Ap 1447-67.2019 - Estelionato - Autoria e Dosimetria

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1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA

Apelação Nº. 0001447-67.2019.8.17.0920


Juízo de Origem: Vara Criminal da Comarca de
Limoeiro
Apelante: Evilson Eliaquim Silvestre de Fontes
Apelado: Ministério Público do Estado de Pernambuco
Procuradora de Justiça: Luís Sávio Loureiro da
Silveira
Relator: Des. Paulo Augusto de Freitas Oliveira

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por


Evilson Eliaquim Silvestre de Fontes, inconformado com
a sentença proferida pelo Juízo da Vara Criminal da
Comarca de Limoeiro (ID 35168206), que o condenou à
pena de 01 (um) ano de reclusão, em regime inicial
aberto, e ao pagamento de 50 (cinquenta) dias-multa
pela prática do crime tipificado no art. 171, caput,
do Código Penal, referente ao estelionato contra a
vítima Edvan Correia da Silva.

Em suas razões recursais (ID 459384_058), a


defesa de Evilson pugna pela absolvição, alegando
ausência de dolo e provas suficientes para a
condenação, além de pedir a desclassificação do crime
para inadimplemento contratual e a exclusão da pena de
multa, considerando a hipossuficiência do réu.
Alternativamente, pleiteia a redução da pena para o
mínimo legal e a isenção das custas processuais.
Nas contrarrazões (ID 35168214), o Ministério
Público requer o improvimento do apelo, sustentando
que a materialidade e autoria estão comprovadas pelas
provas produzidas nos autos, especialmente pelo
comprovante de pagamento e pelos depoimentos das
testemunhas, que confirmam a prática do crime de
estelionato.
Parecer da Douta Procuradoria de Justiça (ID
35690461) opinando pelo improvimento do recurso,
mantendo a condenação, destacando que o dolo do
acusado é evidente, uma vez que ele se apropriou dos
valores pagos pela vítima e os destinou a sua conta
pessoal, sem repassar o montante ao DETRAN/PE.
Eis o relatório.
À douta revisão.

Caruaru, (data da assinatura eletrônica).

Des. Paulo Augusto de Freitas Oliveira


Relator
P04
1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA
Apelação Nº. 0001447-67.2019.8.17.0920
Juízo de Origem: Vara Criminal da Comarca de
Limoeiro
Apelante: Evilson Eliaquim Silvestre de Fontes
Apelado: Ministério Público do Estado de
Pernambuco
Procuradora de Justiça: Luís Sávio Loureiro da
Silveira
Relator: Des. Paulo Augusto de Freitas Oliveira

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade e


pressupostos recursais. Passo a análise do mérito.
Narra a denúncia (num. 35167692):
“(...)No dia 21/02/2018, por volta
das 14h08, neste Município de
Limoeiro, o acusado, acima
qualificado, obteve para si vantagem
ilícita, em prejuízo da vítima Edvan
Correia da Silva, induzindo-a em erro
mediante meio fraudulento, conversa
enganosa.
Emerge dos autos do inquérito
policial em anexo que, nos dia e
horário acima reportados, o ofendido
se dirigiu ao posto de intermediação
bancária "Cartório Postal",
localizado na Rua da Alegria, nº 595,
Bairro Santa Luzia, neste município,
a fim de pagar o boleto referente ao
Imposto sobre a Propriedade de
Veículos Automotores (IPVA) através
do cartão de crédito "Hipercard", de
sua titularidade.
Na sequência, a transação foi
realizada no valor de R$ 950,00
(novecentos e cinquenta reais),
divididos em parcelas mensais.
Cerca de um mês após a transação, a
vítima consultou junto ao DETRAN/PE
se o débito havia sido quitado,
oportunidade em que constatou a
inadimplência e, ao procurar o
denunciado para esclarecimentos, este
informou que resolveria o problema.
Tempos depois, Edvan Correia se
dirigiu novamente ao mencionado posto
de atendimento, mas este já havia
sido fechado e o acusado, evadido-se
para local incerto e não sabido.

