Professoresas Multiplicadoresas de Educacao em Dir

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Professores/as: multiplicadores/as de educação em direitos humanos

Article in Societade e Cultura · October 2014


DOI: 10.5216/sec.v16i2.32188

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Vera Maria Ferrão Candau


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
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Professores/as:
multiplicadores/as de educação
em direitos humanos
Vera Maria Candau
Doutora em Educação, pela Universidad Complutense de Madrid.
Professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil
[email protected]

Resumo Os direitos humanos constituem um dos eixos centrais da problemática das sociedades
contemporâneas. Para afirmá-los, a educação em direitos humanos vem desenvolven-
do-se cada vez com maior força no Brasil, tanto do ponto de vista normativo como das
políticas públicas e das atividades promovidas pelas organizações da sociedade civil.
No entanto, é possível constatar que ainda são frágeis e pouco frequentes a discussão e
a reflexão sobre o sentido da educação em direitos humanos nas nossas instituições de
ensino. O presente trabalho defende a tese de que a formação continuada de professo-
res/as constitui um espaço privilegiado para a incorporação da educação em direitos
humanos nas nossas escolas, assim como para a formação de educadores/as como agen-
tes multiplicadores comprometidos com os direitos humanos no âmbito educacional
e na sociedade em geral. Está estruturado em três partes, que abordam os seguintes
aspectos: o sentido da educação em direitos humanos, a concepção de formação conti-
nuada adotada e as principais características que deve ter para que mobilize a formação
de professores/as multiplicadores/as da educação em direitos humanos.

Palavras-chave: Brasil, educação, educação em direitos humanos, formação continu-


ada de professores, multiplicadores.

Introdução

E ste ano estamos comemorando 65 anos da Declaração Universal


dos Direitos Humanos e 20 anos da II Conferência Mundial sobre
os Direitos Humanos, promovida pela Organização das Nações Unidas
para comemorar os 45 anos da Declaração Universal, realizada em Vie-
na em 1993. Foram/são anos de muitas controvérsias, novos contextos,
mudanças aceleradas, em que se multiplicaram e diversificaram as vio-
lações de direitos humanos e, ao mesmo tempo, as lutas e esforços pela
afirmação dos direitos já definidos e pela construção e reconhecimento
de novos direitos.
Os direitos humanos continuam sendo um dos eixos fundamentais
da problemática das sociedades contemporâneas. Do âmbito planetário
ao local, afirmados ou negados, exaltados ou violados, eles fazem parte
da nossa vida individual, comunitária e coletiva.
Segundo Lynn Hunt (2009, p. 24-25),

os direitos humanos são difíceis de determinar porque sua definição, e na


verdade sua própria existência, dependem tanto das emoções quanto da
razão. A reivindicação de autoevidência se baseia em última análise num
apelo emocional: ela é convincente se ressoa dentro de cada indivíduo.

