Parecer05 - Dirceu Estabilidade

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 12

ESTADO DE PERNAMBUCO

TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

PARECER MPCO 533/06


PROCESSO T.C. nº 0401510-1
RELATOR: CONS. ALDA MAGALHÃES
INTERESSADO: MARIA ELIZABETE MAXIMINIANO BERNARDO
ÓRGÃO: PMPE – POLÍCIA MILITAR/PE

Trata-se do procedimento administrativo de aposentadoria da servidora civil da


PMPE acima nominada, ultimado com a exaração da Portaria – SARE nº 550/04 (publicada
no D.O.E do dia 18/02/04), conforme depreende-se do documento acostado às fls. 18.

A própria interessada fez a juntada de uma petição (fls. 25 dos autos), corroborada
por documentos, no bojo da qual requer a inclusão de uma estabilidade financeira nos
proventos de sua aposentadoria, considerando que tal vantagem não foi consignada no ato de
inativação supramencionado.

O NAP/TCE, às fls. 34, solicitou informações ao órgão de origem, tendo sido


carreado aos autos os documentos e opinativos atinentes ao caso.

Após o cotejamento de todos os documentos coligidos, o relator expediu o ofício GC-


02 nº 551/04 (fls. 46) solicitando informações mais precisas ao Comando-Geral da PMPE,
haja vista imprecisões e inconsistências que avultaram da análise documental.

Em resposta, foi expedido o Ofício nº 004 – SSAFP/2005 (Diretoria de Finanças da


Secretaria de Defesa Social), cujo teor ratifica os períodos de percepção da Gratificação de
Insalubridade e da Gratificação de Apoio (FAG-3). Entrementes, no mesmo documento, foi
retificado o tempo de percepção da G.S.E., estando patenteada a percepção da vantagem por
mais de 7 (sete) anos, com interrupção, conforme abaixo demonstra-se:

PERCEPÇÃO DA G.S.E.

De 04/80 a 07/83;
de 04/85 a 07/91;
de 01/92 a 10/02.

Os autos foram reimbicados à GIPS, a qual elaborou novos cálculos (Relatório nº


0520/05 – fls. 53-54) bem como considerou devida a incorporação da G.S.E. com fulcro no
modelo de estabilidade financeira previsto no art. 1º, § 2º, inciso XVIII da LC nº 03/90,
levando em consideração o fato do texto do citado dispositivo legal ser mais abrangente,
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

posto que previa a concessão da vantagem pela percepção de gratificação percebida a


qualquer título. Na cota firmada na fl. 55, a GIPS afirma de forma categórica o direito
subjetivo da aposentanda.

Assim, na fl. 56 dos autos, foi exarado o Ofício GC-02 nº 335/05, no qual o
Conselheiro-relator solicita a retificação da Portaria nº 550/04, desta feita incluindo nos
cálculos dos proventos o valor da estabilidade financeira requerida.

Em resposta foi expedido o Encaminhamento nº 976/05 da Gerência de Apoio


Jurídico do Órgão de origem, cujo teor rechaça a hipótese de incluir a vantagem, para tanto
invoca o entendimento da P.G.E. firmado no Encaminhamento nº 18/05, entendimento este
que só concebe a incorporação de estabilidade financeira que esteja lastreada na percepção de
gratificação de representação de cargo comissionado e/ou gratificação de função gratificada
de direção, chefia, apoio ou assessoramento. De outra parte, a gerência em tela invoca a LC nº
063/04 (que altera o art. 33 da LC nº 028/00) como impeditivo legal para atender à solicitação
do insigne Conselheiro relator.

É o que importa relatar.

Do Mérito

Em sede meritória, temos a reafirmar nosso posicionamento avezado e firmado em


vários opinativos, dentre os quais realçamos a Cota MPC nº 013/04. Segundo tal intelecção, o
modelo de estabilidade bosquejado na LC nº 03/90 agasalhada a situação em epígrafe.

