O Playboy e A Secretaria - Angel Dias

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Copyright © 2023

Capa: Ângela Caroline


Beta reader e leitura crítica: Ane Le
Revisão: Ane Le
Diagramação: Ângela Caroline

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos são produtos da imaginação da autora.
Quaisquer semelhanças com nomes, datas e acontecimentos
reais são mera coincidência. Esta obra segue as regras da Nova
Ortografia da Língua Portuguesa.
Todos os direitos reservados.
É proibido o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer
parte desta obra, através de quaisquer meios tangível ou intangível
sem o consentimento escrito da autora.
Plágio é crime.
A violação autoral é crime, previsto na lei nº 9.610/98, com
aplicação legal pelo artigo 184 do Código Penal.
Criado no Brasil.
Obra Registrada.
Sumário
Dedicatória
Sinopse
Notas da Autora
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Epílogo
Sobre a Autora
Agradecimentos
Dedico essa obra a todas as pessoas que acreditaram em
mim e que me ajudaram a fazer esse sonho ser possível, em
especial ao meu marido e meus filhos que são quem me atura nos
melhores e nos piores momentos.
As minhas adms Josy, Dani, Nanda, Aline, Dani, Lu e Paula,
por estarem sempre me apoiando imensamente, mas acima de tudo
agradecer a Paula por ter me dado a honra de desenvolver uma
bela história baseada em alguns instantes de um sonho que ela
teve.
E a todas as minhas lindas leitoras que acompanham minhas
obras.
Um enorme beijo, Angel.
Ele é um playboy libertino;
Ela é uma secretária virgem;
Ele é arrogante;
Ela não o suporta.
Eduardo Alencar, no auge dos seus 29 anos não quer
responsabilidades, tudo que ele quer é farra, bebidas e mulheres.
Sua mãe é quem comanda todas as empresas da família,
mas tudo muda quando ela decide que é hora de seu filho
amadurecer.
A punição de Eduardo é ir morar em outra cidade para
trabalhar como faxineiro.
Cecília Richards, é uma menina esforçada, aos 21 anos está
terminando a faculdade e trabalha como secretária de um dos
gerentes da empresa Alencar, onde ela lida constantemente com
suas investidas.
Cecília conhece um faxineiro para lá de arrogante e
imediatamente uma inimizade entre ambos surge, porém, junto com
as faíscas trocadas entre os dois, uma chama da atração é acesa.
A vida da secretária nunca mais foi a mesma após cruzar
com o playboy... agora ela está GRÁVIDA!
Apesar de ser uma obra mais leve, contém alguns temas que
podem incomodar pessoas mais sensíveis.
Este livro contém: Cenas de sexo e palavras de baixo calão,
não sendo recomendável para menores de 18 anos.
Contém gatilhos: Agressão verbal, relacionamento familiar
abusivo e insinuação de estupro. Considere sua saúde mental.
A autora não romantiza nenhum desses tópicos.
Eduardo Alencar
Ter um império para herdar me proporcionou uma vida de
luxos e sem o mínimo de esforço.
Não quis prestar atenção aos negócios e sempre fui mimado
pela minha mãe, já que ela tentava compensar sua ausência me
dando tudo o que eu queria.
Mas minha vida mudou quando minha mãe decidiu que
estava na hora de crescer, e uma linda mulher de língua afiada e
péssimo humor atravessou meu caminho.
Agora tudo o que sempre fui não me parece mais
interessante e um futuro ao lado dela me parece incerto.
Cecília nubla meus pensamentos e faz das suas vontades as
minhas, e não sei se gosto disso.

