disso não. Só que no outro dia o meu dedo já
amanheceu inchado. Aí mesmo assim eu vim na parte da tarde [...] porque tipo
assim, para evitar esse trem [fim do recorde]” (Auxiliar mecânico, 7 anos de
experiência).
No dia seguinte, o dono da empresa que a usina contrata e que é o chefe oficial do
trabalhador acidentado ligou para o supervisor para comunicar que o acidentado ia
comparecer para trabalhar. O motivo que o levou a ter essa tomada de decisão, segundo o
supervisor, era o de evitar com que a usina ficasse prejudicada em relação ao resultado
atingido. Nesse momento, o supervisor expôs a sua opinião dizendo que se foi uma decisão
técnica ela deveria ser mantida, porém se o acidentado estiver se sentindo bem para trabalhar
ficaria a critério pessoal do mesmo voltar ao médico para solicitar outro atestado alegando a
sua aptidão para o trabalho.
“Porque estava naquele... O pessoal aqui naquela preocupação e o índice, não sei o
quê, e o índice e tal?" E ele [acidentado] estava lá preocupado. O supervisor dele
da empresa lá veio me perguntar... Eu falei: "Para mim, a voz legal aí é a do
médico e ele analisou que ele precisa ficar dois dias afastado, então por mim ele
tem que ficar em casa. Agora, isso é uma decisão pessoal. Se ele acha que está bem
e tal, ele pode até comparecer, mas ele precisaria de passar no médico e o médico
atestar essa condição dele”. Aí ele disse: "Ah, ele vai passar lá agora". Porque ele
tinha que tomar vacina antitetânica”. (Auxiliar mecânico, 7 anos de experiência)
Então, durante a manhã, o acidentado foi tomar as vacinas e solicitou outro atestado ao
médico. No período da tarde, com os dois atestados em mãos o acidentado compareceu para
trabalhar. Enquanto ele estava no vestiário trocando de roupa o supervisor de operação que
ficou sabendo da entrada dele na usina compareceu para conversar sobre as condições físicas
que ele se encontrava. Segundo o supervisor, quando ele pediu para o trabalhador acidentado
retirar a sua botina para que ele visse seu pé ele percebeu que este teve dificuldades por causa
do inchaço e das dores. Ele questionou o trabalhador sobre sua condição para andar e este
chegou a dizer que estava “pisando de lado”. Então o supervisor, vendo a sua real condição,
70
pediu para que ele fosse embora argumentando que assumir aquela situação seria um ato ilegal.
Por fim, o acidentado foi embora para a casa se recuperar. “
"Deixa eu ver o seu pé. Tirou a botina até com dificuldade e tal. Aí eu perguntei: "O
que você está pretendendo? Por que você veio? "Ah, porque eu não quero
atrapalhar as coisas na empresa aí, o índice”. Eu falei: [...] eu estou vendo aqui o seu
pé inchado, você está conseguindo pisar? "Não. Estou pisando de lado”. Pois é,
você vai ter condição de desempenhar as atividades que você normalmente faz com
o pé no chão? “Não”. Pois é, se a gente assumir isso aqui vai ser um ato ilegal. Eu
não vou aceitar que você continue aqui não. Já estou com o carro aqui e vou te
deixar na portaria. [...] Aí antes eu falei com ele, me passa aí o que você tem em
mãos. Aí ele me passou o atestado e já tinha pegado lá o atestado de
comparecimento. Ou seja, ele ia apresentar o atestado de comparecimento e ia
rasgar o outro atestado. Eu disse: Me dá os dois (Supervisor de Operação, 27 anos
de experiência).
Esse caso dá sustentação a afirmação de que o recorde pode gerar um peso para os
trabalhadores e retrata o esforço que pode ser realizado pelos trabalhadores em algumas
situações para proteger o resultado atingido pela empresa.
Nesse caso específico, o acidentado optou por se esforçar na tentativa de fazer parte do
coletivo que colabora para a superação do recorde a cada dia. Isso pode ser verificado no
momento em que ele solicita ao médico um novo atestado para cancelar o atestado de
afastamento. Por dessa decisão dele há a grande responsabilidade que ele sentiu pelo fim do
recorde gerado por um acidente que ele sofreu.
“Ah, você fica com aquele trem na cabeça, né? Nossa o que foi que eu fiz? Mas não
foi porque eu quis. Aconteceu. Entendeu? A gente não quer que aconteça assim,
entendeu? A consciência ficou meio pesada. [...] Você achar que foi você que fez
alguma coisa. “[...] Estava muito molhado com folha. Você não enxergava direito.