O ponto nodal da questão pertine ao delineamento de elemento substancial, ou um


objeto de preservação imanente do adicional em tela, vez que o aspecto temporal previsto no
preceptivo da Lei Complementar nº 03/90 foi sobejamente satisfeito pela servidora.

a) Elemento teleológico ou finalístico – este é da própria essência da vantagem,


podendo ser resumido na expressão “EVITAR DECESSO NO PATAMAR
REMUNERATÓRIO DO AGENTE PÚBLICO”. Diz respeito, imediatamente, ao cariz
preservacionista do beneplácito, está sempre presente, independentemente do modelo legal,
ou seja, para qualquer modelo legal de estabilidade o elemento teleológico é um “a priori”,
está já no campo da política jurídica de nomogênese da hipótese legal.

b) Elemento temporal – Diz respeito ao critério objetivo, traduzido em interstício


previsto em lei, para o estabelecimento de um novo padrão remuneratório. É óbvio constatar-
se que o elemento temporal cambia conforme o modelo legal, melhor dizendo, cada lei que
tratou de estabilidade financeira no ordenamento jurídico parcial do Estado trouxe requisitos
temporais próprios. Assim, não há como ser extraído, sem referência a um específico modelo
2
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

jurídico-formal, um interstício temporal padrão suficiente para a concessão de um adicional


de estabilidade financeira. O aqui denominado CRITÉRIO OBJETIVO TEMPORAL tem seu
estabelecer ilaqueado a uma hipótese legal, ou seja, é relativo, sempre, a uma determinada lei
(ex.: Lei nº 9892/86 – 10 ou 7 anos; Lei Complementar nº 03/90 – 7 ou 5 anos etc. etc.etc.).

c) Elemento substancial (objeto imanente de preservação) – O parecer da douta


procuradora, na esteira da deliberação supracitada, assesta para a existência de terceiro
elemento, excludente de outras possibilidades, qual seja o EXERCÍCIO DE CARGO
COMISSIONADO E/OU FUNÇÃO GRATIFICADA, mesmo que o texto legal deixe
entrever um alcance e um sentido de maior anchura, como ocorre no caso da Lei
Complementar nº 03/90. Teríamos de reconhecer quanto a este aspecto, um conceito de
natureza EXTRALEGAL.

Aqui, ousaremos divergir da prestigiosa intelecção firmada pela douta P.G.E. O


aspecto supostamente substancial não pode ser compreendido como uma inferência de
validade geral ou essencial, vez que o tipo de beneplácito em tela, a estabilidade financeira,
tem definição deste elemento, também, assim como ocorre com requisito temporal, no modelo
legal.

Cada lei trata a matéria de forma peculiar, hipótese que confrontada, no dizer de Souto
Maior Borges, com algumas linguagens – objeto (leis previsoras de estabilidade financeira)
terá, induvidosamente, a sua confirmação.

Vejamos três modelos legais de estabilidade abaixo, com as respectivas notas


explicativas:

I – Lei 9.892/86, art. 18 – Este modelo legal de estabilidade financeira previa a


preservação de patamar remuneratório pelo EXERCÍCIO DE CARGOS COMISSIONADOS,
assegurando-se o direito de continuar a perceber os VENCIMENTOS ou a
REPRESENTAÇÃO do último cargo exercido. Neste caso, a lei não permite estabilização
em FUNÇÃO GRATIFICADA, portanto o pretenso elemento substancial já nos parece
infirmado.

II – Lei 6.785/74, art. 53, § 4º (com a redação imposta pela Lei 9.986/86) – A norma
legal faz alusão, neste caso, a gratificação e/ou indenização de representação relativa a
exercício de CARGO e/ou FUNÇÃO.

Verifica-se, então, a possibilidade da estabilidade ser concedida com base no exercício,


também, de FUNÇÕES GRATIFICADAS.

3
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

III – Lei Complementar nº 03/90, art. 1º, § 2º, XVIII – A lei aporta com a expressão
“GRATIFICAÇÃO OU COMISSÃO PERCEBIDA A QUALQUER TÍTULO”, texto
idêntico àquele previsto no art. 115, da Lei 10.426/90 (ambos já revogados). Não há como
divisar as restrições presentes nos outros modelos legais citados, aqui a MENS LEGIS afasta
qualquer qualificação à vantagem GRATIFICAÇÃO (cuja percepção lastreia a aquisição da
estabilidade financeira), ou seja, não importa a razão específica de concessão de gratificação
encartada na lei previsora. Assim, neste caso o modelo normativo exige, apenas, o
cumprimento do interregno legal na percepção da vantagem categorizada legal e
doutrinariamente1 como GRATIFICAÇÃO.