Cecília Richards
Desde a infância venho matando um leão por dia para
continuar viva, cresci em uma família disfuncional em meio a brigas
e confusões, sabia exatamente que não queria aquilo para mim.
Me centrei em meus estudos, mantendo o foco em um futuro
melhor, uma vida digna e tentando equilibrar isso e um alcoólatra
que chamo de pai.
Não tenho tempo para nada que não seja a faculdade e o
emprego que consegui. Até me deparar com o homem mais
arrogante que já vi na vida e me apaixonar perdidamente por ele.
Capítulo 1
Estou na minha cobertura no First Hill Plaza[1] olhando para
baixo com um cigarro na mão, a noite hoje foi muito interessante e
como de costume, acabei com duas beldades na minha cama.
O vento gelado está aliviando o calor do meu corpo nu, um
corpo do qual eu não preciso sentir vergonha, nem receio, minha
nudez, na verdade, é meu maior orgulho.
Sim, sou muito egocêntrico e não tenho vergonha em assumir.
Sou o único herdeiro de um império bilionário, nunca precisei
fazer um esforço sequer para ter algo na vida, tudo o que quero vem
até mim num estalar de dedos... dinheiro, bebidas, mulheres,
absolutamente tudo é meu a qualquer momento, não há nada que eu
deseje que não possua.
Recordo-me do almoço que tive com a minha mãe hoje e
como dona Carmen estava irritada.
— Eduardo? Está ouvindo o que estou dizendo? — Tirei os
olhos da recepcionista que estava me olhando e foquei a atenção na
minha mãe. — Ouviu o que eu disse?
Limpei a garganta.
— Muito provavelmente algo a respeito da empresa, você não
fala sobre outra coisa mãe, já estou até acostumado.
Ela me direcionou um olhar ainda mais furioso.
— Empresa essa que garante a sua vida de farra e luxos!
Empresa da qual dou a minha vida e meu sangue para manter nos
trilhos e você simplesmente ignora! — As pessoas em volta olharam
na nossa direção. — Empresa que se você não tomar um rumo vai
acabar destruindo em menos de uma semana!
Minha mãe é a senhora dos exageros, ela não suporta a
minha vida libertina, e de uns tempos para cá está pegando muito no
meu pé.
— Mãe, já fiz a faculdade que me pediu, me formei...
— Com muita ajuda, pensa que eu não sabia que pagava as
pessoas para fazer seus trabalhos? Acha que não sei que você saiu
formado sem sequer fazer algum esforço? Edu, já passou da hora de
você crescer, meu filho, há tanto o que você precisa aprender antes
de assumir as coisas. — Suspira. — Estou cansada, preciso me
aposentar, como é que vou confiar em você? Me diga, como?
Raramente minha mãe briga comigo, dessa vez ela estava
muito estressada.
Felizmente eu sabia como contornar todas as raras vezes que
essas situações aconteciam.
— Mãe, sei bem que a senhora quer um bom herdeiro,
quando chegar o momento, sei que não vou decepcioná-la. — Ela
me encara, respirando fundo. — Tenho que ir mãe, tenho algumas
coisas para fazer mais tarde.
— Que coisas Eduardo? Que coisas? O que é que você tem
ou faz na sua vida? — As perguntas dela estavam me incomodando
um pouco. — Tudo Edu, absolutamente tudo o que você tem, e tudo
o que vai ter um dia, vem do meu esforço, dos meus sacrifícios,
daquela empresa! O que está esperando para se juntar a nós, se
tornar parte do legado da nossa família?
Me levantei quando já não queria mais ouvir todas aquelas
baboseiras
— Não vou discutir mãe, o dia está bom demais, quente,
perfeito... e eu não quero mais falar sobre isso. — Dei um beijo em
seu rosto e saí, encerrando aquela conversa chata.
Naquele dia tinha programado um pool party[2] em uma das
casas da família, uma festa incrível regada a álcool, drogas e
mulheres, não queria ficar de mau humor.
No fim das contas, o que minha mãe disse acabou me
deixando irritado o bastante para não conseguir fazer mais nada,
fiquei algumas poucas horas, mas de cara fechada e sem conseguir
me divertir.
— Ah, qual é Edu? Vai ficar com essa cara amarrada até
quando? – Ricardo, meu melhor amigo desde o tempo de escola,
gritou para mim enquanto eu bebia sentado em um canto mais
afastado dos outros. — O que tá pegando com você hoje?
Olhei em volta, vendo aquele monte de pessoas, a maioria
nem sequer sabia o nome, nem porque estavam ali.
— Minha mãe acabou me deixando com um humor péssimo,
acho que vou para casa...
Me levantei para ir embora, mas duas das meninas que
estavam ali me seguraram pelo braço.
— Não vai... por favor, queríamos tanto poder te fazer
companhia. — Pediu, com a voz manhosa.
A risada estrondosa de Ricardo soou alto.
— Isso aí meninas, deem um jeito nesse idiota e se restar
algo dele, tragam ele de volta para cá. — Fala, com um sorriso
enorme no rosto.
Ele sumiu entre as pessoas e eu, que estava planejando ficar
sozinho, acabei com duas mulheres maravilhosas. Como poderia
reclamar de algo? Minha vida é perfeita.
Balanço a cabeça espantando esses pensamentos das coisas
que aconteceram hoje e trago o meu cigarro.
Mãos começam a alisar as minhas costas e abdômen, com
unhas espertas me dando leves arranhões.
— Vem para a cama... ainda queremos mais. — Uma das
garotas pede, sorrindo e sua mão vai parar no meio das minhas
pernas, acariciando-me até que fique duro, pronto para mais uma
rodada insana com as duas.
E é claro que não desperdicei a chance de brincar mais uma
vez, indo direto para a cama e ficando lá até amanhecer.
Capítulo 2
Estava prestes a sair de casa quando meu pai me chamou.
— Ei... você precisa deixar um dinheiro comigo! — Reclamou.
Desde que minha mãe se foi, é tudo o que ele tem feito,
reclamar, reclamar e reclamar.
Cresci em meio ao caos, meus pais nem consigo imaginar por
que se casaram, ele sempre foi péssimo, não sei como minha mãe
conseguia... bem, agora eu sou a bola da vez, e ele desconta todas
as frustrações em mim.
— Eu já disse que não sou banco pai, se quer bebida,
trabalhe e compre, não vou ficar gastando meu dinheiro todo com
você! — Continuei me arrumando para sair.
— É isso que eu recebo por ter te criado até agora? Só
ingratidão! Eu sei bem que você tem dinheiro, desde que começou a
trabalhar naquela empresa chique do centro você tem se vestido
melhor, comprou mais coisas para você...
Dei uma risada amarga balançando a cabeça.
— É isso que fazemos quando trabalhamos pai, compramos o
que temos vontade com o nosso dinheiro, não com o do outro.
Meu pai é um escroto, mas infelizmente eu não consigo
abandoná-lo, fico pensando em como é que ele vai se virar sem mim,
se conseguiria fazer isso, e sempre que penso a resposta que me
vem à mente é não, ele não conseguiria.
— Eu já faço o bastante pagando o aluguel, fazendo as
compras e pagando as contas, não tenho obrigação de sustentar
seus vícios.
Além disso, quando ele bebe acabava deixando de ser
inofensivo, então quanto mais longe do álcool eu conseguia mantê-
lo, melhor era para a nossa convivência.
Consegui com muito esforço trabalhar como secretária de
uma empresa grande, ganhava bem o bastante para pagar a parte
da minha faculdade que não tinha conseguido com a bolsa e manter
as coisas importantes em casa.
Mesmo quando minha mãe estava viva eu tive que trabalhar
cedo, ela também não era um exemplo de mulher, nem de mãe.
Sempre me culpava pelo fracasso de sua vida. Quem destruiu o
corpo e a felicidade dela.
Tomava antidepressivos com álcool e passava boa parte do
dia apagada. Se eu não aprendesse a me virar sozinha, teria morrido
a muito tempo, ou pior, poderia ter me tornado alguma versão dela.
— Não vai deixar nada? — Ele me parou segurando meu
pulso quando eu já estava abrindo a porta. — Não precisa ser
muito...
Olhei para ele e depois para onde ele estava me segurando.
— Solte, eu não vou te dar nada, não tenho a obrigação, na
verdade seria o contrário, você é quem deveria ter me mantido, não
eu manter você e a casa. Preciso ir trabalhar, não posso me atrasar.
— Puxei meu braço, saindo para iniciar minha jornada.
Eu precisava sair bem mais cedo, para chegar ao trabalho já
que minha casa não ficava muito perto. Menti no meu endereço,
passei o da minha única amiga da faculdade para conseguir a vaga,
sei que nesses lugares dão preferência a quem mora perto pela
pontualidade, e por isso saio de casa uma hora e meia antes, para
chegar dentro do meu horário na empresa.
Já era difícil lidar com meu chefe quando estava tudo certo,
quando eu cometia um erro, fosse ele qual fosse, era ainda mais
complicado.
Minha vida não foi um mar de rosas, creio que a de ninguém
seja, não tenho tempo para muitos amigos, não consigo ter um
namorado, nem sequer consigo assistir televisão ou ler um livro...
tenho que dividir muito bem o meu tempo.
— Respira... isso tudo um dia vai ser recompensado. — Digo
para mim mesma ao chegar no trabalho, me sentando em minha
mesa.
Deixei minhas coisas organizadas sobre a mesa, peguei meu
bloquinho de notas e imprimi tudo o que meu chefe faria naquele dia.
Olhei para meu reflexo cansado na porta de vidro e abri um
sorriso antes de bater.
E aqui vou eu para mais um dia.