Na rapidez... Foi aí que aconteceu esse trem aí. Hora que eu pisei, nossa... Aquele
trem foi lá no osso do dedo. Furou com a minha bota. No que furou eu fui lá puxei
assim, olha. Doeu. Questão de 20 min o meu pé parece que ficou dormente. “Para
tirar a botina ficou doendo” (Auxiliar mecânico, 7 anos de experiência).
Ao ser questionado sobre como foi a repercussão dentro da usina nos dias seguintes, o
acidentado relatou ter sido alvo de piadas e comentários compartilhados em um aplicativo de
mensagem que associavam o acidente dele com o fim do recorde.
71
“[...] Fizeram videozinho meu aí... Um vídeo do meu pé furado. [...] Riram, né. Mas
eu deixei esse trem de lado” (Auxiliar mecânico, 7 anos de experiência).
72
destruiu esse imaginário de que na usina há pessoas que conseguem manter o acidente zero
como se fossem super-heróis, ou seja, de que são infalíveis. Por trás dessa lógica há a ideia de
que o acidente zero é um estado permanente e de que pessoas podem nunca errar. Isso explica
esse sentimento de não querer ser aquele que vai derrubar o recorde, como se o fim deste
colocasse em questão a própria existência dos indivíduos que o produziram. O sentimento é
de fracasso total diante de uma falha e isso traz a sensação de que tudo o que foi feito no
passado perde o sentido. Isso afetou não só os trabalhadores diretamente envolvidos com as
atividades, como também o gestor da unidade, como observado na fala do gerente da unidade
após a apresentação dos resultados desta pesquisa:
“Isso era um peso até para mim. Até quando eu ia ter que manter
isso? A gente passa a ser visto como incompetente quando acaba”.
Gerente da unidade
5
Após a finalização das coletas de dados em campo e da análise, os resultados dessa pesquisa foram
apresentados aos trabalhadores da usina, incluindo operadores, mantenedores e gestores. Um dos trabalhadores
alegou que o recorde não o impediria de comunicar um acidente que resultaria em afastamento. Isso de fato pode
acontecer, porém, no caso da usina, não representa o coletivo, uma vez que emergiram quatro relatos de
acidentes onde o recorde esteve presente de alguma forma.
74
Essa é uma discussão que acompanha os homens pelo menos desde Aristóteles (322
a.C) sobre a possibilidade de um homem ser virtuoso. Em resposta aos sofistas que defendiam
ser impossível ensinar a virtude ou saber se um homem é virtuoso, pois ele sempre pode
fracassar, Aristóteles defende que as virtudes podem ser adquiridas através do exercício,
mesmo se, eventualmente, desgraças possam ocorrer. Em outras palavras, o homem só se
torna virtuoso com a prática. E isso deve ser um agir contínuo uma vez que é praticando a
virtude que um homem se torna virtuoso. “As coisas que temos de aprender, antes de poder
fazê-las, aprendemo-las fazendo” (ARISTÓTELES; 322 A.C). No contexto da usina, é
errando que o trabalhador se torna capaz de errar menos ao longo de sua vida profissional.
Isso não quer dizer que os acidentes devem acontecer mais para que eles diminuam. Mas
implica em aceitar os acidentes que acontecem para aprender com eles, pois é através dessa
aprendizagem que a usina se tornará capaz de produzir mais segurança e de sofrer menos
acidentes. Isso desenvolve a capacidade de agir bem e de fazer boas escolhas nas próximas
situações de trabalho.
Mas, em um cenário onde reina o absoluto não há flexibilidade e nem movimento em
direção a virtude de errar menos. Se houver uma infração ou resultado indesejado, o
responsável deve ser punido (LONG, 2022) ou ele é pressionado e julgado pelo coletivo que
incorporou esse absoluto.
Dekker (2018) faz uma reflexão sobre a visão do acidente zero ser um produto das
construções sociais do pensamento iluminista e da continuação das práticas religiosas.
Segundo o autor, épocas passam e a humanidade não deixa de acreditar e seguir crenças. Essa
capacidade que o homem tem de criar sistemas de crenças pelos quais viver vem da
necessidade do atendimento das questões humanas fundamentais e existenciais para conseguir
consolo e segurança através de orientações, ou seja, um sistema de crenças que oferecem
regras (DEKKER, 2018).
Um exemplo disso são os mandamentos pregados nas práticas religiosas e que podem
ser vistos aqui como regras. E essas são sempre conectadas com os problemas da existência
humana do período em que se vive. Desse modo, os sistemas de crenças não são estáticos uma
vez que evoluem à medida que a sociedade se desenvolve para lidar com as preocupações das
práticas da vida cotidiana (DEKKER, 2018).