IV - Lei 10.798/92, art. 1º (CAPUT) – O fautor desta lei foi bem mais analítico,
referindo-se a gratificação de representação ou de função pelo exercício de cargo em
comissão ou FUNÇÃO GRATIFICADA DE DIREÇÃO, CHEFIA, ASSESSORAMENTO ou
APOIO.

Forçoso é perceber que a afirmação de que a estabilidade financeira só abrange a


percepção de cargos comissionados e FUNÇÕES GRATIFICADAS torna-se absolutamente
insuficiente para explicar a operatividade da norma bosquejada no art. 1º (CAPUT) da Lei
10.798/92. Neste particular, dever-se-á adicionar à afirmação, noções acerca do significado
das locuções adjetivas DE DIREÇÃO, DE CHEFIA, DE ASSESSORAMENTO ou DE
APOIO. Uma vez mais precipita-se no vazio a idéia do elemento substancial de envergadura
genérica e aplicação a todos os modelos legais de estabilidade financeira que vigeram no
ordenamento jurídico do Estado.

O querido mestre Souto Borges, ao referir-se à ciência dogmática do Direito


(considerações perfeitamente aplicáveis aos “operadores do Direito”, e é o que somos), afirma
que a mesma corporifica-se numa linguagem “que se verte sobre outra linguagem, a do
objeto normativo”. E continua o douto jurista: “As normas jurídicas, e só elas, firmam a base
empírica de sustentação das proposições doutrinárias que as descrevem. O teste, o ensaio, a
tentativa de falseamento de uma teoria jurídica (ou seja, o experimento crucial de sua
refutação) inclina-se para um conjunto de proposições prescritivas (normas) integrantes da
ordem jurídica” (SOUTO BORBES, José in “O Problema Fundamental da Base Empírica
para a Ciência do Direito ...”- artigo publicado na obra Ciência Feliz – Fundação de Cultura
da Cidade do Recife – 1994 – p. 114)2. Fizemos, neste caso, o confronto da afirmação de

1
Estará rechaçada, nesta linha de entendimento, a aquisição de
estabilidade financeira com arrimo na percepção de vantagem que tem o NOMEN JURIS
de GRATIFICAÇÃO, entrementes, por exemplo, seja, em verdade, uma espécie de
INDENIZAÇÃO.
2
Sobre a matéria o brilhante pensador ainda afirma que “A norma é sempre
em qualquer hipótese um pressuposto necessário para qualquer investigação
jurídica: o ponto de referência dos estudos jurídicos”.(mesma obra e artigo, p.
115).
4
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

existência ELEMENTO SUBSTANCIAL DA ESTABILIDADE FINANCEIRA com a base


empírica adequada, ou seja, as diversas leis que trataram da matéria (sob método comparativo
e reflexivo), restando, no nosso modo de sentir, afastada ou infirmada a tese de existência do
tal elemento, cuja principal característica seria a sua independência do modelo legal
disciplinador da hipótese fática, considerando um específico âmbito de validade temporal.

Poder-se-ia opor ao que ora é sustentado, o fato de estarmos a privilegiar o modelo


subsuntivo, quando a doutrina hodierna vem apontando para uma chamada “CRISE DO
MODELO SUBSUNTIVO”, consoante pondera o coruscante pensamento de Gustavo Just da
Costa e Silva3. Contudo, mesmo para os que apregoam a superação do racionalismo
positivista, o método subsuntivo é o prevalente, ou de observância inelutável, para a resolução
de um grande número de casos, como o que ora se nos é apresentado.

O problema é resolvido por parâmetro de razoabilidade, neste caso é força ressaltar o


pensamento do preclaro Gustavo Just, que aponta três principais situações que exigem a
introdução, no discurso jurídico, “de premissas valorativas incontidas no texto normativo a
interpretar”, ou seja, nestes casos a pura subsunção torna-se insuficiente, senão vejamos:

1 – Quando aparece o caráter vago da linguagem do direito - O autor quer referir-se,


notadamente, à presença de cláusulas abertas ou “conceitos normativos” (no sentido dado por
Karl Engisch), ensejando plurivocidade e indefinições gramaticais. A questão trazida à baila
não suscita dificuldades maiores nesta seara, em verdade os conceitos atinentes ao adicional
de estabilidade financeira são correntes na administração pública, não exigindo do exegeta a
busca de pautas axiológicas extra-normativas.

