Artigo Costa-Hubes 2024
Artigo Costa-Hubes 2024
Artigo Costa-Hubes 2024
Introdução
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Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC, Brasil. Professor de Linguística Aplicada. drigo_
acosta@yahoo.com.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0148-8725
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Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Cascavel, PR, Brasil. Professora no Programa de Pós-
Graduação em Letras. tehubes@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9063-7982
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.
no próprio sentido do conceito de ‘práticas de linguagem’. Para além das pesquisas,
os mais recentes documentos político-educacionais brasileiros (PCN, Brasil, 1997a,
1997b, 1998a, 1998b BNCC, Brasil, 2018) se ocupam dos termos em várias passagens
das orientações. A partir disso, nos inquietamos com as seguintes questões: o que são
‘práticas de linguagem’? Como poderíamos definir ‘práticas de linguagem’? Como os
documentos político-educacionais definem ‘práticas de linguagem’?
A fim de abrir um debate sobre a questão, nosso objetivo, neste artigo, é propor uma
discussão teórico-metodológica sobre o conceito de ‘práticas de linguagem’ que orbita
em documentos parametrizadores nacionais, a partir da qual procuramos sistematizar
um construto metateórico sobre esse conceito, olhando, mais especificamente, para a
disciplina de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental1.
Para tanto, em termos de referencial balizador, vamos nos ancorar nos estudos
dialógicos da linguagem (Bakhtin, 2003 [1979]; 2008 [1963]; Medviédev, 2012
[1928]; Volochínov, 2013 [1928]; 2017 [1929-1930]). Com isso, nossa proposta segue
o panorama dos estudos linguístico-filosóficos do Círculo dos pensadores russos, o
que já, por conseguinte, elucida o matiz pelo qual e a partir do qual nossa proposta
se delineia.
Metodologicamente, nosso artigo é essencialmente teórico-metodológico à luz
da revisão bibliográfica (Fonseca, 2002; Pádua, 2004; Gil, 2008) e da metateorização
(Talja; Keso; Pietläinem, 1999; Edwards, 2013; Vanderberg, 2013; Bufrem; Freitas,
2015; Hedlung et al., 2015; Garcia, 2018) em diálogo com a análise documental
(Cellard, 2008; Bowen; 2009; Flick, 2009). A partir disso, vamos não apenas revisitar
referenciais teóricos, por meio da bibliografia, mas, em adição, vamos meta-analisar
dois documentos parametrizadores do Ensino Fundamental: os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) (Brasil, 1997a, 1997b, 1998a, 1998b) e a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) (Brasil, 2018), a fim de construir teorizações outras sobre nosso
objeto conceitual – ‘práticas de linguagem’.
Com o propósito de atendermos ao proposto, organizamos o texto da seguinte forma:
além da introdução e das considerações finais, tecemos, inicialmente, uma breve reflexão
sobre concepção de linguagem e unidades de ensino; em seguida, analisamos o conceito
‘práticas de linguagem’ em dois documentos político-educacionais: PCN e BNCC e, por
fim, apresentamos um construto metateórico sobre o conceito analisado. Acreditamos
na relevância da discussão, ou seja, um delineamento teórico-metodológico sobre o
sentido do conceito de ‘práticas de linguagem’ no âmbito das práticas de ensino e de
aprendizagem da língua portuguesa na escola, não apenas em função de uma possível
contribuição sobre essa questão – o que são práticas de linguagem? – para as pesquisas
em LA no campo da educação em linguagem, mas, sobretudo, para caminhos de (re)
leitura dos documentos político-educacionais brasileiros.
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Optamos por delimitar o escopo da análise no Ensino Fundamental para fins de exequibilidade da pesquisa e sua
posterior publicação no gênero artigo científico.
Abordar uma discussão sobre concepção de linguagem poderia ser conduzido sob
diferentes olhares. Nesta seção, vamos nos basear nas discussões de Volochínov (2013
[1928]) e Volóchinov (2017 [1929-1930]). Para o autor, as tendências linguístico-
filosóficas do início do século XX (mas ainda atuais) recobrem duas grandes abordagens:
(i) uma voltada à objetividade imanente do sistema linguístico e (ii) uma outra ancorada
na subjetividade da criação linguística.
Na tendência objetivista, a linguagem é vista como uma estrutura cujos elementos
constitutivos são voltados a si mesmos sob a regência do sistema. O foco está na forma
e na imanência do sistema. O olhar para a linguagem se fixa na objetividade sistêmica
das formas da língua que se arregimentam numa estrutura inabalável a qualquer força
centrífuga. A visão para a linguagem é homogênea, invariável e abstrata. Dessa maneira,
temos, de forma sintética, as características de uma abordagem objetivista abstrata
da linguagem, segundo Volochínov (2013 [1928]) e Volóchinov (2017 [1929-1930]).
