Tese - Alberto Toledo Resende - 2020 - Completa
Tese - Alberto Toledo Resende - 2020 - Completa
Tese - Alberto Toledo Resende - 2020 - Completa
São Gonçalo
2020
Alberto Toledo Resende
São Gonçalo
2020
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CEHD
______________________________________ ___________________
Assinatura Data
Alberto Toledo Resende
Banca Examinadora:
_____________________________________________
Prof.ª Dra. Catia Antonia da Silva (Orientadora)
Faculdade de Formação de Professores de São Gonçalo – UERJ
_____________________________________________
Prof. Dr. Gelsom Rozentino de Almeida
Faculdade de Formação de Professores de São Gonçalo – UERJ
_____________________________________________
Prof.ª Dra. Maria Letícia Corrêa
Faculdade de Formação de Professores de São Gonçalo – UERJ
___________________________________________________
Prof. Dr. Márcio Antônio Cataia
Universidade Estadual de Campinas
___________________________________________________
Prof. Dr. Ulisses da Silva Fernandes
Instituto de Geografia- UERJ
São Gonçalo
2020
DEDICATÓRIA
À minha família, mãe, querida esposa e filha, pela paciência e a vivência do compromisso
solidário durante todos os momentos desse trabalho, e aos meus amigos pelos períodos de
descontração que possibilitaram a revitalização para a escrita.
AGRADECIMENTOS
Joël Candau
RESUMO
RESENDE, Alberto Toledo. Public Fishing Terminals: norms and implementation of State
policy and its territorial relations in the pt government (2003 to 2016). 2020. 190f. Tese
(Doutorado em História Social) – Faculdade de Formação de Professores, Universidade do
Estado do Rio de Janeiro, São Gonçalo, 2020.
Texto do The investigation of the national policy of public fishing terminals is the
central point of this work, in relation to its impact on the territorial planning of fishing
activity, which already exists. A similar impact has already been seen, at the beginning of the
20th century, with the implementation of the Fishermen's Colonies system, under the tutelage
of the Navy, whereby the state's demand for territorial controlled fishermen's vessels to
become the third fleet of the Brazilian Navy. This object requires the understanding and
description of federal legislation (mainly Decree No. 5,231 of October 6, 2004) and
international conventions and treaties (with emphasis on the United Nations Convention on
the Law of the Sea), with the ability to alter the local reality, through standardization, with the
objectification of the actions of the agencies involved and considering the interconnections of
these actions with spatialities and historicities. In this apprehension of the legislation, the
observation of the intertwining between treaties and international conventions ends up
generating demands, which do not always equate to local needs, causing changes in the
territory, not only at the market level, but may reach, hypothetically, up to the daily lives of
fishermen and their customs, because the social relations and market actions of the agents
involved, are public, such as the standardorgans (ministries and secretariats) , are private, such
as the petrochemical, ice factories, port logistics, trade unions and NGOs sectors in the fishing
sector's activity should also be observed, in order to understand territorial change by market
bias.
Keywords: Public Fishing Terminals. Legislation. Fishing. Territory and Productive Circuit.
LISTA DE TABELAS E FIGURAS
CS Circuito superior
MP Ministério Público
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 12
INTRODUÇÃO
configuração territorial, proposta pela política dos Terminais Pesqueiros Públicos (TPP).
Deste modo, o trabalho faz parte de uma trajetória de pesquisa construída na demanda de
compreensão da relação legislativa entre o território e o Estado, em que a pesca passa ser um
ponto de interseção.
Minhas primeiras indagações sobre o tema (Estado e atividade pesqueira, com
destaque para a pesca artesanal) tiveram lugar no curso de mestrado, concluído junto ao
PPGHS/FFP/UERJ, e incluíram, como ponto inicial de análise, o período histórico de 1890-
1919, quando o setor pesqueiro foi institucionalizado pela primeira vez, a nível nacional, com
a instalação de fixos em todo o território brasileiro. Por meio deste estudo, foi possível
verificar que a relação entre Estado e pesca tem seu primeiro marco histórico neste período,
no qual a pesca não era vista como uma atividade econômica central, mas, sim, como um
instrumento de organização e de domínio/controle do Estado sobre o território.
Portanto, o diálogo com a Geografia política se pautava na compreensão da soberania
do Estado, por meio do controle do território. No início do século XX, a pesca era
subordinada à Marinha do Brasil (Companhia dos Portos), sendo, a embarcação do pescador,
considerada, nesse período, o terceiro braço da frota da Marinha, encarregado de monitorar o
litoral brasileiro, já que, naquele período, a Marinha do Brasil possuía um número limitado de
embarcações, que não conseguiam dar conta de todo o extenso mar continental e das águas
ribeirinhas do país. Depois desse período, a literatura define quatro novos marcos
institucionais da pesca (SILVA, 2015).
O primeiro marco é estabelecido em 1930, no governo Vargas. Tal política pública é
voltada à organização do circuito produtivo, por meio dos primeiros empréstimos aos
pescadores (cartas de crédito) e pela escrita das primeiras legislações de controle da produção.
Já havia um desejo de modernização da pesca, visando à produção em grande escala, mas os
resultados foram pequenos e pontuais, espacialmente falando.
O segundo marco foi a criação da Superintendência de Desenvolvimento da Pesca
(SUDEPE), vinculada ao Ministério da Agricultura. Este órgão, que funcionou entre 1961 e
1989, foi central na Política Nacional de Pesca, implementada pelo governo Jânio Quadros.
Na conjuntura da ditadura militar, este órgão e esta política estiveram integrados ao Plano
Nacional de Desenvolvimento (PND), mas este tema será retomado neste texto.
Antes de citar o terceiro grande marco, vamos entender um pouco do processo
constituinte de 1988, que altera totalmente o debate sobre a atividade pesqueira, dando novos
rumos à sociedade brasileira.
14
Em seu livro, Villa (2011, posição 1734 1) coloca que a eleição de 15 de novembro de
1986 teve a maior parte dos estados conquistado pelo PMDB, dando ao partido a maioria
absoluta das cadeiras na Constituinte. Com essa característica, “em 1º de fevereiro de 1987,
foi instalada a Assembleia Nacional Constituinte”, a qual, segundo Villa (2011), já possuía
um problema, em sua sessão de abertura: a questão dos senadores eleitos em 1982, com
mandatos de oito anos e, portanto, sem a “devida delegação constituinte”. Acabou sendo
aceita a participação desses senadores, mesmo sem terem sido escolhidos constituintes pelos
eleitores.
Esse crescimento artificial do PMDB, durante as eleições constituintes, gerou,
segundo Villa (2011, posição 1746), uma crise interna do PMDB com a divisão do partido,
durante a constituinte, acarretando o surgimento do PSDB, que “também foi um elemento que
colaborou com a balbúrdia constitucional. (...) A direção partidária, em certo momento dos
trabalhos, perdeu a liderança. Grupos suprapartidários foram surgindo”.
A Constituição de 1988 é a mais longa de todas as anteriores: são 250 artigos e mais
70 nas disposições transitórias, perfazendo um total de 320 artigos. Acabou até
ficando enxuta, pois na primeira versão tinha 501 artigos, depois “sintetizados” em
334, até chegar, quando da votação, aos 250. Em relação às disposições transitórias,
se comparado com as Cartas produzidas por assembleias constituintes, o
crescimento ou a prolixidade, questão de escolha, é evidente. A de 1891 tinha
apenas oito artigos, em 1934 saltou para 26, em 1946 aumentou para 35 e em 1988
duplicou, alcançando 70 artigos. (VILLA, 2011, posição 1760)
1
Posição é uma referência utilizada pelo dispositivo Kindle, da Amazon, no lugar da paginação, em seus e-
books.
15
Finalizando esse ponto, em relação a constituição de 1988, Villar (2011, posição 1838)
lembra que foram editadas ou reeditadas milhares de medidas provisórias no período de 1988
a 2011. Ele ressalta que, na maioria delas, não havia um caso de “relevância e urgência”.
Como um exemplo, entre centenas de outros, temos a Medida Provisória de 3 de novembro de
1988, surgida antes mesmo da Constituição completar um mês de existência, que tinha, como
ponto principal, disciplinar a proibição da pesca de espécies em períodos de reprodução.
O terceiro grande marco institucional aparece com a subordinação do setor pesqueiro
ao Instituto Brasileiro Meio Ambiente Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no período
1989-1999. Este marco é considerado crítico para a pesca, pois o órgão, com uma visão
ambiental protecionista, passou a tentar proteger, com decretos e com leis, o período de
reprodução das espécies (defeso), proibindo técnicas de grande captura, como o arrastão, e
extinguir alguns avanços conquistados no período anterior, relacionados ao crescimento da
atividade pesqueira dentro da zona marítima exclusiva, sob o pretexto da proteção ambiental.
Os setores hegemônicos da pesca, principalmente, o da pesca industrial, fizeram pressão,
junto ao governo Fernando Henrique Cardoso, que decretou a vinculação do órgão ao
Ministério de Agricultura e Abastecimento, no ano de 1999.
2
Com a queda do Muro de Berlim, que levou ao fim da Guerra Fria, ao mesmo tempo, o modelo social-
democrata da Europa, do estado de bem-estar social, também começou a dar sinais de esgotamento (VILLAR,
2011, posição 1780).
16
O quarto marco institucional histórico tem início em 2003 e se estende à época atual.
Novos órgãos e legislações foram criados, tais como a Secretaria Especial da Aquicultura e
Pesca (SEAP), em 2003, vinculada diretamente à Presidência da República, no primeiro
governo Luiz Inácio Lula da Silva, e o Ministério da Pesca e Aquicultura, bem como a Lei da
Pesca, em 2009, no segundo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. No debate, que envolveu o
circuito produtivo da pesca, em suas esferas de captura, de produção, de distribuição e de
comercialização, aparece a problemática do entreposto, seja para o pescador artesanal 3, seja
para o pescador industrial, seja para o comerciante de pescado, o que, junto com outros
fatores, fortaleceu a implementação da política dos Terminais Pesqueiros Públicos (TPP).
É importante ressaltar que cerca de 60% do pescado nacional vem da pesca artesanal 4,
enquanto os cerca de 40% restantes resultam da pesca industrial, no que se refere à pesca
marinha. A aquicultura ainda é muito pequena no país e, no caso de espécies exóticas, tem o
rio como local principal de extração, junto com os tanques de criação de espécies, como
tilápia, tambaqui e camarão.
São milhares de pescadores, de acordo com Diegues (1983), sempre sofrendo com a
atuação do Estado, com seus projetos (como a criação das Colônias de Pescadores, no início
do século XX), o que acabou por produzir uma separação entre a forma artesanal 5, que ocorre,
ao longo da costa, trabalhando com pouca tecnologia, possuindo uma relação de trabalho em
parceria e capturando em pequena escala, marcada, principalmente, pelo uso de caícos e de
embarcações, que raramente ultrapassam 12 metros de comprimento (DIEGUES, 1983;
RESENDE, 2006; SILVA, 2010). Os pescadores industriais, fortalecidos pela ação da antiga
3
Atividade exercida por trabalhadores, que capturam moluscos, mariscos e crustáceos perto da costa, amiúde,
sem usarem de embarcação nenhuma, ou pescam perto ou longe, servindo-se de embarcações de pequeno porte
(como jangadas ou canoas), as quais a legislação em vigor manda terem, no máximo, 15 m de comprimento, e
que, em média, conduzem dez pescadores. A pesca artesanal é praticada em regime de trabalho familiar ou em
grupos de parentesco e de vizinhança, utiliza recursos tecnológicos poucos e simples e se baseia em
conhecimentos empíricos, transmitidos por tradição oral, dentro das famílias e das comunidades que a
exercem. Os pescadores artesanais confeccionam seus próprios meios de produção e escolhem seus processos
de trabalho autonomamente, produzindo em pequena escala, tanto para o consumo familiar quanto para o
mercado. Por disporem de parcos recursos financeiros e tecnológicos, esses pescadores não costumam se
aventurar em águas muito afastadas da costa, o que restringe suas áreas de pesca, sobre as quais a modernidade
faz sentir, com maior força, os efeitos socialmente deletérios para trabalhadores de baixa renda, como eles.
4
Saberes, narrativas e conflitos na pesca artesanal [recurso eletrônico] / KNOX, Winifred; TRIGUEIRO,
Aline. (orgs.). Vitória: EDUFES, 2015. Disponível em:
http://repositorio.ufes.br/bitstream/10/1337/6/Livro%20edufes%20saberes%2C%20narrativas%20e%20conflit
os%20na%20pesca%20artesanal.pdf, acessado em 16/07/2018.
5
São trabalhadores que têm dificuldades de distribuir e de beneficiar o pescado e que, portanto, necessitam
rapidamente de vender o que acabaram de pescar, gerando situação de exploração, por parte dos varejistas.
17
6
Em nenhum trecho do seu relatório, Villar (1945) oculta o real interesse da Marinha com essa população
litorânea pobre e excluída. Como observa ele, nas suas justificativas para a “missão”, era impossível tornar os
pescadores parte do Estado, como força militar ou como potência na economia, sem criar uma nova
organização social, que incluísse melhorar-lhes as condições de existência: “[...] de nada poderão servir
homens, embora inteligentes e bravos, assim, em grande parte, em lamentável estado de deficiência física,
vivendo, ou melhor, vegetando, abandonados nas curvas da costa, vilmente explorados pelos mandões locais e
por eles cruelmente escravizados. ERA, POIS, PRECISO LIBERTAR, SANEAR, INSTRUIR, EDUCAR E
DEFENDER O NOSSO BONÍSSIMO CABOCLO PRAIANO. A Missão do cruzador José Bonifácio foi,
assim, obra de reação nacionalista e de grande relevância cívica. [...] iniciando do extremo Norte para o Sul os
trabalhos de organização e de defesa dos nossos pescadores: REUNI-LOS EM COLÔNIAS
COOPERATIVAS. CRIAR ESCOLAS. EDUCÁ-LOS. FUNDAR POSTOS DE SANEAMENTO. DAR-
LHES TERRAS. DAR-LHES SAÚDE, INSTRUÇÃO PROFISSIONAL, AMPARO E LIBERDADE. Eis os
objetivos que buscávamos colimar. (VILLAR, 1945, p. 23). O grande projeto da Marinha era que as Colônias
de Pescadores, formadas em áreas abrangidas ou não por um só município, fossem reunidas em federações de
pescadores, dentro de cada estado brasileiro, totalizando entre 15 e 25 colônias por estado, e acolhendo o maior
19
rompimento com a memória coletiva, pela implantação da política dos Terminais Pesqueiros
Públicos e pela possível desconstrução dos núcleos pesqueiros locais, como as colônias e
como os pequenos atracadouros das associações de pescadores.
Com isso, busco, na interseção entre os campos da História, da Geografia e do Direito,
compor uma interpretação para a reestruturação da atividade pesqueira, no final do século XX
e no início do XXI, através do processo legislativo, tomando, como alicerces, algumas teorias
da História e da Geografia, bem como os conceitos de Estado territorial, de soberania e de
regulação. Do mesmo modo, aproveito-me dos debates iniciados por Antas Jr. (2005, posição
63), nos quais o autor estabelece o tripé Estado-corporações-instituições civis não estatais,
que pode ser aplicado à compreensão da atividade pesqueira no último século, marcada por
transformações resultantes de uma maior interpenetração de modelos distintos de concepção
jurídica, derivando na legislação dos Terminais Pesqueiros Públicos.
A política dos Terminais Pesqueiros Públicos parte de uma demanda de
regulamentação apresentada pelo Estado, objetivando, não, somente, a regulação da atividade
pesqueira nacional, mas procurando impor um maior controle sobre o volume de recursos
marinhos vivos, observando, ainda, normativas internacionais.
De acordo com Antas Jr. (2005, posição 108), a partir do “entrelaçamento entre
Estados hegemônicos e outros agentes institucionais e corporativos”, pode-se fazer uma
relação deste processo com o fenômeno, que vem produzindo pressão legislativa sobre a
atividade pesqueira, semelhante ao resultado proposto por Antas Jr. (2005, posição 108) “em
efeitos diversos sobre os modos de regulação das formações socioespaciais, dentre os quais se
destaca o ressurgimento do pluralismo jurídico, cujo funcionamento essencial se distingue
bastante daquele, observado antes da formação dos Estados territoriais”.
Para compreende as diversidades legislativas e políticas que circundam a construção
dos Terminais Pesqueiros Públicos, retomo os textos de Koselleck (2014, p. 19), para quem os
estratos do tempo admitem a “transformação da história humana, política ou social, que
permite separar analiticamente os diversos planos temporais, em que as pessoas se
número desses trabalhadores. Tais Colônias, constituídas de agrupamentos de pescadores no litoral, em ilhas,
em rios e em lagoas, seriam um ponto de apoio, para a ação social, administrativa e militar do governo da
República, dando corpo à ossatura do governo e conferindo a este representatividade. No projeto da Marinha,
que deveria ser executado por Villar (1945) em um período de quatro anos, cada Colônia seria um “centro de
orientação técnica e profissional”, que, dentro de suas estruturas, contaria com espaços para preparar todos os
pescadores. E o mais importante: seria um “núcleo de vigilância da costa e de defesa nacional, facilmente
mobilizável, de instrução e de educação cívica, além de um posto de fiscalização da pesca, de defesa da fauna e
da flora aquáticas e dos processos de trabalho em nossas águas”. Objetivava-se dotar o Estado com uma
estrutura de controle territorial que ele nunca antes tivera, tanto no que se refere às riquezas naturais quanto à
produção da atividade pesqueira (VILLAR, 1945, p. 24).
20
[...] na relação entre as leis e a justiça (...) as leis precisam ser formuladas de modo
tão geral que possam ser aplicadas repetidamente; só assim se pode assegurar a
justiça. Todos os casos individuais se distinguem, em sua singularidade, mas, para
que as leis possam ser aplicadas a eles, é necessário que haja um mínimo de
recorrência. Todas as teorias da justiça baseiam-se na duração relativa dos textos
legais e na sua replicabilidade. (KOSELLECK, 2014, p. 22)
Koselleck (2014, p. 33) tem preocupação com a História, seja pela linguística, seja
pela experiência, pois, para ele: “o fato de histórias surgirem primeiramente das experiências
das pessoas envolvidas e atingidas é condição de sua narrativa e, portanto, também é condição
da narratividade de experiências alheias”, o que nos leva a pensar na tese das experiências
vivida e narrada, seja pessoal, seja “alheia” aos pescadores, no que tange às políticas
implantadas. O tipo de análise que busco fazer, para compreender o surgimento dos Terminais
Pesqueiros Públicos, domina a historiografia moderna.
Esse rumo de compreensão dos terminais pesqueiros e, consequentemente, da
atividade pesqueira, nos remete à ideia de Antas Jr. (2005, posição 125), que observa que
“grande parte do pensamento geográfico está fundado na ideia de Estado-Nação e,
21
Portanto, o Brasil, com seus 8.456.510 km² de área, que o posicionam como o quinto
maior país do mundo, e com sua grande extensão litorânea de 7.491 km, que o colocam em
décimo lugar, apresenta um imenso potencial marítimo e ribeirinho subaproveitado, se
analisarmos os volumes de pescado dos países, no ano de 2004, apresentados nas tabelas, que
o colocam na vigésima sexta posição, atrás de muitos países com território e com extensão
litorânea bem menores.
Na solução desse subaproveitamento, surgem as políticas nacionais, no século XX, das
quais Antas Jr. (2005) ressalta a soberania como uma fonte real e indiscutível de poder para
produzir normas. Segundo o autor: “[...] foi a partir do princípio da norma como verdade
absoluta que os sistemas de técnicas jurídicas modernos se consolidaram e passaram a drenar
eficazmente tributos de extensões territoriais contíguas [...]” e, fazendo uma analogia de seus
pensamentos com a atividade pesqueira, “[...] produzindo [...] grandes concentrações de
riqueza, sob a tutela de uma forma pública de poder.” (ANTAS JR., 2005, posição 132).
Na tentativa de Antas Jr. (2005) de facilitar o entendimento da legislação e de seu
poder ou não sobre o espaço geográfico, tem-se:
Antas Jr. (2005) ressalta, ainda, que o contexto do trabalho de pesquisa deve observar
e interligar o objeto aos campos da História, da Geografia e do Direito:
Por mais recente e progressista que se pretenda uma lei, ela já é fruto de
necessidades passadas, e o seu papel é o de promover uma espécie de congelamento
ou, no melhor dos casos, de estabilização das relações sociais no espaço e no tempo.
A geografia não escapa a essa condição mesmo que os geógrafos anseiem o inverso;
o ensino de geografia, expressão mais difundida desse campo de conhecimento, ao
explicar o funcionamento do mundo ou a constituição de um dado território, revela
uma coisa que já não é mais. (ANTAS JR., 2005, posição 526)
Refletindo sobre o fato de que a “norma jurídica” vai ser vista e analisada de forma
diferente, por cada ciência (História, Geografia, Direito, Sociologia, entre outras), deve-se
entender que existe pelo menos uma interligação, que unifica tais normas na ideia de que são
a materialidade condicionadora da vida social, conforme coloca Antas Jr. (2005, posição 540).
Tal lógica permitiu o que aconteceu à pesca, no início do século XX, e permite que o
fenômeno se repita, no início do século XXI:
24
[...] a sociedade busca produzir e ao mesmo tempo controlar seu território. Como ela
sempre se apresenta fragmentada em grupos, classes, castas etc., os graus de
controle se afirmam conforme os recursos e as possibilidades dos grupos ou
indivíduos para efetivamente exercê-lo. Por outro lado, as formas produzidas (bem
como as não produzidas mas igualmente humanizadas) não poupam a dinâmica
social de atritos e condicionamentos, gerando, desse modo, uma forma peculiar de
regulação. (idem, posição 568)
segundo alguns recursos estratégicos, como rios, montanhas, vales, etc.” (ANTAS JR., 2005,
posição 613). Através desse exemplo, podemos observar a norma participando ativamente da
configuração territorial urbana. Tais narrativas explicitam que as instituições e as suas normas
são apenas um dos elementos geradores das configurações territoriais, como se observa nas
políticas públicas de implantação dos Terminais Pesqueiros Públicos.
Nessa linha, ressalta-se o seguinte ponto, que possibilita afirmar que as construções
estabelecidas, não, somente, pela lei que cria os Terminais Pesqueiros Públicos, mas pelas
normas que regulamentam seus usos, revelam a íntima relação entre formas geográficas e
normas:
[...] geram, por meio de alguns mecanismos de controle peculiares a cada uma delas,
o que se denomina usualmente regulação. A regulação pode ser econômica, social
ou política. Frequentemente abarca essas três instâncias, indiferenciadamente.
Assumindo-se como problema de fundo as questões relativas às principais fontes
reguladoras dos territórios nacionais no período contemporâneo e o modo como se
dá essa regulação, justificam-se as diretrizes metodológicas adotadas: partimos das
reflexões de autores geógrafos que se preocuparam exclusiva ou tangencialmente
com essa temática. (ANTAS JR., 2005, posição 620)
grupos sociais que concentram maior poder. (ANTAS JR., 2005, Posição
766)
Antas Jr. (2005) observa que as normas jurídicas, como, no caso que construo, as dos
Terminais Pesqueiros Públicos, são formais e externas aos indivíduos e não exigem uma
adesão interna dos sujeitos, enquanto as normas morais “expressam-se, sobretudo, nos
costumes de uma dada sociedade, na medida em que eles exprimem os valores dos indivíduos
que a compõem” (ANTAS JR., 2005, posição 778). No caso da atividade pesqueira, as
normas morais estão entrelaçadas às normas jurídicas, desde o início do século XX, pelas
quais as Colônias de Pescadores foram implantadas e enraizadas, dentro dos costumes locais.
