Plantão 1

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A tentativa de suicídio tem as mesmas características fenomenológicas do suicídio, diferindo

deste apenas quanto ao desfecho, que não é fatal.

Os comportamentos suicidas não constituem uma doença, embora na maioria estejam


associados a diversos transtornos mentais, dos quais os transtornos do humor
(particularmente a depressão), os transtornos por uso de substâncias (especialmente a
dependência de álcool), as esquizofrenias e os transtornos de personalidade são os mais
frequentes.

Ademais, determinadas doenças físicas apresentam também significativa associação com os


comportamentos suicidas, entre as quais a síndrome de dor crônica, doenças neurológicas
(como a epilepsia, lesões neurológicas medulares e centrais e sequelas de acidentes vasculares
cerebrais), infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), a síndrome da
imunodeficiência adquirida e certas neoplasias.

As três principais funções do psiquiatra, em particular, e de todo o pessoal de saúde, no geral,


em relação ao comportamento suicida, são: identificar o risco, proteger o paciente e remover
ou tratar os fatores de risco.

Numa emergência psiquiátrica, as principais situações clínicas associadas ao comportamento


suicida são os pacientes que apresentam grave ideação suicida e os sobreviventes de tentativas
de suicídio, que já estão com os possíveis comprometimentos clínicos e cirúrgicos estabilizados.
Em ambos os casos, o papel do psiquiatra seria o de determinar os procedimentos de curto e
longo prazos para diminuir o risco de suicídio, incluindo uma possível decisão de internação
psiquiátrica.

Fatores de riscos para comportamentos suicidas


Especula-se que o histórico de suicídio (particularmente em parentes de primeiro grau) e
histórico de doença psiquiátrica na família confere risco aumentado para o comportamento
suicida.

Os fatores precipitantes

(estressores) de comportamentos suicidas estão associados uma série de situações que


implicam perdas, reais ou simbólicas, ou mudanças de status, no geral, para pior. Exemplo:

A presença de um transtorno mental é um dos mais importantes fatores de risco para o


suicídio. Em geral, admite-se que de 90% a 98% das pessoas que se suicidam têm um
transtorno mental por ocasião do suicídio, em especial, o transtorno de humor.
Fatores de proteção para os comportamentos suicidas

A maioria das propostas preventivas baseia-se na identificação de fatores de risco, pois há uma
escassez de dados referente aos fatores protetores. É legítimo supor que fatores como
alojamento seguro, segurança em geral, boa alimentação e períodos adequados de repouso
possam não só contribuir para a consolidação da saúde, mas também reduzir o impacto de
fatores adversos, como situações de estresse ou a presença de doenças mentais. Entretanto,
desconhece-se o papel específico desses fatores em relação aos comportamentos suicidas.

Em termos individuais, a resiliência emocional, a capacidade para resolver problemas e certas


habilidades sociais que possam reduzir o impacto de fatores ambientais adversos ou
intrapsíquicos e, dessa forma, contrabalançar o peso de certos fatores de risco.

Não podemos esquecer que há uma coexistência de desejos e atitudes antagônicas que
capturam a indecisão do indivíduo frente à vida. Ele deseja morrer e, simultaneamente, deseja
ser resgatado ou salvo. Atos estereotipados de tomar psicotrópicos e telefonar em seguida
para conhecidos solicitando ajuda expressam ambas as faces do ato. A maioria dos pacientes
suicidas é ambivalente, incorpora uma batalha interna entre o desejo de viver e o desejo de
morrer.
Não há como prever quem cometerá ou não suicídio, mas é possível avaliar o risco individual
que cada paciente apresenta, baseado nos fatores de risco e de proteção investigados na
entrevista clínica.

Em casos de tentativa de suicídio, a entrevista inicial tem dois objetivos: um é semiológico, com
coleta de várias informações; outro é de apoio emocional e de estabelecimento de um vínculo.

O primeiro contato pode ocorrer em condições pouco favoráveis, muitas vezes no pronto-
socorro, estando o paciente reticente, sonolento ou ainda recebendo cuidados médicos
intensivos. O paciente pode mesmo negar que tenha tentado morrer, embora familiares e
equipe médica refiram-se a uma tentativa de suicídio.

Desde o início é preciso tentar o estabelecimento de um vínculo que garanta a confiança e a


colaboração, em um momento em que a pessoa pode se encontrar enfraquecida, hostil e nem
sempre disposta a colaborar.

A entrevista visa à obtenção de um número considerável de informações: caracterização do ato


suicida (método, circunstâncias, intencionalidade), dados de cunho epidemiológico (fatores de
risco, acontecimentos marcantes), fatores predisponentes e precipitantes, aspectos
psicodinâmicos (conflitos, motivações, fantasias a respeito da morte), antecedentes pessoais e
familiares, modelos de identificação, dados sobre a saúde física, rede de apoio social (com
quem o paciente se relaciona e pode contar: em casa, no trabalho, em igreja e associações).

Inicialmente, é importante tomar como foco o conteúdo (frustração, conflito, necessidade)


expressado pela pessoa.

O profissional sente-se, frequentemente, entre dois pólos: de um lado, deve respeitar os


sentimentos da pessoa, incluindo seu desejo de morte, ou sua ambivalência entre viver e
morrer; de outro, já ao final de um primeiro atendimento, deve tomar medidas concretas para
evitar que um paciente atormentado se mate, o que inclui uma possível decisão de uma
internação involuntária.

