Jesuitas Grao Azevedo
Jesuitas Grao Azevedo
Jesuitas Grao Azevedo
S JES·UITAS NO GRÃO-PARA
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OS .JJ!S.UITAS
GRÃO-PARÁ
SUAS MJSSÕES E A COLONIZAÇ~Ã.0
BOSQUEJO BISTORICO
COM V:l\:RiàS'
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LISBOA
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'l'AVARES CARDOSO· 8i lHM1\0
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s. p~rg? d~ camõl'l~i. 6
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AO LEITOR PARAENSE
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~;~. da ' historia. Quando o poder mahometano,
creando assento em Cons.tantinopla, parecia ter vibrado o der-
radeiro golpe á civilização christã; quando o islamismo pene-
trava na Europa, pelo Bosphoró, como seculos antes fizera
pelo estreito de Gades; a mais pequena das nações occiden-
taes _lançava-se através do oceano, indo arrebatar áquelle o
mais ~opioso manancial da sua grandeza. Por esse facto o
opulento commercio do levante achou-se transfc:_rido a outras
mãos; de Veneza o valioso trafico das especiarias passou ás
margens do Tejo; e o troar das bombardas portuguezas no
mar das Indias annunciou a ruina do novo imperio, que to-
mara para capital a destroçada Bysancio.
-Todavia, por importante que tenh3: sido "para a civilização
esse facto, mais o foi ainda a descoberta da America, que
inopinadamente abrira as portas de um mundo novo á cubi-
çosa actividade das nações :européas. Realizado por u~ geno-
vez ao serviço de Espanha, este commettimento deve-se tam-
bem, posto que ·por indirectos canaes, aos portuguezes. - No
alto do promontorio de Sagres, os olhos fixos na vastidão do
Mar Tenebroso, o Infante Dom Henrique -o Navegaáor-
tinha como que uma visão das terras longinquas. D'ali saíam,
para as expedições aventurosas, as frotas lusitanas; ali vinham
8 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
II
..
1 RANKE, obra citada, liv. v, cap • .unice.
. :
12 OS ) ESUITAS NO GRÃO-PARÁ
III
O DESCOBRIMENTO
••
I
II
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viam fartos de sangue; e de ouro e poderio tinham sêde insa-
ciavel.' ·
Na escola' delles se educou · Orellana. Nascera em Trujillo,
mais. ou menos por I 5 I 1, da mesma estirpe dos Pizarros,
posto que em remoto grau. Partiu moço para a America. To-
. mando parte nas luctas contra Almagro, perdeu um olho na
campanha.
Nomeado governador de provinda, funda · Santiago de
Guyaquil. D'ahi sáe para acompanhar a Gonçalo Pizarro na
esperançosa jornada ás terras da Canella. Compunha-se a éx.
pedição de du~entos e vinte espanhoes e quatro mil índios;
cêrca de duzentos cavallos e camellos lhamas, os ultimos corno
bestas de carga; grande numero de porcos para sustento; e
matilhas de caça para aperrear os índios inimigos.
Não vem aqui repetir as por demais conhecidas miudezas
desta viagem: A historia tornou á · tradição todas as maravi-
lhas, para relembrar as tristezas da ~ventura. Casos de fomes
terriyeis, barbaridades inauditas, thesouros fabulosos exornarn
a narração. Primeiramente o frio rigoroso . nos montes faz pe-
recer muitos soldados. Depois de sacrificarem cêrca de mil
3
a·.i
18 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
III
.. ;,,
20 os J ESUITAS NO GRÃO-PARÁ
toda a fazenda que possuía. Será isto verdade? Com que va-
lores acudia elle aos primeiros gastos? Certo é que foi armando
quatro embarcações: duas naus e duas caravellas; reunindo
manti~entos, e tratando gente para a viagem. Era então cos-
tume pagarem n;uitos destes aventureiros suas passagens;
outros levavam mercadorias a frete; aos poucos, e com estes
recursos do acaso se ·foi arranjando. Por ultimo falleceram
completamente os meios. O padrasto, para libertai-o .dessa .
augustia, vendeu uns padrões de juros, que possuía; o resto
se alcançou por emprestimó de certos ' mercadores genovezes,
. gente por índole e costume inclinada a taes aventuras. Em
tudo se apparelhou a expedição com grande penuria, fazendo
-já presentir o exito infeliz. O védor, fiscal da armada, infor-
mava assi~ para Madrid: «-Fez-se a empresa sem conc~ito,
sem ordem, com toda a cegueira, e pouco s~ber i>.
Entretanto preparava-se em Lisboa outra jornada ao Ma-
ranhão. Diogo Nunes de Quesada, espanhol, e o portuguez
João de Sande, faziam propostas a Dom João III para a colo-
f.
nização das terras banhadas pelo grande rio. O primeiro esti-
vera no Peru, e sabendo, pela viagem de Orellana, da com-
. . '
municação com o oceano, expunha ao monarcha as singulares
conveniencias do commettimento. =--«Esta terra, (dizia), . está
entre o rio da Prata e o Brazil pela terra a dentro, e por esta
terra vem o grande rio das Amazonas. Por este rio se ha de
prover esta terra, porque podem ~r navios por elle até onde
se poderá povoar uma villa, que seja porto e escala de toda
esta terra, porque sobe a maré 200 leguas rio acima; e deste
ponto onde se povoar a primeira villa subirão bergantins mais
.' de 300 leguas, porque o rio vai chão e muito bom. Haverá
300 leguas desta província até ao mar, e sáe este rio á costa
do Brazil» t.
A inesperada aventura do caudilho espanhol, pondo o go-
verno portuguez sobre aviso, favorecia a realização do proje-
cto. Começou-se a preparar a armada com desvelo. Eram qua-
tro navios, sendo dois de 300 toneladas; muita artilharia de
bronze, e munições á farta; quasi tudo_á custa·do rei.
IV
VI
VII
.
diu-se noticia para Lima ao vice-rei; e foi o proprio piloto da
armada, Bento da Costa, levar-lhe o roteiro da viagem, e a
planta do rio, que agora mais uma vez perde o nome. Passa
elle a chamar-se São Francisco dé Quz"to: porque a nova des- '
coberta se dev~ á ordem seraphica; e porque êla cidade cor-
rem as aguas (tal era a idéa dos navegantes) directamente
até ao mar.
Não foi porém o effeito da jornada qual se podia julgar do
merecimento della. O cauteloso chime, com que Espanha guar-
dava as suas colonias, entrou em sobresalto. Os homens do
governo reflectiram que pelo mesmo caminho podiam vir os
flibusteiros bretões ou da Hollanda surprehendel-os. Portugal
agitava-se já nos prodromos da futura rebellião. Convinha a ·
todo o custo inutilizai: a descoberta; e a primeira providencia
foi intimar aos portuguezes que voltassem no menor prazo
possível ás suas terras: assim o determinava o vice-rei.
Não devemos esquecer o intermedio comico da viagem: a
disputa entre franciscanos e jesuítas, pela honra e proveitos
da descoberta. Entrava nas instrucções do vice-rei o manda-
rem-se á côrte de Madrid pessoas de autoridade e lettras bas-
tantes que; acompanhando a expedição na baixada, servis-
sem de fiscaes. Offereciam-se para o encargo pessoas das mais
5
34 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
.' era para elles uma força; pois onde encontraremos alforria
mais completa das peias que nos sujeitam as acções? Receios
de consciencia, considerações por terceiros, incertezas do por-
vir, de tudo isso viam desannuviados os horisontes do espírito,
que livre se podia consagrar ás obrigações de uma nobre
causa.
Recommendados por Dom Pedro de Mascarenhas, enviado
de Portugal junto á Santa Sé, vieram á côrte de Dom João III
os dois primeiros jesuitas. Um delles, Francisco Xavier, partiu
logo para o Oriente, onde sua passagem foi comó um rasto de
brilhante meteóro. O outro, Simão Rodrigues de Azevedo, ficou
sendo em Lisboa o oraculo do governo. Mas, recusando as gra-
ças do soberano, elle e seus companheiros viviam em absoluta
pobreza. De dia mendigavam nas ruas, á noite pousavam ó.os
hospitaes; serviam os enfermos, visitavam as cadeias, préga-
vam na praça publica, exhortando os transeuntes á penitencia.
Similhantes praticas a muitos pareceram ridículas. A mesqui-
nhez da existencia, a compostura modesta, que os novos apos-
tolos adoptavam, não podiam dár-lhes prestigio entre um povo
costumado a ver no clero ostentações de opulencia e domínio .
.
ESTABELECIMENTO DAS MISSÕES 37
II
«Em certos logares, quando sabiam que estavam para chegar os pa-
dres, ajuntava-se toda a communidade, e queimavam pimenta e sal, como
para retel-os e esconjurai-os não fossem para diante. » VASCONCELLOS, ibid.
2 V ASCONCELLOS, ibid.
40 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
III
t C. R. de 22 de outubro de 1649.
2· 15 de março de Ij88.
ESTABELEClMENTO DAS MlSSÕES 45
,.:.
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50 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
•
I
VI
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
) narios. Mas Vieira não era homem que se deixasse tão facil-
mente prostrar. O instincto da lucta constituía o fundo do seu
caracter, e agora, vencido pela unanime hostilidade dos colo-
nos, dos governantes como dos simples cidadãos, deliberou
recorrer ao monarcha. Pretendia queixar-se dos capitães-móres,
e alcançar novas leis que, sendo em beneficio das liberdades,
ao mesmo tempo favorecesseqi a catechese. Com este intento
se dirigiu ao Mar:anhão.
Era opinião dos religiosos que o superior na primeira oppor-
ESTABELECIMENTO - DAS MISSÕES 57
VII
II
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A lei, que André Vidal de Negreiros levava ao Pará-Mara-
nhão, ainda que de alguma forma melhorava a condição dos
índios, não os libertava por completo da vjolencia dos colonos.
As. autoridades perdiam a faculdade de fazer guerra offensiva,
a qual, mesmo justificada, ficava dependente de approvação
régia, e com isso se estancava uma fonte copiosa de captivei-
ros; mas permanecia o direito ·á guerra defensiva, e não fal-
tariam sophismas para considerar tal a mais injusta aggressão
da parte dos portuguezes. Como na lei antecedente, o gover-
nador não podia pôr capitães nas aldeias, nem fazer a repar-
tição dos índios; e tambem lhe era vedado occupal-os em ser-
viço proprio, especializando-se, como singularmente penosa,
a lavoura do tabaco. Estas prohibições, que com maior razão
CONTENDAS E PRIMEIRO REVÉS
III
· IV
I
Convinha, entretanto serenar os animos, e, por meio de
concessões dentro das leis, satisfazer o ' ~lamor gera( que in-
.cessantemente pedia escravos. O missionado via bem quant~s
hostilidades 0 rodeavam, e não desesperava de rendei-as; mas
a occasião não era opportuna. - «Temos contra nós (dizia) o
povo, as religiões,_ os donatarios d'a.s cap~tanias-móres, e egual- . _
mente todos que nesse reino e nes,t e Estado são interessados
no sangue e suor dos índios» t. - Essa era a verdade pura.
Elle porém, como meio de defesa, pedia sómente que nos con-
selhos não se admittisse requerimento algum, cujo objecto
fosse alterar ou supprimir qualquer disposição da ultima lei.
Com isso se julgava habilitado a domar a revolta dos animos.
·o fallecimento de Dom João IV não diminuira o prestigio -
de Antonio Vieira na _côrte: pelo contrário, com mais auto~i
dade usava agora do ascendente, que a qualidade sacerdotal
lhe dava no animo devoto da · rainha. Com arrojo de illumi-
nado, e dureza de propheta, apontava-lhe os effeitos, para ella
dolorosamente mànifestos, da divina colera: - « A el-rei Pha-
rnó,_ porque consentiu no seu reino o injusto captiveiro dos
hebreus, deu-lhe Deus grandes castigos, e um delles foi tirar-
lhe os primogenitos. No ano.o de 1654 i, poi: informação dos
procuradores deste Estado, se passou uma lei com tantas lar-
guezas, na materia do captiveiro dos índios, que ·depois, sendo
Sua Majestade melhor informado, se serviu mandai-a · revogar,
e advertiu-se que, neste mesmo anno, tirou Deus a Sua Majes-
tade o primógenito dos filhos e a primogenita das filhas » 2.
- Estas palavras cruéis, qué duplamente teriam o coraçà'.o dà
rainha, mãe e esposa, não êràm, como se poderia supp&r, um
artificio de rhétorica, para levar o pavor a umà alma feminil.