Mas as normas, segundo Antas Jr. (2005, posição 779), “permeiam cada etapa de realização
de um costume específico (desde um rito, até uma técnica), se fazem cumprir pela convicção
íntima dos indivíduos de que se trata de algo justo e necessário”.
Nesse sentido, Antas Jr. (2005) explica:
7
O tema será apresentado neste trabalho, posteriormente.
27
partir daí, foram implantadas várias ações, pelo Estado, das quais se destaca a imposição de
que o pescador e sua embarcação se tornassem parte da terceira frota nacional da Marinha
brasileira (sendo, a primeira, a Marinha de Guerra, e a segunda, a Marinha Mercante).
Koselleck propõem, em seus estudos, em suma, uma compreensão do processo de formulação
de leis, que posso aplicar na tese, para uma melhor apreensão da atual política de implantação
dos Terminais Pesqueiros Públicos.
Para que uma decisão jurídica justa seja emitida, a exegese da lei trata qualquer caso
específico de tal forma, que os fatos possam ser subsumidos à afirmação da lei. Um caso
jurídico subsumido à lei é formado, linguisticamente, de modo diferente de um caso
investigado pela Psicologia ou pela História Social. A submissão aos termos da lei pré-
formata o caso, de modo a facilitar a aplicação da lei. O texto da lei tem, portanto, uma função
reguladora na interpretação do caso particular. O mesmo caso que termina em um veredicto
de culpa pode, sob outros aspectos – os da Psicologia, da Moral ou da Crítica da Ideologia,
por exemplo ‒, redundar em inocência, contrariando a interpretação jurídica.
Quando, em decorrência de mudanças nas condições políticas e sociais, a interpretação
da lei é alterada, a exegese do texto se modifica, porém com algum atraso (KOSELLECK,
2014, p. 106).
Outro ponto importante para a pesquisa é a abrangência linguística do texto legal. O
entendimento linguístico de um texto legal precisa ser precedido por uma compreensão – de
certa forma, também linguística – da História ou, melhor, da mudança histórica, que se
manifesta, em novas leis ou na reinterpretação radical de textos antigos. Em comparação com
os textos jurídicos, os teólogos e os filólogos estão ainda mais presos ao status de suas fontes.
O mesmo não ocorre com o historiador: basicamente, ele se serve dos textos, apenas, como
testemunhas, para extrair uma realidade que existe além deles. Portanto, mais do que todos os
outros exegetas de textos, ele destaca um fato extratextual, apesar de reconstituí-lo, por meios
linguísticos (KOSELLECK, 2014, p. 107).
Para Koselleck (2014, p. 107), escrever a História de um determinado período, no caso
desta pesquisa, o início do século XX e o início do século XXI, significa fazer afirmações que
nunca poderiam ter sido feitas naquele momento: “Elaborar uma História baseada em suas
condições econômicas significa empreender análises de fatores que não podem ser
diretamente deduzidas das fontes”.
Portanto, Koselleck (2014, p. 154) apresenta que:
28
Outro debate muito interessante para esta tese, que posso relacionar com as políticas
voltadas à construção dos Terminais Pesqueiros Públicos, é o conceito de História do presente
ou História contemporânea ou Nosso tempo, utilizado por Koselleck (2014, p. 229). Este é um
aspecto notável, pois toda a História é uma narrativa com representações, ao longo de uma
sequência temporal, logo não existe História sem vínculo temporal.
Dentro dessas lógicas, as normas são essenciais, pois, por meio delas, são
determinados os usos de parcela do espaço geográfico, no intuito de preservar os elementos
naturais ou sociais. Igualmente, nelas se conferem as condições fundamentais de valor na vida
da comunidade. “Entende-se, assim, o território como fonte material e não formal do direito”
(ANTAS JR., 2005, posição 838). Nesse sentido, podemos observar que “os sistemas
jurídicos são sistemas abertos, na medida em que a dinâmica socioterritorial, com suas
peculiaridades culturais e históricas, afigura-se uma fonte de produção de normas [...].”
(ANTAS JR., 2005, posição 860).
Uma coisa deve ficar bem clara: os Terminais Pesqueiros Públicos, muito além de
constituírem uma política de reestruturação da cadeia produtiva da pesca, são, também, uma
difusão das infraestruturas, que se torna uma centralidade e interliga diferentes regiões. Na
relação com a visão de Antas Jr. (2005), o projeto dos TPPs “difundiu a construção de uma
consciência de território uno, ao mesmo tempo em que promoveu a capacidade de regular e de
gerenciar o uso de toda a extensão espacial pertencente ao Estado-Nação, a partir de um
centro decisório”. Esse ponto me lembra que, diferentemente das políticas de implantação das
Colônias de Pescadores, no início do século XX, que estava atrelada à Marinha do Brasil,
como uma de suas forças, os Terminais Pesqueiros Públicos estão ligados diretamente ao
29
Estado, ainda que sua administração seja baseada na parceria público-privado, que deve se
apoiar, geralmente, em uma ou em várias regiões.
Esses argumentos apresentam uma face da política, que se pode interligar à ideia
debatida no decorrer do trabalho sobre a legislação dos Terminais Pesqueiros Públicos, cuja
relação dialética se dá entre o território normado e o território como norma, isto é, está entre o
direito e o espaço geográfico:
[...] coloca-se em relevo o fato de a lex mercatoria, como uma ordem jurídica a-
nacional, ao regulamentar a relação entre os grupos transnacionais estabelecendo
formas de organização e ação, mais a padronização de técnicas de produção (que
concerne ao direito da produção, igualmente ligado às ações das empresas),
apresenta forte poder de intervenção nas políticas territoriais locais (e nacionais), nas
quais a participação do Estado se mostra cada vez mais frágil e moldável, sendo que
se tratava, outrora, de uma prerrogativa. (ANTAS JR., 2005, posição 2363)
O Estado apresenta uma ossatura material própria que não pode de maneira alguma
ser reduzida à simples dominação política. O aparelho de Estado, essa coisa de
especial e por consequência temível, não se esgota no poder do Estado. Mas a
dominação política está ela própria inscrita na materialidade institucional do Estado.
Se o Estado não é integralmente produzido pelas classes dominantes, não o é
também por elas monopolizado: o poder do Estado (o da burguesia no caso do
Estado capitalista) está inscrito nesta materialidade. Nem todas ações do Estado se
reduzem à dominação política, mas nem por isso são constitutivamente menos
marcadas. (POULANTZAS, 2000, p. 12)
Para empreender um debate mais amplo entre Estado e poder, Poulantzas (2000, p. 13)
coloca que devemos procurar o fundamento da ossatura material do Estado (suas estruturas)
nas relações de produção e na divisão social do trabalho. Como ponto crucial da pesquisa, as
Colônias de Pescadores foram desenvolvidas e implantadas como uma parte da estrutura do
Estado, e a reestruturação da atividade pesqueira, pela adoção dos Terminais Pesqueiros
Públicos, molda a pesca nacional, novamente, fazendo-a parte da ossatura do Estado.
Ainda na construção de um raciocínio sobre as políticas dos TPPs, podemos construir
um analogia com a conjectura de Poulantzas (2000, p. 15) sobre a ossatura do Estado, em que
o autor apresenta a concepção de uma “teoria geral da economia, enquanto objeto
epistemologicamente isolável, teoria do funcionamento trans-histórico do espaço econômico”,
33
[...] deve possuir limites inalteráveis que lhe seriam atribuídos por exclusão, fora dos
limites intemporais da economia. As fronteiras intrínsecas do objeto-economia,
realidade auto reproduzível do interior por força de suas leis internas, tende às
fronteiras intrínsecas do exterior, isto é, do estado, espaço imutável, pois que
envolve o próprio espaço imutável da economia. (POULANTZAS, 2000, p. 15)
[...] o Estado capitalista, a separação relativa das relações criadas pelas relações de
produção constitui o fundamento organizacional de sua ossatura orgânica e revela
sua ligação com as classes sociais e a luta de classes sob o capitalismo.
(POULANTZAS, 2000, p. 25)
Muitas das ações do Estado que ultrapassam seu papel repressivo e ideológico, suas
intervenções econômicas e sobretudo os compromissos materiais impostos pelas
classes dominadas às classes dominantes, uma das razões do consentimento, vêm
inscrever-se no corpo da lei, fazendo parte da sua estrutura interna. A lei apenas
engana ou encobre, reprime, obriga a fazer ou proibindo. Também organiza e
sanciona direitos reais das classes dominadas (claro que investidos na ideologia
dominante e que estão longe de corresponder em sua aplicação à sua forma jurídica)
e comporta os compromissos materiais impostos pelas lutas populares às classes
dominantes. (POULANTZAS, 2000, p. 82)
8
Mónada, ou mônada, é um conceito-chave na filosofia de Leibniz. No sistema filosófico deste autor, significa
substância simples ‒ do grego μονάς, μόνος ‒, que se traduz por "único", "simples". Como tal, faz parte dos
compostos, sendo ela própria sem partes e, portanto, indissolúvel e indestrutível.
35
preocupações desta tese é tentar identificar as relações de poder, que possibilitaram a criação
da legislação e a implantação das políticas voltadas à atividade pesqueira, principalmente,
aquelas ligadas à implantação dos Terminais Pesqueiros Públicos e suas influências
internacionais, a partir dos acordos e das convenções construídos.
A respeito do poder político, Raffestin escreve:
Admitimos que há poder político desde o momento em que uma organização luta
contra a entropia que a ameaça de desordem. Esta definição nos faz descobrir que o
poder político é congruente a toda forma de organização. Ora, a geografia política,
no sentido estrito do termo, deveria levar em consideração as organizações que se
desenvolvem num quadro espaço-temporal que contribuem para organizar ou... para
desorganizar. (RAFFESTIN, 1993, p. 18)
Raffestin (1993, p. 19) lembra que, por muito tempo, esse poder político ou, melhor, o
estudo dele, pela geopolítica, estava vinculado diretamente ao estudo de uma Geografia
aplicada ao Estado, herança de um período de estudo de estados totalitários. Mas ele mostra
que, de modo genérico, ainda que com algumas exceções, a Geografia Política do século XX
foi uma Geografia do Estado. Uma contribuição, para mudar esse panorama, foram os estudos
da Geografia do Estado “construída a partir de uma linguagem, de um sistema de sinais, de
um código que precede do Estado” (RAFFESTIN, 1993, p. 22).
Para explicar a Geografia do Estado, Raffestin (1993) observa:
Para não cair na análise micrológica, consideramos os grupos primários, tal como o
Estado, e os grupos secundários, que podem ser organizações de tipos bem diversos.
Mas o Estado é uma organização como qualquer outra; simplesmente está investido
de um peso enorme. Etzioni o mostrou bem: nossa sociedade é uma sociedade de
organização. Nascemos em organizações, fomos educados por organizações e a
grande maioria de nós consagra uma grande parte de sua existência a trabalhar para
organizações. E, se é verdade que a maior das organizações é o Estado ele não é a
única: As organizações canalizam, bloqueiam, controlam, ou seja, domesticam as
forças sociais. Essa observação é muito significativa, pois exprime de uma só vez o
jogo das organizações no espaço e no tempo. [...] Domesticar é, portanto, encerrar
numa rede, numa malha em que todas as partes estão debaixo do olhar. Mas por
quê? Porque toda organização é ameaçada, seja de dissolução interna, seja de
regressão por causa da concorrência das outras organizações. O Estado só recorta o
espaço em malhas mais ou menos cerradas por uma única razão: deve encontrar a
“malha” mais adequada para, levando em consideração os meus meios, “ver” o
melhor possível. (RAFFESTIN, 1993, p. 39)
Raffestin (1993, p. 53) relaciona alguns pontos, que podem ajudar a identificar e a
compreender a natureza do poder nesta tese e, subsequentemente, a natureza das políticas
voltadas ao setor da pesca: “o poder não se adquire; é exercido, a partir de inumeráveis
pontos”. Nesse sentido, temos que entender que “as relações de poder não estão em posição
de exterioridade, no que diz respeito a outros tipos de relações (econômicas, sociais, etc.), mas
são imanentes a elas” (idem); que a origem “do poder vem de baixo, não há uma oposição
binária e global entre dominador e dominados” (idem); que “as relações de poder são,
concomitantemente, intencionais e não subjetivas” (idem); e, por fim, que “onde há poder há
resistência e, no entanto, ou por isso mesmo, esta jamais está em posição de exterioridade, em
relação ao poder” (idem).
Apesar das inserções do teórico facilitarem o entendimento da natureza do poder,
temos que ter claro que o enquadramento conceitual de poder é extremamente difícil, pois ele
“brota de estruturas profundas e, não, de estruturas de superfície”. Por isso, não se pode,
simplesmente, analisar os Terminais Pesqueiros Públicos, sem compreender todo o processo
político que os antecedeu.
Com essa problemática, ligada à identificação e à conceituação do poder, acaba se
tornando “inútil distinguir um poder político, econômico, cultural, etc., sendo toda relação um
lugar de poder”, pois o poder está “ligado intimamente à manipulação dos fluxos, que
atravessam e que desligam a relação, a saber: a energia e a informação”. Raffestin (1993, p.
54) vai além, afirmando que o “espaço-tempo relacional é organizado pela combinação de
38
energia e de informação” e que o laço entre “o poder e o saber é evidente, mas não há nem
informação pura nem energia pura”, ressaltando, ainda, que, para termos uma informação,
seja oral, seja escrita, seja de qualquer outra natureza, precisamos de uma quantidade de
energia, para que a comunicação tenha lugar.
Na busca por analisar e por compreender o poder, faz-se necessário notar alguns
aspectos:
A organização não só manipula a vida, mas também a morte, para assegurar o seu
domínio sobre a população. Aliás, no século XX o poder descobriu que, para atingir
os seus objetivos, algumas vezes era necessária a eliminação física em grande
escala. A revolução Industrial matou gerações inteiras para chegar às suas
finalidades. Não falamos de genocídio, sem dúvida, mas aqui se trata da morte lenta
9
Apropriar-se do trabalho significa destrui-lo ou, mais exatamente, submetê-lo a uma dicotomia e separar a
energia da informação: apropriar-se de uma e/ou de outra. No fundo, é impedir o homem de dispor de uma e de
outra, ao mesmo tempo, o que, consequentemente, significa privá-lo de sua capacidade primitiva de
transformação. As organizações, ao separarem a energia da informação, no nível do trabalho, realizaram a
primeira fissura social. Desde então, a energia liberada pode ser combinada com outra informação, resultado de
uma acumulação anterior, e com outras energias. Isso significa que o trabalho deixou de ser uma entidade com
suas duas faces, pois as duas faces foram “deslocadas”, “destacadas” (RAFFESTIN, 1993, p. 57).
39
É natural que a integração das diferentes áreas dialetais pela promoção de uma
língua única faça crescer as possibilidades de controle e de gestão de uma
organização central sobre as coletividades periféricas. A partir daí é possível
visualizar a criação de transmissores centrais de informação e controlar a informação
que circula. Tudo saber, tudo ver, eis aí o objetivo de qualquer organização. A
língua única pode ajudar nisso. É, em todo o caso, uma das condições para aí chegar.
Além de que, se a distribuição e a coleta de informação são centralizadas, há
economia de meios, portanto de energia, mas no mesmo tempo há a marginalização
ou a eliminação da informação que não passa pelos canais autorizados. O poder da
organização cresce à medida que há a marginalização ou a eliminação da informação
que não passa pelos canais autorizados. O poder da organização da informação que
não cresce à medida que há diminuição dos modelos culturais à disposição, mas, ao
mesmo tempo, decresce o poder das coletividades cujos modelos desaparecem.
Existe uma relação de tensão constante entre a organização periféricas, que tentam
emitir mensagens específicas. (RAFFESTIN, 1993, p. 110)
Com Koselleck (2014), discuti as questões de tempo e de espaço. O espaço era tratado
como uma totalidade e seu interesse era debater a questão do “espaço histórico”. Com
Raffestin, entro na questão geográfica do espaço, cuja lógica é, igualmente, a da totalidade.
10
É metafórico definir a linguagem como um instrumento, porque ela tem muito mais utilizações do que, em
geral, tem um instrumento. Assim como se fala em instrumento, fala-se também de função. Função de
comunicação, de organização do real e de transmissão. Na qualidade de instrumento, a língua pertence à
cultura (aqui, em seu sentido antropológico) e pode ser definida como “o conjunto de toda a informação não
hereditária e dos meios para sua organização e sua conservação”. (RAFFESTIN, 1993, p. 97)
40
Como estamos tratando de poder, o ponto, agora, é o território, visto como uma forma, a partir
do espaço, que resulta de uma ação conduzida por um ator sintagmático 11, em qualquer nível.
“É um espaço, em que se projetou um trabalho, seja energia, seja informação, e que, por
consequência, revela relações marcadas pelo poder. O espaço é a ‘prisão original’ e o
território é a prisão que os homens constroem para si” (RAFFESTIN, 1993, p. 143).
[...] a tecnicidade nos introduz diretamente na esfera do poder, e tanto mais quando
ela exprime relações de poder não somente com a matéria, mas também com os
11
Diz-se da relação entre unidades da língua, que se encontram contíguas na cadeia da fala e que não podem se
substituir, mutuamente, pois têm funções diferentes (p. ex., em céu azul e em eles chegaram ocorre a relação
entre céu e azul e entre eles e chegaram).
41
homens para os quais essas matérias é um trunfo. A produção dos recursos supõe,
pois, uma dominação mínima de uma porção do quadro espaço-temporal dentro do
qual, e para o qual, a tecnicidade interage com a territorialidade. A relação com a
matéria é portanto, ipso facto, uma relação com o espaço e com o tempo.
(RAFFESTIN, 1993, p. 227)
para Becker (2010), a gestão territorial “pode articular e instrumentalizar múltiplas decisões
coerentemente, no espaço-tempo”. Tal proposta pode ser aplicada nesta tese e se coloca no
cerne dos TPPs, cuja justificativa de implantação é a nova gestão produtiva, resultando em
uma prática estratégica, principalmente, na questão alimentar, com a adoção de melhorias
científico-tecnológicas às ações dos pescadores, em seu cotidiano.
Outro ponto são as articulações das escalas, que permitem relações de poder, como
“princípio organizador da análise geopolítica, as escalas geográficas, entendidas como arenas
políticas dinâmicas e articuladas, permitem quebrar compartimentações fossilizadas do
espaço” (BECKER, 2010, p. 21).
Para Becker (2010, p. 22), outro ponto importante, que se pode ressaltar na tese,
encerra os debates, ligados à implantação dos TPPs: “o planejamento, para ser bem-sucedido,
deve focalizar problemas bem definidos e delimitados. As novas territorialidades têm, assim,
que ser reconhecidas como um componente a ser fortalecido, para o desenvolvimento regional
sustentável”, descontruindo as antigas territorialidades.
Como os TPPs são políticas públicas construídas pelo Estado, em uma possível
relação de poder vertical com provável unilateralidade, demostrando uma imaginável questão
de poder, baseada na construção legislativa, mesmo respeitando todos os trâmites de Direito.
Para melhor compreender esse ponto da tese, busco em Weber o sentido dos conceitos de
“poder” e de “Estado”, pretendendo vislumbrar uma possibilidade de debate, a partir do
próximo subitem.
12
Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva, de Max Weber, edição em português de
2009.
43
seja de indivíduos, seja de recursos pesqueiros. Quem ressalta bem este aspecto é Santos13,
com sua teoria dos circuitos da economia, colocando uma luz sobre a problemática da pesca.
Mas o que são dominação e disciplina, em Weber, e como estes conceitos impactam a
atividade pesqueira brasileira?
Para Weber (2009, p. 34), a dominação está sempre ligada à presença efetiva de
alguém mandando em outro(s) alguém(ns), mas, não, necessariamente, à existência de um
quadro administrativo. É claro que, para ele, a associação política não necessita
primeiramente de uma coação física, como único meio, mas tal pode se tornar uma
possibilidade.
Nem toda dominação se serve de meios econômicos. E ainda muito menos tem fins
econômicos. Mas toda dominação de um a pluralidade de pessoas requer
normalmente (não invariavelmente) um quadro de pessoas, isto é, a probabilidade
(normalmente) confiável de que haja uma ação dirigida especialmente à execução de
disposições gerais e ordens concretas, por parte de pessoas identificáveis com cuja
obediência se pode contar. Esse quadro administrativo pode estar vinculado à
obediência ao senhor (ou aos senhores) por costume ou de modo puramente afetivo,
ou por interesses materiais ou por motivos ideais (racionais referentes a valores). A
natureza desses motivos determina em amplo grau o tipo de dominação. [...]
Conforme ensina a experiência, nenhuma dominação contenta-se voluntariamente
com motivos puramente materiais ou afetivos ou racionais referentes a valores,
como possibilidades de sua persistência. (WEBER 2009, p. 139)
13
O espaço dividido, de Milton Santos, em edição de 2004.
44
14
Azambuja (2006, p. 47).
45
Há que se ter em mente que os circuitos, principalmente, o inferior, são uma questão
muito mais ampla do que uma simples análise de mercado. Portanto, a política dos TPPs não
pode estar vinculada, somente, à estocagem e à comercialização de pescado.
A questão não se reduz ao simples estudo dos mercados, mas deve fazer-se em
termos de sistema ou, antes, como um subsistema dentro do comércio em geral.
Pode-se ir mais longe ainda estudando o fenômeno do mercado no seu contexto,
como um subsistema do sistema geral de relações espaciais, do qual a cidade é um
dos centros ou um dos elementos. Por outro lado, o comércio é apenas um dos
elementos desse subsistema. O circuito inferior compreende as atividades de
fabricação tradicional, como o artesanato, assim como os transportes tradicionais e a
prestação de serviços. (SANTOS, 2004, p. 22)
Para Santos (2004, p. 35), o período atual é diferente dos anteriores, na questão da
modernização, por sua capacidade de inventar e de reinventar, pela existência de uma
aceleração da informação e pela ampliação do consumo de bens e de serviços, em países
subdesenvolvidos.
No caso do circuito inferior, apresentado por Santos (2004) nos países
subdesenvolvidos, torna-se difícil chamá-lo de tradicional, pois ele não é, somente, um
produto da modernização; ele está em constantes processos de transformação e de adaptação.
Além disso, o circuito inferior possui uma dependência, em relação ao circuito superior
(SANTOS, 2004, p. 39). Portanto, fazendo uma relação com o ocorrido na pesca artesanal,
observa-se que existe uma tradição nas formas de navegação, na preparação dos apetrechos
para pescaria, na relação de trabalho entre os pescadores, entre outros aspectos, mas não é
possível dizer que a pesca artesanal inscrita no circuito inferior é tradicional.
Para Santos (2004, p. 43), as diferenças fundamentais entre as atividades dos dois
circuitos residem na tecnologia e na organização empregadas em cada um. O circuito superior
é caracterizado por apresentar uma tecnologia importada e de alto nível, com “capital
intensivo”, enquanto o circuito inferior utiliza baixa tecnologia e é marcado por um “trabalho
intensivo”, sendo repetidamente local ou localmente adaptado ou recriado. Logo, para Santos,
o primeiro é imitativo, enquanto o segundo tem um potencial de criação considerável, o que
pode ser observado, dentro da atividade pesqueira artesanal, no circuito inferior.
