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CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL

Denominações religiosas de matriz neopentecostal e suas

incidências na política

Alexandra Correa de Souza

DRE 113085727

RIO DE JANEIRO

2022
Trabalho de conclusão de curso como requisito

obrigatório para obtenção do graus de bacharel em

Serviço Social

Denominações religiosas de matriz neopentecostal e suas

incidências na política

Alexandra Correa de Souza

Prof Joana Garcia (orientadora)

Rio de Janeiro, maio de 2022

2
Agradecimentos

O caminho percorrido para a conclusão do meu Trabalho de Conclusão de


Curso exigiu de mim um grande esforço psicológico e aprendizado. Os
desafios e angústias fizeram parte desse processo e foram inúmeros os
momentos em que pensei em desistir, mas graças à colaboração e incentivo de
todos esse sonho se tornou possível. Gostaria de agradecer e dedicar essa
dissertação às seguintes pessoas:

Em primeiro lugar agradeço ao meu amado Deus pois sei que foi graças a Ele
que eu consegui chegar até aqui.

Aos meus pais, Sonia e Jorge, pelo amor incondicional que me deram durante
a minha vida em todos os instantes.

Ao meu filho Anderson e à minha querida nora Lorruama pelos momentos de


companheirismo, apoio e incentivo.

Ao meu marido Messias e à minha filha Andreza pela dedicação oferecida e


por ficarem ao meu lado.

Ao professor Rogério Lustosa, que me orientou em TCC I, pelas oportunidades


de aprendizagem e pelo suporte em um período extremamente difícil.

À professora Mirian Krenzinger, pelos ensinamentos e pela parceria desde o


início da minha graduação.

E à professora Joana Garcia, minha orientadora em TCC II, agradeço por todo
o auxílio, disponibilidade e paciência que foram fundamentais para mim e
contribuíram para a elaboração do meu projeto.

Serei eternamente grata a todos que me ajudaram para a conclusão dessa


grande etapa.

3
"A miséria religiosa é ao mesmo tempo a expressão da mesma miséria e

o protesto contra esta mesma miséria. A religião é o suspiro da criatura

oprimida, o coração do mundo sem coração e o espírito do mundo sem

espiritualidade. Ela é o ópio do povo". MICHAEL LÖWY

4
Siglário

CF Constituição Federal

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e


CNPq
Tecnológico

ESS Escola de Serviço Social

ISER Instituto de Estudos da Religião

IUPERJ Instituto Universitario de Pesquisa do Rio de Janeiro

IURD Igreja Universal do Reino de Deus

Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos


NEP-DH
Humanos

PSC Partido Social Cristão

PT Partido dos Trabalhadores

SBI Sociedade Brasileira de Instrução

TCC Trabalho de Conclusão de Curso

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

UNICAMP Universidade Federal de Campinas

USP Universidade de São Paulo

Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Quer,


LGBTQIA+ Intersexuais, Assexuais, todas as outras siglas e
identidades que integram o movimento

5
Resumo

Este Trabalho de Conclusão de Curso procura debater as denominações

religiosas de matriz neopentecostal e suas incidências na política,

especialmente no campo das políticas e formas de intervenção social, a partir

de uma análise crítica. Em virtude de uma conjuntura política propícia ao

protagonismo dos evangélicos pentecostais, há neste estudo um destaque a

esse segmento. O tema da religião é pouco estudado no âmbito do Serviço

Social, embora esteja presente desde sua gênese, atravessando - de modo

inequívoco - a atuação profissional e a inserção sócio ocupacional de muitos


Assistentes Sociais. O presente estudo sistematiza reflexões oriundas da

produção teórica e investigativa de alguns autores da área das Ciências Sociais

Aplicadas, bem como busca referências no debate veiculado pelos órgãos de

comunicação escrita. Apresenta uma interlocução com o conteúdo trazido por

professores convidados a ministrar aulas no Curso de Extensão “Direitos,

Políticas Públicas e os atravessamentos religiosos” realizado no âmbito da

Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio e Janeiro no ano de

2021. Considera-se que o debate sobre religião, política e intervenção

profissional deve ser estimulado e enriquecido com contribuições críticas para

que o tema não se mantenha presente de modo invisibilizado ou camuflado,

porém bastante incidente nas visões e práticas sociais.

Palavras chave: religião, política, bancada evangélica.

6
Índice

Introdução 8
1- Considerações sobre religiões e as religiosidades 11
- Prosperidade como valor religioso 14

- crime e castigo 15

- a pauta dos costumes 16

2- Política na religião: a Bancada Evangélica 18


2.1- Uma aproximação sobre o “o povo de Deus” 23

3- Reflexões em torno da religião e da esfera pública 31


a. Secularização da Cultura e Tolerância Religiosa no Século XVIII -
contribuições do Prof Marildo Menegat 31

b. Religião, Cultura e Politica, contribuições da Profa Maria das Dores


Campos Machado 33

c. O que é o Estado Laico? - contribuições do prof. Luís Antônio Cunha


37

d. Vocação religiosa e engajamento profissional, contribuições do Prof


Pedro Simões 39

e. Os atravessamentos religiosos no campo da saúde mental,


contribuições da Prof Tathiana Gomes 41

f. Familia, Patriarcado, Religião e Democracia, contribuições da prof


Andrea Moraes 44

Considerações finais 49
Referências Bibliográficas 51

7
Introdução

Na história de longa duração da humanidade, houve muitas pessoas

consideradas profetas. Segundo Alves (2014), alguns destes profetas eram

assim considerados porque eles eram videntes com poderes de prever o

futuro, diferente dos “verdadeiros profetas hebreus” que se dedicavam com

paixão à sua vocação, compreendendo e denunciando o que ocorria no

momento. Sua vocação estava mais próxima da política do que da meditação

espiritual.

Os profetas hebreus não estavam preocupados com aquilo que

vulgarmente era considerado sagrado. O cultivo das experiências místicas não


era do seu interesse, na verdade boa parte de suas pregações eram tomadas

pelo ataque às práticas religiosas dominantes e a classe sacerdotal.

O Estado crescia cada vez mais centralizado e concentrado nas mãos de

poucos e, como sempre acontece, quando o poder de uma elite aumenta, o

poder dos subordinados enfraquece. A fraqueza do povo crescia à medida que

aumentava o poder dos exércitos. Os camponeses, por sua vez, tinham que

vender suas propriedades que eram transformadas em latifúndios por um

pequeno grupo de capitalistas urbanos. É neste contexto que se constituem os

profetas, porta voz dos desgraçados da terra exigindo o fim das práticas de

opressão. Era necessário que a vida e a alegria fossem devolvidas aos pobres,

aos desprotegidos e a todos que se encontrassem fora da riqueza e do poder.

Instaurou-se com os profetas um novo tipo de religião, de natureza ética e

política.

As autoridades os acusavam de traidores e denunciavam suas pregações

como contrárias aos interesses nacionais. Foram proibidos de falar,

perseguidos e mortos. E enquanto lutavam com o poder estatal, de um lado,

enfrentavam os representantes das religiões oficiais do outro. Parecia-lhe que

uma religião protegida pelo Estado só poderia estar a serviço dele. Os

8
profetas não só denunciavam aqueles que oprimiam os fracos, como aqueles

que sacralizavam e justificavam a opressão.

Foi assim que há muito tempo antes que um grande intelectual

afirmasse que a religião é ópio do povo, o nome de Deus era usado em nome

da opressão. O Estado e o poder econômico tem a religião como sua aliada.

Nesta pesquisa temos como objetivo geral considerar aspectos da

religião de matriz neopentecostal na política no Brasil, considerando a

bancada evangélica como uma das mais influentes neste meio. Com base

nisso, a presente pesquisa visa contribuir, do ponto de vista acadêmico, com

uma reflexão sobre a inserção da bancada religiosa na política no Brasil.

No que diz respeito à motivação, o interesse no presente estudo se


constitui a partir da leitura de livros, artigos que abordavam a política na

religião e que indicavam o quanto a bancada religiosa vem crescendo ao

longos dos anos. Esse tipo de representação política vem trazendo segmentos

com viés mais conservador. Analisamos que existem diversos fatores de ordem

estrutural e contextual que fazem com que ocorra essa inserção dos

evangélicos na esfera política brasileira.

A metodologia utilizada para a elaboração do presente trabalho foi

baseada na abordagem exploratória, bibliográfica e documental. O principal

instrumento para coleta de dados foi a análise bibliográfica, sendo

desenvolvida com o aporte de artigos científicos e livros relacionados ao tema

da religião na política. Além disso, o curso “Atravessamentos Religiosos no

Campo das políticas públicas”, realizado no ano de 2021 pela Escola de

Serviço Social (ESS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sob a

coordenação da professora Elaine Moreira do Departamento de Método e

Técnicas do Serviço Social, contribuiu imensamente para a elaboração deste

estudo.

Esta monografia está estruturada em três capítulos, cada um com sua

especificidade: no primeiro capítulo abordaremos a Religião e as

9
religiosidades, no segundo capítulo A política na religião e bancada

evangélica, no terceiro capítulo serão apresentadas Reflexões em torno da

religião e da esfera pública e, por fim, nas considerações finais faremos uma

retomada no que foi análisado, visando uma reflexão acerca do tema.

