Secularização e Espaço Público: A Reinvenção Do Pluralismo Religioso No Brasil
Secularização e Espaço Público: A Reinvenção Do Pluralismo Religioso No Brasil
Secularização e Espaço Público: A Reinvenção Do Pluralismo Religioso No Brasil
Paula Montero
Edição electrónica
URL: https://journals.openedition.org/etnografica/1195
DOI: 10.4000/etnografica.1195
ISSN: 2182-2891
Editora
Centro em Rede de Investigação em Antropologia
Edição impressa
Data de publição: 2 maio 2009
Paginação: 7-16
ISSN: 0873-6561
Refêrencia eletrónica
Paula Montero, «Secularização e espaço público: a reinvenção do pluralismo religioso no Brasil»,
Etnográfica [Online], vol. 13 (1) | 2009, posto online no dia 16 março 2012, consultado o 10 fevereiro
2022. URL: http://journals.openedition.org/etnografica/1195 ; DOI: https://doi.org/10.4000/
etnografica.1195
como “crenças religiosas”, não apenas não declinou como estimulou a criação
já no final do século XX de “novos movimentos religiosos” que ampliaram a
noção mesma de campo religioso para novas dimensões da vida social. além
disso, longe de “privatizar-se”, as religiões, desde sempre, imiscuíram-se das
mais variadas formas na construção e na gestão do espaço público. a presença
histórica das igrejas cristãs nas áreas de educação, saúde, assistência social, etc.
correspondeu a uma delegação consentida e pactuada pelo próprio Estado.
a concessão pública de canais televisivos e de radiodifusão a confissões religio-
sas tampouco é um fenômeno recente. no campo da política também já nos
habituámos à presença de bancadas religiosas no congresso.
todas essas formas de visibilidade e agenciamento público das religiões tam-
bém se manifestam no campo da linguagem política, ora re-significando suas
principais categorias, tais como igualdade e direito, ora introduzindo no debate
valores religiosos como fundamento para a produção de consenso em torno
de certas opiniões, ora mobilizando grupos sociais em torno de determina-
das causas. alguns exemplos mais conhecidos desse fenômeno relatados pelos
estudiosos dizem respeito, no caso católico, ao modo como o discurso teoló-
gico da libertação imantou de paixão religiosa as categorias de “participação”
e de “comunidade” e, no caso protestante, como a “teologia da prosperidade”
produziu uma idéia de “direito” dissociada do conceito de cidadania, que nas
teorias da democracia é concebida como diretamente ligada aos direitos de pro-
priedade e de acesso aos bens e aos direitos de participação política. no caso
dos neopentecostais, através das formulações da “teologia da prosperidade”, a
noção de acesso aos bens articulou-se, paradoxalmente, não à lógica do mer-
cado, mas à do dom e contra-dom tão bem estudada pela antropologia. com
efeito, nas práticas discursivas neopentecostais todo indivíduo deve exercer seu
“direito à prosperidade”, formulação esta que enuncia de modo bastante parti-
cular a idéia de “inclusão social” e de “ordem legal” posto que não passa, como
no caso do discurso católico, pela noção de fraternidade ou de comunidade.
Os exemplos rapidamente relatados acima para ilustrar a complexidade das
relações entre religiões e espaço público nos permitem sugerir a hipótese da
insuficiência teórica da noção weberiana de “secularização” para pensar os
fenômenos da publicização das religiões na cena contemporânea, ou ainda
para compreender como, em contraposição à igreja católica tida como referên-
cia, as outras religiões lutam pela legitimidade de sua “ação social”. penso que
é possível propor essa relação de modo menos normativo: a secularização não
precisa ser postulada como condição sine qua non da emergência de uma esfera
pública democrática. Ou, dito de outro modo, o conceito de “secularização”
talvez tenha deixado de ser útil como categoria analítica, tendo-se deslocado,
progressivamente, para a esfera normativa.
isto não significa que estamos em desacordo com max Weber quando o
autor afirma, em sua teoria geral da secularização, que a emancipação histórica
10 paula mOntErO etnográfica maio de 2009 13 (1): 7-16
BiBliografia
caSanOva, José, 1994, Public Religions in the Modern World. chicago, the university of
chicago press.
cOrtEn, andré, 1996, Os Pobres e o Espírito Santo: O Pentecostalismo no Brasil. petrópolis,
vozes.
GaSBarrO, nicola, 2004, “il concetto di ‘religione’ come problema antropológico: genesi
e sviluppo”. policopiado.
GiumBElli, Emerson, 1997, O Cuidado com os Mortos: Uma História da Condenação e da Legi-
timação do Espiritismo. rio de Janeiro, arquivo nacional
—, 2000, O Fim da Religião: Controvérsias acerca das “Seitas” e da “Liberdade Religiosa” no Bra-
sil e na França. rio de Janeiro, museu nacional, tese de doutoramento.
haBErmaS, Jünger, 2003 [1961], Mudança Estrutural na Esfera Pública. rio de Janeiro,
tempo Brasileiro.
mOntErO, paula, 2003, “max Weber e os dilemas da secularização: o lugar da religião no
mundo contemporâneo”. Novos Estudos Cebrap, 65: 34-44.
—, 2006, “religião, pluralismo e esfera pública no Brasil”, Novos Estudos Cebrap, 74: 47-
-65.
piErucci, Flávio, 2000, “a secularização segundo max Weber”, em Jessé de Souza (org.),
A Atualidade de Max Weber. Brasília, universidade de Brasília, 105-162.
Secularization and public space: the re-invention of religious pluralism in Brazil paula
montero universidade de São paulo; cEBrap pmontero�usp.br
this essay analyses the historical process of secularization in Brazilian post-republic period. com-
paring with the emergency of republicanism in France this article stresses the particularities in the
Brazilian development of a civil public space. taking into account ethnographic examples of popular
religions the analysis confronts the Weberian paradigm of secularization.
kEyWOrDS: secularization, public space, religious pluralism, popular religion.