Entrei na sala do Sr. Jones, ele estava com os braços


cruzados me aguardando.
— Chegou atrasada hoje, Cecília?
Olhei sem entender.
— Não... eu estava na empresa, mas precisei ir a outro setor,
buscar alguns documentos que eram necessários para que o senhor
verificasse algumas alterações. — Hoje era um dos dias de mau
humor, com toda a certeza. — Tem muita coisa que acabou
passando batido graças à última viagem que fez e eu preciso que dê
uma olhada melhor.
Ele me olhou de cima a baixo, com aquele ar superior que eu
tanto detestava.
— Para alguém tão pequena, a princesa sempre tem uma
resposta para tudo.
Me segurei o máximo que pude para não revirar os olhos, ele
nem imagina o quanto a princesa aqui tem que ralar, não faz a menor
ideia de quantos leões eu tenho que matar por dia para conseguir o
mínimo da vida.
— Na verdade era algo que deveríamos ter repassado a
bastante tempo e estou apenas fazendo o meu trabalho. — Cheguei
mais perto e coloquei todos os papéis que estava carregando. —
Alguns vieram da empresa principal, então acredito que seja melhor
resolver o mais rápido possível.
Enquanto colocava na ordem que tirava de meus braços, vi
que ele observava atentamente o meu rosto.
— Você é tão bonita Cecília... não consigo entender por que
não aceita sair comigo... pode ser apenas para um drink, ou um
jantar, o que acha?
Olhei para ele com um sorriso falso.
— Acho que já tenho que aguentar o seu mau humor na
empresa, não quero ter que aguentar fora dela também.
Por mais que as investidas dele me incomodasse um pouco,
fico feliz por ele não se incomodar que eu seja honesta e por não
usar sua posição de chefe para me amedrontar, ele leva as coisas na
brincadeira a maior parte do tempo e eu tento não ser tão dura com
as minhas respostas.
— Vamos voltar ao que interessa? — Fiz uma careta olhando
dele para os documentos. — Isso aqui não vai se preencher sozinho.
Me afastei um pouco.
— Quando revisar e assinar tudo, me avise que mandarei um
motoboy entregar tudo o que for necessário e envio por fax o que for
para longe, melhor que não haja ainda mais atrasos, são
documentos importantes.
Ele assentiu.
— Por favor, já te pedi para parar com essa coisa de senhor,
me sinto velho quando você me chama assim, e nem temos tanta
diferença de idade. – Realmente não temos de idade, mas de classe
social é gritante. — Me chame de Lucas.
Dei um último sorriso antes de sair e desejei boa sorte.
Todos sempre saiam para almoçar, eu ia até a cobertura,
coisa que não era permitido, mas como havia feito amizade com o
segurança, ele sempre me deixava passar para almoçar
tranquilamente.
— Um dia você ainda vai acabar me causando problemas
menina.
Dei um sorrisinho.
— Jamais faria isso, sabe que eu amo esse lugar, é lindo...
Daqui consigo ver tudo ao redor da empresa, é silencioso e a
vista de tirar o fôlego, não me canso de olhar para o mar.
San Diego[3] é uma cidade linda.
Capítulo 3
— Bom dia senhora, pediu que nos chamassem? — A voz
estridente do meu advogado soou.
Olhei brevemente para cima, o gerente do banco, meu gestor
financeiro e um advogado estavam parados na porta, retornei o olhar
para a tela do meu notebook.
Estou cheia de problemas para resolver, mas aquele era um
assunto que não poderia deixar para depois.
— Sim. — Dei um breve suspiro. — Preciso que me auxiliem
em uma coisa.
Os dois me olharam como se eu tivesse falado latim.
É claro que isso vinha do fato de que eu não os escutava,
pagava eles de enfeite porque a última palavra era sempre minha e
não costumava fazer absolutamente nada que eu não queria.
— Estão vendo isso? — Joguei o jornal do dia em cima da
mesa na direção deles para que vissem o absurdo que estava ali.
Meu filho estava em uma boate, cercado de mulheres, sem
camisa, garrafa na mão... uma verdadeira vergonha.
— Eduardo tem saído com frequência em sites de fofoca
senhora, mas acredito que nós não possamos ajudar neste caso, a
imprensa deve...
— Eu não terminei de falar. — O interrompi. — Chamei vocês
aqui porque tenho um pedido, quero que bloqueie tudo do meu filho,
cartões, contas, entradas nas nossas propriedades, no apartamento
dele, ele não deve conseguir um centavo sequer do que veio da
empresa.
Os três me lançaram olhares de espanto.
Meu filho tem fama de ser tão difícil de lidar quanto eu.
— Senhora, acredito que Eduardo não vá concordar com isso,
ele pode acabar armando um escândalo.
Dei risada.
– Acha que meu filho vai querer que os amigos e essas
mulheres qualquer que o acompanham saibam que ele está sem um
tostão furado? É claro que ele não vai armar um escândalo, ele virá
até mim, e quando chegar aqui podem deixar que eu assumo tudo o
que mandei que fizessem.
Me levantei da frente do notebook olhando para eles
praticamente pela primeira vez.
— Meu filho precisa crescer, fui uma mãe paciente, esperei
que isso fosse uma fase e de acordo os anos passassem, ela
passaria junto, mas como podem ver, não foi isso o que aconteceu,
estou me sentindo cada vez mais cansada e não vou deixar minha
empresa e todos os negócios nas mãos de um irresponsável
mulherengo... Não! Eu não lutei tanto para isso!
Se entreolharam, todos tinham receio do meu filho, mas
tinham ainda mais de mim.
— E qual será o acordo? Quer dizer, não pretende tirar
apenas por tirar, acredito que tenha algo que ele faça que possa
recuperar tudo. — O gerente comentou.
— Não se preocupem, já pensei em tudo, depois que ele
perceber que está sem nada, virá correndo propor algum acordo,
estarei pronta para isso, mas não será assim tão fácil... quero que
façam uma cópia do meu testamento, coloque tudo o que tenho
como doação para o governo e para uma lista que preparei de meus
funcionários.
Peguei os papéis que eu já tinha preparado.
— Quero que deixem o testamento reserva pronto, mas eu só
vou assinar depois, quando eu tiver certeza se ele vai ou não poder
mudar para melhor.
Me olharam em puro espanto.
— Faria mesmo isso? Está deserdando seu próprio filho... —
O gerente do banco perguntou abismado.
— Pensa que não sei o que estou fazendo? Ao menos as
pessoas listadas aí. — Aponto para os documentos com a lista. —
Farão melhor uso dos meus recursos. Isso é tudo, podem se retirar.
É claro que isso me dói como mãe, mas errei na criação do
meu único filho, o pai dele faleceu quando ainda era uma criança,
não soube conciliar a minha vida de mãe e empresária e acabei me
tornando ausente e compensava essa ausência com presentes
caros, viagens e tudo o que ele queria. O que o fez ser o que é hoje.
Tentei mudar isso por diversas vezes, de diversas maneiras,
mas infelizmente meu filho não é alguém muito maleável, esta é a
minha última tentativa, se isso falhar, infelizmente terei que tomar
atitudes mais drásticas, claro que deixarei algo para ele, mas ele não
precisa saber disso, não agora.
Muitos no mundo dos negócios querem ver o nome da minha
empresa na lama, e sei bem que assim que Edu assumir, ele fará
exatamente o que esperam, não posso deixar que isso aconteça.
É uma atitude desesperada, mas o que mais eu poderia
fazer?
Me sentei novamente em frente ao notebook, buscando entre
as nossas filiais alguma vaga de emprego, a grande maioria tinha
suas vagas quase completamente preenchidas e eu não queria
colocá-lo em um cargo que fosse prejudicial, muito menos colocá-lo
aqui junto comigo, seria fácil demais.
Busquei uma filial afastada, onde era provável que menos
pessoas conhecessem meu filho, o máximo seria os superiores que
já participaram de muitas reuniões comigo e que tem interesse em
nossa matriz, os outros não devem se importar.
San Diego, será para lá que eu vou enviá-lo.
Busquei uma casa simples nas redondezas e a mandei por e-
mail para a minha secretária, pedi que ela comprasse a casa de
imediato, que cobrisse qualquer oferta.
— A quero para ontem, mande quem for necessário para a
aquisição. — Avisei no interfone.
Mesmo a casa sendo minha, Edu não teria mais nada de mão
beijada, teria que pagar aluguel e comprar seus mantimentos, iria
aprender como é a vida, que por ele ter nascido em berço de ouro
nunca deu valor a nada que tem, enquanto muito precisam trabalhar
duro para ter o básico.
Capítulo 4
Passei boa parte do dia com as mulheres que passei a noite.
Quando senti fome resolvi ir a um restaurante que me
agradava, dispensei as garotas que eu nem sequer sabia o nome,
tomei banho e quando cheguei na garagem, vi que nenhum dos
meus carros estavam ali.
— Que palhaçada é essa?!
Voltei para o elevador com disposição para matar qualquer um
que se colocasse no meu caminho.
Cheguei à portaria do meu prédio.
— Senhor, em que posso ser útil? — O porteiro perguntou
assim que me aproximei, havia um tom de medo em sua voz, mas
ele tentou mascarar.
— Eu quero que me diga onde é que estão os meus carros!
Essa porra de prédio é o de maior padrão da cidade, como levam da
garagem cinco dos carros mais caros daqui? — Me aproximei dele
olhando com toda a raiva que sentia. — Quero que me traga os
meus carros agora mesmo, ou esse prédio vai ficar pequeno para
nós...
O peguei pela gola da camisa e ele engoliu seco, mas não me
disse nada a princípio, minha paciência já estava em seu limite
quando ele resolveu abrir a boca.
— Senhor, infelizmente eu não pude fazer muito... foram
ordens de sua mãe.
Olhei para ele com descrença, mas pelo olhar que ele me
lançou de volta imaginei que ele não estivesse brincando, quem mais
conseguiria tirar meus carros do prédio onde vivo?
O que diabos a minha mãe está aprontando agora?
