Artigo 4 - Diferentes Planejamentos Orto-Cirurgicos para Pacientes Classe III Com Assimetria Facial

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Comparação de diferentes planejamentos

em cirurgia ortognática para tratamento de


assimetrias faciais: relato de casos

Comparison between planning in orthoganathic surgery for


treating facial asymmetries: case reports

resumo

Daniel Amaral Alves Introdução: a cirurgia ortognática envolve a correção de desarmonias funcionais e estéticas. A
Marlière1, hiperplasia condilar (HC) unilateral resulta em crescimento mandibular acentuado, provocando
Hugo Leite Rodrigues Neto2, assimetria facial. Para obter previsibilidade e sucesso nos resultados, é imprescindível planejamento
Alan Robert Moreira
preciso e adequado. Objetivo: descrever e comparar diferentes métodos de planejamento e seus
Schmitt3,
Luciana Asprino1, resultados no pós-operatório no tratamento de pacientes com assimetria facial. Relato de caso:
Rodrigo Alvitos Pereira3 foram avaliados 03 casos orto-cirúrgicos (A, B e C) de pacientes adultos jovens, com média de idade
de 22 anos, portadores de má oclusão esquelética de Classe III, com assimetria facial resultante de
HC inativa. Foi realizada análise facial e empregou-se dois métodos de planejamento em cirurgia
ortognática (convencional e virtual). O caso A foi planejado por meio de imagens bidimensionais
1
Área de Cirurgia e Traumatologia (2D) e sequência cirúrgica iniciada pela maxila. O caso B foi planejado por imagens 2D associado
Bucomaxilofacial, Faculdade
ao recurso de simulação em protótipo. Por fim, o caso C foi planejado exclusivamente com imagens
de Odontologia de Piracicaba,
Universidade Estadual de tridimensionais (3D) e simulação virtual, sendo que os casos B e C utilizaram sequência cirúrgica
Campinas, FOP – UNICAMP,
iniciada pela mandíbula. Foi utilizado o software Dolphin Imaging® em todos os planejamentos e
Piracicaba, SP.
os mesmos foram transferidos para os procedimentos cirúrgicos com auxílio dos guias em resina
2
Faculdade de Odontologia,
acrílica estereolitográfica. Conclusão: os planejamentos demonstraram eficácia em termos de
Hospital e Maternidade Therezinha
de Jesus, Faculdade de Ciências previsibilidade e viabilidade para a correção das assimetrias faciais, sendo todos os resultados
Médicas e da Saúde de Juiz de
considerados satisfatórios por parte dos cirurgiões e dos pacientes. Houve tendência de melhores
Fora, FCMS/JF – SUPREMA, Juiz de
Fora, MG. resultados quando da utilização de prototipagem, das imagens 3D e sequência operatória iniciada
pela mandíbula, no planejamento.
3
Serviço de Cirurgia e
Traumatologia Bucomaxilofacial,
Hospital Universitário Pedro Palavras-chave: assimetria facial, cirurgia ortognática, côndilo mandibular
Ernesto, Universidade do Estado do
Rio de Janeiro, HUPE – UERJ, Rio
de Janeiro, RJ.
ABSTRACT

Introduction: orthognathic surgery provides correction of functional and esthetic disharmony. Condylar
* Daniel Marlière hyperplasia induces in pronounced mandibular growth, resulting facial asymmetry. Planning is important
Rua Professora Violeta Santos,
to get predictable and successful on outcomes. Purpose: to describe and compare methods of planning
31/803, bloco 01
Democrata and post-operative outcomes by reporting three cases associated with facial asymmetries. Case
CEP: 36035-210
report: a total of 03 young adult patients (cases A, B and C), mean of age 22 years old, Class III
Juiz de Fora - MG
8 [email protected] skeletal malocclusion, and facial asymmetry after inactive condylar hyperplasia were evaluated. They
were undergone facial analysis, two methods of planning in orthognathic surgery (conventional and
virtual). Patient A was planned by bidimensional (2D) images and maxilla first sequence. Patient B was
planned by 2D images associated with simulating on surface mesh prototyping. And, Patient C was solely
planned by three-dimensional (3D) images and virtual surgical planning. Patients B and C used mandible
first sequence. Dolphin Imaging software was used on each planning. Each planning was transferred
to surgical procedures by assisting of the guides manufactured (acrylic resin and stereolithography).
Patients were usually assessed during post-operative and were pleasured with outcomes. Conclusion:
planning showed predictable and feasibility for facial asymmetries because outcomes were great. There
was a propensity of better outcomes when surface mesh, 3D images and mandible first sequence were
used at the treatment planning.
Submetido: 04/12/2018
Aceito: 10/12/2018 Keywords: facial asymmetry, orthognathic surgery, mandibular condyle