O apelante sustenta que os fatos a ele


imputados não configuram o crime de estelionato,
argumentando que a situação caracterizaria, na
verdade, um mero descumprimento contratual,
inserido no âmbito civil. Alega que em momento
algum agiu com a intenção de enganar a vítima, e
que o prejuízo sofrido por esta decorreu de sua
própria inércia ao não entrar em contato com a
empresa responsável pela maquineta de cartão de
crédito (PinPag). Por fim, defende que as provas
constantes dos autos são insuficientes para embasar
a condenação, requerendo sua absolvição com base no
art. 386, VII, do CPP.
Analisando detidamente os elementos de provas
coligados aos autos, nota-se que restou demonstrada
a autoria e materialidade delitiva do crime do art.
171, do CP.
O cerne da questão reside no fato de que o réu
prestava serviços como correspondente bancário,
realizando pagamentos de boletos e concedendo
empréstimos em seu estabelecimento. No caso em
análise, a vítima, Sr. Edvan Correia, efetuou o
pagamento de um boleto referente ao IPVA de seu
veículo, mas o valor não foi repassado ao órgão
credor, o Detran, deixando a vítima em situação de
inadimplência. Essa conduta por parte do réu era
recorrente, havendo diversas outras pessoas que se
encontraram em situação semelhante.
Os depoimentos testemunhais prestados em juízo,
respaldam a tese acusatória.
A vítima, em seu depoimento judicial, relatou
que se dirigiu ao estabelecimento do réu para
efetuar o pagamento referente a dois anos de IPVA
de uma moto de sua propriedade, pagando metade do
valor em espécie e parcelando a outra metade no
cartão. Informou que o réu possuía uma maquineta de
cartão, através da qual realizava a transação,
entregava-lhe o dinheiro, e posteriormente fazia o
depósito para a empresa, que, no caso era a
"Pinpag". Esclareceu que não recebeu nenhum estorno
ou devolução dos valores pagos, tendo o réu
mencionado apenas que houve um "pequeno problema".
Afirmou também que conheceu outras pessoas que
foram lesadas pelo acusado e, até o presente
momento, não teve notícia de que alguém tenha sido
ressarcido. Por fim, declarou que não tinha
conhecimento de que o réu teria sido vítima de
assalto. (Depoimento extraído da sentença e
disponível no sistema de audiência digital/TJPE).
Foi ouvido também o sr. Ednilson Freire de
Melo, trabalhou um período no estabelecimento do
réu, e disse que frequentemente recebia reclamações
de pessoas cujos boletos não haviam sido
compensados, e que informava o acusado, sobre essas
queixas, mas este alegava estar resolvendo
pendências com outros cartórios (Depoimento
extraído da sentença e disponível no sistema de
audiência digital/TJPE).
O apelante em seu interrogatório, nega os
fatos, disse que um cliente precisou de um
empréstimo, realizando a operação por meio de
cartão de crédito, havendo um problema na quitação,
pois o valor não ficou disponível para que pudesse
ser repassado e a partir desse incidente,
comprometeu outras operações, impossibilitando o
pagamento a outros clientes. Disse que orientou o
cliente a entrar em contato com a empresa e pedir o
ressarcimento e depois da solicitação, perdeu à
PinPag, o que desencadeou problemas com outros
clientes, pois não conseguia mais acessar o
sistema. Por fim, disse ter sofrido dois assaltos.
No primeiro, conseguiu recuperar os valores
perdidos através do seguro do correspondente
bancário, mas no segundo, perdeu o seguro porque o
valor roubado excedia o limite da apólice
(Depoimento extraído da sentença e disponível no
sistema de audiência digital/TJPE).
Porém suas alegações não encontram respaldo nos
autos. O que se verifica é que o apelante, efetuava
operações em seu estabelecimento, do tipo
correspondente bancário, recebia valores de
pagamentos e não repassava para os credores de seus
clientes, obtendo assim vantagem ilícita.
A materialidade delitiva restou bem
demonstrada pelos documentos acostados e pelos
depoimentos das testemunhas e da vítima.
A autoria, certa que é, recai sobre o acusado.
Observe-se que o depoimento da vítima tem muita
importância, harmoniza-se com todo o contexto
probatório. Não há nenhuma contradição das
declarações, sendo certo que a vítima afirmou de
forma firme e peremptória ter sido prejudicado, em
decorrência do desfalque financeiro e a
continuidade do débito.
Com relação ao crime de estelionato, a doutrina
pátria, baseada em precedentes jurisprudenciais,
aponta que “o crime é de duplo resultado, somente
se consumando após a efetiva obtenção da vantagem
indevida, correspondente à lesão patrimonial de
outrem (nesse sentido: RT 536/326)”1[1]. Assim o é
porque os verbos que compõem o núcleo típico
descrevem atos que devem se somar para que haja a
efetiva caracterização do crime.
O crime de estelionato conforme disposto no
art. 171 do CP, consiste em: Obter, para si ou para
outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio,
induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante
artifício, ardil, ou qualquer outro meio
fraudulento.
No presente caso, os fatos narrados se adequam
aos requisitos do crime de estelionato. O réu, ao
receber o pagamento por meio de um correspondente
bancário, teria induzido ou mantido a vítima em
erro, fazendo-a acreditar que o valor seria
devidamente repassado ao destino final, o que
configura a fraude. Essa conduta foi praticada com
o intuito de obter uma vantagem indevida, uma vez
que o réu reteve o valor recebido, sem proceder ao
repasse conforme acordado.
Assim, ao apropriar-se do montante, o réu
buscava uma vantagem ilícita. Como consequência
dessa fraude, a vítima sofreu prejuízo financeiro,

