Refletindo Ciencia Tecnologia Sociedade

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Refletindo acerca da Ciência, Tecnologia e Sociedade: enfocando o Ensino

Médio

Refletindo acerca da Ciencia, Tecnología y Sociedad: enfocando a


Educación Secundaria

Nilcéia A. M. Pinheiro1
Eloiza A. S. Ávila de Matos2
Walter Antonio Bazzo3

Resumo

O artigo tem por objetivo discutir a relevância de se trabalhar, em sala de aula, temas que
contemplem as relações existentes no contexto científico-tecnológico e social. Para tanto, expõe-se
como a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) tem tratado tais questões em nível
de Ensino Médio. Enfatiza-se que os trabalhos desenvolvidos no referido nível de ensino, foram
subsidiados pelos pressupostos epistemológicos do enfoque CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade)
a partir de pesquisa empírica assentada em premissas da investigação-ação. Destaca-se, assim, a
necessidade de o público escolar ter subsídios suficientes, em seu processo de formação, para
entender e julgar a veracidade das evidências colocadas pela ciência e pela tecnologia, comparando-
as com outras também significativas, a fim de que possam tomar decisões coerentes diante de
problemas que envolvam a sociedade.

Palavras-chave: Ensino Médio, Educação Tecnológica, Enfoque CTS

1- Introdução

Por fazer parte de um contexto social em constante movimento e mutação, é


possível afirmar que a educação precisa sofrer transformações de forma cada vez mais
rápida, haja vista a nova compreensão que se tem sobre o papel da escola como elemento
de desenvolvimento social, estimulada pela incorporação de novos conhecimentos, quer
sejam eles científicos ou tecnológicos. Estes conhecimentos têm sido produzidos num
volume avassalador, constantemente superados, colocando novos parâmetros para formação
do cidadão, pois conhecer não significa acumular conhecimentos. Dessa forma, a atual
sociedade, marcada pela revolução tecnológica, vem exigir da escola que esta possa

1
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
2
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
3
Universidade Federal de Santa Catarina
oportunizar a formação de competências básicas, tanto no exercício da cidadania como no
desempenho de atividades profissionais. Tal exigência é estabelecida na Constituição
Brasileira de 1988, por meio do seguinte dispositivo:

A educação, direito de todos, é dever do estado e da família e será promovida e


incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho. (BRASIL, 1988, Art. 205).

O referido dispositivo torna-se explícito no Art. 22 da atual LDB, sendo


responsável pelo seu cumprimento a Educação Básica:

A Educação Básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurando-lhe


a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecendo-lhe
meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores. (BRASIL, 1999).

Em seu artigo 21, a LDB considera como Educação Básica o conjunto formado
pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, sendo este último
considerado como “etapa final da Educação Básica”.
O interessante a se destacar é que foi somente na atual LDB que o Ensino Médio
recebeu identidade própria. Revisitando a história da educação brasileira1, no contexto que
enfatiza a origem do Ensino Médio, percebe-se que é antiga a discussão em torno da função
social desse grau de ensino. Todavia, na atual LDB, em que o Ensino Médio é considerado
como parte integrante da Educação Básica, fica evidenciado que a sua função primordial é
completar a formação do indivíduo para a vida social, enquanto cidadão. O caráter
formativo, atribuído ao Ensino Médio, foi conseguido pelas lutas que se travaram a fim de
se conseguir uma extensão de obrigatoriedade para esse grau de ensino. Incorporado na
Constituição como resultado das pressões populares, esse dispositivo visa a estender o
acesso ao Ensino Médio para todos os cidadãos brasileiros.
Com isso, não se pode mais reduzir o Ensino Médio ao objetivo restrito de
preparação para o Ensino Superior (função essa, que lhe foi atribuída em grande parte das
leis educacionais, até então, existentes), nem à função de formação profissionalizante. É
notório, no contexto da sociedade científico-tecnológica, que não se exija do cidadão
apenas o domínio da leitura, do cálculo e da escrita, faz-se mister que se saiba interpretar o
mundo.
Portanto, é no espaço do Ensino Médio, também, que se deve gerar aos educandos
oportunidades que lhes permitam a formação de importantes capacidades:

[...] capacidade de abstração, do desenvolvimento do pensamento sistêmico, ao


contrário da compreensão parcial e fragmentada dos fenômenos, da criatividade,
da curiosidade, da capacidade de pensar múltiplas alternativas para solução de
um problema, ou seja, do desenvolvimento do pensamento divergente, da
capacidade de trabalhar em equipe, da disposição para procurar e aceitar críticas,
da disposição para o risco, do desenvolvimento do pensamento crítico, do saber
comunicar-se, da capacidade de buscar conhecimento. (BRASIL, 1999, p.
27).

