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Vol.

6 • Nº 1 • Ano 2018

EFEITO DA ALTA TEMPERATURA EM CONCRETOS:


UMA REVISÃO DA LITERATURA
EFFECT OF HIGH TEMPERATURE IN CONCRETES: A REVIEW OF LITERATURE

Recebido em: 21/05/2018. Rochanna Alves Rocha1


Aceito em: 18/06/2018.

RESUMO

O concreto pode ser sujeito acidentalmente a altas temperaturas ou estas podem fazer
parte de suas condições normais de trabalho. As características dos constituintes do
concreto, como teor de umidade e as condições para melhorar a resistência, podem
precipitar a desagregação do concreto submetido a altas temperaturas. O presente
estudo se justifica pela relevância no entendimento do comportamento de concretos
submetidos a elevadas temperaturas. Por isso, o trabalho tem como objetivo fazer uma
revisão da literatura no que diz respeito ao efeito da alta temperatura na estrutura do
concreto, a fim de auxiliar novas pesquisas no tocante a esse tema. Dessa forma, foi
possível compreender a importância dos materiais constituintes no que diz respeito
ao efeito da temperatura no concreto, sendo de fundamental importância um estudo
aplicado no comportamento do concreto frente a elevas temperaturas para aplicação
de concretos não convencionais.

Palavras-chave: Concreto. Constituintes. Alta temperatura. Resistência.

ABSTRACT
Concrete can be accidentally subjected to high temperatures or these can be part
of your normal working conditions. The characteristics of the constituents of the
concrete, such as moisture content and the conditions to improve the resistance, can
precipitate the disintegration of the concrete subjected to high temperatures. The
present study is justified by the relevance in the understanding of the behavior of
concretes submitted to high temperatures. Therefore, the paper aims to review the
literature regarding the effect of high temperature on the concrete structure, in order
to support new research on this subject. In this way, it was possible to understand the
importance of the constituent materials with respect to the effect of the temperature

1 Graduada em Engenharia Civil pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ). E-mail:
[email protected].

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on the concrete, being of fundamental importance a study applied in the behavior of
the concrete in front of elevated temperatures for the application of unconventional
concrete.

Keywords: Concrete. Constituents. High temperature. Resistance.

INTRODUÇÃO
Segundo Mehta e Monteiro (2014), atualmente, o concreto é o material da
construção mais utilizando e estima-se que seu consumo seja da ordem de 19 bilhões
de toneladas métricas ao ano; este fato pode ser compreendido devido à boa resistência
do concreto à água, à viabilidade de construir estruturas de diferentes formas e
tamanhos, à disponibilidade de materiais para sua produção e ao seu baixo custo,
quando comparados a outros materiais de mesma função.
Misturas semelhantes ao concreto eram utilizadas no tempo da Idade Média e
Renascimento, mas o que desencadeou o emprego do concreto em grandes proporções,
foi a invenção do cimento Portland. Atualmente, há uma busca por aplicações de novas
tecnologias que tragam melhorias e soluções para otimização na aplicação do concreto
que também minimizem os impactos ambientais. Assim, como alternativas para
finalidades de utilização distintas, surgem diferentes tipos de concretos, como com
adições e aditivos especiais e com a utilização de agregados leves (FONSECA, 2010).
O concreto pode ser sujeito acidentalmente a altas temperaturas ou estas
podem fazer parte de suas condições normais de trabalho (FERREIRA, 2011). A
boa resistência do concreto, quando submetido a temperaturas mais altas, é devida às
características térmicas dos materiais que o compõe, como incombustibilidade, baixo
coeficiente de dilatação e condutividade térmica. Porém, o aumento da temperatura
nos elementos de concreto provoca redução no módulo de elasticidade e na resistência
características de seus materiais constituintes, havendo prejuízos na rigidez do
elemento (COSTA, 2011).
Souza (2005) afirma que o fogo se manifesta em função da composição química
do material e depende da sua superfície específica e das condições de oxigenação e da
umidade contida. As características da pasta de concreto, como teor de umidade e as
condições para melhorar a resistência, podem acelerar a desagregação do concreto
submetido a elevadas temperaturas (COSTA, 2011).
Costa, Figueiredo e Silva (2002) citam que essa desagregação no concreto
se manifesta através de fenômenos como esfarelamento da superfície calcinada e
separação parcial de pequenas camadas superficiais do material (sloughing ou spalling).
Por isso, o presente estudo se justifica pela relevância no entendimento
do comportamento de concretos submetidos a elevadas temperaturas, pois um
conhecimento mais aprofundado dessa influência pode resultar em projetos mais
econômicos e seguros.