2 – Quando surge a possibilidade de existirem situações que exigem uma regulação


jurídica que todavia não é objeto de nenhuma norma válida (“a vida tem infinitamente mais
fantasia do que pode prever o mais criativo dos legisladores” – Martin Kriele) – Longe de ser
o caso do adicional de estabilidade financeira. No ordenamento jurídico parcial do Estado tal
vantagem, em respeito à estrita legalidade, sempre foi deferida com fulcro em alguma lei
vigente ou que, embora revogada, tenha sido o supedâneo de um direito adquirido.

3 – Quando há conflitos normativos autênticos (duas normas contraditórias que


apresentam simultânea pretensão de validade) – Uma vez mais temos que afirmar que tal
3
“É dificilmente contestável que a operação estritamente lógica de
subsumir o fato concreto à previsão normativa é suficiente à aplicação de uma boa
parte das normas jurídicas. Mas é por não ser sempre esse o caso – o que a
transformação da estrutura do Estado de direito, dentre outros fatores, veio a
tornar impossível de ocultar – que a teoria jurídica vem organizando uma nova
alternativa metodológica, respaldada nas correntes da filosofia contemporânea que
se esforçam por reabilitar a razão prática como forma de superar o racionalismo
positivista”. (COSTA E SILVA, Gustavo Just. IN “Os Limites da Reforma
Constitucional”. Biblioteca de Teses – Renovar – RJ/SP – 2000 – p.14).
5
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

celeuma inocorre na situação ora em epígrafe. Não vislumbra-se problemas de conflito


normativo que vulnere a força do método subsuntivo como o caminho mais consentâneo para
afirmarmos ou infirmarmos a existência do elemento substancial acima referido.

De todo o referido, infere-se que não há como estabelecermos um objeto imanente de


preservação (ELEMENTO SUBSTANCIAL), é matéria que segue a sorte do modelo legal,
parecendo-nos inconsistente e de fácil infirmação qualquer conceito cunhado com a pretensão
de ser essencial e genérico, melhor dizendo, independente do conceito legal.

A intelecção acima exposta representa uma retratação nossa após maior reflexão no
enfrentar da matéria. Destarte, utilizando-nos do pertinente caminho da subsunção,
enfrentamos o caso vertente à luz do que dispõe o texto debuxado no art. 1º, § 1º, inciso
XVIII da Lei Complementar nº 03/90, dispositivo aplicável ao caso, considerando-se o seu
âmbito de validade temporal, muito embora abaixo façamos uma ressalva quanto à sua
revogação .

Neste caso, o texto aplicável traz consigo uma anchura de alcance e eficácia maior do
que aquele vislumbrado pela douta Procuradora-Geral Adjunta, data máxima venia, haja vista
que faz expressa referência a estabilidade garantida face a PERCEPÇÃO DE
GRATIFICAÇÃO A QUALQUER TÍTULO. À despeito do que preconiza a P.G.E., o
TCE/PE já deliberou, em casos concretos, pela contagem de tempo de gratificações diversas
(não relacionadas com o exercício de cargo comissionado ou função gratificada) para efeito
de concessão de adicional de estabilidade financeira, fulcrado na Lei Complementar nº 03/90,
podendo-se citar o Acórdão TC nº 380/95 (nos autos do Processo TC nº 9604097-2- cópia
acostada).

Por fim, embora sejamos contrários à tese de que o inciso XVIII, § 2º, art. 1º da Lei
Complementar nº 03/90 só tenha sido revogado pela Lei Complementar nº 16/96, esta é a
intelecção que frutificou no âmbito desta Casa. Portanto, partindo da premissa de que o
dispositivo em tela vigeu até o advento da Lei Complementar nº 16/96 (revogação expressa
constante de seu texto), não há como não reconhecer o direito da servidora a incorporar o
valor do adicional de estabilidade financeira G.S.E.

