Alterações Laboratoriais Com o Uso de Esteroide Anabolizante

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 16

0

INTRODUÇÃO

O uso de testosterona e esteroides anabolizantes androgênicos (EAAs)


pode gerar alterações significativas em alguns marcadores de exames
laboratoriais abrangendo períodos de uso de curto a longo prazo. Muitas destas
alterações costumam ser mal compreendidas e algumas delas podem gerar
repercussões significantes. Vamos abordar neste material as principais
alterações laboratoriais que são observadas com uso de EAAs, assim como seus
mecanismos e principais desfechos.

ALTERAÇÕES NO HEMOGRAMA E ERITROCITOSE

A eritrocitose, também chamada de policitemia, é uma das principais


alterações laboratoriais que acontecem de forma secundária ao uso de EAAs.
Ela é caracterizada por um aumento da produção das células vermelhas do
sangue, conhecidas como hemácias ou eritrócitos.

O aumento da produção de hemácias nestes casos pode acontecer por


vários mecanismos distintos. Um deles é representado pelo fato de que os rins
expressam receptores androgênicos onde a testosterona e os EAAs podem se
ligar.

A ligação dos andrógenos nestes receptores estimula os rins a produzirem


um hormônio chamado Eritropoetina, também conhecido como EPO, que atua
diretamente na medula óssea estimulando o processo de eritropoiese, que
consiste na produção e maturação das hemácias, como mostra a figura a seguir:

1
Entender este mecanismo é importante porque ele explica o motivo pelo
qual algumas pessoas podem uma produção exacerbada de hemácias mesmo
com o uso de testosterona em doses de reposição.

Zitzmann e colaboradores (2007) observaram que indivíduos que


possuíam polimorfismo genético nos receptores androgênicos presentes nos rins
tinham uma resposta de eritrocitose acentuada. Este polimorfismo era
caracterizado por uma menor repetição da sequência dos pares de base CAG
(citosina-adenina-guanina). Ou seja, quanto menor era a repetição de CAG,
maior era a resposta de eritrocitose.

Além do aumento da síntese de EPO, a alteração dos processos


regulatórios da absorção de ferro também consiste em um mecanismo pelo qual
a eritrocitose pode acontecer de forma secundária ao uso dos EAAs.

A absorção de ferro é regulada, dentre outros fatores, por uma proteína


chamada de hepcidina, produzida pelos hepatócitos. A hepcidina pode estar em
níveis aumentados ou diminuídos. Quando está elevada, atua diminuindo a
absorção de ferro pelo duodeno e reduz o seu transporte para o plasma através
da inibição da ferroportina, uma proteína que possui função de fazer a
exportação de ferro para o sangue.

2
Por outro lado, quando a hepcidina está reduzida, ocorre um aumento da
absorção de ferro pelos enterócitos e um maior transporte para a circulação,
aumentando a quantidade de ferro disponível para ser incorporado nas células
vermelhas. Vale destacar aqui que o ferro é um importante micronutriente que
está relacionado com o processo de maturação das hemácias.

A testosterona e os EAAs atuam diminuindo os níveis de hepcidina,


podendo contribuir com o aumento da produção de eritrócitos através desta via.
Além disso, alguns estudos verificam que a eritrocitose também pode ser
estimulada por ação dos metabólitos da testosterona, como o DHT e o estradiol.

A figura a seguir ilustra um esquema com as principais vias pelo qual a


testosterona e os EAAs podem aumentar a produção de células vermelhas de
maneira direta ou indireta:

Laboratorialmente, a eritrocitose é identificada no exame por meio da


elevação dos níveis de hemoglobina e hematócrito para acima dos valores de
referência de acordo com o sexo.

A hemoglobina é uma proteína que se encontra ligada ao ferro no interior


das hemácias e tem como principal função o transporte de oxigênio pelos tecidos
do corpo.