Outro ponto destoante, entre os circuitos apresentados por Santos (2004, p. 46), é o do
lucro. No circuito superior, trata-se de “acumular capitais indispensáveis à continuidade da
atividade e à sua renovação, em função dos progressos técnicos”, como visto nesta pesquisa,
47
Os pobres, na visão de nosso estudo, são aqueles que não tem acesso, de modo
regular, aos bens de consumo corrente considerados com o mínimo indispensável
numa certa sociedade. Muito raramente tem acesso ao crédito institucional e
representam o essencial da clientela dos pequenos estabelecimentos comerciais ou
artesanais, que oferecem crédito pessoal a taxa usurárias. Trata-se, em geral, dos
não-empregados e dos subempregados, mas também dos assalariados que recebem
muito pouco. (SANTOS, 2004, p. 50)
Mas por que os países subdesenvolvidos têm boa parcela de sua população nas
atividades ligada diretamente ou indiretamente ao circuito inferior? Santos tenta explicar tal
aspecto, a partir da questão da industrialização. Sabemos que existem diversos fatores, mas,
para este estudo, a explicação que segue é suficiente:
Outro ponto tratado por Santos, que, para a tese, é intrinsicamente vinculado à
atividade pesqueira artesanal, é o limite de crescimento:
Santos (2004, p. 368) ainda esclarece que o circuito inferior tem uma importância
fundamental na sobrevivência dos mais pobres, pois é ele que acolhe as pessoas expulsas do
campo, tendo um papel amortizador dos choques das migrações, dado que o circuito superior
é incapaz de empregar todo mundo.
Acrescentamos, neste debate teórico, a importância de pensar a gestão costeira, a
logística marítima e a distribuição nacional e internacional do pescado. O Terminal Pesqueiro
50
15
Segundo o Decreto-Lei nº 5231, de 2004, articulado entre as três escalas de poder: federal, estadual e
municipal, o que ainda será tratado, neste texto.
16
Ainda hoje, é importante, para se tentar compreender melhor o espaço, porque ela continua servindo à
expansão territorial (RATZEL, 1990, p. 180), pois exige a conquista de novas terras.
52
Estado, bem como aprofundam a visão crítica acerca do poder, advertindo que a lei não se
presta apenas para comandar, senão, ainda, para redefinir, para capacitar, para construir, para
dividir, para encerrar e para ofuscar no espaço.
Lefebvre (apud BLOMLEY, 1994) argumenta que:
17
O original está em inglês. “Space is not a scientific object removed from ideology or politics; it has always
been political and strategic. If space has an air of neutrality and indifference with regard to its contents and
thus seems to be "purely" formal, the epitome of rational abstraction, it is precisely because it has already been
occupied and used, and has already been the focus of past processes.... Space has been shaped and moulded
from historical and natural elements, but this has been a political process. Space is political and ideological. It
is a product literally filled with ideologies”.
53
pessoa, ela deve ser vista como resultante de uma venda”, com destaque para a “peculiaridade
[...] surpreendente do sistema repousa no fato de que, uma vez estabelecido, tem que se lhe
permitir funcionar, sem qualquer interferência externa”.
Essa nova produção “envolve uma transformação que é a da substância natural e
humana da sociedade em mercadorias”. Nesse sentido, lembra Polanyi (2000, p. 61):
“Obviamente, a desarticulação causada por tais engenhos deve desorganizar as relações
humanas e ameaçar o seu habitat de aniquilamento”. Portanto, transpondo essa teoria para o
contexto dos pescadores, com a implantação dos Terminais Pesqueiros Públicos em
municípios de grande relevância na produção nacional de pescado, estes trabalhadores passam
a deixar de lado a relação com suas instituições representativas e a ser absorvidos pelo
mercado, como meros fornecedores de matéria-prima, prejudicando sua relação cultural, já
tão fragilizada, pelos impactos da modernização, tanto em sua forma de trabalho quanto no
meio ambiente.
Modernização, essa, na qual, como Santos (2004) explicava “cada período é
caracterizado pela existência de um conjunto coerente de elementos de ordem econômica,
social, política e moral, que constituem um verdadeiro sistema”. Portanto, a modernização é a
universalização da inovação de um período anterior, isto é, “[em] cada modernização, o
sistema tende a desdobrar sua nova energia para os subsistemas subordinados. Isso representa
uma pressão para que, nos sistemas atingidos, haja também modernização” (SANTOS, 2004,
p. 395, inserção nossa). Tal é o caso da atividade pesqueira, afetada pelo impacto dos novos
terminais pesqueiros.
A pesca pertence, em grande parte, ao circuito inferior, com características de trabalho
intensivo e de cunho local, mas com uma capacidade de criação considerável, de acordo com
o que Santos (2004) descreveu, em seus estudos sobre os circuitos, mas os dois circuitos estão
presentes na atividade pesqueira: o superior, com todos os avanços tecnológicos de alto nível,
denominado pesca industrial, que está interligado a um capital intensivo e a uma dimensão
nacional ou supranacional.
O Estado tem um papel importante nesta questão, pois “se apresenta como um aliado
do circuito moderno da economia” (SANTOS, 2004), através da proteção concedida à
concentração e aos monopólios, do financiamento direto ou indireto, da construção de
infraestruturas, dos subsídios à produção e à exportação e de todas as formas de acordo, de
leis de investimentos e de planos de desenvolvimento, entre outros.
Um Terminal Pesqueiro Público, em seu cerne, em analogia ao entendimento de
Santos (2004) sobre o circuito inferior, tem “o papel de intermediário [...] ele é inicialmente
55
18
Pesca Comercial Artesanal: é aquela praticada por pescador profissional, de forma autônoma ou em regime de
economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria, desembarcado ou
podendo utilizar embarcações com Arqueação Bruta 1 (AB1) menor ou igual a 20; Pesca Comercial Industrial:
é a praticada por pessoa física ou jurídica, com o envolvimento de pescadores profissionais empregados ou em
regime de parceria, utilizando embarcações de pequeno, médio ou grande porte (de qualquer AB), com
finalidade comercial (MPF, 2017).
19
Armador de Pesca: aquele que, em seu nome e sob a sua responsabilidade, apresta, para sua utilização, uma ou
mais embarcações pesqueiras, cuja soma de suas Toneladas de Arqueação Bruta totalize ou ultrapasse a 10
(dez) Toneladas de Arqueação Bruta (BRASIL, 1989)
56
envolvidas, mesmo sabendo que o pescador é um extrativista e que não possui recursos para
armazenar seu pescado por muito tempo e que tem que estar, sempre, retomando sua atividade
de pesca, para manter o seu sustento. A existência de um local com compra constante e
garantida (os TPPs) gera uma grande dúvida, quanto ao estabelecimento de uma grande
resistência, por muito tempo, ao novo mercado, o que trará, como consequência hipotética, a
extinção de boa parte dos pontos tradicionais de venda direta de pescado e da cultura neles
existente.
A problemática da relação entre pesca e Estado contribuiu para a reflexão, tanto na
História quanto na Geográfica, acerca da relação entre ordenamento territorial, gestão pública
e modernização econômica e relações internacionais. Os desafios dos campos econômicos e
políticos são compreender o tempo presente, com a problemática aproximação temporal do
objeto de estudos, e entender como se dão os processos de dominação e de produção da ordem
capitalista nos territórios nacional e internacional, marcados por uma história política de forte
ação estatal na produção da economia e do mercado. Mais uma vez, por meio de estudo do
setor de portos pesqueiros e da política federal para o setor pesqueiro, pode-se trazer novos
elementos ao fazer geográfico do século XXI, em que política e poder são gestados por
projetos de colonização do futuro, dentro da articulação Estado-empresas.
Penso na compreensão teórica dos processos de modernização do território nacional,
na presente fase de desenvolvimento do capitalismo no Brasil, com suas novas relações
internacionais, mostrando a inserção do país na globalização e como este modelo altera a
história dos lugares. Tais orientações conceitual, teórica e metodológica têm, por finalidade,
igualmente, avaliar de que forma o estudo dos Terminais Pesqueiros Públicos, e das suas
consequências, na realidade dos pescadores brasileiros, contribuirá ao avanço dos estudos
históricos.
Na tentativa de dispor sobre a implantação dos TPPs, busco, no próximo subcapítulo,
analisar os períodos históricos de 1890-1919 e de 2003-2015: o primeiro, da estruturação das
Colônias de Pesca, com a intervenção do Estado no território, através da instalação de fixos; e
o segundo, da implantação dos Terminais Pesqueiros Públicos, com a normatização do espaço
e com a possível reestruturação da cadeia produtiva e do mercado.
57
Esta tese faz parte de uma trajetória de pesquisa que foi, e continua sendo, dirigida à
compreensão da relação entre o território e o Estado, tendo a pesca como ponto de interseção,
especificamente, nos períodos históricos de 1890-1923 e de 2003-2015, quando o setor foi
institucionalizado e, posteriormente, reestruturado. Neste sentido, posso afirmar que a
institucionalização da pesca teve, como primeiro marco histórico, o período de 1890-1923,
momento no qual a atividade não ocupava um papel central na economia, mas, sim, era vista
como atividade que organizava o domínio, o controle, sobre o território. Portanto, o diálogo
da Geografia Política com a História se pautava na compreensão da soberania do Estado, por
meio do território.
O marco central das políticas dos Terminais Pesqueiros Públicos está vinculado a
processos de estruturação e de modernização, que têm, como desiderato, a construção do
zoneamento costeiro como ponto internacional da territorialização da Marinha do Brasil e, ao
mesmo tempo, a busca pela industrialização do circuito produtivo da pesca, com a adoção de
inovações tecnológicas na captura (embarcação e petrechos) e na comercialização em grande
escala. A justificativa do marco temporal se dá pelas conjunturas nacional e internacional de
controle das Zonas Econômicas Exclusivas costeiras (ZEEs), nesse período, e pelos acordos
firmados entre o Brasil e as organizações internacionais, com destaque para a Convenção das
Nações Unidas sobre o Direito do Mar20.
Para esclarecer sobre as reais estruturas atuais da pesca brasileira, é preciso
compreender o processo da institucionalização, ocorrido no início do século XX, pensado e
organizado pelo Estado, e o seu fortalecimento, através da instalação dos fixos (as Colônias
de Pescadores), vinculados à Marinha do Brasil.
Em 1923, último ano da missão do Cruzador José Bonifácio 21, destinada a reconhecer
a costa brasileira e a regulamentar a atividade de pesca, por meio das Colônias de Pescadores,
ocorreram as primeiras mudanças marcantes. A 25 de outubro, o Decreto nº 16.183 transferiu
20
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar será mais bem explicada, no decorrer do trabalho.
21
Foi uma missão concebida pelo Almirante Gomes Pereira, que durou de 1919 a 1923, sob o seu comando,
executada pela Marinha de Guerra do Brasil, com a participação de cerca de duzentas pessoas no Cruzador
Auxiliar José Bonifácio, tendo o objetivo cívico de conhecer social e ambientalmente a costa brasileira. Ao dar
à embarcação o nome do “Patriarca da Independência”, o Estado assinalou o quanto esse trabalho de
nacionalizar a pesca do país se filiava, historicamente, ao remoto alvorecer do Brasil e ao patriotismo e ao
nacionalismo, que a missão deveria infundir nas comunidades visitadas.
58
Abrangia-se, não, só, todo o litoral e as suas reentrâncias, como, ainda, os rios e as
águas continentais. Mas as incumbências da Diretoria da Pesca iam muito além de resguardar
os limites territoriais:
tendo por fim unil-os por laços de salidariedade fraternal, promovendo instrucção,
auxilio mutuo e prosperidade dos associados e suas familias. visando
particularmente a sua utilização como auxiliares da Marinha, na paz e na guerra.
§ 2º Haverá duas especies de confederações: estaduaes e geral.
§ 3º Por confederação estadual comprehende-se o agrupamento de delegados das
colonias de um Estado, com o fim de tratar de questões de seus interesses e
represental-as perante os poderes publicos e privados, em juizos ou fóra delles.
§ 4º Por confederação geral comprehende-se o agrupamento de delegados das
confederações estaduaes e delegados das colonias do Estado doRio e do Districto
Federal. Terá a sua séde na Capital Federal, cabendo-lhe a administração da Caixa
do Soccorros da Pesca. (BRASIL, 1923a)
[...]
g) suggerir a nomeação do pessoal para o serviço sob a direcção da Directoria da
Pesca;
j) receber, fazer archivar e extractar dos relatorios e demais documentos que forem
enviados pelas Capitanias dos Portos e repartições dellas dependentes, pelas
Confederações Geral e Estaduaes, Colonaias de Pescadores etc., as estatisticas e
informações sobre a pesca e industrias correlatas, não só no que diz respeito á
piscicultura, industrias, pessoal e material empregado na pesca, como na adaptação
de dados logisticos que interessem ao Estado Maior da Armada
[...] (BRASIL, 1923a)
criou para a pesca. A primeira divisão era a marítima, que assentava os limites da atividade
em águas internacionais, de modo que se beneficiasse a pesca brasileira e que se garantisse a
defesa nacional, controlando melhor os que circulavam, quase diariamente, por águas
próximas às das fronteiras marítimas do país. A outra divisão era a da pesca fluvial, que, além
de autorizada em todo o país, tinha, no período da Primeira República, um imenso potencial
econômico pouco explorado, em boa parte do território, além de um potencial estratégico para
a segurança do Brasil, nos pontos mais críticos das suas fronteiras, servindo, os dias de pesca
nos rios e no mar, para, de certo modo, vigiá-las.
O segundo capítulo do decreto estipula a quem pertence explorar a atividade pesqueira
nacional, direito garantido, no Artigo 8º, a todos os brasileiros maiores de 16 anos:
Além de garantir a atividade pesqueira aos brasileiros, ressalta como essa atividade
deveria ser controlada e normatizada, pelo Estado, para cujo exercício todos os pescadores
profissionais deveriam ser registrados, junto com suas embarcações, em suas Colônias de
Pesca e, posteriormente, nas Diretorias de Pesca, de forma gratuita. Para tanto, estabeleceram-
se regras para o registro, que deveria ser controlado e fiscalizado pela Capitania dos Portos
local, como descrito no capítulo terceiro do decreto:
Art. 12. Nas capitanias dos portos e estações dellas dependentes haverá livros
especiaes para os matriculados pescadores de profissão e registro c arrolamento de
suas embarcações, segundo o modelo adoptado.
Art. 13. A matricula pessoal será tirada nas capitanias de portos ou onde for
determinado pela Inspectoria de Portos e Costas, e deverá conter : nome do
matriculado, filiação, nacionalidade, naturalidade, idade, côr, rôsto, nariz, cabellos,
olhos, barba, estatura, estado civil, residencia e signaes caracteristicos.
62
Não havendo muitas mudanças para o registro do pescador, o maior destaque fica para
a figura do capataz, o qual, como membro da Colônia de Pescadores e representante militar
das áreas mais distantes, tinha a incumbência de identificar as demandas das comunidades
pesqueiras na localidade e de resolver os problemas, junto à Capitania dos Portos. De acordo
com o Decreto nº 16.184, não era possível a inserção de estrangeiros na atividade pesqueira,
mesmo que temporariamente, sendo, a única alternativa, sua naturalização. Outro ponto
apresentado é o de que, necessárias para os pescadores obterem licença de exercer a sua
atividade, as matrículas deles e de suas embarcações tornaram-se intransferíveis. Em
consonância com isto, o capítulo quatro do decreto outorga direitos aos pescadores e lhes
impõe deveres, para com a nação, relacionados à matrícula, junto ao Ministério da Marinha.
Art. 17. Todo pescador, de profissão ou amador, no exercicio da pesca deverá estar
munido de sua matricula ou licença.
Art. 18. Os pescadores de profissão estão isentos do serviço militar no Exercito e nas
milicias estaduaes.
Art. 19. Os pescadores que pelas leis da Republica forem sorteados para o serviço
militar só serviço na Marinha de Guerra, na fórma dos regulamentos em vigor.
Art. 20. Os pescadores matriculados, que tenham i serviço na Armada, terão
preferencia para exercer cargos nas capitanias dos portos, Directoria da Pesca e suas
dependencias, já creadas ou por crear, desde que tenham a idoneidade precisa para o
desempenho das respectivas funcções.
Art. 21. Os pescadores, como reservistas da Armada que são, farão parte do pessoal
naval das estações em cujas proximidades tiverem domicilio e onde tiverem
paradouro as embarcações que empregam na pesca. Estão directamente
subordinados aos capitães dos portos e aos seus delegados, agentes, capatazes e sub-
capatazes da secção em que funccionarem.
Art. 22. Por intermedio da Directoria da Pesca os pescadores levarão aos poderes
competentes as suas queixas contra as vexações que qualquer autoridade lhes tenha
feito em detrimento de seus direito, garantidos no presente regulamento.
Paragrapho unico. O offendido poderá recorrer directamente an inspector de Portos e
Costas, com recurso para o ministro da Marinha.
63
Art. 23. Todos os pescadores são obrigados a deixar que as autoridades navaes
insppeccionem as embarcações em que estiverem pescando ou em que transportarem
o producto da pesca, bem como seus depositos e estabelecimentos de pesca.
Paragrapho unico. O producto da pesca só poderá ser vendido si estiver obedecendo
ás prescripções da Inspectoria de Portos e Costas, tornadas publicas pela Directoria
da Pesca.
Art. 24. Os pescadores que tiverem conhecimento de, infracções á policia da pesca o
de qualquer procedimento é conservação das especies de seres marinhos, os levarão
immediatamente ao conhecimento da autoridade naval competente mais proxima.
Art. 25. Os pescadores que reconhecerem sobre as praias ou costas destroços ou
salvados de embarcações perdidos ou naufragadas deverão recolhel-os e entregal-os
aos capatazes, que lhes darão o destino legal.
Art. 26. Os pescadores de cada estação maritima ou fluvial deverão associar-se em
colonias e nomear dentre elles um para os representar junto ás autoridades
competentes.
Art. 27. Quando se fizer necessario tomar medidas de protecção ou outras para
conservação ou policia da pesca, os pescadores, collectivamente ou por seus
representantes, fundamentando a representação, as solicitarão da Directoria da
Pesca.
(BRASIL, 1923b)
Tal qual nos decretos anteriores, neste, um dos deveres do pescador é salvaguardar os
limites do país, atuando como parte da frota militar nacional, mesmo que de forma indireta,
como no Decreto nº 9.672, de 17 de julho de 1912, que passava o controle da atividade
pesqueira ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, mas conservava nas mãos da
Marinha a legalização das embarcações e o controle da frota privada nacional. A imposição,
pelo Decreto nº 16.184, de que tanto o pescador amador quanto o profissional obtivessem
licença para a sua atividade demostra a importância das embarcações para a segurança
nacional.
Parecendo contraditórios com a liberação do pescador do serviço militar, apresentada
no Artigo 18, os demais artigos do capítulo quatro fazem com que todos os pescadores
devidamente matriculados pertençam à frota militar de reserva, e lhes incumbe a constante
vigilância do litoral brasileiro, obrigando-os a informar qualquer anomalia ao capataz da sua
colônia ou à Capitania dos Portos. A este respeito, o capítulo cinco estabelece algumas regras
para as embarcações:
a pesca, registraram quais eram as formas mais agressivas da atividade, que poderiam levar à
extinção de espécies de grande importância para o Brasil.
caso, dando destaque aos moluscos, às algas e às plantas marinhas, aos crustáceos, às
tartarugas e às técnicas mais rentáveis de pesca à baleia.
Ao elaborar o decreto que estabelecia estas relações na prática da atividade pesqueira,
o governo procurou, com os artigos de 125 a 135, salvaguardar a pesca e os pescadores,
vinculando direitos e deveres aos pescadores:
Art. 125. Aos brasileiros que, sós ou associados em fórma de colonia de pescadores,
ou de outra qualquer, quizerem explorar a pesca ou industrias della resultantes, no
littoral, nos rios e lagôas do dominio federal, o Governo poderá conceder os
seguintes favores:
I - Concessão de marinhas e terrenos publicos nas costas de terra firme e nas ilhas,
de accôrdo com o decreto nº 14.594, de 31 dezembro de 1920, para a fundação de
estabelecimentos industriaes de pesca;
II - Reducção dos direitos aduaneiros á metade, a pescadores colonizados, para a
importação das duas primeiras embarcações de pesca, movidas a machina ou motor
e exclusivamente destinadas á pesca pelas suas disposições internas e installações,
por intermedio da Directoria da Pesca;
IV - Isenção de todos os direitos aduaneiros para os motores marinhos, machinas,
apparelhos e mais material necessario ao inicio dos serviços da pesca e de conserva
do pescado e aproveitamento industrial dos productos aquaticos, desde que sejam
importados pela Directoria da Pesca;
V - Faculdade de sahir livremente do porto ou entrar, tanto de dia com de noite,
sendo avisada a autoridade naval a que estiver affecto o serviço da pesca, na fórma
do estabelecido no art. 31 e paragraphos.
Art. 126. A concessão dos favores das alineas IV e V do artigo acima será extensiva
ás companhias ou emprezas que estiverem funccionando na industria da pesca,
desde que só tenham nacionaes ou estrangeiros naturalizados em sua direcção
administrativa.
Art. 127. A concessão dos favores constantes do art. 126 será feita mediante
contracto, lavrado na Directoria da Pesca, no qual a companhia ou empreza
concessionaria obrigar-se-ha:
I - A não empregar estrangeiros em numero superior a um quinto dos seus
funccionarios em terra;
II - A receber e sustentar, como aprendizes, os filhos dos pescadores orphãos, que
lhes forem remettidos pela Directoria da Pesca. O numero e a idade minima desses
menores serão fixados no contracto, segundo a importancia da empreza;
III - A prestar a esses menores a instrucção pratica da industria exercida pela
companhia ou empreza;
IV - A pagar aos ditos menores, no segundo anno e seguintes, os salarios que
houverem sido fixados no contracto de que reza o art. 127, os quaes serão
independentes dos encargos da condição anterior;
Art. 129. Os terrenos de que trata o § 1º do art. 125 serão concedidas para a
fundação de colonias de pescadores mediante petição, feita pela Confederação Geral
dos Pescadores, dos terrenos de marinha e publicos, nas ilhas ou nas costas de terra
firme, depois de medidos e demarcados por empregados mandados pelo Governo,
obedecendo ás disposições dos decretos ns. 14.594 e 14.596, de 31 de dezembro de
1920. (leis de uso e disposição do solo)
Art. 134. Nas bahias, lagôas, enseadas ou ainda nos mares da costa, bem como nos
rios, as colonias de pescadores não prejudicarão, de modo algum, nem impedirão o
exercicio da pesca aos pescadores amadores, devendo-lhes prestar todos os auxilios
de que porventura carecerem.
Art. 135. O desenvolvimento do Serviço da Pesca e Saneamento do Littoral, será
garantido por uma verba de rubrica - *Pesca e Saneamento do Littoral", que fará
parte da lei annua. (BRASIL, 1923b)
68
Art. 136. A pesca, para todos os effeitos, ficará sob a administração do Ministerio da
Marinha.
Art. 137. Para auxiliar os serviços administrativos da pesca será creada na
Inspectoria de Portos e Costas uma Directoria da Pesca, lotada com o pessoal
marcado no regulamento respectivo.
Art. 138. A' Inspectoria de Portos e Costas serão enviados todos os papeis relativos a
assumptos de pesca, os quaes, depois de estudados convenientemente e informados,
serão encaminhados ao ministro da Marinha para os devidos fins.
Art. 139. A' Inspectoria de Portos e Costas, para fiscalização da pesca, conhecimento
de paragens abundantes de peixes e mais estudos relativos á piscicultura e á pesca,
serão fornecidos navios proprios para o desempenho de taes missões os quaes farão
parte do quadro dos navios da Armada, embora estejam sob a jurisdicção daquella
inspectoria.