— Eu juro senhor, foram ordens da sua mãe.
A voz do porteiro me chamou de volta de meus pensamentos
e eu o soltei.
Sem dizer mais nenhuma palavra, me virei e caminhei a
passos firmes para a saída.
Minha mãe teria que explicar direitinho o que é que ela queria
com toda aquela palhaçada.
Sem meu carro, sentia como se estivesse pelado, nunca havia
pegado um táxi em toda a minha vida, aquela seria a primeira e
última vez.
Dona Carmen nunca dá um ponto sem nó, agora me resta
descobrir o que é que ela estava planejando com todo aquele circo.
Não demorei para estar na empresa, todos os grandes prédios
estavam mais próximos do centro, isso inclui os residenciais.
Passei direto pela recepção indo de imediato ao andar onde
fica a sala dela.
A secretária até tentou me impedir dizendo que ela estava em
uma reunião naquele momento, mas a ignorei entrando na sala.
— Será que pode me explicar que palhaçada é essa? —
Esbravejo, nem sequer me dei ao trabalho de olhar quem estava
com ela. — Onde é que estão os meus carros?!
Minha mãe apenas levantou a cabeça levemente dos
documentos que estavam diante dos seus olhos.
— Sente-se e aguarde, é bom que tenha vindo, quero te
apresentar a alguém.
Ela ignorou completamente a minha pergunta, e se antes eu
tinha alguma dúvida de que era ela, agora havia sido sanada, foi a
minha mãe quem orquestrou tudo, mas o que ela queria com isso era
o que eu estava me perguntando.
— Mãe...
Tentei iniciar, mas ela dispensou minhas próximas palavras
com um aceno de mão.
Esperei um pouco mais.
— Está tudo perfeito. – Disse por fim, mas não para mim, para
o desconhecido que estava sentado na cadeira diante da mesa dela.
— Quem preparou toda a documentação?
O homem que até então não tinha dito nenhuma palavra e
estava de costas para mim a respondeu.
— Foi a minha secretária, é uma moça muito dedicada. —
Provavelmente transa com o chefe, uma boa parte das secretárias
têm caso com superior, seja para manter seus empregos ou ter
regalias.
Minha mãe respirou fundo.
— A julgar por tudo isso aqui, vou acreditar no que me diz.
Ela fechou as pastas.
— Agora sim, Eduardo, este é o Sr. Jones, representante e
gerente de uma de nossas filiais.
Olhei para o homem que agora sorria com parte do corpo
projetado em minha direção, dei a ele apenas um leve aceno de
cabeça, não vim aqui para conhecer ninguém, vim para saber o que
diabos a minha mãe pensa que está fazendo.
O homem não satisfeito em ver meu humor péssimo,
caminhou em minha direção para me estender a mão.
— Pode me chamar de Lucas.
Olhei para a mão estendida e ignorei voltando meu olhar para
minha mãe.
Lucas recolheu a mão com uma expressão tranquila.
— Receio que meu filho não esteja em um bom momento Sr.
Jones, mas ele vai melhorar esse humor dele, muito em breve. —
Ela deu a volta na mesa e estendeu a mão para ele. — Obrigada por
ter vindo tão depressa, agora eu preciso dar uma palavrinha com
meu filho.
Os dois se despedem e ela finalmente olha para mim.
— Até que foi muito rápido... com aquelas mulheres enfiadas
no seu apartamento imaginei que passaria o resto do dia lá.
Fechei a cara sem achar a menor graça de nada.
— Onde estão os meus carros? Por que é que você os tirou
do meu apartamento?
Fui direto ao ponto que estava me matando, não queria ficar
dando rodeios e conhecendo bem a minha mãe, ela também não
tinha interesse nisso.
O sorriso dela me pegou desprevenido, é muito difícil ver
Dona Carmen sorrindo.
— Onde é que está seu senso de humor meu filho? Justo
você que leva a vida toda como uma piada agindo assim tão sério?
— Ela veio até mim. — Que tal um jogo meu filho, uma brincadeira
que será um pouco mais divertida para mim do que para você?
— Do que está falando mãe? Eu quero meus carros de volta!
— E você vai ter, mas somente depois de alguns testes...
— O quê? — Sorrio nervoso negando com a cabeça.
— Não se faça de bobo Eduardo, você me ouviu bem. – Ela
passou as mãos por seu terninho bem alinhado. — Você terá tudo
de volta, mas apenas se passar por um teste. Eu te dei tudo o que a
vida poderia oferecer meu filho, e acabei errando nisso, você se
tornou um homem fútil, mimado, arrogante... e essas não são as
qualidades necessárias para ser um bom líder, nem mesmo um bom
ser humano, diga-se de passagem, então resolvo tomar uma atitude
drástica, você não tem mais nada Edu, absolutamente nada, terá que
conquistar com o trabalho, a única coisa que eu farei por você é
colocá-lo em uma empresa para trabalhar, nela você conseguirá o
salário, com o seu salário você terá que pagar o aluguel da casa,
suas contas e comprar seus mantimentos, assim como tantos outros
trabalhadores.
Ela enlouqueceu de vez!
— A empresa que você será enviado é uma filial, assim
conseguirei ficar de olhos em você e aquele homem. — Apontou
para a porta onde a pouco o desconhecido que nem me lembro do
nome acabou de sair. — Que você acabou de ignorar será seu
superior...
Comecei a rir, não havia nada mais para fazer, o que ela
estava me dizendo era ridículo.
— E o que eu ganho com isso mãe? Por que pensa que eu
vou aceitar uma coisa dessas?
Me entregou um documento em mãos . — Este é o meu
testamento, o meu novo testamento, nada irá para as suas mãos,
você não tem o que é necessário para manter meus negócios, e eu
não vou deixar que destrua tudo o que eu lutei para conquistar... Se
você não tomar um rumo na vida, não aprender que o trabalho vem
muito antes do sucesso, se não entender de uma vez por todas
como ser um homem e não o moleque que é neste momento, nada
do que é meu irá para as suas mãos.
— O que? Está de brincadeira comigo, não está? — Joguei as
mãos para o alto frustrado. — O que é isso? Algum tipo de
pegadinha? Brincadeira de péssimo gosto? Eu sou seu filho! O único
filho! Como pode fazer isso? — O meu desespero estampado em
cada palavra.
— Justamente por isso. Você é meu único filho e eu te criei
muito mal, não te ensinei os valores da vida, tudo foi fácil demais
para você, não entende o que é ter que lutar por algo, mas agora
terá que lutar, vai ter que mudar na marra meu filho, ou não terá
absolutamente nada... agora você ainda tem uma chance, mas
depois que eu partir, não terá mais nada de verdade e aí sim vai ter
um problema muito grande.
— Não!
— Não estou te dando uma escolha Edu, se não fizer o que
estou mandando eu assino este documento e envio para o banco. —
Ela deu um suspiro cansado. — Você sabe bem que não é um blefe,
eu não sou uma pessoa que costuma brincar.
— Mãe... — Tento questionar, mas ela me interrompe.
— Já chega Edu, está tudo definido, você vai para a nossa
filial, irá trabalhar pelo seu sustento, vai aprender a ver a vida por
outro ângulo e seu eu julgar que está apto a voltar, se você
realmente entender como a vida funciona, te devolverei tudo.
A raiva estava borbulhando dentro de mim, como uma panela
de pressão prestes a explodir.
— Então esse é seu grande plano para me fazer mudar?
Muito engenhoso, mãe, mas acho muito difícil que coloque nosso
patrimônio nas mãos de outra pessoa.
— Quando eu não estiver mais aqui não vou me importar com
isso, mas para as suas mãos não vai!
A encaro por alguns segundos e posso perceber em seus
olhos que ela não está para brincadeiras. Para não entrar em uma
discussão pior e acabar faltando com respeito, dou as costas e saio
da sala, o sangue virando lava nas veias.
Eu não posso deixar que ela tente me manipular dessa
maneira!
Capítulo 5
Todos os dias depois do trabalho eu tenho que correr para a
faculdade, foram anos cansativos, mas agora que finalmente está
prestes a acabar, eu não tenho a menor pretensão de continuar
trabalhando como secretária de Lucas.
— Bom dia Cecília. Sentiu a minha falta? — Disse com um
sorriso largo assim que me viu.
— Bom dia Sr. Jones. — Sorri de volta. — Acordou animado,
os dias que passou fora o fizeram bem. — Comentei. — Tenho mais
algumas coisas que preciso que resolva, viagens seguidas assim
acabam atrapalhando um pouco o nosso cronograma.
Peguei as pastas de arquivos para entregar a ele.
— É Lucas. Vou aguardar na minha sala. — Suspirei.
“Ele não podia mesmo esperar?”
O segui para dentro do escritório, parando diante da mesa
enquanto ele tirava o paletó.
— Pensei que levaria um pouco mais de tempo para
regressar... ser chamado pela empresa principal deve ter sido um
grande passo.
— Tudo foi bem, aquela mulher não brinca em serviço, diz o
que tem para dizer e fim. Como passou os dias?
— Muito bem obrigada. — Ele estreitou os olhos. — Isso tudo
tem que ser entregue ao setor jurídico, e esses ao RH. — Coloquei
uma pasta e em seguida a outra. — Limpei a garganta e prossegui.
— Eu estou prestes a finalizar a faculdade, último semestre e...
— Não! Você não vai a lugar algum Cecília! O que eu vou
fazer sem você? — Interrompeu adivinhando o que viria a seguir.
— Sei que sou insubstituível. — Sorri tentando aliviar a
tensão. — Mas eu quero trabalhar na minha área, sabe disso desde
que entrei aqui.
— Último semestre, né? O que eu posso fazer para que você
fique?
— Acho que nada. — Respondi com sinceridade.
— Nem mesmo um aumento de salário?
Fui pega de surpresa e pensei por alguns instantes. — Não...
esse não é o meu sonho, foi o passo que eu dei para conseguir
alcançá-lo, não posso desistir.
— Comece a buscar uma substituta o quanto antes, não quero
uma leiga para estar em seu lugar, não vou dar apenas uma semana
para aprender, quero que passe ao menos um mês com a candidata,
e se ela não for boa o bastante, passe para a próxima.
Ótimo, o humor dele já mudou. — Tudo bem.