À medida que a sociedade se desenvolvia e sob a forte influência do Iluminismo,
movimento que valorizava a razão em substituição da fé, via-se que os problemas práticos do
cotidiano não eram respondidos por essas crenças religiosas, incluindo as questões de
proteção e segurança, por exemplo. O pensamento iluminista descartava o teocentrismo, os
dogmas, as crenças e o misticismo, uma vez que somente passou a ser válido aquilo
que podia ser
75
justa a retribuição que se segue a essas escolhas (DEKKER; LONG; WYBO, 2014), como
punições, por exemplo.
O Iluminismo promoveu a superioridade da ciência e uma visão utópica de que todos
os problemas da humanidade poderiam ser resolvidos e a sociedade poderia ser aperfeiçoada
através da ciência (DEKKER, 2018). É o mesmo sentimento presente que justifica a
existência da religião: a aspiração de que é preciso dar conta de tudo o que é diferente,
estranho, misterioso; ou de acreditar que é possível dar conta dessas coisas (GEERTZ, 1926).
A ciência se tornou, portanto, uma nova religião. E a visão zero acidentes lança uma realidade
futura como meta com a imagem de que essa é tangível e alcançável podendo a sociedade
atingir a perfeição ao mesmo tempo em que resultam em confusão e cinismo entre a força de
trabalho (DEKKER, 2018).
A confusão pode ser explicada pela flexibilidade interpretativa dos acidentes onde, em
algumas situações, os trabalhadores se deparam com o dilema do reportável e não reportável,
do tolerável e do não tolerável. Um mesmo acidente pode ser considerado grave para um
trabalhador e para outro pode ser considerado leve; um mesmo evento pode ser considerado
como um acidente ou como um quase acidente, porque, conforme Vaughan (2002), cada
indivíduo interpreta informações dentro de uma “visão de mundo” ou quadro de referência
desenvolvido a partir da atividade prática, ou seja, do que ele já experenciou e viveu no
mundo organizacional ou social. Se já fez parte da história da usina considerar uma queda sem
lesão como um quase acidente ou acidente leve sem necessidade de ser reportado, por
exemplo, e um trabalhador presenciou ou participou dessa decisão, isso molda o quadro de
referência dele de modo que passa a orientar a construção do sentido e da escolha quando ele
vivencia outro evento similar. E a repetição reforça a sua visão de mundo (VAUGHAN,
2002). Outro trabalhador, que não presenciou essa decisão, quando se depara com o mesmo
tipo de evento, pode classificar de forma contrária, considerando-o de maior gravidade. Além
disso, quando essa diferença de percepção é exposta, surge uma controvérsia concretizando
ainda mais a confusão, como ilustrado nos casos 1 e 2 desta pesquisa.
As controvérsias resultam de posições divergentes sobre um determinado assunto (LA
GUARDIA, 2016). Nos dois casos houve divisão de opinião em relação à necessidade de
afastamento do acidentado. No primeiro caso, a característica do local onde aconteceu o
evento e casos anteriores na história da usina onde o mesmo tipo de consequência (dores sem
lesão aparente) culminaram em afastamento serviram como quadro de referência de
parte dos trabalhadores de modo que eles interpretaram que o acidentado deveria ter sido
afastado. No segundo caso, o tipo de tratamento médico recebido (suturação) e a
possibilidade de infecção
77
acidentes para permanecer com o excelente resultado de segurança podem se tornar cada vez
mais arriscadas tolerando acidentes.
Essa prática de reclassificação de riscos pode ser perigosa quando passa a “normalizar
desvios” e considerar anomalias como “riscos aceitáveis” (VAUGHAN, 2002; VAUGHAN,
2004), mecanismo cuja consequência é a conversão da incerteza em certeza transformando as
controvérsias em curso, mudanças na estimativa de riscos e níveis de tolerância para desvios
em fatos institucionais (VAUGHAN, 2004). O caso 3 ilustra essa institucionalização da queda
sem lesão aparente como um risco aceitável, uma vez que mesmo que o trabalhador tenha
escolhido silenciar, outros presenciaram a situação e aquilo não foi discutido da mesma forma
como os outros dois casos anteriores.
A confusão também acontece porque a meta zero não significa necessariamente um
compromisso com zero acidentes em todos os graus de gravidade (ZWETSLOOT et al.,
2013), como no contexto da usina em estudo, onde o resultado é direcionado apenas aos
acidentes com afastamento. E o cinismo decorre pelo senso que os trabalhadores possuem de
que os acidentes continuam existindo mesmo diante de um programa de acidente zero
implementado. Os trabalhadores ridicularizam essa meta (SHERRATT; DAINTY, 2017).