Art. 140. Para os estudos que se referirem á pesca e á piscicultura, empregar-se-ha,
sob a direcção da Directoria da Pesca, uma parte da verba destinada ao
desenvolvimento da pesca e saneamento do littoral.
Paragrapho unico. Nas despezas que puderem ser feitas em obediencia a este artigo,
estão incluidas as acquisições de peixes para reproducção e tudo quanto se
relacionar com a piscicultura natural e artificial. (BRASIL, 1923b)
69
Para uma maior fiscalização das atividades pesqueiras, sabendo que a Capitania dos
Portos é responsável por todas as embarcações que circulam e que atracam nos portos de sua
região, independentemente da atividade, criou-se, na Inspetoria de Portos e Costas, a Diretoria
de Pesca, dirigida por oficiais da Marinha, cuja principal obrigação, como dito anteriormente,
era a de fiscalizar a pesca e de realizar estudos e pesquisas, que beneficiassem a pesca ou a
piscicultura.
Os artigos 141 até 187, referentes à polícia da pesca, realizada regionalmente pelo
capitão dos portos e localmente pelos capatazes, mais os artigos referentes à pesca fluvial
(sobretudo, na região amazônica, desvendada pela missão do Cruzador José Bonifácio),
tratam das contravenções e das penalidades e estabelecem disposições gerais, relacionadas à
pesca (ANEXO A).
Um artigo que não pode passar despercebido é o 184, o qual determinava que os
regimentos e os estatutos das colônias e das confederações de pescadores deveriam ser
aprovados e organizados pela Marinha, por meio da Inspetoria de Portos e Costas.
A última lei do período republicano, relativa à pesca, é a nº 4.793, de 7 de janeiro de
1924, que fixa a despesa geral da República, em cujo Artigo 45 se estipula de quais formas o
governo poderia empregar as verbas públicas:
III - realizar estudos, em caráter permanente, que visem à atualização das leis
aplicáveis à pesca ou aos recursos pesqueiros, propondo as providências
convenientes;
IV - aplicar, no que couber, o Código de Pesca e a legislação das atividades ligadas à
pesca e aos recursos pesqueiros;
V - pronunciar-se sôbre pedidos de financiamento destinados à pesca, formulados a
entidades oficiais de crédito;
VI - coordenar programas de assistência técnica nacional ou estrangeira;
VII - assistir aos pescadores na solução de seus problemas econômico-sociais;
§ 1º Para a finalidade definida neste artigo, a fauna e a flora de origem aquática são
considerados recursos pesqueiros.
§ 2º A SUDEPE exerce atribuições sôbre as atividades de piscicultura e de pesca
interior e marítima. (BRASIL, 1962)
Logo no segundo artigo, observa-se que a atividade pesqueira sofre uma mudança
brusca, passando da tutela da Marinha para a da SUDEPE. Essa mudança fica clara, pois, em
todos os itens, é ressaltada uma estrutura de arranjo assistencialista, com possibilidade de
organização, colocando o pescador como um ator, que deveria tomar parte nas decisões.
Mas, logo no Artigo 3º, vemos que a autonomia da atividade pesqueira ainda não vem
com a SUDEPE, pois fica a cargo dessa superintendência, não, só, gerir, mas executar
diretamente a função de ponte entre os profissionais da pesca e a Administração nacional,
limitando sobremodo a autonomia da categoria no período:
22
Disponível em: dicio.com.br, no verbete “consultivo”, acessado em 12/02/18.
73
Outro ponto marcante é o de que a SUDEPE passa a ter todas as gerências sobre a
pesca, além de planejar, de fomentar e de ser órgão fiscalizador da atividade.
Reforçando essa nova atitude, frente à atividade pesqueira nacional, entra em vigor,
em 1967, o Decreto-Lei 221 23, mais conhecido como Lei da Pesca. Ele tem, como objetivo
central, dar proteção e estímulo à pesca nacional. Mas podemos observar algumas mudanças,
que alteram a estrutura pesqueira, levando a uma valorização da produção para o mercado.
Nos primeiros artigos, que descrevem a atividade pesqueira, não há grandes mudanças
estruturais:
Art. 1º. Para os efeitos dêste Decreto-lei define-se por pesca todo ato tendente a
capturar ou extrair elementos animais ou vegetais que tenham na água seu normal ou
mais freqüente meio de vida.
Art. 2º. A pesca pode efetuar-se com fins comerciais, desportivos ou científicos;
§ 1º Pesca comercial é a que tem por finalidade realizar atos de comércio na forma
da legislação em vigor.
§ 2º Pesca desportiva é a que se pratica com linha de mão, por meio de aparelhos de
mergulho ou quaisquer outros permitidos pela autoridade competente, e que em
nenhuma hipótese venha a importar em atividade comercial;
§ 3º Pesca científica é a exercida ùnicamente com fins de pesquisas por instituições
ou pessoas devidamente habilitadas para êsse fim.
Art. 3º. São de domínio público todos os animais e vegetais que se encontrem nas
águas dominiais.
Art. 4º. Os efeitos dêste Decreto-lei, de seus regulamentos, decretos e portarias dêle
decorrentes, se estendem especialmente:
a) às águas interiores do Brasil;
b) ao Mar Territorial brasileiro; às zonas de alto mar, contíguas ou não ao Mar
Territorial, em
c) conformidade com as disposições dos tratados e convenções internacionais
ratificadas pelo Brasil;
à plataforma continental, até a profundidade que esteja de
d) acôrdo com os tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil.
(BRASIL, 1967)
23
Decreto-Lei nº 221, de 28 de fevereiro de 1967, que dispõe sobre a proteção e estímulos à pesca.
76
naturalizado para ser pescador. No nono artigo, passa da Marinha para o ministro da
Agricultura a responsabilidade de liberar, pessoalmente, embarcações estrangeiras para a
pesca em águas nacionais.
Art. 18. Para os efeitos dêste Decreto-lei define-se como "indústria da pesca", sendo
conseqüentemente declarada "indústria de base", o exercício de atividades de
captura, conservação, beneficiamento, transformação ou industrialização dos sêres
animais ou vegetais que tenham na água seu meio natural ou mais freqüente de vida.
Parágrafo único. As operações de captura e transformação de pescado são
consideradas atividades agropecuárias para efeito dos dispositivos da Lei nº 4.829,
de 5 de novembro de 1965 que institucionalizou o crédito rural e do Decreto-lei nº
167, de 14 de fevereiro de 1967, que dispõe sôbre títulos de crédito rural. (BRASIL,
1967)
O trigésimo quinto artigo mantém uma questão já observada nas legislações do início
do século XX, que é a da preservação das espécies e da não contaminação da população. Mas
há um parágrafo único preocupante, que permite ao poder público utilizar substâncias
nocivas, para eliminar espécies invasoras, não se preocupando com impactos às demais
espécies.
Art. 52. As emprêsas que comerciarem com animais aquáticos ficam sujeitas a
registro na SUDEPE e pagarão taxa anual equivalente a metade do salário mínimo
mensal vigente na Capital da República. (BRASIL, 1967)
Outro ponto sobre o qual também é possível traçar um paralelo diz respeito à
continuidade das políticas públicas voltadas para os pescadores artesanais, que sai da tutela da
Marinha brasileira, no início do século XX, para o controle financeiro e administrativo da
SUDEPE, na década de 1960, não tendo, contudo, uma autonomia real.
No início do século XXI, os Terminais Pesqueiros Públicos são parte de uma política
pública voltada à reestruturação da atividade pesqueira e das infraestruturas aquícola e
pesqueira brasileiras. Atrelado a eles está todo um peso normativo internacional, que impõe
certas regras, que não podem ser ignoradas, que é o ponto central do próximo subcapítulo.
Como observado no texto legal, os Terminais Pesqueiros Públicos têm, como ponto
central, serem responsáveis pela reestruturação da atividade pesqueira e das infraestruturas
aquícola e pesqueira brasileiras, considerando a necessidade e o interesse públicos, segundo o
Decreto-Lei nº 5.231, de 2004.
Diferente dos marcos históricos anteriores, já citados, a nova política pública de
reestruturação visa, segundo o governo, a fortalecer a atividade pesqueira:
Ainda na tentativa de demostrar que todo o projeto dos Terminais Pesqueiros Públicos
não é para benefício da categoria artesanal, somente, existiu um reforço no documento
resultante da audiência pública realizada em Brasília, em 18 de março de 2015 (ANEXO A),
80
como já estabelecido, anteriormente, no Decreto-Lei nº 5.231, de 2004, os TPPs são para uso,
tanto da pesca artesanal quanto da industrial.
Em 2015, eram 18, os TPPs criados ou em criação, pelo Estado, assim divididos:
quatro estavam em operação; cinco encontravam-se em pré-operação; três constavam em
construção/aparelhamento; quatro não passavam da fase de projeto/licenciamento; e um ainda
estava no debate do planejamento, conforme o mapa da Figura 1.
Neste marco mais recente, observam-se duas conjunturas: de 2004 a 2014, quando as
normas fazem referência à criação e à implementação da Lei; e de 2015, quando da
modificação proposta na legislação, pela audiência pública. Tais modificações são as
seguintes:
relação com o espaço rural e é considerada uma das mais importantes formas
extrativistas da atualidade (DIEGUES, 1983), mas a atividade adquire novos
conteúdos e sentidos no contexto da urbanização.
Mas o Artigo 6º do Decreto nº 5.231, indo além da normatização das atividades, que
poderiam ser realizadas nos TPPs, através de um mecanismo que permite que a administração
dos terminais seja entregue ao setor privado, tornando-o órgão fiscalizador e normatizador,
junto das instituições públicas lá instaladas, suprimindo, mesmo que de forma indireta, a
atuação das Colônias e dos demais sindicatos e associações de pesca.
Art. 6º. Na área do Terminal Pesqueiro Público, somente poderão ser realizadas as
seguintes atividades:
85
Este processo de substituição local das entidades representativas da pesca, através das
estruturas e das garantias de comercialização, pela administradora dos Terminais Pesqueiros
Públicos, fica mais claro no Artigo 9º do Decreto nº 5.231, que estabelece o modelo
administrativo a ser adotado:
24
Fonte: sítio http://www.cnpa.org.br/, acessado em 27/08/2020.
88
forma de atuação deste órgão são definidas pelo Art. 12. do Decreto nº 9.678, dando
um posicionamento claro, quanto a sua presença na audiência, estando, entre suas
atribuições (redação dada pelo Decreto nº 9.979, de 2019):
28
Fonte: https://www.ocb.org.br/ocb, acessado em 27/08/2020.
29
Fonte: http://www.bahiapesca.ba.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
30
Fonte: https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao/2o-plano-de-acao-
brasileiro/ministerio-do-planejamento-orcamento-e-gestao, acessado em 27/08/2020.
90
MDIC era o órgão responsável por formular, por executar e por avaliar políticas
públicas, para a promoção da competitividade, do comércio exterior, do investimento e
da inovação nas empresas e do bem-estar do consumidor 31. A presença desta entidade
poderia estar vinculada à possibilidade de avaliar a competitividade dos TPPs, com
relação à colocação do pescado no comércio exterior.
- A presença do Presidente da Federação Nacional dos Engenheiros de Pesca do Brasil
se tornou um caso interessante, pois a FAEP-BR foi fundada em 26 de junho de 1979
e é a entidade máxima representativa da classe dos engenheiros de pesca do Brasil,
tendo sido constituída para fins de aprimoramento, de coordenação, de proteção, de
reivindicação e de representação legal dos engenheiros de pesca, quer sejam
profissionais liberais, quer sejam autônomos, quer sejam servidores públicos. É uma
sociedade civil de caráter federativo, de duração ilimitada, de base territorial nacional
e com sede e foro na cidade de Brasília (DF) 32. Em nossa avaliação, não havia motivo
para a presença desta entidade em uma audiência pública voltada diretamente à
atividade pesqueira de pequena escala, mas, analisando a função do engenheiro de
pesca, que está vinculada à criação e à captura, estendendo-se à industrialização de
organismos aquáticos, os TPPs poderiam ser uma expansão para as suas atividades.
- A Marinha do Brasil não poderia faltar a uma audiência pública sobre a atividade
pesqueira, visto que existe uma relação muito forte entre a pesca e a instituição. A
presença do Assessor para Assuntos Marítimos e Ambientais do Estado-Maior da
Armada reforça essa ideia. O Estado-Maior da Armada (EMA) teve sua origem no
período de transição do regime monárquico para o republicano, por intermédio do
Decreto nº 430, de 29 de maio de 1890. A atual versão do Regulamento do EMA foi
aprovada pela Portaria nº 126, de 7 de julho de 2008, editada pela Chefia do Estado-
Maior da Armada, e incorpora à sua estrutura organizacional as Divisões de Portos e
Hidrovias e de Mobilização. Cabe ao EMA as seguintes tarefas:
31
Fonte: sítio http://dados.gov.br/organization/about/ministerio-da-industria-comercio-exterior-e-servicos-mdic,
acessado em 27/08/2020.
32
Fonte: sítio http://faep.eng.br/quem_somos.php, acessado em 27/08/2020.
91
33
Fonte: sítio http://www.arquivodamarinha.dphdm.mar.mil.br/index.php/estado-maior-da-armada-3, acessado
em 27/08/2020.
34
Fonte: sítio http://conape.org.br/nossa-historia/, acessado em 27/08/2020.
35
Fonte: sítio http://www.postofarol.com.br/#sobrefarol, acessado em 27/08/2020.
92
36
Fonte: sítio https://www.mma.gov.br/institucional.html, acessado em 27/08/2020.
37
Fonte: sítio https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao/2o-plano-de-acao-
brasileiro/ministerio-do-planejamento-orcamento-e-gestao, acessado em 27/08/2020.
38
Fonte: sítio https://portogente.com.br/portopedia/78620-atribuicoes-e-metas-da-secretaria-de-portos, acessado
em 27/08/2020.
93
39
Fonte: sítio https://sepaq.ma.gov.br/sobre-sepaq/, acessado em 27/08/2020.
40
Fonte: sítio http://www.abc.gov.br/zopacas/informacoes/InstituicaoMPA.aspx, acessado em 27/08/2020.
41
Fonte: sítio https://pt.wikipedia.org/wiki/Cabedelo<https://cabedelo.pb.gov.br, acessado em 27/08/2020.
42
Fonte: sítio https://www.imarui.sc.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
43
Os dados da Superintendência Federal de Pesca e Aquicultura do Rio de Janeiro ficavam no site do Ministério
da Pesca e Aquicultura (www.mpa.gov.br), porém, após a extinção do órgão, estes se tornaram indisponíveis.
94
44
Fonte: sítio http://www.setre.ba.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=50, acessado em
27/08/2020.
45
Fonte: sítio https://www.gov.br/cgu/pt-br/acesso-a-informacao/institucional, acessado em 27/08/2020.
46
Fonte: sítio https://www.santos.sp.gov.br/?q=institucional/assuntos-portuarios-industria-e-comercio, acessado
em 27/08/2020.
95
47
Fonte: sítio https://abccam.com.br/quem-somos/, acessado em 27/08/2020.
48
Fonte: sítio https://cananeia.sp.gov.br/cidade, acessado em 27/08/2020.
49
Fonte: sítio https://pt.wikipedia.org/wiki/Niterói, acessado em 27/08/2020.
50
Fonte: sítio https://www.seagri.se.gov.br/informacoes/2/a-secretaria, acessado em 27/08/2020.
96
Santa Catarina na regulamentação das políticas públicas dos TPPs. A secretaria tem os
objetivos de planejar, de formular e de normatizar políticas, programas, projetos e
ações, referentes aos sistemas portuário e de mobilidade rodoviária, ferroviária,
hidroviária, aeroviária, cicloviária e de pedestres, além de administrar, de coordenar,
de elaborar e de executar convênios de delegação de encargos, firmados com a União
ou com os municípios do estado, de que resultem estudos, projetos, planos, programas,
construções, conservações, restaurações, reconstruções, melhoramento, ampliações e
operações da infraestrutura de transportes, de edificações e de obras hidráulicas, que
integram a infraestrutura de transportes, vinculada à SIE, aos sistemas viários, às
rodovias, às ferrovias, às vias navegáveis e aeroviárias e às instalações portuárias 51.
- A participação do Subsecretário de Aquicultura e Pesca do Município de Itapemirim
(ES) está ligada à história do município no início do século XX, período que foi
marcado pela possibilidade de construção do entreposto da Colônia do Rio Novo, que
seria ligado por um canal artificial, denominado Canal do Pinto 52. Com a possibilidade
de implantação de TPPs em comunidades ribeirinhas, sua participação na audiência
pública era de extremo interesse.
- A presença da Secretaria de Pesca da Prefeitura de Angra dos Reis na audiência
pública está vinculada à extensa história das atividades pesqueira na cidade, bem como
à preocupação com as mudanças na Lei dos TPPs. O município, situado no sul do
estado do Rio de Janeiro, conta com 365 ilhas 53, que, além de potencial pesqueiro, têm
forte apelo turístico.
- Uma participação bem peculiar na audiência, voltada para a normatização de um
espaço de comercialização de pescado, foi a da Gehr International. A empresa atua em
marketing, em venda, em instalação e em apoio logístico pós-venda de equipamentos e
de sistemas de alta tecnologia nos segmentos marítimo comercial/offshore, de meio
ambiente, militar, de segurança pública, de aviação comercial, de portos, de aeroportos
e de comunicações, no mercado brasileiro. A Gehr International é representante
exclusiva, no Brasil, das principais empresas atuantes no mercado de defesa, tais
como: General Dynamics, Astronautics Corporation of America, Krauss Maffei
51
Fonte: sítio https://www.sie.sc.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
52
Fonte: sítio https://www.itapemirim.es.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
53
Fonte: sítio https://pt.wikipedia.org/wiki/Angra_dos_Reis/, acessado em 27/08/2020.
97
54
Fonte: sítio http://www.gehrinternationalbr.com/, acessado em 27/08/2020.
55
Fonte: sítio http://www.sape.rn.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
56
Fonte: sítio http://www.spa.ce.gov.br/index.php/indentidade-organizacional/, acessado em 27/08/2020.
57
Fonte: sítio http://www.turismo.gov.br/institucional.html/, acessado em 27/08/2020.
98
58
Fonte: sítio https://www.sindfrio.com.br/, acessado em 27/08/2020.
59
Fonte: sítio https://www.conepe.org.br/, acessado em 27/08/2020.
60
Fonte: sítio https://www.gov.br/ibama/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/sobre-o-ibama/, acessado em
27/08/2020.
99
61
Fonte: sítio https://pt.wikipedia.org/wiki/Bragança_(Pará)/, acessado em 27/08/2020.
62
Fonte: sítio https://pt.wikipedia.org/wiki/Santos/, acessado em 27/08/2020.
63
Fonte: sítio https://www.gov.br/agricultura/pt-br/, acessado em 27/08/2020.
64
Fonte: sítio https://camocim.ce.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
100
atividades correlatas, que lhe forem atribuídas pelo Gabinete da CODAE 65. Como seu
principal interesse, poderíamos destacar uma formatação do controle do pescado e de
seu processamento, prevista na legislação.
- Outro participante bem peculiar foi o Sistema CNA, que é composto por três
entidades: a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que representa
os produtores rurais brasileiros de pequeno, de médio e de grande portes, o Serviço
Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), que atua como instrumento de formação
profissional rural e de promoção social e de qualidade de vida de homens e de
mulheres do campo, e o Instituto CNA, que desenvolve estudos e pesquisas na área
social e no agronegócio 66. Aparentemente, esta instituição não tem ligação com a
atividade pesqueira, mas possui possíveis interesses na aquicultura.
- Na audiência pública, houve a participação de um assessor parlamentar, cuja principal
função é auxiliar o parlamentar nas matérias legislativas de seu interesse, podendo
elaborar minutas e assessorar o parlamentar em reuniões 67. Como não foi possível
identificar o gabinete ao qual estava vinculado, não é viável dizer a qual setor ele se
reportaria.
- Da mesma forma que o assessor parlamentar não foi identificado, também houve a
presença de um Assessor de Comunicação, que não foi possível vincular a uma
entidade ou a um órgão. A função de uma assessoria de comunicação é de praticar a
comunicação social, que estabelece uma ligação entre uma entidade (indivíduo ou
instituição) e o público (a sociedade exposta à mídia). Em outras palavras, uma
assessoria de comunicação faz a administração de informação 68.
- Como já mencionado, o governo de Santa Cataria teve grande interesse na audiência
pública do TPPs, enviando diversas secretarias. Logo, a sessão também contou com
um representante da Secretaria de Agricultura de Santa Catarina, vinculado,
principalmente, aos produtores e aos pescadores do estado, dando-lhes suporte, para
65
Fonte: sítio https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/aba/divisao-de-qualidade-e-logistica-dos-alimentos-
dilog/4/, acessado em 27/08/2020.
66
Fonte: sítio https://www.cnabrasil.org.br/cna/, acessado em 27/08/2020.
67
Fonte: sítio https://www2.camara.leg.br/comunicacao/camara-noticias/camara-destaca/56a-legislatura/no-
exercicio-do-mandato/verba-de-gabinete/gestao-de-pessoas-do-gabinete/, acessado em 27/08/2020.
68
Fonte: sítio https://pt.wikipedia.org/wiki/Assessoria_de_comunicação/, acessado em 27/08/2020.
101
que possam seguir em frente, em suas atividades, trabalhando para produzir alimentos
e para seguir movimentando a economia de Santa Catarina 69.
- Na escala federal, houve ainda a participação do DRAER, órgão da Controladoria-
Geral da União (CGU), que é responsável por realizar atividades relacionadas à defesa
do patrimônio público, além da supervisão técnica dos órgãos, que compõem o
Sistema de Controle Interno, o Sistema de Correição e o Sistema de Ouvidoria do
Poder Executivo Federal, prestando a orientação normativa necessária 70.
- Uma participação interessante foi a da Associação dos Pequenos Produtores da
Agricultura Familiar (ASPAF), com sede em General Carneiro (MT), cidade instalada
à margem do rio das Graças. A associação tem, como principal ramo de atividade,
atuar em causas de caráter social, tais como a defesa dos direitos humanos, do meio
ambiente, das minorias étnicas 71.
- Uma participação bem burocrática foi a da Assessoria Especial de Controle Interno
(AECI), que tem os seguintes atributos:
69
Fonte: sítio https://www.agricultura.sc.gov.br/, acessado em 27/08/2020.
70
Fonte: sítio https://www.gov.br/cgu/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/, acessado em 27/08/2020.
71
Fonte: sítio https://cnpj.biz/14633710000163/, acessado em 27/08/2020.
102
72
Fonte: sítio http://agronet.agricultura.gov.br/institucional/areas-do-ministerio/controle-interno/assessoria-
especial-de-controle-interno/, acessado em 27/08/2020.
73
Fonte: sítio http://dados.gov.br/dataset/cgu-pad-sistema-de-gestao-de-processos-disciplinares/, acessado em
27/08/2020.
74
Fonte: sítio http://www.projepesca.com.br/, acessado em 27/08/2020.
103
75
Fonte: sítio https://www.scc.sc.gov.br/index.php/noticias/821-estado-assume-terminal-pesqueiro-de-laguna-e-
projeta-criacao-de-empregos, acessado em 27/08/2020.
76
Fonte: sítio https://www.bnb.gov.br/sobre-o-bnb, acessado em 27/08/2020.
77
Fonte: sítio https://www.sei.ba.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=107&Itemid=274,
acessado em 27/08/2020.