O dia sempre passa depressa na empresa, acho que porque


eu não consigo parar quieta nem por um minuto, mesmo quando
estou almoçando, preciso ficar com o celular para resolver alguma
coisa.
Na parte da tarde, Lucas ficou insuportável, estava nervoso,
parecia exasperado.
— Algum problema? Fiz algo errado? — Me olhou por um
momento, como se ponderasse se deve ou não dizer algo. —Tinha
chegado tão bem, alegre e sorridente...
Um suspiro pesado escapou de seus lábios.
— Saber que a minha melhor funcionária vai me deixar, não
foi a melhor notícia do meu dia. E essa quantidade de trabalho
acumulado unido com alguns outros pepinos, está me deixando
louco. — Colocou as mãos na cabeça. — É cansativo...
Eu sei bem que muita coisa da empresa fica nas costas dele,
os outros peixes grandes não se importam muito porque sabem que
ele dá conta de tudo, acostumaram-se com Lucas fazendo das tripas
o coração... o costume do cachimbo...
Mesmo com o jeitinho cafajeste dele, sei que Lucas é um bom
homem, nunca excedeu os limites que impus, sempre me respeitou
apesar das piadinhas.
— Você ainda dá conta de tudo, se orgulhe disso.
Coloquei a mão levemente no pulso dele e dei um sorriso
encorajador. Seus olhos correram para minha mão e da mão para o
pulso.
— O que foi isso? — Pegou meu braço olhando para a marca
roxa no meu pulso.
Puxei rapidamente evitando seu olhar.
— Eu tinha visto isso mais cedo, não quis te constranger, mas
fiquei preocupado.
Engoli seco.
— Não é nada de mais, eu fico roxa quando passo um pouco
de nervoso.
Não gosto de entrar em detalhes sobre a minha vida pessoal.
Ele encarou meus olhos e eu desviei, não gosto disso, não
estou acostumada a ninguém direcionar tanta atenção a mim, gosto
de ser “invisível” ou ao menos que ninguém me perturbe.
Lucas puxou o ar com força.
— Cecília, creio que nós dois já nos conhecemos há um bom
tempo, não é a primeira vez que eu noto esse tipo de coisa, você
precisa de ajuda? Eu consigo identificar quando está mentindo...
Balancei a minha cabeça negativamente.
— Estou bem, é sério.
— Não estou dizendo que não esteja, sei que você é forte o
bastante para estar bem em situações complicadas. Não quero que
me veja como seu chefe neste momento, convivemos tempo o
bastante para que eu possa ser chamado de... colega? Talvez?
Enfim, só gostaria que confiasse em mim o bastante para
conversar... se quiser, podemos ir jantar, o que acha?
Hoje ele não me pegou em um bom dia para isso, estava
sensível, na noite anterior, meu pai e eu tivemos uma discussão feia,
o que acabou acarretando hematomas no meu braço, está
razoavelmente quente hoje e mesmo assim fui obrigada a manter
meus braços cobertos, o que acontece com muita frequência, mas o
pulso é um pouco mais complicado esconder, às vezes a blusa sai
do lugar.
Olhei para os olhos esperançosos do meu chefe.
— Apenas como amigos, certo?
Ele assentiu com um belo sorriso.
— Então eu aceito.
— Posso te buscar mais tarde se me passar o endereço da
sua casa.
— Não!
Jamais colocaria meu chefe naquele bairro... além de estar
totalmente oposta à realidade que ele vive, é perigoso para alguém
como ele, visivelmente cheio de dinheiro e eu menti sobre onde vivo.
— Pode ser na faculdade, o que acha? É aqui perto, eu
sempre vou direto daqui.
Ele sorriu.
— Combinado então.
Eu não sabia ao certo se ia conseguir falar sobre mim, ou
sobre algo da minha vida, mas uma coisa era certa, Lucas tem
tentado muito se aproximar de mim, e por que tenho sempre que
afastá-lo?
Sorri de volta para Lucas e me retirei da sala.

