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PARECER JURIDÍCO

Arielle Caroline Brito Monteiro


Deise Lara Lima Patez Araújo
Emanuel Santos Prates
Gilmar Jefferson dos Santos Ribeiro
João Gabriel de Oliveira Guedes
Kelly Fantine Oliveira dos Santos
Meiriane Santos Oliveira
Susana Miranda Magalhães
Vandilson Ferreira Matos

Unidade Curricular: Teoria geral do direito


Professores: Julio Gama e Raphael Almeida

2024
Resumo

O presente parecer foi elaborado pelos discentes do curso de direito da Unifg, Município de
Guanambi no Estado da Bahia, e tem como objetivo, analisar juridicamente a aplicação da
Teoria da Decisão em dois casos que provocam debates sensíveis no meio jurídico e na
sociedade.
O primeiro caso aprecia a decisão judicial que sob críticas de grupos conservadores, autorizou a
interrupção da gravidez de uma menina de 10 anos, vítima de violência sexual, que estava com
22 semanas de gestação. O segundo caso, analisa a sentença que reconheceu o direito a pensão
alimentícia para um animal de estimação.
Diante disso, é evidente que quando surge a necessidade de apreciação, o julgador se depara
com a responsabilidade de elaborar uma sentença que não seja apenas a resolução de mais uma
questão, pois os chamados casos difíceis (hard cases), são complexos e necessitam da análise de
vários de fatores dentro do contexto de cada situação, e certamente a busca pela melhor
solução, estará além texto positivado.
Nesse sentido, serão abordados alguns conceitos, posicionamentos e teorias da decisão que
versam sobre o papel do julgador e o equilíbrio entre o uso da discricionariedade e a
manutenção do Estado Democrático de Direito.
Antes de tudo, é importante destacar que a análise dos casos selecionados se concentrará nos
aspectos jurídicos envolvidos, desconsiderando questões de senso comum ou de natureza
técnica que não se enquadram no propósito do estudo.
Portanto, o parecer se propõe a examinar os fatos relevantes para o direito com base na teoria
da decisão e se compromete a formular o melhor entendimento no âmbito judicial para os casos
abordados.
PARECER JURIDICO: MENINA DE 10 ANOS VIOLENTADA FAZ ABORTO LEGAL,
SOB ALARDE DE CONSERVADORES À PORTA DO HOSPITAL

DOS FATOS
Em agosto de 2020, na cidade de São Matheus no Espírito Santo, foi proferida uma decisão
judicial do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, para autorizar a interrupção da gravidez de
uma menina de 10 anos que foi violentada sexualmente durante os últimos quatro anos. O
abusador era um tio que foi detido em Minas Gerais e posteriormente, foi condenado a 44 anos
de reclusão.
Antes que o procedimento fosse realizado, a criança chegou a ser internada no Hospital
Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam), em Vitória. Porém a equipe médica do
Programa de Atendimento as Vítimas de Violência Sexual (Pavivis), decidiu não realizar o
aborto. Diante disso, a criança precisou viajar para Recife, no estado de Pernambuco, a mais
1.600 quilômetros de onde morava, para cumprir a decisão no único hospital que aceitou fazer
o procedimento. Enquanto isso, foi divulgado na mídia, que o motivo da negativa de realizar o
procedimento seria a idade gestacional que estava com o tempo superior ao que a Norma
Técnica de Atenção Humanizada ao Abortamento, editada em 2005 pelo Ministério da Saúde
regulamenta. Entretanto, o superintendente do Hucam e o secretário de saúde do Estado se
manifestaram em uma entrevista coletiva esclarecendo que atendeu os protocolos técnicos de
saúde e foi por conta de limitações técnicas, que a equipe médica decidiu por não realizar o
procedimento. Segundo o pronunciamento, após os exames, a equipe constatou que as
condições de desenvolvimento da gravidez (22 semanas e quatro dias e um peso fetal de 537
gramas), indicavam um procedimento que o hospital Hucam não teria capacidade técnica de
executar. Haja vista que o protocolo do Pavivis, segue a norma técnica do Ministério da Saúde
para o abortamento humanizado, existente desde 2005, deixa claro o que abortamento é
considerado, quando o limite da gravidez, é de 22 semanas e o peso de 500 gramas. Diante
disso, a medida mais segura para a menina, seria direcioná-la para um hospital que tivesse a
estrutura estabelecida pelos protocolos de saúde.
A discussão sobre o caso deveria ser tratada com absoluto sigilo, mas após a o vazamento de
informações, ocorreram várias manifestações de conservadores que criticavam a decisão que
permitiu o aborto. Finalmente, depois de muito tumulto e exposição da família na porta do
hospital de Recife-PE, a vítima teve acesso ao direito concedido pela decisão judicial, e o
procedimento foi realizado.

