Aula 3. Amenorreia

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Saúde da Mulher II

Izabela Campos

AMENORREIA

 Eixo reprodutivo feminino


O hipotálamo coordena a hipófise, que coordena o
ovário que, por sua vez, secreta os hormônios
estrogênio e progesterona que comandam o útero.
Qualquer alteração/problema em algum desses níveis
causa interrupção da menstruação e do ciclo
menstrual.

 Desenvolvimento puberal normal


No desenvolvimento puberal normal, a primeira mudança é o broto mamário, que aparece por volta
dos 9-10 anos. Depois, ocorre a pubarca, por volta dos 10 anos; depois o desenvolvimento das
mamas, por volta dos 11 anos; depois, a menarca e ciclos menstruais.
Entre o aparecimento do broto mamário e a menarca, tem mais ou menos 2-3 anos de intervalo.
Depois da menarca, o desenvolvimento puberal ocorre mais rapidamente. O desenvolvimento
puberal completo (mama adulta, distribuição de pelos pubianos, ciclos menstruais) é alcançado por
volta dos 14-15 anos de idade. Entre o aparecimento do broto mamário e o fim do desenvolvimento
puberal são cerca de 4,5 anos.

 Amenorreia
No início da vida reprodutiva, é muito comum a irregularidade menstrual por imaturidade do eixo
hipotálamo-hipófise. Quando o funcionamento do eixo é estabelecido, espera-se que a
menstruação seja regular.
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A amenorreia é a ausência de menstruação.
Pode ser primária ou secundária:
- Primária: significa que a menina nunca menstruou e não desenvolveu nenhum caractere
sexual secundário até 13-14 anos OU quando a menina nunca menstruou até a idade > 16 15

anos, mas já desenvolveu caracteres sexuais secundários. Até os três anos após o início do desenvolvimento
das mamas, se isto se deu antes dos anos
- Secundária: quando a mulher já menstruou e que, por algum motivo, ocorre interrupção
de menstruação por um período de mais de 3 meses ou mais de 3 ciclos menstruais.

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o Amenorreia primária
Na amenorreia primária, deve-se identificar o estado de desenvolvimento gonadal da menina.
Assim, ela pode estar associada a:
- Eugonadismo: a gônada funciona normalmente, com produção normal de estrogênio e
progesterona.
- Hipogonadismo hipogonadotrófico: a gônada funciona menos do que deveria, por um
problema na secreção de gonadotrofinas.
- Hipogonadismo hipergonadotrófico: a gônada funciona menos do que deveria, mas
devido a um aumento das gonadotrofinas.

VAI CAIR NA PROVA

As situações em que ocorrem cada uma dessas causas incluem:


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A investigação inicial inclui:


- Exame físico:
 Peso, altura, avaliação física e neurológica (obesidade? IMC baixo?)
 Desenvolvimento puberal (critérios de Tanner);
 Presença de galactorreia;
 Sinais de adrenarca (se há desenvolvimento de pelos pela secreção de androgênios
pela adrenal);
 Sinais de ação estrogênica (significativa no desenvolvimento mamário);
 Hiperandrogenismo (hiperplasia congênita de adrenal ou tumor produtor de
androgênio causa bloqueio na produção ovariana de hormônios);
 Anatomia e desenvolvimento da genitália externa;
 Exame da genitália interna (hímen imperfurado?);
- US:
 Verificar a presença de útero.
- Investigação de gonadotrofinas:
 FSH.
- Cariótipo.
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Fenótipo
feminino

Se a paciente tem um fenótipo feminino, ela pode ter o útero + ou ausente. Se o útero estiver
presente, deve-se buscar a dosagem do FSH, que pode estar baixo, normal ou alto.
Se o FSH estiver baixo, classifica-se como hipogonadismo hipogonadotrófico. Nesse caso, não
há a produção de gonadotrofinas, que pode ser causada por atraso constitucional do
desenvolvimento puberal ou por deficiência de GnRH.

A causa mais comum de deficiência de GnRh é a


Síndrome de Kallmann. Nessa síndrome, um defeito
embrionário leva a falta de uma proteína, o que faz
com que os neurônios responsáveis pela produção de
GnRH não migrem para o núcleo arqueado. Além
disso, também ocorre a falta de migração dos
neurônios responsáveis pelo desenvolvimento do
olfato. A característica clínica é uma amenorreia
primária, caracterizada por hipogonadismo
hipogonadotrófico e anosmia.
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Se o útero estiver presente e o FSH estiver normal, deve-se considerar uma possível obstrução
no trato genital. A obstrução do fluxo de saída é decorrente geralmente de alteração anatômica, o
que pode ser por um hímen imperfurado ou por um septo vaginal transverso.
O local mais comum de ocorrência do septo vaginal é no terço distal da vagina.