O ·espirifo do missionário desde muito abrigava em si essà
convicção, da qual, em carta reservada, dava conta em 1654 á
um dos superiores. , Esquecendo quanto devia ao mónátcha,
\
ainda então em vida, condemnava-o, 110 fôro de sua cótiscien-
- eia, a penas terríveis. - «Um dos ultimas castigos que Deus
deu a El-Re~ por captiveiros inju?tos foi tirar-lhe o primoge-
f nito; e porque ·não cessou, antes continuou, tirar-lhe-á por
r fim o reino mai's a vida! 3 » O pensamento, desvendado a um
dos se_us, que não ousara exprimir ao soberano, declarava-o
elle agora, inflexível ~ cruel, á regente, como quem recebera
do céo essa missão vingadora !
Para congraçar os moradores com o novo estado de coisas,
concordou Vieira com o ·governador que o melhor meio seriá
VI
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OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
II
III
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de se reter o superior nâ Europa era já meio caminho andado
para a pacificação.· Isso não obstante, devia-se contar com a
resistencia, e, na impossibilidade · de appellar para os meios
coercivos, o delegado da côrte ia disposto a ·recorrer aos as-
tuciosos, dando por bem feito tudo quanto os ~uaceiros haviam · -
praticado. ·
Antes de chegar á bar~a de São Luiz perdeÚ-se ·uma das
naus, desastre que não só diminuía a força, como o prestigio da
expedição. O accidente deu animo aos culpados, mais pujantes
desde ·que no pequeno apparato de tropas reconheciam a fraque-
za do governo. Assim pois, no acto da posse, exigiu o povo que
Ruy Vaz declarasse por escripto não ser portador de ordem
contraria á expulsão dos jesuítas; ou que, bem que o fosse, a
não cumpriria. O governador acceitou a humilhante intimação.
Reservava-se para mais tarde dar execução ás ordens, que a
fallencia de recursos lhe impe.dia, po~ emquanto, de tornar effe-
ctivas. Desta maneira passaram dois mezes, até que successos
occorridos no Pará lhe facilitaram para isso ensejo.
Nesta capitania, o exito da revolta fôra menos completo.
Scientes, pelo exemplo de São Luiz, do que deviam esperar,
os jesuitas retiraram-se a tempo da cidade, refugiando-se entre
os índios. Deu isto á facção opposta motivo de allegar. que
haviam . desamparado o collegio, indo introduzir nas aldeias a
desordem. N~o lhes valeu . porém fugirem: um após outro fo-
ram colhidos, e levados aó Pará, ortde ficaram em custodia.
Pre~Ós os jesuítas, que se encontravam nas vizinhanças da
cidade, mandou a camara intimar os ultimos dois, ainda livres
no Amazonas, que baixassem a reunir-se aos companh.eiros.
O padre João F elippe_Betendorff, belga, que na sua chronica
man~1scripta deixou copiosa relação d'estes motins, era um
delles. Iniciava então a s~a carreira de missionario. Em Be-
lem Antonio Vieira, apontando no mappa o primitivo traçado,
todo conjectura!, do rio das Amazonas, mostrara-lhe os terri-
torios onde o domínio da Companhia havia de firmar-se como
um impedo, governando as almas singelas e doceis dos índios.
Er~ esta missão a primeira com assento fixo fóra do po-
voado. Em pequena canôa mal segura o altar portatil, alguns
poucos mantimentos, os presentes sem valor: anzoes, agulhas,
facas, missangas, com que se grangeava a complacencia dos
/
A ANARCHIA 103
II
111
l
Já então Antonio Vieira .tinha regressado de Roma, e,
mandado ouvir pelo regente, offerecia o seu voto, com as se-
guintes propostas: introducção de escravos de Angola por
conta da corôa; prohibição absoluta dos resgates; desenvolvi-
mento das missões, e entrega das aldeias aos religiosos da
· Companhia. Com estas providencias entendia satisfazer as ne-
cessidades dos colonos, salvaguardar o direito dos naturaes, e
promover o adiantamento da civilização dos selvagens, objecto
de maximo empenho do seu instituto. I
Parecerá talvez incrivel esta aberração de um espirito re-
1
1
cto, _distinguindo entre o direito do indio e o do africano, e
preparando a escravidão deste ulti~o. para assegurar áquelle
a liberdade. Mas porque razão o fazia? O enthusiasmo pela
obra, que tinha em mente, apagava.lhe na consciencia a noção
exacta da justiça. Ideára para os seus o imperio" dessas almas,
faceis de assimilar á fé. Cumpria para isso guardai-as da in- ·
fluencia corruptora do europeu; pôr um paradeiro ás mortes
provenientes das guerras,_ dos trabalhos, das molestias; que
f1
•
desde a apparição dos brancos no continente tinham dizimado
as populações. A raça nativa e~a fraca, e só pela segregação 11.·
-·
112 OS JESÚITAS NO GRÃO-PARÁ
VI
•
de proposito. A lei já ali fôra publicada, e o prelado, com me-
_ lhor conselho, declarou submetter-se em tudo que não encon-
trasse a sua propria jurisdicção.
Tamaram-se portanto as providencias; que a mudança de
situação exigia. Saíu bando a ordenar que, no prazo de um
mez, trouxessem os moradores os seus índios á casa do go-
vernador/para de lá serem entregues aos prlnclpaes, nas di-
·versas aldeias. Fizeram depois -os missionarias o arrolamento,
e procedeu.se á repartição, dividindo a.S tres turmas, na fórma
da lei. Ahi se manifestou sem freio o descontentamento geral:
do povo com os repartidores, dos camaristas com o bispo, de
todos com os jesuítas.
Aggravava-se tambem a indisposição d'estes ultimos com
o Ordinario, pela controversia sobre o direito, chamado de vi-
sita, disputa que havia de -perdurar e contribuir mais tarde
grafidemente para a ruina da sociedade. A questão não tem
interesse para o nosso estudo. Pretendia o bispo ser preroga-
tiva sua o provimento das parochias e igrejas de indios. Con-
testavam os jesuítas, allegando que, por se~em essas igrejas
do. padroado real, em todo o tempo se commettera a direcção
dellas aos superiores da companhia. Esta fôra a praxe cons-
tantemente seguida no Maranhão e no Brazil, e como tal fazia
lei. Antonio Vieira,- em pÓucas palavras, nos instrue da con-
tenda, com recommendações que dirige aos missionados: -
Vossas Reverendíssimas não devem resistir a que o bispo vi-
site as igrejas e os índios, .freguezes della; mas não os paro-
chos, quando Sua Senhoria nos não queira fazer a cortesia,
que sempre nos fizeram todos os bispos do Brazil, não havendo
algum que até hoje visitasse, nem intentasse visitar, aldeia
alguma nossa, havendo por bem descarregadas suas conscien-
cias pelas visitas, que nelles fazem os nossos superiores»- t.
Eram os· jesuítas vezeiros nestas disputas, e em toda a "parte ·
se arrogavam independencia da a~toridade diocesana. O facto,
mais tarde allegado por Cle mente XIV no breve da suppressão,
mqstra de que forma elles iam accumulando contra si os des-
peitos e coleras, que lhes haviam de ser fataes.
•
116 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
.
A ANARCHIA 117
. 14$000 réis pelo quintal de ferro, 100$000 reis pot cada ne-
, gro, um cavado de gorgorão 1$600 réis; e assim por diante,
t.specificados todos os artigos desordenadamente na tabella; a
mercadoria humana, que eram os filhos de Africa, de envolta
com os generos sêcos e molhados. Prohibia-se, pelos mesmos
vinte annos, todo o commercio directo dos habitantes com os
outros vassallos do reino e conquistas; todas as transacções
seriam por intermedio da companhia. Taxava:se preço aos
productos do Estado. Impunha-se pená de confiscÕ a qualquer
embarcação que violasse o bloqueio. Taes eram as restricções
que vinham empecer a já de si lenta evolução da vida co-
lonial. ·
A promessa da escravatura não logrou vencer o desconten-
tamento, lpgo manifestado pelos maranhenses, inclinados á li-
berdade commercial, e cuja indignação mais excitavam as -con-
cessões seguintes: uma de poderem os contratadores fazer en-
tradas no sertão, a seu arbitrio, sem valer contra elle opposi-
ção de nenhuma autoridade; outra que punha á disposição dos
mesmos cem casaes de índios, em cada uma das capitaes, com
que fabricassem farinhas e mantimentos para os negros, quan-
do chegassem.
Entrou no Estado o syndicato com o novo governador
Francisco de Sá de Menezes, que ás primeiras manifestações do
publico desagrado respondeu com firmeza, perante a qual os
mais arrogantes se calaram. Estava disposto, dizia elle, a
~mbarcar para o reino os descontentes, no mesmo navio em
que viera, encarregando-os de levarem p·e ssoalmente suas
queixas ao rei. Temor, persuasão, e suborno, conforme as
pessoas, venceram as resistencias. Os mais influentes abrandou
o representante da companhia com presentes e occultas van-
tagens; os outros ce~eram ao habito de imitação e obedieqcia
passiva. Ficou a minoria dos que, vendo-se poucos, não ou-
savam affrontar as contingencias da reacção. Estabelecido ali
o estanco, Sá de Menezes, passou•se ao Pará, séde do go-
verno, onde eguaes reclamações terminaram por meios simi-
lhantes.
Breve se experimentaram os effeitos da permc1osa insti-
tuição. Os africanos proniettidos não chegavam; as fazendas
eram de má qualidade; os generos do paiz mal pagos pelos
118 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
VII
,,
Hl
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.•
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124 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
II
·'
Á falta de ouro, prata e pedras preciosas, não eram para
desdenhar as riquezas vegetaes, que o solo feracissimo prodú-
zia sem Ci.Ultura. A baunilha, o cacau, a canella, · o cravo, as
raízes aromaticas abundavam no seio dâs matas. Recolher as
drogas do sertão era uma das occupações preferidas dos colo- .
nos. Em seguida á attracção do ouro, sem comtudo destnül·a,
veio esta outra tentar a avidez dos conquistadores, creando
novo incentivo á exploração do territorio.
Pouco 'e pouco, ia-se rasgando o véo mysterioso, que cfesde
a viage'm de Orellana tantas tentativas abortadas tinham dei-
xado pa!rar, sobre esta parte do novo Mundo: Tarde haviam
chegado os portuguezes, e já por outros precedidos no descobri-
mento; mas, impellidos por seu genio aventuroso, e sobretudo
pelo espírito mercantil, em pouco tempo levaram suas embar-
cações aos mais reconditos tributarias do rio-mar. A mesqui-
nha povoação, que tinham fundado, longe, mais do que cum-
pria, do oceano, não tinha importancia como cidade: era ape-
nas um cáes de desembarque e um ponto de partida; mas
tambem o centro de onde as ambições insaciaveis irradiavam,
procurando riquezas.
Aos dois motivos principaes, já apontados, da rapida ex-
pansão do~ colonos. pelo interior das terras, temos de accres-
III
IV
t C. R. de 16 de novembro de 1697.
2 C. R. de 3 de 'dezembro de 1691.
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
t C. R. de 23 de março de 1688.
2 Repres. sobre a liberdade e captiveiro, etc.
3 Resp. aos cap., 25.
·O ORGANISMO COLONIAL 137
\
nham engenhos? Tinham cannaviaes? Tinham lavouras de ta-
bacos? Faziam alguma lavoura ou beneficiavam alguma droga
das que ha naquelle Estado?» 2 Tinha razão no tempo delle:
mas depois respondem a estas interrogações as cartas régias,
permittindo aos .religiosos receberem do reino mercadorias, e
embarcarem generos do paiz, mesmo durante o tempo dos
monopolios; responde d'ahi a cem annos o arrolamento dos
bens; respondem em todo o tempo as reclamações dos habi-
tantes, e frequentes vezes as advertencias do geral da Çom-
panhia.
Por outro lado, n~o resta duvida que certos padres não
}
tinham com os neophytos a caridade devida: por leves culpas
os mandavam açoutar e metter em troncos; e nem sequer os
przºncipaes, que o prestigio de sua autoridade devera resguar-
dar, escapavam aos humilhantes castigos. Algumas vezes che-
garam os clamores á côrte, de onde saíu ordem para serem
\
'·
os missionarios admoestados com mode1·ação pelo governa-
dor, 3 mas, sem embargo, os actos de ,severidade repetiam-se,
VI
. .