ANÁLISE JURIDICA

Este parecer tem por objetivo analisar, à luz da Teoria da Decisão, o caso em que uma menina
de 10 anos, vítima de violência sexual, teve o aborto autorizado por decisão judicial, apesar das
críticas de grupos conservadores. O procedimento foi realizado por um médico após a devida
autorização. A análise será fundamentada nas contribuições de Ronald Dworkin e Lenio
Streck, com ênfase na ponderação dos princípios constitucionais que guiaram a decisão. O caso
envolve uma menina de 10 anos, grávida em decorrência de estupro, cuja gestação apresentava
riscos à sua saúde física e mental. A decisão judicial que autorizou o aborto foi fundamentada
na legislação brasileira, especificamente no Código Penal, que permite o aborto em casos de
estupro (art. 128, inciso II) e quando há risco à vida da gestante (art. 128, inciso I).1
Além do amparo normativo, a decisão também foi guiada por princípios constitucionais como a
dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da Constituição Federal) e a proteção integral à
criança (art. 227 da Constituição Federal)2, ambos centrais para a análise de conflitos de direitos
fundamentais. De acordo com Ronald Dworkin, o direito deve ser interpretado a partir de
princípios e não apenas de regras. No caso em questão, o juiz, ao autorizar o aborto, atuou
como o "juiz Hércules", ponderando entre os valores morais e direitos fundamentais
envolvidos (DWORKIN, 2002, p. 31-34).3
 Princípio da Dignidade Humana: A decisão ponderou o direito à vida do nascituro
com o direito à saúde e à dignidade da menina. Dworkin defende que o princípio da
integridade moral deve prevalecer, em casos semelhantes a este, em que a gestação
forçaria a menina a suportar consequências físicas e psicológicas devastadoras
(DWORKIN, 2002, p. 240-242). No caso do aborto, por exemplo, a proteção da
dignidade implica que a gestante) deve ter a sua autonomia respeitada em relação à
decisão sobre o próprio corpo e saúde, ainda mais em situação de vulnerabilidade, como
uma criança. A dignidade da menina envolve reconhecer que forçá-la a continuar uma
gravidez indesejada decorrente de violência seria uma violação à sua autonomia moral e
uma imposição de sofrimento desproporcional.
 Direito como Integridade: Dworkin também propõe que o direito seja visto como um
sistema de integridade, no qual as decisões devem harmonizar-se com os direitos e
valores constitucionais. Nesse caso, a decisão judicial reflete uma interpretação coerente
com o direito à proteção da saúde e à dignidade humana (DWORKIN, 2002, p. 225).4
Para Lenio Streck, as decisões judiciais devem ser baseadas na normatividade constitucional
e no respeito aos direitos fundamentais, evitando qualquer influência de subjetivismos ou
pressões externas. Streck critica o decisionismo e defende a hermenêutica constitucional
como a base para a tomada de decisões.
 Centralidade da Constituição: Streck sustenta que a Constituição Federal,
especialmente os artigos relacionados à dignidade humana e à proteção integral da
criança, deve ser a base da decisão judicial. No presente caso, a autorização do aborto
preserva esses princípios constitucionais (STRECK, 2011, p. 129-131)5. No caso do
aborto autorizado judicialmente da menina de 10 anos, a centralidade da Constituição
está diretamente ligada à proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da CF),
ao direito à saúde (art. 196 da CF) e ao princípio da proteção integral à criança (art.
1
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm.
2
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. Nessa
obra se faz referencia sobre o principio da dignidade humana, o direito como integridade e
a atuação do Juiz “Hércules”.
3
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2011.
4
STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso: Constituição, Hermenêutica e Teorias
Discursivas. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
5
ALBUQUERQUE FILHO, 2002, p. 145.
227 da CF). A decisão judicial deve se basear nesses princípios constitucionais,
assegurando que a Constituição seja a guia normativa para a solução do caso.
 Crítica ao ativismo judicial: A decisão do juiz não pode ser vista como ativista, mas
sim como uma aplicação objetiva da normatividade constitucional6, uma vez que ela
foi fundamentada nos princípios do direito à saúde, à dignidade humana e à proteção
integral da criança (STRECK, 2014, p. 75-77).

