Qual Se Extingue, Pela Prescrição, Nos Prazos A Que Aludem Os Arts. 205 e 206
Qual Se Extingue, Pela Prescrição, Nos Prazos A Que Aludem Os Arts. 205 e 206
Qual Se Extingue, Pela Prescrição, Nos Prazos A Que Aludem Os Arts. 205 e 206
Acórdão Nº 1838981
EMENTA
1. Apelações cíveis interpostas em ação declaratória de prescrição c/c danos perdas e danos onde se
discute a declaração de inexigibilidade de débito em razão da prescrição, restituição em dobro do valor
debitado na conta salário do autor e reparação por danos morais.
2. O artigo 189 do Código Civil estipula que "violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a
qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. O art. 206, §5º, I do
Código Civil diz que prescreve em 5 anos a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de
instrumento público ou particular.
3. Ainda que o autor tenha assumido, por ocasião do contrato de abertura de conta e abertura de
crédito, a obrigação de autorizar o débito, este somente é exigível dentro do prazo prescricional. Se
esse prazo já foi ultrapassado, o banco réu não tem mais o direito de proceder aos descontos
anteriormente autorizados. Fazê-los agora, de maneira compulsória, configura abuso do direito de
cobrança, devendo a instituição financeira restituir, em dobro, os valores pagos indevidamente.
4. Na espécie, os descontos indevidos realizados na conta corrente do autor para saldar dívida prescrita
comprometeram a integralidade de seu salário, verba de natureza alimentar, privando-o da manutenção
de sua subsistência (mínimo existencial). Tal situação viola a dignidade da pessoa humana, causando
transtornos e constrangimentos passíveis de configurar ofensa aos atributos da personalidade, razão
pela qual deve a instituição financeira compensá-lo pelos danos morais suportados.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas por ambas as partes contra a sentença que, na AÇÃO
DECLARATÓRIA DE PRESCRIÇÃO C/C PERDAS E DANOS C/C PEDIDO DE TUTELA DE
URGÊNCIA, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para declarar a prescrição da
pretensão quanto à cobrança da dívida em questão e condenar o banco réu ao pagamento de R$
3.511,05, a título de repetição simples do indébito, e R$ 2.000,00, a título de danos morais.
BRUNO BORGES PINHEIRO ingressa, sob a égide do rito comum do Código de Processo Civil com
AÇÃO DECLARATÓRIA contra o BRB – Banco de Brasília S.A., partes qualificadas em epígrafe.
Em suas considerações iniciais aduz que seu primeiro mês de trabalho quando foi receber seus
rendimentos em sua conta salário [Agência 218 – Conta Salário 218.010.989-4] do Banco de Brasília –
BRB, foi surpreendido com o bloqueio dos valores, incluindo o vale alimentação.
Explica que tem conhecimento de uma dívida de R$ 400,00 [quatrocentos reais] que correspondia a um
cheque especial que ele tinha há 8 [oitos] anos atrás.
Aponta que por consequência do bloqueio indevido, o autor vem passando por dificuldades financeira,
a acarretando atraso em suas contas de aluguel [moradia], energia elétrica, água, comida para seus
cachorros, afetando até mesmo sua alimentação, frisa-se que parte do valor bloqueado corresponde ao
vale alimentação.
Tece arrazoado jurídico e postula a gratuidade dos atos processuais e o deferimento de tutela de
urgência para que o requerente tenha seu salário restituído. No mérito requer a procedência da
demanda para que seja declarada a cobrança indevida realizada na conta salário do autor, prescrição da
referida dívida. Sucessivamente a condenação do réu à devolução dos valores confiscados/bloqueados
do autor R$ 3.511,05 [três mil reais e quinhentos e onze reais e cinco centavos], em dobro, que totaliza
R$ 7.022,10 [sete mil e vinte e dois reais e dez centavos], e ainda, a condenação do réu ao pagamento
de R$ 15.000,00 [quinze mil reais] a título de danos morais ao autor.
Citado o requerido. Alega que embora a pretensão possa estar prescrita, não acarreta a perda do direito
de retirar valores da dívida da conta; que não praticou qualquer ilícito; que não tem que indenizar. Ao
final, pede a improcedência dos pedidos.
A parte autora apresentou réplica combatendo os pontos suscitados na contestação, e ainda, reforçando
os pedidos iniciais.
Irresignado, o BRB interpôs recurso de apelação (ID53640129), bem como a parte autora, de forma
adesiva (ID53640136).
Em razões recursais, o banco réu alega que a prescrição do título executivo extingue apenas a
pretensão, contudo não atinge o direito à satisfação do crédito, podendo utilizar de meios extrajudiciais
para o recebimento do seu crédito.
Sustenta que os descontos realizados na conta corrente do autor estão de acordo com o disposto no
contrato de abertura de conta e abertura de crédito, visto que teriam sido previamente autorizados por
ele.
Argui que o suposto dano patrimonial alegado pelo autor não tem o condão de gerar dano à sua
personalidade, pois são fatos normais em uma sociedade complexa, moderna e tecnológica, tratando-se
de um mero dissabor.
Por fim, aduz que o “quantum” indenizatório a título de danos morais deve ser fixado em harmonia
com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Requer o provimento do recurso para reformar a sentença, a fim de julgar improcedentes os pedidos
iniciais do autor.