Para aggravar a pouca invejavel situação dos habitantes,
concorria tambem o defeituoso regímen politico da colonia.
Aos inconvenientes da exaggerada centralizaç.ão administrativa,
exercida pela metropole, accresciam outros de procedencia lo-
cal, egualmente nocivos. Taes eram os do poder absoluto que
arrogavam a si os governadores; a demasiada autonomia e a
tu~bulencia das camaras; os abusos de jurisdicção do bispo,
quando o houve, e das autoridades ecclesiasticas; os absurdos
privilegios dos capitães-móres; os conflictos dos magistrados
entre si; a complicação e incerteza das leis, constantemente re-
formadas; tudo isso produzindo o antagonismo dos funcciona- ,
rios, o embate dos poderes, a anarchia nos serviços p ublicos
e, como ultima· consequencia, o descont~ntamento geral.
Os negocios da administração . da colonia corriam em Lis-
boa pelo Conselho Ultramarino (primeiramente Conselho -da
India), competindo á Meza de Consciencia e Ordens os assum-
•·
144 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
t C. R. de 20 de março de 1680.
148 OS JESUITAS NO _GRÃO-PARÁ
1 C. R. de 20 de novembro de 1700.
2 e. R. de IO de dezembro de 1678 e o_u-tras.
3 VIEIRA. Resp. aos cap., z.
/
O ORGANISMO COLONIAL 149
I
150 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
...
VII
•
Pará-Maranhão de procederem com justiça, já no tempo de
Vieira conclamavam que «na expulsão dos religiosos da Com-
panhia faziam tanto serviço a el-rei como tinham feito na ex~
pulsão dos hollandezes » 1.
Mais tarde, quando a colonia começou a ter organização
regular, e o principio da autoridade melhor se fez sentir, abriu-
se o período dos vehementes libellos. Estes ataques aos mis-
sionarios foram a valvula por onde se expandiam as queixas;
originadas em tantas e tão diversas causas, que acabamos de
expôr. ,Cegos por uma só e mesma illusão, todos filiâvam os
males publicos na questão dos índios: os colonos porque não
tinham sérvós em numero bastante; os m1Ss1onarios por se
verem obrigados a dar-ih' os de mais. A:; reclamações encon-
20
\ -
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
II
III
1 e. R. de _9 de março ~e 17i8.
166 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
IV
VI
VII
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
VIII
nas aldeias dos índios, auxiliados pela tropa commandada por Belchior Men-
~ ~~~; .
Em 19 de setembro: Represeµtação do mesmo a El-Rei, sobre as inso-
lencias que tem praticado Bel~hior · Mendes de Moraes, cabo da tropa de.guerra·
do Rio Negro nas povoações de índios;
Em 6 de outubro: Requerimento pedindo se ponham em liberdade to-
das as peças, captivadas pelo mesmo;
Em 7 de outubro: Requerimento pedindo certidão da sentença que se
proferiu contra os tapuyas, na devassa que contra elles se tirou, para se lhes
dar guerra;
Em ·6 de setembro de 1730: Requerimento do vice-provincial, dizendo
que lhes são nece~sarios ~raslado's de todos os requerimentos que fez o pro-
curador dos índios Alexandre Camello de Azevedo, sobre os escravos que se
vendt;;!ram, e sobre a tropa de guerra de que é cabo Belchior Mendes de
~oraes. •
(Ms, da Bibl. Nac. de Lisboa. Collecção intitulada: Papeis relativos ao
Pard e Maranhão).
1 Representação do Govemado1· do Estado do .Maranhão. Ms. da Bibl. de
· Evora.
·•
-,
180 OS JESUITAS NO GRÃO-PARA
IX
, ~-·
Desta vez os je~uitas:<i)~deram 'julgar-se, para sempre, a
, t:oberto dos golpes do -seu encarniçado adversario. Entretanto
~ão succedeu assim; e Paulo da Silva Nunes, não desanimando
•
CAPITULO VIII
• 1
Officio de 13 de agosto de 1750. Archivos do Pará.
A SITUAÇÃ.O NO SECU LO XVIII 193
'"
/
,.j
'>
A SITUAÇÃO NO SECULO 'xvm 195
I '
II
'l
das ordens religiosas, tendo, ao menos na apparencia, mais
alto escopo, que a simples cubiça e a tyrannica dominação so-
bre os indios; a outra, dizemos, medrava a blhos vistos, e, na
sua prosperidade, constituia assumpto de escandalo e inveja
dos pauperrimos moradores , e dos governantes, impotentes no
seu esforç<?, de levantarem a communidade do abatimento em 1
l
f
\
que jazia. Alguns destes tinham querido, por vezes, medir for-
ças com a poderosa Con1panhia de Jesus, que possuia, por assim
/.
dizer, o exclusivo das missões; mas infallivelmente, como te~
mos visto,
.
saíam vencidos ; e assim, por amor á vantagem' do
posto, e para tranquillamente gozarem das commodidades
delle, no curto prazo de tempo, que lh'o davam a explorar,
preferiam , viver . em paz com o que reputavam inimigo social,
.·~, ...
'
l,)_
r.e latorios, ém que os exaggeros ··n ão e~cluiam inconcussas ver-
dade,s , o_immenso ról das_. queixas, accumuladas ~ontra os mis-
sionados, no ' succeder de gerações. . ·
Usando elos mesmos processos de captiveiro e domfoio,
~'
applicados· pelos seculares, os padres logravam accrescentar
os seus estabelecimentos, ao passo que os..dos simples colonos '
•
os JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
III
1
C. R. de 20 de novembro de 1699, e outra~. Vej. Catalogo dos ma-
nuscriptos <!a Bibliotheca Publica Ebore1ise, Tom. 1.
, 2 e. R. de II de janeiro de 1701. Bibl. de Evora.
' 3 e. R. de 16 de novembro de I 702. Bibl. de Evora.
f
200 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
- .
não é licito, á Íuz de um .justo criterio, impôr-lhe por isso
algum deshonroso labéo. É certo que os canones da Igreja
romana, as leis do proprio instituto, a idéa que da vida reli-
. giosa, "no christianismo, fazemos, declaradamente Ih' o vedavam.
Mas já vimos que, nesta parte do Novo Mundo, elles eram co-
lonizadores; a obra, que haviam emprehendido, tinha caracter
temporal, e, nessa qualidade; sómente com. os meios temporaes
se poderia realizar. A sociedac;le religiosa era, pois, tambem
mercantil. Tinha, nos centros de catechese, feitorias; nos mis-
sionatios, caixeiros, regentes agrícolas, ou directores industriaes; •
(
A SITUAÇÃO NO SECUL-0 XVlll 201
- ,
~ua - Ordem. Mui diversos da actual opulencia tinham sido os
principios_da fundação . .QtJizera_Dom João IV dotai-a com lar-
gu~za, e assim teria feito, sem a resistencia do superior, que.
'se oppunha. A congnia estabelecida foi de 3 50 mil reis an-
nuaes, para dez sujeitos ; mais 420 mil, para .os gastos da via-
gem, e 7 56 mil para provimento das igrejas. Com isto se
partiu Vieira de Lisboa, á conquista de terras -extensíssimas e
centenares de nações populosas -; tão rico, a seu ver, como se
levara já cõn1sigo os thesouros, que, outros por tantos annos
debalde buscavam no interior das mesmas terras. Sua con-
fiança, nos actuaes e futuros r'ecutsos da empresa, denota, com
a simplicidade de coração,_a grandeza de um'alma· por inteiro
consagrada a altissl.mos fil1s. . «Logo Sua Majestade, como
tem promettido acúescentará mais a renda, e não faltarão
pessoas particulares que nos àjudem com suas esmolas ... » 1 •
- Assim falava elle, e achando pingue de mais, para as neces-
_sidades, o apanagio dos · seus padr~~. cuidava já de elevar o
numero delles. Para mantença de cada um no Maranhão basta-
vam, pelos seus calculas, vinte e cinco mil "réis, e assim das
sobras poderia sustentar ~ais quatro ou cinco. A isto accrescia
o seu ordenado como prégador régio; e, em ultimo caso, sendo
preciso, «resolver-me-ei a mandar impriinir · os borrões de
meus papelinhos », dizia 2. Das rendas da Bahia e Rio de J a- .
neiro era pago -o subsidio .régio, que em uma e outra parte
_os collegios empregavam cm assucares da ·sua lavra; e, vendi- .
dos estes no Maranhão, com o ganho -augmentava considera-
velmente o valor primitivo deste auxilio. Em bens de outra
especie, possuíam os jesuítas no Mâranhão um engenho ao
abandono, reliquia de seu primitivo estabelecimento, com pou-
cos escravos, e num'ero diminuto de gados.
·Em todo o tempo de Yieira, o cabedal da fundação não
variou sensivelmente dçsta pc~uria. Expulsos os jesuítas, em
1661, verificou-se que, além do engenho, ' toda a fazenda que
possuíam ·não valeria mais de dois ·mil cruzados; Attribuiam-
lhes seus' adve~sarios terem grangeado, ·no espaço de nove
annos, - cêrca de cincoenta mil cruzados, o que permittia aos
. .
Carta ao provincial do Brazil. Lisboa 14 de nov~mbro de 1652.
2 Idem. ·
26
,,
204
·~ ~
~ ~·
. .... .-..
08. JESU!TAS NO GRé:_PARÁ.
.. . . -.
.. 7'~?p. ~'. - •' ~ ·d-~;
IV
f
2o6
f
NO SBcirt.O XVIII 207
'
.A SITUAÇÃO NO SECULO xvm 209
religiosos, que primeiro saírem para fora. Os ch.apéos entendo que duram á
vida do religioso, a quem se dão, e os sapatos grossos, de duas solas, são fei-
tos em casa pelos seus officiaes, e de cabedal tam bem fabricado nas suas fa-
zendas. O comer é mais ordinario que em outra alguma parte .•. »-Carta de
Francisco Xavier de Mendonça, capitão general, a Diogo de Mendonça Côr-
te Real-, por extenso in fine. Nota D. 1
'
A SITUAÇÃO. NO SECULO XVlll 211
<""
A. EXPLORACÃO
. DO CONTINENTE
~
l
Buscando as drogas, ou á cata de indios que
podesse escravizar, invadia o colono os ·sertões
mais reconditos. De par com elle, caminhava o
missionado, com a mira na catechese, e . o pro~
posito de repovoar as aldeias, constantemente desfalcadas por
tantas causas, que se tem enumerado.
A portentosa jornada de J;>edro - Teixeira produzira na Es-
panha, sempre temerosa de inopinados assaltos, uma impres-
são de pavor; em outras nações, levantou enthusiasmos e sus-
citou projectos de arrojadas aventuras. Já se tinha por menos
que incerta a fidelidade portugueza, e havia receios que, pelo
Amazonas acima, ficasse patente aos inimigos da monarchia
o ádito ás regiões, de onde ella extrahia seus thesouros. Ao pa- ·
dre Christovam de Acuõa se proh:ibiu primeiramente tra-
2r4 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
f
A EXPLORAÇÃO DO CONTINENTE 215
II
)
mestre de campo Antonio Raposo Tavares, acompanhado de
cincoenta e nove paulistas e alguns índios. Eram as reliquias
de uma ' forte b.andeira, de duzentos portuguezes e cêrca de
mil auxiliares indigenas, que á caça de escravos, dois annos
atrás, partira de São Paulo. As tropelias deste grupo são fa-
mosas. Em certa aldeia do Paraguay, assaltam a igreja á hora
dos officios divinos. Surprehendendo os índios, entretidos na
oração, tomam-nos prisioneiros, saqueiam e profanam o templo.
Prevenidos por alguns fugitivos, correm os missionarias das
aldeias circumvizinhas, com seus neophytos, a libertar os
captivos, e expellir os assaltantes. Acceitam estes batalha e,
·mais peritos que os padres na arte da guerra, facilmC7nte der-
rotam os improvizados contendores. Um dos missionarias fica
(
218 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
(
A EXPLORAÇÃO DO CONTINENTE 219
•
A EXPLORAÇÃO DO CONTINENTE 221
III
f
A EXPLORAÇÃO DO CONTINENTE 223
IV
.
fronteira, assim delineada, jámais recuou. ,Desta arte, impulsos
tão diversos, quaes er_am os do aventureiro e d~ missionario
. '
se conjugavam afinal num esforço commum.
•
CAPITULO X
A COMPANHIA DE COMMERCIO
- .