104
78
Fonte: sítio http://dados.gov.br/organization/about/secretaria-geral-sgpr/, acessado em 27/08/2020.
79
Fonte: sítio https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/inspecao/produtos-animal/sif/, acessado em
27/08/2020.
105
Eis outro ponto relevante: “Os TPPs deverão ser instalados um por município,
priorizando local que demostre a maior necessidade.” A solicitação oriunda dessa reunião
pode ser vista como uma tentativa de igualar espacialmente os TPPs, quanto às leis que regem
as entidades de classe, como as Colônias de Pescadores, que também são municipais e
unitárias.
No Artigo 5º, que substitui o Artigo 3º, demonstra-se o interesse pela criação e pela
anexação dos mercados locais, incluindo os da aquicultura: “O Terminal Pesqueiro Público é
uma infraestrutura de apoio à cadeia logística da pesca e da aquicultura e serve de entreposto
do pescado nas áreas costeira e continentais, de acordo com as necessidades e interesse
público”
Essa absorção dos mercados locais de beira de praia, das Colônias de Pesca, dos píeres
dos armadores, entre outros, pode representar um domínio do mercado, através da única
opção de venda para o pescador. Isto acaba enfraquecendo as Colônias, que tiveram esse
benefício, desde a década de 1920, juntamente com outras entidades de classe, que receberam,
posteriormente, o direito de comercialização do seu pescado.
No Artigo 6º, que substitui o Artigo 4º, o principal ponto é a inclusão do
monitoramento do desembarque nos terminais, tanto da pesca como da aquicultura, para um
maior controle da produção e da comercialização.
Na audiência, houve uma grande pressão, por parte das pessoas jurídicas, que tinham,
como objetivo, administrar os TPPs, quanto a retirar ou a tornar opcional o beneficiamento do
pescado (Art. 7º), pois demandaria um maior investimento em manutenção e na adequação às
normas sanitárias, o que poderia causar frequentes interrupções nas operações.
Outra mudança marcante está no Artigo 15 (antigo Artigo 11), que trata dos Conselhos
dos TPP (CTP), os quais tinham a “Colônia de Pescadores Artesanais” como membro, e que
passam a ser uma “entidade de classe representativa dos pescadores profissionais artesanais,
no âmbito do município”. Tal mudança teve reflexos, também, para a pesca industrial e para
os armadores, dos quais as associações de pescadores foram retiradas. Essas mudanças
tiveram a seguinte justificativa, documentada:
Nesse sentido, a pesca vê, no primeiro mandato do governo Lula, uma reestruturação,
baseada em uma independência político-administrativa nunca vista, a nível governamental.
No início do século XXI, com a criação da Secretaria de Aquicultura e Pesca e,
posteriormente, com a formação do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), a atividade
pesqueira deixa de estar sob a tutela da Marinha brasileira, em relação a documentações, além
de não ser mais uma secretaria, com um orçamento limitado, dentro do Ministério da
Agricultura, que sempre teve outras prioridades, vinculada à matriz econômica
agroexportadora brasileira.
Em seu livro, Gregolin (2014, posição 1013) destaca alguns pontos interessantes, para
termos uma noção da dificuldade e da importância da atividade pesqueira: um potencial de
produção de 20 milhões de toneladas/ano, do qual temos utilizados, em média, 10%; a Zona
Econômica Exclusiva (ZEE) brasileira representa metade do território nacional; e a produção
de pescado possui um gasto de energia muito inferior ao de produção de outras carnes.
Outro ponto fundamental deste trabalho, observado nos textos de Gregolin (2014), é a
ligação tênue entre a política nacional, voltada para a atividade pesqueira, e as diretrizes
resultantes dos acordos internacionais firmados pelo Brasil, nos últimos 60 anos, sobre os
usos das águas e de seus recursos.
Gregolin (2014, posição 991) utiliza a declaração da Organização das Nações Unidas
para Alimentação e Agricultura (FAO) sobre a importância do potencial de produção de
pescado/ano brasileiro, para atender à crescente demanda mundial. A partir da leitura desse
documento, Gregolin ressalta a importância da utilização da Zona Econômica Exclusiva
(ZEE) brasileira e apresenta as orientações da FAO, sobre o valor da criação da Secretaria
Especial de Aquicultura e Pesca (SEAP) para a atividade pesqueira nacional. Contudo, a
criação da secretaria demostrou a fragilidade orçamentaria do governo, devido a esta ser um
órgão de assessoramento à Presidência da República, subordinado à Casa Civil. Portanto, a
falta de autonomias administrativa e financeira (quadro de pessoal concursado pequeno e com
alta exposição política) impossibilitou ou dificultou o tratamento das demandas do setor, com
discernimentos técnicos e legais específicos, conforme Gregolin (2014).
A partir dessa realidade, ressalta Gregolin (2014, posição 1340), a FAO propôs ao
governo brasileiro “centralizar as competências em uma única instituição: fomento,
ordenamento, fiscalização, pesquisa, estatística, sanidade, para citar somente essas, dentre as
várias competências”. Esse modelo de órgão de pesquisa, de fomento, de ordenamento e de
fiscalização esbarrou em outras instituições do Estado, que deveriam abrir mão de suas
atribuições sobre a atividade pesqueira. Um exemplo, citado por Gregolin (2014), é o Ibama.
109
Importante destacar que todos tiveram sua construção precedida por estudos de
viabilidade. Em 2003, foi realizado pela SEAP um seminário internacional com o
objetivo de estudar as melhores experiências para viabilizar a gestão dos terminais
existentes. A concessão por longo período (10 anos com renovação para mais 10
anos) à iniciativa privada foi a forma considerada mais viável. Assim iniciou-se o
processo de concessões. O resultado foi negativo pelo total desinteresse do setor
privado em assumir esses terminais. (...) O principal problema é que os terminais são
economicamente deficitários. Não são viáveis economicamente. Isso se deve ao fato
da existência de um setor ainda sendo desenvolvido, com volume de desembarque
insuficiente em alguns polos, ou a existência de terminais privados em outros, ou
ainda as dificuldades de pescadores artesanais pagarem taxas de desembarque que
permitam a manutenção desses terminais. Ou seja, o modelo de gestão desenvolvido
não dá conta da realidade do setor pesqueiro brasileiro. O setor Privado não tem
interesse em assumir terminais que não deem lucro. (GREGOLIN, 2014, posição
2660)
Fechando o tema dos Terminais Pesqueiros Públicos (TPP), Gregolin (2014) apresenta
proposta, como ministro, de que a gestão dos TPPs deveria ser feita por uma empresa pública,
criada exclusivamente para essa função, devido às alegações, feitas pelos parceiros privados,
de não haver lucro nos terminais. Mas ele comenta que tal forma de gestão passaria para o
público-privado, assim que os TPPs se estruturassem e se tornassem superavitários.
Interessantemente, a posição do então ministro é bem semelhante à apresentada pela FAO, no
tocante ao modo como deveria ser o órgão governamental voltado ao setor pesqueiro 82. A
82
A FAO também relatava quais deveriam ser as atribuições de um órgão governamental voltado ao setor
pesqueiro. Tal órgão deveria ter:
• A capacidade de integrar as dimensões sociais, econômicas e ambientais do desenvolvimento sustentável;
• Um marco legal adequado e atualizado, favorecendo, em especial, a criação de leis de pesca e de
aquicultura;
• Hierarquia institucional, que permitisse autonomia administrativa, financeira e de gestão;
110
Meta Nacional: Em nível nacional, não é fácil ter, implementar e impor planos de
manejo efetivos para a pesca e elaborar leis necessárias para controlar a explotação
em suas zonas exclusivas de pesca. Portanto, poucos países manejam bem este
assunto.
Os princípios-chave do Código incluem:
• Basear o manejo de pesca nos mais fidedignos dados científicos
disponíveis;
• Utilizar enfoques conservadores de manejo quando sejam incertos os
efeitos das práticas pesqueiras (o princípio da precaução);
• Evitar a sobrexploração, prevenindo ou eliminando a pesca além da
capacidade suporte;
• Minimizar os descartes e a pesca incidental;
• Proibir os métodos de pesca destrutivos;
• Restabelecer os estoques esgotados;
• Implementar leis nacionais, planos de manejo e mecanismos de vigilância
adequados;
• Monitorar os efeitos da pesca sobre todas as espécies do ecossistema e não
somente nas populações de espécies particulares;
• Trabalhar em cooperação com outras nações para coordenar as políticas de
manejo e controle e vigilância;
• Reconhecer a importância da pesca artesanal e de pequena escala e o valor
das práticas tradicionais de manejo;
• Desenvolver uma aquicultura ambiental e socialmente responsável. 83
O então ministro teve duas opções (GREGOLIM, 2014, posição 2662): criar uma nova
empresa pública para gerir os TPPs; e utilizar a parceria de uma empresa pública já existente.
A segunda opção foi a escolhida, e a empresa selecionada para gerir os TPPs, com
participação do Ministério, foi a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), através da
qual cada TPP teria um plano de gestão, visando a sua autossuficiência, e os déficits seriam
cobertos com recursos do MPA. Mas, com o fim do segundo mandato do governo Lula e o
início do governo Dilma, a troca de ministros levou ao fim da parceria, deixando os TPPs na
política antiga e sem uma definição de gerência, mantendo muitos fechados e sem usos
definidos.
A atividade pesqueira nacional é muito frágil, historicamente, e localmente
fragmentada, se levarmos em consideração os termos organizacionais, a partir de suas
lideranças, devido, principalmente, ao ritmo de trabalho ao qual o pescador se submete,
quando em pequenas embarcações, com saídas diárias exaustivas, para garantir o sustento de
sua família, e, quando em embarcações maiores, com longos períodos no mar, que podem ser
de uma semana, de um mês ou, até, de mais do que isso, gerando uma representatividade
política efêmera, tanto a nível nacional quanto local, diferente de outros setores da economia,
que, além de estarem presentes nas respectivas Câmaras, ainda possuem força institucional,
para pressionar todos os processos legislativos.
Esta situação acaba gerando, no setor, uma pressão legislativa que, em alguns pontos,
são avanços e, em outros, são barreiras ao desenvolvimento. E, como demonstrado neste
trabalho, boa parte das leis construídas para gerir a atividade pesqueira não é demandada pelo
setor.
Tal realidade revela outro exemplo de descaso, para com a atividade: no primeiro
mandato do governo Lula, houve a 1ª Conferência Nacional de Aquicultura e Pesca, que foi
resultado de uma política de proximidade com o setor. Contudo, as conferências não são
ideias novas, pois já estavam previstas nas legislações de outros setores, desde a década de
1930 84.
Foram 27 conferências, em todos os estados da Federação e no Distrito Federal, as
quais geraram a 1ª Conferência Nacional de Aquicultura e Pesca, realizada de 25 a 27 de
novembro de 2003, na qual 953 delegados e delegadas, de um universo de 1.056
representantes, discutiram e aprovaram subsídios, para a construção de uma política de
desenvolvimento sustentável da aquicultura e da pesca, que respeitasse às particularidades
regionais e à pluralidade de opiniões 85. Tal Conferência teve 55% de suas deliberações
abarcadas na agenda do Governo Federal86. Petinelli (2011, p. 239) observa que o alto índice
de deliberações ocorreu, devido a um grande volume de atores estatais (50%), somado a
representantes de associações profissionais e de empresários, mas era esperado um índice
84
Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937.
85
Disponível em:
http://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/conferencias/Aquicultura_Pesca/deliberacoes_1_conferencia
_aquicultura_pesca.pdf, com acesso em 25/01/2020.
86
PETINELLI, V. As Conferências Públicas Nacionais e a formação da agenda de políticas públicas do Governo
Federal (2003-2010). Opinião pública, Campinas, v. 17, n. 1, jun. 2011. p. 228-250.
112
ainda maior de inclusões na agenda do Governo, por parte desses grupos, pois, na verdade,
eles possuíam ampla capacidade inclusiva.
Isso nos leva a outro ponto, que toca às políticas voltadas à atividade pesqueira,
adotadas nacionalmente, no início do século XXI. Como abordarei mais detalhadamente, após
a Constituição de 1988, o Brasil vem assinando diversos acordos internacionais, vinculados
ao uso das águas. Do meu ponto de vista, o mais importante foi a Convenção das Nações
Unidas sobre o Direito do Mar, realizada em Montego Bay, em 10 de dezembro de 1982, que
foi aprovada, pelo Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo nº 5, de 9 de
novembro de 1987, ratificada, pelo Brasil, em 22 de dezembro de 1988, e promulgada, pelo
Presidente da República, por meio do Decreto nº 99.165, de 12 de março de 1990.
O texto do acordo também pode ser visto em uma publicação do Ministério do Meio
Ambiente sobre a pesca, no qual a Convenção sobre o Direito do Mar das Nações Unidas é
apresentada como fonte para a regulamentação:
87
Disponível em: https://www.mma.gov.br/estruturas/205/_publicacao/205_publicacao29112010050729.pdf,
com acesso em 30/01/2020.
113
Lula. Portanto, no próximo subcapítulo, tratarei de compor uma breve narrativa sobre esse
governo e sobre as suas políticas.
Para construir uma narrativa sobre o governo do PT, é necessário entender, mesmo
que de maneira sucinta, o governo anterior, pois o Plano Real, instituído por Fernando
Henrique Cardoso, continuou presente no primeiro mandato do governo Lula.
Em seu livro, Sampaio Jr. (2017, posição 233) observa que “após uma década de
ajuste à crise da dívida externa, no início dos anos 90, a sociedade brasileira abraçou
definitivamente as recomendações do Consenso de Washington” 88. Ele ainda ressalta que foi
no governo de Fernando Henrique Cardoso que a “desarticulação do mercado interno como
eixo dinâmico do crescimento e a elevada vulnerabilidade da economia às vicissitudes do
capital internacional” afetaram a capacidade econômica brasileira de geração de empregos
com qualidade e com boa remuneração para a população mais jovem, chegando ao mercado
de trabalho.
O resultado foi que, na segunda metade da década de 1990, o Brasil possuía,
aproximadamente, 40% da sua força de trabalho subempregada ou, simplesmente,
desempregada. Com o agravante, ainda, da impossibilidade de incorporação “às indústrias
modernas, as massas urbanas marginalizadas vivem na desesperança, alienadas nas ilusões de
um misticismo mercantilizado”. Outra característica marcante desse período da história
brasileira era o quanto a população estava sujeita ao descaso, por parte do poder público, e à
violência, por parte do crime organizado, no seu cotidiano (SAMPAIO JR., 2017, posição
240).
Pensando em termos macroeconômicos, segundo Sampaio Jr. (2017, posição 325), nos
oito anos de mandato FHC são evidentes os elevados custos econômico e social da frágil
estabilidade inflacionária construída pelo plano Real. “Incapaz de enfrentar as causas
estruturais da instabilidade monetária – as crônicas fragilidades cambial e fiscal da economia
brasileira –, FHC sacrificou as condições de vida da população e hipotecou o futuro da
88
Resumidamente, as dez medidas do Consenso de Washington são: disciplina fiscal; reordenamento nas
prioridades dos gastos públicos; reforma tributária; liberalização do setor financeiro; manutenção de taxas de
câmbio competitivas; liberalização comercial; atração de investimentos diretos estrangeiros; privatização de
empresas estatais; desregulamentação da economia; e proteção a direitos autorais.
114
nação”, tudo, para manter estáveis os preços dos produtos, através de uma “política
econômica, que asfixiou o crescimento econômico, aumentou dramaticamente a
vulnerabilidade externa e comprometeu a dívida interna, como instrumento de financiamento
de políticas públicas”. Para Sampaio Jr. (2017):
Sampaio Jr. (2017) faz, em seu livro, um comparativo, para tornar possível uma visão
mais clara do Plano Real e de suas características na economia nacional:
O fraco desempenho da economia brasileira ampliou ainda mais a distância que nos
separa dos países desenvolvidos. Medida em dólar, em 2002 a renda per capita deve
ficar em torno de US $ 2,9 mil dólares, 19% inferior à registrada em 1994 e 42%
abaixo do nível atingido em 1997, no ápice do Plano Real . Em comparação com a
renda per capita norte-americana, a diferença relativa, que girava em torno de sete
vezes quando FHC tomou posse, deve elevar - se para dez vezes em sua saída. O
hiato de riqueza entre o Brasil e as economias desenvolvidas deve ampliar - se ainda
mais, pois a promessa de que a privatização elevaria o investimento não se cumpriu.
Nos anos FHC, a taxa de investimento da economia ficou deprimida em torno de
17% do PIB, marca bem inferior à verificada nos anos oitenta, a chamada década
perdida. Após o reinado tucano, a famigerada “modernização”, isto é, a corrida atrás
dos padrões de consumo das economias centrais, ficou ainda mais restrita a um
reduzido número de brasileiros. (SAMPAIO JR., 2017, posição 338)
A partir da análise do último mandato de FHC, que foi marcado por um crescimento
do desemprego, sendo acompanhado de forte deterioração dos rendimentos da população,
Sampaio Jr. (2017, posição 352) apresenta pontos importantes, que demostram como o
governo Lula recebeu o Brasil para governar, em seu primeiro mandato:
A partir da crítica realizada por Sampaio Jr. (2017), foi possível dizer que, no final do
mandato de FHC e no início do primeiro mandato de Lula, temos uma população destituída de
115
Para Sampaio Jr. (2017, posição 527), a transição entre o governo FHC e o governo
Lula é marcada por poucas mudanças, em relação à política econômica, como um todo. Na
agenda de transição ao governo Lula, o conteúdo das reformas propostas no legislativo é
similar ao das pautas assumidas pelo governo FHC com o FMI (notadamente, quanto à
reforma da previdência, à reforma tributária e à autonomia para o Banco Central). Para
Sampaio Jr. (2017), os compromissos explicitados na Carta de Intenções, de agosto de 2002, e
reafirmados, em fevereiro de 2003, pelo governo Lula: “são verdadeiras contrarreformas,
medidas desenhadas, para aprofundar o neoliberalismo no Brasil, reforçando ainda mais a
blindagem institucional, que fecha a possibilidade de políticas econômicas alternativas”. Não
se estranhou, portanto, o entusiasmo e o assanhamento do mercado nesse período.
Mas Sampaio Jr. (2017, posição 2225) ressalta dados relevantes sobre o governo Lula:
[...] a noção de que a economia brasileira vive um momento ímpar de sua história
apoia - se em diversos elementos da realidade. Afinal, após duas décadas de
estagnação, entre 2003 e 2011 a renda per capita dos brasileiros cresceu à taxa média
de 2,8 % ao ano. Nesse período, o país manteve a inflação sob controle e, salvo a
turbulência do último trimestre de 2008, no ápice da crise internacional, não sofreu
nenhuma ameaça de estrangulamento cambial. Desde a segunda metade da primeira
década do milênio o volume de divisas internacionais supera o estoque de dívida
externa com os bancos internacionais, configurando [...] uma situação na qual o
Brasil aparece como credor internacional, dando a impressão de que, finalmente, os
problemas crônicos com as contas externas teriam sido superados. A população
sentiu os efeitos da nova conjuntura de maneira bem palpável. Após décadas de
demanda reprimida, o aumento da massa salarial e o acesso ao crédito provocaram
uma corrida ao consumo. O governo calcula que o número de empregos gerados no
período Lula – 2003 - 2010 – tenha ultrapassado 14 milhões. Associando grandes
negócios, crescimento econômico, aumento do emprego e modernização dos
padrões de consumo à noção de desenvolvimento, o discurso do PT apresentou a
nova conjuntura como demonstração inequívoca de que o Brasil teria, finalmente,
criado condições objetivas para um desenvolvimento capitalista autossustentável.
(SAMPAIO JR., 2017, posição 2229)
116
Para compreender melhor esse momento da história brasileira (do governo PT),
retomemos, de modo um pouco mais aprofundado, o livro 10 anos de governos pós-
neoliberais no Brasil: Lula e Dilma, organizado por Sader (2013). Em sua entrevista com
Luiz Inácio Lula da Silva, o cientista afirma que ele é um político prático, intuitivo, buscando
uma resolução sólida dos problemas. Tomando esse ponto como base e graças a essa aptidão,
o governo Lula “desenvolveu, no país, um complexo processo de articulação política, que
tornou viável a prioridade do social e a promoção de políticas igualitárias, a soberania externa
e a recuperação do papel ativo do Estado na construção dos direitos dos cidadãos” (SADER,
2013, posição 111).
Respondendo a Sader (2013), sobre o desenvolvimento da economia, Lula diz:
O que eu guardo é o seguinte: eles nunca ganharam tanto dinheiro na vida como
ganharam no meu governo. Nem as emissoras de televisão, que estavam quase todas
quebradas; os jornais, quase todos quebrados quando assumi o governo. As
empresas e os bancos também nunca ganharam tanto, mas os trabalhadores também
ganharam. Agora, obviamente que eu tenho clareza que o trabalhador só pode
ganhar se a empresa for bem. Eu não conheço, na história da humanidade, um
momento em que a empresa vai mal e que os trabalhadores conseguem conquistar
alguma coisa a não ser o desemprego. (SADER, 2013, posição 285)
Quanto à política externa, parte importante na tese, Garcia (2013, posição 1299) indica
que predominavam debates sobre a nova ordem mundial multipolar, relativamente aos seus
aspectos econômico e político. A situação internacional necessitava saber mais claramente
qual seria o papel que a América do Sul poderia desempenhar: “A disjuntiva era: o Brasil
podia (ou queria) ser, isoladamente, um polo na nova ordem global em construção ou buscaria
ocupar um lugar de destaque nela, junto a todos os países da América do Sul?”. O Brasil
escolheu se destacar como um polo na nova ordem global.
Podemos destacar alguns fatos narrados por Garcia (2013):
A nacionalização dos ativos da Petrobras pelo governo Evo Morales provocou uma
onda de protestos no Brasil , onde não estavam ausentes manifestações racistas ( “
até quando vamos aguentar este índio ” ) ou propósitos belicistas , como a sugestão
de que o governo concentrasse tropas na fronteira e pudesse , até mesmo , invadir a
Bolívia . Esses protestos não levavam em conta o fato de que o governo boliviano
havia utilizado critérios legais semelhantes aos da legislação brasileira. Omitia - se
também que a Petrobras tenha sido devidamente indenizada e lá continue operando.
A renegociação das tarifas de Itaipu foi outra batalha difícil e a aprovação do acordo
firmado entre os presidentes Lula e Lugo só foi obtida após intensa batalha
parlamentar, na qual opositores não economizaram considerações chauvinistas. As
dificuldades nas relações comerciais com a Argentina, ainda que em certas
oportunidades os processos administrativos utilizados por autoridades de Buenos
Aires sejam objetáveis, não podem esconder um elemento central: a enorme
importância do mercado daquele país para o sistema produtivo brasileiro. Não deve
117
Além das questões sul-americanas, o Brasil se teve papel ativo em outras ações
internacionais:
[...] país com mais de 10 milhões de imigrantes de origem árabe , mas não só por
essa razão , o Brasil passou a dar enorme importância ao Oriente Médio , região que
, por sua relevância econômica , política e cultural , tem significação estratégica para
os destinos da humanidade e da paz mundial .[...] A proposta turco - brasileira aceita
por Teerã foi objeto de consultas e negociações prévias nos meses que antecederam
o acordo e coincidiu com a posição do presidente Obama , expressa a Lula em carta
reservada , só mais tarde tornada pública . Pouco depois, a recusa do acordo e a
adoção de novas sanções pelo Conselho de Segurança da ONU (contra os votos da
Turquia e do Brasil) mostravam mais do que uma rigidez das grandes potências.