No fim do meu expediente, corri para conseguir chegar a


tempo na faculdade, como sempre fazia, não gostava de perder
nenhum segundo de nenhuma aula, não via a hora de me formar e
queria fazer tudo com total excelência.
Não sou uma pessoa muito sociável, então nesse tempo do
curso fiz apenas uma boa amiga, Camila.
— Você precisa desacelerar um pouco essa sua vida! Como é
que você aguenta? — Camila se sentou no seu lugar habitual e me
deu um sorriso. — A vida precisa ser mais do que trabalho e mais
trabalho Cecília, você é jovem e bonita demais para não aproveitar!
Camila é uma garota legal, gosto de conversar com ela, mas
não costumo falar muito sobre a minha vida, focamos mais nas
coisas que ela me conta sobre suas farras.
— Não sou tão solta como você Cami. — Fiz uma careta. — E
prefiro ouvir suas experiências malucas.
A aula iniciou e paramos de conversar para prestar atenção.
De vez em quando ela me virava a tela do celular com alguma
mensagem sobre a aula que me fazia sorrir.
Quando saí da faculdade, havia uma pequena aglomeração
de pessoas próximo à entrada, Lucas estava ali, parado com seu
carrão me esperando. Quem não iria parar para ver um Lamborghini
Veneno[4]
Ele não tinha nada mais simples para vir?
Meu rosto estava em chamas, muitos ali faziam várias aulas
junto comigo e sei que eles ficaram apenas para ver quem é que o
bonitão do carrão estava esperando.
Que maravilha, vou virar alvo de fofoca...
— Eu retiro o que disse, você sabe bem se divertir. — Camila
disse ao meu lado vendo que Lucas sorria para mim.
Fiz uma careta para ela, me despedi e fui em direção ao carro.
— Boa noite. — Queria cavar um buraco para me enfiar
dentro, todos estavam olhando, sem fazer o menor esforço para
disfarçar. — Vamos?
Ele sorriu e abriu a porta do passageiro para mim.
— Vamos.
Assim que me sentei, fiquei me perguntando o que diabos eu
estava pensando quando aceitei o convite, deveria ter recusado,
como a maioria das vezes, mas não... olha eu indo jantar com meu
chefe.
— Conseguiu resolver todos os assuntos pendentes? —
Perguntei, tentando não ficar calada num silêncio constrangedor.
Ele tirou a atenção da estrada por segundos me olhando
rapidamente.
— Nem tudo. Algumas coisas ficaram para amanhã. Acho que
estava animado demais para conseguir trabalhar direito. — Não
soube o que responder. — E nada de falar sobre trabalho, vamos
falar sobre outras coisas, quaisquer coisas, tudo bem?
Respirei fundo.
— Tudo bem...
Ele me levou a um restaurante muito chique, estava morrendo
de vergonha pela maneira que estava vestida comparada às outras
mulheres que estavam ali.
— Você está bem? Parece um pouco pálida.
Limpei a garganta.
— É que eu nunca estive em um lugar, nem mesmo parecido
com esse e acho que não estou muito adequada. Além de tudo não
entendo as regras de etiqueta.
Ele deu risada e senti meu rosto pegar fogo.
— Sabe que eu adoro isso em você?
— Isso o que?
— A sua sinceridade... você não tenta ser o que não é, diz
tudo o que pensa e quando pensa, recusa quando precisa. Isso é
bem raro.
Não sabia exatamente se era ou não um elogio, então apenas
fiquei quieta.
— Só não se incomode com os outros, esse restaurante tem
uma comida maravilhosa, se você se sentir mais confortável, peço
que nos levem a uma mesa mais reservada.
Ele fez o que disse e em poucos minutos estávamos longe
dos olhares de desgosto das pessoas.
— Aqui está bem melhor. — Comentei com um sorriso.
— Eu também acho. Mas agora Cecília, o que eu quero é
saber o que está acontecendo com você. Sei que pode ser difícil
acreditar, já que eu sempre estou tentando sair com você, mas agora
quero apenas te oferecer a minha amizade, um ombro amigo caso
queira chorar, um confidente... o que quer que esteja precisando.
Respirei fundo me arrependendo de estar ali, não sabia por
onde começar, e nem se queria conversar.
— Confie em mim. — Me encorajou.
Okay, lá vou eu falar sobre minha vida pessoal ao meu chefe,
creio que eu vou me arrepender, mas...
— Me promete que nada muda.
— Prometo.
Não sei se estava fazendo a coisa certa, ele é meu chefe
apesar de estar me pedindo que não pense dessa forma.
Mas será que é um pecado assim tão grande querer alguém
para estar ao seu lado nesses momentos? Querer que alguém se
importe com você?
Eu já estive tanto tempo só, já passei por tanto vendo que
ninguém nunca esteve ao meu lado.
Aceitando de pais completamente disfuncionais qualquer
migalha de afeto.
Nada nunca foi tão grande para mim, quanto o que Lucas está
fazendo. Ninguém nunca ouviu meus lamentos, minhas queixas,
minhas dores…
Espero que ele esteja com tempo porque a história é longa.
Capítulo 6
Saí do escritório da minha mãe com o estômago revirado, o
que ela estava fazendo era loucura, como pensa que eu posso
aceitar?
Liguei para um de meus advogados, precisava saber se ela
podia mesmo aquilo.
— Infelizmente senhor, não posso fazer nada a respeito. Não
é exatamente dentro da lei, mas sua mãe tem grande influência,
pessoas muito grandes a seu lado, amizades políticas... —
Respondeu com a voz fraca.
— Então está me dizendo que ela pode só porque é ela? —
Rosnei no telefone.
Ele suspirou.
— Estou dizendo que se for o que ela realmente quer, não
poderemos fazer absolutamente nada. Sua mãe é viva e muito bem
de saúde, pode fazer o que bem entender com a sua fortuna.
Respirei fundo e apertei o celular com força.
— Você é um completo inútil! Está demitido! — Desliguei com
a raiva me tirando o controle.
— Preciso de uma dose de whisky. — Passei as mãos no
rosto exasperado.
Fui até a sala de descanso onde sabia que encontraria o
motorista da minha mãe e pedi que me levasse até meu
apartamento, aparentemente ele ainda não estava ciente das novas
ordens da chefe, já que me levou sem pestanejar.
Peguei meu cartão de acesso, mas ele estava sendo
recusado sempre que eu aproximava do leitor.
— Mas o que diabos...
O porteiro veio e parou a uma certa distância, sua expressão
demonstrava o pânico que sentia. — Sr. Alencar, eu sinto muito.
— Eu não quero saber das suas desculpas, abra a droga do
portão! Eu não estou tendo um bom dia, é melhor que não teste
minha paciência!
Ele engoliu seco, mas não se aproximou mais do portão. —
Eu sinto muito, não posso...
— O que? — Meu espanto deve ter ficado evidente.
— Sua mãe, ela proibiu sua entrada no apartamento. —
Arregalei os olhos. — Infelizmente não poderei permitir sua entrada
senhor.
Olhei para onde eu havia deixado o motorista, ele ainda
estava lá, caminhei em sua direção e ele estendeu o celular para
mim.
— Mãe? — Perguntei levando o celular até o ouvido.
— Ah querido, eu estava falando sério, acredite. A partir de
hoje você não tem nada, suas contas e cartões estão zerados, agora
seja obediente e vá com o motorista para o aeroporto, ele vai te dar a
passagem e as instruções.
— Eu já disse que não. — Respondi com firmeza.
— Vamos ver quanto tempo você vai aguentar antes de vir
atrás de mim aceitando a única chance que estou te dando.
— Droga! —Joguei o celular com força no chão.
— Para onde iremos senhor? — O motorista perguntou sem
demonstrar nenhuma emoção. O perfeito robozinho da minha mãe.
— Você pode me levar para outro lugar? — Pode ser que
minha mãe tenha dito para ele me levar diretamente ao aeroporto.
— Para onde quiser senhor, basta que me diga.
Olhei um pouco desconfiado, mas como de costume, era
impossível saber o que ele estava pensando.
Passei o endereço de Ricardo, meu amigo com certeza me
ajudaria neste momento, estamos sempre juntos, para todos os
lugares que eu vou, ele vai também, não estou completamente
sozinho como minha mãe pensa.
Ricardo estava em casa, em uma pequena reunião de amigos.
— Posso falar com você por um momento? — Perguntei
nervoso.
Olhei ao redor e reconheci a maioria das pessoas que
estavam ali, não que falasse com nenhum deles, mas estavam
sempre nas minhas festas.
Ricardo me deu passagem.
— Entra aí... qual é a boa de hoje? — Me perguntou indo em