I. Antecedentes .dê Sebastião José de Carvalho. Seu projecto da Companhia
0rienta.J,. Missão a Vienna. Regresso ao reino. Por morte de Dom João v
é chamado ao poder.-II. O tratado de limites. Francisco Xavier de Men-
. donça governador do Gi:ão-Pará. Seu earacter. Desagrado dos habitantes.
Estado da questão jesuitica ·em 1751.-III. Desmandos da população e
dos missionarias . . Situação dos indigenas. P roposta sobre a introducção
de negros no Estado. Carvalho institue a Companhia do Grão-Pará. oit
posição dos jesuite.s-_ Sermão do padre Ballester..-IV. Protesto da Mesa
do Bem Commum. Castigo de seus membros. Participa~o dos jesuitas::
Providencias sobre à repressão no Pará.
(z750-z755)
;º
indicação d' este ultimo; tanto mais se soubermos que lhe era
sobrinho bene~erito de particular affeição: .Os actos de Se-
':_b astião José de Carvalho, como enviado em Londres, não dei-
xaram de si lembrança, que fizesse prever a f~ma posterior do
seu nome. Citam os biographos uma energica reclamação
contra o proceder dos capitães de navios inglezes, em portos
lusitanos, e sobre os privilegios, que os subditos de Portugal
deviam ter, em territorio britanico; mas bem se deixa ver que
similhante representaçãó só podia ter Jogar em cumprimento
de ordens, expedidas de Lisboa. Depois disso, nenhuma outra
p:iemoria resta dos serviços de Carvalho na Inglaterra.
' Mais conhecidos são os factos_ relativos á sua missão a
Vienna, posto que -não trãzidos, até agora, a lume, com a indi-
viduação que merecem. Não é comtudo geralmente sabido
que a enviatura de Pombal, áquella côrte, lhe foi antes dada
como pena disciplinar, que por escolha motivada pela excel-
lencia de séus meritos. O caso prende-se ao gosto _do diplo-
mata pelos estudos economic6s, e ao desejo, já então evi-
dente, de conquistar nome hÓnroso na sua patrià. Seu espir~to
observador, fazendo-lhe ver a crescente prosperidade do tra-
fico inglez na India, ao mesmo tempo que o comparava com
a progressiva decadencia do nosso domínio, levou-o a ~onsi
derar na possibilidade de se levantar em Portugal uma com-
(
_OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
'
A COMPANHIA DE COMMERCIO 231
II
'
..
(
A. COMPANHIA DE COMMERCIO 235
1 • . Cf.
os curiosos documentos dados ·á estampa no diario Commercio de
Portugal, pelo sr. José Antonio Moniz, distincto empregado e professor de
bibliologia na Bib. Nac. de Lisboa.
(
A COMPANHIA DE COMMERCIO 237
f
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
Arch. do Pará.
(
A COMPANHIA DE COMMERCIO
-
'lei, que apolia os capt!veiros, tratou de cprrigir as violações
da ~~tiga. Aqs índios, m.arc~~os a ferro, ma,nciou pôr em liber-
dad~. 9 m.esmo praticou com todos aquelles, de .cuja licita,
escravidão havia duvida,s. Para ~cprimir a continuação dos res-
gates, ordenou que os commandantes das fortalezas do Ama-
zonas prendessem q.s pessoas, qi.1e soubessem occupadas_nelles,
enviando á sédé da capitania ºli índios, livres desde esse mo-
mento. Contemplancio, pqrém, ~ cxtrem.a penuria dos babitan-
tes, eil-o que aponta, a9 governo q. inoppõrtunidade de re5ql-
ver a questão por. um golpe immediàto. «Este Estado, e prin-
cipaJ!Ilente esta capitania (diz), se acha rec;:Iuzicio á extrema
!Iliseria; Todos os seus moradores estão na ultima conster!la.-
çã~; são poucos os que ainda cultivam alguns generos. A
maior par~e conservam algum índio escravo, para lhes ir bus-
çar a,o rio, ou ao mato,' o miserayçl s,usten,to quotidiano! com
que passam pobrissimamente, mettidos em uma choupana,,.. a -
que elles chamam roça » l.. D_e certo, sem a eloquencia de
Vieira, não desenha tqdavia com ~enos exacção a inópia
deste povo infeliz. Fazendo por galvanizar um organismo
inerte, Mendonça conyoca os principaes habitantes; pergunta:
lhes que remedio antecipam a uma situação, cada dia ma,is
perigosa. _A cons.ulta é igual á de toda,s as épo~as. A· uma
opin.am ós do conselhq se lhes faculte descerem os indios para
as fazendas, como fa~em os religiosos. A introducção dos
africanos não lhes sorri; . pnis, com ·que recursos hão-de pa-
gai-os? E mais, ~tendo os missionarios á sua disposição tantos
índios, ·que nada lhes custam, como pocierão .os mor3:d,~res ti-
rar vant3:gem com os negros, por elevado preço? Estq.s razões
. convencem o governador, que apoia o alvitre dos descimentos,
suggerip.do a creação de aldeic;ts, para onde se ~ragam os ín-
dios, na vizinhança das cidades e povoações principaes; isen-
tos, porém, da jurisdicção dos religiosos; ao governádor caben-·
do providenciar sobre a repartição e a cobrança dos salarios.
· A proposta e as observações de ·Mendonça tiveram em
Lisboa acolhimento. O governo concedeu o adiamento na pu:
blicação da lei emancipadora, e autorisou novamente os resga-
tes. Parece que · isso foi antes uma fraternal condescendencia
(
A COMPANHIA DE COMMERCIO 243
(
A COMPANHIA DE COMMERCIO 245
\
ral, foi endereçada a supplica ao soberano.
Já então se acercavam de Carvalho os financeiros sem es-
crupulos, que foram a calamidade e fizeram a :eputação do.
seu governo. Nada teve a invejar, ilesse ponto, o regímen, tão .
cioso das régias prerogativas, ás actuaes democracias. Punha-se
um paradeiro á avidez dos nobres abatidos, entregando, por
·outra parte, o reino inteiro, á exploração de mercantes insacia·
1
\
vei~. Com o fundamento! sincero no ministro, de adiantar o
·commercio e as industrias do paiz, iam criar-se os odiosos
,.
m«?nopolios, e chover os pingues empregos, sobre os favoritos i
plebeus; e, se estes enriqueciam cotri os despojos da nação, ·1
crescia tambem parã:Uelamente,· pela reciprocidade das conces-
sõc::s, 'a fortuna do doador t, Já Feliciari~ Velho Oldemberg f
. '
IV
(
A CO!t\PANHIA DE COM!'liERCIO 249
•
250 OS JESUITAS NO GRÃO-PARA
l.l
A COMPANHIA DE COMMERCIO
•
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
. .
politicos, daria motivo a repressão severa. O terremoto do 1. 0
de novembro, chamando para outra parte a attenção de Car-
valho, remiu as penas dos condemnados, menos um, o desdi-
toso Negreiros, que pereceu esmagado sob as paredes do car-
, cere, onde esperava a hora de embarcar para o presidio. Os
outros aproveitaram da amnistia, publicada em seguida, e que
foi o unico acto de clemencia deste genero.
. Os successos de Lisboa inspiraram receios de que, no Pará,
igual opposição se levantasse. O exemplo do padre Ballester.po-
dia ser ·imitado na colonia, onde maior era a influencia dos
jesuitas. Os habitantes ha_viam de sentir ver-s.e privados da
· liberdade de commerciar com a metropole; e, entre esses, os
promotores da companhia, desilludidos e alvo da zombaria
geral, certo lamentariam a cega confiança nas promessas do
governador. Os antecedentes hist?ricos da população, sempre
prompta aos actos de turbulencia, justificavam. por outro lado
as apprehensões. Era, pois; de atilado concei~o prever algum
sedicioso e violento protesto dos moradores.
As instrucções, enviadas por Carvalho a seu irmão; de-
monstram o proposito de reduzir, por actos de ~nergia, os
recalcitrantes á proinpta obediencia. Escrevendo, . em 4 de
agosto dá-lhe noticia do sermão do padre Ballester, cujo ob-
jecto tjnha sido, dizia, provocar ·uma sedição contra ,ª Com-
panhia de Commercio: informa-o de ter a Mesa do Bem Com-
mum ousado fazer a el-rei uma representação - e sacrílega
satyra contra uma lei tão util e necessaria, em ·cuja observai1.-
cia tinha a sua real pal_avra emp·enhada »; conta que ficavam
presos, e respondendo a interrogatorio, nos carceres, os homens
de negocio; os jesuítas confusos e em desanimo. Se estes ul-
timos intentassem, no Estado, praticar, como em Lisboa,
usando do pulpito, para excitar os animos contra a nova insti-
tuição, a identicas penas ficariam sujeitos, isto é deportado
para o reino seria o prégador, e o superior admoestado a con-
ter, no· respeito devido ás leis, os 'religiosos, sob pena de m.ais
severo proceder. Os particulares, que semeassem o· desconten-
tamento, por meio de criticas ou protesJ;os, seriam logo pre-
sos, para desengano dos outrós. Se, porém, a opposição che~
gasse ao excesso de romper em tumultos, a devassa e a pena
uJtima · esperavam os cabeça.S. Já por ahi se annunciavam os
r
A COMPANHIA DE COMMERCIO 253
fl
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
fi
A EMANCIPAÇÃO DOS INDJOS 257
1 e. R. de II de março de I755·
33
'
•
A EMANCIPAÇÃO DOS INl)IOS 2 59
{
'·
como administradçn·, um ojficial de guerra. Está aqui todo o "
plano . da emancipação, realizada per Carvalho mais tarde. )
~ .
C·)
•
262 OS JES UITAS NO GRÃO-PARÁ
II
. (•
A EM;\NCIPAÇÃO DOS INDJOS
«Não terei mais remedia que ir eu mesmo, com todos os meus fa-
miliares, supprir a falta dos índios; nem se poderá julgar improprio em um
prelado o exercido de remar, attendendo que os bispos são os legítimos suc-
cessores dos apostolas, os quaes largaram os remos para empunharem os ba-
culos».-Carta a Sebastião José de Carvalho, 8 de março de 1754. Bibl. Nac.
de Lisboa .
• 2 Carta .a Francisco Xavier de Mendonça, 14 de março de 1755. Bibl.
Nac. de Lisboa.
J
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
(
• A EMANCIPAÇÃO DOS INDIOS
III
•
•
266 OS JESUlTAS NO GRÃO-PARÁ '
(
A EMANCIPAÇÃO DOS INDTOS
1 C. R. de 3 de março de 1755.
2 e; Do mal da·desobediencia deste homem tiramo""s o bem de sabermos
que em seis mezes de tempo ~e pode ir.desta cidade, e vir, ás minas de Mato
Grosso».-Officio de 9 de março de 1754. Arch. do Pará.
3 Resol. de ·23 de outubro .de 1752 1 baseada em parecer do Conselho
Ultramarino, aut_o risa as communicações pelo Madeira, vedando em absoluto
a navegação do Tocantins.
- . •
268 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
..
Á dishmcia de um tiro de espingarda da missão, achava-se
estabelecido o posto fiscal. Um offi~ial e poucos soldados vi-
giavam o rio, fazendo visita ás canôas, que desciam. Quando
algum mineiro transitava com ouro, acompanhavam-no dois
_ guardas á capital, para lá se verificar ·o que trazia, e ter Jogar
o pagamento do imposto. .
Chegou o governador a Trocano em 20 de dezembro. Por
espaço de alguns dias, conservou occulto ao rnissionario, . que
era o allemão Anselmo Eckart, o objecto da viagem. A ' 3 I,
fazendo-lhe certa communicaçã? por escripto, tratava-o ainda.
por míssz"onario de Trocano; mas, n~ dia immediato, convi-
dando o religioso para assistir á solemne inauguração-da villa,
que- nomeou por Borba a · Nova, omittiu qualquer referencia
áquelle tjtulo, de certo por considerar extincto o cargo.
Convocados os índios ao som das trombetas, fez-lhes um
official,. da escolta de Mendonça, perito na linguagem tupy;
·.u ma pratica, insinuando-lhes que, para o futuro, viveriam em
. outros costumes, outra disciplina e outra lei. Em seguida, en-
traram os selvagens, ajudados por soldados, de fazer uma gran-
de derrubada, e, no meio da clareira, em pouco tempo abertá,
elevaram, á feição de columna, um t9sco madeiro: o pelouri-
nho, symbo_lo das franquias· municipaes. Alguns vivas ao so-
berano, e os tiros de duas pequenas peças de artilharia, exis-
tentes ?ª missão, saudaram o levantamento desta ·á dignidade
de villa. Restava só designar qu~m havia de reger a povoação,
e quaes as suas leis, para a obra ser completa.
