Semântica DO Português: Dalby Dienstbach
Semântica DO Português: Dalby Dienstbach
Semântica DO Português: Dalby Dienstbach
DO
PORTUGUÊS
Dalby
Dienstbach
Revisão técnica:
ISBN 978-85-9502-140-2
CDU 81’3
Introdução
Para compreendermos o significado de uma sentença, não basta co-
nhecermos os significados das unidades lexicais que a compõem. O
linguista norte-americano Noam Chomsky (1928-) tentou demonstrar
isso com a sentença “ideias verdes incolores dormem furiosamente”.
Embora essa sentença represente uma estrutura bem formada em língua
portuguesa e as suas palavras tenham um significado coerente, essa
combinação é impossível (ou, pelo menos, difícil) de ser compreendida.
Tanto os significados de palavras (ou, ainda, das unidades lexicais) quanto
os significados que decorrem da combinação dessas palavras (ou seja,
das frases) constituem objetos de investigação da semântica.
Neste capítulo, vamos abordar alguns fenômenos que fazem parte
do escopo dos campos da semântica lexical e da semântica frástica,
além de aprender sobre algumas relações de sentido que existem entre
palavras e sentenças.
A semântica lexical
Atualmente, o campo particular da linguística que chamamos de semântica
corresponde, na verdade, a um conjunto bastante amplo de teorias que lançam
diferentes olhares sobre diferentes aspectos do mesmo objeto — isto é, os
significados das línguas. Umas das teorias mais tradicionais desse conjunto
é conhecida como semântica lexical.
Semântica lexical é a ciência que se ocupa, especificamente, do significado
das palavras (CANÇADO, 2008). Para compreendermos o objeto da semântica
lexical, portanto, precisamos entender o que é uma palavra. Porém, esse não
é um objeto muito fácil de se definir.
Se levarmos em consideração a sua estrutura gráfica, podemos explicar o
objeto “palavra” como uma sequência de letras entre dois espaços em branco
(como a sequência “b-r-a-n-c-o”, na sentença anterior). No entanto, quando
consideramos a sua realização fônica, determinar os limites de uma palavra
qualquer se torna uma tarefa um pouco mais complicado. Não existem “espaços
em branco” na cadeia da fala.
De fato, a nossa tendência mais natural não é pronunciar palavra por palavra,
mas uma série de sílabas em um fluxo contínuo e ininterrupto — com pausas
ora entre as sílabas de uma mesma palavra, ora entre palavras, ora somente no
final de sentenças completas. A propósito, está claro que as pausas da cadeia da
fala nem sempre equivalem aos “espaços em branco” em uma linha no papel.
Portanto, ao assumirmos a palavra como um objeto da semântica, não
podemos defini-la somente em função da sua forma, mas, principalmente,
em termos de uma forma e um conceito associado a ela. Nesse sentido, o
interesse da semântica lexical deixa de ser a palavra e passa a ser a unidade
lexical sobretudo (LEWIS, 1993).
Uma unidade lexical pode ser definida, de um modo geral, como qualquer
unidade linguística (quer seja uma palavra ou, até mesmo, um conjunto de
palavras) que constitua uma unidade mínima de significação. Em outras pa-
lavras, essas unidades correspondem a formas linguísticas às quais podemos
atribuir um significado elementar. Exemplos de unidades lexicais podem
incluir, portanto, desde interjeições monossilábicas que expressam sentimentos
e impressões (como “ai”, “oh” e “ei”) até palavras simples (como “mala”,
“exemplo” e “justiça”) e conjuntos de palavras ou palavras compostas (como
“fim de semana”, “mal-humorado” e “comemorar”).
Um tipo de investigação que podemos conduzir, para descrever o signi-
ficado das unidades lexicais, é conhecida como análise sêmica (ou, ainda,
análise componencial) (TAMBA-MECZ, 2006). A análise sêmica (Quadro 1)
Animal + + +
Vertebrado + + +
Mamífero + + +
Primata + + −
Humano + − −
Podemos dizer que, atualmente, a semântica lexical está dividida em duas subáreas
particulares, uma de caráter mais teórico e outra mais aplicada. A primeira subárea,
que recebe o nome de lexicologia, ocupa-se da descrição e da análise do vocabulário
de línguas e dialetos (em função da estrutura semântica e das relações entre as suas
palavras e unidades lexicais). Já a segunda subárea da semântica lexical, chamada de
lexicografia, recruta as descrições e análises feitas pela lexicologia para realizar a
documentação e o registro desse vocabulário, sob a forma de dicionários.