DOS POSSÍVEIS CRIMES E VIOLAÇÕES


Diante do alvoroço e grande repercussão do caso in comento, observa-se o vazamento
de informações à matéria que, em tese deveria ser resolvida sob sigilo. Dessa forma, os
Consulentes buscam fundamentos jurídicos que os amparem para as tratativas do abortamento
legal a fim de proceder com esse objetivo fim. Assim sendo, invocando as legislações
pertinentes, haveremos de verificar a consonância dos direitos positivados para com o caso
concreto.
Ab initio, é preciso qualificar a vítima, que nesse caso, cumpre invocar o Estatuto da
Criança e do Adolescente, como legislação específica para categorização do seu estado de
criança, sobretudo o art. 2º: considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze
anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. (Grifo
nosso).
Ainda em tempo, paira de forma hesitosa, como deu-se essa publicização do caso diante
às mídias e meios de comunicação nacional.
Nesse ínter0069m, nota-se uma afronta ao que prevê a Carta Magna de 88. A
Constituição Federal, em seu artigo 5º, inc. X, traz a seguinte redação: são invioláveis a
intimie, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização
material ou moral decorrente de sua violação.
O caso permeia em sentido contrário à proteção da intimidade da vítima estuprada,
caracterizando de fato violação em seu direito fundamental de inviolabilidade de sua
intimidade.
Nesse contexto, ainda em se tratando do que deveria correr sob sigilo, cumpre imperioso
destacar o art. 154 do Código Penal: revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem
ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir
dano a outrem. Fica evidente o dano causado à vítima, a tal ponto que a fez transladar para
outro estado em busca de auxílio e amparo médico, anteriormente negado.
Ademais, fica óbvio a influência política e midiática após a devida proporção nacional
que acompanhou toda trama, resultando ainda mais na dificuldade de decisão, pressão e
tentativa de indeferimento na escolha da vítima e de sua representante legal.

6
BEANI, Larissa. “A era dos pais de Pet”. Veja Saúde, 2024. Disponível em:
https://saude.abril.com.br/vida-animal/a-era-dos-pais-de-pet. Acessado em 14 out 2024.
Em face do exposto, o Estado, em seu dever de punir, deve averiguar de onde surge tal
revelação a público para assim imputar a quem deu causa às condutas de violação do segredo
profissional, descritas pelo Código Penal.

DO ARTEFATO JURÍDICO APLICADO AO CASO CONCRETO


Ainda em tempo e não menos importante, devemos atentarmos ao objeto central,
buscado pela consulente que é: o amparo jurídico para o abortamento.
A legislação brasileira traz em seu Código Penal, no rol dos CRIMES CONTRA A
DIGNIDADE SEXUAL, o crime de estupro, previsto no Art. 213 e afins, tendo como texto:
(...)
Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a
praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.
Adiante, ao ato de estupro, o legislador trouxe como penalidade, reclusão de 6 a 10 anos.
Imperioso destacar que, o rol dos crimes que tratam a liberdade sexual abarca outras
séries de condutas de mesmo cunho.
Assim sendo, no capítulo II, ainda em se tratando do caderno dos crimes contra a
dignidade sexual – Título VI, temos a figura do estupro de vulnerável, caso esse enquadrado na
matéria abordada pelo consulente, figurando no Art. 217-A, vislumbrando assim obtenção de
visão técnica-jurídica para o autorização do ato.
Nos termos do artigo supramencionado, ter conjunção carnal ou praticar outro ato
libidinoso com menor de 14 (catorze) anos, denomina-se como Estupro de vulnerável. Esse é o
texto de lei positivado no Código Penal Brasileiro, imputando-o a penalidade para quem o
pratica reclusão de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
A vítima de 10 anos de idade fora brutalmente submetida à obscuridade da interrupção
do ser criança. Decorre ainda do paradoxo: uma criança carregando outra criança em seu ventre
ainda em formação.
No Brasil, admite-se o aborto em casos específicos, dentre esses, se a gravidez resulta
de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu
representante legal; essa é a redação trazida no Inciso II do artigo 128 do Código Penal.
Em síntese, a vítima anseia pelo gozo do dispositivo positivado de tal forma que,
juntamente com sua avó, responsável legal, buscaram amparo no hospital local para o
procedimento do aborto. Por motivo alheio à sua vontade, não o fizeram, contrariando o que
determina a legislação vigente, sobretudo à Portaria de Nº 2.282, de 27 de agosto de 2020, que
dispõe sobre o Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da Gravidez nos
casos previstos em lei, no âmbito do Sistema Único de Saúde-SUS.
Em continuidade, é imperativo ressaltar que devido a amplitude da matéria veiculada
em toda mídia, surgem preceitos religiosos e morais no intuito de que esses se sobrepunham às
permissibilidades legais. A vítima incluída no contexto de gravidez resultante de abuso possui a
faculdade em optar ou não pelo prosseguimento da gestação. Percebe-se então a negativa da
criança e sua representante em relação a continuidade da gravidez. Vale-se então julgar a
matéria segundo disposição legal.