Com o intuito de desenvolver as referidas capacidades, as propostas, que


resultaram na reforma curricular do Ensino Médio, pautaram-se na construção de novos
conhecimentos e seus desdobramentos, voltados à produção e às relações sociais de modo
geral.
Um dos principais enfoques previsto para o Ensino Médio é o de preparar o aluno
para a vida, de forma que, a partir dos conhecimentos que construirá, consiga relacioná-los
com o contexto científico-tecnológico e social no qual está inserido, como supõe a própria
concepção de cidadania explicitada na proposta educacional vigente: “[...] a cidadania não é
uma condição ou qualidade separada da aprendizagem escolar. É, antes de qualquer coisa, a
aplicação prática daquilo que o aluno aprende nos conteúdos curriculares, é o conhecimento
das ciências, das linguagens, das matemáticas, utilizadas de modo responsável, solidário e
includente.” (BRASIL, 1999, p. 98).
Para tanto, o redesenho do Ensino Médio exige um novo olhar sobre as dimensões
da ciência, tecnologia e seus impactos nessa sociedade em constante transformação. O que
significa voltar-se para o esteio da Educação Tecnológica. Segundo Bastos (1998, p. 100),
“a interação entre todos os sujeitos envolvidos na produção e no desenvolvimento
tecnológico é fundamental para que a tecnologia seja verdadeiramente democratizada e
participativa.” É imprescindível que as pessoas envolvidas com o progresso tecnológico
tenham consciência crítica, diante de situações, como por exemplo: por que motivo a
maioria da população vive sob condições de miséria, sem oportunidades de superar as
desigualdades sociais? Nessa perspectiva, o ensino da ciência e da tecnologia no Ensino
Médio, deve permitir a percepção da interação da ciência e da tecnologia com todas as
dimensões da sociedade, considerando as suas relações recíprocas oportunizando ao
educando uma concepção ampla e humanista da tecnologia.
Para Carvalho (1998, p.101), “a educação tecnológica pode desenvolver essa
postura crítica, sendo uma das vias a formação de uma consciência de diversidade de
interesses no desenvolvimento tecnológico e da noção de sujeito social, que tenha espaço
político para lutar por seus interesses.” Há, aqui uma percepção profunda de paradigma
onde o educando/sujeito deixa seu status de cognoscente, que se relaciona com objetos e
passa a estabelecer novas relações intersubjetivas para a construção de um entendimento e,
por conseguinte, de um conhecimento científico, que inclui a reação, reelaborando-o,
ampliando-o, enfim, criando possibilidades de ação. Dessa forma, a Educação Tecnológica
em nível médio, deve propiciar situações de aprendizagem que reputem a ciência e a
tecnologia, como resultados de escolhas sociais. Nesse cenário, considera-se que o
professor é o grande articulador permitindo a mobilização dos saberes, o desenvolvimento
do processo e a realização de projetos nos quais os alunos estabeleçam conexões entre o
conhecimento adquirido e o pretendido, com a finalidade de resolver situações-problema,
em consonância com as condições intelectuais, emocionais e contextuais dos alunos.
Com vistas às situações, até aqui tecidas, o objetivo para esse artigo é o destacar a
importância de trazer para a sala de aula questões que contemplem as relações existentes
entre o contexto científico-tecnológico e social, apresentando como a Universidade
Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) tem tratado as questões relativas à ciência,
tecnologia e sociedade em nível de Ensino Médio.
As discussões tiveram como eixo catalisador, inicialmente, a disciplina de Princípios
Tecnológicos, a qual possibilitou um avanço para as demais disciplinas presentes no
currículo do citado nível de ensino. Destaca-se que tanto os trabalhos desenvolvidos nessa
disciplina, quanto os que se tem desenvolvido à posteriori, foram subsidiados pelos
pressupostos epistemológicos do enfoque CTS (Ciência-Tecnologia-Sociedade), pondo em
relevo um trabalho de investigação-ação em sala de aula. A opção por esse enfoque, se deu
pelo fato de possibilitar a participação conjunta dos indivíduos de forma crítica, reflexiva e
consciente em sua atuação na realidade. Já, a escolha pela investigação-ação ocorreu pela
possibilidade de as atividades pedagógicas serem entendidas dentro de uma dimensão
conscientizadora e não apenas de obtenção de informações. Nesse caso, o pesquisador
dispõe de um conhecimento prévio que funcionará como ponto de partida, como gerador de
idéias ou diretrizes para nortear a pesquisa e as interpretações. Ao longo do processo,
descortinarão questões que demandarão novos conhecimentos, novas reflexões e novas
tomadas de consciência, sem perder de vista a construção coletiva e colaborativa do
conhecimento.