As crenças se relacionam com a realidade de duas maneiras: através dos fatos ou do
desejo de determinada realidade (GEERTZ, 1989). A crença no “zero” pode gerar a ilusão de
acreditar ser possível viver em um mundo sem sofrimento levando a esforços para fazer o
sofrimento "desaparecer de vista" (DEKKER; LONG; WYBO, 2014), o que pode ser
verificado em casos de silenciamento de acidentes.
A crença no zero também apresenta raízes no mito de que ao evitar qualquer acidente
leve ou desvios, evita-se acidentes mais graves. Isso leva a acreditar que quanto menos
acidentes acontecem, o que sobra são incidentes e esses recaem sobre o comportamento
humano. Essa é uma crença, fruto da má interpretação da Pirâmide de Heinrich e que
influencia os engenheiros até os dias de hoje (BUSCH, 2021). Essa prática explica a
permanência no mito do acidente zero, uma vez que alimenta e reforça essa crença. E essa
lógica parece estar mais ao lado das máquinas do que dos trabalhadores, porque a máquina
pode quebrar, mas o humano não. Existe a transferência para o comportamento, de modo que
os gestores pensem que se aconteceu um acidente é porque o comportamento não foi
controlado. Isso também é um efeito da ilusão retrospectiva, uma vez que ela gera a impressão
de que era possível ter evitado um acidente fortalecendo objetivamente a ideia de que o
comportamento poderia ter sido mudado e que o resultado teria, assim, sido diferente. No
entanto, nem mesmo uma máquina e processos nunca serão absolutos ou definitivamente
estáveis (PETROSKI, 2018). Assim, por trás dessa
79
lógica, a engenharia acredita que a meta zero acidente é possível. Dito isto, é evidente que
eles não enxergam que é um processo de aprendizagem contínua. Com isso, o trabalhador é
culpado pela falta de percepção e por não apresentar bom comportamento.
Chegados a estes pontos, é evidente que o mito do acidente zero limita a cultura de
segurança a uma cultura de contabilização da frequência dos acidentes e quase acidentes a
qual se explica pela forma fácil de compreensão, instrumentalização e comunicação ao
público (AMALBERTI, 2016). Essa prática também carrega efeitos deletérios e
desumanizadores por trás dos esforços para gerenciar e empurrar os números o mais baixo
possível produzindo mais sofrimento, em vez de menos (DEKKER, 2018). A cultura do zero
pode, então, paradoxalmente, produzir novos tipos de sofrimento, como a punição de
trabalhadores envolvidos em incidentes (DEKKER; LONG; WYBO, 2014), sendo esta
voluntária ou involuntária. E pode ainda aumentar a probabilidade de acidentes graves
(SHERRATT; DAINTY, 2017), uma vez que impede o diálogo aberto na organização e uma
cultura que possibilita o aprendizado (LONG; 2022).
É necessário compreender que essa visão desencoraja os trabalhadores e a liderança
para a elaboração de melhores práticas. O discurso do dano zero não promove o resultado
almejado; ele promove dinâmicas ocultas associadas à sua promoção (LONG, 2022)
ocultando a realidade, como foi demonstrado neste trabalho. As pessoas tendem a se
concentrar nos números e não na visão que deveria inspirar mudanças reais na prática para as
pessoas diretamente relacionadas a execução do trabalho (SHERRATT; DAINTY, 2017).
Portanto, o abandono dessa prática possibilitará que, quando ocorrer um acidente, se o
acidentado precisar se afastar por dois dias, que se afaste sem se preocupar com a
contabilização nos índices da empresa. Deve-se ter em mente que não há nada grave nisso,
pois o acidente é leve. Sendo assim, ele na verdade, não quebra o recorde. Isso é uma falha
dos indicadores ao querer nivelar um acidente industrial, como por exemplo, no contexto da
usina, a uma explosão de caldeira com uma queda no chão, como foi o caso do acidente do
mecânico. Acidentes como esses não deveriam ser avaliados de forma negativa, como se fosse
algo contra a capacidade que os trabalhadores da usina já demonstraram ter ao longo desses
anos.
Na verdade, o recorde só será quebrado quando houver um acidente grave. E mesmo
assim, quando esse acidente grave acontecer, ninguém deve se sentir culpado, porque não
existe acidente zero, não existem pessoas que não erram e o acaso também pode fazer parte da
gênese de um acidente. A crença do acidente zero joga contra a segurança. Enquanto um
acidente não acontece, nós ficamos adormecidos na ilusão de que estamos seguros, estáveis e
de que não vamos falhar. Não é porque a empresa atingiu o recorde que ele deve permanecer.