Septo vaginal transverso: pode


ser resultante da falha na fusão dos
ductos de Müller ou da canalização
da placa vaginal.

Se o útero estiver presente e o FSH estiver alto, deve-se sempre considerar uma insuficiência
ovariana ou disgenesias gonadais. Entre as disgenesias gonadais, as mais comuns são a
síndrome de Turner (paciente tem ovário, mas é XO) e a Disgenesia Gonadal XY ou Síndrome
de Swyer (a paciente tem testículo, mas ele em fita, não ocorrendo a produção de androgênio, o
que impede a formação do pênis e da bolsa escrotal). Nesse caso da Síndrome de Swyer, pela
falta de androgênios e pelo não funcionamento do testículo, não ocorre a produção do hormônio
antimulleriano (hormônio inibidor dos ductos de Muller), o que leva ao desenvolvimento do
terço proximal da vagina e do útero.

A amenorreia primária também pode ser causada em um paciente com fenótipo feminino pela
ausência de útero.
Nesta condição, se o útero estiver ausente e o FSH estiver normal, existem duas condições que
podem acontecer: se a paciente for 46 XX, na maioria dos casos é uma malformação mulleriana,
como a Síndrome de Rokitansky, em que ocorre a ausência do útero (origem nos ductos de
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Muller), das trompas e do terço proximal da vagina (origem ectodérmica); em caso de paciente 46
XY, ocorre insensibilidade androgênica ou Síndrome de Morris.
OBS: a origem embrionária do útero e dos ovários é diferente. Portanto, no caso da Síndrome de
Rokitansky, a paciente tem ovários funcionantes, mas não tem útero.

No caso da síndrome de Morris, a paciente tem níveis de FSH normais porque ela tem testículo,
mas não tem receptor periférico para o androgênio que ela produz agir. Ou seja, a concentração
de androgênios é normal, mas não existem os receptores alvo para a ação desses hormônios.
Assim, a paciente não desenvolve bolsa escrotal e pênis, mas sim, genitália feminina.
A diferença com a Síndrome de Swyer está justamente no fato de que nesse caso, a paciente tem
testículos, mas eles não são funcionantes e não produzem o hormônio antimulleriano. Na Síndrome
de Morris, ocorre uma insensibilidade periférica aos androgênicos, pela falta de receptores. Na
hipófise, os androgênios conseguem agir e, por isso, o FSH é normal.

As mamas são desenvolvidas pela conversão periférica dos androgênios. A massa muscular é
aumentada pela quantidade de androgênios.
Como os testículos não descem para a bolsa escrotal, eles permanecem na região abdominal.
Contudo, a temperatura intra-abdominal aumentada pode se associar a ocorrência de tumor no
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testículo. Assim, nessas pacientes deve ser avaliada a gonadectomia para reduzir o risco de
transformação maligna nos testículos (gonadoblastoma, Disgerminoma, tumor de saco de yolk,
Coriocarcinoma). Indicação de cariótipo: não tem útero e FSH normal ou tem útero e o FSH está alto.

o Amenorreia secundária
Na avaliação inicial, deve-se atentar para:
- Excluir gravidez como investigação inicial.
- Anamnese;
- Exame físico:
 Sinal de hiperandrogenismo clínico em amenorreia secundária leva a pensar em SOP
ou tumor adrenal produtor de testosterona.
- Dosagens hormonais:
 FSH e Prolactina.

Em caso de FSH baixo e PRL alta, ou seja, em casos de hiperprolactinemia, deve-se pensar
como causa os tumores hipofisários, uso de medicamentos que reduzem dopamina,
hipotireoidismo, insuficiência renal ou causa idiopática. Alguns medicamentos que podem causar
hiperprolactinemia são: Risperidona, ADT, anti-tireoidianos, Metoclorpramida por tempo
prolongado, etc.
Em casos de adenoma, podemos classifica-los em micro ou macroadenomas produtores de PRL.
O microadenoma é caracterizado quando a PRL < 100 e o macroadenoma quando a PRL é > 100.
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Em caso de PRL > 100 deve ser feita investigação por


imagem da sela túrcica para verificar o tamanho do tumor e a
possibilidade de efeitos compressivos.
A cirurgia para retirada de macroadenoma é sempre a última
opção, uma vez que o tumor é não capsulado, causando em
muitos casos a exérese de outros segmentos da hipófise e
levando a insuficiência hormonal de outros hormônios, como
TSH, ACTH, etc.