2- Ciência, Tecnologia e Sociedade: abrindo espaço no Ensino Médio


Muitos dos estudos hoje desenvolvidos, levantam questionamentos em relação à
forma de como o ensino das várias disciplinas vem sendo apresentadas. O enfoque abstrato,
quantitativo, rigoroso, suscita no dia-a-dia da sala de aula, um caráter demasiado acadêmico
e distante das experiências dos alunos, o que não permite prepará-los como cidadãos
críticos de seu contexto social.
É necessário ultrapassar a meta de uma aprendizagem apenas de conceitos e de
teorias, relacionadas com conteúdos abstratos e neutros, para um ensino mais cultural que
proporcione uma melhor compreensão, apreciação e aplicação da ciência e da tecnologia,
levando-se em conta as questões sociais e, entendendo, que tanto a ciência, quanto a
tecnologia são resultados do saber humano e, que portanto, estarão sempre presentes em
nossas vidas.
Assim, mediante a estas questões surge um novo enfoque, que pode ser trazido
para a prática de sala de aula, e objetiva não apenas possibilitar a experimentação da
tecnologia dentro das tarefas práticas, mas sim procurar uma relação recíproca entre
ciência, tecnologia e sociedade. Esse enfoque recebe o nome de CTS. Este campo de
trabalho se mostra ainda muito recente em nossa sociedade, porém, já nasceu com caráter
crítico, tanto em relação à visão essencialista da ciência e da tecnologia, quanto à visão
interdisciplinar entre as áreas do conhecimento. Uma das grandes metas do modelo CTS é
dotar as pessoas de habilidades e competências, tornando-as capaz de debater e discutir
questões científicas e tecnológicas que permeiam a sociedade.
O movimento CTS teve suas origens nos acontecimentos de 1960 e 1970, os quais
causaram profundas mudanças no cenário dos países europeus e da América do Norte, e
vindo mais tarde a refletir-se no mundo de forma geral. Esses movimentos pautaram-se em
questionamentos em torno da ciência e da tecnologia, com relação às armas nucleares e
químicas, agravamento dos problemas ambientais e seus impactos na vida das pessoas. A
partir desses questionamentos, organizações começaram a tomar corpo em prol de uma
educação científica e tecnológica.
Devido às circunstâncias em que esses movimentos surgiram, e também seus
objetivos para com a sociedade, verificou-se a importância de trazê-los para a sala de aula,
com o intuito de se possibilitar a compreensão da dimensão social da ciência e da
tecnologia, numa visão crítica-reflexiva, e segundo Palacios et al. (1996, p. 60) de:

Através desses estudos, compreender a dimensão social da ciência e da


tecnologia, tanto desde o ponto de vista dos seus antecedentes sociais como de
suas conseqüências sociais e ambientais, ou seja, tanto no que diz respeito aos
fatores de natureza social, política ou econômica que modulam a mudança
científico-tecnológica, como pelo que concerne às repercussões éticas, ambientais
ou culturais dessa mudança.