FUNDAMENTAÇÃO COM BASE NA TEORIA DA DECISÃO (TEORIA DA


INTEGRIDADE DO DIREITO DE RONALD DWORKIN)

A Teoria da Integridade do Direito, formulada por Ronald Dworkin, oferece uma perspectiva
importante para a tomada de decisões judiciais em casos complexos, onde há conflito entre
direitos e princípios. Dworkin propõe que o Direito deve ser interpretado de maneira coerente
com os princípios de justiça, equidade e respeito aos direitos fundamentais, sustentando que os
juízes devem tratar os casos difíceis de acordo com a melhor interpretação possível do conjunto
de normas e valores que compõem o sistema jurídico (DWORKIN, 2002).
No caso da menina de 10 anos estuprada e que buscou realizar um aborto legal, a aplicação da
Teoria da Integridade de Dworkin permite que o juiz, ao decidir sobre a questão, busque uma
interpretação do Direito que respeite a dignidade e os direitos da vítima de maneira justa e
equitativa. Dworkin argumenta que o Direito não é apenas um conjunto de regras que deve ser
seguido mecanicamente, mas um sistema que deve refletir os melhores princípios de justiça e
moralidade, levando em consideração a totalidade do ordenamento jurídico (DWORKIN,
2002).
Neste caso, o direito ao aborto em situações de estupro, previsto no Código Penal Brasileiro,
deve ser interpretado à luz dos princípios constitucionais de dignidade humana (art. 1º, inciso
III, da Constituição Federal) e da proteção à saúde e bem-estar da vítima. A integridade do
Direito, para Dworkin, exige que as decisões judiciais tratem os cidadãos com igual respeito e
consideração, o que significa que a escolha da menina de interromper a gravidez deve ser
respeitada, sobretudo considerando o trauma profundo e os riscos à sua saúde física e mental
decorrentes da violência que sofreu (BRASIL, 1988).7
A coerência entre a legislação existente e os valores subjacentes ao sistema jurídico é crucial na
decisão de permitir o aborto. Para Dworkin, a interpretação das normas deve ser feita de forma
a refletir o respeito pelos direitos individuais, especialmente em casos envolvendo questões
morais sensíveis, como o aborto. O juiz, ao decidir sobre o caso, deve buscar a melhor

7
Dias, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias / Maria Berenice Dias – 14. Ed ver.
Ampl e atual. – Editora JusPodivm, 2021. P. 414.
interpretação possível do Direito, conciliando o direito à vida, a dignidade da vítima e a
necessidade de garantir seu bem-estar psicológico e físico (SILVA, 2019).
Além disso, Dworkin critica a ideia de que o Direito deve ser influenciado por pressões
externas, como opiniões políticas ou religiosas. No caso em questão, a exposição pública e a
interferência de atores políticos e religiosos, como a ministra Damares Alves, não devem
influenciar a decisão judicial, pois a integridade do Direito exige que as decisões sejam
baseadas em princípios jurídicos e não em convicções pessoais ou ideológicas (SILVA, 2019).
O promotor da Infância e Juventude de São Mateus reforça essa visão ao destacar que a
interferência externa viola a autonomia da vítima e de sua família, ao invés de respeitar o
direito delas a uma decisão informada e protegida pela legislação.
Assim, com base na Teoria da Integridade de Dworkin, a decisão de permitir o aborto para a
menina estuprada reflete a aplicação coerente do sistema jurídico, respeitando os direitos e
princípios constitucionais que garantem a dignidade, saúde e autonomia da vítima. A
integridade do Direito exige que o juiz interprete o caso de maneira a promover a justiça e o
respeito aos direitos fundamentais, sem ceder a pressões externas que possam distorcer a
aplicação equitativa das normas (DWORKIN, 2002).8

8
ALVES, Jonas Figueirêdo. A Doutrina na mamília multiespécie e identidade animal. Conjur,
2021. Disponível em https://www.conjur.com.br/2021-fev-14/processo-familiar-doutrina-
familia-multiespecie-identidade-animal/. Acessado em: 14 out. 2024.
RESPOSTA AO QUESITO
Baseando no exposto, concluímos que a permissibilidade do artigo 128 do
Código Penal Brasileiro adequa-se ao caso concreto. O embasamento do esboço jurídico
disposto nas legislações brasileiras deve ser aplicado conforme requer o Consulente.
Observa-se então, partindo do pressuposto que a vítima e seus responsáveis
desejam pelo não prosseguimento da gestação, o ajustamento entre o aborto e o caso de
estupro adequam-se de tal forma a, desde já, optarem pelo abortamento legal.
No presente caso, a responsabilidade médica não configurará crime, segundo
dispositivo do Código Penal:
Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico: I – se não há outro meio de
salvar a vida da gestante; II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido
de consentimento da gestante, ou, quando incapaz, de seu representante legal.
(Grifo nosso).

Assim sendo, não há que se falar em distanciamento entre a escolha admitida e o


abortamento legal positivado. Dessa forma, o parecer segue favorável no
reconhecimento do direito pleiteado pelas Consulentes no sentido de coincidir a vontade
em legislação disposta.
É o parecer, salvo melhor juízo e nos limites da consulta e das informações que
me foram fornecidas.