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OBJETIVO
Este trabalho tem como objetivo fazer uma revisão da literatura no que diz
respeito ao efeito da elevada temperatura na estrutura do concreto, a fim de auxiliar
novas pesquisas no tocante a esse tema.

REFERENCIAL TEÓRICO

Concreto
De acordo com Silva (2000), por mais de um século o concreto foi composto
por uma mistura homogênea de água, cimento, agregados e água. Segundo NEVILLE
(2016), misturas de concretos convencionais de cimento Portland podem não atender
as necessidades exigidas, por isso, a fim de superar tal carência, viu-se a necessidade
de desenvolvimento de tipos especiais de concreto.
Cardoso (2012) afirma que, quando submetidos a altas temperaturas, concretos
convencionais tem sua vida útil reduzida e normalmente necessitam de manutenção. A
fim de possibilitar propriedades limitadas pelo concreto tradicional, desenvolveram-se
concretos especiais, como o concreto refratário, que, de acordo com a NBR 8826 (ABNT,
2014), pode ser entendido como um produto não-conformado de pega hidráulica, pega
química ou pega ao ar e consiste na mistura de um ou mais agregados refratários
de granulometria adequada, com ligantes como cimento aluminoso, sílica coloidal,
alumina hidratada e fosfatos, podendo conter aditivos e componentes não cerâmicos.

Concreto submetido a elevadas temperaturas


Grande parte da comercialização de refratários do mundo corresponde ao
concreto refratário que é um material caracterizado por possuir boa estabilidade física
e química a temperaturas elevadas e possuir propriedades de isolamento térmico,
além de apresentar resistência mecânica, térmica e ao choque térmico. Normalmente,
são empregados em locais submetidos a temperaturas acima de 500°C, na indústria
siderúrgica, por exemplo, como revestimento de fornos. Além disso, a fim de suportar
esforços mecânicos e provocando retrações mínimas e dilatações, quando submetido
à variação brusca de temperatura, este tipo de concreto pode ser obtido através da
mistura de cimento aluminoso, aditivos especiais e agregados refratários (CARDOSO,
2012).
O comportamento do concreto submetido a elevadas temperaturas depende
do comportamento individual dos seus materiais constituintes, variando com o grau
de hidratação, proporção água-ligantes, finos existentes e tipo de agregados (SOUZA,
2016).

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Aglomerante
A utilização de cimento Portland para concreto submetido a altas temperaturas
é limitada a aproximadamente 500ºC, pois, quando sujeito a elevadas temperaturas, o
hidróxido de cálcio (C-H) se decompõe dando origem ao óxido de cálcio (CaO) livre que
leva a deterioração do concreto exposto à umidade ou água (MEHTA E MONTEIRO,
2014).
De acordo com Freitas (1993, apud RAAD, 2008), a partir das propriedades
desejadas, é determinado o material ligante a ser utilizado, dessa forma, a fim de
obter um material que possa ser exposto a elevadas temperaturas mantendo grande
parte de suas características mecânicas e reológicas, em concretos refratários, é mais
utilizado o cimento de aluminato de cálcio (CAC), que, pela alta pureza, a formação de
fases indesejadas, como o óxido de cálcio e hidróxido de cálcio (Ca(OH)₂), ocorrem a
temperaturas acima de 1000 ºC.
Neville (2016) afirma que o cimento Portland branco apresenta baixo teor de
álcalis solúveis e é produzido a partir da mistura de caulim, que contém baixos teores
de óxido de ferro e manganês, com giz ou calcário livres de determinadas impurezas e
custa cerca de 3 vezes o preço do cimento Portland comum; além dele, é produzido o
cimento branco especial de aluminato de cálcio que pode suportar temperaturas ainda
mais elevadas, pois é produzido contendo entre 70 e 80% de Al2O3, 20 a 30% de cálcio
e apenas 1 % de ferro e sílica, possuindo porém, custo bastante elevado.