Sobre um .e outro ponto havia o goverp.ador antecipada-
mente disposto . . Poude, pois, recolher-se sem demora ao rio
Negro, a esperar os demarcadores, emquanto o missionario se
retirava para uma aldeia vizinha, a dos Abacaxis, pertencente
tambem á sua Ordem. A administração dos indios e o go-
verno da v.illa ficaram a cargo de um official militar. A expe-
riencia, d'ahi 'resultante, tinha de servir de molde á transfor-
mação successiva das outras aggremiações indígenas, dirigidas
f>elos missionarios.
Tão . obscura ficaria na historia a aldeia de Trocano como
o tem sido a villa, que lhe suê:cedeu, não fôra o incidente dos
canhões. Os que salvaram _em presença dt; Mendonça eram
duas peças de pequeno alcance, levadas para ali annos atrás,
(
•
A EMANCIPAÇÃO DOS INDIOS
..
'.
J
'
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
t
A EMANCIPAÇÃO DOS INDIOS
•
l
272 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ •
'
A EMANCIPAÇÃ~ nos· INDIOS 273
· 1 ••• ~Sendo hós- os protectores das liberdades, pcir cujo respeito tem"os
padecido tanto neste Estado, não queriamos nem podíamos possuir algum
escravô, que não foss~ legitimo; assim como.taqibem não estamos para per-
der os que são verdadeiros, e que possuímos com bom e seguro titulo, dan- ·-
do·os, como quer o governador, por livres».-Carta d,o padre Domingos An-
tonio, reitor do collegio do Pará á rainha. Ms. da Bibl. de Evora.
35
•
274 OS JESUITAS N.O GRÃO"'PARÁ
~/
A EMANCJPAÇÃO DOS iNDIOS 275
-·'
•
A. EMANCIPAÇÃO ,. DOS INDIOS
'
•
os JÊSUITAS NO GRXOPPA:l!Ã
•
(1
A EMANCIPAÇÃO DOS lNDlOS 279
.
•
•'
•
f·
meio de defesa talvez inconsciente, mas o uriico efficaz. Em
toda a vastidão do contínente americano, o só Jogar onde as
communidades inqigenas prosperaram, aproveitando da civili-
zação a parte material adequada ao seu temperamento, pode-
se dizer que foi o Paraguay, lá onde os jesuítas tinham esta-
belecido as reducções. Depois das crueldades 'sem · nom\'.! d~
conquistadores do Mexico e do Perú,. e ao tempo que no ter-
ritorio portuguez a oppressão dos colonos rapidamente prose-
guia a sua obra destruidora, os missionarios da Companhia
tinham logrado estabelecer, em terreno neutro, um abrigo para
as reliquias da perseguida raça. Vedado á cubiça dos forastei-
ros por leis prohibitivas, e regido por uma branda tyrannia,
á s.o mbra da qual prosperava, o territorio das missões consti-
tuía quasi uma nação autonoma, encravada nos domínios de
Castella. Esta soberba creação dos jesuítas foi a experiencia
fundamental das ét!Jtidões çia gent~ .indiana. O que para esta
podia valer a nossa civilização, bem como as idéas de lil:>er-
dade e individualisíno que lhe são proprias, colhe-se dos resul-
, tados obtidos. A nullidade destes, desfazendo.se a obra dos
jesuítas, logo que foi destruído o seu regímen, não prova, como
muitos querem, contra a razão . dd systema: demonstra si_m-
plesmente a incapacidade da materia, sobre a qual elle agia.
A nossa concepção dos destfoos humanos repugna a hu- ·
milhante tutela, material e mental, em que os missionarios
co~servavam seus neophytos; trias não' surtiu melhor o metho-
, e o que
'do contrario; .
da comparação ficou patente foi a in-
fluencia fatal do anjbiente da civilização européa, sobre a raça.
. conquistada. Podia, muito embora, preservai-a de completa
anniquilaç'ão o systema..jesuitico, que era a continuação da: exis-
tencia selvagem, com o seu communismo rudimentar, e um
est~do mental, caracterizado pelo amalgamá das crenças genti-
licas anteriores com as superstições novas do ~:tholidsmo.
Entregues a si. os índios, ou volviam gradualmente aos seus
matos, e á primitiva rudeza, ou tinham de s uccumbir, persis-
tindo nas relaçõe~ coi.n a raça mais forte. Do nõrte ao suJ do '
continente foi este o seu destino. E m umas partes dewad.a nte
,servidão;, ·em outras o iexilio para os confins da zona ci~iliza
da, nas terras que a compaixão dos invasores lhes outorga; a -
breve trecho, por uma · e outra forma, a sua total extincção. ·
)'
/,/
, .
.. A DERROCADA
•
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
. (
A DERROCADA
".
•
286 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
e
A DERROCADA
•
288 OS JES ~ ITAS NO GRÃO-PARÁ
II
o
OS JESUITAS NÓ GRÃO-PARÁ
(
A DERRO"CADA
•
OS JESUITÃS NO GRÃO-PARÁ
serv!lnt is much hurt ••• This blow is thought to have been designed against
the man, ·not against the master. » SMITH, Memofrs of the Marquis of Pom- -
bal, vol. 1, pag. 210.
1
«Illuxit tandem anno 1755 fatalis ilia dies, quae . totum· Portugal-
lire regnum, civitatem prresertim Ul!ysiponensem terribilli ille terrremotu
concussit, quem P . Malagridre fuisse a Deo revelatum non pie tantum, sed
quasi certo creditur. »-Carta do padre Bento da Fonseca em MÜRR; fournal
für K1mstgeschicbte, tom. 16. - --
( .
294 OS JESUITAS NO G~O-PARÁ
• (•
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A DERROCADA 295
t · « Vix erat domus ulla, qure rere alieno, prresertim post terrre motum,
non laboraret. Collegiis et Conimbricenci . et Paraensi (hrec erant omnium
maxima; pri~um enim ducentas alterum personas 100 numerabat) succur-
rere debebant domicilia minora, ad debita paulo citius expungenda. »-His-
toria pe~secutionis Societatis Jesu in Lusitânia, em MÜRR, ,Journal cit., vol. 8,
pag. 96. ·
2 Despacho do enviado allemão Klevenhüller,.de 17 de dezembro de
17 58: « Die drei Staatssecretarii sind bestandig dergestalten um den Konig dass
·je einer wechselweis um den andem hei dem Konige wacht, und nahe an
seiner Kammer übernachtet. » --Citado em DUHR, Pombal sein Charakter und
seine Politik, pag. 84. .'' . .
••
OS JESUITAS NO GRÃO-PÂRÁ
(
A DERROCADA 297
38
•
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
IV
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•
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300 OS JESUIT~S NO GRÃO-PARÁ
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A DERROCADA 301
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302 OS JESUlTAS NO GRÃO-PARÁ
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-A DERROCADA
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OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
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A DERROCADA 305
VI
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OS JESUITA~ NO GRÃO-PARÁ
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A DERROCADA
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OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ -
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EPILOGO
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310 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
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- 3 I 2' OS J ESUITAS NO GRÃO- PARÁ
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~PILOÚO · 313
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EPILOGO
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. OS JESUlTAS NO GRÃO-PARÁ
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EPILOGO
II
1 Pag. 129.
2 Como por exemplo os quinhentos mil, em que fala Simão Estado da
Silveira na Relação ~tmmiaria, atrás citada, pag. 128.
•
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EPILOGO 319 .
FIM.
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APPENDICE
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OS JESUITAS Nó GRÃO-PARÁ
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APPENDICE
NOTA-~
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OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
NOTA_!C
V. P .Ji Maragn.
R.de in Xpo P.
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APPE:NDlCE
R. V.ae
servus in Ch."'
lgnatius Vicecomes.
II
•
•
328 OS JESUtTAS NO GRÃO-PARÁ·
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APPENDICE 329
•• •
330 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
III
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APPENDICE 331
Servus in Christo
~icbael Angelus Tamburüms.
•
•
332 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
IV
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f;
APPENDICE 333
centi, aut trecenti congii, seu metretae gariophylli, quos etsi P. Visitator
O rlandinus partim applicavit Ecclesiae Paraensi, et partim Ecclesiae Mara-
gnonensi; illos tamen applicamus conductioni operariorum; nam Missio gra-
vata est Ulyssipone in septem millibus cruciatis, et ultra. Serenissimus Lusi-
taniae Rex concessit, ut quilibet Missionarius possit habere ad suum obse-
quium viginti quinque Indos uxoratos; sed nostri cum gravi nota externorum
utuntur pluribus Indis. Quapropter R. V·ª in hoc diligenter invigilet praeter-
quam quod id fieri non debeat, esset maximum dedecus Societatis, si idipsum
deferretur per nostros adversarios ad Serenissimum Regem.
Cum paucissimi sint socii, qui ordinarie assistant in Collegiis Maragno-
nensi et Paraensi, necesse est ut utrobique assignetur Confessarius, qui ha-
beat licentiam absolvendi a reservatis. Haec, et alia sibi scripta communicet
R. V .a P.ri Visitatori, ut uterque unitis viribus. egregie •.•
• . • Missionis. Neque unus vel alter se - excuset, quod impediantur
adinvicem; ·quia tunc erit culpa utriusque; eo quod noluerint mutuo concor-
dari, quod certe non speramus. Ss. (sanctis) R.ae V .ae Ss. (sacrificiis) me
impense .commendo. Romae 22. -0ctobris 1712.
R. V.ae
Servus in Christo
:M:ichael Angelus Tamburinus.
•
334
0
OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
Etsi Theologi ibi, finito 3·º examine Theologico possent accipere con-
clusiones ad Gradum, ut citius convolarent' ad Missiones, volumus tamen,
ut in futurum absolvatur quadriennium Theologicum; nam sic evadunt do-
ctiores, et maturiores. Excipimus aliquem casum, in quo aliqua missio quasi
extreme 'indigeret ; et time posset dispensari cuni uno vel altero in aliq uibus
mensibus post 3.um examen Theologicum. Quando ibi nostri nequeant habere
3.um annum Probationis, debent habere integrum mensem exercitiorum Spi-
rítualium, ut ubique fieri solet in simili casu. .
Praedecessor ,R. V.~e in ultimis !itt.is nobis proposuerat sequentia du-
bia in hunc modum. Solent Missionarii hujus Missionis a multis annis eam
partem Indorum, quam Seren .mus Rex ad ipsorum servitium assignat, certis
anni temporib'us mittere ad colligenda semina cacai, avellendamque gario-
philli corticem, ut emant, quae ad Ecclesiae ornamentum, et fabricam sunt
necessaria, ad vestiendos pauperes, aegrotorum medicamina, et levamen, cul-
tra, bipenes, falces, et similia, quibus indiget paupertas Indorum, eo magis,
quo remotiores sunt missiones.
Quaeritur modo, utrum, posito, quod cacaum et gariophyllum sint ar-
bores agrestes in terris a nemine habitatis, vel habitatis ab íllis, qui nullo in
pretio habent cacaum, et gariophyllum, liceat hoc, vel non Iiceat Missionariis,
non habentibus aliunde, a quo possint obtinere huj~s modi res, et quae ne-
cessaria sunt ad munera praestanda gentilíbus, cum quibus volunt pacem
stabílire, ut Fides introducatur .
Quaeritur etiam, utrum Rectoribus licuerit hucusque id facere cum In-
dis Coll.iis, ut necessaria pro Coll.o emerent, quae alio modo hucusque non
poterant habere? Isti enim sunt contractus, quos reprobant ipsimet, qui in-
troduxerunt, cum missiones erant pancissimaé, nec tot gentiles, quod hodie
suis e sylvis extrahebantur.
Ut antem plenius respondeamus his dubiis P,is Ferreyra b. m., R. V.•
de iisdem audiat omnes seniores in ista Missione, et una charta collígat
eorum notitias, et íllas ad nos mittat; sic enim singulís satisfacíemus.
