Texto Ética - A Eudaimonia Aristotélica

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A eudaimonía aristotélica: a felicidade como fim ético

Roberto Antônio Penedo do Amaral


Revista Vozes do Vale da UFVJM, número 1, ano 1

Ética é uma palavra que deriva de ethos, que em grego, significa “costume”,
“caráter”, “tradição” (FARIA, 1994). É a forma que o homem utiliza para se organizar
em sociedade, elaborando juízos de valor e criando leis de governo. Também se refere à
índole, significando o estudo do caráter para determinar como o indivíduo poderá se
tornar virtuoso. Desse modo, a natureza do homem apresenta duas dimensões: a política
e a moral que se manifestam nos diferentes ethos.
Aristóteles não foi o precursor nas discussões a respeito da ética, porém, foi o
primeiro a denominá-la como filosofia prática e empregou o método, o conteúdo e a
técnica para torná-la uma ciência:

A ética é uma ciência prática ou uma ciência da práxis humana, isto é,


um saber que tem por objeto a ação. (...) o homem age tendo em vista
um fim ou uma finalidade e, portanto, ao agir, atualiza potências para
realizar plenamente sua forma (CHAUÍ, 2002 p. 440).

Esta finalidade está presente, segundo Aristóteles, em todas as atividades humanas


que tem como alvo a busca do “bem”. No caso da ética, o bem é uma maneira de preparar
o indivíduo para viver na pólis. A política que também é uma ciência prática não se
dissocia da ética, elas apenas se diferenciam pelo fato de a primeira apresentar uma
dimensão social, coletiva, enquanto a outra se restringe ao particular, individual, portanto,

Quando se trata de determinar o mais alto dos fins humanos, Aristóteles dá a


impressão de hesitar nas Éticas, entre a vocação contemplativa e a vocação
política. Na verdade, não há contradição entre os dois ideais, que realizam,
ambos, a natureza do homem: o primeiro, na mais eminente de suas
virtualidades, que é a vida segundo intelecto, e o outro, na totalidade de suas
aptidões, que são interligadas e consumadas pela capacidade de manter relações
de justiça com outrem (HUISMAN, 2001 p. 70).

Ao escrever sobre a ética, Aristóteles compõe um verdadeiro tratado sobre o agir


humano na história do pensamento filosófico, refletindo sobre as condutas humanas e da
sociedade. O filósofo considera que o homem é um animal capaz de pensar e de fazer
política, ou seja, de exercitar a busca do bem comum por meio da cidadania.
Sendo uma ciência prática, a ética deve direcionar o fim a ser alcançado, dando
subsídios para que se concretize em plenitude, ou seja, para que alcance a felicidade.
Aristóteles concebia a ética como teleológica, que visa produzir um bem e chegar a um
objetivo, de acordo com o primeiro parágrafo da Ética a Nicômaco:
Percebemos que a ética em Aristóteles é interpretada como racional e natural, de
modo que, o homem fazendo o uso da razão tem a capacidade de fazer escolhas tanto para
o bem quanto para o mal. Ele nasce ético e a partir dos seus atos poderá ou não
desenvolver suas virtudes aperfeiçoadas pelo hábito.
Segundo Chauí (2002) Aristóteles concebia a virtude como um hábito adquirido
ou uma disposição constante e permanente para agir racionalmente em conformidade com
uma medida humana, determinada pelo homem prudente. Nesse ponto a ética tem como
atributo, orientar o homem na obtenção do hábito (exercício da vontade) para se tornar
virtuoso. Assim o filósofo escreve:
A virtude também se divide em espécies, de acordo com esta subdivisão, pois dizemos que algumas
virtudes são intelectuais e outras morais; por exemplo, a sabedoria filosófica, a compreensão e a
sabedoria prática são algumas das virtudes intelectuais; e a liberalidade e a temperança são algumas
das virtudes morais. De fato, ao falar do caráter de um homem não dizemos que ele é sábio ou que
possui discernimento, mas que é calmo, amável ou temperante; porém, louvamos um homem sábio
referindo-nos à sua disposição de espírito, e às disposições de espírito louváveis chamamos virtudes
(ARISTÓTELES, Livro I, 13,1103 a, 2010).

Em termos filosóficos, virtude (areté) quer dizer potencialidade, vitalidade e


vigor. Segundo Aristóteles, ela se refere à função da alma e é o equilíbrio (moderação)
entre dois extremos o justo meio – medida exata entre o excesso e a falta. A virtude se
divide em dois grupos: as dianoéticas (dianóia, “conhecimento demonstrativo”) que são
as virtudes intelectuais formadas pela sabedoria e pela prudência. E as virtudes éticas ou
morais que aludem ao instinto, à capacidade de desejar e à sensibilidade.
Todas as ações humanas visam uma finalidade com o propósito de obter um bem.
Aristóteles considera o bem como uma finalidade própria do homem, que busca alcançar
a felicidade (eudaimonía).
Na visão do pensador grego, ela é percebida como um bem supremo,
autossuficiente que é aprazível em si mesmo. É um meio de nos aproximarmos do que é
nobre e divino. Sendo uma atividade da vida contemplativa independe de bens exteriores
(riqueza, poder), mas estes bens podem ser usados como instrumentos para alcançá-la,
“(...) a felicidade necessita igualmente dos bens exteriores, pois é impossível, ou pelo
menos não é fácil, praticar ações nobres sem os devidos meios” (ARISTÓTELES, Livro
I, 8, 1099 a, 2010).
A finalidade natural de todos os seres humanos, segundo Aristóteles, consiste em
ter uma vida boa, justa e feliz. Partindo deste princípio, este filósofo propõe investigar
qual é o fim ético que todo indivíduo aspira e quais caminhos ele deve trilhar em direção
desta busca.
Diferentemente da honra, da inteligência e da riqueza, a felicidade é
autossuficiente (autárkeia), pois não necessita de bens exteriores para ser atingida, ao
passo que os outros meios são buscados em favor de distintos bens.
O bem é idealizado como uma virtude, uma atividade cotidiana que procura a
excelência de acordo com o exercício da razão, sendo tão sublime que nos aproxima do
divino. Sendo a felicidade um fim em si mesmo é conceituada na filosofia aristotélica
como um bem supremo, algo absoluto que converge na ação.
A ética é um saber prático que tem por objeto a ação humana, ao agir o homem
atualiza sua forma e busca a excelência em todos os aspectos do seu ser (físico, biológico,
social, psicológico etc.). Aristóteles diferenciou as ciências práticas (ética, política) das
teoréticas (as artes ou técnicas), sendo que as primeiras possuem um fim em si mesmas,
e as últimas não possuem esta mesma autonomia, pois seu fim é uma obra diferente. No
entanto, tais atividades possuem um aspecto comum, ambas têm como finalidade um
bem. Na ética aristotélica o bem é a forma harmoniosa de convivência entre os cidadãos
da pólis. A ética tem como pressuposto mostrar o caminho para se chegar à felicidade,
“Como toda ciência prática, a ética deve determinar a essência do fim a ser alcançado, a
essência do agente e das ações e os meios para realizá-la” (CHAUÍ 2002, p. 441).
Sendo assim, esta ética pretende investigar não somente o que é o bem, mas como
nos tornarmos bons. O bem ético é a vivência das virtudes no cotidiano, se difere da
felicidade uma vez que alcançá-la é o resultando da conquista de uma vida inteira. O bem
se diz de várias formas de acordo com a substância (atividade pura; intelecto); a qualidade
(excelência ou virtude); e a quantidade (justo meio), e também de acordo com a ação e a
paixão (desejo racional)

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