3
O hematócrito é um parâmetro relativo ao percentual de células vermelhas
que estão presentes no volume total de sangue. Quanto maior a proporção de
hemácias presentes, maior será o valor do hematócrito, e quanto maior o
hematócrito, maior a viscosidade do sangue.

Alguns estudos mostram que o aumento do processo de eritrocitose com


uso de testosterona e EAAs acontece de forma dose-dependente e também
sofre grande influência da idade.

Bhasin e colaboradores (2001) observaram que os níveis de hemoglobina


aumentaram em 1,4g/dL após 20 semanas de administração semanal de 600 mg
de enantato de testosterona em homens jovens. Esse aumento de hemoglobina
se traduziria em elevações de 4% nos níveis de hematócrito. Por outro lado, em
um estudo posterior, foi observado que homens mais velhos recebendo a mesma
dosagem pela mesma duração tinham níveis de hemoglobina aumentados em
2,9 g/dL.

O estudo HAARLEM (2022) também demonstrou resultados interessantes


nesta questão. Este foi um grande estudo observacional prospectivo no qual
usuários de EAAs se auto-administravam doses médias de 898 mg
semanalmente durante um período de 13 semanas. No final do ciclo, foi
observado que os níveis de hematócrito aumentaram 3% em comparação com
a linha de base. Notavelmente, enquanto apenas 5% dos indivíduos
apresentavam níveis de hematócrito acima do intervalo de referência (> 50%) no
início do estudo, 33% dos indivíduos apresentavam níveis de referência
superiores ao final das 13 semanas. Porém, os níveis retornaram aos valores
basais após um período de 3 meses com a interrupção do uso.

Um hematócrito elevado é problemático e visto com maus olhos pois


aumenta o risco do indivíduo desenvolver complicações cardiovasculares que
costumam estar relacionadas com eventos de trombose venosa, já que um
sangue viscoso circula pelos vasos sanguíneos com maior dificuldade. Portanto,
a lentificação do fluxo sanguíneo gerada pelo aumento do hematócrito pode
contribuir com o aparecimento de um trombo e, posteriormente, episódios de
tromboembolismo e/ou acidente vascular cerebral (AVC).

4
Apesar da elevação do hematócrito acontecer de forma esperada com o
uso de testosterona e os demais EAAs, é necessário entender que em boa parte
das vezes, esta elevação não irá repercutir em desfechos clínicos negativos.

Normalmente, os laboratórios adotam valores de referência de


hematócrito na faixa de 40-49% para os homens e 35-45% em mulheres. As
sociedades e diretrizes costumam recomendar intervenções para reduzir o
hematócrito quando este atinge faixas superiores a 54%, outras adotam o ponto
de corte de 52%.

O fato é que usuários de EAAs dificilmente ultrapassam valores de


hematócrito de 54%. Mesmo os que utilizam em doses de abuso. Além disso, em
muitas das vezes, os altos níveis de hematócrito encontrados no exame
acontecem por uma baixa ingestão de água pelo indivíduo, que faz com que o
sangue fique hemoconcentrado e isso gera uma interpretação errônea do
resultado visto. Níveis muito altos de hematócrito (>55-60%) são considerados
mais preocupantes e podem necessitar de alguma intervenção.

ALTERAÇÕES NO PERFIL HEPÁTICO E HEPATOTOXICIDADE

Alguns dos EAAs são famosos e conhecidos pelos seus supostos efeitos
danosos no fígado. Dentre eles, os principais relacionados a esta questão são
os EAAs da família dos 17 alfa-alquilados, que incluem o Dianabol, Turinabol,
Oxandrolona, Hemogenin, Halotestin e Stanozolol.

Como mencionado em outros materiais, os EAAs 17 alfa-alquilados são


chamados assim por conta de uma modificação estrutural que apresentam no
carbono 17 que possibilita a sua administração pela via oral, já que essa
modificação faz com que eles se tornem resistentes ao metabolismo de primeira
passagem no fígado e tenham sua biodisponibilidade aumentada.