Água
Freitas (1993, apud CARDOSO, 2012) aponta que o principal agente
para a hidratação do concreto refratário na ligação hidráulica do aglomerante é a água,
que possui papel relevante nas propriedades do concreto fresco e endurecido, além de
atuar diretamente na fluidez da pasta e na continuidade dos constituintes, da matriz e
demais componentes do concreto.
As reações de hidratação definem a estrutura do compósito. A hidratação do
cimento se dá pela hidratação do C₃S, C₂S, C₃A e C₄AF, sendo o endurecimento da pasta
dominado pela hidratação dos aluminatos (C₃A e C₄AF) e a resistência do compósito
comandada pelos silicatos (C₃S, C₂S), que compõem cerca de 75% do cimento Portland
comum. É possível constatar silicato de cálcio hidratado (C-S-H) sobre a superfície
dos grãos de cimento depois de poucas horas de hidratação, sendo eles responsáveis
por ocupar de 50 a 60% do volume de sólidos da pasta de cimento completamente
hidratada (ALVES, 2002; BORJA, 2011; PAREDES E BRONHOLO, 2013).
A água pode existir de várias formas na pasta de cimento hidratada (Figura
1) e, de acordo com o grau de facilidade com que pode ser removida, é classificada
em água interlamelar que é retida pelas ligações de pontes de hidrogênio entre as
camadas do C-S-H, água capilar que está presente nos maiores vazios e está livre da

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influência das forças de atração, água adsorvida que se encontra próximo à superfície
sólida dos produtos de hidratação e a água quimicamente combinada que integra
parte da microestrutura de vários produtos de hidratação do cimento (MEHTA E
MONTEIRO, 2014).

Figura 1: Esquematização dos tipos de água na pasta de cimento hidratada.

Fonte: MEHTA E MONTEIRO, 2014.

Agregados
De acordo com Neville (2016), o tipo de agregado influencia a resposta do
concreto, sendo o coeficiente de dilatação térmica (quanto maior for o coeficiente do
agregado, maior será o coeficiente do concreto), calor específico e a condutividade
propriedades dos agregados importantes no desempenho do concreto.
O comportamento térmico de concretos usuais é determinado pelos agregados,
pois, além de ocuparem a maior parte do volume do concreto, restringem as eventuais
contrações e dilatações da pasta de cimento durante o aquecimento. Dessa forma,
devido à sua origem, as variações nas propriedades do agregado podem promover efeito
considerável no comportamento do concreto submetido a elevadas temperaturas. A
condutividade térmica do concreto, por exemplo, é influenciada pelo tipo de agregado,
sendo a sua escolha baseada em propriedades, como condutividade, fusão e expansão
térmica (BRITEZ, 2011).

Propriedades do concreto no estado fresco e endurecido


A propriedade mais relevante do concreto no estado endurecido é a resistência
à compressão, que é medida através de um esforço solicitante por uma prensa hidráulica
(ROHDEN, 2011).
As características dos agregados influenciam na dosagem do concreto e no
comportamento do concreto no estado fresco e endurecido. As propriedades do concreto

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no estado fresco são determinadas pela porosidade, massa específica, composição
granulométrica, forma e textura superficial do agregado e as propriedades do estado
endurecido são influenciadas pela composição mineralógica e também pela porosidade
do agregado (METHA; MONTEIRO, 2014).
De acordo com Morales, Campos e Faganello (2011), acima de 300 °C a queda
da resistência mecânica do concreto convencional é acentuada, sendo o resfriamento
brusco da temperatura responsável pelas maiores perdas de resistência mas, dependendo
da temperatura máxima atingida, é possível recuperar até 90 % da resistência inicial
com o resfriamento lento do concreto.

Efeito do Fogo
De acordo com Souza (2005), o fogo é um fenômeno físico-químico que ocorre
com uma reação de oxidação com emissão de calor e luz e se manifesta diretamente
em função da composição química do material que pode queimar em função da sua
superfície especifica, das condições de exposição ao calor, da oxigenação e da umidade
contida.
A propagação do calor no concreto dá-se, principalmente, por condução devido
à temperatura fria no interior do concreto e quente na superfície, pela difusibilidade e
pelo calor específico. Além disso, o concreto não é um bom condutor de calor, por isso o
processo de propagação do calor no interior do concreto é lento quando comparado ao
aço, por exemplo, formando um intenso gradiente térmico no seu interior e provocando
modificações em suas propriedades (BRITEZ, 2011).