10
1- Considerações sobre religiões e as religiosidades

O que é religião? Segundo Alves (2014) e Buber (2006), a religião parte

do pressuposto de juntar o homen ao sagrado, à ideia de Deus. Quem segue

essa ideia tem o desejo de mudança interior e não pensar só nas questões

materiais, monetárias, ultras individualistas, é uma superação de si mesmo

para ter um encontro com Deus e ser uma pessoa melhor. Há uma diferença,

segundo esses autores, principalmente Buber, entre a ideia de Deus no sentido

do sagrado e a religião institucionalizada. A ideia de Deus está associada ao

contato no sentido radical da vida na mudança do seu eu interior em função

dos nossos melhores valores. E a religião institucionalizada, que não


necessariamente leva a esse religar com o Deus luminoso é a interpretação

humana desse fenômeno e nem sempre se consegue ter esse contato direto.

Por isso, a constituição da religião institucionalizada. No entanto, a religião

institucionalizada pode desenvolver o lado material do ouro da prata e afastar

desse contato com o sagrado.

De acordo com Buber (2006), a discussão da religião se dá

principalmente na ideia de Deus. O que é desvelar Deus ou encontrar Deus,

segundo esse autor? É desenvolver antes de tudo a relação entre EU e TU.

Quem é o eu? O homem. Quem é o tu? São os animais e a natureza. Na

medida que nós amadurecemos nessa relação, ela se torna construtiva tanto

para o eu quanto para o tu, estamos entendendo e desvelando o que é Deus

aqui no mundo. Em outras palavras, a relação EU e TU em resumo significa

primeiro desenvolver a mudança própria da pessoa viver os valores maiores

que são entre eu e tu: a compaixão, a gentileza, o perdão, a compreensão, a

misericórdia. Segundo o autor, todos esses sentimentos tornam a alma bela.

Se esforçar por viver isso é ter um encontro com Deus no sentido radical da

vida quem realmente vive isso mesmo em silêncio se torna uma pessoa

diferente isso faz a gente e a sociedade mudar.

11
Segundo esta concepção, na religião institucionalizada, a relação Eu e

Tu se dá de forma incompleta. Há uma tendência de viver essa relação “no

holofote”, explorando o outro, tirando vantagem disso com a ideia de Deus,

seja no dízimo seja nas relações de compadrio.

Para Alves (2014), houve um longo tempo que a religião era uma forma

de enquadramento e controle. Quase não se ouvia falar em pessoas que não

tinham religião, os chamados descrentes. Nesse período, ter esse

posicionamento era raro, pois muitos indivíduos se escondiam por medo de

acabar queimados na fogueira. As pessoas em suas relações eram educadas

para ouvir e aprender tudo que girava em torno do mundo religioso, ou seja,
sobre Deus e seus milagres. O meio natural se estruturava em torno da alma

humana, caso não acreditassem em Deus e não seguirem os mandamentos

divino suas respectivas almas iram perecer.

Posteriormente, houve uma “quebra de encanto”: o céu ficou vazio e já

eram considerados raros os milagres entre a população. Com o avanço da

ciência e tecnologia, algumas pessoas já pensavam em mundo em que Deus

não era necessário. A partir desse período em si o ateísmo surge como uma

das marcas da Ciência. (ALVES, 2014).

Democracia em risco é um livro que apresenta textos de diversos

autores com especialidades em inúmeras áreas como, por exemplo, ciência

política, história, sociologia, antropologia, economia e direito. Ele é composto

por 22 ensaios sobre o Brasil de hoje. O ensaio escolhido para estabelecer

uma interlocução com esta monografia é o que fala sobre Deus acima de

todos e que foi escrito pelo autor Ronaldo de Almeida. O autor é graduado

em ciências sociais, mestre em antropologia pela UNICAMP, doutor em

antropologia social e concluiu o pós-doutorado em Paris na École dês Hautes

Études em Sciences Sociales. Possui experiência em Antropologia da Religião

e Antropologia Urbana Atualmente é professor adjunto no departamento de

12
antropologia na UNICAMP. Os autores deixam claro que o tempo em que este

projeto foi criado e executado também terá sido a causa de eventuais

deficiências e ausências, pelas quais os editores assumem total

responsabilidade.

Pouco depois do anúncio do resultado final das eleições de 2018, o

presidente eleito Jair Bolsonaro, acompanhado da esposa, de assessores e

políticos, fez o discurso da vitória, mas antes disso passou a palavra para o

senador, pastor e cantor gospel Magno Malta, que disse: “Nós começamos

essa jornada orando. E o mover de Deus...e ninguém vai explicar isso nunca:

os tentáculos da esquerda jamais seriam arrancados sem a mão de Deus.


Começamos orando e mais do que justo que agora oremos para agradecer a

Deus.”1

Ao ver vantagem no grande número de votos que poderia ter do

eleitorado evangélico, Bolsonaro deixou explicita uma grande inclinação para

esse segmento, embora se declarasse católico.

Seu último casamento foi feito pelo pastor Silas Malafaia e depois da

votação do impeachment da Dilma, foi batizado no rio Jordão em Israel pelo

pastor Everaldo da Assembleia de Deus, já que o batizado feito na Igreja

Católica quando criança não é reconhecido pelos evangélicos. Sem dúvida,

esse ato simbólico significou muito para os evangélicos e seus discursos com

citações bíblicas também eram algo que agradava muito seus eleitores. Até a

narração de sua facada como forma de testemunho, o ajudou na conquista da

presidência, na medida em que tirou proveito da cena violenta e da

recuperação dela decorrente. A evocação religiosa fez parte do seu discurso e

das suas práticas, até a composição do seu novo governo é composta por

assim denominados “cristãos”.

1Fonte: https://noticias.gospelmais.com.br/jornalista-preocupacao-oracao-
bolsonaro-103975.html, acesso em 30/05/2022.

13
Segundo o Data Folha, apesar do declínio dos fiéis, o catolicismo ainda

é o grande mediador cultural do país. Entretanto, quem fez de fato a diferença

a favor de Bolsonaro em números absolutos foram os evangélicos, motivados

pelo medo da “ameaça comunista” e pelo apelo à honestidade, à moral e aos

bons costumes das pessoas de bem. Outra razão era o interesse da população

em relação ao combate da crise econômica, o antipetismo e a violência. Cabe

ressaltar que um terço dos eleitores evangélicos votou no candidato Fernando

Haddad e isso revela uma diversidade entre os religiosos. A candidatura de

Haddad mobilizou um discurso em defesa da democracia diante da ameaça de

um governo de militares, da defesa dos direitos humanos, das diferenças das

minorias, do combate à desigualdade social, etc. A partir de 2013, uma fusão


de valores culturais e uma concentração de forças políticas configuram o que

tem sido chamado de onda conservadora. O Deus evocado por Bolsonaro não

está acima de todas as coisas, mas se articula em algumas linhas de força

social que constituem a onda. Neste sentido, cabe ressaltar que nem todos os

conservadores são evangélicos e nem todo evangélico é conservador.

No próximo segmento, buscamos ressaltar traços que marcam algumas

denominações religiosas, especialmente de base pentecostal, ainda que tais

traços contradigam o espirito transcendente da religião, na medida que

conecta o eu e o tu ao ter e, no limite, ao ostentar, assim como traz elementos

associados à punição e não à consolação, além de estabelecer uma pauta de

costumes essencialmente conservadora nos seus fundamentos, embora na

prática não necessariamente esses fundamentos sejam observados.

- Prosperidade como valor religioso

Trazida ao Brasil pelo neopentecostalismo (movimento dentro do

cristianismo que surgiu em meados dos anos 1970 e 1980), a teoria da

14
prosperidade tem sido um fato de incentivo para que os fiéis ajam com

determinação na sua vida financeira, a fim de gerar estabilidade econômica

para enfrentar as tempestades, além de adquirir e consumir bens materiais. A

teologia da prosperidade prega uma ética econômica voltada para um mundo

em que possuir e ascender são sinais de que Deus e não o Diabo age em sua

vida. A utopia da prosperidade por sua vez, está na possibilidade do indivíduo

crescer em relações de desigualdade. Cada vez mais essa concepção se

espalha pelo meio religioso e além dele. É recorrente em pesquisas feitas em

que os eleitores atribuem a si ou a Deus o sucesso na vida e ao governo as

dificuldades.

- crime e castigo

A segunda linha de força social que constitui a “onda conservadora” se

refere a uma serie de movimentações políticas que apontam para posturas e

ações mais repressivas e punitivas dos aparelhos de segurança do Estado. A

redução da maioridade penal, a ampliação do porte legal de arma, a lei

antiterrorismo, a política de encarceramento, entre outros, são temas atuais,

cujo conjunto aponta para o aumento da violência do Estado sobre a

população, criminosa ou não, sobretudo os mais apartados do universo dos

direitos.

Em boa medida, essa linha tende a encontrar considerável apoio

popular, a exemplo das políticas de encarceramento. A eleição de Jair

Bolsonaro à Presidência da República foi a principal, mas não a única,

expressão desse momento político. No Congresso, o número de deputados e

senadores ligados a carreiras na segurança saltou de dezoito para 73 (entre

bombeiro militar, policial civil e militar, militar reformado e membro das Forças

Armadas). Nessa linha, Bolsonaro joga em casa, enquanto a esquerda é

percebida como presa ao discurso dos direitos humanos e com pouca

capacidade de oferecer respostas às demandas mais urgentes da população.

