Os Paradigmas No Mundo Do Trabalho Na Era Da Globalização: Josecleto Costa de Almeida Pereira
Os Paradigmas No Mundo Do Trabalho Na Era Da Globalização: Josecleto Costa de Almeida Pereira
Os Paradigmas No Mundo Do Trabalho Na Era Da Globalização: Josecleto Costa de Almeida Pereira
Resumo: O presente artigo objetiva apresen- Abstract: The present article aims to present,
tar, de maneira pontual, as transformações da in a punctual manner, the changes in the
economia global e seus reflexos no mundo do global economy and its reflexes in the sphere
trabalho, bem como focalizar as novas of labor, as well as to focus new technologies
tecnologias como um processo de transforma- as a process of political, social and cultural
ção política, social e cultural do nosso tempo. change of our times.
Palavras-chave: Globalização — Novas Keywords: Globalization — New
Tecnologias — Neoliberalismo — Technologies — Neoliberalism —
Precarização do Trabalho — Sindicalismo. Precariousness of Labor — Trade-unionism.
Introdução
1. Paradoxos da globalização
O mundo contemporâneo vive uma profunda revolução das novas
tecnologias de informação, e o que se destaca nesse processo é o uso do
computador como instrumento fundamental da comunicação, da
economia e dos poderes.
Com a globalização se potencializa a crescente comunicação e
conexão entre as estruturas econômicas e políticas de diversos países do
mundo. Esse processo traz impactos devastadores aos países chamados
periféricos e em vias de desenvolvimento, ou seja, a globalização
manifesta-se de forma assimétrica e, com isso, deixa mais vulneráveis
todas as nações que não assimilam as novas tecnologias que as empresa
multinacionais possuem.
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Além disso, a globalização não pode ser vista apenas como um
fenômeno econômico, mas como um processo complexo que tem afetado
profundamente o mercado de trabalho de forma desigual em todas as
nações do planeta.
Nesse contexto, as sociedades modernas caminham para um mundo
de incertezas, apesar da chamada terceira revolução tecnológica das
últimas décadas, com uma globalização que aumentou a discrepância
social no acesso às informações, ou seja, são os incluídos (prestadores de
serviços altamente especializados — os conectados) e os excluídos (os
trabalhadores precários, subcontratados e os desempregados — os
desconectados) desse processo de globalização. Como diz Liszt Vieira:
53
Constata-se nesse período histórico da humanidade uma grande crise
estrutural. Por isso, a globalização que se presencia tem como pilares básicos
as tiranias do capital e da informação. Daí a grande dupla que eles formam,
através do sistema financeiro internacional e das técnicas da informação,
para consolidar a visão de um mundo global.
A isso se acrescente o sistema ideológico que justifica esse processo
de globalização como o único caminho histórico para se compreender a
realidade, por imposição de uma lógica que prima pela visão de um mundo
unificado, em que a resposta de todos os países com relação a essa
globalização fosse a mesma para todos. Como Milton Santos diz:
2 SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 5.
ed. Rio de Janeiro: Record, 2001. p.38.
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Nesse contexto, é importante frisar que a globalização, por ser um
conjunto de processos, se expande com a internacionalização do capital
financeiro, acompanhada da política neoliberal e, aproveitando-se das
novas tecnologias, passou a redefinir a ordem mundial, com reflexos no
mundo do trabalho.
Por conseguinte, os defensores da política neoliberal sustentam a tese
do Estado mínimo e da flexibilização dos direitos fundamentais dos
trabalhadores como solução dos problemas sociais. Além disso, apontam
as novas tecnologias como responsáveis pelo desemprego e pela
precariedade do trabalho.
Essa perversa lógica busca alterar radicalmente as regras do Estado
de Direito e as políticas sociais. E, no âmbito do Direito, as garantias e os
direitos fundamentais individuais e coletivos tornam-se vulneráveis como,
também, a proteção ao exercício da cidadania.