Dessa forma, o enfoque CTS ganhou espaço no contexto educacional, visando a


promover o letramento científico e tecnológico que ultrapasse conteúdos isolados, incluso
no currículo dos alunos, sem contextualização. Pelo enfoque CTS é possível “capacitar o
cidadão a participar no processo democrático de decisões e promover a ação cidadã
encaminhada à solução de problemas relacionados à tecnologia na sociedade industrial.”
(WALKS, 1990, p. 97).
É reconhecida a validade de trazer esse enfoque para um trabalho conjunto com as
várias disciplinas que compõem o currículo, desenvolvendo um trabalho que possa levar o
aluno a compreender a influência da ciência e da tecnologia e a interação entre elas. Essa
afirmativa encontra respaldo nas várias competências constantes nos Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEMs), distribuídas entre as suas três áreas:
Linguagens, Códigos e suas tecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas
tecnologias; Ciências Humanas e suas tecnologias.
Aparecem marcadamente nas áreas citadas, a importância de formar um aluno que
seja cidadão de um mundo simbólico e letrado, tomado de tecnologias; da relação entre o
conhecimento científico-tecnológico, a vida social e produtiva e os aspectos relacionados
ao contexto da vida social; as questões ambientais relativas à qualidade de vida e saúde; e
às questões éticas relacionadas às ciências.
Argumenta-se que em uma sociedade tecnológica, as linguagens são muitas e só
consegue ler o mundo aquele que tem olhos críticos e reflexivos, ou seja, aquele que sabe
ouvir, responder e questionar pelo poder de argumentar em favor dos interesses sociais.
Os PCNEMs apontam, da mesma forma, que não basta ter o conhecimento sobre a
ciência e a tecnologia e entender sua linguagem, é preciso ter princípios de ação cidadã,
entendendo a sociedade como uma construção coletiva, que se reconstrói continuadamente
num processo de ação ininterrupta. Nessa perspectiva, fica subentendido, que é preciso
possibilitar aos alunos uma alfabetização contínua para capacitá-los a participar do
processo democrático de tomada de decisões, promovendo a ação cidadã encaminhada à
solução de problemas relacionados à sociedade na qual está inserido.
Na direção exposta nos PCNEMs, alguns trabalhos subsidiados pelo enfoque CTS
já vêm sendo desenvolvidos de forma a contribuir com o ensino, e para que este possa
desenvolver competências e habilidades críticas e reflexivas necessárias para o
enfrentamento dessa sociedade tecnológica. A maioria desses trabalhos têm priorizado o
viés da investigação-ação, a qual se caracteriza como uma pesquisa participante, que visa
unir a pesquisa à ação ou à prática, isto é, desenvolver o conhecimento e a compreensão
como parte da prática. Dessa forma, a investigação-ação torna-se forte aliada daquelas
pessoas que fazem parte da prática educacional e têm a intenção de melhorar sua
compreensão sobre ela.
Estando categorizada como interpretativista, a investigação-ação detém uma
natureza argumentativa, permitindo que as interpretações da realidade observada e as ações
transformadoras sejam objetos de deliberação. Encontram-se suas raízes em Thiollent
(1988, p. 14), a pesquisa-ação é uma pesquisa social com base empírica que é concebida
em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no
qual os pesquisadores e os participantes estão envolvidos de modo cooperativo ou
participativo.
Segundo Thiollent (1988), na pesquisa-ação, há como o próprio nome aponta, uma
ação por parte dos pesquisadores, ação esta, problemática, que mereça investigação para ser
elaborada e conduzida. Não obstante, os pesquisadores têm papel ativo no equacionamento
dos problemas encontrados, no acompanhamento e avaliação das ações, organizando assim
sua intervenção.
Este tipo de pesquisa é uma forma de experimentação em situação real, na qual os
pesquisadores intervêm conscientemente. Os participantes não são reduzidos a cobaias e
desempenham um papel ativo. As variáveis, de seu lado, não são isoláveis, posto que todas
elas interferem no que está sendo observado. Logo, assim como nas outras pesquisas da
linha interpretativista, a substancialidade dos pesquisadores não é total, pois o que cada
pesquisador observa e interpreta nunca é independente da sua formação, de suas
experiências anteriores e do próprio “mergulho” na situação investigada.
As experiências que têm sido concretizadas com o enfoque CTS, no Ensino Médio
que se caracterizam como investigação-ação podem ser classificadas em três grupos, de
acordo com Walks (1990) e Sanmartim (1992): introdução de CTS nos conteúdos das
disciplinas de ciências (enxerto CTS); a ciência vista por meio de CTS; e CTS puro. E
consoante com Palacios et al. (1996), pode-se resumir os objetivos dessas três modalidades
da seguinte forma:
 Enxerto CTS: introdução de temas CTS nas disciplinas de ciências, abrindo
discussões e questionamentos do que seja ciência e tecnologia. Nos Estados Unidos
podemos citar o projeto Harvard Project Physics e na Europa o projeto SATIS (Science
and Technology in Society) que englobam essa modalidade.
 Ciência e tecnologia por meio de CTS: estrutura-se o conteúdo científico por meio do
CTS. Essa estruturação pode acontecer numa só disciplina ou por meio de trabalhos
multidisciplinares e interdisciplinares. Pode-se ver esse tipo de trabalho no PLON (Projeto
de Desenvolvimento Curricular em Física), trabalhado na Holanda.
 CTS puro: ensina-se ciência, tecnologia e sociedade por intermédio do CTS, no qual
o conteúdo científico tem papel subordinado. O projeto mais conhecido nessa modalidade é
o SISCON (Studies in a Social Context), na Inglaterra.
No Brasil, arrolam-se os estudos de Bazzo (1998); Mion, Angotti e Bastos (1999);
Bazzo e Colombo (2001); Bazzo e Cury (2001); Cruz (2001); Auler (2002); Santos e
Schnetzler (2003); Koepsel (2003), Pinheiro e Bazzo (2004), Pinheiro (2005), os quais em
sua maioria, envolvem o trabalho com a modalidade do enxerto CTS.
O enfoque CTS inserido nos currículos é um impulsionador inicial para estimular o
aluno a refletir sobre as inúmeras possibilidades de leitura acerca da tríade: ciência,
tecnologia e sociedade, com a expectativa de que ele possa vir a assumir postura
questionadora e crítica num futuro próximo. Isso implica dizer que a aplicação da postura
CTS ocorre não somente dentro da escola, mas também extramuros. De acordo com Osório
(2002, p. 64):

O enfoque educativo em CTS, tanto recupera os espaços críticos dessa relação


conjunta ao desenvolver as implicações e os fins do desenvolvimento científico-
tecnológico em um emaranhado social, político e ambiental, se nos apresenta
como um campo de análises propício para entender e educar o fenômeno
tecnocientífico moderno.2 (Tradução dos autores)

Nesse encaminhamento, o ensino-aprendizagem passará a ser entendido como a


possibilidade de despertar no aluno a curiosidade, o espírito investigador, questionador e
transformador da realidade. Emerge daí a necessidade de buscar elementos para a resolução
de problemas que fazem parte do cotidiano do aluno, ampliando o conhecimento para
utilizá-lo nas soluções dos problemas coletivos de sua comunidade e da sociedade.
Ao se propor uma estratégia conjunta em torno do enfoque CTS, há um
compromisso com a construção de uma nova metodologia para o ensino, caracterizando a
sala de aula como um cenário de pesquisa, na qual a investigação-ação estará presente. Isso
não denota uma mudança radical no programa de ensino da escola, mas pressupõe que se
complemente a base curricular. Com o enfoque CTS, a própria concepção de ciência e
tecnologia se transforma. O conhecimento científico passa a ser entendido como produção
do homem na constante luta para superação de suas dificuldades, na interpretação dos
fenômenos, na resolução dos problemas que afetam a sociedade, enfim, na busca de
melhores condições de vida.