Propriedades térmicas do concreto


Britez (2011) afirma que a transferência de calor no interior do concreto é
responsável, em parte, pela intensidade do dano causado ao concreto e é decorrente
da condutibilidade, difusividade e calor específico, propriedades térmicas básicas
dependentes do tipo de agregado, cimento, porosidade e teor de umidade do concreto.
A condutibilidade térmica do concreto varia com seus constituintes,
principalmente do cimento hidráulico e da presença de ligações cerâmicas. Em geral, a
condução aumenta com o aumento da temperatura (CARDOSO, 2012).
De acordo com Neville (2016), a condutividade do ar é menor do que a da
água, por isso o grau de saturação do concreto é o principal fator influente na sua
condutividade, que, em concretos leves, aumenta com o acréscimo do teor de umidade
e com a redução da quantidade de água da mistura, já que a condutividade da água é
menor do que a condutividade da pasta de cimento.
Mas o coeficiente de condutibilidade térmica dos concretos é pouco relacionada
à sua massa específica, sendo a mineralogia dos agregados de grande influência. O
concreto usual é melhor condutor de calor quando comparado ao concreto de baixa

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densidade, dessa forma são os concretos com baixa condutividade térmica que
apresentam maior resistência ao fogo (GABRICH, 2008; BAUER, 2015).
Normalmente essa propriedade é calculada a partir da difusividade e,
aproximadamente entre os 50 °C e 60°C, a condutividade aumenta lentamente até
atingir um valor máximo, mas diminui subitamente por volta dos 120 ºC com a perda
da água do concreto. A condutividade volta a se estabilizar por volta dos 140 ºC e a 800
ºC é cerca da metade do valor a 20 °C (NEVILLE, 2016).
Outra propriedade relacionada à temperatura é o calor específico, ou
seja, a capacidade térmica, que varia de 800 a 1000 J/Kg°C em concretos usuais e
está relacionada com o teor de água e massa específica (MORALES, CAMPOS E
FAGANELLO, 2011; BAUER, 2015).
De acordo com Cardoso (2012), agregados porosos apresentam expansão
térmica menor, quando comparados aos agregados densos e concretos com coeficientes
de dilatação térmica maiores e são menos resistentes a variações de temperatura do
que concretos com um coeficiente menor.

Efeito do calor na estrutura do concreto


O comportamento do concreto exposto a elevadas temperaturas está
relacionado a vários fatores que agem simultaneamente, como a composição do
concreto que influencia no seu comportamento, quando submetido ao fogo, pois a pasta
de cimento e o agregado se decompõem com o calor, e o desenvolvimento de pressões
internadas geradas pela decomposição gasosa que é decorrente da permeabilidade do
concreto, do tamanho do elemento e da taxa de aumento da temperatura (MEHTA E
MONTEIRO, 2014).
Os componentes instáveis do concreto sofrem várias reações de decomposição
quando aquecidos, principalmente, referentes à desidratação. Materiais cristalinos
desidratam a temperaturas definidas, enquanto os materiais não cristalinos, como o
gel de C-S-H, perdem água em ampla faixa de temperatura (WENDT, 2006).
A relação da temperatura nas causas e efeitos sofridos por concretos expostos
a temperaturas elevadas pode ser entendida na Tabela 1 apresentada por Carvalho
(2001):

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Tabela 1: Efeitos do fogo nas características do concreto.

Fonte: Carvalho, 2001.

Por isso, devido aos diversos fatores que influenciam nas alterações do concreto,
são apresentados a seguir a influência da elevada temperatura na microestrutura
em relação às propriedades térmicas e mecânicas. De acordo com Souza (2016), a
microestrutura do concreto é constituída em três regiões com polaridades distintas:
a fase do agregado, a matriz do cimento hidratada e uma zona de transição que as
conecta.

Efeito da alta temperatura na água


A água presente é eliminada ao elevar-se a temperatura no concreto endurecido.
Entre 65 °C e 80 °C, é evaporada a água absorvida e, entre 80 °C e 100 °C, a água livre
nos interstícios. Mas, devido ao alto calor de vaporização necessário, a temperatura do
concreto não aumenta até que toda água evaporável seja eliminada, por isso, grande
quantidade de água evaporável pode causar danos ao concreto, uma vez que fissuras
surgem na microestrutura pela retração da pasta causada pela perda da água contida
no sistema de poros. (CARVALHO, 2001; COSTA; SILVA, 2002).