direção ao quarto. — Você nunca veio aqui, deve ser uma daquelas.
Entrei no quarto e me sentei na cama.
— Não tem boa, nada de boa para hoje, na verdade eu
preciso da sua ajuda.
Me fitou estreitando os olhos. — O grande Eduardo Alencar
precisando da ajuda de um mero mortal? Hoje provavelmente vai
chover fogo. O que precisa?
O sorriso dele era o de sempre, alguém que já estava
chapado demais para levar alguma coisa a sério.
Respirei fundo sentindo meu rosto queimar com a vergonha.
Eu nunca precisei de nada, ninguém nunca me ajudou, muito pelo
contrário, normalmente eu era quem todos procuravam quando
queriam diversão, ajuda, ou o que fosse.
— Preciso ficar na sua casa por um tempo, minha mãe
resolveu que quer que eu cresça, me tirou tudo, bloqueou minhas
contas e até minha entrada na minha própria casa! Você é o único
amigo com quem eu posso contar. Eu não vou ceder aos caprichos
da minha mãe.
Ele ficou calado me olhando de um jeito estranho. Limpou a
garganta e depois começou a falar um pouco enrolado.
— Edu... sabe que eu tenho a maior consideração por você, a
quanto tempo nos conhecemos, não é? — Deu um sorriso pálido. —
O problema é que eu divido o apartamento com alguns amigos, e
tem as meninas que às vezes vem junto com eles. Vai ter um
aumento nos gastos com mais uma pessoa e...
Eu me levantei de repente.
— Não precisa falar mais nada, eu já entendi!
O único amigo que eu tinha, acaba de demonstrar que mesmo
nossa amizade era baseada apenas nos meus bens materiais e nas
festas que eu bancava para ele.
— Não precisa esquentar... entendo bem o que está
acontecendo, sem as festas, as bebidas e as mulheres, eu não sou
seu amigo, sou apenas o cara que banca e que agora não pode
bancar mais.
Caminhei para fora do quarto.
— Ah, qual é Edu, você não gostaria de ficar aqui com a
gente, eu conheço você. Não vai ficar bravo com isso vai?
Não o respondi. Dei as costas a Ricardo e não parei de andar
até estar do lado de fora, e lá estava o motorista me esperando,
como se já soubesse o que iria acontecer.
Será que já sabia mesmo? Ou apenas imaginava que minhas
amizades eram baseadas apenas naquilo que eu tinha e não em
algo sólido?
Seja como for, ainda não estou disposto a aceitar as coisas
que minha mãe pretende que eu aceite, não está certo, não faz o
menor sentido.
Sempre fiz tudo o que ela queria, mesmo quando não me
agradava, para agora, de repente, ela decidir que eu não sou bom o
bastante para o dinheiro dela... não... eu não vou desistir tão fácil
assim.
— Para onde vamos agora senhor?
A minha vontade era de mandar que ele fosse pastar em
algum lugar, mas eu ainda precisava dele.
— Sua mãe ainda se encontra na empresa, não precisa dos
meus serviços, mas precisará em breve.
Sei o que ele quer me dizer:
“Vamos logo porque a paciência dela é curta e em breve pode
acabar e ela me mandar te deixar na rua.”
— Vamos para a avenida principal do centro.
É a minha única opção.
O porteiro do condomínio já me conhece bem, então assim
que me viu liberou a minha entrada. Melhor.
— A srta. Duarte está em casa? —Perguntei passando por
ele.
Me olhou com estranheza, imagino que seja porque sempre
que eu venho ela está me esperando e eu nem sequer me dava ao
trabalho de dirigir uma palavra a ele.
— Um momento que eu vou verificar. — Respondeu em tom
neutro. Instantes depois de interfonar, liberou minha entrada. — Ela
está aguardando o senhor.
O condomínio que Paula mora é muito bonito, um dos
melhores assim como o meu, ela e eu brigamos pela cobertura, mas
acabei ganhando, ainda não me perdoa por aquilo, disse que eu
deveria ser um cavalheiro, mas quando me conheceu melhor,
entendeu que essa palavra não existe no meu dicionário, e ela
gostou muito disso, se eu bem me lembro.
Sua porta se abriu e ela estava com um sorriso enorme no
rosto.
— A que devo a honra da visita? Cansou de estar em capa de
revista com modelos diferentes?
Ela viu e provavelmente não gostou, mas é orgulhosa demais
para deixar seu ciúme transparecer.
— Entre, estava mesmo precisando de uma distração...
Paula vem de uma família rica, assim como eu. Herdeira de
um império, minha mãe acredita que ela seja meu par perfeito, mas
gosto da minha liberdade. Ela é ocupada, tem seus próprios projetos
e planos, raramente está em casa durante o dia, mas sempre me
recebe bem em seus lençóis quando eu ou ela precisamos.
Ela espera que eu me apaixone, lembro exatamente qual foi a
minha resposta quando ela mencionou isso “Não crie expectativas”,
acho que acabei me tornando um dos objetivos de vida para ela a
partir daquele momento.
Para ser honesto, nem sabia por que ela insistia tanto em
estar comigo, principalmente porque eu surgia em diversos sites de
fofoca, cada vez com uma mulher diferente, me admira que ela
aceite isso e ainda tente disfarçar seu descontentamento.
Não sabia por onde começar a falar, estava perdido e
envergonhado.
— Pensei que não estaria em casa, normalmente tudo tem
que ser com hora marcada quando se trata de você. — Disse
passando por ela.
— Sente-se, vou nos servir algo. — Foi até a cristaleira.
— Por sorte sua, me dei uma folga hoje, não me senti muito
bem, resolvi descansar um pouco, acho que estou trabalhando um
pouco demais, quase virando meu pai.
Se alguém pode entender o que eu passo, esse alguém é ela,
cresceu com as mesmas cobranças, mas ela cedeu, eu não.
— Poderia ter me ligado, não estou esperando ninguém hoje,
assim nos veríamos mais cedo. Como está sua mãe? Perguntou
sorrindo. — Soube da aquisição em Londres, uma jogada e tanto.
Revirei os olhos. — Agora não é o melhor momento para
falarmos da minha mãe Paula, então por favor, fale de outra coisa,
qualquer coisa, menos sobre ela.
— Você parece um pouco tenso Edu, qual o problema? — Me
entregou um copo. — Posso te ajudar a relaxar se quiser. — Suas
mãos massagearam meus ombros tensos.
— A verdade é que quero ficar um pouco quieto, só quero
pensar um pouco em qual será meu próximo passo. — A rejeitei
educadamente.
— Temos algo inédito aqui? Você querer ficar quieto comigo
não é algo muito comum.
Antes que pudesse responder, o celular dela começou a tocar.
— Um momento, preciso atender.
Demorou um pouco até que ela voltasse e quando estava
diante de mim novamente seu rosto estava mudado.
— Pela sua cara, já sei com quem é que você estava
falando... não precisa dizer muito mais.
— Eduardo, sua mãe só está querendo o que é melhor para
você, um dia você vai agradecer a ela, isso te garanto...
— Já chega Paula, não vim aqui para ouvir lição de moral.
Estou indo. Nem sei o que diabos vim fazer aqui.
Respirei fundo, e caminhei até a porta.
— Sinto muito por isso... espero que dê tudo certo para você,
tente olhar as coisas pelo lado positivo, se você se esforçar sua mãe
vai esquecer dessa ideia maluca, mas você precisa mostrar que está
disposto mesmo a mudar, ela não é boba...
— Abre a porra da porta Paula. — Deixei todo o meu desgosto
ficar evidente.
Entrei no carro que ainda me esperava na entrada do
condomínio.
— Para onde vamos senhor? — O motorista me perguntou
com o mesmo tom monótono. Como se não soubesse que eu não
tinha mais escolha.
— Onde acha? — Respondi com desgosto.
Ele assentiu e deu partida no carro.
Me levou até o aeroporto, onde me entregou as chaves com
um endereço.
— Sua mãe deixou tudo certo na empresa onde o senhor irá
trabalhar, o único a saber a respeito do que sua mãe fez é o Sr.
Jones, e sua mãe espera que continue assim, há um documento com
todas as regras e o que o senhor deve ou não deve fazer.
Apenas olhei para ele sem o menor interesse em nada do que
ele dizia, só desejando que esse inferno acabasse.
Virei as costas e entrei no avião.
O que minha mãe está pensando? Que eu vou mudar da água
para o vinho só porque ela vai me mandar para outro lugar?
Até parece, não importa quanto tempo passe, eu continuarei
sendo o mesmo Eduardo, ela gostando ou não, será assim.