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INTRODUÇÃO OLIVEIRA, 2015; RIU et al., 2014).
Portanto, o objetivo deste estudo foi descrever e
A simetria facial perfeita é raramente encontrada, comparar a eficácia de diferentes métodos de planejamento
devido a fatores biológicos e ambientais inerentes (convencional e virtual) e os resultados obtidos no
aos processos de desenvolvimento, que podem gerar tratamento de 03 pacientes assimétricos submetidos à
diferentes graus de assimetria leves e imperceptíveis cirurgia ortognática.
(THIESEN; GRIBEL; FREITAS, 2015). No entanto, os
quadros clínicos classificados como assimetria facial relato dos casos
consistem em variação significativa entre as duas
metades da face que, quando exacerbada, propicia Três pacientes compareceram ao Serviço de Cirurgia
alterações estéticas e problemas funcionais quanto ao Bucomaxilofacial do Hospital Universitário Pedro Ernesto
desenvolvimento orofacial, nutricional e psicossocial nos (Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro)
pacientes (SRIVASTAVA et al., 2018). para tratamento de deformidade dentofacial e má-oclusão
Segundo Good et al. (2006), a má oclusão de Classe III, queixando-se da aparência estética facial e
Classe III está frequentemente associada aos casos restrições funcionais. Todos os pacientes foram submetidos
de assimetria facial. A relação entre tais condições a exame clínico intrabucal, análise facial associado a
pode ter como fator etiológico a hiperplasia de côndilo fotografias faciais, exames tomográficos e confecção
(HC) unilateral, que predispõe a piora progressiva de modelos de gesso dos arcos dentários de maxila e
da má-oclusão, com a presença de mordida cruzada mandíbula.
contralateral, desvio mandibular e mentual para o lado Para a análise facial, cada paciente foi analisado quanto
oposto e desnivelamento oclusal (SRIVASTAVA et al., aos contornos de tecido mole facial, de estruturas ósseas e
2018). dentárias. A função das articulações temporomandibulares
Dados epidemiológicos demonstram ocorrência também foi avaliada. Dessa forma, foi compreendido que
significante de casos de assimetria de face com a etiologia da assimetria facial possivelmente foi por HC
distribuição igual entre homens e mulheres (RAMIREZ- unilateral. Os pacientes foram acompanhados clinicamente
YAÑEZ et al., 2011). De acordo com Wolford et al. (2009), o por 06 meses para confirmação de inatividade de
superdesenvolvimento mandibular simétrico ou desviado crescimento assimétrico.
possui maior ocorrência durante a puberdade, podendo o Durante anamnese, os pacientes não relataram
crescimento ocorrer até os 20 anos. O acompanhamento nenhuma alteração sistêmica ou fatores de comorbidades,
e o diagnóstico dos casos de assimetria de face podem sendo solicitados exames laboratoriais pré-operatórios
ser realizados pelos exames clínicos, pela análise da face (hemograma, coagulograma e glicemia em jejum).
(fotografias para verificação das proporções faciais), dos Os resultados dos exames não indicaram qualquer
modelos de gesso e de exames de imagens (MARLIÈRE et anormalidade. Os pacientes assinaram o termo de ciência e
al., 2017; LÓPEZ; CORRAL, 2015). consentimento informado para realização do procedimento
A cirurgia ortognática é a conduta de escolha cirúrgico e autorizaram a publicação para fins científicos.
para correção de assimetria facial por demonstrar
estabilidade em longo prazo e melhora da estética e Pré-operatório
função mastigatória do paciente (SINGH et al., 2017). A
previsibilidade dos resultados cirúrgicos está associada a Caso A
alguns recursos, tais como de exames clínicos adequados, Paciente de 21 anos foi submetida à análise facial e
imagens bidimensionais (2D) e/ou tridimensionais (3D) e exame intrabucal. As avaliações demonstraram assimetria
ferramentas específicas de planejamento (MARLIÈRE et facial com má-oclusão Classe III associada a mordidas
al., 2018). cruzadas posterior e anterior, mordida aberta anterior de
No passado, os planejamentos em cirurgia ortognática 2,0 mm, overjet de -11,0 mm, desvio mandibular para lado
eram realizados exclusivamente por meio de imagens 2D e esquerdo, linha média dentária superior desviada 1,5 mm
simulação em articuladores semi-ajustáveis (ASA), visando para direita e inferior 7 mm para esquerda, perfil facial
à previsibilidade de posicionamento dos maxilares e auxiliar côncavo e exposição dentária inadequada em repouso e ao
a transferência do planejamento para o procedimento sorrir (Figura 1). As características faciais estão no quadro
por meio da confecção de guias cirúrgicos (SUN et al., 1.
2013). Com as inovações tecnológicas, os planejamentos
avançaram proporcionalmente aos métodos de imagem, Caso B
como nas tomografias computadorizadas e com os Jovem de 22 anos foi submetido à análise facial e exame
programas computacionais para segmentação de imagens intrabucal. As avaliações demonstraram assimetria facial
tomográficas e renderização 3D, confecção de protótipos com má-oclusão Classe III associada a mordida cruzada
estereolitográficos e simulações cirúrgicas em ambiente posterior e anterior, mordida aberta anterior de 6 mm,
virtual, que se tornaram úteis e eficazes (HASS JR; BECKER; trespasse horizontal de - 6 mm, com desnivelamento nos