Os
80
Nos dois capítulos anteriores, foi demonstrado e explicado como o que foi pensado
como estímulo positivo se tornou uma fonte de sofrimento. O recorde de quase 7 anos
atingido pela usina se transformou em algo rígido e absoluto que não poderia ser mais
quebrado. Os bons resultados deixaram de ser motivadores da equipe e o “peso do recorde”
passou a alimentar um processo contrário, de fragilização da segurança e de criação de
conflitos entre colegas. Esses efeitos negativos do zero acidente e da valorização do recorde
indicam a necessidade de mudanças, talvez mesmo de serem abandonados como objetivos
centrais. Essas práticas se mostraram perversas e já são reconhecidas como uma estratégia
inviável, uma vez que vivemos em um mundo complexo, onde o trabalho ocorre em
condições de convivência mútua com sistemas técnicos, financeiros, culturais e políticos
(HOLLNAGEL, 2014), cujas inter-relações estão longe de serem previsíveis e controladas.
Incontestavelmente, a luta pela segurança e os bons resultados traduzidos em redução
da frequência e gravidade de acidentes é sempre benvinda. Entretanto, isso deve acontecer de
modo que as vitórias alcançadas não se transformem em um fardo. Para evitar que o medo de
sofrer o próximo acidente leve à fragilização do sistema de prevenção, é extremamente
importante que a organização abandone qualquer tipo de ranking de segurança entre as
unidades, não somente os relacionados com acidentes. Um primeiro motivo para justificar
essa medida é que comparação entre unidades de produção é sempre injusta, pois suas
histórias e as condições nunca serão iguais. Depois, por ser uma taxa, e uma taxa requer um
denominador que é maleável6 (DEKKER, 2018). E outro motivo é que a definição de acidente
ou lesão é variável e manipulável (DEKKER; TOOMA, 2021) e isso pode acontecer com a
definição de
6
Segundo Dekker (2018), O que é medido pode ser manipulado e é medido por uma razão fazendo com que as
pessoas se preocupem com esse número em particular, pois ele tem implicações que vai além do número,
significando algo para elas. E à medida que ocorre uma manipulação para atingir uma meta, essa medida perde
qualquer conexão com a segurança. Por exemplo, se a meta é zero acidentes, os trabalhadores começam a ajustar
seus comportamentos e decisões para não registrar acidentes e atingir o resultado, mesmo que prejudique a
saúde, segurança e o bem-estar no ambiente de trabalho, pois esse resultado pode significar que o ambiente é
seguro e que os trabalhadores cumprem as normas e os procedimentos ou que os gestores possuem um
desempenho acima da média, pois conseguem controlar bem os acidentes. Essa prática se torna ainda mais
atraente quando gera bônus para os gerentes responsáveis.
82
qualquer outro conceito que se queira colocar em evidência em segurança, uma vez que
determinada prática pode fazer sentido para um grupo e para o outro não.
Além do abandono dos rankings de segurança e da meta zero acidente, a mentalidade
da usina deve mudar. O objetivo da empresa deve ser ter o menor número possível de
acidentes ou situações indesejadas, mas reconhecendo que eles nem sempre são evitáveis. E,
quando acontecerem, devem ser oportunidade de aprendizagem genuína e não de execração
pública do acidentado que quebrou o recorde.
O caminho saudável que propomos para a empresa seguir é agir aperfeiçoando as
práticas já existentes utilizando meios que consideram a experiência dos trabalhadores como
parte fundamental na produção de mais segurança como os Espaços de Debate sobre o
Trabalho (ROCHA, 2014), que é uma ferramenta que foi desenvolvida com base nos fatores
humanos e organizacionais para a discussão e o tratamento das situações de trabalho
envolvendo riscos (ROCHA; MOLLO; DANIELLOU, 2019); e a identificação de sinais
fracos que são sinais de alerta de riscos, erros e possibilidade de resultados prejudiciais
(LIMA et. al, 2022). Também são compreendidos como anomalias que podem não ter
nenhuma conexão clara e direta com risco ou perigo potencial ou que acontecem raramente
(VAUGHAN, 2002). E quando se fala em sinais fracos é necessário dar atenção às situações
normais (HOLLNAGEL et al., 2006) ou aquilo que dá certo na segurança (HOLLNAGEL,
2014), ou seja, aquilo que acontece todos os dias e na maior parte do tempo.
