Apostila de Filosofia
Apostila de Filosofia
Apostila de Filosofia
ALUNO(A) TURMA:
A Cidade injusta, portanto, impede que uma Por sua vez, o conceito moderno de política –
parte dos cidadãos tenha assegurado o direito à conforme assinalou o filósofo político italiano
vida boa. Norberto Bobbio – está estreitamente ligado ao
de poder. O que é poder?
A justiça política consiste em respeitar o
modo pelo qual a comunidade definiu a A palavra poder vem do latim potere, posse,
participação no poder. “poder, ser capaz de”. refere-se
fundamentalmente à faculdade, capacidade,
Essa definição depende daquilo que a Cidade força ou recurso para produzir certos efeitos.
mais valoriza, os regimes políticos variando Assim, dizemos: o poder da palavra, o poder do
em função do valor mais respeitado pelos remédio, o poder da polícia, o poder da
cidadãos. imprensa, o poder do presidente.
O filósofo britânico Bertrand Russell tinha
Há Cidades que valorizam a honra (isto é, a definido o poder como a capacidade de fazer os
hierarquia social baseada no sangue, na terra e demais realizarem aquilo que queremos. Assim,
nas tradições), julgando o poder a honra mais o indivíduo que detém essa capacidade – ou
alta que cabe a um só: tem-se a Monarquia, meios – tem a faculdade de exercer
onde é justo que um só participe do poder. determinada influência ou domínio sobre o outro
e, por seu intermédio, alcançar os efeitos que
desejar. O fenômeno do poder costuma ser
Há Cidades que valorizam a virtude como dividido em duas categorias: o poder do ser
excelência de caráter (coragem, lealdade, humano sobre a natureza e o poder do ser
fidelidade ao grupo e aos antepassados), humano sobre outros seres humanos.
julgando que o poder cabe aos melhores:
tem-se a Aristocracia, onde é justo que
somente alguns participem do poder. FORMAS DE PODER
Se levarmos em conta o meio do qual o
indivíduo se serve para conseguir os efeitos
Há Cidades que valorizam a igualdade (são desejados, podemos destacar três formas
iguais os que são livres), consideram a básicas de poder social, conforme a análise de
diferença entre ricos e pobres econômica e não Norberto Bobbio:
política, julgando que todos possuem o direito
• poder econômico – é aquele que utiliza a decisivo na imposição da vontade é a guerra,
posse de bens socialmente necessários para que consiste no recurso extremo do poder
induzir os que não os possuem a adotar certos político.
comportamentos, por exemplo: realizar
determinado trabalho; ESTADO: A INSTITUIÇÃO QUE DETÉM O
• poder ideológico – é aquele que utiliza a posse PODER POLÍTICO
de certas ideias, valores, doutrinas para O termo Estado deriva do latim status (“estar
influenciar a conduta alheia, induzindo as firme”) e significa a permanência de uma
pessoas a determinados modos de pensar e situação de convivência humana ligada à
agir; sociedade política.
• poder político – é aquele que utiliza a posse
dos meios de coerção social, isto é, o uso da
força física considerada legal ou autorizada pelo O pensador alemão Max Weber elaborou uma
direito vigente na sociedade. das conceituações mais conhecidas e debatidas
entre os estudiosos do assunto. Estado é a
instituição política que, dirigida por um governo
O poder econômico preocupa-se em garantir o soberano, reivindica o monopólio do uso
domínio da riqueza controlando a organização legítimo da força física em determinado
das forças produtivas (por exemplo: o tipo de território, subordinando os membros da
produção e o alcance de consumo das sociedade que nele vivem
mercadorias).
Para a maioria dos autores, o Estado nem
O poder ideológico preocupa-se em garantir o sempre existiu. Sabe-se que diversas
domínio sobre o saber (conhecimentos, sociedades, do passado e do presente,
doutrinas, informações) controlando a organizaram-se sem essa instituição. Nelas, as
organização do consenso social (por exemplo: funções políticas não estavam claramente
os meios de comunicação de massa – televisão, definidas e formalizadas em determinada
jornais, rádios, revistas etc.). instância de poder. No entanto, em dado
momento da história da maioria das sociedades,
O poder político preocupa-se em garantir o com o aprofundamento da divisão social do
domínio da força institucional e jurídica trabalho, certas funções político- administrativas
controlando os instrumentos de coerção social e militares acabaram sendo assumidas por um
(por exemplo: forças armadas, órgãos grupo específico de pessoas. Esse grupo
legislativos, órgãos de fiscalização, polícia, passou a deter o poder de impor normas à vida
tribunais etc.). coletiva. Assim teria surgido o governo, por
meio do qual foi se desenvolvendo o Estado.