3- Discutindo Ciência, Tecnologia e Sociedade no Ensino Médio da UTFPR


Ao se conduzir uma reestruturação nas leis que regem o contexto educacional e o
estabelecimento de suas diretrizes curriculares, muito se tem a caminhar para que as
propostas se efetivem. É condição sine quanon interpretar o que se pretende com cada
objetivo e as possíveis direções para atingi-los. Enfoca-se, sobremaneira, aos objetivos do
Ensino Médio e, por conseguinte, às diretrizes traçadas pelos PCNEMs como percurso
para avançar em busca da concretização desses objetivos.
Cabe, aqui, destacar alguns dos objetivos trazidos pelos PCNEMs para implementar
as discussões levantadas. Sendo assim, é condição necessária ao Ensino Médio:
A formação da pessoa, de maneira a desenvolver valores e competências
necessárias à integração de seu projeto individual ao projeto da sociedade em
que se situa; o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a
formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento
crítico; a preparação e orientação básica para a sua integração ao mundo do
trabalho, com as competências que garantam seu aprimoramento profissional e
permitam acompanhar as mudanças que caracterizam a produção no nosso
tempo; o desenvolvimento das competências para continuar aprendendo, de
forma autônoma e crítica, em níveis mais complexos de estudos. (BRASIL,
1999a, p. 23)

Diante do exposto, verifica-se que a função social é latente na concepção


formativa do Ensino Médio, vinculada à formação do indivíduo em sociedade, enquanto
cidadão. Isso significa que os objetivos do Ensino Médio, em sua prioridade, deixam de ser
a preparação para o ensino superior ou formação profissionalizante. Emerge, em pauta, um
currículo que:

[...] promova no indivíduo tanto em termos de desenvolvimento pessoal, quanto


em termos do desenvolvimento social, quando ele poderá questionar e
posicionar-se, por exemplo, quanto à hegemonia das nações que detêm o poder
do conhecimento científico-tecnológico. (GRINSPUN, 1999, p. 28).

Para que isso ocorra, nos PCNEMs reafirmam-se a necessidade de um [...]