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Figura 1: (A–D) Imagens pré-operatórias da face com lábio relaxado e ao sorriso; (E–G) Imagens da oclusão pré-operatórias

Figura 2: (A–D) Imagens pré-operatórias da face com lábio relaxado e ao sorriso; (E–G) Imagens da
oclusão pré-operatórias

caninos superiores e inferiores, desvios de linhas médias juntamente com projeção do mento em relação ao lábio
dentárias superior de 2 mm para direita e inferior de 4 inferior. O exame intrabucal demonstrou má-oclusão
mm para esquerda, maior exposição gengival a direita classe III, sobremordida normal, overjet de - 9mm, com
durante sorriso (Figura 2). As características faciais desvio de linha média superior (2mm para direita) e
estão no quadro 1. inferior (1,5 mm para esquerda) (Figura 3). O quadro 1
descreve as características faciais.
Caso C A partir dos exames clínicos e de imagem dos três
Mulher de 23 anos foi submetida à análise facial e casos, foi verificado assimetria facial resultante de
exame intrabucal. A análise facial mostrou aparência HC unilateral, que estava inativa após 06 meses de
de face longa, sem excesso vertical aparente de acompanhamento clínico. Os planejamentos para os
maxila, com exposição gengival adequada ao sorrir três casos foram baseados a partir dos dados clínicos,
(aproximadamente 2mm de margem gengival), e diferentes métodos de planejamento foram utilizados.

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Planejamento e simulação cirúrgica nos três pacientes, através do tomográfo i-CAT (Image
Primeiramente, as fotografias faciais pré-operatórias Sciences International, Hatfield, PA, EUA), com tempo
foram registradas em posição natural da cabeça. Para isso, de varredura de 40s, ajuste de 120 kVp, 5 mA, voxel 0,4
todos os pacientes foram orientados a olhar em direção mm isotrópico e escala de cinza de 14 bits. Os arquivos
a um ponto distante ao nível dos olhos e, se necessário, de imagens no formato DICOM foram importados para o
os cirurgiões os reorientavam. Os exames de tomografia programa computacional Dolphin Imaging® 11.7 (Dolphin
computadorizada de feixe cônico (TCFC) foram realizados, Imaging and Management Solutions, Chatsworth, CA, EUA).