Ad aliud dubium ibi pariter exortum, ad quem·, scilicet, devolvatur ju-
risdictio, si non acceptet nominatus a Sup.re d,efuncto, jam respondimus, eam
jurisdictio1_1em devolvi ad Rectorem Maragnonensem, si Visitator nominatus,
vel confirmatus a Generali Socíetatis, non velít ali um nominare; quia ejus-
modi Visitatores habent eandem potestatem, qua fruuntur Provles. Praeterea,
si detur casus, in quo Sup. 0 r moribundus, dum modo sit bene sui compos,
dicat soli suo Confess. 0 se nominare hunc, vel ullum in suum successorem,
valet utique nominatio.
Intelligat subinde R. V.•, quod de jur~ Societatis nemo possit aperire
litteras Generalís (aut etiam P . P. Assistentiuth) sive absit, sive. obierit ille,
ad quem Gener<ilis scribit, et litterae deberent comburí. Sed cum in Iocis re-
motioribus detur specialis difficultas propter bonum regifnen, utimur hac
providentia in casu mortis (cum de Sup.re absente nulla possit esse contro-
versia) ubiprimum pervenerint hujusmodi litterae at V. Sup.or, si praesens .
sit, aut Rector convocct ad consultatiooem, et coram consultoribus numeret
litteras Generalis, combustis alíorum lítteris, , et in publico íllas tradat P.
Praefecto Spirituali, qui postea eas aperiret, et leget, apertasque tradat illi,
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APPENDICE 335
qui fuerit. V. Sup.or, si in ipsis nihil inveniat contra ipsum, si autem inve-
niat, illud non debet tradi, sed comburi. .
Informationes ad gubernandum, quas misit ejus praedecessor, non sunt
confectae juxta paradigma Societatis, ideo novae conficiantur, et scribantur
in folio chartae, et singulae non sint separatae in diversa chatta, sed ·una
scribatt.ir"successive cum distinctione post aliam.
Bene revocavit R. V.a P. Joannem Murcott in CoU.um, ut examinentur
factae de eo delationes; et gaudebimus, si deprehendetur innocens; illius
autem perseverantia pendet ah exemplari t:mendatione. Cum multi defendant
P. Claudium Gomes, de illo diffusius scribimus ad P. Visitatorem, qui hac
de re aget cum R. V·ª· Casus vero solicitationis debet melius examinari cum
omnibus circumstant.iis, qui si verus sit, ille debet privari ab audiendis con-
fessionibus, et pejus foret, si ille mitteretur in Brasiliam. Unde ibi res tota
decidenda est, attenta penuria opcrariorum, ac illius emendatione. De Fr. Jo-
st>pho de Moura jam scripsimus Octobre, et si ille potest conservari cum
emendatione, conservari debet ,· est enim aliunde benemeritus.
Cum ista Missio paulo ante fecerit plures expensas, et faciet, s1 mve-
niantur duo :professores, ut diximus, judicavimus suspendere emptionem li-
brorum de nastro Instituto. Si tamen R. V .a existimet illos adhuc emi posse,
de eo nos moneat, et quod corpora emenda sunt.
Meritas agimus gratias P. Proc.ri Brasiliae pro solicitudine, qua favet
isti Missioni, et illas jam egimus P. Prov.li; ~undemque Proc.rem mónemus
de qualitatibus recipiendoram. Si Coll." Conimbricense, et Eborense non
alunt gratis Missionarias Maragnonenses, eos Rectores monebimus, et jam
fecin:ius reprehendere illos; qui minus religiose impediebant alios, -ne se con-
ferrent in Maragnonium.
Praedecessor R. V.ae ad nos scripsit, quod missione Canuma, et Aba-
caxis, mortuis P.e Francisco Xaverio Maloves, et P ..; Laurentio Homem, ha-
bebant in Coll. 0 Paraensi 400 congios cacai, et 600 gariophilli, ab aliis se-
paratos, proponebatque, an illae merces forent mittendae Ullyssiponem, quo-
rum lucrum poneretur ad censum, ut inde· emerentur necessaria pro illis
Miss.ionibus? Concedimus faculta tem ad hoc, dummodo in Lusit.• non eman-
tur stabilia, ne saeculares magis murmurent de multis divitiis Societatis.
Ss. R. V.o.e Ss. me valde commendo. Romae 29. Julii 1713.
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Servus in Christo,
Dveicbael Angelus Tamburinus.
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OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
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R. in Xpo P.
P. Caietano Ferreyra Prov.•• Maragnonensis V. Prov.li, Parae.
2.• via.
Antequam Romã pervenirent Literae, quas R. V. subscripsit mense De-
cembri superiqris anni, aliam acceperam 6 Octobris datam, in qua dicit
nullã meã responsíonê ad Maragnonium appulisse, quod mibi novum non
accidit, seio enim dietas responsiones post discessum naviíi Maragnonensiíi
Ulyssiponem perlatas fuisse; easdem, ut spero, cum bis accipiet R. y. praesenti
anno. Respondeo igitur iis, de quibus modo me monet. Et in primis. ipsi
gratias ago pro labore, et solicitudit}e, qua Collegia visitavit; et licet, in bac
visitatione omnia recte peregisse comperiam, illud mibi maxime placet, quod
omnes compulerit, ut exercitiis S. P. N• vacarent; maximo jure enim desi-
dero, et Superioribus comendatíi valo, neminem unum sinant b;;nc sanctis-
simam functionem praeterire, nisi quis omnino sit impeditus, id est, graviter
infirmetur ;· coetera nanque impedimenta deponi debent, et ea maxime, quae
de rebus et negotiis saecularibus provenire castigaverit. pnde R. V. optime
injunxit Sociis Domus Visiensis, ut pro babendis dictis exercitiis dies dupli-
carent in compensationem eoríi quae omiserant. Mibi etiam gratissimum erit,
si Socii, qui per praedia, et residentias existunt, ad Collegia se receperint se-
mel in anno, ut Laudata exercitia serventius, et majori cum perfectione, per-
agere possint; quare de hac mea voluntate, et commendatione omnes co-.
munefaciet et nullo modo in posterum permittat extra Collegia manere scilito
tempore exercitiorum. Quod si aliquis ex supra memoratis locis ita longe
distat, ut Socii sine maxima incommoditate ad Collegium se conferre ne-
queant quod a R. V. judicand~m erit, attentís etiam personae circumstantiis,
v. g. senectute, debilitate, etc. ali um determinet, ubi quietius, et a tempora-
lium strepitu semoti Deo vacent.
Quaestionem super Indorum examine vidi, et P. Procuratorê Ulyssipone
existente monui, ut de ilia coram Serenissimo Rege quam primum ageret,
prout a R. V. sibi comissum fuit; plurimum tamen desidero, ut, quantum
fieri poterit, similes controversiae declinentur, ut omnis praecidatur occasio
obloquendi, etiam iis, qui minus affecti sunt . Et probare non possum imatu-
rum, et praecipitem admissionem Bartholomei Antonii, de quo expectari de-
berent informationes necessãriae tum de sanguine, vita et moribus, tum
etiam de. impedimento resuÍt-ªnte ex bomicidio, dum illud non probatur mere
casuale, et citra ctllpam Tbeologicam commissum; ad bane autem probatio-
nem nullactenus sufficiens est ipsius. occisoris testimonium. Igitur super hac
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APPENDICE 331
R. V .
. servus in Xpo
Franci:cus Rctz...
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• 338 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
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APPENDICE 339
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340 • OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
mais prudentes informações, é sem a menor ·duvida que lucram nelle mais
de cem mil patacas liquidas, segundo o sobredito calculo dos homens mais
prudentes, e que maior voto tinham nes!_a materia.
O commercio da terra não é menos importante, · porque delles são os
azeites de andirob'a, manteiga de tartarugas, salgas . de peixe, uma grande
parte das carnes, farinhas, feijões, arroz, e finalmente quasi todos os comes-
tíveis, e um grande nup1ero de arrobas de algodão, ássucar e· aguardente;
os officiaes das artes fabris, como pintores, entalhadores; pedreiros, fer-
reiros, tecelões, e finalmente até oleiros, conservando-os- nas suas fazendas,
nas quaes tem estabelecido umas grandes fabricas de olaria, vendendo nellas
tanto tijolo e telha como louças, por um preço mais de dobrado do que se
costuma vender em Lisboa, cujos officiaes continuamente trabalham a favor
·do commum da sua religião, deixando-lhe um grandíssimo lucro; e pagando
a estes officiaes pelo limitadíssimo preço de vinte e quatro varas de panno
grosso de algodão, quando são das aldeias da ·repartição, e, quando são· das
suas privativas, não recebem mais que a doze, até quinze ·varas, vindo por
esta forma .a ficarem senhores não só da grande importancia daquelias obras,
mas tambem do suor destes miseraveis officiaes.
• Tenho demonstrado a V. Ex.• brevissimamente os lucros que estes pa-
dres teem ; agora será preciso tambem participar a despesa que fazem, para
·que V. Ex.• comprehenda bem a sinceridade, com que estes religiosos affir-
mam que teem. grandes empenhos, e que se lhes devem satisfazer.
Os vestidos, sendo os mesmos que em toda a parte, tem aqui a grandis-
' sima differença de que muitas das roupetas são de algodão grosso, tintas na
terra, e as capas não passam de seis, que são ,do commum dàquelles religio-
sos, que primeiro saírem para fóra. Os chapéos entendo que duram a vida
do religioso, a quem se dão, e os sapatos grossos, de duas solas, são feitos.
em casa, pelos seus officiaes, e de cabedal tambem fabricado nas suas fazendas .
O comer é m·ais ordinario que em outra alguma parte, reduzindo-se
todo o manti.mento, que se gasta no collegio, á vacca que vem dos seus cur-
raes, peixe salgado que lhe fazem os índios, arroz, farinha e feijão das suas
fazendas, e manteiga de tartarugas, que tambem lhes. fazem os indios.
Sendo este o gasto grosso, que se faz com a sustentação dos padres, só
restam os generos -que mandam vir do reino para a sua subsistencia, como
são vinhos, vinagres, azeites, e farinhas. ·
Quanto aos vinhos, são inteiramente da quinta que possuem em Carca-
vellos, comprados com o dinheiro desta v.ice-provincia, para o fo"!ecimento
dos collegios e aldeias. Os azeites, vinagres e farinhas creio que se compram
em Lisboa, porém são transportados a esta cidade sem pagarem direitos em
parte ·alguma. •
De todos os provimentos que vem do reino, em nome do corrimum do
collegio, se fazem' os das aldeias, pela forma que referirei a V. Ex.ª. Faz o
procurador das Missões relação do que lhe é preciso, para caéla uma das al-
deias e, separando aquellas parcellas, e carregando-as a cada um dos missio-
narias, pelos mais altos preços, que corre_m na terra depois de partirem os
·navios, são cobrados pontualissimamente, pelos efeitos que vem do sertão,
que . todos se recebem na Procuratura, vindo desta sorte a .fazer um grossis~
APPENDICE 341
•
• lt
342 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
Porque isto só poderá fazer algum peso, dito em Lisboa, e se alguem não
tiver bastante noticia destas materias; mas aqui no Pará· não pode merecer
credito algum, porque além de que a estes padres lhes dá Sua Majestade
95olooo réis cada anno para a subsistencia dos missionarias, maior congrua
que a todos os outros, nem por isso· fazem maiores despesas do que elles,
nem menores negociações, como é publico e notorio; e se os outros se não
empenham não tendo tão boa economia como elles, como haviam de con-
trahir as·divigas que affectam, tendo nestas materias·tanto desvelo como a to-
dos é constante?
Fazendo· a este respeito uma evidencia notaria do que p~ssa na aldeia
dos Sacacazes, da ilha de Joannes, na qual, porque teve dois religiosos suc-
cessivos, ·que com zelo cuidaram na sua obrigação, não tendo a dita aldeia
outro algum commerc;io mais que o ,de um pouco de peixe sêco, fizeram
toda a prata que julg~ram precisa para a igreja, a qual dizem que importa
cm mais de 6:000 cruzados, e vestimentas que valem mais de dois, e se aqüel-
le pequeno commercio, porque houve os dois religiosos que cuidaram na sua
obrigação, produziu um tal effeito, julgue V. Ex.~ a que sommas terá che-
gado o das outras aldeias, aproveitando-se das preciosas drog~s do sertão, as
quaes aquella não mandava.
Ultimamente farei a V. Ex.a uma combinação desta aldeia dos Sacaca-
zes com a de Trocano, que hoje é villa de Borba a Nova, e por ella compre-
henderá V. Ex.• a boa fé e sinceridade, com que o padre Visitador pede o
pagamento das dividas, que só existem na sua prevenida idéa.