Assim, mostra-se complexa a confrontação entre capital e
trabalho, isto porque nessas últimas décadas o capitalismo tem esti-
mulado o individualismo e a competição predatória em detrimento
das ações coletivas, além de instaurar uma anarquia que favorece o
darwinismo social e econômico.
É indiscutível que no mundo globalizado a competitividade se
exacerba, tendo como lema não a concorrência, mas a guerra. Essa guerra
utiliza-se de todas as formas para dirimir os conflitos, frutos dessa lógica
sem ética. A conseqüência mais visível dessa realidade é o egocentrismo,
ou seja, os individualismos na vida econômica, política e social, que
terminam por transformar as pessoas em coisas.
Os individualismos, conduzidos pela movimentação incessante da
globalização dos interesses, da competitividade, do consumo sem limites,
dos comportamentos ditados pela mídia alucinada e pela automação
proposta pelo sistema vigente na sociedade, empurram o indivíduo para
onde e com quem não mantém qualquer traço de afinidade, transformando-
o mesmo num estrangeiro em seu próprio país.
Face a essa realidade, irrompem na sociedade a violência, o desres-
peito ao cidadão, a perda do seu espaço, a insegurança ameaçadora, a
ansiedade, o medo, a desconfiança...
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Ante a impossibilidade de encontrar-se consigo mesmo nesse processo
global, o indivíduo desidentifica-se como cidadão, e daí resultam diversos
fragmentos da vida social, sendo o mais grave a ampliação do desemprego.
Como assevera Milton Santos:
56
2. As novas tecnologias
Todo processo de transformação política, social e tecnológica sempre
provocaram muitas tragédias no campo do conhecimento, principalmente
com relação aos saberes individuais e coletivos.
A globalização elegeu as novas tecnologias como elemento fundamental
para alimentar a lógica de mercado como uma verdade inquestionável, e
além disso, estabeleceu um discurso hegemônico sobre o mundo com
implicações na economia e na política internacional contemporânea.
As mudanças e revoluções tecnológicas criaram muitos impactos e
alterações nas sociedades, no século XVIII, na Inglaterra, que foi o núcleo
central da chamada Primeira Revolução Industrial, fundamentalmente
baseada no vapor (desvalorizou o trabalho muscular). Já o centro dinâmico
da Segunda Revolução Tecnológica (desvalorizou o trabalho mental de
rotina) residiu nos Estados Unidos e na Alemanha, nos últimos anos do
século XIX, e essa revolução tecnológica, que tinha na eletricidade seu ponto
central, redesenhou o mapa do mundo.
Atualmente consolida-se a Terceira Revolução Tecnológica, a qual
tem recebido várias denominações, porém, nesse texto utilizaremos a mais
conhecida, que é a Revolução das Novas Tecnologias de Informação.
O marco dessa revolução é o uso do computador como instrumento
vital da comunicação, da economia e dos poderes.
As redes de comunicação informacionais cobrem todo o planeta, e o
capital financeiro circula no mundo conectado a essas redes, tornando
instáveis as economias nacionais dependentes (países periféricos) dos fluxos
de capital. Por exemplo, o Brasil, nesses últimos tempos, vem sofrendo
ataques especulativos (fuga de capitais), com graves conseqüências, não
só para o Brasil, mas para todos os países em desenvolvimento.
O fato é que essa globalização da economia tende a transfigurar-se
na economia da informação, e as conseqüências desse novo paradigma
econômico e produtivo é o desemprego.
Assim, nesse processo de mudanças econômicas, sociais e políticas
em curso vê-se a apropriação dessas tecnologias pelos países ricos em
prejuízo dos pobres. Como afirma Milton Santos:
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A globalização marca um momento de ruptura nesse processo de evolução
social e moral que se vinha fazendo nos séculos precedentes. É irônico
recordar que o progresso técnico aparecia, desde os séculos anteriores,
como uma condição para realizar essa sonhada globalização com a mais
completa humanização da vida no planeta. Finalmente, quando esse
progresso técnico alcança um nível superior, a globalização se realiza,
mas não a serviço da humanidade.