Não resta dúvida, portanto, que a servidora satisfez, plenamente, a moldura legal de
estabilidade insculpida na LC nº 03/90, assim é inconcusso o direito subjetivo à vantagem,
embora não tenha sido requerido e deferido no âmbito administrativo.

Quanto à afirmação de que o atendimento à solicitação do TCE/PE estaria obviada


por conta do que prescreve a LC nº 063/04, em sessão plenária, invocando a Súmula nº 347
do Excelso Pretório Pátrio, a Corte de Contas pernambucana deliberou no sentido de negar-
6
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

lhe aplicação ante o fato de estar acoimada pela pecha da INCONSTITUCIONALIDADE


FORMAL E MATERIAL. Vejamos o que prescreve o malsinado dispositivo:

LC nº 063/04

Art. 11. O art. 33 da Lei Complementar nº 28, de 14 de janeiro de 2000, passa a


dispor de § 3º com a seguinte redação.

“Art. 33 ...........................

§3º - Os benefícios previdências, concedidos de forma e condições definidas nesta


Lei, estão sujeitos ao controle interno e externo quanto a sua legalidade, através
da análise dos respectivos atos concessivos, competindo privativamente ao
controle interno determinar eventual majoração de seus valores, ressalvada a
hipótese de controle pelo Poder Judiciário”. (grifamos)

Como se pode verificar, o texto normativo mitiga competência da Corte de Contas


pernambucana. A análise dos atos de aposentadoria para fins de registro (inciso III, art. 30 da
C.E. / inciso III, art. 71 da Carta Magna) é atribuição que conta, para que sua desincumbência
seja mais fecunda, com um mecanismo normativo adjutório, este também elencado no
desenho competencial bosquejado nas Constituições da República e do Estadual (ex vi inciso
IX, art. 30 da CE / inciso IX, art. 71 da C.R.), ou seja, a competência prevista para a análise
dos atos de aposentadoria exercida pelo órgão controlador (Tribunal de Contas) sobre os
órgãos controlados4, permite ao primeiro a utilização da competência genérica e
admoestatória prevista no inciso IX (assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as
providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada a ilegalidade), inclusive -
quando o prazo é assinado no bojo de uma deliberação final do Tribunal -, de forma
impositiva.

Em verdade, o dispositivo da LC nº 063/04 é eufêmico, utiliza-se da expressão


CONTROLE EXTERNO em lugar de TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE
PERNAMBUCO. Assim, manejando com habilidade o criativo eufemismo, o legislador
estadual adentrou na competência do TCE/PE - órgão de extração constitucional e detentor de
autonomia financeira e administrativa -, desrespeitando a INICIATIVA DE LEI de
observância obrigatória. As atribuições do TCE/PE estão debuxadas na CE/89 e em sua Lei

4
A nossa brilhante administrativista Maria Sylvia Zanella Di Pietro, em
artigo publicado na Revista do Tribunal de Contas da União (“Coisa Julgada –
Aplicabilidade a Decisões do Tribunal de Contas da União” – nº 70, 1996, p.33-
34), afirma que não se pode colocar a decisão proferida pelo Tribunal de Contas
no mesmo nível que uma decisão proferida pela Administração Pública. Não haveria
sentido em que os atos controlados tivessem a mesma força que os atos de
controle.
7
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

Orgânica, esta última um repositório legal só modificável por lei de iniciativa da própria
presidência da Corte de Contas.

Sobre o tema, é força lembrar, impende referir o voto da Ministra Ellen Gracie no
M.S. nº 23.996-4/DF, perfilhando trecho do Parecer da Procuradoria-Geral da República:

“De acordo com os incisos III e IX do art. 71 da Constituição Federal, inciso II e


“Caput” do art. 39 da Lei nº 8.443/92 e Regimento Interno do Tribunal de
Contas da União, a Corte de Contas da União possui atribuição para fiscalizar
os atos de concessão de aposentadoria das entidades da administração direta e
indireta. E, de acordo com as normas legais retromencionadas, quando constatar
qualquer ilegalidade deverá dar imediato conhecimento ao órgão de origem para
que adote as medidas regularizadoras cabíveis, sendo essas decisões emanadas
do Tribunal de Contas impositivas (de cunho obrigatório) para a Administração
Pública.”
(grifamos)

Portanto, o preceptivo que a LC nº 063/04 aporta, restringe, de forma lancinante,


competência constitucional do TCE/PE, uma vez que torna inócuo o instrumento jurídico-
constitucional de aperfeiçoamento previsto no inciso IX art. 30 da CE, o que transforma a
função de controle na sobreposição improlífica de uma instância burocrático-cartorial. É certo
que o Princípio da Máxima Efetividade das Normas Constitucionais repudia, de forma
veemente, tamanho dislate. Neste aspecto identifica-se, também, um vício de
INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL.