Revelavam a inconformidade delas com o fato de que países “periféricos” tivessem
obtido diplomaticamente do Irã o que elas não haviam conseguido com suas
ameaças. O desfecho do episódio revelou a precariedade do sistema multilateral e
uma visão distorcida dos instrumentos de resolução de contenciosos. Três anos após
a recusa do Acordo de Teerã, o mundo encontra - se mais longe de uma solução do
problema nuclear iraniano. (GARCIA, 2013, posição 1480)
Segundo Garcia (2013, posição 1522), o Brasil foi em busca da firmação de sua nova
posição internacional, através, principalmente, do pleito de integrar o Conselho de Segurança
da ONU na condição de membro permanente, não, somente, pela visibilidade, mas “trata-se,
antes, de dar eficácia à ONU e legitimidade a seu Conselho de Segurança, que reflete, hoje,
em sua composição, uma correlação de forças internacionais ultrapassada, de mais de sessenta
anos”.
Esse novo posicionamento brasileiro no cenário mundial multipolar, de acordo com
Garcia (2013, posição 1543), implicava atuar em múltiplas frentes, como no caso da atuação
do Brasil no “Haiti, ao abrigo das Nações Unidas e do Direito Internacional, ele está não
apenas participando de uma iniciativa multilateral, mas dando sentido próprio a esse tipo de
missão, distinto das intervenções internacionais passadas em países demandantes de
estabilização”. Além dessas questões, o governo brasileiro teve ações em terrenos muito
diversificados, como a participação intensa na reforma de instituições, como o FMI, o Banco
Mundial, a FAO ou a Organização Mundial do Comércio. Para Garcia (2013, posição 1570),
“A voz altiva da política externa brasileira fazia-se ouvir, uma vez mais, na maior caixa de
ressonância mundial”, ressaltando o discurso do governo Lula sobre a construção de um
“Estado democrático, para corrigir distorções – de consequências sociais catastróficas –, que a
irracionalidade dos mercados acarretara”.
118
A nova dinâmica social, construída nos governos liderados pelo PT, era “capaz de
ampliar a justiça e a coesão social e de romper com uma das maiores vergonhas nacionais: a
profunda desigualdade social”, de acordo com Mattoso (2013, posição 2629), graças ao
conjunto de programas e às ações do Estado, com o intuito de garantir renda, acesso a bens e a
serviços e a regulação, através do salário mínimo, gerando uma maior capacidade política de
enfrentar a pobreza e a desigualdade endêmicas e favorecendo à ampla recuperação do
mercado interno.
Para Mattoso (2013, posição 2670), o sucesso dos governos do PT não se deveu,
exclusivamente, às esferas econômica ou social, “mas ao uso de políticas inovadoras, capazes
de articular o econômico e o social e de potencializar o crescimento, a produtividade e a
institucionalidade, gerando algo inexistente, ao longo das duas décadas anteriores”.
Mattoso (2013, posição 2708) destaca a continuidade das políticas de desenvolvimento
no governo de Dilma Rousseff:
Todas a políticas apresentadas geraram uma estabilidade, que não foi alcançada, no
mesmo nível, por governos anteriores. Seguindo com essa linha descritiva, Pochmann (2013,
posição 3330, inserção nossa) relembra que, “[em] relação à desigualdade, no sentido da
reversão, na distribuição pessoal da renda do trabalho é compatível com a elevação da renda
per capita dos brasileiros nos anos 2000”. Ele sustenta que houve um aumento na participação
dos rendimentos do trabalho em toda a renda nacional, bem como ocorreu uma ampliação na
taxa de ocupação, em relação ao total da força de trabalho.
Pochmann (2013, posição 3416) declara, ainda, que o estado de bem-estar social
brasileiro, com referência ao âmbito da seguridade social (saúde, previdência e assistência
social), foi paralisado pela política neoliberal da década de 1990, impossibilitando o avanço
do gasto social, sendo que tais investimentos foram retomados no governo do PT. Outro dado
marcante dessa nova política econômica, liderada pelos investimentos do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), foi que o Brasil passou a constituir suas
grandes corporações transnacionais (nas áreas de construção civil, de alimentos, de energia,
de siderurgia e de transporte, entre outras), “cujo objetivo era de se recolocar no espaço
restrito da ultra monopolização da competição capitalista mundial, guiada por não mais do
que quinhentas corporações transnacionais. As três maiores delas possuem um faturamento
anual que equivale ao PIB brasileiro” (POCHMANN, 2013, posição 3455).
Em seu livro, Pochmann (2013, posição 3509) afirma que o governo Lula, com forte
ênfase nas políticas sociais, possibilitou ao Brasil emergir e se reorganizar, em torno de um
novo projeto de desenvolvimento nacional, em que os gastos sociais passaram a ser
considerados uma ferramenta fundamental na coesão da sociedade brasileira e um
multiplicador da incorporação pelo mercado de consumo.
Pochmann (2013) destaca, ainda, que:
o governo Lula ousou ao romper com o passado, o que permitiu substituir o déficit
pelo superávit comercial e fazer do mercado interno a principal fonte do presente
dinamismo da economia nacional. Para isso, fortaleceu gradualmente a gestão
operacional e técnica do Estado, paralisando a privatização e reativando o
planejamento reorganizador do investimento público e da coordenação das
expectativas do setor privado. (POCHMANN, 2013, posição 3535)
Em tom crítico, Duarte (2018, posição 306) declara que, durante o governo Lula, suas
bases políticas se sustentariam na democracia de cooptação, formando um apaziguamento da
classe trabalhadora e uma tranquilidade para os negócios, mas que essas bases teriam sido
fincadas de maneira frágil, criando dependência do bom andamento, uma da outra. Além
120
disso, a relação de dependência externa foi se agravando, ao longo dos anos, e essa fragilidade
ficou visível, logo no primeiro ano do governo Dilma, estagnando a economia brasileira e
causando a ampliação das reivindicações dos movimentos populares.
E o que ocorre não é nada além do recorrente, a classe capitalista que estava
ganhando altas taxas de lucro enquanto a democracia de cooptação estava em pleno
funcionamento, quando chega a crise de acumulação continua tentando manter seus
ganhos. Nestas condições, já não há mais bases para a democracia de cooptação na
forma de antes e o governo de conciliação de classes chega a seu fim. (DUARTE,
2018, posição 317)
Em seu livro, Brum (2019) apresenta um ponto importante, para descrever esse
momento da história brasileira, principalmente, para o entendimento do comportamento da
sociedade no pós-governo Lula:
O Brasil é tão desigual e tão racista, porém, que mesmo o que era pouco provocou
uma reação que só se tornou explícita no governo de Dilma Rousseff, já no início da
segunda década do século. Ainda que esta não seja uma revolução, a possibilidade
de um pobre poder voar de avião" ou de um filho da classe trabalhadora ter um
diploma universitário, dois marcos simbólicos do final do governo Lula, muda o
Brasil. Ao ter acesso a outras experiências, as pessoas se transformam. isso tem
impacto sobre as aspirações cotidianas e sobre a forma de olhar para si mesmas e de
se relacionar com os outros. E impacta de muitas maneiras. inclusive no desejo de
consumir ainda mais. Ao mesmo tempo, ao aproximar os mais pobres de bens
materiais e de espaços até então exclusivos da classe média, o governo Lula atinge
algo caro para essa classe média que era definida como “tradicional”: atinge aquilo
que a diferenciava dos mais pobres. Essa perda foi sentida. Para essa parcela da
sociedade, não eram os mais pobres que ampliavam seus direitos, mas ela que perdia
seus privilégios — ou sua diferença “positiva” de classe (BRUM, 2019, posição
444).
Ainda nessa linha de pensamento, Margingoni (2017) constrói uma narrativa, para
compreendemos um pouco a elite brasileira, na qual, como ele argumenta, cabe um pouco de
tudo: empresários, artistas, banqueiros, pastores, milionários, jornalistas, políticos
conservadores, estrelas da indústria cultural, etc.
Mas Margingoni (2017), em uma elaboração secundária, entende que essa burguesia
não via, no governo PT, uma solução para a crise econômica e, principalmente, para o
controle dos movimentos populares, gerando uma crise:
Retomando o debate sobre o governo Lula, que foi caracterizado por uma maior
visibilidade internacional, tendo, como um dos marcos dessa diplomacia, a tentativa de
inserção do país no Conselho de Segurança da ONU, como membro permanente, é
interessante o posicionamento de Alles (2015, posição 292): “a diplomacia de Lula buscou
uma inserção internacional, com vistas, ostensivamente, a ampliar o perfil político do país e,
sem confessá-lo, mas de maneira igualmente evidente, contribuir a que o presidente adquirisse
estatura de estadista”.
Para tanto, temos que avaliar alguns pontos: ao iniciar seu primeiro mandato, em 2003,
Lula deu continuidade às políticas macroeconômicas, iniciadas pelo governo anterior. Com a
estabilidade econômica alcançada pelo Plano Real 89, conquistada com o sacrifício de políticas
sociais, foi possível implementar, finalmente, políticas de infraestrutura e de inclusão social e
buscar, nas relações exteriores, um novo posicionamento para o Brasil, como liderança sul-
americana, visando a uma maior participação nos conselhos da ONU.
Lula, em seu discurso de posse, em 2003, analisado por Alles (2015, posição 984),
defende a democratização das relações internacionais e a reestruturação do Conselho de
Segurança da ONU, demandando mais representatividade, não, somente, dos países
desenvolvidos, mas, também, dos países em desenvolvimento. Também, destaca-se que os
novos fios condutores da política externa brasileira seguiriam na busca de uma “globalização
solidaria e humanista” 90. Tal diplomacia solidária poderia ser entendida como a aplicação de
uma ação coletiva internacional, feita por países intervenientes, num conflito interno ou
89
Conjunto de medidas econômicas, elaborado no início da década de 1990, na sequência de tentativas de
estabilização da economia brasileira, depois da crise da dívida externa, no início da década de 1980, que tinha
duas características básicas: a intenção deliberada de fugir aos movimentos bruscos e do elemento-surpresa,
que fizeram a glória e o fracasso de seus antecessores, e que atingiram o paroxismo no Plano Collor; e a
insistência da equipe de governo em anunciar o plano, como uma estratégia multifásica de estabilização, da
qual a reforma monetária seria apenas um momento; não, necessariamente, o mais importante. Essas duas
características tinham o objetivo de desarmar os espíritos dos agentes econômicos, que tinham se habituado a
associar programas de estabilização a perdas súbitas de direitos. Disponível em:
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/plano-real, acessado em 26/01/2020.
90
Alles (2015, posição 1103).
123
91
Alles (2015, posição 1142).
92
Constituição Federal de 1988:
TÍTULO I - DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
IV - Não-intervenção;
93
Disponível em: http://www.cnrh.gov.br/composicao-ctgrht/81-ctgrht/148-acordos-e-tratados-internacionais,
acessado em 27/01/2020.
94
Disponível em: http://www.fao.org/3/to970en/TO970EN.pdf, acessado em 30/01/2020.
95
Disponível em: http://www.fao.org/3/i4356pt/I4356PT.pdf, acessado em 30/01/2020.
124
Nações Unidas sobre o Direito do Mar, promulgada pelo Presidente da República, por meio
do Decreto nº 99.165, de 12 de março de 1990, que teve, como principal objetivo:
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar traz, em seu corpo,
delimitações a serem cumpridas, pelos países que a ratificaram ou que a ela aderiram, no
intuito de preservar a soberania e o meio ambiente de cada país. Portanto, ela determina o
regime jurídico do Mar Territorial, acompanhado de seus espaços aéreo e sobrejacente, leito e
subsolo. Para isso, a soberania do Estado Costeiro se estende, além do seu território e das suas
águas interiores, designadas pelo nome de Mar Territorial.
O alcance estabelecido para o Mar Territorial se estende, até o limite de 12 milhas
marítimas, medidas a partir de linhas de base, determinadas pela Convenção. Em
contrapartida, as águas situadas no interior da linha de base do Mar Territorial fazem parte das
águas interiores do Estado.
Um ponto interessante é o de que alguns locais poderiam ou poderão implantar os
Terminais Pesqueiros Públicos, ampliando o Mar Territorial brasileiro, pois, no Artigo 11 da
Convenção, frisa-se que, para efeitos de delimitação do Mar Territorial, as instalações
portuárias permanentes, ao largo da costa, que sejam parte integrante do sistema portuário,
são consideradas parte da costa. Portanto, são parte das linhas de base, que determinam o
início do Mar Territorial.
Na Convenção, existe, ainda, uma grande preocupação com a paz e com o meio
ambiente, mas, sobretudo, com a soberania do país, quanto ao seu território, portanto o Artigo
17, que trata do Direito de passagem inocente 96, coloca que um navio estrangeiro será
considerado prejudicial à paz, à boa ordem ou à segurança do Estado Costeiro, se realizar, no
Mar Territorial, algumas atividades proibidas. Considerando a atividade pesqueira brasileira,
96
"Passagem" significa navegação no mar territorial, com o fim de: a) Atravessar esse mar, sem penetrar nas
águas interiores, nem fazer escala em ancoradouro ou em instalação portuária situada fora das águas interiores;
e b) Dirigir-se a águas interiores ou delas sair ou fazer escala num desses ancoradouros ou instalações
portuárias.
125
estas atividades proibidas incluem pesca e atos intencionais e graves de poluição. Mas o
Artigo 24 deixa claro que o Estado Costeiro não deve impor dificuldades à passagem inocente
de navios estrangeiros pelo Mar Territorial.
Outro ponto interessante está no Artigo 33, que delimita a zona contígua, que não pode
se estender, além de 24 milhas marítimas, contadas das linhas de base, que servem para medir
a largura do Mar Territorial. Dentro dessa área, o país pode tomar as medidas de fiscalização
necessárias, de modo a evitar infrações às leis e aos regulamentos aduaneiros, fiscais, de
imigração ou sanitários, no seu território ou no seu Mar Territorial. Esse artigo traz alguma
luz a pontos inseridos na legislação dos Terminais Pesqueiros Públicos, como os artigos 2º, 3º
e 4º 97, que tratam sobre a competência de criar, de implementar, de organizar, de administrar
e de fiscalizar os TPPs e acabam dando, por meio dos seus incisos, meios para cumprir o
Artigo 33 da Convenção.
O único ponto da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que trata da
pesca tradicional é o Artigo 51, inciso 1, cujo texto traz um normativo restrito aos estados
denominados arquipélagos:
Artigo 51
Acordos existentes, direitos de pesca tradicionais e cabos submarinos existentes
1. Sem prejuízo das disposições do artigo 49, os Estados arquipélagos
respeitarão os acordos existentes com outros Estados e reconhecerão os direitos de
pesca tradicionais e outras atividades legítimas dos Estados vizinhos imediatamente
adjacentes em certas áreas situadas nas águas arquipelágicas. As modalidades e
condições para o exercício de tais direitos e atividades, incluindo a natureza, o
alcance e as áreas em que se aplicam, serão, a pedido de qualquer dos Estados
interessados, reguladas por acordos bilaterais entre eles. Tais direitos não poderão
ser transferidos a terceiros Estados ou a seus nacionais, nem por eles
compartilhados. (BRASIL, 1990)
97
Decreto nº 5.231, de 6 de outubro de 2004.
126
A zona econômica exclusiva é uma zona situada além do Mar Territorial e a este
adjacente, sujeita ao regime jurídico específico estabelecido na presente Parte,
segundo o qual os direitos e a jurisdição do Estado Costeiro e os direitos e
liberdades dos demais Estados são regidos pelas disposições pertinentes da presente
Convenção.
Artigo 56
Direitos, jurisdição e deveres do Estado Costeiro na zona econômica exclusiva
1. Na zona econômica exclusiva, o Estado Costeiro tem:
a) direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e
gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos das águas sobrejacentes ao leito do
mar, do leito do mar e seu subsolo, e no que se refere a outras atividades com vista à
exploração e aproveitamento da zona para fins econômicos, como a produção de
energia a partir da água, das correntes e dos ventos;
c) jurisdição, de conformidade com as disposições pertinentes da presente
Convenção, no que se refere a:
i) colocação e utilização de ilhas artificiais, instalações e estruturas;
ii) investigação cientifica marinha;
iii) proteção e preservação do meio marinho
2. No exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres na zona
econômica exclusiva nos termos da presente Convenção, o Estado Costeiro terá em
devida conta os direitos e deveres dos outros Estados e agirá de forma compatível
com as disposições da presente Convenção.
3. Os direitos enunciados no presente artigo referentes ao leito do mar e ao seu
subsolo devem ser exercidos de conformidade com a Parte VI da presente
Convenção.
Artigo 57
Largura da zona econômica exclusiva
A zona econômica exclusiva não se estenderá além de 200 milhas marítimas das
linhas de base a partir das quais se mede a largura do Mar Territorial.
Artigo 58
Direitos e deveres de outros Estados na zona econômica exclusiva
1. Na zona econômica exclusiva, todos os Estados, quer costeiros quer sem
litoral, gozam, nos termos das disposições da presente Convenção, das liberdades de
navegação e sobrevoo e de colocação de cabos e dutos submarinos, a que se refere o
artigo 87, bem como de outros usos do mar internacionalmente lícitos, relacionados
com as referidas liberdades, tais como os ligados à operação de navios, aeronaves,
cabos e dutos submarinos e compatíveis com as demais disposições da presente
Convenção.
2. Os artigos 88 a 115 e demais normas pertinentes de direito internacional
aplicam-se à zona econômica exclusiva na medida em que não sejam incompatíveis
com a presente Parte.
3. No exercício dos seus direitos e no cumprimento dos seus deveres na zona
econômica exclusiva, nos termos da presente Convenção, os Estados terão em
devida conta os direitos e deveres do Estado Costeiro e cumprirão as leis e
regulamentos por ele adotados de conformidade com as disposições da presente
Convenção e demais normas de direito internacional, na medida em que não sejam
incompatíveis com a presente Parte.
Artigo 60
Ilhas artificiais, instalações e estruturas na zona econômica exclusiva
127
Artigo 61
Conservação dos recursos vivos
1. O Estado Costeiro deixará as capturas permissíveis dos recursos vivos na sua
zona econômica exclusiva.
128
d) fixação da idade e do tamanho dos peixes e de outras espécies que podem ser
capturados;
e) indicação das informações que devem ser fornecidas pelas embarcações de
pesca, incluindo estatísticas das capturas e do esforço de pesca e informações sobre
a posição das embarcações;
f) execução, sob a autorização e controle do Estado Costeiro, de determinados
programas de investigação no âmbito das pescas e regulamentação da realização de
tal investigação, incluindo a amostragem de capturas, destino das amostras e
comunicação dos dados científicos conexos;
g) embarque, pelo Estado Costeiro, de observadores ou de estagiários a bordo de
tais embarcações;
h) descarga por tais embarcações da totalidade das capturas ou de parte delas
nos portos do Estado Costeiro;
i) termos e condições relativos às empresas conjuntas ou a outros ajustes de
cooperação;
j) requisitos em matéria de formação de pessoal e de transferência de tecnologia
de pesca, incluindo o reforço da capacidade do Estado Costeiro para empreender
investigação de pesca;
k) medidas de execução.
5. Os Estados costeiros devem dar o devido conhecimento das leis e regulamentos
em matéria de conservação e gestão.
(BRASIL, 1990)
A Convenção traz, ainda, artigos, cuja preocupação está nas espécies altamente
migratórias, como as de mamíferos marinhos, de peixes anádromos e de espécies catádromas,
gerando direitos e deveres para o Estado, em suas Zonas Econômicas Exclusivas.
O Estado Costeiro tem a obrigação de proteger e de preservar o meio marinho,
mantendo o direito de soberania, para aproveitar dos seus recursos naturais, conforme o
Artigo 193 da Convenção.
Os demais artigos tratam da cooperação entre Estados, tanto para a preservação quanto
para a circulação das embarcações e para o controle das espécies, ressaltando a preocupação,
quanto aos usos do mar aberto, que é apresentado como patrimônio da humanidade e,
portanto, não pode ser requerido para o bem de um único Estado.
Não entrarei no debate das legislações impactantes a atividade de pesca, que não
estejam ligadas, diretamente, à criação ou à manutenção da política dos Terminais Pesqueiros
Públicos, mas apresento, no ANEXO C, uma breve coleção dessas legislações, começando
pelos Atos Internacionais 98.
A partir desse panorama legislativo direto e indireto sobre a atividade pesqueira e,
consequentemente, sobre os Terminais Pesqueiros Públicos, o próximo subcapítulo abordará
as condições físicas dos terminais propostos, demonstrando a capacidade de alteração do lugar
pela legislação em vigor.
98
BRASIL. Câmara dos Deputados. Legislação sobre pesca e sobre aquicultura [recurso eletrônico]:
dispositivos constitucionais, leis e decretos relacionados à pesca e à aquicultura / Câmara dos Deputados.
Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015. 231 p. (Série Legislação, n. 137).
130
Em 2015, foi apresentada uma lista com 18 Terminais Pesqueiros Públicos (Santana,
Belém, Bragança, Camocim, Beberibe, Natal, Cabedelo, Recife, Aracaju, Salvador, Ilhéus,
Vitória, Campos dos Goytacazes, Niterói, Angra dos Reis, Santos, Cananeia e Laguna),
divididos entre: em operação, em pré-operação, em construção/aparelhamento, em
projeto/licenciamento e em planejamento. Mesmo depois de tantas turbulências, como as
apresentadas nesta tese, as políticas dos TPPs continuam em execução ou, pelo menos, em
debate, em alguns setores, principalmente, no âmbito municipal. Alguns dos
empreendimentos apresentam parcerias público-privadas já constituídas, enquanto outros nem
saíram do papel. A seguir, veremos a situação atual de cada um deles.
O Terminal Pesqueiro Público de Aracajú 99, na capital de Sergipe (Figura 2), teve suas
obras iniciadas em 2015, com previsão da entrega no ano de 2017. No entanto, sua construção
continua parada, em 2019, por falta de recursos, e, até a última pesquisa, não há previsão de
entrega. Os pescadores, principalmente os artesanais, continuam utilizando uma área
improvisada, na lateral do futuro terminal, para o beneficiamento e para a comercialização dos
pescados.
99
Aracaju é a capital do estado de Sergipe, na costa nordeste do Brasil. É conhecida pelas praias, incluindo a
Praia de Atalaia. Junto à praia, há o Oceanário de Aracaju, em forma de tartaruga, que possui arraias, tubarões,
enguias e tartarugas marinhas, além de exposições práticas. O passeio da marginal, a Passarela do Caranguejo,
está repleta de restaurantes de peixes e de mariscos e é marcada por uma enorme escultura de caranguejo.
Disponível em: https://www.google.com/maps/place/Aracaju,+SE/@-11.0059758,-
37.2432428,11z/data=!3m1!4b1!4m5!3m4!1s0x71ab04015be27cd:0x804434fd92ec3b36!8m2!3d-
10.9472468!4d-37.0730823, acessado em 31/08/2020.
100
Disponível em: https://infonet.com.br/noticias/economia/obra-do-terminal-pesqueiro-de-aracaju-continua-
parada/, acessado em 30/01/2020.
131
O Terminal Pesqueiro Público de Laguna 101, em Santa Cataria (Figura 3), é uns dos
poucos em funcionamento pleno, desde 2019. Ele foi assumido pelo Estado de SC e sua
administração foi entregue à SCPar Porto de São Francisco do Sul102, com promessas de
revitalização e de geração de mais empregos. Sua estrutura conta com um cais de 300 metros
de extensão e com três esteiras de recepção de pescados, podendo atracar até dez embarcações
por vez. Ele tem sua origem antes das políticas do TPPs, tendo sido reestruturado, em 2004,
para corresponder à nova legislação, e sua administração, pela Companhia Docas do Estado
de São Paulo (Codesp), empresa pública vinculada ao Ministério da Infraestrutura, vem desde
a década de 1990.