5
O efeito tóxico dos EAAs no fígado costuma ser atribuído a esta
resistência ao processo de metabolização, já que os hepatócitos ficam mais
expostos a estes fármacos e precisam “trabalhar mais” para metabolizá-los,
gerando sobrecarga hepática.

Algumas hipóteses foram propostas para explicar este efeito hepatotóxico


causado pelos EAAs. A principal delas está relacionada a um aumento do
estresse oxidativo no fígado causado pela produção de espécies reativas de
oxigênio (ROS) a partir da ligação do EAAs com seu receptor androgênio. Esse
aumento da produção de ROS poderia ser explicado pelo aumento do processo
de beta-oxidação mitocondrial de ácidos graxos por meio da regulação positiva
da enzima carnitina palmitoiltransferase-1 (CPT-1) a partir da ligação dos EAAs
com seus receptores presentes no fígado.

A maioria dos estudos que investigam os efeitos dos EAAs no fígado


observam alterações das enzimas hepáticas. As transaminases alanina
aminotransferase (ALT/TGP) e aspartato aminotransferase (AST/TGO) são as
mais que costumam sofrer alterações com uso dos esteroides. Por outro lado,
as outras enzimas hepáticas como gama glutamil transpeptidase (GGT),

6
fosfatase alcalina (FA) e lactato desidrogenase (LDH) não costumam sofrer
grandes alterações.

As enzimas AST e ALT atuam catalisando a conversão de aminoácidos


em alfa-cetoácidos através de retirada e transferência de grupos amino (NH2).
As reações catalisadas por estas enzimas exercem papel importante na síntese
e degradação de aminoácidos.

A AST/TGO está presente em outros tecidos além do fígado, como


coração e músculo esquelético. Por este motivo, a AST pode estar acima dos
valores de referência sem que haja necessariamente um problema hepático, a
exemplo das elevações de AST que são secundárias à realização de uma
atividade física intensa.

A ALT/TGP, por outro lado, está presente principalmente no fígado. Por


isso, elevações desta enzima são mais específicas para indicar algum tipo de
prejuízo hepático. Ambas enzimas podem estar aumentadas no sangue por
conta de lesões ou destruição dos hepatócitos.

A GGT é uma enzima presente em vários órgãos (rins, intestino, próstata,


fígado) e está envolvida no transporte de aminoácidos e peptídeos através das
membranas celulares, na síntese proteica e na regulação dos níveis de
glutationa. Os níveis de GGT costumam estar aumentados nos casos de
obstrução biliar pós-hepática e intra-hepática.

A avaliação de GGT em usuário de EAAs é importante pois ajuda a


detectar disfunções hepáticas e diferencia as elevações de AST e ALT que são
secundárias ao exercício.

Os esteroides da família dos 17 alfa-alquilados possuem graus variados


de hepatotoxicidade que pode ser explicado pelas diferenças estruturais de cada
composto.

Verdy e colaboradores (1968) examinaram os efeitos metabólicos de


baixas doses de metandrostenolona (dianabol) em 18 pacientes idosos
ateroscleróticos por um período de 9 semanas. Após o período de intervenção,
os idosos que utilizaram 5mg de dianabol tiveram aumento médio de TGP de 14

7
para 24 U/L. O grupo que utilizou doses de 10mg tiveram aumento médio de
TGP de 18 para 45 U/L. Os valores de TGO não tiveram alterações significativas.

No estudo de Grunfeld e colaboradores (2006), pacientes com HIV que


receberam até 80mg de Oxandrolona por dia durante um período de 12 semanas
não tiveram alterações significativas das enzimas hepáticas.