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Efeito da alta temperatura na pasta de cimento
A consequência do aumento de temperatura na pasta de cimento hidratada
depende do grau de hidratação e da umidade, pois o fator água/cimento interfere
diretamente na permeabilidade e a umidade livre na pressão de vapor. (CARVALHO,
2001;).
A pasta saturada apresenta grande quantidade de água livre, capilar e
adsorvida, enquanto uma pasta bem hidratada consiste, principalmente, em silicatos de
cálcio hidratados (C-S-H), hidróxido de cálcio e sulfoaliminatos de cálcio hidratados.
As alterações iniciais na pasta de cimento são predominantemente físicas e começa
a sofrer desgaste químico a partir dos 200ºC com a redução das forças de Van Der
Walls entre as camadas do C-S-H. Aos 300ºC, a água intermelar do C-S-H e parte da
água quimicamente combinada do C-S-H e dos sulfatosaluminatos hidratados será
perdida, provocando a evolução dos poros. Aproximadamente aos 500ºC, verifica-
se uma desidratação da pasta do cimento devido à decomposição do hidróxido de
cálcio (portlandita) e, aos 900ºC com a perda completa da água interlamelar, ocorre
a decomposição completa do C-S-H (tobermorita), que é responsável pela perda de
resistência do concreto e pela redução de volume da pasta aumentando a fissuração
(COSTA; SILVA, 2002; SOUZA, 2016).
O tempo de exposição à determinada temperatura deve ser considerado, pois,
como exemplo, o C-S-H mantido a 400°C por algumas horas perde tanta água quanto
aquecido até a temperatura de 600ºC por alguns minutos (WENDT, 2006).
Além disso, quando a amostra é aquecida em patamares superiores a 600°C e
depois resfriada, o CaO formado se re-hidrata, formando uma portlandita secundária
que apresenta arranjo cristalino de qualidade inferior à primeira, e provoca expansões
que acabam contribuindo para o aparecimento de fissuras no concreto. Acima de 800ºC,
a pasta sofre reações cerâmicas e, entorno dos 1100ºC, ocorre derretimento total dos
cristais. Após o resfriamento, todas as partículas podem se re-hidratar, formando
diferentes géis ou componentes cristalino (LIMA, 2005).

Efeito da temperatura no agregado


O efeito da temperatura no agregado varia de acordo com a sua composição.
Agregados silicosos apresentam expansão térmica elevada e favorecem o aumento
da fissuração e consequente redução da resistência na interface matriz-agregado. Por
outro lado, agregados calcários apresentam menor dilatação térmica (SOUZA, 2016).
Segundo Wendt (2006, apud NEVILLE, 1997), a diferença na perda da
resistência em concretos com agregados silicosos, calcários ou leves é desconsiderada
quando são submetidos a temperaturas acima de 800°C, como pode ser observado na
Figura 2 que apresenta o resultado de ensaio realizados em concretos de resistência

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inicial de 28 MPa com tipos distintos de agregados ensaiados a quente e sem aplicação
de carga.

Figura 2: Resistencia à compressão de concretos com agregados distintos


ensaiado a quente e sem aplicação de carga.

Fonte: NEVILLE, 1997 apud WENDT, 2006.

Agregados silicosos que contêm quartzo em sua composição, sofrem


transformações significativas, como expansão volumétrica de 5,7% aos 570°C, devido
à transformação da forma cristalina do quartzo de α em β que causam fissuras radiais
ao redor dos agregados e agregados calcários tornam-se instáveis em torno dos 600ºC
quando começa sua decomposição (NEVILLE, 2016).

Efeito das altas temperaturas na zona de transição


O aquecimento do concreto leva a uma expansão térmica diferencial entre
o agregado e a matriz cimentícia, pois, durante o aquecimento, a pasta sofre um
intenso processo de retração devido à desidratação, enquanto os agregados sofrem
um processo de expansão. Esse fato resulta em fissuras que surgem inicialmente na
zona de transição devido à sua maior fragilidade, o que pode também pode introduzir
processo de desplacamento (FERNANDES ET AL, 2007).