Pouco importa o que a “referida” lei prescreve, o certo é que tanto a concessão quanto
a denegação do registro pelo TCE/PE são deliberações INTANGÍVEIS ou INDISPONÍVEIS
para a Administração. Portanto, ao invés de resolver um impasse, a lei ora profligada agravou
um indesejável estado de plurivocidade e disseptação. O chamado controle interno (?) não
passou a assenhorar-se de um viés da legalidade dos atos, a uma porque a LEGALIDADE não
pode ser cindida ou “parcializada”5, a duas porque a NÃO-INCLUSÃO de uma vantagem

5
Ao abordar o problema da possibilidade do registro parcial dos atos de
aposentadoria, parcialidade esta que parte da premissa de que o controle da
legalidade pode ser flexibilizado, o preclaro Dr. Flávio Germano de Sena Teixeira
(em “O controle das Aposentadorias pelos Tribunais de Contas” – Fórum, 2004, ps.
232-233) pontifica, com veemência, que, “mesmo quando o prejuízo advindo da
irregularidade da composição é do servidor e não do erário, incumbe aos Tribunais
de Contas dissentirem do ato, vez que o móvel de sua atuação não é, ao contrário
do que asseveram respeitáveis vozes discrepantes, exclusivamente a proteção das
finanças públicas, mas o cumprimento da lei a realização do interesse público
primário, que não desgruda dos princípios da boa-fé e da moralidade pública”. Em
outro excerto, o doutrinador pernambucano rechaça a idéia do registro parcial,
desta feita ponderando que o registro não é ato discricionário e que diante de
composição de proventos que considere indevida, os Tribunais de Contas teriam de
8
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

devida levará à denegação de registro do ato ilegal, denegação esta, como já asseverado,
impositiva no âmbito administrativo. Neste sentido são esclarecedoras as assertivas lançadas
pelo preclaro Flávio Germano de Sena Teixeira, senão vejamos:

“Conquanto se repila a tese da invalidação, dúvida não pode restar de que,


denegado o registro de aposentadoria, cessam imediatamente seus efeitos,
fulmina-se sua eficácia. A invalidação ou o perecimento da eficácia não suscita
disputa de maior significação. Como seja, o ato de aposentadoria tornou-se inútil
para seus fins e, se inacolhidos eventuais recursos administrativos, não buscada
ou inexitosa a tutela judicial requerida, restará permanentemente imprestável.
A denegação fê-lo fenecer.

Da melhor doutrina e jurisprudência pátrias, como visto, extraímos que do


registro depende a continuidade dos efeitos do ato aposentatório. Reversamente,
não concedido o registro, desfazem-se os efeitos, voltando o órgão emitente e o
inativado ao Status quo ante. A denegação de registro, preclusos os prazos para
questioná-la perante o Tribunal de Contas, faz coisa julgada administrativa,
obrigando a Administração.”
“SENA TEXEIIRA, Flávio Germano: “IN” “O controle das Aposentadorias
pelos Tribunais de Contas” – Editora Fórum, 2004, p. 222) grifamos.

Outra não foi a intelecção firmada pelo S.T.F. nos autos do Recurso Extraordinário nº
74.663. A 2ª turma do Excelso Pretório, ao exarar o venerável aresto, asseverou de forma
lapidar que “as decisões do Tribunal de Contas são obrigatórias para os órgãos da
Administração”, salvo a revisibilidade de suas deliberações pelo Poder Judiciário.