Por outro lado, Carson e colaboradores (2015) verificaram que mesmo


doses baixas de 4mg/dia de Stanozolol eram capazes de causar alterações
significativas nos níveis de TGO e TGP quando esta utilização era feita a longo
prazo (6 meses). Os níveis das transaminases estavam até 3 vezes maiores
quando comparados com o grupo controle, como pode ser visualizado na figura
a seguir:

8
Apesar dos esteroides 17-alfa-alquilados causarem alterações das
enzimas hepáticas, é preciso ter clareza sobre uma coisa: os exames
laboratoriais não são bons preditores da existência de lesões hepáticas. Ou seja,
apesar dos níveis de TGO e TGP se elevarem de maneira esperada com o uso
de alguns dos compostos mencionados, ainda sim são elevações que
dificilmente ultrapassam 2 a 3 vezes os valores de referência, e, mesmo assim,
não é possível estabelecer a presença de algum tipo de lesão.

As principais alterações estruturais hepáticas que podem ocorrer com o


uso de EAAs e gerar algum tipo de lesão local são os adenomas, as pelioses
hepáticas e as colangites.

Os adenomas hepáticos consistem em tumores benignos que podem se


romper e causar um sangramento interno, levando à hipotensão e choque. Os
adenomas dificilmente causam alterações nas transaminases hepáticas. É
recomendado que se faça a verificação através de exames de imagem, como
ultrassonografia ou tomografia computadorizada.

As pelioses hepáticas são caracterizadas pela proliferação e dilatação dos


capilares sinusoidais presentes no fígado. Estes capilares se expandem com o
acúmulo interno de sangue e eventualmente podem se romper, levando a um
quadro de choque e óbito. Em alguns casos a doença pode progredir para
icterícia, hepatomegalia ou insuficiência hepática. Nestes casos de peliose, as
enzimas hepáticas podem estar normais ou levemente aumentadas. A
identificação também é feita por meio da ultrassonografia ou tomografia
computadorizada.

A colangite consiste na obstrução ou irritação das vias biliares. Nestes


casos, o paciente costuma apresentar enjoos, náuseas e dores abdominais. Na
maioria das vezes, os sintomas são leves e as alterações tendem a se restringir
apenas a nível dos exames. Recomenda-se também a identificação por meio de
exames de imagem.

Resumindo, os EAAs podem de fato desempenhar efeitos hepatotóxicos,


especialmente os 17 alfa-alquilados. Entretanto, se basear apenas nos exames

9
bioquímicos para avaliar as alterações e possíveis prejuízos no fígado é um erro,
visto que muitas das alterações hepáticas são silenciosas e só podem ser
identificadas a partir da visualização de exames de imagem. Vale combinar os
dois parâmetros de exames, em casos de suspeitas mais extremas, para ter uma
melhor avaliação do perfil hepático do paciente.

ALTERAÇÕES NO PERFIL LIPÍDICO

O perfil lipídico, também chamado de lipidograma, consiste nos


marcadores laboratoriais que envolvem parte do metabolismo lipídico, que
abrange os níveis de colesterol total (CT), lipoproteína de baixa densidade (LDL),
lipoproteína de alta densidade (HDL), lipoproteína de densidade muito baixa
(VLDL) e triglicerídeos (TG).

O colesterol é o principal precursor lipídico utilizado para a síntese de


hormônios esteroides, ácidos biliares e vitamina D. As lipoproteínas tem função
de transportar os lipídeos na corrente sanguínea. O LDL transporta o colesterol
do fígado para os tecidos extra-hepáticos, enquanto o HDL faz o “transporte
reservo” do colesterol, captando o colesterol presentes nos tecidos periféricos e
levando-o até o fígado. Altos níveis de LDL e baixos níveis de HDL estão
relacionados com o aumento do risco cardiovascular e desenvolvimento de
aterosclerose, que consiste na deposição de placas de gordura na parede das
artérias.

10
A testosterona e os demais EAAs podem causar alterações no
lipidograma pois atuam influenciando algumas etapas relacionadas a síntese de
degradação do colesterol, assim como afetam o metabolismo das lipoproteínas
HDL e LDL.

De forma geral, os EAAs tendem a reduzir os níveis de HDL e aumentar


os níveis de LDL, sendo que os 17 alfa-alquilados (Hemogenin, Dianabol,
Stanozolol, Halotestin) costumam ser mais agressivos nestas alterações,
promovendo, em média, reduções de 30% dos níveis de HDL e aumentando o
LDL na mesma proporção.