Comportamento do concreto submetido a elevadas


temperaturas
De acordo com Argenton (2011), quando exposto ao fogo, o concreto pode
apresentar redução de suas propriedades mecânicas, danos devido à deformação
excessivas, ocorrência de desplacamento e alteração na coloração. Esses problemas

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decorrem de reações físico-químicas provenientes do fluxo de calor submetido
e da distribuição da temperatura no interior do elemento que depende: do tipo de
cimento, agregado, adições, dimensão da seção transversal, relação água/cimento e da
porosidade do elemento de concreto (BRITEZ, 2011).

Efeito nas propriedades mecânicas do concreto


A resistência à compressão do concreto varia com a situação de exposição
a altas temperaturas, por exemplo, no caso de um incêndio, a exposição a elevadas
temperaturas ocorre por um período curto, mas a massa do concreto fica sujeita a um
imenso fluxo de calor, enquanto no corte de concreto por lança térmica, a exposição é
de poucos segundos e o fluxo de calor aplicado é pequeno. Os efeitos nas propriedades
do concreto são decorrentes do gel de CSH e do C₂S. Após a exposição a uma alta
temperatura, a resistência varia (NEVILLE, 2016):

a) Misturas com menor consumo de cimento sofrem uma perda na resistência


após a exposição a uma alta temperatura menor do que misturas mais ricas;
b) A perda da resistência à compressão é menor em concretos com agregados
leves do que o concreto normal;
c) Concretos de alta resistência perdem mais resistência do que concretos de re-
sistência normal;
d) Devido ao teor de umidade no momento de aplicação da carga, a perde de re-
sistência é maior em concretos saturados do que em concretos secos.

A determinação do módulo de elasticidade (módulo de Young) em função da


temperatura é realizada através de ultra som (MORALES, CAMPOS E FAGANELLO,
2011).
O comportamento da resistência e do módulo de elasticidade em concretos
convencionais submetidos a variações de temperatura é apresento na Figura 3, no qual
é possível observar a ocorrência de uma redução drástica no módulo de elasticidade.
Conforme mencionado por Mehta e Monteiro (2014), a resistência do concreto
também é influenciada pelas condições de ensaio, podendo os corpos de prova serem
ensaiados a quentes e sob carga ou após resfriamento à temperatura e umidade
ambientes.

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Figura 3: Comportamento da Resistência à compressão e do Módulo de Elasticidade
em concretos submetidos a diferentes temperaturas.

Fonte: MORALES, CAMPOS E FAGANELLO, 2011.

Fenômeno do lascamento e esfarelamento das camadas


superficiais do concreto
De acordo com Lorenzon (2014), as condições térmicas extremas podem
provocar desplacamentos no concreto, sendo esse fenômeno de lascamento, conhecido
como spalling ou sloughing, que é decorrente do processo termo mecânico, associado
ao aparecimento de tensões oriundas de variações térmicas, e ao termo hidráulico,
relacionado à transferência de ar, vapor e água pela rede de poros.
Enquanto o sloughing é o desprendimento de uma considerável porção em
grande extensão da superfície do concreto, o spalling configura-se pela perda parcial,
instantânea e violenta com grande liberação de energia, formando cavidades no material
quando submetido a temperaturas entre 250ºC e 400ºC. Outra forma de degradação
física das camadas superficiais do concreto, é o esfarelamento, que é caracterizado
pela constante exposição das camadas superficiais do concreto à ação térmica, o que o
enfraquece e leva a uma redução da resistência a abrasão (COSTA, FIGUEIREDO E
SILVA, 2002).
Dessa forma, Neville (2016) indica que o risco de lascamento explosivo aumenta
com a diminuição da permeabilidade do concreto e com o aumento na velocidade
de elevação da temperatura e da umidade excessiva, sendo este último o fator mais
relevante na determinação do comportamento estrutural em temperaturas elevadas.
Em alguns casos, o lascamento é consequência da mineralogia do agregado
ou da concentração de tensões térmicas surgidas durante o aquecimento (COSTA,
FIQUEIREDO E SILVA, 2002; POMPEU, 2004; WEIDMANN, 2008).