A globalização mata a noção de solidariedade, devolve o homem à condição
primitiva do cada um por si e, como se voltássemos a ser animais da selva,
reduz as noções de moralidade pública e particular a um quase nada.5
58
A tecnologia da informação criou um novo paradigma na hegemonia
econômica mundial e no mundo do trabalho; além disso, ampliou significati-
vamente as desigualdades entre os países ricos e os pobres, como também
aprofundou o distanciamento cognitivo entre aqueles que dominam a
tecnologia da informação e os que são excluídos digital e socialmente.
Em outras palavras, para a grande maioria da população dos países
pobres e periféricos o acesso ao ciberespaço e aos bilhões de sítios espalhados
é bastante difícil devido ao custo. Com isso, os excluídos não conseguem
se conectar com os incluídos, os quais têm na navegação pela Internet o
estímulo à criatividade e à descoberta de um oceano de informações que
possibilitará a ampliação dos conhecimentos sobre o planeta.
Assim, a exclusão digital torna-se a maior problemática desse processo
revolucionário da comunicação em rede, pois essa exclusão é um impeditivo
para se reduzir a exclusão social, uma vez que as principais atividades
econômicas, governamentais e culturais estão sendo praticadas e divulgadas
por meio da comunicação informacional, ou seja, é necessário assegurar o
acesso aos excluídos socialmente como estratégia de fundamental
importância para a inclusão social.
Como diz Milton Santos:
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Como diz João Bernardo:
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do sub-trabalho e a flexibilização trabalhista que consiste na extração de
mais-valia como instrumentos de sustentação das políticas neoliberais.
Assiste-se à idolatria do mercado, à demonização do Estado, à
exaltação do capital especulativo e ao endeusamento de um individualismo
egocêntrico. Por conseqüência, vê-se transformar o “darwinismo social de
mercado” em algo desejável do ponto de vista econômico, e o neoliberalismo
surge como o projeto hegemônico de nosso tempo.
3. O mundo do trabalho
O mundo do trabalho vem sofrendo uma metamorfose profunda
nessas últimas décadas, principalmente nos países capitalistas avançados,
em virtude das inovações das tecnologias, com repercussões significativas
nos países periféricos.
Como conseqüência desse processo de transformações tecnológicas,
verificou-se uma desproletarização do trabalho industrial e fabril, ou seja,
uma diminuição da classe operária industrial tradicional. Além disso,
efetivaram-se diversas formas de fragmentação do trabalho, como por
exemplo a terceirização, a subcontratação, a precariedade do trabalho,
todos vinculados à economia informal, ao setor de serviços, etc.
Emergem nessa sociedade da informação novos paradigmas no
mundo do trabalho, onde o cronômetro e a produção em série são substituí-
dos pela flexibilização da produção como corolário da lógica do mercado.
O desdobramento desse novo padrão de gestão da força de trabalho
encontra no neoliberalismo a “força” necessária para também flexibilizar
os direitos sociais e trabalhistas.
O fato é que o avanço tecnológico modificou substancialmente as
organizações do universo fabril, essas transformações propiciaram uma nova
divisão internacional do trabalho e, como referência-chave desse processo,
temos a experiência japonesa do “toyotismo”. Como diz Ruy Braga:
61
contratá-los, mesmo diante do incremento da demanda engendrada pela Guerra
da Coréia. Para os diretores da Toyota, tratava-se de suprir a oferta de produtos
sem recorrer à admissão de novos operários. A automação, a reestruturação
imposta pelo capital financeiro (com importante redução de pessoal e a adaptação
da produção às vendas), o método kan-ban (técnica de gestão de estoques
inspirada no exemplo dos supermercados norte-americanos), constituíram-se
em soluções capitalistas às condições concretas da luta de classes.9
9 BRAGA, Ruy. A restauração do capital: um estudo da crise contemporânea. São Paulo: Xamã,
1996. p. 245-246.