O Stanozolol é conhecido por ser uma das drogas que mais afeta os níveis
de HDL e LDL de forma negativa. No estudo de Carlson, já mencionado no tópico
anterior, foi observado que doses de apenas 4mg/dia de Stanozolol por um
período de 6 meses foram capazes de gerar reduções expressivas de HDL, onde
os indivíduos saíram de uma linha de base média de 50mg/dL para valores que
chegaram próximos de 20mg/dL.

A explicação para esta redução brusca de HDL com o uso de Stanozolol


se deve a um aumento dos níveis de lipase triglicerídeo hepática, enzima
responsável pela degradação das moléculas de HDL.

Os ésteres de testosterona costumam ter pouca influência no perfil


lipídico, mesmo em doses suprafisiológicas. A única exceção é em relação aos
níveis de HDL, que parecem ser reduzidos de forma dose-dependente com o
uso de testosterona. Este fato pôde ser observado no estudo de Bhasin e
colaboradores (2001):

11
As alterações dos níveis de LDL e HDL em usuários de EAAs podem ser
preocupantes e em muitos casos vai demandar a utilização de recursos
farmacológicos com o objetivo de atenuar estas alterações e diminuir o risco
cardiovascular do indivíduo, pois vale lembrar que outras condições associadas
ao uso de EAAs vão estar contribuindo também com este risco aumentado, como
a própria eritrocitose, uso de inibidores de aromatase, alterações no miocárdio,
etc.

ALTERAÇÕES NA PROLACTINA

De todas as alterações laboratoriais mencionadas, esta costuma ser a


mais especulativa e superestimada.

Vários usuários de esteroides costumam relatar que seus níveis de


prolactina estão aumentados e isso gera neles várias queixas e colaterais. Esse
aumento de prolactina costuma estar associado também a uma família
específica, que é a família da 19-nortestosterona, onde estão incluídas a
Nandrolona e a Trembolona.

Antes de falarmos sobre a questão laboratorial, é necessário entender a


fisiologia da prolactina e os mecanismos pelos quais os EAAs poderiam
supostamente aumentar os seus níveis.

A prolactina é produzida pelos lactotrofos da adenohipófise e tem sua


secreção regulada por vários hormônios importantes. Dentre eles, o principal é
a dopamina.

12
A dopamina atua se ligando nos receptores D2 presentes na hipófise
lactotófrica e dessa forma, exerce um efeito inibitório sob a secreção de
prolactina. Logo, quando a ação da dopamina está reduzida, seja por uma
redução dos seus níveis circulantes ou por competição no receptor, os níveis de
prolactina podem aumentar.

Quando a prolactina está presente em níveis excessivos ocorre uma


supressão do eixo hipotálamo-hipófise-gônadas, causando uma diminuição da
produção de hormônios sexuais, seja em homens ou mulheres. Nestes casos,
ocorrem sintomas típicos de hipogonadismo, normalmente relacionados a
diminuição de libido/desejo sexual, alterações de humor e ansiedade.

A ideia de que os EAAs podem aumentar os níveis de prolactina se pauta


no fato de que alguns esteroides podem ter uma ação mais pronunciada no
sistema nervoso central e desenvolver efeitos neurotóxicos. A Trembolona
costuma ser a principal acusada por este efeito.

Estudos em ratos demonstram que o efeito neurotóxico da Trembolona


pode ser verificado a partir da morte de neurônios presentes no hipocampo
destes animais. Alguns neurônios presentes nesta região estão relacionados
com a produção de dopamina. Por isso, acredita-se que a morte destes
neurônios dopaminérgicos estaria relacionada com a elevação dos níveis de
prolactina, pois, como vimos, a dopamina é um importante regulador da liberação
de prolactina.

Este mecanismo é extrapolativo e mecanicista, visto que são dados


observados em animais e não existem estudos em humanos que atestem
elevação dos níveis de prolactina com a Trembolona ou qualquer outro esteroide
anabolizante.