Nas razões recursais, o autor alega que o contrato não estava nos autos, tendo sido apresentado na
apelação do banco réu, sem a sua assinatura.
Aduz que a petição de ID 144810019 apontou mais um valor bloqueado na sua conta corrente (R$
365,68), o que não foi observado pelo juiz sentenciante.
Alega que a conduta do banco réu de reter seu salário para saldar dívida prescrita é contrária à boa-fé
objetiva, visto que a retenção foi voluntária, caracterizando má-fé. Ressalta que o artigo 42 do CDC
somente exclui a devolução em dobro se ele for justificável, o que não ocorreu nos autos.
Pugna pelo provimento do recurso para reformar a sentença, a fim de elevar a condenação para R$
3.876,73, com a devolução em dobro, totalizando R$ 7.753,46, e majorar o dano moral em R$
15.000,00.
É o relatório.
VOTOS
Da admissibilidade
Recursos tempestivos.
Do mérito
Conforme relatado, trata-se de apelações interpostas por ambas as partes contra a sentença que, na
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C DANOS MORAIS E
MATERIAIS, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais.
A questão jurídica a ser enfrentada diz respeito à declaração de inexigibilidade de débito em razão da
prescrição, restituição em dobro do valor debitado na conta salário do autor e reparação por danos
morais.
O artigo 189 do Código Civil estipula que "violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual
se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206".
O art. 206, §5º, I do Código Civil diz que prescreve em 5 anos a pretensão de cobrança de dívidas
líquidas constantes de instrumento público ou particular.
O banco réu não nega a ocorrência de prescrição da dívida contraída pela utilização do limite de
cheque especial, mas argumenta que os descontos realizadosna conta corrente do autor não são
abusivos, visto que estariam de acordo com o disposto no contrato de abertura de conta e abertura de
crédito, previamente autorizados por ele.
Ainda que o autor tenha assumido, por ocasião do contrato de abertura de conta e abertura de crédito,
a obrigação de autorizar o débito, este somente é exigível dentro do prazo prescricional previsto para o
exercício da pretensão que, no presente caso, é quinquenal. Na espécie, esse prazo, já foi ultrapassado,
razão pela qual o banco réu não tem mais o direito de proceder aos descontos anteriormente
autorizados. Fazê-los agora, de maneira compulsória, configura abuso do direito de cobrança.
“A retenção de verbas alimentares do correntista para pagamento de dívida prescrita configura falha
na prestação de serviço da instituição financeira a ensejar a devolução dos valores indevidamente
descontados em conta salário.”. (Acórdão 1212943, 07016002820198070018, Relator: SIMONE
LUCINDO, 1ª Turma Cível, data de julgamento: 30/10/2019, publicado no DJE: 18/11/2019. Pág.:
Sem Página Cadastrada.)
De acordo com o artigo 42, parágrafo único do CDC, para que haja a devolução em dobro, é
necessária a comprovação de três requisitos cumulativos, a saber: (i) que a cobrança realizada tenha
sido indevida; (ii) o efetivo pagamento pelo consumidor; e (iii) que haja engano injustificável.
Assim, levando em consideração que a prescrição não extingue a dívida, mas afasta a pretensão de
exigir o respectivo pagamento, se a instituição financeira procedeu, compulsoriamente, aos descontos
na conta corrente do autor após o transcurso do prazo prescricional, torna-se cabível a restituição em
dobro.
Por ocasião da emenda à inicial (ID 144810019), o autor apontou novo valor bloqueado pelo banco
réu— R$ 365,68— , perfazendo a quantia de R$ 3.876,73 (três mil oitocentos e setenta e seis reais e
setenta e três centavos), descontada indevidamente de sua conta corrente, totalizando R$ 7.753,46
(sete mil setecentos e cinquenta e três reais e quarenta e sei centavos).
O dano moral, por sua vez, decorre do abalo a qualquer dos atributos da personalidade, em especial à
dignidade da vítima, desencadeada pelo evento (art. 5º, V e X da CF).
Na espécie, os descontos indevidos realizados na conta corrente do autor para saldar dívida prescrita
comprometeram a integralidade de seu salário, verba de natureza alimentar, privando-o da
manutenção de sua subsistência (mínimo existencial). Tal situação viola a dignidade da pessoa
humana, causando transtornos e constrangimentos passíveis de configurar ofensa aos atributos da
personalidade, razão pela qual deve a instituição financeira compensá-lo pelos danos morais
suportados.
Na seara da fixação do valor da reparação devida, mister levar em consideração a gravidade do dano,
a peculiaridade do lesado, além do porte econômico da lesante. Também não se pode deixar de lado a
função pedagógico-reparadora do dano moral consubstanciada em impingir ao réu uma sanção
bastante a fim de que não retorne a praticar os mesmos atos, sem, contudo, gerar enriquecimento sem
causa.
Sopesados todos estes elementos, tem-se como razoável e proporcional a condenação do banco réu ao
pagamento da quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de reparação por dano moral, tal como
consignado na r. sentença.
Majoro em 2% (dois por cento) os honorários de sucumbência fixados na origem, nos termos do artigo
85, § 11º, do Código de Processo Civil.
É como voto.
DECISÃO