Figura 3: (A–C) Imagens pré-operatórias da face com lábio relaxado e ao sor-


riso; (D–F) Imagens da oclusão pré-operatórias
Quadro 1: Comparação das características clínicas pacientes dos casos A, B e C
Dados qualitativos da análise facial
Vista frontal Caso A Caso B Caso C
Órbitas Simétricas Assimétricas Simétricas
(Simetria pupilar) Paralelo ao solo Desnivelado Paralelo ao solo
Nariz Não desviado Não desviado Não desviado
Filtro do lábio Não desviado Não desviado Não desviado
Desnivelamento labial e em Desnivelamento labial e em Desnivelamento labial e
Linha labial e comissura oral
comissuras comissuras em comissuras
Linha media do incisivo
superior ao plano mediano Desviado para a direita Desviado para a direita Desviado para a direita
sagital
Desnivelamento em caninos Desnivelamento em caninos Desnivelamento em caninos
Plano oclusal transversal superiores (lado direito mais superiores (lado direito mais superiores (lado esquerdo
baixo) baixo) mais baixo)
Exposição gengival em sorriso Sem exposição Maior exposição à esquerda Maior exposição à esquerda
Linha media do incisivo inferior Desviada para a esquerda Desviada para a esquerda Desviada para a esquerda
Lábio inferior e mento Deslocados para a esquerda Deslocados para a esquerda Deslocados para a esquerda
Comprimento do ramo
Diferença vertical Diferença vertical Nenhuma diferença
mandibular
Vista lateral Caso A Caso B Caso C
Suporte do lábio superior Pouco suporte labial Pouco suporte labial Pouco suporte labial
(ângulo nasolabial) superior (agudo) superior (normal) superior (agudo)
Incisivo superior Retroposicionado Retroposicionado Retroposicionado
Preenchimento paranasal Deficiente Bom Deficiente
Mandíbula e mento Prognatismo Prognatismo Prognatismo