222
Aspectos físicos e químicos
De acordo com Bauer (2015), o concreto convencional apresenta mudança
na coloração após o resfriamento, mas essa alteração está sujeita a variações que
dependem da natureza dos constituintes. A Tabela 2 indica a sucessão de cores de um
concreto decorrentes do aumento da temperatura e a Figura 4 ilustra essas alterações.

Tabela 2: Alteração na coloração do concreto submetido ao aumento de temperatura.


TEMPERATURA COLORAÇÃO
Entre 300 e 600 °C Rosa
Entre 600 e 900 °C Vermelho para cinzento
Entre 900 e 1000 °C Amarelo-claro
Acima de 1000 °C Amarelo

Fonte: produzida pela autora, 2017.

Figura 4: Alteração na coloração de um concreto e pasta submetidos a variadas temperaturas.

Fonte: HAGER, 2013.

A ilustração apresentada na Figura 4 é decorrente do estudo realizado por


Hanger (2013), que utilizou scanner de mesa para análise das transformações na cor
de um concreto de resistência comum, produzido com agregados naturais do leito do
rio e submetido às temperaturas de T = 100 ° C, 200 ° C, 300 ° C, 400 ° C 500 ° C,
600 ° C, 700 ° C, 800 ° C, 900 ° C e 1000 ° C, aquecidos em um forno elétrico com
uma taxa de aquecimento constante de 1 ° C / min e, depois de atingir a temperatura
alvo, as amostras foram aquecidas a esta temperatura durante 1 h para homogeneizar
a temperatura dentro da amostra (HAGER, 2013).
Os agregados utilizados no concreto levam às alterações de sua coloração,
sendo essa mudança permanente. A modificação da cor é mais pronunciada em
agregados silicosos, que ao serem submetidos a temperaturas em torno de 300°C,
o ferro presente nos agregados, especialmente na areia, oxida fazendo com que haja
alteração para a cor rosa ou vermelha. Além disso, as alterações na coloração do
concreto exposto a altas temperaturas pode servir como indicativo para se estimar a
perda de resistência, como apresentado no Figura 5 (WENDT, 2006).

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Figura 5: Relação entre a coloração e a perda de resistência de um
concreto submetido a elevadas temperaturas.

Fonte: CANOVAS, 1998 APUD LIMA, 2005.

A partir do gráfico, é possível observar a queda de resistência inicial do


concreto entre os 250°C e 300°C, mas sem alteração na sua coloração. Entre os 300°C
e 600°C, a queda de resistência se acentua e pode chegar a 50%, com alteração para
rosa ou vermelho na coloração do concreto. De 600ºC a 950°C o concreto volta a ser
cinza com alguns pontos avermelhados, indicando redução na resistência à compressão
e fragilidade. A cor amarelo-alaranjado dos 950°C até 1000°C indica sinterização do
concreto e, entre 1000ºC até 1200°C, o concreto sintetizado torna-se amarelo claro e
apresenta perda total de sua resistência (CANOVAS, 1998 APUD LIMA, 2005).

METODOLOGIA
Foi empregada uma metodologia descritiva, que consistiu em uma revisão
de literatura através de consultas em livros, monografias, artigos sobre o efeito da
elevada temperatura na estrutura do concreto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho apresentou uma revisão da literatura sobre o comportamento da
elevada temperatura na estrutura do concreto. Dessa forma, foi possível compreender
a importância dos materiais constituintes no que diz respeito ao efeito da temperatura
no concreto, sendo de fundamental importância um estudo no comportamento do
concreto frente a elevadas temperaturas essencial para aplicação de concretos não
convencionais.

224
REFERÊNCIAS
ALVES, S. M. S. Desenvolvimento de compósitos resistentes Através da
substituição parcial do cimento por resíduo da indústria cerâmica. Dissertação
(mestrado). Curso de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica da Universidade
Federal da Paraíba, João Pessoa, 2002.

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ARGENTON, M. B. Efeito das variações do teor de umidade e condições de


aquecimento no comportamento de concretos de alta compacidade. Monografia
(Graduação). Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, 2011.

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5ed, vol 1 e 2. Rio de Janeiro: LTC, 2015.

BORJA, E. V. Efeito da adição de argila expandida e adições minerais na


formulação de concretos estruturais leves autoadensáveis. Tese (Doutorado).
Programa de Pós-graduação em Engenharia Mecânica da Universidade Federal do
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