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MODALIDADE: COMUNICAÇÃO
SUBÁREA: COMPOSIÇÃO
Ricardo Rosa
Universidade Estadual Paulista, UNESP - [email protected]
Resumo: O presente artigo propõe uma análise de possíveis dinâmicas e técnicas estendidas para a
ocarina, a partir da abordagem acústico-organológica do instrumento, visando sua utilização na
prática composicional contemporânea. É feita uma breve contextualização histórica do instrumento
e, posteriormente, são explicadas e analisadas suas características acústicas e organológicas, a fim
de perceber a interferência destas na composição para o instrumento, principalmente em relação a
dinâmicas. Por fim, é feita uma descrição de possíveis técnicas estendidas do instrumento.
Organologic Characteristics of the Ocarina and its Importance to the Composition for the
Instrument
Abstract: The present article proposes an analysis of possible dynamics and extended techniques
for ocarinas, based on the acoustic-organological approach of the instrument, aiming its
application in the contemporary compositional practice. For this, a brief historical
contextualization of the instrument is made and, afterward, its acoustic and organological
characteristics are explained and analysed in order to perceive their influences in composing for
ocarina, especially in relation to dynamics. Finally is made a description of possible extended
techniques of the instrument.
1. Introdução
A ocarina é um instrumento ainda pouco estudado academicamente e seu repertório,
apesar de crescente, é ainda escasso. Assim, o presente trabalho busca analisar as capacidades
e particularidades organológicas da ocarina a partir de experimentações composicionais em
repertório recente, escritas e executadas pelos autores do artigo, visando catalogar e descrever
tais particularidades.
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2. Contextualização histórica
Segundo David Ramos (RAMOS, p.9, 2011) as ocarinas, também conhecidas
como flautas globulares, já foram encontradas em culturas centro e sul americanas, sendo
datadas de 10.000 anos, provavelmente usadas como um instrumento ritualístico para a dança
e pastoreio. Somente no meio do século XIX, após a criação do modelo transversal apelidado
“modelo de Budrio” - devido à cidade onde foi criada por Giuseppe Donati - a ocarina foi
aperfeiçoada e passou a ser tratada como um instrumento profissional.
Este novo instrumento, que continha 10 furos, possibilitava uma tessitura de
pouco mais de uma oitava. Para compensar a pequena tessitura, as ocarinas eram tocadas em
quintetos e septetos. O instrumento foi então levado para o mundo, ora como um brinquedo,
ora fabricado como meio de distração para soldados durante as duas guerras mundiais.
No decorrer do século XX, o crescente interesse de compositores como
¹György Ligeti, Leoš Janacek, Krzysztof Penderecki, e mais recentemente Ellie Mäkelä e
Kristopher Maloy por instrumentos menos conhecidos deu à ocarina novas composições e
solos. Após aparecer como tema no jogo de videogame Zelda: Ocarina of Time, a ocarina se
tornou conhecida pelos jovens, e desde então vemos - inclusive no Brasil - novos
instrumentistas e produtores de ocarina. O instrumento foi incorporado à cultura popular
japonesa, onde se desenvolveu o modelo com 12 furos, utilizado até hoje, com maior
tessitura. Este é o modelo que será abordado com maior profundidade no decorrer deste
artigo.
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5.Extensão e Tessitura
Mesmo tendo passado por um aperfeiçoamento com o modelo de Budrio, a
ocarina ainda é um instrumento de extensão relativamente pequena. Em geral, não tem mais
que uma oitava e uma quarta justa de extensão.
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As ocarinas podem ter uma câmara (4-12 furos), duas câmaras (ocarina dupla,
com 8-16 furos) ou três câmaras (ocarina tripla, com 20 furos). Elas estão organizadas de
acordo com suas tessituras, da mais aguda para a mais grave, respectivamente: soprana, alta,
média (ou tenor) e baixa. Geralmente estão divididas em 3 afinações: Dó Maior (mais
comum), Sol Maior e Fá Maior (menos comum). No entanto, é usado um único padrão de
digitação, o que faz das ocarinas instrumentos transpositores.
A tabela abaixo resume as características básicas de cada ocarina transversal, discutidas
acima:
6. O Sopro
Diferentemente do que ocorre com as flautas cilíndricas, o formato globular das
ocarinas não causa o dobramento de oitava quando soprada com maior intensidade, como na
flauta transversal, por exemplo.
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Por outro lado, na ocarina, a intensidade do sopro pode alterar a afinação da nota
produzida, ocasionando uma diferença de até uma segunda maior. A afinação é, portanto, uma
questão de extremo cuidado, principalmente quando tocada com mais ocarinas ou em
uníssono com outro instrumento. Esta particularidade, no entanto, permite a produção de
“bends” na ocarina, se adaptando muito bem à sonoridade blues/jazz. Outra possibilidade é a
de trabalhar com a música microtonal, adaptável à ocarina.
Em relação ainda à intensidade, em determinadas peças pode-se substituir a
variação deste parâmetro sonoro pela ornamentação. São possíveis todos os tipos de
articulações, trinados, apojaturas e glissandos. Estes últimos devem ser executados mantendo-
se a pressão de sopro estável e escorregando-se o dedo de um furo e abrindo-o
progressivamente, elevando a altura da nota.
7.Dinâmica
Na ocarina, a dinâmica e a afinação são influenciadas pela intensidade do sopro.
Quanto mais grave a nota, menos ela soará, quanto mais aguda a nota, mais soará. Partindo
disso, para realizar três dinâmicas (p, mf e f) para a mesma nota, é preciso mudar a intensidade
do sopro e usar ou a técnica de semi-furos (presente na técnica de flauta doce) ou mudar a
digitação, considerando os diferentes tamanhos dos buracos, para compensar a desafinação.