101
Com uma economia voltada principalmente para a pesca, Laguna se destaca pela forte produção de camarão e
siri nas lagoas e de pescados na costa do Atlântico Sul. Banhada pelas lagoas Santo Antônio dos Anjos, Imaruí
e Mirim, a cidade atrai turistas à procura do famoso “Camarão Laguna” . Reconhecido como um dos melhores
do Brasil, o crustáceo é capturado através da pesca artesanal, nos meses de dezembro a junho, do entardecer ao
amanhecer. A atividade utiliza como arte de pesca para a captura do camarão a rede conhecida como
“aviãozinho”, propícia à baixa profundidade das lagoas, inferior a dois metros. A baixa profundidade, por outro
lado, favorece o desenvolvimento do camarão. A técnica utiliza redes com argolas e luz à bateria, para atrair o
crustáceo. À noite, as lagoas são cobertas de luzes, semelhante a uma cidade iluminada, proporcionando um
espetáculo aos visitantes. No Canal de Laranjeiras, na lagoa Santo Antônio, com cinco metros de profundidade,
a captura deve ser feita com tarrafas e somente por pescadores artesanais profissionais. De 15 de julho a 15 de
novembro, período de defeso do camarão, a pesca é proibida no complexo lagunar. Espécies que habitam as
lagoas da região: camarão-rosa (Penaeus paulensis) e camarão-branco (Penaeus Schimitti). Disponível em:
https://www.laguna.sc.gov.br/cms/pagina/ver/codMapaItem/100438, acessado em 31/08/2020.
102
SCPar Porto de São Francisco do Sul S.A., sociedade por ações de propósito específico, com sede na Avenida
Engenheiro Leite Ribeiro, nº 782, Centro, São Francisco do Sul - SC, exerce a gestão do Porto Organizado de
São Francisco do Sul, até o ano de 2036, conforme Convênio de Delegação nº 01/2011, celebrado ente a União
e o Estado de Santa Catarina. Com uma administração autônoma, o porto funciona com a agilidade e com a
eficiência de um terminal privado, respondendo por mais da metade da movimentação portuária do Estado.
103
Disponível em: http://www.scc.sc.gov.br/index.php/noticias/821-estado-assume-terminal-pesqueiro-de-
laguna-e-projeta-criacao-de-empregos, acessado em 30/01/2020.
132
O Terminal Pesqueiro Público de Santos 104, em São Paulo (Figura 4), não está em
funcionamento, atualmente, e passa por uma ação, junto ao Ministério Público, devido à
Prefeitura ter apresentado um projeto para construir, no local, um Centro de Atividades
Turísticas (CAT), a partir de uma parceria público-privada. Segundo o MP, não se pode
utilizar a área para outros fins, que não os voltados à pesca.
104
Cidade de praia, privilegiada pelo sol e pelo mar de águas calmas, mas com infraestrutura de metrópole e
repleta de belezas e de atrações para todas as idades, o ano todo. Assim é Santos, localizada em uma ilha, onde
a cordialidade, a segurança e a diversidade de cenários se aliam a uma riqueza cultural, histórica e ecológica,
transformando a cidade em um destino único, que encanta e apaixona. E tudo isso a apenas 70 km de São
Paulo, a maior metrópole brasileira, perto dos principais aeroportos nacionais e internacionais, e com fácil
acesso por modernas rodovias. Bela e esportiva, Santos é, ainda, uma das principais rotas de cruzeiros
marítimos e se destaca no turismo de negócios, com um dos mais completos complexos de eventos do Brasil.
Santos possui uma economia crescente. Em 2016, a cidade era a 33ª mais rica do país, com produto interno
bruto de 21 954 556,74 de reais. Durante um bom tempo, sua economia se centrou na comercialização do café.
O Complexo Portuário de Santos responde por mais de um quarto da movimentação da balança comercial
brasileira é o principal porto do país, e inclui, na pauta de suas principais cargas, produtos como açúcar, soja,
café, milho, trigo, sal, polpa cítrica, suco de laranja, papel, automóveis, álcool e outros granéis líquidos, em
cargas transportadas em contêineres via porto, trilhos e estradas. A área de influência econômica do porto
concentra mais de 50% do produto interno bruto (PIB) do país e abrange, principalmente, os estados de São
Paulo, de Minas Gerais, de Goiás, de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul. Aproximadamente 90% da base
industrial paulista está localizada a menos de 200 quilômetros do porto santista. Em 2007, o Porto de Santos
foi considerado o 39ª maior do mundo por movimentação de contêineres pela publicação britânica Container
Management, sendo o mais movimentado da América Latina. Disponível em:
https://www.turismosantos.com.br/?q=pt-br/cidade e
https://pt.wikipedia.org/wiki/Santos#:~:text=Santos%20possui%20clima%20tropical%20litor%C3%A2neo,car
acterizam%20como%20esta%C3%A7%C3%B5es%20de%20transi%C3%A7%C3%A3o, acessado em
31/08/2020.
105
Disponível em: https://www.diariodolitoral.com.br/cotidiano/area-do-terminal-pesqueiro-publico-de-santos-
so-pode-utilizada-para-a/122475/, acessado em 30/01/2020.
133
principal serviço, a venda de gelo aos pescadores da região, oferecendo, ainda, combustível
para embarcações, unidade de beneficiamento de pescado, soprador de gelo (equipamento que
coloca o gelo diretamente na embarcação, sem necessidade de esforço físico, por parte dos
pescadores), estrutura de peixaria, caminhão frigorífico e um píer, que comporta cerca de 15
embarcações, simultaneamente.
O Terminal Pesqueiro Público de Camocim 109, no Ceará (Figura 6), gera grande
interesse dos empresários do ramo, de acordo com a Secretaria de Agricultura, Pecuária,
106
É a cidade com o mais extenso litoral entre os municípios do estado. Ilhéus foi fundada em 1536, como "Vila
de São Jorge dos Ilheos", e foi elevada a cidade, em 1881. É conhecida por ambientar os romances de Jorge
Amado, famoso escritor baiano, como Gabriela, Cravo e Canela e Terras do Sem Fim. É considerada a capital
do cacau e denominada, por seus habitantes, como a "Princesinha do Sul". Sua economia se baseia na
agricultura, no turismo e na indústria. Já foi o primeiro produtor de cacau do mundo, mas, depois da
enfermidade conhecida como vassoura-de-bruxa, que infestou as plantações, reduziu consideravelmente a sua
produção. Conhecida também como "IOS", sigla que respeita à grafia antiga do nome da cidade, "São Jorge
dos Ilheos", que é utilizada nos bilhetes de transporte aéreo. Após a década de 1990, com a crise gerada pela
monocultura do cacau, resultante da disseminação do fungo da vassoura de bruxa, que dizimou toda a lavoura
cacaueira da região sul da Bahia, surgiu a necessidade de alternativas de desenvolvimento econômico, dentre
as quais, destacam-se o turismo e a atividade industrial (a criação do polo de Informática). A economia
ilheense deverá experimentar uma nova onda de progresso econômico com a implantação de um novo porto, o
Porto Sul, instalado em águas profundas, e com a chegada da ferrovia integrada à Ferrovia Leste-Oeste.
Também está prevista a construção de um aeroporto capaz de operar voos internacionais. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ilh%C3%A9us, acessado em 31/08/2020.
107
Criada em 1982, a Bahia Pesca, empresa vinculada à Secretaria de Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e
Aquicultura da Bahia (SEAGRI), tem, como finalidade, fomentar a aquicultura e a pesca, mediante a
implantação de projetos sustentáveis, observando a natureza econômica, social, ambiental e cultural, como
forma de contribuir para o desenvolvimento do estado da Bahia. A empresa atua na atração de investimentos,
no desenvolvimento científico, tecnológico, na criação de polos produtores e no fortalecimento das cadeias
produtivas. Disponível em: http://www.bahiapesca.ba.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=6,
acessado em 30/01/2020.
108
Disponível em: http://www.bahiapesca.ba.gov.br/2019/12/686/Pescadores-ja-podem-comprar-gelo-no-
Terminal-Pesqueiro-de-Ilheus.html, acessado em 30/01/2020
134
Irrigação, Pesca e Aquicultura. Passou por uma readequação de sua estrutura, em 2010, que
custou R$ 12,5 milhões aos cofres públicos e, menos de dez anos depois, está desativado. O
terminal de Camocim aguarda que a Secretaria de Pesca lance um edital de concessão. A
intenção do Governo é a de repassar a responsabilidade por esse Terminal para a Companhia
Docas, ainda em 2020 110.
O Terminal Pesqueiro Público de Santana 112, no Amapá (Figura 7), teve suas obras
iniciadas, em 2005, e concluídas, em 2009, tendo sido entregue, em 2012, mas nunca foi
109
Camocim se localiza em um território com uma rica história de intercambio e de conflitos entre povos. Os
primeiros habitantes foram os indígenas de várias etnias, tais como os Tremembé, os Tabajara, os Jurema, os
Jenipaboaçu e os Cambida. As bases da economia do município são extração de sal marinho e a pesca,
complementadas pelas culturas de caju, de arroz sequeiro, de mandioca e de feijão. Na pecuária, há o
desenvolvimento dos rebanhos bovino, suíno e avícola. Na indústria, há 20 unidades no município (uma têxtil,
cinco extrativas minerais, uma de perfumaria, sabão e velas, uma editorial e gráfica, oito de produtos
alimentares, uma de vestuário, calçados e artigos de couro e peles). Disponível em:
http://www.camocim.ce.gov.br, acessado em 31/08/2020.
110
Disponível em: http://site.cdljuazeirodonorte.org.br/dn-dois-terminais-pesqueiros-no-ce-devem-ser-
privatizados-em-2020/, acessado em 30/01/2020.
111
Disponível em: http://www.camocimportaldenoticias.com/2019/12/terminal-pesqueiro-de-camocim-entra-
na.html, acessado em 30/01/2020.
112
Santana tem uma conurbação com o município de Macapá, a capital do estado, formando a Região
Metropolitana de Macapá. As duas totalizavam quase 630 mil habitantes, em 2018. É o segundo município
mais populoso do estado, com cerca de 120 mil habitantes, conforme estatísticas de 2018 do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O município de Santana tinha, segundo dados do IBGE de 2016,
o Produto Interno Bruto de cerca de R$ 1.809.277.000,00 e o PIB per capita era de R$ 15.891,21. O setor
econômico é comandado pela criação de gados bovino, bubalino e suíno, além da atividade pesqueira e a
extração da madeira, ademais da venda de produtos tipicamente nortistas (madeira e açaí), que também
contribuem para o desenvolvimento econômico de Santana. No setor primário do município, há um total de 14
empresas, segundo o CAGED. Santana mantém, sob o seu domínio, o Distrito Industrial de Santana, cujo
parque sofre constante ampliação. Entretanto, funcionam as empresas Flórida e Equador e, também, as
empresas Reama (que industrializa a Coca-Cola no estado) e Amcel (responsável pela plantação de pinhos e de
eucalipto), entre outras. Segundo o CAGED, há um total de 119 estabelecimentos (sendo 116 industriais e 3
extrativos) atuando na cidade. O comércio (incluindo a Área de Livre Comércio de Macapá e Santana
135
O Terminal Pesqueiro Público de Natal114, no Rio Grande do Norte (Figura 8), ficará
situado no Porto de Natal, na Ribeira, e a concessão do equipamento passará a ser,
oficialmente, de domínio do estado do Rio Grande do Norte. O governo do estado do RN
(ALCMS)) e os serviços contribuem economicamente. Os funcionários do serviço público são os que recebem
as maiores remunerações, movimentando o comércio. Segundo o CAGED, há no total 1.407 estabelecimentos
de setor terciário, atuando na cidade. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Santana_(Amap%C3%A1),
acessado em 31/08/2020.
113
Disponível em: https://www.diariodoamapa.com.br/cadernos/cidades/ministerio-publico-do-trabalho-faz-
audiencia-publica-sobre-terminal-pesqueiro-de-santana/, acessado em 30/01/2020.
114
A cidade de Natal tem uma boa infraestrutura básica. Hoje, quase 100% de seus domicílios são atendidos pela
rede elétrica e mais de 93% são ligados ao abastecimento de água. Por outro lado, menos de 30% tem
saneamento básico. Sua economia é baseada no turismo, sendo o estado do Rio Grande do Norte forte em
petróleo e em sal e em produtos de exportação, como: melão, coco, camarão, castanha, café, cana-de-açúcar.
Em Natal há um bom número de pousadas e de hotéis, sendo alguns de grande porte, principalmente, na Via
Costeira, embora seus principais atrativos naturais estejam ao longo da costa potiguar. O comércio em Natal é
diversificado e possui boa oferta de produtos. O serviço portuário vem se modernizando e já apresenta tarifas
competitivas. O aeroporto Augusto Severo, localizado no município de Parnamirim, foi ampliado para 10 mil
metros quadrados, oferecendo condições adequadas ao embarque e ao desembarque anual de 1,5 milhão de
passageiros e uma movimentação de 8 milhões de toneladas de carga. Outro aeroporto está sendo construído no
município de São Gonçalo do Amarante e a previsão é de que esteja concluído em 2014. Natal aparece no
censo qualitativo da hotelaria nacional, da Associação Brasileira da Industria Hoteleira (ABIH), na oitava
posição, no que diz respeito à disponibilidade de hotéis, respondendo por 1,2% da hospedagem no mercado
nacional. O censo toma por base uma pesquisa feita em 7.003 hotéis e pousadas distribuídos pelo país.
Disponível em: http://turismo.natal.rn.gov.br/simb.php, acessado em 31/08/2020.
136
entregou um projeto de concessão do Terminal para a iniciativa privada, que será feita, por
meio de licitação pública. A construção do Terminal Pesqueiro foi iniciada em 2009 e
paralisada, por descumprimento de contrato, por parte da construtora. O RN é o maior
exportador de atum do Brasil, que compreende uma cadeia produtiva, que engloba a pesca
artesanal, em especial, na região de Areia Branca, e a pesca industrial. Os recursos financeiros
para a reconstrução do Terminal Pesqueiro são do próprio governo do estado, em parceria
com a União. Com relação ao projeto de retomada da obra, que está sendo concebido pela
Secretaria de Infraestrutura (SIN), este ainda não tem cronograma definido 115.
O Terminal Pesqueiro Público de Cabedelo 117, na Paraíba (Figura 9), está desativado
e, segundo o Ministério Público Federal, não possui vigilância, energia ou água, além da
depredação e do abandono do prédio, cujos portões estão derrubados. Ainda de acordo com a
ação, o local se tornou fonte de insegurança para a população. A vistoria do MPF ocorreu em
115
Disponível em: https://www.blogdobg.com.br/tag/obra/, acessado em 30/01/2020.
116
Disponível em: http://www.pontodevistaonline.com.br/justica-determina-estado-assuma-terminal-pesqueiro-
provisoriamente/, acessado em 30/01/2020.
117
Cabedelo é município da Região Metropolitana de João Pessoa, no estado da Paraíba. Tem uma área de 31,42
quilômetros quadrados, com medidas singulares: 18 quilômetros de extensão por apenas três quilômetros de
largura. Sua população, em 2018, foi estimada, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 66.680
habitantes. Cabedelo conquistou e perdeu autonomia, por algumas vezes, para a cidade de João Pessoa. Através
da Lei nº 283, de 17 de março de 1908, obteve autonomia, ficando o povoado elevado à condição de vila.
Perdeu os foros de vila e de município, pela Lei Estadual nº 676, de 20 de novembro de 1928, a qual anexou o
seu território ao município da capital. Possui um produto interno bruto superior a 2,2 bilhões de reais, segundo
dados atualizados de 2007, ou seja, mais da metade da economia de Campina Grande (outra grande cidade do
estado) numa área muito menor e com população também bastante inferior. Possui um dos maiores Produtos
Internos Brutos proporcionais do Nordeste, comparável ao de cidades, como Ipojuca e Guamaré. Disponível
em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Cabedelo, acessado em 30/01/2020.
137
agosto de 2018, junto com a Polícia Federal e com a Advocacia-Geral da União (AGU), e, em
setembro de 2018, houve um vazamento de amônia, que causou a interdição do local. Após
outra ação do órgão, a segurança foi restabelecida, em outubro do mesmo ano 118.
O Terminal Pesqueiro Público de Belém 119, no Pará (Figura 10), ainda se encontra em
fase de conclusão de obras, aguardando investimentos do Governo Federal, com proposta de
impulsionar o desenvolvimento regional e de fomentar redes de arranjos produtivos locais,
ligados à Rota do Peixe, estratégia do programa Rotas da Integração Nacional 120.
118
Disponível em: https://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2019/09/23/uniao-deve-apresentar-projeto-para-o-
terminal-pesqueiro-de-cabedelo-decide-jfpb.ghtml, acessado em 30/01/2020.
119
Santa Maria de Belém do Grão Pará, ou simplesmente Belém do Pará, está localizada ao nordeste do estado, à
120 km do mar e à 160 km da linha do equador. Possui, aproximadamente, 1.059,406 km² (IBGE) de área
territorial, sendo a capital do estado do Pará. A economia belenense se baseia, primordialmente, nas atividades
de comércio e de serviços, embora seja também desenvolvida a atividade industrial, com grande número de
indústrias alimentícias, navais, metalúrgicas, pesqueiras, químicas e madeireiras. A Grande Belém se localiza
na região mais dinâmica do estado e, juntamente com o município de Barcarena, integra o segundo maior
parque industrial da Amazônia. A cidade conta com os portos brasileiros mais próximos da Europa e dos
Estados Unidos (Belém, Miramar e Outeiro). Com a revitalização dos distritos industriais de Icoaraci e de
Ananindeua, a implantação da Hidrovia do Tocantins e com a chegada da Ferrovia Norte-Sul, a cidade aguarda
um novo ciclo de desenvolvimento. Podemos ter, como exemplo, o Círio de Nazaré, uma das maiores
procissões cristãs do planeta, que movimenta a economia da Cidade. Disponível em:
http://www.belem.pa.gov.br/, acessado em 31/08/2020.
120
Disponível em: https://www.diarioonline.com.br/noticias/para/noticia-391179-terminal-pesqueiro-de-belem-
recebera-r-33-mi.html, acessado em 30/01/2020.
138
Fonte: http://www.alleanzaprojetos.com.br/projetos/?pagina=5
O Terminal Pesqueiro Público de Beberibe 123, no Ceará (Figura 12) está em uma
situação, que reflete uma realidade nacional: pensado para alavancar o mercado de pescados,
está inutilizado. Previa a ampliação do cais de atracação das embarcações em 50 metros e a
121
Disponível em: http://pactoseimpactos.blogspot.com/2012/03/terminal-pesqueiro-de-belem-tera-32-mil.html,
acessado em 30/01/2020.
122
A cidade de Bragança é o maior polo pesqueiro do Estado do Pará, exportando sua produção, principalmente,
para as capitais do Nordeste e do estado do Pará. Há grandes atividades, em termos de pecuária, de agricultura
e de extrativismo de caranguejos. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Bragan%C3%A7a_(Par%C3%A1), acessado em 31/08/2020.
123
Beberibe é um município brasileiro do estado do Ceará, localizando-se na microrregião de Cascavel, na
mesorregião do Norte Cearense. Sua população, estimada em 2017, era de 53.110 habitantes. Sua economia é
ainda baseada na cultura de cana-de-açúcar, bem como na cultura do caju, do coco-da-Bahia, da mandioca, do
milho e do feijão. Na pecuária, há destaque para a produção dos rebanhos bovino, suíno e avícola. Em suas
terras, registram-se ocorrências de Lepidolita, fonte de obtenção do Lítio, de Moscavita, de Biotita e de
grandes jazidas de Quartzo e de Feldspato. No setor da indústria, Beberibe é um dos grandes produtores de
tijolos do Ceará, sediando, ainda, dez indústrias (cinco de produtos minerais não metálicos, duas de produtos
alimentares, uma de extração mineral e duas de vestuário, de calçados e de artigos de couro e peles).
Disponível em: https://www.beberibe.ce.gov.br/omunicipio.php, acessado em 31/08/2020.
139
construção de um imóvel de dois pavimentos, com 536 m² de área. A estrutura seria feita para
comportar as unidades de recepção, de seleção e de classificação de pescados, de
processamento, de conservação, de expedição dos produtos, além de servir como apoio
administrativo. A construtora executou, apenas parcialmente, o objeto do contrato e
abandonou a obra, que teve início em 2007 124.
124
Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/editorias/negocios/parado-ha-anos-terminal-
pode-ser-privatizado-1.1293762, acessado em 30/01/2020.
125
Recife é a capital do estado de Pernambuco, localizado na Região Nordeste do país. Com área territorial de,
aproximadamente, 218 km², é formado por uma planície aluvial, tendo as ilhas, penínsulas e manguezais como
suas principais características geográficas. Cidade nordestina com o melhor Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH-M), o Recife é a quarta capital brasileira na hierarquia da gestão federal, após Brasília, Rio de
Janeiro e São Paulo, e possui o quarto aglomerado urbano mais populoso do Brasil, com 4 milhões de
habitantes, em 2017. Existem, na metrópole pernambucana, áreas industriais, como o Polo Automotivo Fiat
Chrysler Automobiles e o Complexo Industrial e Portuário de Suape (que abriga, entre muitos
empreendimentos, a Refinaria Abreu e Lima e o Estaleiro Atlântico Sul ‒ maior estaleiro do Hemisfério Sul.
Também merece destaque a indústria da construção civil da cidade. O Recife possui centenas de arranha-céus
residenciais e comerciais, sendo superada, neste indicador, no país, apenas por São Paulo e pelo Rio de Janeiro,
que têm áreas municipais mais de cinco vezes superior à da capital pernambucana. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Recife, acessado em 31/08/2020.
126
Disponível em: http://www.recife.pe.leg.br/noticias_antigas/terminal-pesqueiro-do-recife-ainda-nao-tem-
local-definido, acessado em 30/01/2020.
140
O Terminal Pesqueiro Público de Salvador 127, na Bahia (figura 13), foi inaugurado em
2012, está em funcionamento e é administrado pela empresa pública Bahia Pesca, tendo,
como principal serviço, a venda de gelo aos pescadores da região. Está localizado no Largo da
Ribeira. O TPP pode realizar descarga, recepção, manuseio, armazenagem, classificação,
pesagem e estatística do pescado; fabricar e armazenar gelo; fazer reparos e manutenções de
embarcações; além de dar acesso a combustível subsidiado.
O Terminal Pesqueiro Público de Vitória 128, no Espírito Santo (Figura 14), está sob
investigação do Ministério Público Federal (MPF), desde o final de 2018. O prédio foi
entregue à Superintendência de Pesca e Aquicultura do Espírito Santo. O TPP está em
funcionamento, mas com “Reboco caindo, ferrugem, pintura descascando, lugares precisando
de reforma, com muito lixo, muita sujeira em um ambiente que precisava andar limpo, com
127
Salvador é um município brasileiro e capital do estado da Bahia. Situada na Zona da Mata da Região
Nordeste do Brasil, Salvador é notável em todo o país pela sua gastronomia, por sua música e por sua
arquitetura. Nas últimas décadas, com o rápido crescimento da sua população, bem como pela necessidade de
moradias e de empregos, vários prédios de escritórios e de apartamentos foram construídos, muitas vezes, no
lugar das antigas edificações do período colonial, o que causou uma perda irreparável na história da cidade.