CONCLUSÃO
Com base na Teoria da Integridade do Direito, de Ronald Dworkin, a decisão de
permitir o aborto para a menina de 10 anos que foi estuprada deve ser fundamentada na
busca por coerência e justiça dentro do sistema jurídico. A integridade do Direito exige
que as normas sejam interpretadas de maneira que reflitam os princípios de dignidade
humana, equidade e respeito aos direitos fundamentais, sem influências externas de
natureza política ou religiosa.
Nesse sentido, a decisão judicial deve respeitar a autonomia da vítima e seu direito de
interromper a gravidez, visto que a continuidade da gestação resultaria em um
agravamento do trauma físico e psicológico já imposto pela violência. A melhor
interpretação do Direito, segundo Dworkin, é aquela que assegura que a vítima seja
tratada com igual consideração e respeito, garantindo que suas necessidades e direitos
sejam prioritariamente protegidos.
Assim, ao aplicar a Teoria da Integridade do Direito, a decisão de permitir o aborto não
apenas se mostra justa, mas também coerente com os valores constitucionais e a própria
função do sistema jurídico em promover justiça e proteger os mais vulneráveis.
PARECER JURIDÍCO CASO 2 - JUIZ RECONHECE DIREITO A PENSÃO
ALIMENTÍCIA PARA ANIMAL DE ESTIMAÇÃO

I. INTRODUÇÃO

O objetivo deste parecer é realizar uma análise jurídica da decisão que


concede o direito à pensão alimentícia para um animal de estimação,
fundamentada no conceito de "família multiespécie". Esse conceito tem
ganhado destaque no mundo jurídico, à medida que as relações afetivas entre
pessoas e seus animais, pois versasse que os animais estão sendo
reconhecidos como parte essencial do núcleo familiar.

No contexto social e atual, onde os animais de estimação desempenham


papéis muitas das vezes afetivos, terapêuticos e sociais, é fundamental que o
Direito acompanhe essa evolução e se adapte às novas demandas da
sociedade. O Benefício positivo da pensão alimentícia para um animal
reflete essas mudanças e amplia a proteção jurídica aos seres que, embora
não humanos, têm importância significativa para a vida familiar de muitas
pessoas.

A análise será baseada na Teoria da Decisão, que orienta como o


magistrado deve justificar suas decisões, considerando aspectos sociais,
jurídicos e os princípios constitucionais pertinentes. O Direito, ao
acompanhar as transformações sociais, deve garantir que decisões justas e
proporcionais sejam tomadas, garantindo o bem-estar tanto dos seres
humanos quanto dos animais de estimação.

Assim, este parecer discutirá o contexto jurídico e social no âmbito da


decisão judicial, e aplicará a Teoria da Decisão ao caso em questão com o
objetivo de demonstrar a aplicação da lei de forma justa e alinhada com os
princípios constitucionais e com o ordenamento jurídico.
II. CONTEXTUALIZAÇÃO DO CASO

O caso em questão envolve um magistrado que, ao ser instado a decidir sobre


questões relacionadas à dissolução de uma relação familiar, reconheceu o direito à
pensão alimentícia para um animal de estimação. A decisão foi fundamentada no
conceito de família multiespécie, que reconhece que, em muitas famílias
contemporâneas, os animais de estimação desempenham papéis afetivos e sociais
equiparáveis aos dos seres humanos.

Isso implica que esses animais, além de sujeitos de cuidados e responsabilidades,


também devem ser protegidos juridicamente em situações que envolvem a dissolução
familiar, como o divórcio ou a separação. A evolução do conceito de família no Direito
reflete as mudanças nas estruturas sociais. Tradicionalmente, a família era
compreendida como a união entre pessoas, principalmente para fins de procriação e
convivência. No entanto, as mudanças nos valores sociais e culturais trouxeram novos
modelos de família, como as famílias monoparentais, homoafetivas, e agora as famílias
multiespécies, que incluem animais de estimação como membros afetivos e funcionais
dessas unidades familiares.

No caso específico, a decisão de incluir um animal de estimação como


beneficiário de pensão alimentícia surge da compreensão de que a relação entre
humanos e seus animais de estimação envolve um vínculo afetivo significativo. Os
tutores desses animais não apenas cuidam de suas necessidades básicas, mas também
desenvolvem uma relação de dependência emocional e até mesmo psicológica, o que
justifica a necessidade de proteção legal para garantir que, em caso de separação, o
animal continue a ser adequadamente cuidado. O conceito de família multiespécie já
tem sido amplamente discutido na doutrina jurídica e em decisões judiciais em países
como Espanha e França, onde a guarda de animais de estimação em casos de separação
ou divórcio é legalmente regulamentada. Embora o ordenamento jurídico brasileiro
ainda não tenha uma previsão expressa sobre a questão, a jurisprudência nacional tem
avançado no reconhecimento dos direitos dos animais dentro do contexto familiar,
principalmente em casos de guarda compartilhada de animais.