15
- a pauta dos costumes

Entre idas e vindas, o Brasil viveu no período democrático recente

mudanças consideradas progressistas em termos de direitos (civis, sociais,

reprodutivos, sexuais, etc.). Em contraposição, vem ocorrendo uma reação

crescente, em grande medida mobilizada por convicções religiosas, que afirma

a necessidade de contenção dos avanços do secularismo e dos

comportamentos e valores mais liberais, os protagonistas mais destacados do

conservadorismo dos costumes nos últimos anos têm sido parcelas

significativas dos evangélicos pentecostais e não pentecostais que entraram,

mais do que em qualquer outro momento, na defesa da moralidade público


para regulação de corpos, comportamentos e vínculos familiares (casamento

entre pessoas do mesmo sexo e adoção de crianças por casais gays, por

exemplo). As proposições da ordem dos costumes não advêm somente de um

tradicionalismo resistente a mudanças, como fazem setores da Igreja católica.

Ele encampou o combate à chamada “ideologia de gênero”, espectro

que assombra os cristãos mais religiosos, sobretudo os situados à direita e ao

centro, que gerou, durante a campanha, uma espécie de pânico moral pela

suposta “ameaça à família tradicional”.

Na manifestação dos evangélicos em Brasília em junho de 2013, o

pastor Silas Malafaia declarou, a propósito do projeto de lei anti-homofobia,

que o direito de uma minoria não pode se sobrepor ao da maioria.

A eleição de 2018 foi, com certeza, uma das mais tensas da história

recente do país. Por características próprias e por outras adotadas na

construção de sua candidatura, Bolsonaro foi mais bem-sucedido em conectar

linhas de forças em curso no Brasil recente, entre elas a demanda securitária, a

moralidade dos costumes e o discurso desqualificador de um Estado corrupto

e paternalista.

16
Como dito anteriormente, governa-se como e com quem se elege.

Ainda sob o impacto das urnas e dos primeiros passos do novo governo, vê-se

a disposição de Bolsonaro de entregar o que prometeu. E de esperar recuos

políticos e constrangimentos institucionais, mas o modus operandi da

campanha sugere manter alguns temas tensionados (redução do papel da

escola na educação sexual de crianças e adolescentes, ampliação do que é

legitimo na violência policial, criminalização dos movimentos sociais, entre

outros).

17
2- Política na religião: a Bancada Evangélica

Segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos,

Todo ser humano tem direito à liberdade de


pensamento, consciência e religião; este direito inclui a
liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade
de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela
prática, pelo culto e pela observância, isolada ou
coletivamente, em público ou em particular. (NAÇÕES
UNIDAS, 1948, p.4).

Para Rua apud Guidotti (s.a), a política “[...] consiste no conjunto de

procedimentos formais e informais que expressam relações de poder e que se

destinam à resolução pacífica dos conflitos quanto a bens públicos.” (RUA,

1998, p.231 apud GUIDOTTI, s.a, p. 9). Ou seja, a política pública deve buscar

meios de resolver as adversidades inerentes ao convívio em sociedade.

Entende-se que uma das instituições usadas como mediadoras desta

relação entre sociedade e Estado é a Igreja. No entanto,

Com a fragmentação da sociedade, passou a haver


diversos grupos com diversas demandas. Os partidos
políticos, mesmo em sistemas bem institucionalizados,
não são capazes de acumular e organizar todas as
demandas dos diversos grupos, levando a sociedade a
buscar outras formas de representação e reivindicação de
suas demandas. (LOCATLLI; MARTINS, 2014, p.98)

Existe atualmente uma pluralidade de denominações religiosas de

matriz pentecostal na sociedade brasileira. Algumas delas mostram-se

engajadas nos debates de interesse público por meio de seus representantes,

que ora se apresentam como líderes de tais organizações religiosas, ora

parlamentares eleitos com a identidade religiosa sustentando sua figura

política. Tais parlamentares constituem a chamada “bancada evangélica”.

18
O quadro abaixo caracteriza o universo dos evangélicos, segundo

tipologia construída no ultimo censo de 2010.

Quadro 1: Lista de denominações protestantes no Brasil por número de


membros

Denominação Membros Ano

Convenção Geral das Assembleias de Deus no


6.000.000 2018
Brasil

Congregação Cristã no Brasil 4.500.000 2018

Convenção Nacional das Assembleias de Deus no


4.000.000 2018
Brasil

Igreja Universal do Reino de Deus 1.873.243 2010

Igreja do Evangelho Quadrangular 1.808.389 2010

Convenção Batista Brasileira 1.790.227 2019

Igreja Adventista do Sétimo Dia 1.729.459 2020

Igreja Internacional da Graça de Deus 1.195.380 2014

Igreja Pentecostal Deus é Amor 845.383 2010

Igreja Presbiteriana do Brasil 649.510 2016

Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil 634.286 2019

Convenção Batista Nacional 384.930 2017

Igreja Cristã Maranata 356.021 2010

Igreja Mundial do Poder de Deus 315.000 2010

Igreja Metodista do Brasil 259.729 2015

Igreja Evangélica Luterana do Brasil 245.631 2018

Igreja Evangélica Pentecostal O Brasil Para Cristo 196.665 2010

Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra 180.130 2010

Igreja Presbiteriana Renovada do Brasil 154.048 2016

19
Igreja do Nazareno 153.002 2016

Igreja Casa da Bênção 125.550 2010

Igreja Metodista Wesleyana 120.000 2017

Igreja Presbiteriana Independente do Brasil 96.396 2019

Aliança das Igrejas Cristãs Nova Vida 90.568 2010

Igreja Evangélica Avivamento Bíblico 80.000 2019

Igreja Adventista da Promessa 73.936 2017

Igreja Apostólica Fonte da Vida 70.000 2011

Igreja Batista da Lagoinha 62.000 2018

Associação das Igrejas Batistas Regulares do Brasil


51.000 -
51.000

Igreja Unida 50.898 2010

União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do


50.000 2004
Brasil

Igreja Evangélica Congregacional do Brasil 50.000 2004

Convenção das Igrejas Batistas Independentes no


45.000 2019
Brasil

Igreja Cristã Evangélica (Brasil) 41.000 2016

Igreja Verbo da Vida 40.000 2018

Igreja Videira 40.000 2018

Igreja de Deus no Brasil 34.910 2006

Igreja Cristã Pentecostal da Bíblia do Brasil 11.000 2006

Convenção das Igrejas Evangélicas Irmãos


10.400 2018
Menonitas no Brasil

Igreja Metodista Livre 9.802 2017

Igreja Cristã Presbiteriana 6.000 2010

Igreja Presbiteriana Conservadora do Brasil 4.371 2018

Igrejas Evangélicas Reformadas no Brasil 2.700 2018

Igreja Presbiteriana Unida do Brasil 2.350 2020

20
Igreja Presbiteriana Fundamentalista do Brasil 1.639 2017

Igrejas Reformadas do Brasil 1.038 2020

Igreja Presbiteriana Coreana Americana 1.000 2018

Igreja Indígena Presbiteriana do Brasil 872 2020

Igreja Cristã da Aliança 450 2010

Fonte: compilação de fontes, disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/


Lista_de_denominações_protestantes_no_Brasil_por_número_de_membros, acesso em
05/03/2021

O envolvimento dos evangélicos na política começou a se constituir em

1960, com o movimento “O Brasil para Cristo” que tinha como objetivo inserir
pastores e líderes religiosos protestantes no Congresso Nacional com as

mesmas pautas conservadoras dos dias atuais.

A bancada religiosa representa a união de segmentos de viés

conservador e, em muitos casos, reacionário com projetos de ampliação de

poder das suas referências religiosas para a vida politica. A bancada evangélica

é um termo utilizado pela imprensa e por cientistas políticos para agrupar os

membros do Congresso Nacional do Brasil e dos legislativos estaduais e

municipais que se auto denominam evangélicos e que defendem as mesmas

pautas relativas aos interesses deste grupo.

Segundo reportagem da Revista Veja, a formação de uma Bancada

Evangélica só veio a ser hegemônica no cenário político nacional no início da

década de 1990, quando a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) formulou

um plano político estruturado fazendo uma interface entre a Igreja e a Política

por meio da aquisição da Rede Record de Televisão e Rádio e de sua utilização

como ponte de comunicação com as massas.

De acordo com Locatelli e Martins (2014) existe uma série de fatores

estruturais, culturais e contextuais que levam à inserção dos evangélicos na

21
esfera política brasileira. As igrejas evangélicas pentecostais e

neopentecostais, beneficiam-se do seu conjunto de valores e crenças para

estabelecerem sua penetração na esfera política brasileira. Os autores

enfatizam a atuação dos evangélicos nas regiões mais pobres das cidades

brasileiras, onde “promovem práticas assistenciais, programas de

alfabetização, postos de atendimento de saúde, etc..” (LOCATELLI; MARTINS,

2014, p. 99) Mas é a partir 1986 que os evangélicos passaram a atuar de modo

significativo no espaço político. A baixa institucionalização partidária no Brasil

neste período também contribuiu também para a entrada dos evangélicos na

cena política.

Dentre as igrejas evangélicas com maior atuação dentro do espaço

político, estão a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), a Assembléia de

Deus e a Igreja do Evangelho Quadrangular. Segundo diversos autores (ORO,

2001, 2003; FONSECA, 1998; MIRANDA, 1998; MACHADO, 2003) a Igreja

Universal do Reino de Deus possui o sistema mais organizado no sentido de

mobilização política para as candidaturas. (LOCATELLI; MARTINS, 2014, p.