É inegável que diante da urgência e da angústia que a tentativa ou a ideação suicida nos impõe,
cuidadores e profissionais de saúde podem ser levados a tentar conduzir o paciente para algo
em que realmente acreditam (uma ideologia, uma fé). No entanto, separar estas crenças,
sentimentos ou desejos, sem as negar, faz parte do treinamento, complexo e geralmente
sofrido, dos profissionais de saúde.

ABORDAGEM INICIAL COM O PACIENTE

Deve-se abordar o paciente de uma maneira calma, não julgadora e empática. O assunto deve
ser abordado com tato, porém com clareza, como, por exemplo, perguntar, no contexto da
entrevista clínica, progressivamente, conforme as respostas sejam positivas:

• Tem pensado em morte ultimamente/mais do que de costume?

• Tem pensado em morrer?

• Tem pensado em acabar com a vida?

• Tem feito planos para isso?

• Pode falar mais sobre isso?


1) Quando perguntar?

Depois de se estabelecer um bom relacionamento com o paciente.

• Quando o paciente sentir-se confortável para expressar seus sentimentos.

• Quando o paciente estiver no processo de expressão de sentimentos negativos.

2) Questões adicionais

O processo não termina com a confirmação das ideias suicidas. Ele continua com questões
adicionais para avaliar a frequência e a gravidade da ideação suicida, bem como a possibilidade
real de suicídio. É importante saber se o paciente tem algum plano e se tem os meios de
cometer o suicídio; se o meio proposto é facilmente acessível, o risco de suicídio é maior.
Finalmente, é fundamental que as questões não sejam coercitivas, mas sim que sejam feitas de
maneira suave, na tentativa de se criar a empatia entre o médico e o paciente.

Quanto maior a magnitude e a persistência dos pensamentos suicidas, maior o risco de


eventual suicídio.

O CONTROLE DE NÃO SUICIDIO

Estabelecer um “contrato de não-suicídio” é uma técnica útilna prevenção do suicídio. Esta


técnica pode ser usada em um contexto de emergência, mas com muita cautela, pois o sucesso
do “contrato de não-suicídio” baseia-se, principalmente, na relação terapêutica positiva
estabelecida entre o médico e o paciente. Em um ambiente de emergência, esta relação pode
estar prejudicada e comprometer a capacidade do clínico julgar o real risco do paciente
cometer suicídio. A negociação deve promover a discussão de vários aspectos relevantes para
que o paciente não cometa suicídio. Na maioria das vezes, o paciente respeita a promessa que
faz ao médico, mas só o contrato não é uma medida efetiva, são necessárias todas as outras
medidas de apoio. O estabelecimento de um contrato só é válido quando os pacientes têm
controle sobre suas ações, ou seja, quando não apresentam transtorno mental que prejudique
seu julgamento.

MANEJO DO PACIENTE

Na maioria dos casos, uma transferência para uma enfermaria ou instituição psiquiátrica é
inviável. Mesmo nas emergências psiquiátricas, muitas vezes a estrutura física e o preparo das
equipes médicas e paramédicas estão longe das condições ideais, como por exemplo, a
existência de enfermarias que misturam pacientes suicidas e pacientes clínicos. Como
transformar uma enfermaria clínica ou cirúrgica em um ambiente seguro para um paciente
potencialmente suicida? É importante assinalar o risco de suicídio no prontuário e na papeleta
da enfermagem, bem como o tratamento implementado; mas, mais do que isso, é
imprescindível trocar ideia com a equipe assistencial a respeito do risco e das medidas a serem
adotadas.

Algumas precauções devem ser tomadas, como a remoção de objetos perigosos que estejam a
seu alcance (perfuro-cortantes – como talheres –, ou que possam ser transformados numa
corda – como cintos, isqueiros, ale de medicamentos guardados entre seus pertences), colocá-
lo em leito de fácil observação, se possível em andar térreo ou em local com janelas trancadas
ou com grade e com acesso ao banheiro sempre supervisionado. Autorizar que um
acompanhante sempre esteja presente pode ser uma alternativa a ser adotada.
Pacientes em delirium com turvação da consciência e agitação devem ser sedados, e a
contenção física deve ser criteriosamente usada. Quando da realização de exames ou de
procedimentos fora da enfermaria, esses pacientes devem ser transportados sedados e com
contenção física, contando-se com a possibilidade de agitação psicomotora e de atos suicidas
impulsivos. O plano de tratamento deve ser flexível, passando por revisões periódicas.

Em síntese, podemos dizer que os elementos básicos do atendimento de uma pessoa em crise
suicida são:

• ouvir. Em geral, precisa-se ouvir muito, pois o paciente necessita falar sobre seus
pensamentos e sentimentos. Há situações, no entanto, em que o profissional precisa ser mais
ativo, incentivando o diálogo em busca de soluções, ou tomar ele próprio decisões
emergenciais de proteção à vida;

• aceitação dos próprios sentimentos, incluindo-se tolerância à ambivalência (que é a


coexistência, bastante perturbadora, de sentimentos opostos). O profissional deve se aliar à
parte do paciente que deseja sobreviver;

• um ponto de apoio, como uma boia a qual a dupla terapeuta/ paciente possa tomar fôlego e
continuar depois. Às vezes, já ao fim do primeiro contato, é preciso vislumbrar um ponto por
onde começar a organizar o caos emocional. Um ponto de esperança, poderíamos também
dizer.

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