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recompensado em seu trabalho porque é estimulado pela própria reestru-
turação produtiva para desenvolver sua imaginação criativa.
Porém, esse trabalhador é compelido à reciclagem permanente, já que
o seu trabalho exige elevada flexibilidade intelectual ao enfrentar as novas
tecnologias. Além disso, esse artesão eletrônico tem a impressão de ter maior
liberdade para agir, pois fica conectado a uma rede imensa de pequenas e
microempresas espalhadas por todos os lugares, e com a tarefa de fornecer
as informações necessárias para serem transformadas em mercadorias.
É nesse contexto que o trabalhador começa a sentir-se proprietário,
um verdadeiro comerciante, de trabalho. E, num mundo onde todos são
produtores de mercadorias, os sindicatos, organizações de luta dos
trabalhadores, parecem supérfluos.
Portanto, é problemático que o trabalho possa sustentar a cidadania
no atual estágio da globalização. Mas é uma exigência inadiável que a
cidadania redescubra as potencialidades democráticas do trabalho. Para
isso, é imperativo que o trabalho deva ser democraticamente compar-
tilhado, ou seja, é necessário um novo contrato social, onde o trabalho
humano possa interagir com a revolução tecnológica em que nos encon-
tramos para conseguir criar riqueza, emprego e qualidade de vida. Afirma
Boaventura Santos que:
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oportunidades para os incluídos na sociedade da informação são indiscu-
tivelmente bem maiores do que para aqueles que vivem no apartheid social
e digital. Assim sendo, o contratualismo de hoje deve ter como base a lógica
da legitimação, a qual deve ser assentada na interação econômica, política,
social e cultural das sociedades contemporâneas.
É oportuno não perder de vista que a globalização hodierna é um
processo que vem consolidando a hegemonia econômica dos Estados
Unidos no resto do mundo.
Esse fenômeno tem no velho liberalismo uma “nova” roupagem e
características ditas “modernas” para implementar sua filosofia, a qual
tem como base principal a minimização do Estado, ou seja, a eliminação
da intervenção do Estado na economia e nos conflitos sociais, com o que se
restaurou o contratualismo do século XIX.
Uma das características desse contratualismo é a prevalência da
negociação entre patrões e empregados (laisser-faire), a irrestrita liberdade
do comércio internacional e a abertura dos mercados, ou seja, é um sistema
de natureza eminentemente mercantilista o qual vê as pessoas como
mercadorias ou no máximo como consumidoras.
Além disso, consolida-se a lógica da redução dos direitos sociais,
da flexibilização e da desregulamentação dos direitos trabalhistas como
necessários para a inserção dos países periféricos nas decisões interna-
cionais, ou seja, a economia globalizada cria pessoas dispensáveis no
processo produtivo e impõe, através de organismos internacionais (FMI,
Banco Mundial), as regras para as economias nacionais, com a
conseqüente desnacionalização dos parques industrias e a destruição
da soberania nacional.
O fato é que a idéia de que o mercado resolve todos os problemas das
sociedades modernas é uma grande falácia, pois a lógica de mercado vigente
tem criado muito mais conflitos e rivalidades do que soluções para os
problemas sociais. E o pior é que cada vez mais aumentam as desigualdades
e as distâncias socioeconômicas entre as nações ricas e as pobres.
Portanto, não é admissível que as inovações tecnológicas sejam
utilizadas para provocar desemprego e multiplicar a pobreza, pois elas
deveriam servir para reduzir a jornada de trabalho, propiciar melhoria
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na qualidade de vida e proporcionar bem-estar para os trabalhadores e
todos os cidadãos.
No reino da globalização financeira predomina o cenário de investi-
mentos produtivos contidos.