103)

Os autores enfatizam recorrentemente que,

As igrejas evangélicas chegam a essas localidades


marginais, muitas das quais não recebem a presença do
Estado, a não ser de forma repressiva, e desenvolvem
trabalhos comunitários em benefício da população local,
mobilizando, assim, um grande número de indivíduos
dentro das comunidades. (LOCATELLI; MARTINS, 2014,
p. 105)

Nesta perspectiva, os evangélicos constituem uma fonte de mobilização

política de setores sociais pauperizados, onde as Igrejas evangélicas atuam

como mediadores da relação entre sociedade e Estado, pois os evangélicos

chegam às áreas marginais da sociedade mobilizando as comunidades de

modo direcionar sua opção na hora do voto.

22
2.1- Uma aproximação sobre o “o povo de Deus”

Se há uma verdade que a história pôs fora de dúvida é a de que a


religião engloba uma porção cada vez menor da vida social.
Originalmente, ela se estende a tudo; tudo o que é social é religioso,
as duas palavras são sinônimas. Depois, pouco a pouco, as funções
políticas, econômicas e científicas se emancipam da função religiosa,
constituem-se à parte e adquirem um caráter temporal cada vez mais
acentuado. Deus, se é que podemos nos exprimir assim, que antes
estava presente em todas as relações humanas, retira-se
progressivamente delas; ele abandona o mundo aos homens e a suas
disputas. (Durkheim, 2008: pp. 151-152).

Segundo o texto publicado no The New York Times (2016), “Para vencer
uma eleição é preciso dialogar com pessoas que pensam diferente de você”.

Foi o que aconteceu nas campanhas eleitorais de Hilary Clinton nos Estados

Unidos e Marcelo Freixo no Brasil. Como e porque eles perderam as eleições?

Será que foi por Hilary não ter incluído em sua campanha a classe trabalhadora

branca e aqueles com fortes opinião religiosa?

Do mesmo modo, a campanha de Marcelo Freixo desmereceu o fato

de Crivela ser religioso? Isso nos leva a considerar que o eleitor evangélico não

tenha sido devidamente reconhecido, bem como a força do pentecostalismo e

o neoconservadorismo exercem sobre os fiéis particularmente evangélicos. É

nestas igrejas que eles são valorizados e recebem acolhimento. As igrejas

acabam ocupando os espaços do poder público. Outro ponto é a dificuldade

de diálogo entre os evangélicos e progressistas, e da imagem preconceituosa

que estes fazem dos neopentecostais, achando que eles votam conforme as

determinações de suas igrejas.

A falta de comunicação entre grupos evangélicos e partidos com visões

progressistas vem de outra discordância. Os protagonistas mais visibilizados

do conservadorismo moral religioso nos últimos anos têm sido os evangélicos

pentecostais que entraram, mais do que em qualquer outro momento, na

23
disputa pela moralidade pública para maior controle dos corpos, dos

comportamentos e dos vínculos primários.

No setor econômico, o enquadramento do debate público aponta para

posições que celebram o esforço e o mérito individuais, e opõe-se, por

exemplo, a políticas públicas e sociais de transferência de renda, como o

Programa Bolsa Família dos governos Lula e Dilma. Tal política redistributiva,

assim como outras, é percebida como clientelismo político e forma de

acomodação dos pobres para o trabalho.

Segundo Ronaldo de Almeida (2017), o mérito decorrente do esforço

próprio é valorizado e incentivado religiosamente. Essa é uma característica do

discurso neopentecostal que se dissemina cada vez mais pelo pentecostalismo


clássico, principalmente pela Assembleia de Deus. Não se trata da ética

protestante classicamente analisada por Weber, em que o lucro decorre de

uma conduta econômica metódica e cuja ética confere valor religioso a quem

é bem sucedido no trabalho secular; e muito menos de uma ética da

providência, como no pentecostalismo clássico das camadas mais populares,

segundo a qual deus provê aqueles que permanecem fiéis a ele nos

momentos de necessidades materiais, as quais nunca deixam de surgir.

A Teologia da Prosperidade neopentecostal, por sua vez, prega uma

ética econômica voltada para o mundo, onde possuir e ascender são sinais de

que Deus, e não o diabo, age em sua vida. Essa ascensão não se ancora

especificamente na disciplina e na dedicação ao trabalho, mas em uma

disposição empreendedora de quem almeja tornar-se o patrão nas relações de

trabalho. Tal disposição de empreender é alimentada por ritos sacrificiais -

como dar o dízimo - que geram expectativas de prosperidade material no

futuro. Os riscos materiais do empreendimento são considerados atos de fé.

(ALMEIDA, 2017)

O texto “quem tem medo da bancada evangélica", escrito por

PRANTINI e SANTOS, vai falar muito sobre uma suposta influência crescente

24
das religiões na política brasileira contemporânea. O principal elemento dessa

empreitada tem nome: a bancada evangélica. Trata-se de um grupo

suprapartidário, composto por congressistas ligados a diferentes igrejas

evangélicas, tanto do ramo histórico ou de missão como do pentecostal e

neopentecostal, que atuariam em conjunto para aprovar ou rejeitar a legislação

de interesse religioso e pautar diversas discussões no parlamento brasileiro.

PRANTI e SANTOS, 2017)

Esse crescimento avança em espaços institucionais, no legislativo e no

executivo, mas em menor incidência no judiciário. Eles têm demostrado forte

capacidade de indução do voto, mais do que qualquer outra religião no país.

O voto evangélico foi decisivo nas eleições presidenciais de 2018. Cerca de 21


milhões de evangélicos votaram no candidato Bolsonaro e cerca de 10 milhões

votaram no candidato do PT Haddad. Isso equivale segundo os dados

estatísticos aproximadamente 20% dos brasileiros que se declaram como

evangélicos. Mesmo sendo menos de um terço do eleitorado, os líderes

evangélicos são muito atuantes na política isso é resultado de anos de ativismo

religioso na sociedade.

Se voto é confiança, a obrigação religiosa entre candidato e eleitor se

afirma. Isso não significa que eles só votem nos “irmãos de fé”, mas o vínculo

é expressivo tanto na eleição proporcional como na majoritária (Machado,

2006; Mariano, 2016). Assim, a via eleitoral permitiu acesso às elites políticas

de religiosos com menos capitais econômico, cultural e social do que o

necessário para a mobilidade no Poder Judiciário, cujo perfil é

predominantemente elitizado, tradicional e católico.

A bancada evangélica se notabilizou com a eleição da Assembleia

Constituinte, no final de 1986, já com uma característica bem marcada e que

permanece até hoje: não é política nem ideologicamente homogênea, mas é,

de forma geral, conservadora. Esse ativismo conservador evangélico traz para

a luta política demandas moralistas que são reivindicações reais dos setores

25
populares, não habituados a separar as esferas da política e da moralidade

privada (Pierucci, 1996a, pp. 165-166). Pouco afeitos à vida político-partidária

do país durante décadas, os evangélicos entraram abertamente na disputa

eleitoral temerosos de que a Constituição devolvesse à Igreja católica antigos

e exclusivos privilégios. Temiam também que a nova carta incluísse a defesa

dos homossexuais, dos comunistas, das feministas, da liberalização do aborto,

do uso de drogas e de outros temas contrários à moral pregada por suas

igrejas (Idem, p. 175; Prandi e Santos, 2015, p. 372).

De lá para cá, essa participação só fez crescer, ainda que algumas

igrejas tenham permanecido alheias à política partidária, enquanto outras não

somente se fizeram presentes em diferentes partidos como fundaram partidos


próprios. Fim de uma era, na qual era lugar-comum dizer que crente não se

metia em política – seja como crítica, feita pelos católicos, seja como

autodefinição dos próprios evangélicos, pelo menos de boa parte deles

(PIERUCCI, 1996a, p. 163)

Segundo o capítulo dedicado à ‘esquerda e os evangélicos’ do livro

Religião e Política - Povo de Deus, escrito por Juliano Spyer, percebe-se que o

uso da fé com finalidade eleitoral se dá a partir do argumento de que a igreja

e o plano evangelizador de Deus correm perigo. Ricardo Mariano, sociólogo

da USP, citado por Spyer, explica que o “o argumento de que “a liberdade

religiosa está em xeque” é um trunfo decisivo para defender candidaturas

evangélicas nos próprios cultos”. Mariano aponta o momento em que a

presença de evangélicos no Congresso mudou para a postura atual. Segundo

indica, nas eleições gerais de 1986, as primeiras após a redemocratização,

correu um boato durante os trabalhos da Constituinte de que a Igreja Católica

estaria exercendo sua influência para ter uma posição privilegiada na redação

da nova Constituição, o que colocaria em risco a liberdade religiosa.

De lá para cá, essa participação só fez crescer, ainda que algumas

igrejas tenham permanecido alheias à política partidária, enquanto outras não

26
somente se fizeram presentes em diferentes partidos como fundaram partidos

próprios. Fim de uma era, na qual era lugar-comum dizer que crente não se

metia em política – seja como crítica, feita pelos católicos, seja como

autodefinição dos próprios evangélicos, pelo menos de boa parte deles

(PIERUCCI, 1996a, p. 163)

Segundo o censo de 2010, os cristãos evangélicos representam 20% da

população brasileira, crescendo nesse ritmo estima-se que em 2032 o número

de evangélicos se igualará e superará ao dos católicos. Mudanças assim só

ocorreram em consequência de guerras e revoluções.

Segundo Machado e Burity (2014), nas últimas décadas o país tem se

destacado entre as sociedades latino-americanas pelo aumento de religiosos e


membros de comunidades pentecostais na cena política, revelando grande

capacidade de mobilização popular, elegendo não só eleger representantes

Casas Legislativas municipais e estaduais, como também para o Congresso

Nacional.