Desses três poderes (econômico, político e
ideológico), qual seria o principal, o mais eficaz? FUNÇÃO DO ESTADO
Para Bobbio, é o poder político, cujo meio
específico de atuação consiste na possibilidade CONCEPÇÃO LIBERAL: A corrente liberal
de utilizar a força física legalizada para centra sua análise em qual deve ser a função
condicionar comportamentos. do Estado. Assim, de acordo com o liberalismo,
o Estado deve agir como mediador dos conflitos
Bobbio desenvolve o argumento de que o poder entre os diversos grupos sociais,
econômico é fundamental para que o mais rico enfrentamentos inevitáveis aos indivíduos. O
subordine o mais pobre, assim como o poder Estado deve promover a conciliação dos grupos
ideológico é necessário para conquistar a sociais, amenizando os choques dos setores
adesão da maioria das pessoas aos valores do divergentes para evitar a desagregação da
grupo dominante. No entanto, só o uso do poder sociedade.
político, da força física legalizada, serve, em Sua função é, portanto, alcançar a harmonia
casos extremos, para impor e garantir entre os grupos rivais, preservando os
determinada ordem social. E nas relações entre interesses do bem comum. Entre os pensadores
dois ou mais grupos poderosos, em termos liberais clássicos destacam-se os iluministas
econômicos ou ideológicos, o instrumento John Locke e Jean-Jacques Rousseau.
Regime político é justamente o modo
CONCEPÇÃO MARXISTA: A corrente marxista característico de o Estado relacionar-se com a
centra sua análise em qual tem sido a função do sociedade civil. Na linguagem política
Estado. Por isso afirma que o Estado não é um contemporânea, os regimes políticos são
simples mediador de grupos rivais, isto é, classificados em dois tipos fundamentais:
daqueles que protagonizam a luta de classes, democracia e ditadura.
conforme a terminologia marxista.
DEMOCRACIA: é uma palavra de origem grega
que significa poder do povo (demo, “povo”;
É uma instituição que interfere nessa luta de cracia, “poder”). Foi a antiga cidade grega de
modo parcial, quase sempre tomando partido Atenas que legou ao mundo ocidental uma das
das classes sociais dominantes. Portanto, sua mais citadas referências de regime democrático.
função é garantir o domínio de classe. Nela, os cidadãos (pequena parcela da
população ateniense) participavam diretamente
das assembleias e decidiam os rumos políticos
SOCIEDADE CIVIL E ESTADO da cidade. Portanto, havia em Atenas uma
democracia direta.
Na linguagem política contemporânea, tornou--
se comum estabelecer a contraposição entre Em nossa época, a democracia direta
sociedade civil e Estado. Nessa contraposição, praticamente não existe mais. Ao longo do
o Estado costuma ser entendido como a tempo, os Estados foram ficando muito
instituição que exerce o poder coercitivo (a complexos, com extensos territórios e
força) por intermédio de suas diversas funções, populações numerosas, tornando-se inviável a
tanto na administração pública como no proposta de os próprios cidadãos exercerem o
Judiciário e no Legislativo. poder diretamente. Assim, a democracia deixou
de ser o governo direto do povo. O que
Por sua vez, a sociedade civil costuma ser encontramos, atualmente, é a democracia
definida como o largo campo das relações representativa, na qual os cidadãos elegem
sociais que se desenvolvem fora do poder seus representantes políticos para o governo do
institucional do Estado. Fazem parte da Estado.
sociedade civil, por exemplo, os sindicatos, as
empresas, as escolas, as igrejas, os clubes, os O ideal de democracia representativa é que o
movimentos populares, as associações governo seja dos representantes do povo, os
culturais. quais deveriam exercer o poder pelo povo e
para o povo. Nos dias de hoje, um Estado
O relacionamento entre os membros da costuma ser considerado democrático quando
sociedade civil provoca o surgimento das mais apresenta:
diversas questões – econômicas, ideológicas,
culturais etc. –, as quais, muitas vezes, criam • participação política do povo – o povo exerce o
conflitos entre pessoas ou grupos. Em face direito de participar das decisões políticas,
desses conflitos, o Estado é chamado a intervir. elegendo seus representantes no poder público.
Geralmente, essa participação é garantida por
Nas relações entre Estado e sociedade civil, os meio do direito ao voto direto e secreto, em
partidos políticos desempenham uma função eleições periódicas. Existem ainda outras
importante: podem atuar como ponte entre os formas de manifestação política do povo: o
dois, pois não pertencem por inteiro nem ao plebiscito, o referendo, as reuniões populares
Estado, nem à sociedade civil. Assim, caberia (passeatas, associações em praça pública etc.);
aos partidos políticos captar os desejos e as
aspirações da sociedade civil e encaminhá-los • divisão funcional do poder político – o poder
ao campo da decisão política do Estado. político do Estado não fica concentrado em um
único aparelho. Ao contrário, apresenta-se
REGIMES POLÍTICOS dividido em vários órgãos, que se agrupam em
torno das seguintes funções típicas: legislativa
(elaboração das leis), executiva (execução das coloca-se acima das leis e, nessa condição,
leis pela administração pública) e jurisdicional costuma desrespeitar todos os direitos
(aplicação das leis e distribuição da justiça). fundamentais do cidadão, principalmente o
Nos regimes democráticos, deve existir direito de livre
independência e harmonia entre os poderes expressão e a liberdade de associação política.