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Para os casos A e B, o planejamento convencional foi cirúrgicas por meio dos arcos dentários dos modelos
realizado por meio de exames de imagens bidimensionais de gesso montados em ASA (Bio-Art, São Paulo,
(2D), montagem de modelos de gesso em ASA e simulação Brasil) que foram conduzidos a uma nova posição pelas
cirúrgica. Exclusivamente, o planejamento do caso B foi mensurações na plataforma de Erickson, permitindo
simulado em protótipo confeccionado a partir da TCFC. nova relação maxilomandibular, que foi transferida
O caso C teve seu planejamento realizado de forma para a cirurgia ortognática em sequência iniciada pela
tridimensional (3D) e virtual por meio Dolphin Imaging® mandíbula por meio de guias confeccionados com resina
11.7 3D (Dolphin Imaging and Management Solutions, acrílica autopolimerizável (JET, São Paulo, Brasil). No
Chatworth, CA, USA). protótipo proveniente da reconstrução ou renderização
tridimensional (Figura 5D – E), o operador simulou as
Planejamento convencional osteotomias sagital bilateral da mandíbula e Le Fort I
O planejamento 2D e convencional foi realizado de acordo com o que seria realizado no paciente, sendo
para o caso A através de radiografias panorâmica e os segmentos ósseos reposicionados de acordo com a
anteroposterior de face, e de telerradiografia de perfil simulação em cirurgia de modelo (Figura 5F).
produzidas na ferramenta building x-ray no Dolphin
Imaging® (Figura 4A - B). Os modelos de gesso dos arcos Planejamento virtual
mandibular e maxilar foram confeccionados e montados Para o caso C, o planejamento cirúrgico foi baseado
em ASA (Bio-Art, São Paulo, Brasil). A partir da análise nas queixas estético-funcional da paciente e na análise
facial, foram realizados traçados original e preditivo na facial. A partir da TCFC, as imagens foram reconstruídas
telerradiografia de perfil, simulando as movimentações tridimensionalmente usando programa Dolphin
cirúrgicas em estruturas ósseas, postura de lábios e Imaging®. De acordo com estes fatores, a cirurgia
contorno de tecido mole em perfil (Figura 4F). Além da bimaxilar (maxila e mandíbula) foi planejada através de
correção da assimetria, o planejamento consistiu de rotação anti-horária do complexo maxilomandibular com
rotação horária do complexo maxilomandibular para mentoplastia. A osteotomia Le Fort I foi selecionada
proporcionar preenchimento em região paranasal, para avanço e discreta impacção de maxila em região
adequada, exposição de incisivos superiores em relação de espinha nasal e incisivos superiores, correção de
ao lábio em repouso e melhor postura do mento e lábio linha média para esquerda em relação ao filtro do lábio e
inferior. nivelamento oclusal em caninos e molares. A osteotomia
A seguir, um operador simulou as movimentações sagital de mandíbula bilateralmente foi escolhida para
cirúrgicas por meio dos arcos dentários dos modelos de recuo de mandíbula e mentoplastia para avanço do
gesso montados em ASA, que foram conduzidos à nova queixo (Figura 6).
posição pelas mensurações na plataforma de Erickson,
permitindo nova relação maxilomandibular, que foi Procedimentos cirúrgicos
transferida para a cirurgia ortognática em sequência
iniciada pela maxila por meio de guias confeccionados com As cirurgias foram definidas de acordo com os
resina acrílica autopolimerizável (JET, São Paulo, Brasil). planejamentos propostos para os três casos. Os
procedimentos cirúrgicos foram realizados sob anestesia
Planejamento convencional e simulação em geral. No caso A, a cirurgia foi realizada em sequência
protótipo iniciada pela maxila. O acesso cirúrgico foi realizado por
abordagem vestibular e descolamento de mucosa não
No caso B, o planejamento 2D e convencional ceratinizada subperiosteal, estendendo-se de assoalho
foi realizado por meio de radiografias panorâmica, de fossa nasal até região pterigomaxilar. A osteotomia Le
anteroposterior de face e telerradiografia de perfil Fort I foi executada utilizando serra reciprocante (Stryker
produzidas na ferramenta building x-ray no Dolphin – CORE System) e finalizada com cinzeis e martelo. Após
Imaging® (Figura 5A - B). Os modelos de gesso dos as osteotomias em regiões pterigomaxilares e mobilização
arcos mandibular e maxilar foram confeccionados e da maxila, as paredes da maxila foram regularizadas
montados em ASA (Bio-Art, São Paulo, Brasil). A partir da de acordo com planejamento virtual, utilizando pinça
análise facial, foi realizado traçado original e preditivo na goiva e brocas de desgastes. O guia cirúrgico de resina
telerradiografia de perfil, simulando as movimentações acrílica autopolimerizável foi inserido em conjunto
cirúrgicas em estruturas ósseas, postura de lábios e com acessórios ortodônticos e fio de aço, com objetivo
contorno de tecido mole em perfil (Figura 4C). Além de bloqueio maxilomandibular, estabilizando maxila
da correção da assimetria, o planejamento consistiu de em posição satisfatória para oclusão ideal. Por fim, a
rotação anti-horária do complexo maxilomandibular e maxila foi posicionada com fixação interna rígida com
mentoplastia para melhorar a postura de lábio inferior miniplacas em formato de L bilateralmente nas regiões de
em relação ao pogônio. zigoticomaxilar e ao redor da abertura piriforme (Sistema
A seguir, o operador simulou as movimentações 2.0 - Neoface – Neoortho Produtos Ortopédicos).