Em artigo que busca conhecer a visão de atores religiosos que formam

opinião pública no meio pentecostal, Machado e Burity realizaram entrevistas

com 58 lideranças que desenvolviam atividades nas cidades de Salvador, São

Paulo, Belo Horizonte, Brasília, Campinas e Rio de Janeiro, onde a grande

maioria tinha cargo eclesiástico – pastores(as), missionários(as), bispos,

presbíteros.

Ainda segundo a perspectiva dos autores (2014), para os pentecostais,

a participação no Poder Legislativo é interpretada a partir de dois


vetores principais: a) como forma de sobrevivência em uma ordem
social em que as relações entre o Estado e os grupos religiosos
sempre foram muito assimétricas e onde a agenda política dos
movimentos feministas e pela diversidade sexual vem se impondo e
orientando as políticas públicas no campo da educação, da saúde e
das relações familiares; b) como forma de construção (minoritária) de
uma agência coletiva com pretensões de reconhecimento e
influência. Nesse segundo registro, autoconfiança e uma certa
maneira de pensar estrategicamente o alcance desses objetivos se
combinam ou respondem ao sentimento de insegurança que o

27
discurso da sobrevivência expressa. (MACHADO E BURITY, p. 602,
2014)

Segundo os autores, o restabelecimento da ordem democrática foi

importante para a criação de novas formas de participação popular e de

gestão da coisa pública. Segundo o Censo Demográfico do IBGE de 2010,”a

representação dos católicos na população brasileira declinou de 83,3%, em

1991, para 73,8%, em 2000, e 64,6%, em 2010, a dos evangélicos, nos

mesmos períodos, evoluiu de 9% para 15,6% e 22,2%” (MACHADO E BURITY,

p. 603, 2014)

O crescente aumento do pentecostais no Brasil está ligada à cultura e

política partidária brasileira, como por exemplo, elas citam “a capacidade de


selecionar e incorporar elementos da agenda política de movimentos sociais; e

os investimentos crescentes nos meios de comunicação eletrônicos”

(MACHADO e BURITY, p. 603, 2014) Além da ampliação da presença de

líderes religiosos no Legislativo; e o interesse tanto pelas concessões de canais

de televisão e de rádio.

Para estes estudiosos, as igrejas neopentecostais surgiram a partir da

década de 70, através da estratégia de enfatizarem a prática do exorcismo, a

capacidade de cura e a resolução de problemas econômicos e familiares em

seus programas televisivos. Ganharam visibilidade por contrariarem temas

importantes como a confrontação com os setores mais “avançados” dos

movimentos sociais – movimento feminista, negro, ambientalista e LGBT

(Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), ou seja, traz

um conteúdo conservador, de forma fluente no assunto.

Sobre os entrevistados, são profundamente imbuídos de uma

identidade religiosa, despidos de referências biográficas, possuem uma visão

liberal. Além disso,

Eles utilizam um léxico “secular”: eleições, políticas públicas, justiça


social, direitos humanos, família, política internacional, relação

28
religião-Estado etc. Com elevado grau de instrução, os entrevistados
adotam argumentos “acadêmicos”, ao saberem que se trata de uma
situação de entrevista e que, dependendo das perguntas, se espera
que demonstrem conhecimento da (sua) realidade, estilo analítico e
reflexividade. (MACHADO E BURITY, p. 608, 2014)

Além disso, uma característica importante dos pentecostais é a

dimensão carismática, militância social, o compromisso com os setores

subalternos, principalmente no atendimento a necessidades materiais dos

pobres. No entanto, verifica-se a predominância de concepções e práticas

conservadoras de democracia. Além “uma cultura na qual as diatribes

doutrinárias e a postura conversionista predominam” (MACHADO E BURITY, p.

612, 2014)
Contudo, eles conseguem articular um discurso laico sobre a

responsabilidade do Brasil, a defesa dos direitos humanos e democracia. A

política entra como uma estratégia de sobrevivência.

Segundo os autores,

Percebe-se uma complexa e contraditória articulação das concepções


pentecostais da política com o contexto mais amplo do liberalismo,
apresentando a política como um recurso institucional e cultural em
geral, mas não se pode ignorar o impacto dos recentes avanços da
política de esquerda no discurso de várias lideranças. (MACHADO
e BURITY, p. 623, 2014)

Pode-se identificar no texto uma possível relação entre Religião e

Política, pois “a política não se joga apenas na esfera da representação de

interesses, mas também na construção de uma direção intelectual e política da

sociedade em termos culturais” (MACHADO e BURITY, p. 614, 2014) Contudo,

enfatiza-se a necessidade da separação entre religião e política, pois não

existe somente uma religião no Brasil, mas várias outras expressões religiosas.

É necessário dizer que a política pentecostal não tem o objetivo de

conquistar o Estado, mas de alcançar espaços estando relacionado a ele. É

uma estratégia de sobrevivência.

29
Identifica-se uma decisão contraditória do Estado, que diz que não a

atuação recente dos atores políticos deste segmento religioso, mas veta a

participação dos grupos religiosos nestes espaços de poder por entender que

o Estado é laico.

30
3- Re exões em torno da religião e da esfera pública

Neste terceiro capítulo elaboramos um estudo com base no acervo de

ideias propagadas pelo curso “Atravessamentos Religiosos no Campo das

políticas públicas”, realizado no ano de 2021 pela Escola de Serviço Social

(ESS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sob a coordenação da

professora Elaine Moreira do Departamento de Método e Técnicas do Serviço

Social. Para realização do curso, foram convidados alguns docentes para

ministração de temas relativos aos seus interesses de pesquisa e/ou de

atividade profissional.

Entre muitos conteúdos considerados bastante pertinentes para o


debate sobre religiao, para nossa análise selecionados os seguintes temas:

Secularização da Cultura e Tolerância Religiosa no Século XVIII; Religião,

Cultura e Politica,; O que é o Estado Laico?; Vocação religiosa e engajamento

profissional; Os atravessamentos religiosos no campo da saúde mental;

Familia, Patriarcado, Religião e Democracia.

As referencias que introduzem os autores escolhidos foram feitas a partir

de seus textos auto referidos na base de consulta pública do Lattes, CNPq, no

mês de janeiro de 2022.

a. Secularização da Cultura e Tolerância Religiosa no Século XVIII -


contribuições do Prof Marildo Menegat

Marildo Menegat possui graduação em Filosofia (UFRJ - 1992),

mestrado em Filosofia (UFRJ - 1995); doutorado em Filosofia (UFRJ - 2001) e

pós-doutorado em Filosofia (USP- 2010). Atualmente é Professor Associado,

lotado no Núcleo de Estudos de Políticas Públicas em Direitos Humanos da

Universidade Federal do Rio de Janeiro (NEPP-DH). Tem experiência na área

de Filosofia Social e Política e Teoria Crítica, atuando principalmente nos

31
fl
seguintes temas: critica da economia política da barbárie, militarização do

cotidiano e crítica da cultura.

Sua contribuição como docente no Curso versou em torno do tema da

Modernidade, Política e Religião, onde discutiu as controvérsias em torno da

oposição entre o pensamento religioso e secular. Visões da ciência e da

religião sobre a política. Diversidade e repertório das manifestações do campo

religioso na vida política.

Segundo sua visão, no geral considera-se que a intolerância religiosa é

uma ideia que tem origem das intolerâncias e posições de cada um. Mas,

segundo a reflexão de Menegat, ela tem uma base bem objetiva e tem três
momentos: a origem, o holocausto no século XX e o tempo histórico.

Em várias tradições culturais, sociais e religiosas o tempo não é humano,

ele é derivado de uma criação divina. Para os cristãos, por exemplo, o tempo

do mundo é criado por Deus. Dessa forma, secularizar o tempo é romper com

essas visões temporais místicas e religiosas. Na modernidade há uma

separação entre a ideia do tempo e o sagrado. Isso traz uma grande ruptura

nas estruturas da cultura e no modo em que concebemos o mundo e o ser

humano. Quando se define o tempo e o espaço, define-se também a

existência humana e a natureza. A secularização, ao pretender desviar os olhos

humanos do céu e direcioná-los à terra, vai fazer com que o homem se

compreenda como ser mundano e se aceite como parte desse mundo, como

parte da sua evolução e do seu desenvolvimento.

A ciência foi muito importante para esse processo do recolocar o

humano. Segundo Copérnico e Galileu, a terra não é plana, ela é redonda e

está em movimento. O universo é vasto e o ser humano não está a sós.

Reposicionar o ser humano para uma compreensão descentrada de que não

está a sós no universo é o colocar no mundo onde a solidão ganha novas

32
dimensões. A elaboração dessa nova solidão vai custar compreender que na

ausência temos uma nova companhia mesmo que não a vejamos. Todas essas

transformações não ocorrem de repente. Toda e qualquer transformação na

cultura é também uma transformação na sociedade e acontece com o tempo.

Essas transformações fazem parte da origem do capitalismo, ele não nasce de

uma forma natural e sim através de rupturas violentas e é uma dessas rupturas

que vai dar origem a constituição de uma série de leis que vai gerir a nossa

vida em comunidade. Uma dessas leis inconscientes é trazer o tempo

mundano como medida do período de trabalho necessário, ou seja, o tempo

de trabalho socialmente aceito não é determinado por nós, ele é determinado

de acordo com o ritmo de produção capitalista. Hoje se vive uma época em


que já não é mais a ascensão do capitalismo que produz a intolerância. A

intolerância do nosso tempo é de uma outra ordem. Os atores em curso são

bem diferentes, mas eles de novo têm uma fé que os cega. Pensar a

intolerância religiosa é pensar no mundo que a produz.