III. ANÁLISE JURÍDICA

Atualmente, é possível afirmar com plena convicção que o princípio do


pluralismo das entidades familiares é encarado como um reconhecimento, pelo Estado,
9
da existência de diversas possibilidades de arranjos familiares.

O conceito de família, outrora restrito a relações sanguíneas ou conjugais, tem se


expandido para reconhecer vínculos afetivos que incluem animais de estimação. Não
obstante, a consagrada autora civilista Maria Berenice Dias, no mesmo capítulo em que
aborda a proteção aos filhos, também trata da proteção aos animais de estimação.

Uma pesquisa publicada pelo site Veja Saúde, realizada pelo Grupo Petz com
tutores brasileiros, aponta que 88% dos entrevistados consideram seus animais como
membros da família.10 O chamado “mundo pet” passou a fazer parte da vida das
pessoas, comprovando-se que o vínculo afetivo entre humanos e animais proporciona
benefícios recíprocos à sociedade contemporânea.11

Esse fenômeno decorre da função protetiva da família, que se ajusta à realidade


social em constante transformação, e da necessidade de tutelar os vínculos afetivos
estabelecidos entre humanos e seus animais de estimação.

Os recentes avanços legislativos surgem em um momento crucial, reconhecendo


que os animais são seres sencientes, capazes de sentir emoções e sensações, como
9
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 21 out.
2024.

BRASIL. Código Penal. Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L2848.htm. Acesso em: 21 out. 2024.
10
DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
11
DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
alegria, dor e aflição. Com isso, os animais deixam de ser considerados meros objetos,
bens materiais ou propriedades móveis. Supera-se a visão de “coisificação” dos animais,
estabelecendo-se um novo ramo do Direito. No caso dos animais de companhia, eles
passam a ser vistos como parte integrante da família.

Por outro lado, embora a futura reforma do Código Civil reconheça a senciência
dos animais, ainda há a associação deles ao conceito jurídico de “coisa”. O caso jurídico
analisado apresenta a ideia de que os ministros compreenderam os animais como algo a
mais que bens ou coisas, mas ainda algo a menos que pessoas.

O artigo 19 sugere: “A afetividade humana também se manifesta por expressões


de cuidado e de proteção aos animais que compõem o entorno sociofamiliar da pessoa,
podendo dela derivar a legitimidade para a tutela correspondente desses interesses e a
12
pretensão reparatória de danos.”

Em outras palavras, embora os animais sejam tratados como membros da família,


seus tutores continuam sendo considerados “donos” no plano jurídico. O
reconhecimento desse tipo de relação pela jurisprudência não deve ser visto como um
simples rompimento com a tradição jurídica, mas como uma evolução natural no
processo de reconhecimento dos direitos e deveres que configuram as novas estruturas
familiares.

Portanto, o juiz deve, ao fundamentar sua decisão, invocar esses princípios e a


necessidade de adequar o Direito às novas realidades sociais.

III.1 DA GUARDA E PENSÃO ALIMENTÍCIA

O conceito jurídico de alimentos relaciona-se ao dever de sustento, assistência e


manutenção de indivíduos em situação de dependência material. Tradicionalmente
aplicado em relações humanas, esse conceito pode ser estendido aos animais de

12
BRASIL. Código Penal. Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L2848.htm. Acesso em: 21 out. 2024.
estimação que integram o núcleo familiar e dependem de seus tutores para sobreviver e
viver dignamente.

Segundo o IBDFAM – Enunciado 11:

“Na ação destinada a dissolver casamento ou união estável, o juiz pode


disciplinar a guarda compartilhada do animal de estimação do casal.”

A interpretação extensiva do dever de prestar alimentos alinha-se à proteção


constitucional da dignidade da pessoa humana e à função social da família. Quando um
animal de estimação é considerado parte da família, a separação entre os tutores pode
gerar a necessidade de fixação de alimentos em favor do animal, para garantir sua
subsistência, conforme orientado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família
(IBDFAM).

Como a guarda compartilhada de animais de estimação ainda não é regulada


de forma expressa no direito brasileiro, mas sua aplicação tem crescido com base em
analogias com o direito de família e princípios fundamentais. Vejamos algumas
decisões:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA EM


AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL
CUMULADA COM FIXAÇÃO DE ALIMENTOS E GUARDA
COMPARTILHADA DO ANIMAL DE ESTIMAÇÃO: ALIMENTOS
PROVISÓRIOS – EX-COMPANHEIRA – CARÁTER EXCEPCIONAL –
BINÔMIO NECESSIDADE X POSSIBILIDADE – FIXAÇÃO QUE DEVE
SE ATER AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE – ART. 1694, § 1, CPC –
MINORAÇÃO – NECESSIDADE DE DILAÇÃO ...Ver ementa
completaPROBATÓRIA – CARÁTER IRREPETÍVEL – RECURSO
CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Agravo de Instrumento
em Decisão Interlocutória em Ação de Reconhecimento e Dissolução de
União Estável Cumulada com Fixação de Alimentos e Guarda Compartilhada
do Animal de Estimação: 2. Cinge-se a controvérsia recursal à minoração dos
alimentos fixados pelo MM. Juízo ad quo em favor da agravada no valor de
03 (três) salários mínimos, pelo período de 12 (doze) meses. 3. Em se
tratando de alimentos, o arbitramento do valor é analisado pelo trinômio:
necessidade, possibilidade e proporcionalidade, em que se averíguam as reais
necessidades do alimentado e a disponibilidade do alimentante, n (TJ-PA
08090060220218140000, Relator: MARIA DE NAZARE SAAVEDRA
GUIMARAES, Data de Julgamento: 28/06/2022, 2ª Turma de Direito
Privado, Data de Publicação: 05/07/2022)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE
RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL,
PARTILHA DE BENS, ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS,
PROVISÓRIOS E DEFINITIVOS, DANOS MORAIS E GUARDA
COMPARTILHADA DOS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO. PLEITO DE
REDUÇÃO DO ENCARGO ALIMENTAR PROVISÓRIO FIXADO EM
FAVOR DA EX-COMPANHEIRA. DESCABIMENTO.OS ALIMENTOS
ENTRE EX-CÔNJUGES SÃO PROVENIENTES DO DEVER DE MÚTUA
ASSISTÊNCIA, NA FORMA DO ART. 1.566, INCISO III, DO CÓDIGO
CIVIL E DO DEVER DE SOLIDARIEDADE DISPOSTO NO ART. 1.694
DO MESMO DIPLOMA LEGAL.NO CASO, AO MENOS EM SEDE DE
COGNIÇÃO SUMÁRIA, RESTOU SUFICIENTEMENTE
DEMONSTRADA A NECESSIDADE DA EX-CÔNJUGE EM PERCEBER
OS ALIMENTOS PROVISÓRIOS E AUSENTE A COMPROVAÇÃO DA
IMPOSSIBILIDADE DO ALIMENTANTE EM ALCANÇAR O
PERCENTUAL ESTABELECIDO NA ORIGEM.AGRAVO DE
INSTRUMENTO DESPROVIDO. (TJ-RS - Agravo de Instrumento:
5318522-04.2023.8.21.7000 SÃO SEBASTIÃO DO CAÍ, Relator: Jane
Maria Köhler Vidal, Data de Julgamento: 17/10/2023, Primeira Câmara
Especial Cível, Data de Publicação: 17/10/2023)

A primeira decisão aborda que, nos casos de alimentos entre ex-companheiros, sua
fixação tem caráter excepcional e deve ser guiada pelo princípio da razoabilidade,
nos termos do art. 1.694, §1º, do Código Civil, que estabelece o binômio necessidade x
possibilidade. Ou seja, o juiz deve avaliar tanto as necessidades do alimentado quanto
a capacidade financeira do alimentante.

No caso concreto, os alimentos foram fixados inicialmente em três salários


mínimos, pelo período de 12 meses. No entanto, diante da necessidade de uma maior
produção de provas (dilação probatória) e considerando o caráter irrepetível dos
alimentos, o recurso foi parcialmente provido, provavelmente para ajustar o valor à
realidade financeira do alimentante e às necessidades comprovadas da alimentada,
sempre respeitando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Essa decisão reflete a natureza flexível da fixação de alimentos entre ex-


companheiros, que não se pauta apenas em parâmetros fixos, mas exige a análise
concreta de cada situação, principalmente para evitar prejuízos desproporcionais a
qualquer das partes envolvidas, mesmo se tratando de animais de estimação.
Jáo segundo acórdão destaca que os alimentos entre ex-cônjuges ou ex-
companheiros decorrem do dever de mútua assistência, previsto no art. 1.566, inciso
III, do Código Civil, bem como do princípio da solidariedade familiar estabelecido
no art. 1.694 do mesmo diploma legal. Assim, mesmo após o término da união, subsiste
a obrigação de assistência financeira, caso demonstrada a necessidade de um dos ex-
cônjuges.

No caso concreto, a decisão de primeira instância foi mantida porque, em


cognição sumária, restou comprovada a necessidade da ex-companheira de receber
os alimentos provisórios. Além disso, o alimentante não conseguiu demonstrar sua
impossibilidade de cumprir o encargo no percentual fixado.

A negativa do recurso reafirma que, em situações que envolvem alimentos


provisórios, a análise do binômio necessidade x possibilidade deve ser feita com
cautela e considerando as peculiaridades do caso. Somente uma comprovação robusta
da impossibilidade financeira poderia justificar a revisão imediata do valor.