Em caso de FSH e PRL normais, deve-se pensar em anovulação crônica. Para verificar a
funcionalidade do ovário, deve-se fazer o teste da progesterona. Administra 10 dias de
progesterona para a paciente e suspende o uso; se o endométrio tiver sido estimulado pelo
estrogênio, haverá sangramento – teste positivo. Se o endométrio for atrófico, ou seja, se não for
estimulado pelo estrogênio, não haverá sangramento e o teste será negativo.

Desde 2017 não é


mais indicado

Assim, FSH e PRL normais estão associados a duas condições na investigação da amenorreia
secundária:
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- Anovulação crônica: SOP.
- Defeito estrutural endometrial: em alguns casos, ocorre a destruição do endométrio devido
a curetagem uterina devido a retirada da camada basal, que impede que o endométrio se
reestabeleça. Infecção por Chlamydia pode levar a uma endometrite e levar a sinéquia
intrauterina também.
Para verificar a presença de defeito estrutural do endométrio, muitas vezes o US não é suficiente.
Deve-se verificar a resposta do endométrio ao estímulo hormonal. Nesse caso, realiza-se o teste
do estrogênio + progesterona. Administra-se estrogênio por 21 dias em uma dosagem mais alta
e, nos últimos 10 dias da administração do estrogênio, administra-se progesterona para verificar a
descamação do endométrio. Se a paciente sangrar, significa que o trato genital está pérvio. Se a
paciente não sangrar, significa que a paciente está com uma anormalidade no trato de saída.

Síndrome de Asherman's:
presença de sinequias fibróticas na
cavidade uterina após um trauma
endometrial
- Infecção por clamydia.
- Curetagem

Se o FSH estiver alto, temos um quadro de hipogonadismo hipergonadotrófico. A principal


causa dessa alteração na amenorreia secundária é a insuficiência ovariana. Nesse caso,
chamamos de insuficiência ovariana prematura (IOP), e não mais menopausa precoce.
Na IOP, ocorre uma aceleração da atresia dos folículos, levando a uma redução da população
folicular. Alguns fatores causadores incluem:
- Quimioterapia e radioterapia: pela destruição de células germinativas;
- Alteração autoimune: muito mais comum do que as alterações cromossômicas;
- Alterações cromossômicas e genéticas: indicação de fazer cariótipo.
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O mais comum é encontrar um cariótipo normal, portanto deve-se investigar as causas


imunológicas. Entre as causas imunológicas mais comuns, estão:
- Diabetes tipo 1
- Tireoidite
- Insuficiência adrenal
- Vitiligo
- LES
- Miastenia
- Púrpura trombocitopênica idiopática
- Artrite reumatoide
- Anemia hemolítica autoimune
- Radioterapia
- Quimioterapia
- Galactosemia
- Deficiência enzimática
- Defeito em receptores: Síndrome dos ovários resistentes – deficiência de receptores
ovarianos para o FSH, não produzindo estrogênio. Se não produz estrogênio, ocorre
aumento do FSH como feedback (raro).
Se o FSH estiver baixo, deve-se pensar em disfunção hipotálamo-hipofisária. A parte folicular
da paciente é normal, só não está sendo estimulada a se desenvolver.
Quando se pensa em tumor, geralmente o paciente apresenta cefaleia como um dos sinais clínicos.
Quando se trata da Síndrome de Sheehan, devemos lembrar que se trata de uma necrose
hipofisária devido a hemorragia pós-parto. Durante a gestação, a hipófise aumenta de volume e se
torna mais vascularizada. No pós-parto, se a paciente perde muito sangue, ocorre vasoconstrição
generalizada como reflexo adrenérgico. Desse modo, pode ocorrer vasoconstrição e necrose da
hipófise. Nesse caso, ocorre uma insuficiência pluri-hormonal – pan-hipopituitarismo.
Primeira alteração: paciente não amamenta.
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Quando se fica na dúvida entre um quadro hipotalâmico e hipofisário, deve-se fazer um teste de
estímulo do GnRH. Administra-se o GnRH e, em seguida, dosa-se as gonadotrofinas FSH e LH.
Se houver um estímulo a secreção de FSH e LH, significa que o problema é hipotalâmico. Se não
houver aumento da secreção de FSH e LH, o problema é hipofisário.
OBS: a dosagem do GnRH é difícil de ser feita porque sua secreção é cíclica e pulsátil (a cada 2
minutos).