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Além disso, temos muita certeza de que um direito paço privilegiado para a afirmação da educação em
humano está em questão quando nos sentimos horro- direitos humanos nas nossas escolas. Os professores
rizados pela sua violação. e professoras convivem diariamente com crianças e
jovens durante muitas horas e muitos anos. Se incor-
No plano nacional, a partir da Constituição de porassem fortemente a perspectiva da educação em
1988, o Estado brasileiro tem feito um esforço siste- direitos humanos, constituiriam agentes multiplica-
mático orientado para a promoção, defesa e proteção dores de especial importância. Essa é a nossa aposta e
dos direitos fundamentais e, respondendo em muitas o nosso empenho.
ocasiões às demandas de diferentes movimentos so- Esta reflexão está centrada em três aspectos que
ciais, vem ampliando progressivamente a inclusão de considero fundamentais: o sentido da educação em
novas dimensões e questões em suas preocupações. direitos humanos, a concepção de formação continu-
Hoje possuímos um significativo conjunto normativo ada que assumo e as principais características que essa
e de políticas públicas centradas na proteção e pro- educação deve ter para que mobilize a formação de
moção dos direitos humanos. professores/as multiplicadores/as da educação em di-
Por outro lado, a educação em direitos huma- reitos humanos. Está situada no contexto da pesquisa
nos vem se afirmando cada vez com maior força no “Educação em Direitos Humanos na América Latina
Brasil, tanto no âmbito das políticas públicas como e no Brasil: gênese histórica e realidade atual”, que
das organizações da sociedade civil, especialmente a vem sendo desenvolvida desde 2008, com o apoio
partir do lançamento do Plano Nacional de Educação do CNPq, pelo Grupo de Estudos sobre Cotidiano,
em Direitos Humanos em 2003, e de sua reedição Educação e Cultura/s (GECEC), que coordeno e que
em 2006 (Brasil, 2003, 2006). Recentemente, em está vinculado ao Programa de Pós-graduação em
2012, foram aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação da PUC-Rio.
Educação e homologadas pelo Ministro da Educação,
as Diretrizes Nacionais para a Educação em Direi-
tos Humanos (Resolução CNE/CP n. 1), publicadas Que sentido tem educar em
no Diário Oficial da União em 30 de maio de 2012
(Brasil, 2012). direitos humanos?
Tanto a Secretaria de Direitos Humanos quanto
o Ministério de Educação vêm promovendo ativida- Uma questão fundamental para a presente refle-
des e oferecendo apoios diversos para o seu desenvol- xão é perguntarmo-nos sobre a possibilidade e o sen-
vimento. São realizados seminários, cursos, palestras, tido de educar em direitos humanos.
fóruns, e publicados livros, artigos e materiais didá- Em primeiro lugar, é importante ter presente que
ticos etc. em diferentes regiões do país, por iniciativa os direitos humanos são historicamente construídos
de universidades, secretarias de Educação e outros ór- e não brotam espontaneamente da dinâmica social.
gãos públicos, movimentos sociais, organizações não São conquistas históricas e frutos de muitas lutas e
governamentais etc. sofrimentos, que suscitaram uma progressiva tomada
No entanto, considero que, para que os referidos de consciência da humanidade sobre o que significa
documentos afetem realmente as práticas educativas sermos pessoas humanas.
de nossas escolas, a formação - inicial e continuada No mundo atual é possível detectar, em muitos
- de professores e professoras sobre essa temática é ambientes, indicadores de retrocesso dessa consciên-
fundamental. A partir da experiência de desenvolver cia, e muitos seres humanos são considerados descar-
diferentes atividades de educação em direitos huma- táveis e “sobram”, justificando-se a sua eliminação
nos, participar em vários espaços em que se reflete física ou simbólica. Hoje é de especial importância
e discute essa temática, assim como do diálogo com promover processos em que se trabalhe a sensibiliza-
educadores/as de diversas partes do país, posso afir- ção, a consciência da dignidade de todo ser humano
mar que são poucas as instituições, tanto do ensino e a promoção de uma cultura dos direitos humanos.
básico quanto do ensino superior, que introduzem Outro aspecto importante a considerar é a in-
de modo sistemático questões relativas à educação trínseca relação entre a educação como direito hu-
em direitos humanos nos processos formativos que mano e a educação em direitos humanos. Segundo o
promovem. É possível afirmar que ainda é frágil e Programa Mundial para Educação em Direitos Hu-
pouco frequente a discussão sobre essa incorporação manos, aprovado pela ONU em 2008,
e a reflexão sobre o sentido da educação em direitos
humanos nas nossas instituições educativas. de um modo geral, a educação em direitos huma-
Partindo dessas considerações iniciais, pretendo nos é considerada como parte integrante do direito à
no presente trabalho defender a tese de que a for- educação. Como afirmou o Comitê dos Direitos das
mação continuada de professores/as constitui um es- Crianças na sua observação geral n.1, “A educação a