Entende-se que a religião retrata aspectos centrais da cultura de um

povo e incide na vida política, podendo ser usada como poderoso instrumento

do governos. A religião pode influenciar na permanência do Status Quo de

uma sociedade, como uma família deve ser formada (homem, mulher e filhos),

pode influenciar na permanência da sociedade patriarcal, nas funções que um

homem e uma mulher deve exercer.

b. Religião, Cultura e Politica, contribuições da Profa Maria das Dores


Campos Machado

Maria das Dores Campos Machado possui graduação em Ciências

Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980), mestrado em

Sociologia pela Sociedade Brasileira de Instrução - SBI/IUPERJ (1989) e

doutorado em Sociologia pela Sociedade Brasileira de Instrução - SBI/IUPERJ

33
(1994). Realizou Pós-doutorado na PUC/SP entre 08/2011 e 07/2012, bem

como no Instituto de Desarrollo Económico y Social de Buenos Aires em 2005.

Tornou-se Professora Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro em

2017, aposentou-se em 2018 e atualmente é professora voluntária do

Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFRJ. Sua tese de

doutorado teve como título “ADESAO RELIGIOSA E SEUS EFEITOS NA

ESFERA PRIVADA: UM ESTUDO COMPARATIVO DOS CARISMATICOS E

PENTECOSTAIS”, tal estudo inaugurou uma trajetória de pesquisa associada

ao tema da religião e política.

Segundo a pesquisadora em uma reflexão publicada em 2012, o debate


sobre a presença da religião na esfera pública foi marcado pela polêmica do

Acordo Bilateral assinado em 2008 entre a Santa Sé e a República Federativa

Brasileira. As consequências da participação dos evangélicos no Poder

Legislativo para a política de ampliação dos direitos humanos e os desafios de

interpretar as relações do religioso com a política e a ordem social fazem parte

do seu acervo de estudos e pesquisa. Uma análise feita na atuação dos

coletivos evangélicos na arena pública brasileira nos dez primeiros anos deste

século revela que a atuação foi marcada por embates não só no campo das

religiões, mas também em importantes movimentos sociais, como o

movimento feminista e a comunidade LGBTQI+.

A grande resistência às mudanças nas questões relacionadas ao aborto

e à homossexualidade também é confirmada, com os estudos indicando um

“ativismo conservador” na sociedade civil e uma forte reação dos

parlamentares cristãos no Congresso Nacional às demandas dos movimentos

feministas e LGBTQIA+. A maioria dos evangélicos atua na Frente Parlamentar

Evangélica e na Frente em Defesa da Vida e tenta barrar qualquer iniciativa

dos movimentos sociais que possibilite o desenvolvimento de uma moral

sexual laica ou descolada da moral cristã.

34
MACHADO (2012) também fala da hierarquia da Igreja Católica no Brasil

e como ela se posicionou na esfera pública a partir de uma série de novas

formas de atuação na sociedade civil e na política partidária. Aponta a

diminuição dos católicos e o crescimento dos evangélicos pentecostais,

refletindo no aumento de uma tendencia de conservadorismo moral.

Constatou também a ampliação do uso dos laços de parentesco com

lideranças religiosas no recrutamento dos eleitores. Entre os diferentes casos,

citamos aqui o da deputada estadual Clarissa Garotinho, filha do ex-

governador, e do deputado federal Filipe Dias Pereira, que é filho do vice-

presidente do Partido Social Cristão (PSC).

MACHADO (2012) considera as experiências de secularização como

processos em aberto de autonomização das esferas sociais, políticas e

culturais, cujo desenvolvimento depende das relações entre as instituições e os

atores individuais e coletivos existentes em cada configuração nacional. Nesse

sentido, procura demostrar que, enquanto na maior parte da história do século

XX, a Igreja Católica teve um papel importante na mediação entre Estado e

sociedade civil, verifica-se hoje uma acirrada disputa entre os programas

culturais de vários atores políticos, mas em especial entre os grupos religiosos

(católicos e evangélicos) e os movimentos de identidade (feminista e

LGBTQIA+).

A pesquisadora aponta que os embates entre católicos e evangélicos

expressam o descontentamento com o tratamento preferencial concedido pelo

Estado à instituição católica. Embora os católicos sejam hegemônicos na

Câmara Federal, o número de sacerdotes que passaram pelo Congresso

Nacional nas últimas décadas foi muito reduzido. Além disso, os políticos

católicos, de modo geral, não apresentam um comportamento tão alinhado

com a Igreja como o dos evangélicos em relação às suas denominações.

35
Seguindo MACHADO, o universo evangélico tem um caráter

fragmentário, o que acaba por pluralizar as instituições religiosas e por gerar

muita competição em torno dos fiéis e dos espaços sociais que facilitam a

socialização religiosa. Essa especificidade tem favorecido não só a expansão

do número de templos, pastores e fiéis, como também o lançamento de um

grande número de candidaturas de religiosos e leigos das mais diferentes

estruturas eclesiásticas.

A despeito das divergências doutrinárias, a maioria dos pentecostais

apresenta posições mais liberais no plano da contracepção que a Igreja

Católica, aceitando o uso de camisinha, pílulas anticoncepcionais e cirurgias


femininas e masculinas para controlar a fertilidade. Por outro lado, a

valorização crescente da participação dos atores religiosos nas disputas

eleitorais, na política partidária e no legislativo, assim como uso cada vez mais

frequente por parte das estruturas eclesiásticas e seus integrantes dos

instrumentos jurídicos sugerem que os mesmos reconhecem a centralidade do

Estado e da esfera jurídica na vida social.

Na reflexão apresentada no curso, MACHADO indica que o

neoconservadorismo vai trazer à tona a judicialização da moral, através das

alianças de distintos atores religiosos, principalmente pela bancada evangélica,

ou seja, usa-se da lógica jurídica para veicular oficialmente valores.

A pesquisadora também indica que a hegemonia cultural é um conceito

formulado por Antônio Gramsci para descrever o tipo de dominação

ideológica de uma classe social sobre outra, particularmente da burguesia

sobre o proletariado. É um conjunto de ideias dominantes de uma

determinada conjuntura social, política, cultural e econômica.

36
c. O que é o Estado Laico? - contribuições do prof. Luís Antônio Cunha

Luis Antonio Cunha é formado em Sociologia em 1967, pela Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro, PUC-Rio. Dedicou-se ao ensino

superior e à pesquisa sobre políticas educacionais, desde 1969, com foco na

universidade, no ensino profissional, nas relações entre o público e o privado.

Recentemente, sua atenção recai sobre os avanços e recuos da laicidade do

Estado, especialmente no que diz respeito à educação pública.

A partir da pergunta que dá origem à aula sobre laicidade, “O que é o

Estado laico?”, viemos apresentar considerações sobre a contribuição de

Cunha sobre a relação da religião com as políticas públicas. O pesquisador


indica que o surgimento do Estado Laico se dá com a Revolução Francesa e

que a França é a mãe do laicisismo.

Um Estado laico se constitui a partir da separação entre si e a religião.

Ou seja, o Estado não permite a interferência de correntes religiosas em

assuntos estatais, nem privilegiaria uma ou algumas religiões sobre as demais.

Numa ótica liberal, respeita todas as crenças religiosas desde que não

aconteça em cena pública. Segundo o professor Luís Antônio Cunha, o Estado

Laico dispensa a religião para estabelecer a coesão social e tem a finalidade

de garantir a liberdade de consciência e a igualdade e não discriminação dos

indivíduos.

Contrário ao Estado Laico, nós temos o Estado confessional, que é

aquele que adota oficialmente uma ou mais religiões. Existe influência religiosa

nas decisões do Estado. Um exemplo de Estado confessional atualmente no

próprio Brasil, onde o atual presidente Jair Messias Bolsonaro, esbanja em

seus discursos o pronunciamento que o Brasil está acima de tudo e Deus

acima de todos.

37
Assim, podemos analisar que quando o presidente profere esta frase,

ele sugere que o governo sofre interferência da sua religião sobre o governo,

em uma sociedade, como é o caso do Brasil, onde se presencia diversas outras

religiões e crenças. De que Brasil estamos falando? E os que não aceitam o

Deus Cristão como único e verdadeiro?

A liberdade de crença ou da ausência de crença de quem não se vê

representada por qualquer símbolo religioso deve ser respeitada, e se

fundamenta nas normas e princípios do Código de Ética do/a Assistente

Social, que adota como seus valores fundantes a liberdade e a justiça social,

articulados a partir da exigência democrática, tomada como valor ético central.

A defesa do Estado laico deve sempre estar relacionado aos princípios

defendidos pelo Projeto ético-político do Serviço Social brasileiro,

principalmente, a liberdade, a equidade e a democracia. Deve-se lutar não

pela religiosidade e sim lutar pela eliminação da alienação religiosa.

Embora o Brasil diz ser um país oficialmente laico, vemos dogmas

relativos às denominações religiosas interferindo nas políticas, além disso

vemos também o uso de crucifixos em repartições públicas. A presença de

referências religiosas em instituições estatais e o crescimento de deputados e

senadores evangélicos são evidências importantes desta sobreposição de

esferas, trazendo conflitos do que é próprio da decisão de foro íntimo e do

que é uma arbitragem sobre a dimensão publica das relações. A bancada

evangélica se opõe a pautas como descriminalização do aborto, leis contra a

discriminação contra homossexuais e transexuais, enquanto defendem projetos

como o Estatuto da Familia que reconhece como único núcleo familiar a união

entre um homem e uma mulher.