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Figura 4: (A–B) Radiografia panorâmica e telerradiografia de perfil apresentaram diferenças de
altura entre os ramos mandibulares; (C–D) Reconstruções multiplanares em TCFC para demons-
trar desvio em sínfise e linhas médias dentárias; (F) Traçado original e preditivo sobrepostos em
telerradiografia de perfil; (G–K) Posicionamento de maxila por meio de plataforma de Erickson
para simulação em cirurgia de modelo

Figura 5: (A–B) Imagem tridimensional das estruturas ósseas maxilomandibulares pré-


-operatórias Radiografia panorâmica e telerradiografia de perfil apresentaram diferenças de
altura entre os ramos mandibulares; (C) Traçado original e traçado preditivo sobrepostos em
telerradiografia de perfil; (D–E) Reconstrução tridimensional e protótipo confeccionado; (F)
Simulação dos movimentos em cirurgia de modelo e protótipo

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O acesso vestibular da mandíbula foi executado a osteotomia sagital da mandíbula bilateral foi feita,
através da incisão em tecido mole sobre a linha obliqua finalizada por uso de cinzeis. Os guias cirúrgicos em
externa até a mesial do segundo molar, lateralmente resina acrílica então foram fixados aos acessórios
(mínimo de 5 mm de mucosa não ceratinizada mantida ortodônticos para bloqueio maxilomandibular com fio
em região de vestíbulo). Foi efetuada, então, dissecção de aço. Mandíbula e maxila foram estabilizadas em
subperiosteal da mucosa bucal em direção à linha obliqua oclusão final, sendo a mandíbula posicionada através de
interna na área retromolar com intuito de exposição fixação interna rígida com miniplacas retas e parafusos
parcial da região medial e língula da mandíbula. Através monocorticais (Sistema 2.0 - Neoface – Neoortho
de serras reciprocantes (Stryker – CORE System), Produtos Ortopédicos).

Figura 6: (A–B) Reconstrução 3D de maxila e mandíbula prévio a simulação de planejamento virtual; (C) Valores em
mm das movimentações esqueléticas e dentárias em maxila e mandíbula; (D-E) Reconstrução 3D de maxila e mandí-
bula após simulação de planejamento virtual; (F-G) Contorno de tecido mole prévio e após a simulação

Para os casos B e C, as mesmas condutas mantidos até a finalização.


mencionadas foram realizadas, mas em sequência Foi constatado, por parte dos próprios pacientes,
invertida, sendo a mandíbula operada primeiramente grau elevado de satisfação, com ótimo resultado
em relação à maxila. E exclusivamente para o caso C, estético e funcional. Os resultados dos casos A, B e C
foram utilizados guias estereolitográficos provenientes permaneceram estáveis após um ano de pós-operatório
da simulação cirúrgica virtual. Para esses dois casos, (Figuras 7, 8 e 9).
foram realizados mentoplastia para avanço de mento e
melhora em contorno de sulco mentolabial. discussão

Pós-operatório Previamente aos planejamentos e cirurgias, todos os


Os pacientes foram avaliados semanalmente nos três pacientes foram submetidos ao preparo ortodôntico, o
primeiros 2 meses e mensalmente até o sexto mês. que permitiu um acompanhamento clínico da assimetria
Os tratamentos ortodônticos pós-operatórios foram facial por período de 06 meses. Foi excluída a realização