Ante o que acima foi expendido, realçamos a convicção de que a apreciação da


LEGALIDADE pelo TCE/PE não pode ser mitigada por norma infraconstitucional,
exatamente por se tratar de competência de socalco constitucional. A LC nº 063/04, sob este
prisma, carrega uma coima de inconstitucionalidade material merecedora de expurgo, uma
vez que pretende seccionar o controle da LEGALIDADE em duas bandas (como se isso fosse
possível), atribuindo uma das quais, privativamente, ao chamado controle interno. A parte que
incumbiria privativamente ao controle interno estaria indene ao controle de legalidade que
deve ser exercido pela Corte de Contas pernambucana, ou seja, a lei instaura um curioso
sistema de DESCONTROLE PARCIAL DOS ATOS SUJEITOS A REGISTRO (legalidade
parcialmente controlada redunda numa legalidade parcialmente descontrolada.). Portanto,
repudiamos o sistema de descontrole parcial instaurado pela LC nº 063/04, visto que carrega a
nódoa da inconstitucionalidade material e formal.

negar registro ao ato, haja vista que o registro de aposentadoria pelos Tribunais
de Contas é ato vinculado.
9
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

Ademais, nunca é tautológico lembrar, o controle da legalidade das aposentadorias,


inclusive no que atine à majoração dos valores dos respectivos proventos, jamais é subtraído
do TCE/PE, pouco importando o que entenda o controle interno, considerando que a
majoração devida e não efetivada significará a DENEGAÇÃO DO REGISTRO DO ATO
pelo controle externo. Dizendo em outros termos, no âmbito administrativo a última palavra
sobre a eficácia do ato de inativação é, irrefragavelmente, do Tribunal de Contas.

Outro aspecto da lei que causa espécie há de ser realçado. O chamado CONTROLE
INTERNO, todo poderoso, é de difícil definição. Tratar-se-ia de um Órgão Central de
Controle Interno? Ao contrário, tratar-se-ia de diversos órgãos setoriais de controle da
legalidade?

Parece-nos anacrônica a criação de uma instância administrativa de controle formal


de atos, até porque o desenho constitucional do controle interno (art. 70, caput, c/c art. 74,
ambos da Lex mater) denota uma preocupação com os chamados controles substantivos
(buscam eficácia e eficiência, o alcance de metas etc. etc). Quando a Carta Magna faz menção
ao controle interno da legalidade, quer referir-se, especialmente, à gestão orçamentária,
financeira e patrimonial, não ao controle de todos os atos de inativação exarados pela
Administração Pública. Ao agente competente incumbe exarar os atos de inativação com
arrimo nas conclusões de uma proficiente assessoria jurídica. Contudo, tal assessoramento,
alcunhada que seja de CONTROLE INTERNO, não poderá, jamais, no exercício de suas
funções, esvaziar a atuação do órgão controlador, até porque uma das missões Constitucionais
do controle interno é auxiliar o controle externo (§ 1º do art. 74 da Carta Magna). Assim,
segundo a Constituição, os dois controles não estão no mesmo plano lógico, é o que
pontificam Maria Sylvia Di Pietro e José Afonso da Silva.

Por fim, após investigar o sentido mais aproximado da expressão CONTROLE


INTERNO insculpido no dispositivo trazido à tona pela LC nº 063/04, concluímos que se
trata de outro eufemismo. Em verdade, os fatos demonstram que a prestigiosa P.G.E
corporifica o CONTROLE INTERNO referido no texto da norma complementar,
funcionando como verdadeiro órgão central de Controle. No que pese a P.G.E contar com
quadros que se destacam no Estado pela excelência de seus conhecimentos, o que é refletido
na irretorquível qualidade de seus trabalhos – pode-se afirmar, sem qualquer dúvida, que a
P.G.E é formada por uma verdadeira plêiade do conhecimento jurídico -, a sua atuação neste
particular tem suscitado uma compreensão distorcida, por parte da Administração Pública do
Estado, do papel a ser exercido pelo Controle Externo em casos como tais. O que se tem
observado é que os pareceres e encaminhamentos exarados pela P.G.E têm vinculado de
forma inarredável a Administração, ao menos é esta a justificativa que, invariavelmente, é
aventada para a não-satisfação das solicitações dos Conselheiros-relatores e para o
descumprimento sistemático das deliberações do TCE/PE.