1
pois, ao realizar o pagamento, esperava que o valor
fosse corretamente transferido, o que não ocorreu,
resultando em dano econômico. Portanto, verifica-se
a presença de todos os elementos necessários para a
configuração do crime de estelionato: a fraude, a
obtenção de vantagem ilícita e o prejuízo causado à
vítima.
Se evidencia, portanto, a presença dos
elementos exigidos à configuração do ilícito penal
em questão, quais sejam, a indução da vítima a erro
e a obtenção da vantagem ilícita. Assim, não há
espaço para a absolvição pleiteada.
Diante dos fatos apurados e das provas
constantes nos autos, não há como se falar em
desclassificação do crime de estelionato para mero
inadimplemento contratual. O réu, ao receber o
pagamento por meio de correspondente bancário e não
repassar o valor devido, agiu com dolo específico
de fraudar, induzindo a vítima em erro e obtendo
vantagem ilícita em detrimento de seu patrimônio, o
que caracteriza a fraude necessária ao estelionato.
O inadimplemento contratual, por sua vez, não se
aplica ao caso, pois aqui não houve simples
descumprimento de obrigação, mas sim a utilização
de ardil para a obtenção de vantagem indevida, com
prejuízo alheio, preenchendo os elementos típicos
do crime de estelionato, conforme já explanado.
Passo a análise da dosimetria da pena.
A dosimetria da pena foi realizada de forma
adequada, respeitando os critérios estabelecidos
pelo art. 59 do Código Penal. O magistrado
considerou, favoráveis ao réu todas as
circunstâncias judiciais na primeira etapa. Não
incidido atenuantes e agravantes, assim como causas
de aumento e diminuição de pena. Tendo a pena
ficado no mínimo legal previsto para o delito, 1
(um) ano e reclusão e 50 (cinquenta) dias0-multa.
Não há qualquer vício ou desproporcionalidade
que justifique a revisão da pena aplicada, sendo
que o quantum fixado se revela compatível com a
gravidade do delito e com as particularidades do
caso concreto.
Por fim, verificada a presença dos requisitos
do art. 44 do CP, foi operada a substituição da
pena privativa de liberdade por restritivas de
direito, conforme já consignado na sentença.

Com relação a exclusão da pena de multa, esta


é sanção de caráter penal. Eventual isenção viola
o princípio constitucional da legalidade, uma vez
que prevista cumulativamente no preceito
secundário do crime praticado, ficando a suspensão
do pagamento a critério do juízo da execução
penal.
Diante de todo o exposto, NEGO PROVIMENTO ao
apelo.
É como voto.
Caruaru, (data da assinatura eletrônica).

Des. Paulo Augusto de Freitas Oliveira


Relator
P04

1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA


Apelação Nº. 0001447-67.2019.8.17.0920
Juízo de Origem: Vara Criminal da Comarca de
Limoeiro
Apelante: Evilson Eliaquim Silvestre de Fontes
Apelado: Ministério Público do Estado de
Pernambuco
Procuradora de Justiça: Luís Sávio Loureiro da
Silveira
Relator: Des. Paulo Augusto de Freitas Oliveira

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL.


ESTELIONATO. CORRESPONDENTE BANCÁRIO.
PAGAMENTO NÃO REPASSADO AO CREDOR.
CONFIGURAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO DE FRAUDAR.
VANTAGEM ILÍCITA OBTIDA EM DETRIMENTO DO
PATRIMÔNIO DA VÍTIMA. AUTORIA E
MATERIALIDADE COMPROVADAS. INAPLICABILIDADE
DE MERO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL.
DOSIMETRIA DA PENA ADEQUADA. RECURSO NÃO
PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1.Demonstrada a prática de fraude pelo réu,


que, ao atuar como correspondente bancário,
recebeu valores para pagamento de boletos e
não os repassou aos credores, configurando
o dolo específico de enganar e obter
vantagem ilícita, causando prejuízo à
vítima.

2.Não há falar em desclassificação do


estelionato para mero inadimplemento
contratual, pois a conduta do réu
ultrapassou o descumprimento de obrigação
civil, revelando a utilização de ardil para
a obtenção de vantagem indevida.

3.A dosimetria da pena foi realizada de


maneira adequada, observando-se as
circunstâncias judiciais e fixando-se a
pena no mínimo legal, com a correta
substituição da pena privativa de liberdade
por restritivas de direitos.

4.Recurso não provido. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos da


apelação criminal em que são partes as acima
indicadas, acordam os Desembargadores componentes
da 2ª Turma da Primeira Câmara Regional de Caruaru
do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco,
por unanimidade de votos, em negar provimento à
apelação, tudo conforme consta do relatório e voto
que integram o presente julgado.

Caruaru, [data da assinatura eletrônica].

Des. Paulo Augusto de Freitas Oliveira


Relator
P04

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