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que tem direito toda criança é a que tem por objeto que proponho supõe processos multidimensionais e
prepará-la para a vida cotidiana, fortalecer sua capa- diversificados, orientados para a construção de su-
cidade de desfrutar de todos os direitos humanos e jeitos de direito, cidadãos e cidadãs participativos e
fomentar uma cultura em que prevaleçam valores de comprometidos com a construção democrática em
direitos humanos apropriados” (parte 2). Esta educa- todos os âmbitos sociais.
ção oferece a toda criança uma ferramenta indispen-
sável para que, com seu esforço, logre ao longo da sua
vida uma resposta equilibrada e respeitosa dos direi- Como concebemos a formação
tos humanos às dificuldades que acompanham a um
período de mudança fundamental impulsionado pela continuada de professores/as?
mundialização, as novas tecnologias e os fenômenos
conexos. (p. 8) A problemática da formação continuada de pro-
fessores/as adquire no momento atual especial rele-
Um terceiro argumento que fundamenta a im- vância e destaque. A busca pela construção da quali-
portância da educação em direitos humanos refere-se dade de ensino, especialmente do ensino básico, por
ao fato de ela ser indispensável para a efetivação de mais ambivalente e polissêmica que essa expressão
todos os direitos humanos na nossa sociedade. seja, exige necessariamente repensar a formação de
Para Fritzsche (2004, p. 162), professor de Ci- professores/as, tanto no que se refere à formação ini-
ência Política responsável pela cátedra da Unesco so- cial como à formação continuada.
bre educação em direitos humanos na Universidade Para a implantação de qualquer proposta que ob-
de Magdeburg (Alemanha), a educação em direitos jetive uma renovação das escolas e das práticas peda-
humanos gógicas, a formação continuada de professores e pro-
fessoras passa a ser um aspecto especialmente crítico e
não é um adendo pedagógico, mas um componente importante. Qualquer possibilidade de êxito do pro-
genuíno dos direitos humanos. Para que serve ter di- cesso que se pretenda mobilizar tem no/a professor/a
reitos humanos se não os conhecemos e para que co- em exercício seu principal agente. Nesse sentido, a
nhecê-los se não os compreendemos? E, finalmente, formação continuada constitui, sem dúvida, um tema
para que serve compreendê-los se ninguém está pre- de particular atualidade, de natureza complexa e que
parado para respeitá-los e promovê-los? O desenvol- pode ser abordado e analisado a partir de diferentes
vimento dos direitos humanos inclui a compreensão enfoques, dimensões e estratégias.
de que eles devem alicerçar-se solidamente na consci- Em confronto com uma perspectiva que centra
ência cidadã e que isto exige esforços do movimento a formação continuada dos professores/as em pro-
conhecido como educação em direitos humanos. cessos de capacitação, presenciais ou a distância - as
ofertas on line se multiplicam -, orientados a atuali-
Considero fundamental ressaltar ainda um úl- zar e “reciclar” os conhecimentos e as práticas dos/as
timo motivo para educar-se em direitos humanos. educadores/as, certamente a perspectiva atualmente
Refere-se à intima relação entre democracia, cidada- mais desenvolvida, vem se configurando, principal-
nia e direitos humanos. A formação para o exercício mente nos últimos tempos, em uma série de buscas,
de uma cidadania ativa e a participação nos esforços reflexões e pesquisas que não negam as contribuições
pela democratização da nossa sociedade, nas suas di- desses “cursos”, mas estão orientadas a construir uma
ferentes dimensões, inclui necessariamente trabalhar concepção diferente da formação continuada.
a problemática dos direitos humanos. Na experiência de professores e professoras, o dia
O horizonte que proponho é favorecer a cons- a dia na escola é um lócus de formação. Nesse cotidia-
trução de uma cultura dos direitos humanos que pe- no, ele/a aprende, desaprende, reestrutura o aprendido,
netre os diferentes espaços da vida social, da família faz descobertas e, portanto, é nesse lócus que muitas
às estruturas e políticas do Estado. Do âmbito local vezes vai aprimorando a sua formação, particularmen-
ao planetário. te quando são favorecidos os processos coletivos de
Essa perspectiva supõe uma concepção de edu- discussão, a reflexão e as buscas de aperfeiçoamento
cação que, me atrevo a afirmar, questiona a lógica das práticas educativas. Nesse sentido, considerar a es-
predominante nas atuais políticas educacionais privi- cola como lócus de formação continuada passa a ser
legiadas, centradas quase exclusivamente na aquisição uma afirmação fundamental para construir uma nova
de determinados conteúdos curriculares, no desem- perspectiva para a formação continuada de professo-
penho medido por instrumentos padronizados e na res/as que não se limite a oferecer diferentes “cursos”
homogeneização dos processos educativos, e orien- aos docentes, considerados individualmente. Mas esse
tadas basicamente para a inserção no mercado e na objetivo não se alcança de uma maneira espontânea,
lógica do consumo. A educação em direitos humanos pois não é o simples fato de estar na escola e de de-