10
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

São verdadeiros pareceres normativos as linhas de intelecção cunhadas pela P.G.E. e,


de alguma forma, expressadas nos diversos processos de inativação do Estado. Bem mais que
assistir o controle interno – como prevê o inciso XIII do art. 3º da LC nº 03/906 -, mais que
monitorá-lo como órgão central, a P.G.E. tem fixado genuínas interpretações apodícticas, de
observância compulsória e inquestionável.

É bem verdade que a função da P.G.E. de fixar interpretação no âmbito do Poder


Executivo e da Administração autárquica do Estado está prevista no inciso XI do art. 2º da
pré-falada LC nº 02/906, e é salutar que tais questões passem por seu especioso crivo,
agregando valor aos conceitos e teses jurídicas que normalmente eclodem da diuturna análise
processual. Contudo, ponderamos uma vez mais, Permissa vênia, o valoroso trabalho
desempenhado pela P.G.E, por excelente que seja, não pode ser guindado à condição de
verdade apodíctica e aniquiladorada do sobranceiro papel exercido pelo Controle Externo.
Embora saibamos que a intenção daquele proficiente órgão não seja a de negação sistemática
de qualquer dos DEVERES-PODERES exercidos por esta Casa, não pudemos deixar de
constatar que os seus opinativos parecem estar acondicionados em “mensagens-invólucros”
de desestímulo à observância das deliberações do TCE/PE, ao menos é assim que vem
entendendo a Administração.

A absoluta harmonia sempre permeou e sempre deverá permear as relações


institucionais entre a douta P.G.E e o TCE/PE, mesmo sabendo-se que os caminhos da
interpretação e aplicação jurídicas nem sempre são lineares, mesmo cônscios que somos das
sinuosidades presentes na seara da opinião jurídica. Há que se encontrar um adequado
ambiente para que, no desempenho das atribuições previstas no inciso XI do art. 3º da LC nº
02/90, a P.G.E continue realçando sua relevante função profilática e, noutro passo, o TCE/PE
continue sendo vislumbrado de forma plena, conforme o disposto na Lex Fundamentalis.
Nunca é despiciendo lembrar que, segundo o nosso ordenamento jurídico, controle interno
não está no mesmo plano de atuação do controle externo, e não há, por assim dizer, simetria
entre ato controlado e ato controlador. Por fim, como consectário lógico do que acima
dissemos, quadra também lembrarmos, uma vez mais, que o ATO DO TCE/PE QUE
DENEGA REGISTRO, ou torna nulo o ato controlado, segundo uma das correntes
doutrinárias, ou retira-lhe a EFICÁCIA por completo, nada podendo ser feito, no âmbito

6
LEI COMPLEMENTAR Nº 02/90
Art. 3º ... OMISSIS
...........
XI – fixar a interpretação de normas constitucionais, legais e
administrativas a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da
administração estadual;
...........
XIII – assistir o Poder Executivo e autarquias estaduais no controle
interno da legalidade e da moralidade administrativa de seus atos;

11
ESTADO DE PERNAMBUCO
TRIBUNAL DE CONTAS
MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

administrativo, pelo denominado CONTROLE INTERNO para modificar este estado de


coisas7.

Estamos convencidos, portanto, de que a LC nº 063/04, sobre estar maculada pela


coima da inconstitucionalidade formal e material, trouxe para o campo institucional do Estado
uma barafunda improdutiva e que enjambra a lógica do sistema de controle administrativo
edificado no texto da Carta Magna.

Destarte, ante a negativa de retificação do ato de inativação, cumpre ao TCE/PE


denegar registro ao mesmo, desta feita assinando prazo para que sejam adotadas as
providências necessárias ao exato cumprimento da lei.

É o Parecer.
S.M.S

Recife, 22 de agosto de 2006.

DIRCEU RODOLFO DE MELO JÚNIOR


Subprocurador-Geral do MPCO

7
Conforme já foi explicado, a denegação do registro por parte dos
Tribunais de contas torna a despesa respectiva irregular e, por outro lado,
dependendo da corrente doutrinária adotada, ou anula o ato de aposentadoria ou
retira-lhe a EFICÁCIA que até então era precária, ou seja, estava pendente da
deliberação da corte de contas que, nestes casos, opera como um verdadeiro
implemento de uma condição RESOLUTIVA.
12

Você também pode gostar