Ligia 1
Ligia 1
Ligia 1
Fátima Aparecida Lopes da Silva ajuizou ação revisional de contrato em face de BV Financeira
S/A Crédito, Financiamento e Investimento. Sustentou, em síntese, que ajustou com o
requerido um contrato de financiamento do veículo descrito na inicial a ser pago em 48
parcelas mensais de R$ 1.584,00. Argumentou que os juros cobrados são excessivos, bem
como as cláusulas contratuais de tarifa de avaliação do bem, seguro e registro de contrato.
Dessa forma requer sejam declaradas nulas as cláusulas abusivas, e ao final julgados
procedentes os pedidos, a fim de reduzir as parcelas (fls.01/11). Juntou documentos
(fls.12/34).
É o relatório. DECIDO.
O feito comporta julgamento antecipado, pois as questões de fato estão demonstradas nos
autos (art. 355, I, do CPC).
Retifique-se o polo passivo da demanda, para que passe a constar BANCO VOTORANTIM S/A,
procedendo-se às anotações de praxe.
A preliminar de inépcia da petição inicial ante a falta de fundamentação específica não merece
prosperar, isto porque a petição inicial atende aos requisitos do art. 319 do CPC e possibilita o
direito de defesa.
A parte requerida não trouxe qualquer elemento concreto que justificasse a revogação da
assistência judiciária gratuita, razão pela qual rejeito essa impugnação.
A demanda em tela possui dois argumentos centrais quais sejam: alegação de juros excessivos
e tarifas abusivas.
No que tange a alegação de juros excessivos, observa-se que a ação tem por objeto contrato de
financiamento de veículo celebrado pelas partes, por intermédio
do qual a financeira ré financiou o carro que a parte autora queria adquirir, sendo que o valor
das parcelas era fixo.
Nesse sentido, o contrato em discussão (fls.23/28) não possui qualquer cláusula ilícita ou
abusiva, inexistindo onerosidade excessiva, desequilíbrio contratual ou pratica lesionaria,
ausente, enfim, qualquer ofensa a normas do Código de Defesa do Consumidor.
As parcelas do empréstimo são fixas. Então, bastava que a parte autora multiplicasse o valor
das parcelas pelo número e obteria o valor final que pagaria. Com isso poderia calcular o
percentual dos juros.
Aliás, às fls.23 está claro e devidamente informado todos os valores inclusos na operação
bancária, de sorte que a parte autora teve ciência prévia de todos os encargos e valores, não
podendo agora alegar que foi enganada.
Como tenho dito em casos similares, esta é mais uma das milhares de ações que ao longo dos
últimos anos tem sido apresentadas ao Judiciário por devedores inadimplentes de
financiamentos, para discutir pretensas irregularidades, abusos ou ilicitudes cometidas pelas
instituições financeiras que lhes concederam crédito, buscando ampla revisão dos contratos
firmados.
A proteção do contratante mais fraco na legislação consumerista, com direito à revisão dos
contratos nos casos de adoção de práticas e cláusulas abusivas (art. 6, IV do CDC), lesão ao
consumidor (art. 6º, V, in fine, do CDC), não pode ser encarada como um direito potestativo, ou
em termos menos jurídicos, como um verdadeiro cheque em branco concedido ao consumidor.
Ao contrário, a revisão contratual no CDC além de não prescindir da precisa comprovação das
hipóteses previstas do Código, deve ser interpretada em consonância com os princípios
maiores da proteção ao ato jurídico perfeito e da segurança jurídica, dos quais decorre um
outro, não expresso, mas implícito no sistema jurídico constitucional vigente, de que não
comportam revisão obrigações já extintas.
Bem a propósito vale lembrar a lição de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR de que “sem o
respaldo da segurança jurídica na contratação dos negócios jurídicos, anula-se o próprio
princípio da legalidade, criando-se verdadeiras armadilhas, na vida contratual. Isto porque,
admitida a instabilidade do vínculo produzido pelo contrato, não teria a contratante o
conhecimento prévio e reflexivo das consequências de seu negócio, daí surgindo um clima de
incerteza e intranquilidade, correspondente a um quadro de profundo antagonismo com a
dinâmica constitucional (...) A função social do contrato, estabelecida a partir dos postulados,
da boa-fé objetiva e da lealdade entre os contratantes não pode ser entendida, obviamente,
como algo incompatível com a segurança jurídica. Sem essa segurança é claro que não se
viabiliza a realização concreta dos fundamentos e objetivos permanentes do Estado
Democrático de Direito, onde a preservação do ato jurídico perfeito e do direito adquirido se
apresenta como condição sine qua non da estabilidade das relações sociais, mediante projeção
pratica do conhecimento antecipado e reflexivo dos atos, fatos e consequências por eles
desencadeados, à luz do critério da previsibilidade (...) A segurança jurídica é, pois, para o
ordenamento constitucional, um alicerce sobre o qual se assentam todos os demais princípios
fundamentais. Apresenta-se como o 'fruto final do Estado de Direito', já que é dela que surge o
clima geral que permite o desenvolvimento e a civilização; e , por isso mesmo, as pessoas
razoavelmente cultas têm sempre a convicção de que 'nenhum valor isolado, por mais valioso
que seja, vale o sacrifício da segurança jurídica'” (“Direitos do consumidor”, Ed. Forense, 2000,
pp. 14-15).
De outra sorte, a parte autora também insurge-se contra a cobrança das seguintes tarifas, as
quais entende serem abusivas:
Antes é preciso ressaltar que a instituição financeira requerida não tem qualquer razão ao
sustentar que por se tratar de contrato de financiamento não estaria sob a égide do Código de
Defesa do Consumidor. É o teor da súmula nº 297 do STJ: “O Código de Defesa do Consumidor
é aplicável às instituições financeiras”.
1ª tese: Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN
2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê
(TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame de abusividade
em cada caso concreto;
2ª tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços
bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas
em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem
respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de
Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de
Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a
qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição
financeira;
Ademais, não demonstrada qualquer abusividade em tais tarifas, as quais foram fixadas em
valores módicos (R$ 435,00 referente à tarifa de avaliação e R$ 144,14 referente à tarifa de
registro de contrato).
Assim, não se sustenta a alegação de que os acréscimos são provenientes de cláusulas leoninas
e abusivas, visto que a parte autora assumiu e contratou por sua própria vontade, valendo
salientar que tais informações estão suficientemente claras no contrato.
972), relatado pelo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, fixou as seguintes teses para os efeitos
do art. 1.040 do CPC:
Conforme se vê, segundo o entendimento fixado pelo Tribunal, não basta assegurar ao
consumidor a liberdade de contratar ou não o seguro, sendo imprescindível que se assegure
também a liberdade de escolha da seguradora, inclusive daquelas não integrantes do mesmo
grupo econômico da instituição financeira, sob pena de se configurar a venda casada.
Não há que falar-se em erro justificável na conduta da instituição financeira, a qual tem ciência
da irregularidade de tal cobrança deste a superveniência da Resolução nº 3.954/2011, do
BACEN e do Código de Defesa do Consumidor.
Assim, nos termos do art. 42, Parágrafo único, da Lei 8.078/90, o consumidor tem direito ao
ressarcimento em dobro do valor pago indevidamente. Na espécie, R$ 1.503,32, corrigidos pela
Tabela Prática do TJ/SP e com juros de mora de 1% ao mês, tudo desde a citação.
P.R.I.
Oportunamente, arquivem-se