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senvolver uma prática escolar concreta que garante Formação continuada de


a presença das condições mobilizadoras de um pro- professores/as e educação em
cesso formativo. Uma prática repetitiva, uma prática
mecânica não favorece esse processo. Para que ele se direitos humanos
dê, é importante que essa prática seja reflexiva, capaz
de identificar as questões presentes na sala de aula, de Tendo presentes os aspectos já assinalados, desta-
buscar formas de trabalhá-las e compreendê-las, con- carei alguns componentes que considero articulado-
juntamente. A prática coletiva, construída por grupos res de processos de formação continuada de professo-
de professores/as ou por todo o corpo docente de uma res/as como agentes multiplicadores da educação em
determinada instituição escolar, constitui um elemen- direitos humanos.
to-chave particularmente importante. Em primeiro lugar, gostaria de ressaltar o que
Nessa perspectiva, o educador português Antô- considero que deve ser evitado, porque educar em
nio Nóvoa já em 1991, afirmava: direitos humanos, na minha perspectiva, não signi-
fica: o desenvolvimento de uma série de atividades
A formação continuada deve estar articulada com o esporádicas sobre temas relacionados com os direi-
desempenho profissional dos professores, tornando as tos humanos, sem articulação entre elas; a mera re-
escolas como lugares de referência. Trata-se de um alização de campanhas sobre temas específicos; um
objetivo que só adquire credibilidade se os programas conteúdo introduzido em algumas disciplinas e áreas
de formação se estruturarem em torno de problemas curriculares; toda e qualquer formação em valores; a
e de projetos de ação e não em torno de conteúdos mera aquisição de algumas noções sobre a Declaração
acadêmicos. (Nóvoa, 1991, p. 30) Universal dos Direitos Humanos e outros documen-
tos referenciais para a área.
E se perguntava: Na perspectiva que assumo, a educação em di-
reitos humanos deve ser introduzida como um eixo
Que potencialidades formadoras pode conter um orientador do projeto político-pedagógico de cada
projeto de escola? Como é que a formação pode in- escola e ser objeto de uma reflexão coletiva e de todo
tervir na promoção e desenvolvimento de práticas o corpo docente, com a finalidade de promover sua
inovadoras? Que condições é preciso reunir para que incorporação em todas as áreas curriculares e nos di-
a ação profissional cotidiana possa ser explorada em ferentes componentes da dinâmica escolar, tais como
todas as suas dimensões formativas? Que mudanças é as relações entre os diferentes sujeitos nela implica-
preciso introduzir nas escolas para que elas se assu- dos - professores, alunos, funcionários, pais de alu-
mam como lugares de formação? (p. 30) nos e agentes comunitários -, assim como as questões
relativas aos processos avaliativos, à disciplina e aos
Partir do reconhecimento da escola como lócus conflitos presentes na escola, às relações com a comu-
privilegiado da formação continuada tem várias im- nidade etc.
plicações. Trata-se de trabalhar com o corpo docente A perspectiva da educação em direitos humanos
de uma determinada instituição favorecendo pro- que assumo está orientada a promover um compro-
cessos coletivos de reflexão e intervenção na prática misso existencial com a incorporação dos direitos hu-
pedagógica concreta, oferecendo espaços e tempos manos nas nossas vidas e práticas cotidianas. Não pode
institucionalizados de encontro, criando sistemas de ser reduzida a uma dimensão meramente cognitiva,
estímulo à sistematização das práticas pedagógicas sem negar a importância da aquisição de um corpo de
dos/as professores/as e à sua socialização, e ressitu- conhecimentos atualizado sobre essa temática. Nesse
ando o trabalho de supervisão/orientação pedagógica sentido, as estratégias metodológicas a ser utilizadas
nessa perspectiva. têm de ser coerentes com uma visão contextualizada
A formação continuada, portanto, não pode ser e histórico-crítica do papel dos direitos humanos e do
concebida como um meio de acumulação (de cursos, sentido da educação neste âmbito: formar sujeitos de
palestras, seminários etc.) de conhecimentos ou de direito, empoderar os grupos socialmente vulneráveis
técnicas, e sim mediante um trabalho de reflexivi- e excluídos e resgatar a memória histórica da luta pe-
dade crítica sobre conhecimentos e práticas, de (re) los direitos humanos na nossa sociedade.
construção permanente de uma identidade pessoal e Sendo assim, a primeira pergunta que temos de
profissional. É nessa perspectiva que acredito ser ne- nos fazer é se as estratégias pedagógicas que privi-
cessário pensar os processos de formação continuada legiamos estão favorecendo caminhar nessa direção
de professores/as como multiplicadores de educação e quais são os aspectos que consideramos mais em