Não tendo a aldeia dos Sacacazes mais do que o pequeno ramo de com-
'', mercio; que acima disse, se conserva não só sem divida alguma, mas teem
( aquelles índios enriquecido a sua igreja de alfaias, em forma que passa o seu
valor de 8:000 cruzados; e a do Trocano, que sempre fez um grossíssimo
negocio de cacau, salsa, cravo, copahiba, manteiga e salgas ·de peixe, não ha
nella igreja, porque uma palhoça que servia daquelle ministerio se queimou
ha muitos annos, e nunca mais se cuidou em fazer outra; não ha paramen-
tos decentes para se dizer missá, por que os que se acharaín são indignos de
se celebrar com elles; e finalmente não ha naquella povoação cousa que boa
seja, e, sem gasto algum que' se possa ver, diz o padre Visitador que deve á
Procuratura 900 e tantos mil réis; sem mais prova que a liberdade, que to-
mou, de fazer aquella representação .
. Ainda que. considero a V. Ex.•· complet.amente Í!;1formado dos interesses
deste Estado, pareceu-me indispensavel do meu officio e da minha obriga-
ção participar-lhe estas certas e infalliveis noticias, para que, querendo estes
padres extorquir do Erario Real algumas 'sommas, com os affectados pretex-
tos _dos seus empenhos, .saiba V. Ex.ª a verdade deUes, para os fazer certos
a9 nosso Augustíssimo Amó: Deus guarde a V. Ex.•, etc. - Pará, 2 3 de
maio de 1757.
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344 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
Pastos Bons; e tem mais na capitania do Cumá tres ermidas parochiáes an~ .
nexas e subordinadas á freguezia, que são: S. Bento, S. José, e Nossa Se-
nhora da Agua do Lupe; com o que vem a ter todo o Estado vinte e quatro
freguezias e nove ermidas parochiaes, fora duas mais, que tem a cidade de
S. Luiz, de S. José e S. João, que é dos soldados, e outras duas na e.idade
dé Belem, que são a do Santo Christo dos soldados, e a de Nossa Senhora
do Rosario e ou.tras particulares,. que estão por varias fazendas.
4. Ha nelle quinze conventos de religiosos: quatro do Carmo, qua-
tro das Mercês, tres de Capuchos, e quatro da Companhia; dos do Carmo,
são dous no bispado do Pará, um na cidade, outro na villa da Vigia; e da
mesma forma dous da Companhia, e um das Mercês, que todos são senho-
res de muitas moradas de casas na cidade, e fazendas, pelo Guamá, Mojú e
mais rios capazes, e estes ultimos da maior parte dos gados da grande Ilha
de Joannes. Dos CapuchÓs tambem são dous: Santo Antonio, ~ S. José, que
ieem cada um suas duas fazendas, a que chamam Doutrinas, com muita gente.
5. No bispado do Maranhão teem dotis conventos os do Carmo: um na
, cidade da ilha, outro na villa de Santo Antonio de Alcantara ; e da mesma
forma os da Co.mpanhia e Mercês; e estes teem -mais outro no rio Mearim, e
os de Santo Antonio teem um na ilha,. tambem com duas doutrinas, com
muita gente como os mais, e todos os outros com muitas fazendas e gente
de toda a qualidade. Além destes h; seis hospícios, tres dos Capuchos no
bispado do Pará, na cidade, no Cayá, e no Gurupá, que têm cada um suas
duas doutrinas, como os mais; e ~res dos padres do Carmo; dous no Estado
do Maranhão, um na ilha e outro nas Aldeias Altas, que teem suas fazendas
de terras e gados, com bastantes índios fôrros e escravos, e outro no districto
do Pará, no rio Negro, d'onde dão providencia ás dependex:icias dos missiona-
~ rios. Além destes ha tres resi.dencias da Companhia no Estado do Maranhão:
· uma na Ilha, e duas no sertão da Tutoya, e Aldeias Altas, a que vão aggre-
gando fazendas de cultura, gados e escravos, com doações e compras como
. nos mais convent~s. Teem mais estes mesmos tres seminarios, um na cidade
do Pará, outro na do Maranhão, e outro no rio Parnahiba, onde nãó ensi-
nam senão por dinheiro, e procuram ir aggregando a cada um as fazendas
que podem adquirir .. Com o que, em summa, vem a haver em tedo o Es-
tado vinte e sete casas de regulares, fóra· as das fazendas, engenhos, e mis-
sões que lhes estão entregues. ·
6. Contém-se néste Estado sete capitanias: as do Piauhy, Maranhão, e
Pará, que pertencem in totum a Sua Majestade, e as do Cumá, Camutá,
Cayté, e Ilha grande de Joannes e Marajó, que pertenc;em a donatarios. A
do Piauhy contém as povoações e fazendas que vem dos·confins da capita-
nia do Ceará e Pernambuco, até ao rio Parnahiba: a do Maranhão com-
prehende as que medeiam entre o dito rio Parnahyba e o Pinaré; e a do.
Pará principia pela parte esquerda do Guamá, e segue tudo quanto alcança o
districto da Vigia e sertão das Amazonas e Cabo do Norte· até os ultimos
confins já declarados, em que entra· a capitania do Cabo do Norte antiga,
que foi extincta. A capitania do. Cumá principia do rio Pinaré, e ponta de ·
Tapuitininga, e alcança toda quanta terra medeia destes extremos até o rio
Gurupy, correndo cincoent~ leguas pela c~st~; e a do Cayté principia do rio
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APPENDICE 345
Gurupy, e vae correndo a costa outras cincoentas leguas até o Guamá, rio
na sua barra caudaloso em que finaliza; e a do Camutá extenck-se a tudo
quanto medeia entre o Mojú e o Tocantins; e a da Ilha Grande de Joannes
comprehende tudo o que contém a sua muita extensão.
7. Nas duas capitanias do Piauhy e Maranhão entende o governador
do Maranhão; e o do Pará em todas, como governador e capitão general.
Nas tres de Sua Majestade ha nove fortalezas, duas no districto do Mara-
nhão, uma á entrada da cidade, e outra no rio Itapec~ru; e sete no districto
do fará, uma na barra da cidade, e seis nos districtos do sertão das AmazoM
nas, no Macapá, Parú, Pauxis, Gurupá, Tapajós, e rio Negro; além disto
ha mais tres fortins, dois na cidade do Pará, e um no Maranhão; e tres ca-
casas fortes, duas neste mesmo Estado, no Iguará e Mearim, e uma no do
Pará, nas cabeceiras do Guamá. ·
8. Ha em todo o Estado cincoenta e sete rios mwegaveis; e muitos pata
mezes, fóra infinitos riachos de menor conta, dos quaes correm seis pela ca-
pitania do _Piauhy que são: Igaruçú, Piauhy, Canindé, Gorugueia, Poty, é
Soroby, e um que é o Parnahyba em que todos entram pelo sul, que a di-
vide çla do Maranhão. E por esta correm dez, que vem a ser: rio das Balsas,
e Riachão que entram no dito Parnahyba pelo Norte, e o Preguiças, em que
entra ·o rio .Preto, que saiem do sertão do Iguará; ltapecurú em que entra o
das Alpercates; Moni, em que entra o Iguará; e M_earim, em que entra o
Guajaú pela direita, e mais o Pinaré que divide esta capitania da do Cumá;
nesta ha o de Orutinguaba, Ariparig!Jaba; e Turyassú, e o do Gurupy que a
divide da capitania do Cayté, da qual sai sómente o Pereá, .e o Guamá que
a divide da do Pará.
9. Nesta do Pará h,a os rios Moju, Capim, Acará e o grande rio das
Amazonas, em que enrtam pela direita os rios Irijó, Jary, Trombetas, Ja-
- mundás, Urubú, e o famoso rio Negro, em que entram o Jaquipiri, rio Bran-
co, Catabuhu,.. e Caíary; e continuam ainda por esta parte no Amazonas os
rios }apurá, Içá, e Napo, e pela esquerda os rios _Xingu, Tapajós, e o cele-
bre Maçleira, em que entram o Mamoré, Aporé, e Sararé; e continuam ainda
no Amazonas por esta parte. os rios Purús, Coary, Catuá, Cayame, Teffé,
.Juruá, Jutahy, e Javary; e_na capitania do Camutá entra o rio Tocantins; e
na de Joannes o rio Marajó. -
10. Tem mais o continente do Estado trinta e cinco bahias, por onde
se navega em canóas, algumas tão grandes que se perde nellas vista "de ter-
ra. Destas são quatro situadas na capitania do Maranhão, que são as do Pe-
reá, Moconuduba, Quebrapotes ou S. José e a de Tapuytapera; e quatorze no
districto· da capitania do Cumá e sua costa, ·chamadas Cumá, Curimattá, Mo-
cunanduba, , Cabello de Velha, Carsapueira, Turirana, Turyassú, Matuoca,
Carará, Maracosamé, Pirocava, Ti.romáhuba, Guiririba, e Guiririba Mearim;
e na capit!lnia do Cayté e sua costa nove, que são Gurupy, Pereátinga, Pe-
reáuna, Toqueemboque, Giramonga, Senambola, Punga, Manigituba,_ Cayté;
e na do Pará oito, que são Maracaná, Cotipurú, Mariquiguy, Piramerim,
Guarapijó, Salinas, bahia do Sol, e de Santo Antonio.
1 1. Ha em todo o .Estado trinta e um engenhos reaes de fazer assucar:
cinco na capitania de ?· Luiz do Maranhão, em que entra um dos padres do
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OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
Carmo, no rio ltapecuru, com mais de duzentos escravos, que não faz nada,
e dous na capitania do Cumá, em que entra um dos padres da Companhia;
e vinte e quatro no Pará, um dos padres da Companhia no Mojú, e outro ·
dos do Cârmo no Guamá, ambos afamados pela muita quantidade de gente
que conservam, e os mais dos moradores, que quasi todos se occupam em
fazerem aguardente, de modo que se vende o assucar por pouco, sendo mau,
a tres mil réis a arroba. E além destes ha em todo o Estado cento e vinte
engenhocas de aguardente, quarenta e três na capitania do Maranhão, que
vem a ser: uma na freguezia de Pastos Bons, tres na de S. Bernardo da
Pamahiba, uma nas Aldeias Altas, duas na do Icatú, quatr9 no Mearim,
vinte e duas na do ltapecurú, e dez na ilha do Maranhão; e na capitania do
Cumá trinta e cinco; e nó Estado do Pará quarenta e duas, duas na capita-
nia do Cayié, quatro na do Camutá, cinco na villa da Vigia, e trima e uma
·. em todo o districto do Pará. E só para esta fabrica ha applicação summa, e
della tamb.em muito cuidam o regulares, a quem pertencem algumas das
que estão declaradás.
12. No mesmo Estado todo se acham quatrocentas e quarenta e oito
fazendas de gado vaccum e cavallar, de que pertencem duzentas e quarenta
e cinco á capitania do Piauhy, que quasi todas são muito populosas, e destas
vinte e tantas á administração dos padres da Companhia da Bahia; e cento e-
sessenta e tres á capitania de S. Luiz do Maranhão, quarenta e quatro situa-
d~s 11a extensão de ce'nto e vinte leguas que tem a freguezia de Pastos Bons
donde não tem entrado religiões, e trinta e cinco na das Aldeias Altas que
terá de extensão cem leguas, nas quaes entra uma do ·carmo, e outra da
Companhia, e trinta e uma na de S. Bernardo que tem de territorio cincoen-
ta leguas, em que entram dez da Companhia, e vinte e .du.as na do lcatú que
terá o mesmo territorio, em que entram duas dos padres das Mercês, e vinte
e cinco no districto do rio Mearim, que poderá ter trinta leguas, em que en-
tram tres do Carmo, tres da. Companhia,_e uma das Mercês, e seis no Ita-
pecurú, ·que terá de districto quarenta leguas, em que entram duas da Com-
panhia e uma do Carmo, e as mais dos moradores; e na capitania do Cumã
ha quarenta, de que pertencem oito á Companhia, duas ao Carmo, e uma ás
Mercês; com o que vem a ter os regulares em todo o Estado cincoenta e
Cinco fazendas de gado vaccum, e cavallar. E no Pará são seµhores, a Com- ·
·panhia, Carmo e Mercês de quasi todo o que dá a grande Ilha de Joannes
no districto do Marajó, e ainda que lá 'tem curraes i:nais outras pessoas secu-
lares, são todos pequenos em comparação dos dos regulares. Fóra disto ha
varias · fazendas de frades do Carmo e Mercês, em particular cheias de i,n-:
dias, a que ellcs chamam aldeias proprias. Ha mais na capitania do Cumá
umas salinas da natureza, que quando tomam agua do mar, nas aguas de
setembro, e lhes corre o tempo, dão sal para sete annos, e se perde a maior
parte por não poder aproveitar-se; e no districto do Maranhão um engenho
real de serrar madeira, sem exercido por estar quasi arruinado.