Em função disso, assiste-se nessas últimas décadas a uma modificação
substancial na divisão internacional do trabalho. Embora o comando da
nova divisão internacional do trabalho pertença à dimensão financeira,
há de se considerar a influência a partir do centro do capitalismo mundial
no processo da reestruturação empresarial, acompanhado da nova
Revolução Tecnológica.
Com o aprofundamento da concorrência intercapitalista tem havido
uma maior concentração do capital, seja nos setores produtivos, seja no
setor bancário e financeiro, o que concede maior importância ao papel das
grandes corporações transnacionais.
Além disso, os países periféricos (Brasil e América Latina) acabaram
transformando-se num grande celeiro de concorrência das grandes
corporações transnacionais, as quais, com o auxilio do FMI e do BIRD,
terminam por provocar o rebaixamento do custo do trabalho e a desre-
gulamentação dos mercados de trabalho com a conseqüente piora na
distribuição de renda.
Portanto, a classe trabalhadora no mundo contemporâneo precisa
criar novas estratégias para pensar as formas de ação com relação à
transnacionalização do capital e seu sistema produtivo em escala global,
pois os desafios no mundo do trabalho passam pela nova divisão inter-
nacional do trabalho imposta pelo capital internacional.
Como afirma Gilmar Mauro:
65
É até discutível a extensão do papel das novas tecnologias no avanço industrial
imediato. Para alguns estudiosos, a preocupação com as máquinas levou à
subestimação do papel de outros fatores na promoção do crescimento industrial,
como a qualidade dos trabalhadores, o estoque de diferentes técnicas, a eficiência
da organização industrial, entre outros.11
11 MAURO, Gilmar. Capitalismo e luta política no Brasil: na virada do milênio. São Paulo: Xamã,
2001. p. 91.
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contemple outras contradições que se apresentam crescentemente situadas
além do local de trabalho e do processo de valorização, os trabalhadores
dificilmente conseguirão protagonizar projetos nacionais e internacionais
de transformação.12
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O principal documento que analisa e define as estratégias para os países-membros
é um libelo a favor das desregulamentações e da flexibilização. As propostas são
objetivas: redução dos ganhos salariais, eliminação das restrições aos licencia-
mentos, precarização dos contratos de trabalho, etc. Os indivíduos têm a opção
de se “acomodarem à liberdade”. Os mais capazes e empreendedores sobreviverão;
os incapazes e inadaptados serão eliminados pela lei da seleção da espécie.
Enquanto os neoliberais usufruem de uma despreocupação unânime e
irresponsável, as diversas correntes do pensamento crítico estão divididas e
torturadas pelo fracasso do sistema socialista ou pela crise do Welfare State.13
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socialização, traduz-se em atomização, em recolhimento doméstico, em egoísmo,
isto é, em ausência de solidariedade.
Cada vez mais, são criadas condições que deixam os indivíduos isolados, que
fomentam o narcisismo e o utilitarismo mediocremente individualista. A
dispersão dos valores e das práticas amplia-se continuamente e pode fomentar
tendencialmente dois tipos de comportamentos: aquele marcado pela obsessão
afoita pela sobrevivência individual, e aquele marcado pelo comportamento
apático, resignado, que logo se traduz em subserviência.14
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resistência do trabalho assalariado, em escala planetária, apoiando a
instauração do Estado social, com novos vínculos com movimentos sociais de
contestação à nova ordem capitalista?15
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Jorge Mattoso que:
Conclusão
Nosso tempo está marcado por muitos desafios e incertezas. Porém,
após os inimagináveis vôos do conhecimento e da tecnologia da atualidade,
o homem e a mulher vivem nas águas turvas da globalização com muita
inquietação e insegurança.
O terceiro milênio tem como marca o homo tecnologicus, o qual se
impõe hodiernamente através da robotização e das programações da
Internet, porém esse processo conspira contra a humanização e a cons-
trução efetiva de uma sociedade socialmente justa.