38
d. Vocação religiosa e engajamento pro ssional, contribuições do Prof
Pedro Simões

Prof. Pedro Simões possui graduação em Serviço Social pela

Universidade Federal do Rio de Janeiro (1994), mestrado em Serviço Social

pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1997) e doutorado em Sociologia

pelo Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (2004). Professor

Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro com atuação no

Departamento de Sociologia Política da Universidade Federal de Santa

Catarina (UFSC). É líder do grupo de pesquisa "Laboratório de Dados

Sociais" (ESS/UFRJ), além de estar vinculado ao grupo "Consciência da

Doença" do Laboratório de Psiquiatria Geriátrica (IPUB/UFRJ). Tem experiência


na área de Sociologia, atuando principalmente nos seguintes temas: religião,

assistência social, assistência religiosa e sistema socioeducativo, com ênfase

nos Métodos Quantitativos.

A reflexão sobre “Vocação Religiosa e Engajamento Profissional”

apresentada pelo professor e pesquisador Pedro Simões, discute os

atravessamentos religiosos e a atuação profissional dos assistentes sociais.

Sabe-se que o Serviço Social surge no seio da Igreja Católica, através

dos modelos norte-americanos e europeus, com base no neotomismo, onde

considerava-se que o problema não estava na sociedade, mas nos indivíduos.

Além disso, o curso era formado somente por mulheres da elite consideradas

generosas, altruístas, filantropas, caridosas.

Embora o Serviço Social tenha rompido com a perspectiva

conservadora, através do Movimento de Reconceituação, verifica-se que além

do curso até hoje ser formado em grande sua maioria por mulheres, observa-

se a resistência de discurso ainda vinculado ao assistencialismo. Não obstante,

o Serviço Social trabalha na garantia dos direitos da classe trabalhadora

39
fi
através de políticas sociais e reconheça que a sociedade capitalista engendra

profundas desigualdades e é produtora das expressões da questão social.

Prosseguindo, Simoes indica que perfil profissional está na identidade

que o curso tem com os valores religiosos e são considerados entre os alunos

do Serviço Social fortes motivadores para o ingresso na profissão. Constata-se

que os alunos carregam a idéia de fazer o bem, de ajuda ao próximo, da busca

da justiça social, embora os cursos de Serviço Social ofereçam uma formação

politizada e com uma ampla base marxista.

Em interlocução com as reflexões de Simoes, não está se dizendo aqui

que os estudantes de Serviço Social não possam seguir determinadas


religiões, aliás todos possuem valores, mas o que se enfatiza neste argumento

é que dentro do campo profissional as noções e valores da política devem ser

adicionados às crenças religiosas de uma pessoa sem que estas últimas sejam

afetadas. Pois, temos que garantir a plena liberdade dos indivíduos e

propagando uma religião não estaremos dando espaço para que os nossos

usuários escolham as suas religiões.

Assim, faz-se necessário apreender até que ponto a religião ainda

influencia o Serviço Social, ou seja, o processo de formação e exercício

profissional dos assistentes sociais, para melhor justificar a luta pela renovação

da profissão e ruptura com o conservadorismo. Onde na prática ainda

encontra interferências relacionadas às posturas advindas do pensamento

religioso.

Portanto, faz-se necessário a busca incessante pela garantia das

demandas e os interesses das classes populares, tendo como fundamento um

pensamento/posicionamento laico.

40
e. Os atravessamentos religiosos no campo da saúde mental, contribuições
da Prof Tathiana Gomes

Tathiana Meyer da Silva Gomes possui doutorado em Serviço Social

(2014), mestrado em política social (2006) e graduação em Serviço Social

(2003). É professora da Escola de Serviço Social da Universidade Federal

Fluminense (UFF) e pesquisadora dos seguintes grupos/Núcleos de pesquisa:

Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Serviço Social e Saúde (NUEPESS/

UFF), Grupo de Pesquisa Ciências Humanas, Saúde e Sociedade (CCBS/IB/

CSS/UNIRIO), Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Saúde Mental e

Atenção Psicossocial (NEPS/UERJ) e do Grupo de Estudos e Pesquisa em

Ontologia Crítica (Faculdade de Economia/UFF). Desenvolve trabalho de


extensão sobre formação profissional do Serviço Social na saúde mental junto

à Rede de Saúde mental de Niterói. Como assistente social atuou em diversos

campos, com ênfase na saúde e saúde mental. Possui experiência na área de

Serviço Social e estudos com ênfase nos seguintes temas: trabalho, política

social, reforma psiquiátrica, saúde mental e fundamentos do serviço social.

Em sua contribuição no curso, a professora inicialmente informa que o

tema da religião no campo da saúde mental nos leva a discutir também sobre

as comunidades terapêuticas e as demandas decorrentes do uso de

substâncias psicoativas.

Aborda a contrarreforma psiquiátrica, decorrente de um projeto

reacionário na saúde mental que se inicia em 2010. Com ela, observa-se um

avanço conservador produzido pelo avanço da vertente evangélica

neopentecostal e seu projeto da contrarreforma psicoterapêutica materializado

pelas comunidades terapêuticas.

Segundo ela, é um processo que acontece na América Latina, já que

não houve nos processos de modernização das Américas a superação da

41
presença religiosa. Ao contrário, o projeto moderno nesses países se

constituiu, se constitui e avança para as expressões religiosas.

Nos últimos 40 anos não se processou nenhum afastamento da

dimensão religiosa por parte das populações, mas houve uma transformação

da identidade religiosa para o neopentecostialismo. Verifica-se ainda uma

migração dos católicos para esta vertente neopentecostal.

Deve-se analisar também o momento em que vivemos, as

determinações conjunturais, onde se observa o avanço do

neoconservadorismo, de uma ideologia de aniquilação da diferença e do

outro, um terreno fértil para o avanço e fortalecimento de ideias religiosas


fundamentalistas ou de um senso comum em detrimento da razão e da

ciência. Esse avanço vai impregnar as políticas públicas, onde se encontram as

comunidades terapêuticas.

Evidenciou-se em pesquisas acadêmicas que as pessoas da área da

saúde não sabem o que são comunidades terapêuticas. Neste sentido,

Tathiana define as comunidades terapêuticas como fenômeno de perfil

heterogêneo, plural e que envolve um processo complexo.

A disseminação das comunidades terapêuticas ocorreu de diversas

formas em diferentes países, à sua origem. Sua origem clássica remonta à

década de 1950, na Inglaterra, em um momento de plena consolidação do

Estado de Bem Estar Social. Naquele contexto, o objetivo da comunidade

terapêutica inglesa era a humanização do espaço do manicômio, a

humanização do tratamento, entre a relação dos profissionais, dos pacientes e

familiares. Não se faz uma crítica as práticas de violência e do próprio hospital

psiquiátrico.

Neste mesmo período, dos anos 1950, nos Estados Unidos, onde o

Welfare State está ligado à meritocracia e assume um viés focalista, emerge

42
um outro modelo de comunidade terapêutica, centrado no tratamento, com

base numa perspectiva de reforma moral e individualista e com grande

influência religiosa. Essa vertente de comunidade terapêutica que vai

influenciar as experiências brasileiras.

No Brasil, as comunidades terapêuticas vão surgir nos anos 1960, no

período de ditadura militar. Surge em Goiânia pela iniciativa e influência de um

pastor seguindo o exemplo de um grupo de Oxford. Três anos depois é

fundada a segunda comunidade terapêutica, em São Gonçalo, Rio de Janeiro,

desenvolvendo um trabalho de base comunitária. Observa-se, com isso, que

não existe um modelo de comunidade terapêutica, elas são um fenômeno


heterogêneo.

As comunidades terapêuticas confessionais no Brasil, a partir dos anos

1980 e 1990, seguiram o modelo norte americano, baseado nessa lógica da

reforma moral e individual como pilar do tratamento destinado às pessoas que

usam substâncias psicoativas.

Gomes considera que tivemos a influência norte americana, mas no

processo de constituição das comunidade terapêuticas brasileiras há

elementos culturais próprios da nossa formação social, entre os atores

religiosos e as políticas públicas. Vemos o uso da religião como mecanismo de

apoio social.

Sobre a natureza constitutiva das comunidades terapêuticas, a partir dos

documentos do IPEA, é possível apontar para uma predominância religiosa,

para uma metodologia de trabalho a partir de trabalho forçado, religião e

disciplina, centrada no isolamento, indicando para nós práticas de violação de

direitos humanos.

Essas instituições efetivam o isolamento e a prática da abstinência como

método, estabelecendo práticas como penitência, castigos físicos, violação de

43
orientação sexual e religiosa dos indivíduos, proibição do contato com o

ambiente externo, ou seja, com a família. Há ausência de equipe de saúde,

uso de medicações sem receita médica e a desarticulação com a rede de

saúde mental principalmente.

Neste sentido, essas práticas contradizem a determinação da lei 10.216,

lei da reforma psiquiátrica que vai dizer que a internação compulsória apenas

quando expedida para o juiz.