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de exames de cintilografia e tomografia por emissão procedimento cirúrgico.
de pósitrons para avaliar as regiões de articulações O tratamento de HC unilateral deve ser definido
temporomandibulares, pois acredita-se que os resultados de acordo com a progressão ou não de atividade de
poderiam ser inespecíficos, sendo as evidências clínicas crescimento. Os relatos apresentaram inatividade quanto
(idade, acompanhamento radiográfico e fotográfico, a HC em pacientes com mais de 20 anos de idade,
e modelos de gesso) de inatividade da HC mais restringindo-se a correção cirúrgica da assimetria facial
determinantes para não progressão da condição. Dessa com intuito de oferecer resultados estéticos e funcionais.
forma, os casos relatados evidenciaram assimetrias Em nenhum dos casos foi realizado condilectomia alta
faciais que foram causadas por HC unilateral caracterizada prévia ou concomitante a cirurgia ortognática. De acordo
por uma atividade de crescimento acentuado em côndilo com Wolford; Movahed; Perez (2014), se os pacientes já se
mandibular. encontram na fase de inatividade quanto ao crescimento
Os parâmetros aplicados nos relatos foram similares ao por HC, a cirurgia ortognática usualmente poderá ser
de Wolford; Movahed; Perez (2014), que relataram que as realizada para correção da deformidade dentofacial sem
HC ocorrem usualmente durante a puberdade, ocasionando necessidade de abordagem em côndilo mandibular.
prognatismo mandibular (má-oclusão Classe III), mordida Ghawsi; Aagaard; Thygesen (2016) revisaram
cruzada posterior, desvio de linha média dentária inferior sistematicamente a eficácia da condilectomia alta para
e mentoniana, o que altera a morfologia mandibular. Em tratamento de HC, destacando que este procedimento
certas ocasiões, haverá pacientes com efeitos residuais é controverso pelo caráter autolimitante da condição
desse crescimento anormal em maxila (desnivelamento de crescimento acentuado, o que indicaria um possível
oclusal e desvio de linha média). Acrescentam considerarem adiamento de abordagem cirúrgica. Entretanto, se os
que a cintilografia ou tomografia por emissão de pósitrons pacientes em fase de crescimento desejarem a correção
são desnecessárias para avaliar hiperatividade na HC, pois da deformidade dentofacial por aspectos psicossociais e
a característica de progressão de assimetria facial até desajuste social (SUEN et al., 2018), é valido considerar a
meados dos 20 anos fundamenta-se como uma condição condilectomia alta para cessar a condição hiperplásica na
autolimitante, e os cirurgiões devem avaliar clinicamente mandíbula e minimizar recidivas após a cirurgia ortognática
os pacientes pelo período de 06 a 12 meses antes do (LÓPEZ; CORRAL, 2015).

Figura 7: (A–F) Imagens do resultado pós-operatório em repouso e ao sorriso; (G–I) Imagens intraorais da
oclusão em pós-operatório

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Figura 8: (A–F) Imagens do resultado pós-operatório em repouso e ao sorriso; (G–I) Imagens
intraorais da oclusão em pós-operatório

Figura 9: (A–F) Imagens do resultado pós-operatório em repouso e ao sorriso; (G–I) Imagens intraorais
da oclusão em pós-operatório