fortalecimento dos laços de solidariedade e de tolerância recíproca; formação de valores;
aprimoramento como pessoa humana; formação ética; exercício da cidadania. (BRASIL,
1999a p.161).
Destarte aparece explícito no corpo da proposta educacional que a sociedade
moderna exigirá do cidadão muito mais do que saber ler, escrever e contar. Alvitra-se que
para o aluno acompanhar os níveis de desenvolvimento da sociedade em seus vários
setores, precisará ter conhecimentos relacionados à estética da sensibilidade, que valoriza o
lado criativo e favorece ao trabalho autônomo; a política da igualdade, que busca a
solidariedade e respeita a diversidade, como base para a cidadania; e a ética da identidade,
que promove a autonomia do educando, da escola e das propostas pedagógicas. A educação
deverá contribuir para a autoformação do aluno, estimulando-o a assumir a condição
humana, incentivando-o a viver, de forma a tornar-se um cidadão que, numa democracia,
será definido por sua solidariedade e responsabilidade.
Todos estes saberes são, igualmente, necessários para que o educando possa viver
e atuar nessa “ sociedade moderna e tecnológica”, saberes que abarcam a compreensão da
ciência e da tecnologia, e suas presenças contínuas em nosso meio.
Seguindo nesse alinhamento, a LDB põe em relevo, em seu artigo 36 que o Ensino
Médio destacará a educação tecnológica, a compreensão do significado da ciência, das
letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a língua
portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da
cidadania. O artigo demonstra que o educando, além de ter acesso aos conhecimentos
relacionados à ciência e à tecnologia, precisará entender como esses processos se
formaram, em que eles implicam, quais as suas conseqüências e que tipo de atitudes, o
cidadão deverá ter diante de determinados problemas. Isso significa que preparar, nesse
patamar, é permitir que o aluno efetive sua participação, enquanto componente de uma
comunidade, buscando informações diretamente vinculadas aos problemas sociais que
afetam o cidadão e seu meio, exigindo um posicionamento ao encaminhamento de
soluções, torna-se primazia no Ensino Médio.
A formação de um cidadão crítico-refexivo e ativo pressupõe que no Ensino
Médio se dê condições para que ele compreenda a natureza do contexto científico-
tecnológico e seu papel na sociedade. Isso implica a necessidade de adquirir conhecimentos
básicos sobre filosofia e história da ciência, para estar a par das potencialidades e
limitações do conhecimento científico, e só, e somente então, possa tomar suas decisões,
subsidiado em evidências e fundamentos para equacionar os posicionamentos que
assumirá.
Com esse encaminhamento, o Ensino Médio na UTFPR construiu suas bases na
Educação Tecnológica voltada ao contexto científico-tecnológico, sem qualificação
profissional formal. Ela alicerça a preparação do futuro cidadão-trabalhador, capaz de
pensar, agir, decidir, fugindo dos modelos divisionistas do trabalho com competência para
o enfrentamento de uma sociedade em constante mudança. Entre seus objetivos, salienta-se
o de permitir ao futuro cidadão-profissional desenvolver uma visão social da evolução da
tecnologia, das transformações oriundas do processo de inovação e das diferentes
estratégias empregadas para conciliar os imperativos econômicos às condições das
sociedades.
A Instituição presume, desse modo, a reflexão e avaliação como método,
proposição de novos conceitos e modos de pensar e ensinar. Para o quê, concebe como
essencial o estabelecimento das relações entre conceitos e as várias linguagens. Nesse
prisma, a disciplina de Princípios Tecnológicos, foi instituída como parte diversificada do
Ensino Médio, na UTFPR. O principal objetivo das disciplinas da parte diversificada, de
acordo com a LDB, é "... de enriquecimento curricular, ou mesmo aprofundamento de
estudos[...]. Desenvolver e consolidar conhecimentos das áreas, de forma contextualizada,
referindo-os a atividades das práticas sociais e produtivas.” (BRASIL, 1999, p.46).
A disciplina de Princípios Tecnológicos estabelecia como principal objetivo,
contribuir na compreensão do desenvolvimento dos conhecimentos científico-tecnológicos
e de suas implicações sociais, econômicas, culturais e ambientais. Visava, ainda, à
alfabetização científica e tecnológica, tendo em vista uma sociedade transformada pela
ciência e pela tecnologia, requerendo dos cidadãos o manejo dos saberes científicos e
tecnológicos, tanto em atividades profissionais, democráticas, operativas, metafísicas ou
mesmo lúdicas. Identificava-se com todas as áreas do conhecimento, pois se inter-
relacionava com as ciências da natureza, as ciências humanas e as linguagens, ao incluir
conteúdos voltados para o questionamento de cada ciência em suas relações com a
tecnologia e a sociedade.
Conduzia-se pelo desenvolvimento de atividades que favoreciam espaço para
exposição de pensamentos, argumentos e convicções dos alunos concernentes às questões
emergentes no contexto científico-tecnológico e social. Esses procedimentos permitiam
planejar os caminhos, replanejar e aplicar técnicas que viessem a possibilitar-lhes uma
reflexão contínua. Sob esse aspecto, orientou-se com prioridade as metodologias, que
pudessem contemplar o foco desejado; entre elas: a problematização; a metodologia de
projetos; dinâmicas de grupo; pesquisa bibliográfica e de campo;
vídeo/análise/discussões/relatório; estudo de caso; palestras – interações com docentes de
outras áreas; seminários interdisciplinares.
A disciplina em questão, apresentava os pressupostos do enfoque CTS, uma vez que
este torna possível instigar o aluno-cidadão a buscar informações sobre o contexto
científico-tecnológico-social que o cerca e dessa forma exigir sua participação ativa nas
decisões que envolvem esse entorno. Evidenciando as iniciativas a partir deles mesmos,
enquanto cidadãos e, depois, enquanto profissionais-cidadãos.
O enxerto foi a modalidade selecionada para inserção do enfoque CTS, pois
entende-se que ao se utilizar a modalidade do enxerto, para se trabalhar o enfoque CTS
numa determinada disciplina, não necessita-se que o tema esteja diretamente relacionado
com o conteúdo da série em questão. O que se torna relevante é trazer temas que admitam
discutir o envolvimento do conhecimento em suas implicações científicas, tecnológicas e