Conta com uma grande refinaria de petróleo, um polo petroquímico, centros de abastecimento e galpões
industriais em seu território e em seu entorno. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Salvador, acessado
em 31/08/2020.
128
Vitória é um município brasileiro, capital do estado do Espírito Santo, localizado na Região Sudeste do país.
É uma das três capitais do país, cujo centro administrativo e a maior parte do município estão localizados em
uma ilha, a Ilha de Vitória. A economia de Vitória é voltada para as atividades portuárias, ao comércio ativo, à
indústria, à prestação de serviços e ao turismo de negócios. A capital capixaba conta com dois portos, que são
dos mais importantes do país: o Porto de Vitória e o Porto de Tubarão. As indústrias mais importantes da
capital são a ArcelorMittal Tubarão (antiga CST) e Vale SA (antiga CVRD/Companhia Vale do Rio Doce).
Esses portos, junto com vários outros do estado, formam o maior complexo portuário do Brasil. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Vit%C3%B3ria_(Esp%C3%ADrito_Santo), acessado em 31/08/2020.
141
higiene 100%” 129. Além da deterioração física, o abandono também prejudica documentos
importantes para os pescadores, incluindo a confecção de documentações solicitadas pela
Fundação Renova, para embasar o cadastramento dos atingidos pelo crime da Samarco/Vale-
BHP.
Fonte: https://seculodiario.com.br/130
129
Disponível em: https://seculodiario.com.br/public/jornal/materia/pescadores-denunciam-abandono-do-
terminal-pesqueiro-da-praia-do-sua, acessado em 30/01/2020.
130
Disponível em: https://seculodiario.com.br/public/jornal/materia/pescadores-denunciam-abandono-do-
terminal-pesqueiro-da-praia-do-sua, acessado em 30/01/2020.
131
Campos dos Goytacazes é um município brasileiro situado no interior do estado do Rio de Janeiro, na Região
Sudeste do país. Durante toda a República, a economia regional viveu períodos de altos e de baixos, em função
do preço internacional do açúcar, mas sempre mantendo sua importância de mercado nas economias estadual e
nacional. Ao final dos anos 1980, os municípios de Campos, de Macaé e de Conceição de Macabu tinham uma
agroindústria açucareira expressiva. A ascensão de São Paulo, como maior produtor nacional, seus altos níveis
de produtividade, além da expansão da área cultivada no Nordeste do país, aliados à falta de modernização do
complexo campista, fizeram com que a região passasse a ser coadjuvante no contexto nacional. O
endividamento de algumas usinas obrigou muitas delas a fechar, atingido, consequentemente, a economia da
região Norte Fluminense. A descoberta de petróleo na bacia de Campos, nos anos 1970, e a construção do
Superporto do Açu têm contribuído, para a recuperação da região, nos dias de hoje. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Campos_dos_Goytacazes, acessado em 31/08/2020.
132
Disponível em: https://www.campos.rj.gov.br/exibirNoticia.php?id_noticia=27557, acessado em 30/01/2020.
142
133
Niterói é um município da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, no estado do Rio de Janeiro, na Região
Sudeste do Brasil. Foi a capital estadual. Niterói é um dos principais centros financeiros e comerciais do estado
do Rio de Janeiro. O município vem acompanhando um alto índice de investimentos na Região Metropolitana
da cidade do Rio de Janeiro, com a qual é altamente conurbada, com investimentos no setor imobiliário, em
atividades financeiras e no setor de comércio. Segundo os dados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística de 2010, a cidade possui a maior renda per capita domiciliar do Brasil, com média de R$ 3.037,30
por pessoa, fazendo com que seja considerada a “cidade com a população mais rica do Brasil”. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Niter%C3%B3i#Economia, acessado em 31/08/2020.
134
Disponível em: https://www.atribunarj.com.br/burocracia-atrasa-retomada-do-terminal-pesqueiro-de-niteroi/,
acessado em 30/01/2020.
135
Disponível em: https://www.atribunarj.com.br/niteroi-tera-o-maior-terminal-pesqueiro-do-brasil-diz-
secretario/ acessado em 30/01/2020.
136
Disponível em: https://www.atribunarj.com.br/terminal-pesqueiro-precisa-de-us-16-milhoes-para-operar/,
acessado em 30/01/2020.
143
O Terminal Pesqueiro Público de Angra dos Reis 137, no Rio de Janeiro, segundo a
última pesquisa feita, continua em estudo preliminar. O projeto inicial foi apresentado à
Prefeitura do município e seu o esboço prevê, além das áreas voltadas para a pesca,
tratamento de esgoto e reforma dos banheiros públicos locais (que estão interditados); um
centro gastronômico, com restaurantes à beira-mar; e uma praça pública, com pista de skate,
para o lazer da população. A forma de viabilizar a construção do TPP será pela realização de
parceria público-privada 138.
O Terminal Pesqueiro Público de Cananeia 139, em São Paulo (Figura 16), apresenta
uma estrutura de, aproximadamente, 27 mil metros quadrados, que já conta com toda a
infraestrutura, para receber os pescados, porém, hoje, se encontra sucateado, trabalhando
apenas com 10% de sua capacidade. O poder legislativo local busca a revitalização do TPP,
com os objetivos de diminuir o preço final dos pescados e de gerar novos postos de trabalho,
propondo, ainda, que ele seja mais do que um entreposto pesqueiro e que vire um polo
turístico, que poderia abrigar boxes de venda de pescado e, até mesmo, um restaurante140.
137
Angra dos Reis é um município brasileiro situado no sul do estado do Rio de Janeiro. As usinas nucleares da
Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto se situam em Angra dos Reis, no distrito de Mambucaba, e são
responsáveis pelo fornecimento de grande parte da energia elétrica consumida no estado do Rio de Janeiro. As
atividades econômicas giram em torno da pesca, de atividades portuárias, da geração de energia nas usinas
Angra I e Angra II, de comércio e de serviços, da indústria naval ‒ por meio do estaleiro Keppel Fels, antigo
Verolme ‒ e, também, do turismo, em suas praias, ilhas e locais de mergulho submarino, principalmente, os da
localidade de Ilha Grande. A cidade conta as principais redes do varejo. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Angra_dos_Reis, acessado em 31/08/2020.
138
Disponível em: http://angranews.com.br/projeto-do-terminal-pesqueiro-publico-de-angra-foi-apresentado/,
acessado em 30/01/2020.
139
Cananeia é situada no litoral sul do Estado de São Paulo, junto à divisa com o Paraná, e é constituída por
vasto arquipélago, com inúmeras ilhas e parques florestais, com áreas de restrições ambientais e com reservas
marítimas. O turismo é, junto com a pesca, a alavanca econômica local, com a agricultura também
contribuindo, porém de forma incipiente, dadas as restrições ambientais, que lhe são impostas. o município
abriga a Praça Martim Afonso, em seu lugar mais central, entre a foz do rio Olaria e a bancada de residências
centenárias, existentes defronte ao Mar de Dentro. Disponível em: http://cidadeilustre.blogspot.com/2013/12/o-
entreposto-ceagesp-de-cananeia-e-o.html acessado em 31/08/2020.
140
Disponível em: http://www.lincolnreis.com.br/index.php/artigos/item/1393-vereador-busca-apoio-para-
revitalizacao-de-terminal-pesqueiro-publico-de-santos, acessado em 30/01/2020.
144
141
Disponível em: http://cidadeilustre.blogspot.com/2013/12/o-entreposto-ceagesp-de-cananeia-e-o.html,
acessado em 30/01/2020.
145
interessado na busca incessante pelo lucro rápido, enquanto outros estão centrados na procura
por políticas de maior visibilidade social.
146
CONSIDERAÇÕES FINAIS
legislação, pela qual o Estado propõem a reestruturação da atividade pesqueira, sem que esta
fosse uma demanda direta dos pescadores.
Não estou descontruindo todo o trabalho das últimas décadas das lideranças locais dos
pescadores, que pressionaram os governos, em todas as escalas, apontando problemas e
procurando soluções para a categoria, mas não posso deixar de lado, ao contrário, que os
acordos internacionais, principalmente, o da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do
Mar (CONUDM), que teve sua origem no pós-Guerra, em meados do século XX,
pressionaram o governo brasileiro a construir uma legislação, que respeitasse os usos
propostos para os recursos marinhos e que, também, influenciasse a utilização dos recursos
fluviais.
Essa influência internacional na legislação tem sua origem na Convenção sobre o
Direito do Mar das Nações Unidas e continua, com a ação da Organização das Nações Unidas
para Alimentação e Agricultura (FAO), pela introdução, no final do século XX, do Código de
Conduta para a Pesca Responsável, no intuito de ajudar os países a assumirem um enfoque
mais responsável no manejo da pesca, baseado nos ecossistemas.
Como pudemos observar no decorrer da tese, os pontos apresentados pela FAO são
bem semelhantes aos expostos na legislação brasileira sobre a atividade pesqueira. A
atividade pesqueira nacional vem sendo construída e reconstruída, durante o último século,
não, somente, no intuito de sustentar plenos direitos aos pescadores, mas na geração de
garantias, para o Estado, do seu controle territorial, como demostrei, inicialmente, ao abordar
a legislação de formação das Colônias de Pescadores, no início do século XX, e,
posteriormente, com os Terminais Pesqueiros Públicos e com as demais legislações que o
acompanharam, para fortalecer o controle da Zona Econômica Exclusiva, por meio de
parcerias público-privadas.
Portanto, a atividade pesqueira nacional continua sofrendo o controle do Estado, no
início do século XXI, porém, agora, com um viés internacional, por meio do qual o país se
esforça para ter uma colocação de maior prestígio no mercado internacional.
Por esse caminho, posso afirmar que, em tese, os Terminais Pesqueiros Públicos e sua
regulamentação, pelo Estado, acabam gerando, direta ou indiretamente, uma fragmentação ou,
até, a extinção dos núcleos pesqueiros locais, por meio de acontecimentos, como os leilões de
pescado, que ocorrem nas madrugadas, em praticamente todas as Colônias de Pescadores,
com o intuito de escoar a produção do dia anterior, e a limitação de uso dos pequenos
atracadouros das associações e dos armadores, que, no último século, se tornaram referência
para a atividade pesqueira regional, escoando as produções locais e regionais e procurando
149
um bom preço para o pescado. Tais pontos são um lastro da identidade, não, somente, para os
pescadores, mas para todas a pessoas que vivem em seu entorno, que utilizam estes espaços
como fonte de trabalho ou como origem de seu alimento.
Tal rompimento não é um fato novo; ele já foi realizado, pelo Estado, no início do
século XX, como demostrando neste trabalho. Em minha dissertação, referida no início desta
tese, e no decorre das descrições legislativas, usando, não, somente, os campos da História,
mas os da Geografia e os do Direito, busquei chegar a uma compreensão do processo
legislativo, que serviu como alicerce para a implantação dos Terminais Pesqueiros Públicos,
caracterizados, pelo Estado, como nova forma geradora de parcerias público-privadas,
trazendo uma nova compreensão do território, da soberania e da regulação, que ainda não
havia sido aplicada à atividade pesqueira.
Um ponto marcante do primeiro capítulo teórico foi o de que, mesmo com essas
parcerias público-privadas, o Estado, em seu exercício cotidiano de hegemonia soberana, que
lhe confere o monopólio dos meios de produção, através das normas jurídicas, não perde sua
função, a partir da desregulamentação da economia. Com isso, tal construção legislativa,
mesmo que influenciada por demandas estatais, conjugadas com normativas de convenções e
com acordos internacionais, leva os Terminais Pesqueiros Públicos e seus múltiplos agentes
produtores de normas a delimitar novos contextos políticos, ainda que sem extinguir o poder
do Estado, pois fica claro que a nova política se torna externa aos indivíduos, porém exige
uma adesão interna, por parte dos sujeitos.
Nesse sentido, os Terminais Pesqueiros Públicos, além de serem uma reestruturação
política da cadeia produtiva da pesca, configuram, também, uma forma de difusão de
infraestruturas pelo território, que adquirem uma centralidade e que interligam diferentes
regiões, remontando ao passado da atividade pesqueira e a sua participação na formação
territorial do país, na qual o Estado tem um papel definido e a corporação, igualmente,
embora, neste novo momento da História, tenhamos a inserção do sujeito trabalhador como
mero objeto da legislação e como validador do programa jurídico, conforme demonstrado na
regulamentação dos TPPs, dentro da qual os conselhos de pescadores têm pouca participação
nas demandas necessárias para gerir toda a atividade, mas estão presentes para ratificar as
ações dos agentes administrativos oficiais, sejam públicos, sejam privados.
Na audiência pública de 18 maio de 2015, para regulamentar o Decreto nº 5.231, de 6
de outubro de 2004, pode-se notar a participação de vários agentes públicos e privados na
busca da normatização perfeita para os interesses do mercado. No setor público, além dos
órgãos já esperados, como o antigo Ministério da Pesca e Aquicultura, junto com a Marinha
150
encerrar e para ofuscar o espaço, dando um corpo completo à política dos Terminais
Pesqueiros Públicos e gerando, ao pescador, a visualização dessa possível nova dependência
dos fixos, implantados pelo Estado, mesmo sob o viés da relação entre políticas público-
privadas e Administração Federal.
Outro ponto é o do limite das lutas dos pescadores. Hoje, tal limite está ligado às
instituições representativas da atividade pesqueira, que ainda são parte da ossatura do Estado,
mesmo que não aparentem, pois são regidas e alimentadas, a partir de políticas públicas, e têm
sua ação ainda vinculada à regulamentação e à normatização da vida do pescador, junto ao
Estado, portanto têm, na sua estrutura, a territorialização estatal, estando inseridas no que se
pode denominar território normado, que termina por ser a grande mediação entre o mundo e
as sociedades locais e a nacional, já que, para a sua funcionalização, o mundo necessita de
mediação com os lugares, cuja descrição, ressalto, penso ter alcançado nesta tese, ou seja,
acredito ter obtido uma maior compreensão sobre todo o processo de criação dos Terminais
Pesqueiros Públicos, o que poderá ampliar o debate sobre seus usos, no futuro.
Como já mencionado nesta tese, o Brasil tem um gigantesco potencial para a atividade
pesqueira, detendo cerca de 13% da água doce do planeta, 8,4 mil km de costa marítima, que
apresenta uma diversidade de fauna e de flora comparada à encontrada na Amazônia, além de
contar com 3,5 milhões de km² de Zona Econômica Exclusiva (ZEE), para a exploração, tanto
dos recursos naturais quanto dos recursos minerais, e com 5,5 milhões de hectares de lâmina
d’água represada. Mas, mesmo com a criação do Ministério da Pesca e com todo o processo
legislativo aplicado na execução dos Terminais Pesqueiros Públicos, ainda se pode notar, no
último capítulo da tese, como ressaltado pela FAO, no início do trabalho, a falta de autonomia
administrativa e financeira, pela alta exposição política das instituições envolvidas, o que
impossibilitou ou dificultou o tratamento das demandas do setor pesqueiro, com
discernimentos técnicos e legais específicos para um funcionamento pleno, seja por parceria
público-privada, seja pelo controle estatal, tornando a política dos Terminais Pesqueiros
Públicos ainda incompleta, em nível local, como fixo, mas bem-sucedida, no campo
legislativo, no que concerne ao cumprimento dos acordos internacionais.
152
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161
DOS OBJETIVOS
Art. 2º. A audiência tem por objetivo debater sobre a proposta de nova regulamentação da
criação e administração dos Terminais Pesqueiros Públicos – TPPS, bem como prestar
esclarecimentos à população, permitindo-se a manifestação de eventuais interessados, desde
que previamente inscritos.
Globais:
- Convenção Sobre a Instalação de Forças Hidráulicas de Interesse de Vários Estados,
adotada em Genebra, em 9 de dezembro de 1923 (r.t.s.d.n., n° 36, 1925, p. 76);
- Convenção sobre a Proteção e o uso dos Cursos D’água Transfronteiriços e dos
Lagos Internacionais (Helsinque, 1992).
Regionais:
- Tratado da Bacia do Prata (Brasília, 23/04/1969);
- Convenção que Constitui um Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do
Prata (Fonplata) (Buenos Aires, 12/06/1974);
- Acordo Tripartite de Cooperação Técnica e Operacional, entre Itaipú e corpus, entre
Argentina, Brasil & Paraguai (Ciudad Presidente Stroessner, 19/10/1979).
Grande de Sete Quedas ou Salto Del Guairá até a Foz do Iguaçu (Brasília,
26/04/1973);
- Brasil & Paraguai, Acordo de Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável e a
Gestão Integrada da Bacia Hidrográfica do Rio Apa (Brasília, 11/09/2006);
- Brasil & Uruguai: Acordo Referente ao Transporte Fluvial e Lacustre (Rivera,
Uruguai, 12 de junho de 1975);
- Brasil & Uruguai: Acordo de Cooperação para o Aproveitamento dos Recursos
Naturais e o Desenvolvimento da Bacia do Rio Quaraí (Artigas, Uruguai, 11 de março
de 1991);
- Brasil & Uruguai: Troca de Notas Constituindo um acordo para a Aplicação, de
Forma Provisória, do Acordo de Cooperação para a o Aproveitamento dos Recursos
Naturais e o Desenvolvimento da Bacia do Rio Quaraí (Artigas, Uruguai, 11 de março
de 1991);
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Naturais e o Desenvolvimento da Bacia da Lagoa Mirim (Brasília, 7 de julho de
1977);
- Brasil & Uruguai: Protocolo para o Aproveitamento dos Recursos Hídricos do
Trecho Limítrofe do Rio Jaguarão (Protocolo do Rio Jaguarão – Anexo ao Tratado da
Bacia da Lagoa Mirim) (Brasília, 7 de julho de 1977);
- Brasil & Uruguai: Estatuto da Comissão Mista Brasil & Uruguay, para o
Desenvolvimento da Bacia da Lagoa Mirim (Brasília, 7 de julho de 1977);
- Brasil & Uruguai: Troca de Notas para Aumentar o Número de Membros de cada
uma das Partes na Comissão da Lagoa Mirim (Brasília, 16 de setembro de 1991);
- Brasil & Uruguai: Troca de Notas Constituindo um Acordo que estabelece uma
comissão Mista para o Aproveitamento da Lagoa Mirim (Montevideo, Uruguai, 26 de
abril de 1963);
- Brasil & Uruguai: Troca de Notas Constituindo um Acordo referente à Comissão
Mista para o Aproveitamento da Lagoa Mirim (Brasília, 20 de maio de 1974);
- Argentina & Paraguai: Convenção Referente à Realização de Estudos Técnicos sobre
a Produção de Energia Elétrica no Rio Paraná, na Altura das Ilhas de Yacyretá e Apipé
(Buenos Aires, 23/01/1958);
- Argentina & Paraguai: Convenção sobre o uso do Rio Paraná no Trecho entre a Foz
do Rio Iguaçú e a Seção Encarnación-Posadas (Buenos Aires, 16/06/1971);
- Argentina & Paraguai: Tratado de Yacyreta (Asunción, 03/12/1973);
180
Diretivas:
- Diretiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23/10/2000, que
estabelece Um Quadro de Ação Comunitária no Domínio da Política da Água.
Resoluções:
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Diversos:
- International Law Association: Regras de Helsinque sobre o uso de Águas de Rios
Internacionais, Relatório da 52ª Conferência, em Helsinque, de 14 a 20 de agosto de
1966;
- Conselho da Europa, Carta Européia da Água, em Estrasburgo, em 06/05/1968.
Também é possível ver alguns acordos ou atos, que envolvem a temática do meio
ambiente, os quais impacta diretamente a pesca artesanal. Dentre esses, se destacam os
multilaterais:
Globais:
- Convenção Relativa às Zonas Úmidas de Importância Internacional, Particularmente
como Habitat de Pássaros Aquáticos (Ramsar, 02/02/1971);
- Convenção sobre Diversidade Biológica (Rio de Janeiro, 05/06/1992);
- Convenção sobre a Luta Contra a Desertificação nos Países Gravemente Atingidos
pela Seca e/ou Desertificação, Particularmente na África (Paris, 17/06/1994);
- Convenção sobre os Povos Indígenas e Tribais nos Países Independentes, organizada
pela OIT (Genebra, 07/06/1989 – ratificada pelo Brasil, em 25/07/2002);
- Convenção sobre a Responsabilidade Civil por Danos Resultantes de Atividades
Perigosas para o Meio Ambiente, organizada pela CE (Lugano, 21/06/1993).
Além dos multilaterais, com a problemática do meio ambiente, temos alguns acordos
bilaterais, que também impactam a atividade pesqueira:
Brasil x ...
- Brasil & Uruguai: Tratado de Amizade, Cooperação e Comércio (Rivera, Uruguai,
12 de junho de 1975 ‒ entrada em vigor em 09/07/1976);
- Brasil & Uruguai: Acordo Básico de Cooperação Científica e Técnica (Rivera,
Uruguai, 12 de junho de 1975 ‒ entrada em vigor em 09/07/1976);
- Brasil & Uruguai: Acordo de Pesca e Preservação de Recursos Vivos, com
ratificação pelo Decreto-Lei nº 412, de 09/01/1969;
- Brasil & Colômbia: Acordo para a Conservação da Flora e da Fauna dos Territórios
Amazônicos, com ratificação pelo Decreto Legislativo n° 72, de 03/12/1973, com
promulgação pelo Decreto nº 78.017, de 12/07/1976;
- Argentina & Chile: Convenção para a Proteção das Florestas Contra Incêndios
(Santiago, 29/12/1961).
Além dos acordos relacionados ao meio ambiente, existem outros atos, que também
impactam a atividade pesqueira:
Declarações:
- Declaração Da Conferência Das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente (Estocolmo,
1972);
- Carta Mundial da Natureza (ONU, Resolução nº 37/7, de 1982);
- Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992);
- Declaração de Princípios, Juridicamente Não Compulsória, mas Tendo Autoridade
Para Um Consenso Mundial Sobre A Gestão, A Conservação E A Exploração
Ecologicamente Viável De Todos Os Tipos De Florestas (Rio de Janeiro, 05/06/1992);
- Declaração de Joanesburgo sobre Desenvolvimento Sustentável (Joanesburgo,
04/09/2002);
- Declaração de São Francisco de Quito, em 07/03/1989, feita pela Bolívia, Brasil,
Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela.
Resoluções:
- Disposições Institucionais E Financeiras Sobre A Cooperação Internacional Em
Matéria De Meio Ambiente (ONU, Resolução nº 2997, de 1972);
183
Continuando com a Leis e com os Decretos-Leis, que não estão ligadas diretamente
aos TPPs, mas os impactam, indiretamente:
• DECRETO-LEI Nº 221, DE 28 DE FEVEREIRO DE 1967 - Código de Pesca -
Dispõe sobre a proteção e sobre os estímulos à pesca e dá outras providências;
• LEI Nº 7.356, DE 30 DE AGOSTO DE 1985 - Determina a inclusão de parágrafo no
art. 5º da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social),
regulando a inclusão dos pescadores, no regime dessa lei;
• LEI Nº 7.643, DE 18 DE DEZEMBRO DE 1987 - Proíbe a pesca de cetáceo nas águas
jurisdicionais brasileiras e dá outras providências;
• LEI Nº 8.171, DE 17 DE JANEIRO DE 1991 - Dispõe sobre a política agrícola;
• LEI Nº 8.617, DE 4 DE JANEIRO DE 1993 - Dispõe sobre o mar territorial, a zona
contígua, a zona econômica exclusiva e a plataforma continental brasileiros e dá outras
providências;
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