Vale destacar também que existe uma grande confusão a respeito do que
significa “níveis de prolactina elevados”. Os limites superiores dos valores de
referência de prolactina que são adotados pelos laboratórios geralmente ficam
na faixa de 18 a 20ng/mL. A maioria das elevações encontradas nos exames não
chegam a ser maiores que 30ng/mL. Além disso, são alterações causadas por
estresse, medicações ou exercício físico. Níveis de prolactina que são realmente
preocupantes e prejudiciais ficam na faixam de 100ng/mL ou superiores a isso.

13
Mas nestas situações, já costumam envolver casos de macro ou
microprolactinoma.

Por fim, ainda que possa ocorrer um aumento dos níveis prolactina pelo
uso de EAAs, seja de maneira direta ou indireta, vale lembrar que o eixo
hipotálamo-hipófise-gônadas já está suprimido e que o indivíduo possui altos
níveis de andrógenos circulantes. Ou seja, é muito improvável que aconteça
qualquer tipo de repercussão clínica por conta disso.

CONCLUSÃO

O uso de esteroides anabolizantes pode causar diversas alterações em


marcadores laboratoriais que irão repercutir em desfechos metabólicos variados.
Vale lembrar que a magnitude e grau destas alterações vai ser dependente tanto
do hormônio utilizado, quanto da dose e tempo de uso. É necessário ter a visão
global dos efeitos dos EAAs para que se identifique e interprete as alterações
causadas por eles de maneira coerente. E claro, propondo intervenções
terapêuticas quando necessário, sejam elas farmacológicas ou não.

14
REFERÊNCIAS
Bond P, Smit DL, de Ronde W. Anabolic-androgenic steroids: How do they work
and what are the risks? Front Endocrinol (Lausanne). 2022 Dec 19;13:1059473.
doi: 10.3389/fendo.2022.1059473. PMID: 36644692; PMCID: PMC9837614.
Bond P, Llewellyn W, Van Mol P. Anabolic androgenic steroid-induced
hepatotoxicity. Med Hypotheses. 2016 Aug;93:150-3. doi:
10.1016/j.mehy.2016.06.004. Epub 2016 Jun 5. PMID: 27372877.
Carson P, Hong CJ, Otero-Vinas M, Arsenault EF, Falanga V. Liver enzymes and
lipid levels in patients with lipodermatosclerosis and venous ulcers treated with a
prototypic anabolic steroid (stanozolol): a prospective, randomized, double-
blinded, placebo-controlled trial. Int J Low Extrem Wounds. 2015 Mar;14(1):11-8.
doi: 10.1177/1534734614562276. Epub 2015 Feb 3. PMID: 25652757.
Ebook Testosterona (Fisiologia, Estética e Saúde) - Dudu Haluch, 2020.
Grunfeld C, Kotler DP, Dobs A, Glesby M, Bhasin S. Oxandrolone in the treatment
of HIV-associated weight loss in men: a randomized, double-blind, placebo-
controlled study. J Acquir Immune Defic Syndr. 2006 Mar;41(3):304-14. doi:
10.1097/01.qai.0000197546.56131.40. PMID: 16540931.
Ohlander SJ, Varghese B, Pastuszak AW. Erythrocytosis Following Testosterone
Therapy. Sex Med Rev. 2018 Jan;6(1):77-85. doi: 10.1016/j.sxmr.2017.04.001.
Epub 2017 May 16. PMID: 28526632; PMCID: PMC5690890.
Rizzuti, André. Testosterona e hormônios anabólicos androgênicos: volume 1/
Lura Editorial – 1º edição- São Paulo, 2021.
Verdy M, Tetreault L, Murphy W, Perron L. Effect of methandrostenolone on blood
lipids and liver function tests. Can Med Assoc J. 1968 Feb 24;98(8):397-401.
PMID: 4866087; PMCID: PMC1923870.

15

Você também pode gostar