sociais.
Segundo Osório (2002), essa é a modalidade que mais se adapta com os currículos
de Ensino Médio, se temos dificuldades em fazer uma mudança radical no planejamento de
ensino.Ela apresenta-se como um complemento à base curricular. Enxertar significa colocar
temas que não estão presentes no currículo de uma determinada disciplina, mas que cabem
como uma aplicação e/ou implicação do conteúdo de tal área de estudo em nossa sociedade.
De acordo com Gordillo (2001, p. 175), através do enxerto se mantém a estrutura
disciplinar convencional na organização geral do currículo, mas se criam espaços para
temas CTS.3 (Tradução dos autores).
Em vista desses fatos, o importante é direcionar temas que ressaltem aspectos que
levem os estudantes a serem mais conscientes das implicações da ciência e da tecnologia
em nossa sociedade. Os projetos mais conhecidos nessa modalidade são o SISCON
(Science in a Social Context) e o SATIS (Science and Technology in Society).
Utilizando-se da modalidade do enxerto na disciplina de Princípios Tecnológicos,
procurou-se contemplar alguns pontos em sala de aula, em um enfoque construtivista da
aprendizagem; abordar temas sócio-técnicos relevantes para os estudantes; situar esses
problemas em contextos específicos; introduzir a análise sócio-filosófica, ética, político,
econômica, nesses problemas; e promover o desenvolvimento da capacidade necessária
para argumentar sobre decisões referentes a tais problemas e sobre sua relação com o meio
social. Ressalta-se ainda, que maioria do material utilizado para as atividades
desenvolvidas, foi selecionada em textos de livros e revistas, filmes, casos simulados e
pesquisa dos alunos.
Dessa maneira, a forma como a disciplina fora organizada, caracterizava a
relevância em aproximar o aluno da interação com a ciência e com a tecnologia em todas as
dimensões da sociedade, considerando-se as suas relações recíprocas, oportunizando-se ao
educando uma concepção ampla e humanista do contexto científico-tecnológico. São
princípios que incitam os alunos a exercerem a sua cidadania, um olhar diferenciado sobre
a educação e sobre o papel enquanto cidadãos. Surgem, conseqüentemente, novas
preocupações com uma prática mais orientada para o desenvolvimento da reflexão crítica e
discernimento dos juízos de valor nos alunos.
Ao sublinhar uma educação voltada para essa demanda na referida disciplina, não
se provocou o abandono do conteúdo em si nas situações de ensino, mas o resgate da
dimensão crítica de cada conhecimento. O processo inclui uma reação do aluno/sujeito, que
supõe a reelaboração e ampliação desse conhecimento, criando possibilidades de ação.
A linha de ação pedagógica assumida incidiu numa ampliação de visão na qual o
ensino supera a forma conteudista que sempre o caracterizou. Percebeu-se, nitidamente, a
necessidade de a escola ser colocada como um dos elementos centrais para o
desenvolvimento do cidadão. Isso significou deixar de lado os modelos prontos, a
memorização e, principalmente, a fragmentação do conhecimento. As mediações e
interconexões que podem relacionar a história dos conhecimentos em sua contínua
evolução e interdependência foram pontos de análise e reformulação nessa nova proposta.
A investigação-ação, neste cenário, abaliza-se como fundamental instrumento
para construir o novo conhecimento, o que significa aprender a aprender, saber pensar e
intervir de forma inusitada e inovadora na realidade. Ela assume contornos de atitude
cotidiana, não restrita a especialistas, mas ao cidadão convocado também a construir o
conhecimento.
As discussões acerca de ciência, tecnologia e sociedade iniciadas na disciplina de
Princípios Tecnológicos passaram a abranger tópicos e saberes constantes em outras
disciplinas, o que provocou a participação de outros professores nas reflexões, na
intervenção e reconstrução do conhecimento.Desse processo, nasceu um grupo
interdisciplinar em estudos sobre CTS, que assumiu a recondução de aspectos teóricos,
alterou o quadro de referências, as condições explicativas da realidade, admitindo
controvérsias e discussões concernentes. A investigação-ação para o grupo adquire
contornos práticos, na proporção em que intervém diretamente na práxis educativa e
concretiza alternativas, comprometidas com soluções produtoras de conhecimento que
passam pelo questionamento sistemático, crítico e criativo.
Aos poucos se chegou ao entendimento de que o espaço curricular destinado às
discussões acerca do CTS em uma única disciplina precisava avançar. As reflexões críticas
semeadas na disciplina de Princípios Tecnológicos, fez com que alunos e professores
chegassem ao consenso que elas precisavam ser incorporadas a temas desenvolvidos nas
demais disciplinas constantes na grade curricular do Ensino Médio da UTFPR. Assim, ao
reestruturá-lo, a disciplina desaparece formalmente do currículo do Ensino Médio da
UTFPR, em 2004, em contrapartida os objetivos, temas, competências e habilidades são
assumidos nos espaços de cada disciplina, formando um corpus interdisciplinar.
Esse avanço positivo, metodológico e epistemológico foi certamente ocasionado
pela abrangência que o modelo CTS impôs no desenrolar da disciplina. Provavelmente, não
se teria o mesmo resultado se a opção fosse outra linha de trabalho.
O enfoque CTS adotado, permitiu resgatar a unidade e o saber numa existência
compartilhada, e de acordo com Bastos (1998), a construção do conhecimento, via processo
cotidiano de investigação, torna-se pesquisa como elemento permanente de inovação em
busca de solução para questões. Para Cerezo (2002) a afirmativa é que a orientação CTS
faz com que se veja o conhecimento da ciência e da tecnologia muito além do
academicismo e cientificismo, pois se preocupa com os problemas sociais relacionados com
o científico e o tecnológico. Dessa forma, favorece a construção de atitudes, valores e
normas de conduta em relação a essas questões, com vistas a uma formação que prepare os
estudantes para tomarem decisões que se fundem no bem-estar da maioria.
Além disso, o enfoque CTS contribuiu na implementação da docência, ao
possibilitar a aplicação novas estratégias que possibilitaram ao aluno desenvolver seu lado
crítico e reflexivo, ao analisar situações e tomar decisões que envolvem o cotidiano.