É importante lembrar que a resiliência de um sistema é estabelecida pela capacidade
de ajustar seu funcionamento antes, durante ou após alterações e perturbações, de modo que
possa dar continuidade à operação necessária em condições esperadas e inesperadas de forma
eficiente e segura (HOLLNAGEL, WOODS, LEVESON, 2006). Em outras palavras, um
sistema é resiliente quando as pessoas inseridas nele conseguem perceber que algo mudou
repentinamente e que isso poderia trazer resultados negativos como acidentes, danos materiais
e desperdícios; ao mesmo tempo essas pessoas sabem responder a essa mudança no tempo
certo e da forma certa de modo que o sistema continue operando satisfatoriamente. Portanto, a
resiliência é possível em virtude da capacidade humana de detectar, interpretar e responder às
variações do sistema (RANKIN et al., 2014), que podem conter sinais fracos.
Para que esse desenvolvimento seja possível, as pessoas precisam, portanto, ser
“educadas” para reconhecer os primeiros sinais de alerta para que pequenos erros não se
tornem acidentes (VAUGHAN, 2004), elas precisam compreender a mudança gradual para a
falha. No entanto, os treinamentos tradicionais não se enquadram como solução para essa
demanda, porque detectar sinais fracos depende de conhecimento, experiência, suposições e
interpretação
83
as esferas da empresa para que quando não for possível fazer um tratamento local, seja
realizado em outras esferas (ROCHA, 2017). Essa é uma forma de facilitar as conexões locais
operacionalmente, estruturalmente e socialmente.
A terceira característica é a co-construção do método, ou seja, devem ocorrer
adaptações particulares conforme as especificidades de cada empresa ou do coletivo de
trabalho, como os meios e recursos a serem utilizados e os tratamentos das situações
(ROCHA, 2017), otimizando a eficiência local.
A quarta característica é possibilidade de que recursos estejam disponíveis, isso
significa que os trabalhadores devem ter a autonomia e possibilidade de agir sobre as
situações discutidas a partir de recursos disponibilizados pela empresa para o tratamento das
situações (ROCHA, 2017), de forma que a auto-organização seja facilitada. Essa também é
uma forma de criar condições para a motivação intrínseca dos trabalhadores de fazer algo bem
e com autonomia (DEKKER, 2018).
E a quinta característica é que o debate deve ser baseado na confrontação com o real,
apresentando ao mesmo tempo a participação constante dos trabalhadores e possibilidade de
ação. O debate deve ser focado no que os trabalhadores fazem realmente durante a atividade,
ainda que sejam transgressões de regras e procedimentos. Dessa forma, o espaço de debate
torna possível o conhecimento da atividade real, evidenciando as vulnerabilidades da empresa
e suas causas para que estas possam ser tratadas de forma eficiente (ROCHA, 2017).
As características mencionadas facilitam a promoção da segurança como um princípio
orientador e compartilhado, incluindo todas as camadas de liderança, removendo o controle
autoritário e descendente de todas as pessoas e atividades, oferecendo meios, tempo e
oportunidades de comunicação (DEKKER, 2018).
A reunião setorial da forma como é feita já possibilita que o grupo discuta sobre os
assuntos envolvendo a atividade. Para a segurança isso é positivo, uma vez que permite o
compartilhamento de experiências e de informações importantes sobre a atividade, riscos e
estratégias para lidar com eles e diferentes percepções e opiniões sobre algo. Os casos 1, 2 e 4
apresentados nesta pesquisa chegaram a ser discutidos pelos trabalhadores nas reuniões
setoriais de operação, espaço onde puderam esclarecer as controvérsias envolvendo os dois
acidentes que não entraram na taxa de acidentes com afastamento. No entanto, no caso 2, a
controvérsia não chegou a ser totalmente resolvida. Mas, seria de grande ganho para o
coletivo de trabalho, se esse caso fosse o centro de um Espaço de Debate no Trabalho, por
exemplo. Haveria, portanto, esclarecimento sobre a controvérsia e a real gravidade do caso e
os trabalhadores aprenderiam coletivamente com a situação do acidente, como ele ocorreu e
como
86
poderia ter sido evitado. Uma estratégia que a usina pode adotar é separar um momento
dentro da reunião setorial único e exclusivo para o EDT ou programar outro momento para
acontecer esse espaço. Assim, os trabalhadores podem ter tempo e oportunidade de discutir
um assunto pertinente à realidade de trabalho de forma separada dos vários assuntos que são
apresentados na reunião.