Legislativo, Executivo e Judiciário;
Além das características anteriores, os regimes
• vigência do Estado de direito – o poder político ditatoriais sustentam-se mediante dois fatores
é exercido dentro dos limites traçados pela lei a essenciais:
todos imposta. Assim, a lei subordina tanto o • fortalecimento dos órgãos de repressão – as
Estado como a sociedade, o que se chama ditaduras montam um forte mecanismo de
Estado de direito. onde vigora o Estado de repressão policial destinado a perseguir
direito, o cidadão respeita o Estado, mas o brutalmente todos os cidadãos considerados
Estado também respeita os direitos do cidadão, adversários do regime. Esses órgãos de
como liberdade de pensamento, expressão, repressão espalham pânico na sociedade e
associação, implantam um verdadeiro terrorismo de Estado,
imprensa, locomoção etc. utilizando métodos de tortura e morte;
• controle dos meios de comunicação de massa
DITADURA: é uma palavra de origem latina, – as ditaduras procuram controlar todos os
derivada de dictare, “ditar ordens”. Na antiga meios de comunicação de massa, como
república romana, ditador era o magistrado que programas de rádio e de televisão, espetáculos
detinha temporariamente plenos poderes, de teatro, filmes exibidos pelo cinema, jornais e
eleito para enfrentar situações excepcionais, revistas etc. monta-se um departamento
como os casos de guerra. Seu mandato era autoritário de censura oficial destinado a proibir
limitado a seis meses, embora houvesse tudo que for considerado subversivo. Somente
possibilidade de renovação, dependendo da são aprovadas as mensagens públicas julgadas
gravidade das circunstâncias. favoráveis ao governo ditatorial.
comparado com suas origens históricas, o
conceito de ditadura conservou apenas esse Esses instrumentos de controle e opressão
caráter de poder excepcional, concentrado nas foram utilizados em diversos regimes ditatoriais
mãos do governante. Atualmente, um Estado no século passado. Alguns exemplos são: as
costuma ser considerado ditatorial quando ditaduras implantadas por Adolf Hitler
apresenta as seguintes características: (Alemanha nazista), Josef Stálin (União
Soviética), Fidel Castro (Cuba), Augusto
Pinochet (Chile), Getúlio Vargas (Brasil) e
• eliminação da participação popular nas
Francisco Franco (Espanha), além de regimes
decisões políticas – o povo não tem nenhuma
militares como os que vigoraram na Argentina e
participação no processo de escolha dos
ocupantes do poder político. não existem no Brasil a partir dos anos 1960 e 1970.
eleições periódicas (ou, quando existem,
costumam ser fraudulentas) e são proibidas as PODER E FORÇA
manifestações públicas de caráter político;
Poder é a capacidade ou a possibilidade de
• concentração do poder político – o poder agir, de produzir efeitos desejados sobre
político fica centralizado nas mãos de um único indivíduos ou grupos humanos. O poder supõe
governante (ditadura pessoal) ou de um órgão dois polos: o de quem exerce o poder e o
colegiado de governo (ditadura colegiada). daquele sobre o qual o poder é exercido. Nesse
Geralmente, o ditador é membro do Poder sentido, o poder é uma relação ou um conjunto
Executivo. Os poderes Legislativo e Judiciário de relações pelas quais indivíduos ou grupos
são aniquilados ou bastante enfraquecidos; interferem na atividade de outros indivíduos ou
grupos.
• inexistência do Estado de direito: o poder
ditatorial é exercido sem limitação jurídica, com Para que alguém exerça o poder, é preciso que
leis que só valem para a sociedade. O ditador tenha força, entendida como instrumento para o
exercício do poder. Assim diz o filósofo francês Idade Moderna: Com o fortalecimento das
Gérard Lebrun: monarquias nacionais, o Estado passou a deter
“Se, numa democracia, um partido tem peso a posse de um território e tornou-se apto para
político, é porque tem força para mobilizar certo fazer e aplicar as leis, recolher impostos, ter um
número de eleitores. Se um sindicato tem peso exército.
político, é porque tem força para deflagrar uma
greve. Assim, força não significa Por isso, segundo o filósofo e sociólogo alemão
necessariamente a posse de meios violentos de Max Weber (1864-1920), o Estado moderno é
coerção, mas de meios que me permitam influir reconhecido por dois elementos constitutivos: a
no comportamento de outra pessoa. A força presença do aparato administrativo para
pode ser o charme de um ser amado, quando prestação de serviços públicos e o monopólio
me extorque alguma decisão (uma relação legítimo da força.
amorosa é, antes de tudo, uma relação de
forças).
Com a secularização da consciência, o Estado
distanciou-se da maneira de pensar medieval,
A força é a canalização da potência, é a sua predominantemente religiosa. À tese de que
determinação. E é graças a ela que se pode todo poder emana de Deus, contrapôs-se a
definir a potência da ordem nas relações sociais teoria da origem social do pacto feito sob o
ou, mais especificamente, políticas.” consentimento dos indivíduos.