4- Considerações finais
A educação democrática pressupõe que os cidadãos tenham a capacidade de
compreender alternativas, expressar opiniões e tomar decisões bem fundamentadas, enfim,
possam construir seu espaço político. Neste sentido, a formação de amplos seguimentos
sociais com vistas a nova imagem da ciência e tecnologia tem seu elemento chave na
renovação educativa, propiciada pelo enfoque CTS, quer seja em conteúdos curriculares,
quer seja em metodologias e técnicas didáticas.
Para tanto, acredita-se que o enfoque CTS, possa ser um alicerce impulsionador
para que questões que envolvam a ciência, a tecnologia e a sociedade possam ser trazidas e
discutidas em sala de aula, despertando, dessa forma, o senso crítico, a postura e defesa dos
alunos perante situações que envolvam seu dia-a-dia. Cabe a cada uma das áreas do
conhecimento, presentes no Ensino Médio, trazer o enfoque CTS para sua disciplina e
questionar a relevância da mesma no que concerne ao envolvimento da ciência, da
tecnologia e da sociedade, conforme tem acontecido na UTFPR.
As experiências desenvolvidas tanto na disciplina de Princípios Tecnológicos e
nos avanços posteriores, obtiveram uma avaliação bastante positiva por parte dos alunos.
As atividades desenvolvidas foram consideradas dinâmicas, criativas e interativas,
permitindo a tomada de decisões, exposição de idéias, opiniões e, principalmente,
possibilitando a busca de vários conhecimentos. Nessa perspectiva, o aprender ganhou uma
nova conotação. O conhecimento não foi considerado algo pronto e transmitido somente
pelo professor. O aprender se construía à medida que o aluno tinha sua curiosidade
aguçada. Sob essa premissa, Freire (1996, p. 77) afirma que “[...] aprender é uma aventura
criadora, algo, por isso mesmo, muito mais rico do que meramente repetir a lição dada.
Aprender para nós é construir, reconstruir, constatar para mudar [...]”.
Os alunos reconheceram a importância de assumirem uma postura crítica ao
analisar os feitos científico-tecnológicos percebendo que eles, enquanto cidadãos, têm o
direito, o dever e, principalmente, a capacidade de intervir em seu cotidiano. Entendem que
se é o homem que constrói o meio social no qual vive, mudanças podem ser realizadas.
Argumentam que não precisam apenas se adaptarem a essa realidade, tem que se lutar
pelas decisões e escolhas, pois nada lhes é dado pelo destino. Se tudo é construído, tem-se
o direito de desconstruir, mudar e reconstruir para melhor. Esse entendimento foi
despertado pelo contato com o enfoque CTS.
Percebeu-se que os alunos encaram o enfoque CTS como uma força que os fez
despertar para o mundo, abrindo-lhes os olhos para o senso crítico, encorajando-os a irem
atrás de maiores informações a respeito dos fatos. São sensibilizados quanto à sua
capacidade de intervir no mundo, de comparar, romper, escolher, formalizar grandes ações
em busca de soluções que venham a beneficiar um maior número de pessoas. O importante
é sempre otimizar os resultados.
Ao se utilizar estratégias de discussão oral e escrita, além de permitirem uma
participação mais efetiva dos alunos, também propiciaram o desenvolvimento de outras
habilidades, dentre as quais a criatividade, a reflexão crítica e a capacidade de
argumentação. Tornou-se cada vez mais visível a necessidade de os alunos falarem,
exporem suas idéias, criticarem e questionarem.
Assim sendo, além do diálogo promovido dentro de cada disciplina, é necessário
que os conhecimentos deixem de ser trabalhados de forma estanque, sem que o vínculo
entre eles e o contexto social seja ressaltado. É necessário que o trabalho conjunto e
contextualizado possa acontecer, de forma a não levar o aluno a pensar que o diálogo entre
os conhecimentos não existe e que um não necessita do outro.
A interdisciplinaridade e a contextualização, proporcionadas ao longo das
disciplinas que adotaram a abordagem CTS, mostraram-se indispensáveis para que se
possibilitasse aos alunos um processo de desenvolvimento de competências, capacidades e
habilidades, a fim de que pudessem compreender e atuar na sociedade científico-
tecnológica.
O constante diálogo e estudos mantidos pelos docentes no grupo de estudos do
enfoque CTS e os resultados da investigação-ação têm possibilitado a recondução de
pressupostos epistemológicos e metodológicos para a abordagem das relações entre ciência,
tecnologia e sociedade.
As experiências que têm sido desenvolvidas na UTFPR demonstram o quanto os
alunos do Ensino Médio possuem capacidade de refletir e aprender, construindo seus
próprios conhecimentos. Foram capazes de criticar, posicionando-se contra ou a favor,
argumentando e defendendo suas posições. Os alunos revelaram, também, a necessidade de
o enfoque CTS ser introduzido já no ensino fundamental, a fim de formar aos poucos um
cidadão que tenha sua atenção despertada para os aspectos que envolvem o contexto
científico-tecnológico e social. Consideram, do mesmo modo, ser o enfoque CTS de tal
relevância que ultrapassa os limites de uma forma de abordagem de conteúdos em sala de
aula, para se tornar uma forma de compreender e ver o mundo. Uma postura que o cidadão
assume ao tratar dos problemas que envolvem o seu entorno, acompanhando-o durante toda
a sua vida, quer seja em seu contexto profissional ou no ambiente onde vive.

NOTAS
o
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2 Tradução de: El enfoque educativo CTS, en tanto recupera los espacios críticos de esa
relación conjunta al devolver las implicaciones y los fines del desarrollo científico
tecnológico en un entramado social, político y ambiental, se nos presenta como un campo
de análisis propicio para entender y educar en el fenómeno tecnocientífico moderno.
3 Tradução de: en los injertos CTS se mantiene la estructura disciplinar clásica del
currículo, pero se crían espacios sobre temas de naturaleza CTS.

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