Dessa forma será possível concentrar mais energia no compartilhamento de
experiências com o coletivo de trabalho sobre os sinais fracos e na educação dos
trabalhadores para sua detecção e relato. Vale ressaltar que o EDT pode ter como assunto
selecionado para debate tanto situações com um potencial percebido maior do que outras, ou
seja, situações que são um grande desvio da situação “normal”, como também aquelas
situações priorizadas de alguma forma pela organização (BUSCH, 2021). Inicialmente, até
que todos os trabalhadores consigam compreender de fato o que são os sinais fracos a ponto
de já conseguirem praticar a identificação deles, essa segunda opção de assunto a ser discutido
nos EDTs será de grande valia para a implementação dessa ferramenta. Também é importante
frisar que não é uma regra que em todos os EDTs tenha a discussão sobre um sinal fraco. No
entanto, discutir coletivamente sobre os sinais fracos da usina é um dos caminhos de melhoria
das práticas de segurança, uma vez que auxilia na educação da percepção dos trabalhadores
para que eles consigam reagir a sinais fracos (WEICK & SUTCLIFFE, 2001), no tratamento
real dos relatos e na produção saudável de mais segurança.
É importante salientar que a palavra dos trabalhadores é essencial para a segurança, pois são
eles que vivenciam o interior dos sistemas sociotécnicos o que os tornam mais aptos a analisar
as anomalias, os déficits, as incoerências e os perigos, e alertar sobre eles. À medida que os
trabalhadores vão se tornando mais experientes, adquirindo uma vivência de longa duração na
organização, eles adquirem uma bagagem história da evolução daquele sistema, uma
familiaridade muito grande e que também acontece com a interação entre o coletivo ao se
interrogarem e debaterem sobre os modos de funcionamento do sistema (LLORY &
MONTMAYEUL, 2014), muitas vezes, vivenciadas no quotidiano de forma informal. Dessa
forma, será possível formalizar o que já acontece o tempo todo, mas agora com a participação
dos gestores.
87
acidente quando a usina estava quase atingindo 7 anos sem acidentes com afastamento.
Portanto, concluímos que a concessionária de energia deve repensar a respeito dessa prática
de estimular entre as unidades uma competição por melhores resultados de segurança. Ainda
que fosse somente dentro de um contexto produtivo com uma única filial, esse tipo de
estratégia pode causar danos para a cultura de segurança, como a instauração do silêncio
organizacional e do mergulho na ilusão de que os bons resultados de segurança refletem a
realidade da planta e garantem a segurança.
As práticas ligadas aos números e indicadores fazem da usina uma organização que
cultiva uma cultura gerencial de segurança, o que consequentemente a torna estagnada e
limitada em termos de segurança. Os bons resultados que foram atingidos podem estar
mascarando potenciais riscos de acidentes, uma vez que se estabelece um clima de
competição entre as unidades ocorrendo à proteção ao recorde, e não a prevenção de
acidentes. Portanto, a organização precisa evoluir e passar a incorporar práticas baseadas em
fatores humanos e organizacionais e que caminham em direção a uma cultura integrada de
segurança.
O desempenho da usina em relação à segurança é bom. Os registros mostraram que o
último acidente grave ocorreu há mais de 10 anos e os outros acidentes que ocorreram foram
de baixo potencial de gravidade. Mas, o recorde é uma referência ao esporte que não deveria
existir na vida organizacional, nem mesmo os rankings de segurança. Isso se torna um peso
porque impõe o pensamento de que é necessário se superar a todo momento, porque o
fracasso pode vir e o outro pode vencer. E lidar com o fracasso é difícil para qualquer ser
humano.
Recordes de segurança e comemorações de X dias sem acidentes do trabalho (ou
apenas acidentes com afastamento) resgatam a visão zero de acidentes que é um mito da
segurança que precisa ser combatido, uma vez que ele limita a cultura de segurança a uma
cultura de contabilização de acidentes e quase acidentes; estimula a manipulação dos números
empurrando-os para mais baixo possível; abre espaço para punições, julgamentos e mal estar
entre os trabalhadores, produzindo sofrimento no trabalho; estimula o silêncio organizacional;
e pode contribuir de forma significativa para o aumento da probabilidade de acidentes graves.
Essa visão desencoraja os trabalhadores e a liderança para a elaboração de melhores práticas
de segurança, mesmo que a intenção por trás dessa estratégia seja a de promover práticas que
colaboram para a prevenção.