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Para a execução da cirurgia ortognática, é seria dependente da posição da maxila. Os três casos
fundamental desenvolver planejamentos prévios aos apresentavam semelhanças clínicas pré-operatórias,
procedimentos cirúrgicos. Esses planejamentos podem contudo, os casos B e C demonstraram melhores
ser caracterizados como convencionais, caracterizado por resultados qualitativos quanto à simetria mandibular, e
fluxo de trabalho descrito nos casos A e B, que utilizaram parece que a sequência iniciada pela mandíbula facilitou
imagens 2D, traçados preditivos e cirurgia de modelo em a correção da região com maior proporção assimétrica.
ASA. Nesse sentido, Ritto et al. (2018) destacaram que Além disso, a sequência iniciada pela mandíbula é
os planejamentos convencionais têm sido realizados há benéfica para rotações anti-horárias do complexo
mais de 50 anos, sendo o fluxo de trabalho reprodutível maxilomandibular (Casos B e C), mordida aberta anterior,
e os resultados obtidos em pós-operatórios favoráveis. imprecisão do registro intercondilar e incerteza quanto
No entanto, o planejamento convencional pode acumular ao posicionamento do côndilo (MARLIÈRE et al., 2018).
pequenos erros durante o fluxo de trabalho, desde Em relação a precisão do planejamento, desde a
a aquisição de modelos de gesso e montagem em utilização dos traçados cefalométricos para planejamento
ASA inadequadas até confecção de guias cirúrgicos em cirurgia ortognática, o desvio máximo de 2 mm era
insatisfatórios, o que levaria a imprecisões importantes. aceitável entre o plano de tratamento e resultados obtidos
Assim, o planejamento convencional apresenta possíveis para tecidos moles e esqueléticos (MARQUETTI et al.,
erros cumulativos do processo laboratorial até a 2006). Atualmente, muitos autores evidenciam que os
visualização 3D das estruturas ósseas, principalmente, critérios de sucesso e clínico aceitável ainda permanecem
quando a deformidade dentofacial é complexa, como se a diferença máxima de 2 mm entre o planejado e
assimetria facial (RITTO et al., 2018). obtido em pós-operatório (STOKBRO et al., 2014). Apesar
Para minimizar essa limitação do planejamento de não ter sido feito nenhuma mensuração quanto a
convencional em assimetrias faciais, o caso B utilizou precisão dos diferentes planejamentos e resultados, os
o recurso de imagem 3D da TCFC para avaliação da casos foram qualitativamente satisfatórios. Os casos
disposição das estruturas ósseas, e prototipagem aqui apresentados sugerem que não houve diferenças
para simular os movimentos cirúrgicos dos segmentos na resolutividade funcional e estética, independente
osteotomizados previamente a cirurgia ortognática. do planejamento executado. Essas evidências podem
Embora, este recurso aumente mais uma etapa laboratorial ser confirmadas pelo estudo retrospectivo de Ritto et
no planejamento, acredita-se que o protótipo permitiu al. (2018), que compararam o planejamento virtual
verificar o comportamento de maxila e mandíbula a partir e convencional por meio de mensurações lineares na
dos guias confeccionados, que auxiliaram a transferência maxila em TCFC de 30 pacientes submetidos a cirurgia
do planejamento e eram provenientes da simulação ortognática, os resultados não demonstraram diferenças
da cirurgia de modelo, que se limitou a apresentar as entre os planejamentos e resultados pós-operatórios
relações entre os arcos maxilo-mandibulares. obtidos.
O planejamento virtual elimina muitas etapas Portanto, concordamos que os avanços tecnológicos
laboratoriais quando comparado ao fluxo de trabalho do quanto ao planejamento em cirurgia ortognática
convencional, o que tende a diminuir tempo dispendido aumentaram a acurácia dos resultados em casos
prévio a cirurgia, minimiza erros cumulativos e apresenta de assimetria, alinhamento de linhas médias e
resultados mais precisos (KWON et al., 2014). O relato posicionamento mandibular quando comparados ao
C realizou exclusivamente um planejamento virtual, planejamento convencional (RIU et al. 2014). No
excluindo traçados preditivos em imagens 2D, montagem entanto, o planejamento virtual não exclui a importância
em ASA de modelos de gesso e cirurgia de modelo. Todas do cirurgião quanto ao plano de tratamento baseado
as etapas foram realizadas a partir da renderização 3D em uma análise facial criteriosa, percepção clínica
da TCFC em programas computacionais, que permitiu para otimização funcional e estética, fluxo de trabalho
simular osteotomias em maxila e mandíbula, bem como, padronizado, e execução cirúrgica tecnicamente
visualizar os movimentos ósseos e a influência sobre os consolidada.
tecidos moles.
Em todos casos aqui relatados, os procedimentos CONCLUSÃO
cirúrgicos foram realizados pela mesma equipe de
cirurgiões por meio de técnicas padronizadas. A única Os diferentes planejamentos em cirurgia ortognática
diferença para o caso A foi a sequência cirúrgica iniciada demonstraram previsibilidade e foram viáveis para
pela maxila em relação a iniciada pela mandíbula para os aplicação em pacientes assimétricos, proporcionando
casos B e C. Entende-se que a sequência iniciada pela resultados satisfatórios para os casos relatados. Para os
maxila favoreceu ao planejamento de rotação no sentido casos B e C, houve uma tendência de melhores resultados
horário do complexo maxilomandibular, mas poderia porque recursos 3D ou imagens 3D foram utilizados nos
dificultar a correção da assimetria, porque a posição final planejamentos e as cirurgias empregaram a sequência
assumida pela mandíbula (maior proporção assimétrica) operatória iniciada pela mandíbula.

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