em direitos humanos e, a partir dela, incorporar di- sintonia com essa orientação.
ferentes estratégias pedagógicas, tanto presenciais É bastante comum que afirmemos que queremos
quanto a distância. formar sujeitos de direito e colaborar para a trans-
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formação social e, no entanto, do ponto de vista pe- presentes ao longo de todo o processo, que deve ter
dagógico, utilizamos fundamentalmente estratégias como referência fundamental a realidade social e as
centradas no ensino frontal, isto é, exposições verbais experiências dos participantes. Especial atenção deve
ou mediáticas, quando muito introduzindo espaços ser dada aos relatos de histórias de vida relacionadas às
de diálogo com expositores ou membros de mesas- violações ou à defesa dos direitos humanos, apresen-
-redondas. Esse tipo de estratégia atua fundamen- tadas pelos próprios participantes, por meio de entre-
talmente no plano cognitivo, quando muito oferece vistas realizadas com determinadas pessoas indicadas
informações, ideias e conceitos atualizados, mas não pelo grupo, matérias de jornais ou informes de outros
leva em consideração as histórias de vida e as experi- meios de comunicação.
ências dos participantes e colabora pouco para a mu- Trata-se, portanto, de transformar mentalidades,
dança de atitudes, comportamentos e mentalidades. atitudes, comportamentos, dinâmicas organizacio-
Em geral, no melhor dos casos, propicia espaços de nais e práticas cotidianas dos diferentes atores, indi-
sensibilização e motivação para as questões de direitos viduais e coletivos, e das organizações sociais e edu-
humanos, mas seu caráter propriamente formativo é cativas. Para a construção de agentes multiplicadores
muito frágil. é necessário favorecer processos que promovam um
A perspectiva anteriormente assinalada supõe a compromisso existencial com os direitos humanos.
realização de processos formativos. A palavra proces- Para tal, é necessário educar em direitos humanos, isto
so é fundamental. Exige uma série de atividades arti- é, propiciar experiências em que se vivenciem os di-
culadas e desenvolvidas em um determinado período reitos humanos.
de tempo.
Outra característica desses processos orientados
pela concepção explicitada é o papel ativo de todos/ Considerações finais
as os/as que deles participam. No que diz respeito
aos temas a ser trabalhados, eles devem ser definidos
tendo-se presente as características e interesses de A promoção da formação de professores e pro-
cada grupo, mas sempre situando as questões abor- fessoras como agentes multiplicadores/as da educação
dadas num contexto social amplo e em relação à pro- em direitos humanos, na perspectiva adotada neste
blemática e aos conceitos fundamentais relacionados trabalho, supõe privilegiar processos de formação
com os direitos humanos. Além disso, é importante continuada em que se assume a escola como lócus
mobilizar diferentes dimensões presentes nos proces- privilegiado. É mediante a reflexão coletiva dos/as
sos de ensino-aprendizagem, tais como: ver, saber, educadores/as, do diálogo entre a teoria e a prática,
celebrar, sistematizar, comprometer-se e socializar. da busca conjunta da construção de práticas educati-
Essas dimensões são concebidas de maneira inte- vas coerentes com a construção de sociedades huma-
grada e inter-relacionada. O ver refere-se à análise nas e democráticas que se vão constituindo sujeitos,
da realidade; o saber, aos conhecimentos específi- professores/as, existencialmente comprometidos/as
cos relacionados ao tema desenvolvido; o celebrar, com a afirmação dos direitos humanos nas nossas es-
à apropriação do trabalhado, utilizando diferentes colas e na sociedade em geral.
linguagens, como simulações, dramatizações, músi- A perspectiva da educação em direitos humanos
cas, elaboração de vídeos etc. A sistematização supõe confronta políticas educativas centradas em aspectos
a construção coletiva que sintetiza os aspectos mais meramente operacionais do processo educativo, que
significativos assumidos por todo o grupo; e o com- se voltam quase que exclusivamente para a dimen-
prometer-se, a identificação de atitudes e ações a se- são cognitiva da educação e têm como horizonte a
rem realizadas. A socialização da experiência vivida inserção na sociedade do mercado e do consumo. A
no contexto em que se atua constitui a etapa final do educação em direitos humanos promove uma visão
processo. Em todo ele, o papel do/a dinamizador/a, crítica sobre a realidade em que vivemos e o compro-
do/a professor/a é fundamental. misso com sua transformação, tendo por base a cons-
A utilização de metodologias ativas e participati- trução de uma sociedade mais igualitária e equitativa
vas, o emprego de diferentes linguagens, a promoção e a construção de uma cultura dos direitos humanos
do diálogo entre diversos saberes são componentes que penetre todos os âmbitos sociais.

