Escola Atraente Irene Lisboa 1926
Escola Atraente Irene Lisboa 1926
Escola Atraente Irene Lisboa 1926
A Escola Atraente
Irene Lisboa
Revista Escolar, Ano 6.º, N.º 10, 405-419
Dezembro de 1926
Obtém a escola, por bem ou por mal, a sujeição do aluno e não raro o
seu apêgo e amor. Ele sente saüdades nas férias e nos termos dos cursos, é-
lhe grato, manifesta aquele humaníssimo interesse de conservar as ligações
de refazer o feito, de manter o equilíbrio moral.
Não se julgue pelo que digo, e é velho, que a Escola por mais desagra-
dável e mal conduzida é sempre boa… Não, a Escola dificilmente se humani-
za e condescende, as crianças é que são boas e plásticas.
A Escola analisando o seu poder devia realmente desdobrar-se,
amplificar as suas vistas; não assestar um óculo para o futuro, mas catar e
esmiuçar o presente.
Trabalho de tanto valor! Poder contentar, realmente, sem iludir… As
multidões de crianças que se aglomeram nas más casas, sem liberdade nem
agrados, mirificamente postas em condições de ser felizes… Ser a Escola o
lugar das satisfações, das respostas, dos bons impulsos, de jogar, de conver-
sar, de trabalhar, de descobrir, de viver…
Os 4 ou 5 anos actualmente obscurecidos por regras de ler, escrever e
contar, vividos humanamente! Os aprendizados não seriam castigos, evitar-
se-iam os logros.
Não falo dos trabalhos de papel, de cortiça e de arame, etc., que per-
tencem aos programas da instrução primária, para poupar aos meus Ex.mos
e benévolos ouvintes delongas enfadonhas.
Falarei dos museus. A palavra museu é bafienta, arrasta consigo uma
figuração de tranquilidade absoluta. Museus significa: lugar de reserva,
vitrines invioláveis, paredes enfeitadas.
E quem não tem vitrines nem objectos dignos de apartar para todo o
sempre fica julgando… O que fica julgando não sei, sei só que nas Escolas o
museu escolar é qualquer dúzia de pedras, de frascos, de inutilidades. Têm-
se por obrigação e as histórias vagas que lhes dizem respeito esquecem.
Um museu escolar – não vou dar novidades – deve ser qualquer coisa
de andar na mão. É toda a casta de coisas bonitas e feias que as crianças
apanham e guardam, as flores que estampam, os insectos que caçam, as
colecções de conchas e de penas, os inúmeros objectos que ficam evocando
os lugares e as circunstâncias. Segundo as idades e o grau de cultura serão
as crianças melhores ou piores seleccionadoras, mas como o museu indivi-
dual ou da classe serve para conservar os documentos e inspirar o espírito de
pesquisa e de observação, não é considerado inútil por lhe faltar sciência.
Numa caixa de papelão se pode armar um museu e qualquer aluno das pri-
meiras classes pode ser seu dono e apresentante. Cumpre aos mestres favo-
recer a tendência de colecionar, tão expontânea nas crianças. E oferecer-
lhes meios de verem e reconhecerem.
V.V. Exas estão notando que eu me encaminho para as saídas, para os
passeios, para as visitas a locais escolhidos.
Eu não andava descalça nem mal vestida e não passava fome, mas
sofria atritos sem conta e era rebelde e triste.
Mais elástica, realmente, é a norma disciplinar actual que permite às
professoras alegrar os seus alunos e amá-los.
Estas e outras observações eu faço pensando que dos pequenos pode-
res algum benefício urde sempre.
Não se dirá, senhores, que atraente seja toda a escola onde o espírito
afectivo paire, que ele transfigure recintos e cubra falhas. Mas sem êle muito
bons propósitos sairiam pecos…
Tudo fica por dizer sôbre a escola atraente. Quem não viu, não sabe, e
fantasia, é o que me acontece.
Irene Lisboa