Nesse contexto, é fundamental que o magistrado reconheça a natureza dos laços


afetivos com os animais e aplique o conceito de alimentos de forma inclusiva,
considerando o bem-estar do animal e a responsabilidade dos tutores em assegurar-lhe
uma vida digna.

IV. FUNDAMENTAÇÃO COM BASE NA TEORIA DA DECISÃO (TEORIA DA


ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA (ROBERT ALEXY)

A Teoria da Argumentação Jurídica de Robert Alexy apresenta uma abordagem


sofisticada e estrutural para a tomada de decisões judiciais. Alexy propõe que a decisão
judicial seja fundamentada em uma argumentação racional, pública e controlável,
baseando-se principalmente em dois conceitos centrais: a ponderação de princípios e a
racionalidade da argumentação (COSTA, 2022).
Segundo Alexy, o Direito não pode ser visto apenas como um sistema de normas
rígidas, mas como um campo que envolve princípios que frequentemente entram em
conflito, exigindo do juiz uma técnica de ponderação para encontrar uma solução que
melhor satisfaça os valores constitucionais em jogo (COSTA, 2022). Essa teoria é
particularmente útil em situações em que o ordenamento jurídico não oferece respostas
explícitas, como no caso em questão, que envolve a concessão de pensão alimentícia
para um animal de estimação, um tema relativamente novo no Direito brasileiro. A
argumentação jurídica, para Alexy, não é um mero processo de escolha arbitrária, mas
uma atividade racional, na qual o juiz deve justificar sua decisão com base em
princípios, normas e valores constitucionais (MOSSOI, 2020). A argumentação deve ser
pública, transparente e passível de controle por meio do diálogo entre os envolvidos,
entre o Direito e a sociedade. Para que uma decisão seja legitimada, ela precisa ser fruto
de um processo argumentativo que envolva a análise de todos os direitos e deveres em
jogo, de modo a equilibrá-los de forma proporcional e racional (MOSSOI, 2020).

A característica essencial da Teoria da Argumentação Jurídica é a necessidade de

o juiz aplicar a ponderação de princípios quando há um conflito entre direitos ou valores

constitucionais (COSTA, 2022).

No caso da concessão de pensão alimentícia para um animal de estimação, há


um conflito de princípios: de um lado, o princípio da dignidade da pessoa humana
(artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal), que pode ser interpretado para incluir o
dever moral e jurídico de cuidado com os animais, e, de outro, o princípio da proteção
aos seres não humanos (artigo 225 da Constituição Federal), que garante que os animais
devem ser tratados de maneira digna, sem sofrimento ou abandono (BRASIL, 1988)

V. CONCLUSÃO
A Teoria da Argumentação Jurídica é a mais adequada para o caso de concessão
de pensão alimentícia para um animal de estimação porque oferece uma estrutura clara
para lidar com situações em que o Direito tradicional não oferece uma resposta direta.
No caso específico, o magistrado não pode simplesmente aplicar as normas existentes
de maneira automática, já que a legislação brasileira ainda não trata expressamente do
conceito de "família multiespécie" ou da responsabilidade dos tutores em relação ao
bemestar dos animais após a dissolução familiar.

Utilizando a técnica de ponderação de princípios, o juiz pode equilibrar os


valores constitucionais em jogo, considerando que o bem-estar do animal de estimação,
que depende diretamente de seus tutores, deve ser protegido. O magistrado pode
argumentar que o dever de cuidar dos animais é uma extensão do princípio da dignidade
da pessoa humana, uma vez que essas relações afetivas são importantes para a qualidade
de vida tanto dos seres humanos quanto dos animais. Além disso, ao fundamentar a
decisão com base na Constituição Federal, o magistrado está ancorando sua
argumentação em princípios amplamente aceitos e protegidos pelo ordenamento
jurídico, garantindo a legitimidade e racionalidade da sua decisão.

Ao adotar a Teoria da Argumentação Jurídica, o juiz justifica racionalmente a


concessão de pensão alimentícia ao animal de estimação, harmonizando a necessidade
de proteger o animal com os deveres constitucionais que recaem sobre os tutores. Essa
teoria também permite que o magistrado vá além de uma interpretação literal da norma,
promovendo uma decisão que reflita os valores e necessidades da sociedade
contemporânea, em que os animais de estimação são reconhecidos como membros das
famílias.

Portanto, a Teoria da Argumentação Jurídica de Alexy é a mais apropriada para


fundamentar a decisão, pois oferece as ferramentas necessárias para uma análise
equilibrada e fundamentada, permitindo que o juiz construa uma decisão justa, racional
e socialmente adequada, ao mesmo tempo que promove uma reflexão mais profunda
sobre o papel dos animais na estrutura familiar moderna.

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