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Referências
BRASIL. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. (Eds.). Perspectivas internacionais em educação em direitos
Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano humanos. Gütersloh: Bertelsmann Foundation Publishers,
Nacional de Educação em Direitos Humanos. Brasília, 2003. 2004.
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Nacional de Educação em Direitos Humanos, Brasília, 2006. Companhia das Letras, 2009.
______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de NÓVOA. A. Concepções e práticas da formação contínua
Educação. Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos dos professores. In: NÓVOA. A. (Org.). Formação contínua
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de 2012. de Aveiro, 1991.
FRITZSCHE, P. K. O que significa educação em direitos ONU. Assembleia Geral. Programa Mundial para a Educação
humanos. 15 teses. In: GIORGI, V. e SEBERICH, M. em Direitos Humanos, 2008.

Profesores: multiplicadores de educación en derechos humanos


Resumen

Los derechos humanos constituyen uno de los ejes centrales de la problemática de las sociedades contemporáneas. Para su afirmación,
la educación en derechos humanos viene desarrollándose con cada vez más fuerza en Brasil, del punto de vista normativo y de las
políticas públicas, así como de las actividades promovidas por las organizaciones de la sociedad civil. Sin embargo, es posible decir
que todavía es frágil y poco frecuente la discusión y reflexión sobre el sentido de la educación en derechos humanos en las institu-
ciones de enseñanza. El presente trabajo defiende la tesis que la formación continuada de educadores es un espacio privilegiado para
la incorporación de la educación en derechos humanos en nuestras escuelas, así como para la formación de educadores como agentes
multiplicadores y comprometidos con los derechos humanos en el ámbito educativo y de la sociedad en su globalidad. Está organizado
en tres partes que desarrollan los siguientes aspectos: el sentido de la educación en derechos humanos, la concepción que adoptamos
de formación continuada y las principales características que debe tener una educación en derechos humanos orientada a la formación
de educadores multiplicadores de esta perspectiva.

Palabras clave: educación en derechos humanos, formación continuada de educadores, agentes multiplicadores de derechos humanos.

Educators: multipliers of human rights education


Abstract

Human rights play a central role in the problems that contemporary societies face. In order to assert such rights, human rights educa-
tion has strongly developed within Brazil in recent years. Notable developments have taken place in law, public policy and activities
promoted by civil organizations regarding the issue. However, it is perceivable that discussions and reflections on human rights in our
schools are still fragile and rare. This work defends the thesis that providing continuing education to professional educators is a viable
strategy regarding the incorporation of this subject material into the school curriculum. Consequently, educators would function as
committed agents of multiplication, not only in the school environment, but also within society as a whole. The paper, structured in
three parts, conveys the following aspects: the meaning of human rights education; the conception we have adopted into this con-
tinuing education curriculum for educators; as well as the main characteristics this must contain in order to mobilize teachers into
becoming multipliers of human rights education.

Key words: human rights education, continuing education for educators, agents of multiplication of human rights education.

Data de recebimento do artigo: 13/5/2013


Data de aprovação do artigo: 20/12/2013

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