13. Tem ma!s todo o Estado duas cidades, que são as de S. Luiz do
Maranhão e a de Nossa Senhora de Belem do Pará, e sete villas: tres da
corôa, duas no Estado do Maranhão, que são lcatú e Piauhy; e uma no do
Pará onde chamain a Vigia; e quatro de donatarios que são: S~nto Antonio
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APPENDICE 347
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OS JESUITAS NO GRÃO- PARÁ
NOTA-F
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APPENDICE 349
do que ·se lhe podia conceder; por cujo motivo.fui servid~ declarar, por oi:·
dem do meu conselho ultramarino, de 21 de março de 1747 por nullas as
licenças, que a mesma junta das missões tinha dado para os captiveiros que
em virtude della se fizeram, ordenando que. os indios se puzessem em liber-
dade, e que se recolhesse a tropa de resgate que, contra a fórma da dita lei,
andava fóra havia annos, cuja ordem fui servido confirmar por resolução de
13 de julho de 1748.
6. Para conter estes desordenad9s procedimentos, e evitar tão conside-
. ravel damno, sou servido declarar que nenhuns destes indios poss:nn ser
escravos, por nenhum principio ou pretexto, para o que hei por revogadas
todas as leis, resoluções e provisões que até agora subsistiam, e quero que -
só vall1a esta minha resolução, que fui servido tomar no decreto de 28 do
corrente, que baixou ao conselho- ultramarino, para que todos os moradores
do Estado cuidem em fabricar as suas terras, como se usa no Brazil, ou
pelo serviço dos mesmos indios, pagando a estes os seus jornaes e tratando-
os com humanidade, sem ser, como até agora se praticou, com injusto, vio-
lento e barbara rigor.
7.· Para que os moradores daquelle Estado observem inteira e religiosa-
mente esta minha resolução, os persuadireis a que se sirvam de escravos ne-
,
gros, ·e que, servindo-se de indios, os tratem com caridade, e de fórma que
não experimentem os effeitos da escravidão, mas sim que convenham com
elles nos preços de seus jornaes; e podereis facilital-os a este modo de culti-
var as terras, na occasião presente, em que a epidemia, que matou tantos
indios os annos passados, dá occasião a mudarem de methodo, e facilitar-se
a pratica do que acima vos aponto, com a qual os indios possam gosar da
sua liberdade, nos poucos que restam daquelle contagio; e usareis de todo o
modo e prudencia por vos oppórdes ás difficuldades que muito póde haver,
e a fórma em que se devem vencer as muitas contradições, que olhareis em
um estabelecimento tantas vezes contestado em aquelle paiz, e que se enca-
minha a tirar um vicio, de muitos annos dominante nÓ mesmo Estado.
8. Para o estabelecimento acima referido cuidareis muito em examinar
as aldeias livres que hoje ha; e o numero dos índios que dellas se podem
tirar para o serviço publico, sem prejuizo ou detrimento ·do commodo parti-
cular das mesmas aldeias; de quantos mais indios se poderá necessitar, e
como se poderão descer, e attrahir voluntariamente pelo cuidado dos missio-
narios, que os exhortarão a virem cultivar as terras, propondo-lhes para esse
fim conveniencias, nos jornaes e commodidades que hão de perceber no
dito exercido, promettendo-lhes ao mesmo tempo o uso da sua liberdade e
conveniencia3, com uma fé inalteravel, que vós fareis executar e cumprir, de
sorte .que a experiencia confirme a estes indios em tudo e por tudo o que
com elles se ajustar. ·
9. Para se poderem aldear alguns indios· nas ald!?ias já estabelecidas, ou
nas que de novo se estabelecerem, fareis com que os indios, que de novo
forem para as sobreditas aldeias a estabelecer-se, achem nellas tudo o de que
.
se necessitar parà o seu estabele~imento, mandando-se-lhes prevenir até os
mesmos mantimentos, que forem mais naturaes e mais convenientes á sua
saude; porque por este modo se conservarão melhor, e assim se lhes dará
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350 OS JESUlTAS NYJ GRÃO-PARÁ
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352 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
voura das terras, e algumas sementes dos fructos, que mais naturalmente se
poderem produzir nellas.
19.' Recommendo-vos muito a extensão da cultura e povoação de todo
esse governo, conforme ~ opportunidade e occasiões que tiverdes para esse
effeitô, porém mais particularmente v9s ·encarrego de povoardes o districto
do rio Mearim, que fui servido mandar aldear por resolução de 7 de fevereiro
do anno passado, e tambem especialmente as missões do ..Cabo do Norte.,
onde cuidareis em estabelecer não só povoações mas tambem logo alguma
defensa, para fazer a barreira desse Estado por essa parte, evitando por esta
fórma as desordens e conquistas que por esta parte podem fazer os francezes
e hollandezes, para cujo fim mandareis missionarias, executando-se sem de-
mora nem admittir excusa a resolução que -fui servido tomar a estê respeito
em 23 de jull10 de 1748. . '
20•. Por carta assignada pel* real mão -Oo Senhor Rei Dom Pedro, meu
avô, em 19 de março de 1693, sé dividiram os districtos das miss,Pes entre
as communidades estabelecidas nesse Estado, ficando as missões da parte
do sul do rio das Amazonas aos padres eia Companhia, e as do Cabo do
Norte aos padres de Santo Antonio, sem limitação para o interior dos ser-
tões, mas de então para cá se descobriram novas terras, e todos os dias se
vão abrindo e conhecendo outras, que todas estão sem missionarias, nem .se
saber a quem pertencem, pelo que se faz precisa uma nova divisão, para cujo
effeito fareis as averiguações e tomareis as noticias necessarias, para me in-
formardes· do que será mais justo, para eu poder tomar resolução sobre esta
materia tão importac.te.
21. Por me constar que o vosso antecessor não executou a resolução de
23 de julho de 1748, acima referida, em que fui servido çirdenl!r que os pa-
dres da Companhia estabelecessem aldeias no rio das Amàzonas, seus colla-
teraes, e nos confins e limites dos meus domínios, para augmento da chris-
tandade nos indios, como tambem para a conservação dos domínios, e ter eu
agora noticia de que nos referidos sitias havia alguns missionarlos reÚgio-
sos do Carmo calçados, em cuja contemplação se' não executou a dita reso-
lução: sou servido ordenar-vos que em virtude della chameis ao vice-pro-
vincial da Companhia, e lhe encarregueis que logo e sem demora se estabe-
leça uma aldeia de índios no rio Solimões, que ainda que é o mesmo das
Amazonas, tem aquelle nome desde o rio Negro, até o rio Napo; na mar-
gem ·do sul, entre a bôcca oriental do rio Javary, e uma aldei~ que adminis-
tram os religiosos do Carmo, com a invocação de S. Pedro, como tambem
estabelecerá outra aldeia na bôcca mais occidental do rio ]apurá, jÚnto ás
primeiras cachoeiras do dito rio, mandando os missi<?narios que lhe parece-
rem mais aptos para este ministerio, os quaes estabelecerão as ditas aldeias,
onde entenderem serem mais uteis para a conservação dos índios, como
tambem para conservação dos meus .domínios por aquella parte do sertão,
ficando assim satisfeita por ora a divisão feita no anno de 1693, e a resolu-
ção de 1748. • •
22. Nas aldeias do Cabo do Norte, que nesta instrucção vos encom-
mendo muito .cuideis iogo em estabelecer, e as mais, que se fizarem nos li-
-mites desse Estado, preferireis s~mp:e os padres da .Companhia, entregando-
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APPENDICE 353
pendente dos ditos duzentos ~il réis, visto o pouco rendimento que presen7
temente teem as provedorias da fazenda.
25. Quanto aos recolhimentos deveis examinar os meios e condições,
com que se erigem, e vendo vós que não são proporcionadas as rendas
para a sua firme subsistencia e decente sustentação, embaraçareis a sua fun-
dação e estabeleGimento, servindo-vos de alguns pretextos, que desculpem a
inobservancia do decreto .de 23 de julho de 1750, e resolução de 18 de .ja- .
neiro de l 75 l, até que possaes dar-me conta particulamiente pela s_ecretaria
de estado: porém advirto-vos que esta inobservancia déve ser qualificada com' ,,.
a falta de meios de subsistencia destes ·recolhimentos, porque havendo-os
podem ser de alguma utilidade.
· 26. Pelo que respeita aos conventos de freiras, de que fala o referido
.decreto, não consentireis por nenhum principio na sua fundação, sem distin-
cta e expressa licença minha; sem embargo das clausulas do mesmo decreto,
de que os g1YUernadores lhes não poriio duvida; porque nas declarações que baixa-
ram com a resolução de 18 de janeiro deste presente anno, assignadas pelo
sécretario de estado Diogo de Mendonça Côrte Real, se declara na setima -
que os governadores não ponham duvida alg!1ma ás ditas fundações, que não seja
prudente e grave, para o maior serviço de Deus e de Sua Majestade; - e como
não vos faltarão duvidas prudentes, com que possaes justamente encontrar
estas fundações, as embaraçareis para me dar conta, consultando sempre com
o bispo, de quem me enviareis o seu parecér.
27. Recommendo-vos muito que procureis attentamente os meios de
segurar o Estado, como tambem os de fazer florescer o commercio, para se
conseguir o primeiro fim, além do que· fica dito a -respeito de se aldearem os
índios, especialml!nte nos lifriites das ·capitanias, e tereis o çuidado, quanto
fôr possivel, que se povôem todas as terras possíveis, introduzindo-se novos
povoadores . .
28. Fareis um exame possível, onde poderdes chegar, e encarregareis
ao governador do Maranhão-.que, no seu districto, faça a mesma diligentja,
para examinar as fortalezas, e reparal-as quanto fôr possivel, como tambem
para o estabelecimento de outras, sendo riecessarias; dando-me conta de tudo
o que a este respeito achardes sobre esta materia, e especialmente .sobre a
fortaleza que, em .8 de março de 1749, se me propôz ser precisa na costa de
Macapá, examinando logo qual ella deve ser, de que força, e os meios que
mais facil, e promptamente se podem applicar a esta o.bra; e vos advh10 que
tanto esta fortaleza como todas as demais, que se fizerem para defensa e se-
gurança desse Estado, se hão de fazer de fórma e modo que não pareça re-
ceio dos nossos confinantes, havendo ao mesmo tempo a cautela precisa,,
para qui: elles nos não surprehendam, para que pelos m~ios de facto não re-
novem as pretensões antigas, e não queiram impossibilitar-nos, para lhes dis-
putarmos em todo o tempo por' força.
29. Como considero que as tropas, para a defesa desse Estado, se acham
totalmente destituídas. da disciplina militar, e fiando do vosso zelo que as po-
nhaes em estado de me servirem, vos encarrego que me informeis do numero_
de tropas que poderão ser necessarias para o serviço desse Estado, á propor-
ção do paiz, da fórma que se devem fardar, do modo porqu,e se lhes deve
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356 OS JESUITAS NO GRÃO-PARÁ
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INDICE
PAG.
1755 Expulsão âe varios padres • 289
As preoccupaçõ~s de Pombal ·. 290
Crime do duque de .Aveiro. 291
Intervenção de Malagrida • 292
III. Destino dos religiosos desterrados. 2 93
Providenciâs no reino contra os jesuitás. 294
Consequencias do mallogrado regicidio . 295
A evolução da sociedade jesuitica termina 296
IV. Diligencias de Pombal contra a mesma . 298
A 'Deàticção chro11olcgica e outros escriptos 2 99
Peita dos cardeaes por ordens de Lisboa. 300
V. Prisão e desterro dos jesuitas 301
Sorte de Malagrida . 3º01
Sua exiStencia na prisão. 302
O supplicio. 304
VI. Sequestro dos bens da Companhia de Jesus no Pará. 305
A noticia do regicidio chega á colonia • ·• 3o6
Partem os ultimos missionarios para o reino 307
Epilogo
APPENDlCE
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