Querigma CNBB
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Querigma
A partir do documento da CNBB n. 107
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
ISBN 978-85-356-4457-9
18-19704CDD-261.2
1a edição – 2018
Paulinas
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© Pia Sociedade Filhas de São Paulo — São Paulo, 2018
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................... 7
PARTIR DA FÉ...................................................................................11
Tempos de pluralismo.................................................................... 13
IR AO ENCONTRO......................................................................... 29
Experiência de Deus....................................................................... 29
Encontro.........................................................................................31
Escutar, dialogar............................................................................. 33
ANUNCIAR A BOA-NOVA............................................................. 37
O mistério de Cristo...................................................................... 38
Memorial da salvação..................................................................... 41
Centrar-se na mensagem das leituras.............................................. 46
CONVERTER O CORAÇÃO........................................................... 49
TESTEMUNHO DE UM PAPA........................................................61
INTRODUÇÃO
7
realizar o querigma nos ambientes familiares, escolares, missioná-
rios, ou pelos meios de comunicação.
Vamos tomar como referência o Documento n. 107 da CNBB,
Iniciação à vida cristã: itinerário para formar discípulos missionários,1
para seguir o caminho abaixo.
É preciso situar o anúncio de Jesus a partir do modo como a
maioria das pessoas entende e vive a fé. Encontramos aquelas pessoas
com pouca evangelização que se apegam a algumas práticas devocio-
nais e creem profundamente em Deus. Por outro lado, também há
aquelas indiferentes à fé ou extasiadas pela teologia da prosperidade.
O primeiro capítulo analisa estas situações.
O segundo capítulo, conforme o documento prevê, traça o per-
fil da Igreja querigmática e com abertura missionária. Por isso, a
metodologia do pré-catecumenato da iniciação cristã dos adultos –
acolher, visitar e anunciar – se estende a todos os agentes paroquiais,
não se restringindo unicamente aos catequistas. Urge a passagem de
uma paróquia que realiza a iniciação cristã para uma paróquia que
seja toda ela iniciática.
O terceiro capítulo destaca a ação do agente que vai ao encontro,
acolhe e escuta atentamente a pessoa, estabelece o diálogo e valoriza
sua experiência de fé. Sabe ligar a situação que o outro está passando
com o plano salvador de Deus.
O quarto capítulo apresenta a eficácia da mensagem como me-
morial das ações de Jesus Cristo realizadas na força do Espírito San-
to. O agente anuncia claramente Jesus Cristo, vai direto ao essencial
da fé, apresenta o amor salvífico de Deus como prévio à obrigação
moral e religiosa e destaca as promessas de graça que o texto declara.
O quinto capítulo põe à luz a única condição para a Palavra
brotar e crescer: o coração contrito e humilde daquele que acolhe
1
CNBB. Iniciação à vida cristã: itinerário para formar discípulos missionários. Brasília:
Edições CNBB, 2017. (Documentos da CNBB 107).
8
livremente a mensagem, a põe em prática e volta para a comuni-
dade cristã. Neste ponto, conta muito o testemunho de fé de quem
anuncia.
O sexto capítulo trata do querigma relacionado ao processo da
iniciação cristã. Os capítulos anteriores servirão de base para arti-
cular o pré-catecumenato dos adultos e identificar o papel do intro-
dutor nesse processo. Lembremo-nos de que todas estas atitudes que
acompanham o querigma se aplicam, em sua medida, na catequese
por idades.
A prática do primeiro anúncio na pastoral paroquial tornará a
comunidade missionária mais sensível ao sofrimento das pessoas, es-
pecialmente dos pobres, e em busca dos batizados que se afastaram
da fé ou que nunca foram evangelizados de verdade. Saberá indivi-
dualizar cada situação e personaliza-lhe as tratativas.
Que estas páginas façam vibrar seu coração e que, assim como
ocorreu com a Samaritana (cf. Jo 4,39), muitos possam crer por con-
ta do seu anúncio e testemunho!
9
PARTIR DA FÉ
11
nosso catolicismo, a transmissão da fé se fazia, principalmente, por
meio da piedade popular. A fé encontrava expressão nas devoções aos
santos, nas peregrinações, nas penitências e nas orações decoradas.2
Essa evangelização formou o vigoroso substrato da fé popular.
Encontramos muitos cristãos que sabem pouca doutrina, expressam
muitos sentimentos piedosos e participam ocasionalmente na comu-
nidade; porém, guardam consigo uma consolidada referência de fé
para enfrentar o dia a dia. “Com sua religiosidade característica [o
povo] se agarra no imenso amor que Deus tem por eles e que lhes
recorda permanentemente sua própria dignidade.”3 Citamos como
exemplo as romarias que visitam frequentemente os santuários ma-
rianos ou aqueles dedicados ao Senhor Bom Jesus flagelado, e que
sabem contemplar a Sexta-feira da Paixão.