A não ser em casos de tumores hipofisários ou hipotalâmicos, os outros casos apresentam


basicamente o mesmo tratamento.
Administrar FSH e LH nas pacientes é de alto custo, o que as vezes inviabiliza o processo. Assim,
o tratamento do hipogonadismo hipogonadotrófico acaba envolvendo suprir o que o ovário não está
produzindo.
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 Tratamento
O diagnóstico de amenorreia é sindrômico.
Deve-se avaliar onde está o problema:
hipotálamo, hipófise, ovário ou útero.
O tratamento depende das expectativas da
paciente, em especial, reprodutivas e sexuais.

Se o problema causador da amenorreia for a hiperprolactinemia, deve-se administrar um agonista


dopaminérgico, que vai inibir a secreção de PRL, melhorando o ciclo menstrual.
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A Bromocriptina apresenta mais efeitos colaterais (lipotimia, tonteira), enquanto a Cabergolina
tem menos efeitos colaterais, mas é mais cara. Além disso, a Cabergolina pode ser administra
semanalmente.
Se a paciente tiver um hipoestrogenismo sem desenvolvimento sexual como causa da amenorreia
primária, o uso de estrogênio leva ao desenvolvimento de caracteres sexuais nessa paciente,
melhorando o amadurecimento das mamas e o trofismo vaginal. Deve ser associado a
progesterona para contrabalancear a proliferação do endométrio.

Em mulheres que já têm o desenvolvimento sexual completo, como em casos de hipogonadismo


hipogonadotrófico, o tratamento com estrogênio e progesterona é feito para reestabelecer os ciclos.

Evitar complicações relacionados ao hipoestrogenismo:


- Complicações cardiovasculares.
- Osteoporose.
Vai manter pelo menos até os 50 anos.

Em caso de eugonadismo normogonadotrófico (FSH, estrogênio e progesterona normais) e


anovulação (pode ser por hiperandrogenismo ou por SOP ou por hiperplasia de adrenal), o
tratamento é direcionado para a causa: corticoide para a hiperplasia de adrenal, ACO e drogas
sensibilizadoras em caso de SOP.
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Se a paciente apresenta uma IOP, deve ser avaliada a terapia hormonal, principalmente pelas
repercussões do hipoestrogenismo a longo prazo. O tratamento deve ser individualizado.

Os principais estrogênios e progesteronas utilizados estão presentes nas tabelas abaixo.


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A paciente com anorexia tem um quadro de hipogonadismo hipogonadotrófico, ou seja, uma


deficiência na secreção de GnRH. A diferença com os outros tipos de hipogonadismo
hipogonadotrófico é que, como o IMC é muito baixo, além da terapia hormonal, deve ser feito o
suporte nutricional e emocional. O tratamento é multidisciplinar, visando restaurar a autoimagem
e o ganho de peso.
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OBS: em alguns casos de anorexia grave, a paciente perde o controle da temperatura corporal.

 Key points
Deve-se diferenciar amenorreia primária de secundária.
Amenorreia primária deve ser investigada com base no perfil endócrino como Eugonadismo ou
hipogonadismo hipo ou hipergonadotrófico.
Amenorreia secundária deve ser investigada, após exclusão de gravidez e causas estruturais, com
base nas dosagens iniciais de prolactina e FSH.

 Caso clínico
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HD: Amenorreia secundária.


Dosar beta-HCG, prolactina e FSH.

Prolactina normal e FSH baixo –


disfunção hipotálamo-hipofisária.
Teste de GnRH: administrar GnRH e
verificar níveis de resposta de FSH e LH.
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HD: Amenorreia secundária hipotalâmica.

Conduta: repor FSH e LH.

OBS: A meia-vida da pílula é de 24 horas. A paciente retorna à fertilidade normal após suspensão
completa da pílula anticoncepcional em 3 meses.

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