Todos os acontecimentos nos dias atuais transcorrem com celeridade,
e a vida moderna lentamente transforma o ser humano em verdadeiro robô
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que, automatizado pela mídia que o comanda, desnatura-se ao renunciar o
seu livre-arbítrio e a lucidez para pensar sobre a sua própria existência.
As questões nobres da existência têm sido substituídas pelas soluções
simples apresentadas pelas máquinas devoradoras, que facultam mais tempo
para os compromissos imaginários do que os reais, e tudo isso cria no
indivíduo o que Max Weber denominava de “desencantamento do mundo”.
O perfil humano nessa era da globalização pode ser desenhado como
aquele que aspira o seu triunfo na glória dos quinze minutos de fama. E,
assim conduzido pela movimentação incessante da globalização dos
interesses, das lutas, dos comportamentos ditados pela mídia alucinada e
pela automação proposta pelo sistema vigente na sociedade, o indivíduo
vê-se empurrado para o individualismo e o egoísmo exacerbados numa
competição predatória sem limite.
Por conseguinte, nos dias de hoje, consolida-se a lógica da globalização
financeira e especulativa com a conseqüente fragilização dos Estados
Nacionais, principalmente nos países periféricos e no Terceiro Mundo. Além
disso, vemos a destruição das várias expressões de contestação à hegemonia
ideológica e política do neoliberalismo, como por exemplo os movimentos
populares e as ações sindicais.
É nesse contexto sócio-histórico que ocorre um complexo processo de
reestruturação produtiva, com um impacto devastador no mundo do trabalho.
É por isso que uma das conseqüências dessa ofensiva do capital na produção
foi a fragmentação da classe trabalhadora e o enfraquecimento dos sindicatos.
Além disso, este processo veio acompanhado de um novo paradigma
de produção industrial, que é a revolucionaria implantação da tecnologia
de informação como eixo central para o processo produtivo e a mudança
na estruturação do mercado de trabalho.
Com essa reestruturação tecnológica de produção vemos consolida-
rem-se as velhas formas de exploração do trabalho, como o antigo sistema
de trabalho doméstico, artesanal e familiar.
Portanto, estamos diante de um (precário) paradigma do trabalho,
em que o trabalhador torna-se vendedor de trabalho objetivado, ou seja,
ele sente-se um verdadeiro comerciante de trabalho. E com isso o
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trabalhador deixa de lutar pelos interesses coletivos da classe trabalhadora,
além de não considerar importante o papel dos sindicatos diante dos
embates ente o capital e trabalho.
Nesse cenário de aprofundamento da globalização e da hegemonia do
capital sobre o mundo do trabalho, vemos o trabalhador lutar de forma obsessiva
pela sua sobrevivência individual, porém marcado pelo comportamento apático
e resignado com relação às imposições do sistema vigente.
Esse comportamento é um reflexo dos diversos níveis de insegurança
que o trabalhador tem de enfrentar, como por exemplo a insegurança no
emprego e na renda.
Assim, diante desse processo de reestruturação do mundo do trabalho,
as entidades sindicais têm um grande desafio para enfrentar, que é o de
renovar suas estratégias e, ao mesmo tempo, implementar novas ações
coletivas visando a construção de uma nova legitimidade a partir da
solidariedade e da consolidação da cidadania.
É portanto necessário repensar os paradigmas que o capitalismo global
nos impõe e, o mais importante, criar um projeto alternativo que resgate
os valores essenciais da humanidade, tendo como ponto central a
construção das novas ações coletivas que possam confrontar a lógica do
capital e, ao mesmo tempo, fortalecer a cidadania e a Democracia.
Referências
ALVES, Giovanni. O novo (e precário) mundo do trabalho. Reestruturação
produtiva e crise do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2000.
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BEINSTEIN, Jorge. Capitalismo senil: a grande crise da economia global. Rio de
Janeiro: Record, 2001.
HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.
PLÁ Rodrigues, Américo. Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1993.
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SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência
universal. 5. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.
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