A semântica frástica
Semântica frástica pode ser definida, de acordo com Tamba-Mecz (2006),
como uma ciência linguística que dá atenção não somente aos significados
das unidades lexicais, mas, principalmente, aos significados provenientes da
combinação de significados de palavras. Mais especificamente, constituem
objetos de interesse da semântica frástica, além dos significados lexicais, os
significados que emergem das relações que eles estabelecem entre si, dentro
de sequências linguísticas maiores.
Portanto, para essa semântica, a unidade mínima de significação (e, por-
tanto, de análise) deixa de ser a unidade lexical e passa a ser a frase. Nesse
sentido, podemos dizer, em última análise, que o tipo de investigação que
a semântica frástica empreende tem, como uma base importante, aspectos
relativos à estrutura gramatical (ou, ainda, à sintaxe) das línguas.
Em primeiro lugar, precisamos compreender a natureza daquilo que a
semântica frástica assume como uma unidade de significação (portanto, a
sua unidade de análise) — isto é, a frase. Frases compreendem ambos os
sintagmas e as sentenças que podemos construir a partir de unidades lexicais
independentes. Por um lado, sintagma designa uma palavra ou um conjunto
de palavras que pode desempenhar uma função sintática — isto é, um papel
particular dentro de uma sentença (quer seja o de sujeito, o de predicado ou o
de complemento). Nesse caso, o significado de um sintagma está definido não
somente pela combinação dos significados das suas partes, como, também,
pelo papel que ele desempenha nas sentenças que integra.
A classificação de um sintagma é definida pela palavra que define a sua função sintática.
Essa palavra constitui o núcleo do sintagma. Por exemplo, sintagmas cujo núcleo é um
substantivo (como “a minha comida predileta”, “aquele carro vermelho” e “todas as
crianças do bairro”) são denominados sintagmas nominais (SNs). Quando o núcleo
do sintagma é um verbo (como “vendeu o seu carro”, “leciono matemática” e “temos
pouco tempo”), ele constitui um sintagma verbal (SV). Além desses, ainda temos
sintagmas preposicionais (SPs), introduzidos por uma preposição (como “com pouco
dinheiro” e “antes do meio-dia”); sintagmas adjetivos (SAdjs), introduzidos por verbos
de ligação (como “é extremamente gentil” e “está cansado demais”); e sintagmas
adverbiais (Sadvs), introduzidos por um advérbio (como “não tenho paciência” e
“jamais te perdoarão”).
Relações semânticas
De acordo com Cançado (2008), as unidades linguísticas (sejam palavras
ou frases) podem ser organizadas (ou, de alguma forma, analisadas), ainda,
em função de determinadas relações de sentido que elas mantêm entre si.
Essas relações podem ser, por exemplo, de identidade, quando aproximam
essas unidades em função de alguma semelhança, ou de oposição, quando se
baseiam em aspectos contrários ou complementares.
No nível da palavra, as relações que podem se estabelecer entre as unidades
lexicais são, entre outras:
sinonímia;
antonímia;
hiperonímia;
hiponímia.
que Pedro” for verdadeira, então, a sentença “João é menor do que Pedro” só
pode ser falsa. Em última análise, as sentenças “João é maior do que Pedro”
e “João é menor do que Pedro” são contraditórias.
Por fim, acarretamento é a relação de sentido que se estabelece quando
o significado de uma sentença está contido no significado de outra sentença
(como acontece com a hiponímia, no que diz respeito às palavras). Nesse
caso, quando significado da primeira sentença é verdadeiro, o significado da
segunda, necessariamente, também o é.
Considere, por exemplo, a sentença “minha mãe comprou uma cadeira”.
O significado dessa sentença acarreta outras sentenças, cujos significados
podem ser depreendidos a partir dele, como “minha mãe comprou um móvel”,
“minha mãe comprou um objeto” ou, ainda, “minha mãe comprou alguma
coisa”. Portanto, todas essas sentenças são verdadeiras na mesma medida.