Posto isso, para impedir que todos esses efeitos negativos se façam mais presentes e
molde a cultura de segurança, a usina deve abandonar essa prática. Isso permitirá que quando
ocorrer um acidente, se o acidentado precisar se afastar por dois dias, que se afaste sem se
preocupar com a contabilização nos índices da empresa. Também possibilitará que a usina se
89
atente aos riscos presentes na realidade e que podem gerar acidentes de maior potencial de
gravidade em vez de ficar adormecida na ilusão de que está segura, estável e de que não vai
falhar mais. Outro benefício é o da aprendizagem constante, porque os acidentes, em vez de
gerar julgamentos e sentimento de fracasso pela perda do status, vai ensinar uma lição
importante para a segurança e que pode ser aprendida por todos. É importante salientar que
abandonar a meta de zero acidentes não significa aceitar os acidentes e parar de buscar
a prevenção! Pelo contrário, significa reconhecer a realidade de trabalho dando abertura para
os trabalhadores relatarem mais casos e praticarem ações que colaboram para o tratamento
mais efetivo dos riscos que permanecem mascarados na organização por causa da valorização
dessa visão. A filosofia torna-se outra, a de que não existe o absoluto, mas existe o tornar-se
melhor. Aristóteles nos ensina isso há milênios afirmando que nós só nos tornamos melhor
através da prática. Quando fazemos o que tem que ser feito para melhorar a segurança,
tornamos ela melhor e mais fortalecida a cada dia. Essa conduta vai ao encontro com o ciclo
de melhoria contínua tanto pregado nas organizações.
Não somente essas comemorações e a visão zero acidentes devem ser abandonadas,
mas qualquer tipo de ranking de segurança estimulado entre unidades, uma vez que isso já
instaura um processo de competição e preocupação com os números que serão relatados;
porque comparações entre unidades de produção são injustas, pois trata-se de histórias,
condições e preocupações diferentes; e também por causa de diferenças de percepção e de
concepção teórica entre os trabalhadores de unidades diferentes.
Dessa forma, as práticas devem incentivar mais os relatos de acidentes, valorizar a
aprendizagem organizacional e facilitar a aproximação social. Recomendamos que a usina
busque vivenciar a Abordagem dos Fatores Humanos e Organizacionais da segurança
industrial que defende a identificação e implementação de condições que facilitam a
contribuição positiva dos trabalhadores e coletivos de trabalho. Assim, propomos dois
caminhos que a usina deve seguir para fortalecer a cultura de segurança: a implementação de
Espaços de Debate sobre o Trabalho (EDT) e o estímulo a detecção de sinais fracos.
Em relação aos Espaços de Debate sobre o Trabalho, a reunião setorial pode ser
adaptada para se transformar nessa ferramenta ou ela pode ser implementada de forma
independente da reunião. Para que se estabeleça um EDT, é necessário que esteja presente
cinco características que favorecem o debate e estimula a participação dos trabalhadores. São
elas: capacidade das hierarquias mais altas em questionar os próprios limites; a presença de
um gestor que conduz o espaço de debate com a postura de garantidor e animador do debate;
co- construção do método; possibilidade de que recursos estejam disponíveis; e debates
baseados
90
na confrontação com o real, ao mesmo tempo que apresenta a participação constante dos
trabalhadores e possibilidade de ação.
Os Espaços de Debate sobre o Trabalho possibilitarão a utilização da experiência
coletiva e o compartilhamento de experiência entre os trabalhadores; além de formar um
caminho que possibilita o desenvolvimento da capacidade de detecção de sinais fracos pelos
trabalhadores, que é o outro caminho proposto para fortalecer a segurança. Esse
desenvolvimento é possível quando as pessoas são “educadas” para reconhecer os primeiros
sinais de alerta de uma mudança gradual para a falha. Essa capacidade não se desenvolve com
treinamentos tradicionais, e sim à medida que os trabalhadores desenvolvem expertise no
contexto em que está inserido. Portanto, essa educação em detecção de sinais fracos implica
em fazer os trabalhadores compreenderem o que é sinal fraco. Isso requer tempo e
experiência, sendo também um processo situado e íntimo de cada um. Sabendo disso, o EDT
pode ser, portanto, a alternativa para lidar com o fator tempo e uma forma de iniciar o
desenvolvimento de capacidade nos trabalhadores, uma vez que poderão ser discutidas as
situações reais de trabalho abordando possibilidades de decisões que são necessárias tomar
durante uma ação; os possíveis erros do sistema e como lidar com eles; os sinais fracos; e as
características do sistema em cada situação.
Para finalizar, sugerimos para trabalhos futuros iniciar a construção da prática dos
Espaços de Debate sobre o Trabalho com foco na educação dos trabalhadores na detecção de
sinais fracos. Também sugerimos o desenvolvimento de mais pesquisas sobre práticas
baseadas na abordagem dos Fatores Humanos e Organizacionais da segurança, uma vez que
ainda não há muitos exemplos práticos que possam servir de exemplo e inspiração para as
organizações.
91
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