Um Senhor dos Passos, vergado ao peso da cruz, rosto ensanguen-
tado, cabeça coroada de espinhos, é a imagem da multidão dos fa-
mintos, dos desempregados, dos favelados, dos sem-teto, que formam
um cinturão de miséria e de sofrimento em muitas de nossas cidades.
Diz-nos o Papa Francisco:
2
Cf. ibid., nn. 2, 73, 44.
3
Documento de Aparecida, n. 265. Ainda: “Nossos povos se identificam particularmen-
te com o Cristo sofredor, olham-no, beijam-no ou tocam seus pés machucados, como
se dissessem: Este é ‘o que me amou e se entregou por mim’ (Gl 2,20). Muitos deles
golpeados, ignorados, despojados, não abaixam os braços”.
4
Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. São Paulo: Paulinas, 2013. n. 125; cf. Docu-
mento de Aparecida (DAp), n. 261.
12
Não podemos menosprezar nossa experiência primeira que nasce
no confronto de nossa fé com a dureza dos limites da vida, nem
mesmo considerá-la como modo secundário da vida cristã, porque
seria esquecer o primado da ação do Espírito e a iniciativa gratuita
do amor de Deus.5 Partamos deste sentimento de fé, de piedade e de
devoção já latente em nosso povo para anunciarmos o Deus de Jesus
Cristo.
Vamos considerar a sensibilidade de fé, a abertura religiosa, na-
turalmente presente nas pessoas que creem e ocasionalmente parti-
cipam de romarias, festas de padroeiro, da Virgem, Semana Santa,
féretros, sétimo dia... Com sinceridade, elas buscam, na fé, sentido
de vida e solução para seus problemas. Tais sentimentos devem ser
amplamente acolhidos e respeitados por aquele que anuncia. Nessa
direção, o Documento n. 107 afirma: “Na Iniciação à Vida Cristã,
a piedade mariana há de ser valorizada, reconhecendo em Nossa Se-
nhora o modelo de fidelidade a Deus”.6
Tempos de pluralismo
O Documento de Aparecida caracteriza o momento atual como
“mudança de época”.7 Podemos constatar o impacto sobre a fé, vin-
do das grandes mudanças trazidas pela sociedade virtual. O mundo
tornou-se uma aldeia e ficamos assombrados com as novas tecnolo-
gias que mudaram nossa maneira de viver e de nos relacionar. Essas
transformações afetaram nossos critérios de compreensão de tempo
e de espaço e os nossos valores mais profundos de vida, de família e
de sociedade.8
5
Cf. DAp, n. 263.
6
CNBB. Iniciação à vida cristã, n. 150.
7
DAp, n. 44.
8
Cf. CNBB. Iniciação à vida cristã, n. 39.
13
O pluralismo presente em todas as esferas nos obriga a pensar de
forma diferente, a sociedade perdeu o referencial de vida cristã e li-
damos com aqueles batizados na infância que não tiveram o mínimo
contato com a fé. Por isso, torna-se necessário, e ao mesmo tempo,
incomum, anunciar Jesus e o seu Reino de maneira clara e decidida.
“A atual mudança de época exige que o anúncio de Jesus Cristo
seja explicitado continuamente.”9 Não podemos pressupor o conhe-
cimento mínimo da fé, ou mesmo que seja prontamente acolhida
nos diferentes meios sociais. “O inquietante enfraquecimento das
instituições cristãs move-nos a um processo de conversão pastoral e
de aprendizagem. Essa interpelação representa uma verdadeira opor-
tunidade para a transmissão da fé.”10
O evangelizador terá todo empenho e coragem para anunciar ex-
plicitamente a vida, a missão e o destino de Jesus de Nazaré.11 Até
mesmo a família acabou perdendo sua função de formadora da fé,
com capacidade de transmitir suas primeiras noções, as orações e a
vivência dos valores cristãos. “A fragilidade dos vínculos familiares é
uma marca de nossos tempos. [...] Vivemos o crescente perigo de que
o individualismo exagerado desvirtue os laços familiares.”12
O indivíduo se confronta com as muitas faces do pluralismo, di-
ferentes formas de viver e pensar convivem em nossa cultura, desde o
amplo leque de ideologias partidárias às múltiplas crenças religiosas.
Esse pluralismo liberta as pessoas de normas fixas, mas também as
desorienta pela perda das referências fundamentais e gera a fragmen-
tação da vida e da cultura. A conjunção destes fatores poderá levar à
falta de sentido da vida.