Focaremos nesta segunda forma, visto que a primeira é mais útil para efeitos como o
glissando.
Na tabela 2 abaixo, há um quadro com a tablatura para cada nota, em três
dinâmicas diferentes - p, mf e f, resultantes de pesquisa e experimentação com auxílio de
afinador. O parâmetro norteante para a construção desta tabela foi que, para uma nota soar
forte (f), é necessário fechar mais a ocarina (seja tapando um buraco grande ou dois buracos
menores que juntos somam o tamanho apropriado) para compensar a afinação alta. Para a nota
soar piano (p), é necessário destampar alguns buracos, e eventualmente substituir por outros
menores, para compensar a afinação baixa.
Como é possível mudar um semitom mantendo a mesma digitação e somente
alterando a intensidade do sopro, em algumas notas, a digitação em piano é idêntica ao
semitom acima (ver notas 8 e 9, por exemplo) ou a digitação em forte é idêntica ao semitom
abaixo (ver notas 1 e 2, por exemplo). Desta forma, é possível expandir essa tabela para mais
gradações de dinâmicas, levando em conta todos esses parâmetros, e até formular outras
digitações.
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Por ser uma técnica fora do uso tradicional do instrumento, ela não se aplica de
forma constante por toda a extensão das notas da ocarina. A percepção das três dinâmicas é
evidente na região central, enquanto que no grave a diferença é reduzida, e no agudo o
mezzoforte fica próximo ao forte. Abaixo há um gráfico (figura.1) para ilustrar:
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8.3 Multifônicos:
Foram encontradas duas maneiras de se realizar multifônicos na ocarina: ao soprar
pouco menos que o suficiente na mudança de harmônico irá se ouvir a fundamental, o
harmônico e uma camada de ruído, ou seja, um multifônico natural do instrumento. Já o outro
método é cantar e tocar a ocarina simultaneamente, resultando em uma interação da voz com
a ressonância do instrumento na câmara.
8.5 Ruído:
A câmara do instrumento poderá ser usada como filtro de ruído branco ao aplicar-
se o conceito de síntese subtrativa de duas maneiras possíveis: a primeira é tocar o
instrumento enquanto se aproxima o dedo ao bisel. Ao abrir e fechar os furos, ouve-se uma
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9. Considerações finais
Apesar de a ocarina aparecer poucas vezes em catálogos organológicos e de a
literatura acadêmica sobre este instrumento ainda ser escassa, a ocarina desempenhou e
desempenha um papel importante na história humana. Ao longo da História, a ocarina passa
de um simples ressonador de sons indefinidos a um instrumento de estudo e escrita musicais
complexos, com o possível uso de técnicas estendidas resultantes de pesquisa e de exploração
do instrumento na contemporaneidade.
Espera-se, assim, que este artigo gere interesse nos músicos e, de maneira
especial, nos compositores. Enquanto houver ocarinistas e compositores interessados neste
instrumento tão singular, a arte da ocarina poderá se manter forte. Se por um lado a ocarina é
um instrumento de simples características organológicas, por outro, é um instrumento que
oferece várias possibilidades composicionais e interpretativas.
Referências Bibliográficas:
FLETCHER, Neville. H.; ROSSING, Thomas D. The Physics of Musical Instruments. 2ª Ed.
New York: Springer-Verlag New York, Inc., 1998.
HALLIDAY, David; RESNICK, Robert; WALKER, Jearl. Fundamentals of physics. 9ª Ed.
EUA: John Wiley & Sons, Inc., 2011.
MIMO Consortium (Musical Instruments Museum Online). Revision of the Hornbostel-Sachs
classification of musical instruments by the MIMO Consortium. Local de publicação: Editora,
2011.Disponívelem:<http://network.icom.museum/cimcim/resources/classification-of-
musical-instruments/> Acesso em: 25 mar. 2019.
ORIGENS DA OCARINA. Disponível em: <https://ventokanta.com/origens-da-ocarina/>.
Acesso em 20 mar 2019.
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RAMOS, David Erick . The Ocarina Guide. EUA: 2011. E-book. Disponível em:
<http://daviderickramos.com/store/the-ocarina-guide-pdf-download/>. Acesso em: 25 mar.
2019.
SACHS, Curt. The history of musical instruments. Mineola, Nova Iorque: Dover Publications,
Inc., 2006.SACHS, Curt; HORNBOSTEL, Erich M. von. Classification of Musical
Instruments: Translated from the Original German by Anthony Baines and Klaus P.
Wachsmann. The Galpin Society Journal, Reino Unido, v. 14, p. 3-29, 1961.
Notas
1 As obras referenciadas são: György Ligeti - Concerto for Violin and Orchestra (1989 - 1993); Leoš Janacek -
Ríkadla (1926); Krzysztof Penderecki - The Dream of Jacob (1974) e Symphony No. 8 (2008); Ellie Mäkelä -
Ocarina Concerto (2016); Kristopher Maloy - Visions and Fantasies: Concerto for Ocarina and Orchestra (2010).
2 Ressonância de Helmholtz - é o fenômeno ocorrido quando o ar passa por uma cavidade e ressoa. O
dispositivo que demonstra esse fenômeno é o ressonador de Helmholtz, um ressonador acústico criado por volta
de 1860 pelo físico e matemático alemão Hermann von Helmholtz. Um exemplo de ressonador de Helmholtz é o
som resultante ao soprar-se pelo gargalo de uma garrafa vazia.
3 Sistema desenvolvido pelos musicólogos Sachs e Hornbostel para catalogar os instrumentos musicais.
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