Esses grupos religiosos vem disputando o fundo público não apenas da

saúde, mas também no conjunto das políticas sociais. Observa-se também

uma tendencia de desfinanciamento da rede de atenção psicossocial.

f. Familia, Patriarcado, Religião e Democracia, contribuições da prof


Andrea Moraes

Andrea Moraes possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade

do Estado do Rio de Janeiro (1991), mestrado em Sociologia pelo Instituto

Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (1994) e doutorado em

Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2002).

Atualmente é professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Antropologia

Urbana, atuando principalmente nos seguintes temas: gênero, velhice,

sexualidade, gerações e antropologia.

Sua contribuição ao curso se situa nos temas Família, Patriarcado,

Religião e Democracia e sua articulação no campo das políticas públicas. Ela

inicia informando que a família entra como um foco de preocupação da

agenda política entre o século XVIII e XIX na sociedade Europeia, sendo esse

período histórico o berço histórico de preocupação e da definição do tema da

família.

44
Nesse contexto histórico vemos também a emergência da sociedade

burguesa e do patriarcado moderno. O que imperava anteriormente era a

ordem aristocrática. Então veremos a mudança dessa base social aristocrática

para um momento histórico onde se tem a emergência da sociedade

burguesa.

Vamos ver neste contexto a questão da família, do tema “família”

marcada por duas questões. A família aparece primeiro identificada como um

espaço de socialização primária, o local onde indivíduos são formados nesta

sociedade burguesa. Mas o espaço prioritário de formação de valores era a

instituição religiosa. Então vamos ver um deslocamento entre a função da


igreja (tradição cristã católica europeu) e a emergência da família, baseada nos

laços de conjugalidade e reprodução.

Ou seja, neste contexto, a família é uma instituição que vai desenvolver

um certo espaço de independência em relação à religião, mas não chega a

romper este vínculo. Além disso vamos ver a emergência da escola, como um

terceiro espaço de socialização primária.

Segundo Durkheim, haverá uma dificuldade da família em formar

indivíduos no século XIX, época da industrialização, onde os valores e as

relações entre os indivíduos seriam fonte de tensão. Faltaria nessas sociedades

que se modernizam um espaço institucional que servisse de “amortecedor”

das tensões sociais, dos conflitos sociais.

Do século XVIII ao século XIX, vemos a instância família começa a

desenvolver uma característica própria de socialização primária, onde o que

une os indivíduos dentro dessa instituição são os laços de autoridade, de

hereditariedade e afinidade.

Outra questão relevante deste contexto histórico, sobretudo no século

XIX, é o problema da gestão das famílias da classe trabalhadora. A família da

45
classe trabalhadora vai ocupar um lugar que é para além da socialização

primária o lugar de recomposição e reprodução social da força de trabalho. É

neste sentido que ações filantrópicas, no campo da caridade, serão

mobilizadas como uma maneira de fazer esta gestão destas famílias, da gestão

da pobreza. Neste sentido vemos a participação muito forte da igreja.

Neste período há a emergência do Estado que vai se ocupando da

gestão, de forma tímida, dos conflitos sociais e da família. Assim vemos que

família está cercada de outras instituições.

Observa-se então formas de relação entre Estado e família. A primeira

forma dessa relação é o paradigma liberal clássico, ligado à liberdade, onde


tem-se a demarcação da esfera privada e a esfera pública, o âmbito do

indivíduo e o âmbito da coletividade, alimento o discurso da liberdade

“negativa”. O termo “negativa” se refere à linha de demarcação entre o

âmbito privado e público, onde se protege o privado da interferência do que é

externo a ele, servindo ao propósito de reconhecer e alimentar a privacidade

dos indivíduos no seio familiar.

Vê-se um modelo burguês clássico de família que composta pelo

homem, a mulher e os filhos. Essa casa, essa família, deve ser protegida de

outras instituições e agentes externos, sendo este o papel do Estado.

A segunda forma da relação entre Estado e família é o paradigma da

família como unidade de consumo e de reprodução social. O papel do Estado

no século XIX, se coloca como um agente que não tem um papel

determinante na reprodução social, delegando as famílias, sobretudo as

mulheres, o papel daquele que distribui e organiza os recursos

disponibilizados pelo trabalho. Aqui vemos a divisão sexual do trabalho, onde

o marido traz o dinheiro a mulher na sua função de esposa e mãe administra

esse dinheiro.

46
Essa família vai movimentar o processo de acumulação capitalista,

sendo a família o lugar onde o trabalhador ou trabalhadora repõe sua

subsistência e se reproduz e gera pessoas que serão futuros trabalhadores.

A terceira forma de relação entre o Estado e família é o paradigma das

famílias como arenas de subjetivação moderna. A família será alvo da

repressão estatal sobre o seu modo de vida, sendo a família a esfera é útil a

reprodução do capitalismo. O Estado vai assumir uma função policialesca, no

sentido de controlar a família mais pobre, de punir os desvios observados nos

modos de vidas da classe trabalhadora. O Estado assume uma função

civilizatória sobre as famílias da classe trabalhadora, pois para o Estado é onde


os distúrbios acontecem, onde as violências acontecem, por viverem na

pobreza. Famílias que serão reprimidas e tuteladas e ensinadas a se civilizarem

a partir de modelos de comportamento daquela família que é considerada

como modelo ideal, que é a família da classe burguesa, baseado na

heterossexualidade (onde a igreja aparece), na monogamia.

No século XXI, tornamo-nos herdeiros destas três formas de relação

entre o Estado e família citado anteriormente. O Brasil acompanhou este

mesmo desenho de modelos que a Europa criou. E quando chegamos no

século XXI vemos o retorno do paradigma liberal clássico em um contexto de

neoliberalismo do século vigente.

Verificamos a divisão sexual do trabalho devem ser incentivadas no seio

das famílias, e que essa família dividida entre homem e mulher é o modelo

responsável pela reprodução e que a reprodução é uma função social e

principal da família.

Então, essas formas de pensar estão renascendo no contexto

contemporâneo. O Estado deixa de investir nas políticas públicas e

responsabiliza a família pela garantia dos direitos. Além disso vemos o Estado

47
reprimindo e vigia, usando essa noção de liberdade negativa para não

interferir no papel do Estado. Se tornando apenas um guardião dos espaços

de liberdade das famílias.

Assim a democracia se torna a preservação da liberdade negativa. Uma

vida democrática neste sentido seria a preservação do valor da privacidade e

da individualidade.

A religião vai preparar a família para a vida pública usando referências

religiosas, como o homem no espaço público e a mulher no âmbito privado,

ou seja do lar, da mulher ser meiga e o homem ser uma pessoa mais bruta,

mais valente e que não pode demonstrar sentimentos. A família e a fé


reforçam as normas do que é certo e errado.

Todas estas contribuições apontam para a importância deste debate na

reflexão sobre a incidência da religião na politica e, nesta medida, na atividade

profissional do Assistente Social que, por sua vez, independentemente do

espaço sócio ocupacional que o abrigue, é essencialmente politica.

48
Considerações nais

Esta monografia se propôs a estudar as denominações religiosas de

matriz neopentecostal e suas incidências na esfera pública. A religião ocupa os

espaços políticos, assumindo papéis que antes não eram tão explícitos. O uso

das referências fé e Deus na linguagem do cotidiano da política, como forma

de conjugar interesses e dessa forma mobilizar votos em eleições se tornou

uma prática recorrente.

Do ponto de vista de sua Carta Constitucional, o Brasil é um Estado

laico, ou seja, promove oficialmente a separação entre o Estado e a Religião.

Considera-se, então, que a partir da ideia de laicidade, o Estado não deveria


permitir que ocorresse interferência de correntes religiosas em assuntos

estatais, nem privilegiaria uma ou algumas religiões sobre as demais. Segundo

a Constituição Federal em vigor, todos os seus cidadãos são igualmente

tratados, independentemente de sua escolha religiosa, ainda que a liberdade

de crença religiosa e o respeito às manifestações religiosas seja um direito de

todos os cidadãos.

Nosso estudo retrata as religiões e a religiosidade, sendo a religião

parte do pressuposto de juntar o homem ao sagrado, ou seja, ter um encontro

com Deus e ser uma pessoa melhor. A ideia de Deus está associada ao

sagrado no sentido radical da vida na mudança do seu interior em função dos

nossos melhores valores.

Abordamos a política na religião e indicamos o quanto a bancada

religiosa vem crescendo ao longos dos anos. Esse tipo de representação

política vem trazendo segmentos com viés mais conservador. Analisamos que

existem diversos fatores de ordem estrutural e contextual que fazem com que

ocorra essa inserção dos evangélicos na esfera política brasileira.

Buscamos também trazer uma reflexão em torno da religião na esfera

pública, onde separamos temas específicos como: Secularização da Cultura e

49
fi
Tolerância Religiosa no Século XVIII; Religião, Cultura e Politica; O que é o

Estado Laico? Vocação religiosa e engajamento profissional; Os

atravessamentos religiosos no campo da saúde mental; Familia, Patriarcado,

Religião e Democracia.

O desenvolvimento dessa monografia não abordou especificidades da

profissão, mas tratou de uma contribuição para o debate teórico da própria

realidade na qual a profissão está inserida.

Não apenas pela sua origem, mas pela história da profissão fortemente

associada a um viés religioso, trazer o debate da religião para a formação

crítica do profissional é não apenas necessário, como imperativo. O curso

oferecido pela ESS que foi matéria de reflexão neste estudo é uma iniciativa
de grande importância para tornar o tema público e, portanto, matéria de

discussão. Esta monografia pretende ser uma contribuição a esse debate na

direção desta formação crítica.

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