9
Ibid., n. 75.
10
Ibid., n. 2.
11
Cf. ibid., n. 41.
12
Ibid., n. 53a.
14
Mostra-se sempre mais urgente apresentar e cultivar a fé. Daí vem
a nossa responsabilidade de compreender que o “Evangelho não mu-
dou, mas mudaram os interlocutores. Mudaram os valores, os mo-
delos, as alegrias e as esperanças, as tristezas e angústias dos homens
e das mulheres de hoje”.13 Precisamos compreender o que se passa
a nossa volta e perceber que o mesmo Evangelho é transmitido de
maneira diferente de uma geração para outra.
Ao lado da sincera experiência de fé de muitas pessoas, a tradi-
ção cristã sofre o bombardeio de novas espiritualidades, ocasionando
mudanças vertiginosas. Do indiferentismo de cristãos que não levam
em conta o Batismo recebido, vamos até aqueles que se refugiam
numa fé de sucessos e vitórias que promete uma prosperidade sem
fim, ignorando a cruz de Cristo.
Crer é, sobretudo, aceitar a gratuidade da vida que nos vem de
alguém capaz de dar plenitude e finalidade a ela. Essa plenitude
vem muito mais na linha do sentido de existir do que propria-
mente de nos tornar invulneráveis e blindados diante da doença,
da violência, da injustiça, dos sofrimentos, intempéries, aciden-
tes, luto ou qualquer outra limitação humana. A fé nos plenifica
porque nos coloca na companhia de Deus; a sua graça, ternura,
compaixão e providência nos amparam e não nos deixam nunca
nos sentirmos sós.
13
Ibid., n. 51.
14
Ibid., n. 225.
15
Devemos ter o cuidado de não privatizar a fé numa esfera intimis-
ta para resolver apenas um problema pessoal daquele momento. “A
educação na fé supõe [...] discernimento na busca de Deus, presente
na religiosidade popular, e condução de todas as nossas devoções e
práticas religiosas ao Mistério Pascal.”15
Assumir existencialmente o morrer e o ressuscitar com Cristo
constituirá a orientação última das práticas devocionais e o eixo
para o qual esta sempre deverá convergir. Coincidentemente, este
é o ponto de partida do querigma. O Cristo morto e ressuscitado
torna-se a referência definitiva da dinâmica cristã de morrer conti-
nuamente para o pecado e viver livremente a novidade do Reino até
a eternidade.
15
Ibid., n. 151.
16
IGREJA QUERIGMÁTICA
E MISSIONÁRIA
1
Ibid., n. 106.
2
Ibid., n. 50.
3
Ibid., n. 75.
4
Ibid., n. 59.
17
as características principais do tempo do pré-catecumenato, como
priorizar e acolher os adultos afastados da comunidade, promover
o encontro com Jesus, anunciar o querigma... se estenderão como a
tônica de toda atividade da pastoral e se tornarão próprias da vida
da comunidade.
O querigma supõe uma Igreja missionária que busca a pessoa
afastada da fé. O Documento n. 107 aposta na inteligente abertura
missionária que sabe ler a passagem de Deus na atual realidade e, por
isso, anima o evangelizador a assumir atitudes inéditas em lugares
fora do alcance da Igreja. “Não existe Iniciação sem abertura missio-
nária [...] [sem] aproximar-se das pessoas e acolhê-las nas situações
em que se encontram.”5
O exemplo mais claro desse jeito de evangelizar vem do próprio
Papa Francisco, que não se cansa de oferecer atitudes proféticas para
sinalizar um rumo mais dialógico da Igreja com a sociedade: seu
constante cuidado com os pobres, a preocupação com o essencial
da mensagem cristã, a acolhida dos refugiados, seu estilo de vida
sóbrio... O documento insiste nesta direção.
5
Ibid., n. 157.
18
Jesus nos convida a sair, a escutar, a servir, num movimento de trans-
formação missionária de nossa Igreja.6 Essa atitude exige estarmos
atentos aos sinais dos tempos. O processo é de escuta e atenção aos
clamores do povo. Voltando-nos assim para a “Samaria” dos nossos
dias, como fez Jesus, abrem-se novos espaços, livres, críticos, comu-
nitários e fraternos, onde a fé cristã pode emergir, com uma renovada
pertinência, na busca de mais humanidade e de melhor qualidade de
vida, com um profetismo especial, que responda às necessidades da
nossa realidade.7
6
Evangelii Gaudium, nn. 19-49.
7
CNBB. Iniciação à vida cristã, n. 51. Relacionados com o tema da Igreja em saída,
encontramos também os nn. 52, 55, 141.
8
Ibid., n. 108.
9
Ibid., n. 135.
19