Na visão subjetiva, por sua vez, a linguagem é produto da mente de um sujeito
individual. É um resultado da atividade individual criativa do sujeito, que, ao pensar,
Geraldi (2011 [1984]) propõe ‘unidades básicas’ de ensino como um construto para
integrar leitura, produção de textos e análise linguística nas aulas de LP em contexto
de Educação Básica. Para o autor, as unidades básicas precisam estar integradas a fim
de contribuir para a ampliação de conhecimento e compreensão dos usos da língua
na vida social. A partir disso, de acordo com o autor, as unidades básicas precisam
ser mobilizadas sob uma concepção de linguagem como forma de interação, o que
converge com a visão sociológica a partir de Volochínov (2013 [1928]) e Volóchinov
(2017 [1929-1930]).
Conforme Geraldi (2011 [1984]), a prática de leitura pode mobilizar textos de
diferentes extensões e em diferentes níveis de profundidade. Além disso, textos
em diferentes propósitos e com diferentes construções estilístico-composicionais
deveriam estar em diálogo na sala de aula. Ao fim, pontua que os textos, na aula de
leitura, necessitam “[...] exercer sua função de ruptura no processo de compreensão da
realidade” (Geraldi, 2011 [1984], p. 64).
Sobre a produção de textos, Geraldi (2011 [1984]) explica que precisamos
desconstruir a ação de escrever somente ao professor, numa visão de escrita artificial,
objetiva e unidirecional. Os textos precisam trazer um interlocutor em potencial, além
de serem produzidos sob reais condições de interação. Produzir textos reais, concretos,
direcionados a outros sujeitos demarca, dentre outras feições, as características da
produção de textos como unidade básica de ensino de LP, segundo o autor.
Integrada às práticas de leitura e de produção de textos, Geraldi (2011 [1984])
propõe a prática de análise linguística. Segundo o autor, não se trata de uma nova
terminologia para o trabalho com a gramática, mas de uma nova abordagem didático-
pedagógica. Em nota de rodapé, assim esclarece: “a análise linguística inclui tanto o
trabalho sobre questões tradicionais de gramática quanto questões amplas a propósito
do texto [...]” (Geraldi, 2011 [1984], p. 74). Com isso, a prática de análise linguística
é uma atividade que extrapola a mera análise estritamente gramatical.
Com essa discussão sobre unidades básicas proposta por Geraldi, em 1984, podemos
já notar que o autor se utiliza do termo ‘prática’ para adjetivar as atividades com leitura,
produção de textos e análise linguística. Não há uma explicação na referida obra sobre
o uso do termo ‘prática’, de forma mais substanciosa, mas acreditamos que esteja
relacionado à concepção interacionista de linguagem que orienta a sua discussão. Além
disso, podemos já vislumbrar caminhos para nossa compreensão sobre ‘práticas de
linguagem’, quando associamos, a partir do escopo da referida obra, ‘unidades básicas’
com ‘práticas de linguagem’.
2
Os dois documentos do Ensino Fundamental – anos iniciais – encontram-se disponíveis em: http://portal.mec.gov.br/
component/content/article?id=12640:parametros-curriculares-nacionais-1o-a-4o-series. Acesso em: 26 jun. 2023.
3
Os dois documentos do Ensino Fundamental – anos finais – encontram-se disponíveis em: http://basenacionalcomum.
mec.gov.br/implementacao/biblioteca-de-apoio/pcn-ensino-fundamental-6-ao-9-ano/. Acesso em: 26 jun. 2023.
[...] espera-se que o aluno amplie o domínio ativo do discurso nas diversas
situações comunicativas, sobretudo nas instâncias públicas de uso da
linguagem, de modo a possibilitar sua inserção efetiva no mundo da
escrita, ampliando suas possibilidades de participação social no exercício
da cidadania (Brasil, 1998b, p. 32, grifo próprio).
4
Disponível em http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso
em: 28 mar. 2022.
5
Nesse quesito, o documento não menciona as demais práticas de linguagem (oralidade e análise linguística/semiótica).
É claro que aqui não ficam enumerados todos os matizes conceituais em torno da
definição/conceptualização do termo ‘prática de linguagem’ quando usada em contexto
de ensino de língua portuguesa na esfera escolar da Educação Básica. Nossa proposta
de construto metateórico traz resultados iniciais. A partir de um trabalho metodológico
de revisão bibliográfica, metateorização e análise documental, muitos outros achados
foram encontrados, problematizados e redesenhados (e virão em pesquisas futuras).
Conclusão
REFERÊNCIAS