O voo foi uma porcaria, durante todo o caminho uma criança


chorou, eu não consegui me concentrar nem nos meus
pensamentos. Estava acostumado a viajar com o jato particular da
empresa
E quando finalmente cheguei, pedi um táxi até o local onde iria
residir daquele dia até o fim daquela tortura. Quase voltei para o
aeroporto e peguei o primeiro avião de volta à Seattle, para implorar
a minha mãe que acabasse com toda aquela palhaçada, mas não
faria isso...
Peguei o celular, a única coisa que me lembrava de quem eu
era, e liguei para dona Carmen.
— Filho, que bom que ligou... soube que você finalmente
colocou a cabeça para pensar e aceitou a minha proposta.
Respirei profundamente. A força que eu precisei para ter
autocontrole o bastante para não mandar a minha própria mãe a
merda impressionou até a mim.
— Pode me explicar que tipo de brincadeira é essa? —
Perguntei sério. — Chegou a ver, pelo menos por foto, o lugar para
onde me mandou?
A resposta dela não expressou nenhum tipo de
arrependimento.
— É claro que vi, eu mesmo selecionei, foi o melhor que
pensei que conseguiria pagar com o seu salário, julgando que você
não tem que pagar apenas a moradia, terá que se alimentar também,
e como você precisava de um imóvel mobiliado, não tinha muitas
opções.
Olhei para a pequena coisa diante dos meus olhos que
deveria ser uma casa e em volta para o bairro que também não era
dos mais bonitos.
— Está me dizendo que além de tudo eu terei que pagar por
esse lugar? — Meu tom de espanto ficou evidente. Isso parece um
mausoléu! — Gritei.
Ela deu risada. — Acha que as pessoas menos privilegiadas
fazem como para viver? Nada cai do céu Edu, você só não sabe
disso porque nunca precisou de nada a sua vida inteira.
Ouvi um suspiro profundo.
— Espero mesmo que você entenda o que estou fazendo e
entenda o que quero de você, vou deixar que descanse, amanhã
você inicia na empresa, por favor leia bem as regras porque eu
ficarei sabendo de tudo e será uma pena que eu tenha que cancelar
caso você descumpra algo e simplesmente assinar o meu novo
testamento. Nós nos falamos depois, tenho uma reunião importante
em breve e preciso me preparar.
— Ma... — Sem esperar que proferisse mais uma palavra
sequer, ela desligou.
A mesma Carmen de sempre, sem tempo mesmo que para
gastar algumas palavras com o próprio filho, nunca foi diferente, já
devia ter me acostumado.
Nem mesmo nos meus aniversários ela conseguia aparecer.
Olhei para aquela casa e me perguntei o que diabos eu faria...
não sei cozinhar, nunca peguei em uma vassoura, nunca estive
completamente sozinho.
Mas se tem uma coisa que minha mãe me mostrou, é que eu
não tenho ninguém, ninguém ficou do meu lado quando precisei,
nenhum dos caras que lotavam as minhas festas, nem mesmo a
mulher que mais disputava a minha cama, sei que a notícia já se
espalhou entre todos, mas ninguém se importou.
Entrei na pequena sala, havia um sofá de dois lugares, mas
ao menos estava melhor por dentro do que por fora, me sentei e pela
primeira vez em toda a minha vida não sei o que fazer.
Capítulo 7
Meu jantar com Lucas está agradável, ele me deixa à vontade
para conversar, e tantos anos aguentando tudo sozinha somado a
alguns drinks que eu não estou acostumada, me fizeram falar mais
abertamente.
— Você não parece muito bem Cecília, pode por favor me
contar o que há de errado? O que vem acontecendo com você? Isso
me preocupa. — Sua expressão demonstra uma real preocupação,
ele está sendo sincero.
Dei um suspiro pesado e tomei mais um gole da coragem
alcoólica que estava no meu copo.
— Meu pai tem problemas com a bebida, desde sempre eu
acho, ele quase nunca faz coisas idiotas, mas quando arruma
qualquer trocado para beber, se torna outra pessoa.
Ele olhou para meu braço de repente.
— Foi ele quem fez isso com você?
Puxei a manga instintivamente.
— Não é por mal, ele nem sempre faz nada desse tipo. —
Menti. — Ele é minha única família, tento cuidar dele e de tudo da
maneira que posso, já o internei tantas vezes, ele sempre foge, volta
para casa pior, parei de tentar.
Não consegui olhar para ele enquanto falava, tentei fingir que
era outra pessoa que estava diante de mim, falar algo tão pessoal
para o meu chefe é estranho e me deixa ansiosa.
— E por que aguenta isso?
Olhei para ele.
—Por favor, não me olhe desse jeito. — Mordo o canto da
bochecha, torcendo o nariz. — Não te contei isso para que tenha
pena de mim, só quis desabafar. — Respiro fundo. — Consigo cuidar
dele, da casa e de quebra ainda consigo estudar, estou prestes a me
formar.
— Mas isso tudo a um custo muito grande. Pelo meu ponto de
vista você simplesmente não vive. Está se matando desde sempre
para cuidar de seu pai e conseguir conquistar seus objetivos
pessoais, mas onde você se encaixa no meio de tudo isso? Seus
amigos, a diversão?
Pensei um pouco sobre isso antes de abrir a boca para
responder.
— Eu não me importo, não tenho muitos amigos e o tempo
que poderia gastar com diversão gasto com os estudos e o trabalho.
— Brinquei com os dedos nervosa. — Bem... entre tudo o que tenho
que fazer, não me resta muito tempo para mais nada, e isso é bom,
por um lado, não me dá tempo de ficar remoendo.
É bom conversar, mas sinto que estou cometendo um erro.
— Isso está errado Cecília, todos nós merecemos um
descanso, alguma diversão, você não é de ferro e está perdendo
uma boa parte da vida. Eu te entendo, muito bem, sabe disso,
também me esforço demais, também deveria diminuir o ritmo, isso
vale para nós dois! Beberica sua bebida antes de prosseguir. — E
quanto a sua mãe?
Minha mãe... eu sinto muita falta dela, talvez não devesse,
mas eu sinto.
— Ela era uma pessoa difícil, muitas vezes um pouco mais do
que meu pai, não guardo nenhuma mágoa, mas os anos que passei
com ela não foram os melhores da minha vida.
Não quero entrar em detalhes, não é uma parte da minha vida
que eu goste de ficar mencionando.
Lucas segura minha mão fazendo-me olhar diretamente em
seus olhos.
— Sei bem que ainda não está falando tudo o que te
incomoda, mas só de ter se aberto comigo, estou feliz, espero que
você passe a confiar mais em mim daqui para frente.
Lanço um olhar caloroso, é bom ter um amigo para conversar
de vez em quando.

Lucas insistiu muito para me levar em casa, era tarde e ele


não queria que eu voltasse só, fiquei com receio aqui é um bairro um
pouco perigoso.
— Tenho algo a dizer. — Ele me olhou atentamente enquanto
colocava o cinto de segurança. — Menti sobre o local onde moro. —
Abaixo a cabeça envergonhada. — Sinto muito por isso, mas eu
precisava tanto do emprego. — Me justifico.
— Já sabia disso. — Arregalei os olhos. — Mas como você
nunca teve nenhum tipo de problema com seus horários, não me
importei.
Senti meu rosto arder de vergonha.
— E como soube?
— Todas as vezes que você diz que não tem aula na
faculdade, você pega ônibus num sentido completamente oposto ao
que disse que morava.
Assinto, não falando mais sobre o assunto.
Passei o endereço correto e fomos em direção a minha casa
em uma conversa agradável sobre o hobby[5] dele.
Assim que chegamos, ele fez questão de abrir a porta para
mim, como um bom cavalheiro que aparenta ser.
— Espero que tenha gostado da nossa noite.
— Gostei sim. — Respondi com sinceridade. — Foi perfeita.
Ele se inclinou e encostou os lábios nos meus me dando um
beijo leve.
— Agora sim eu posso dizer que a minha foi perfeita. — Seu
sorriso amplo se abriu. — Boa noite, nos vemos amanhã!
Fiquei parada, boquiaberta, enquanto ele voltava sorrindo
para o carro.
— Entre, está tarde. — Gritou.
Me virei e fui para dentro, um pouco em choque com o que
tinha acabado de acontecer.
Abri a porta, dando de cara com o meu pai sentado no sofá ao
lado de um homem estranho.
— Boa noite... — Disse já engolindo seco. — Oi pai.
Fechei a porta e tentei continuar meu caminho até o quarto,
mas fui impedida por outro homem que estava mais perto da porta.
— O que... — Me calei quando senti um arrepio ao encará-lo.
Ele me deu um sorriso asqueroso.
— Boa noite querida, é bom finalmente te conhecer
pessoalmente, ouvi muito a seu respeito.
Olhei para meu pai que apenas abaixou a cabeça.
— Não posso dizer o mesmo, pode me dar licença? Tive um
dia cheio, quero descansar.
Tentei passar mais uma vez e novamente fui impedida.
Já imaginava que algo não estava certo, meu pai não tem
amigos, apenas se mete em confusão.
— Na verdade eu preciso falar com você, então que tal se
sentar e ouvir o que tenho a dizer? Pensei que você chegaria mais
cedo, acabei perdendo muito tempo vindo até aqui.
Minha boca ficou seca.
— Não o conheço, e não tenho nada a conversar.
— Mas eu tenho. — Seu tom foi mais firme e ele fez uma
careta irritada.
Ele apontou para o pequeno sofá que tínhamos na sala e me
sentei ao lado de meu pai, evitando o outro homem.
— O que quer? — Tentei parecer segura.
— Seu pai está nos devendo uma alta quantia, já tive muita
paciência até aqui, esperei inclusive alguns dias a mais, já que ele
me disse que só precisava falar com você para conseguir o dinheiro.
— Puxou o ar com força e o que estava sentado ao lado do meu pai
se levantou e ficou de frente para nós. — Bem, ele não nos pagou e
agora a minha paciência já acabou. Sempre dou preferência a
receber o que me é devido, um cadáver não paga ninguém, então a
sua escolha é bem simples, ou você assume a dívida, ou daremos
um fim doloroso ao seu pai.
Olhei para os dois homens, eles não pareciam estar
brincando.
— Filha, por favor. — Implora apavorado. — Sei que não sou
o melhor pai do mundo, mas ainda sou seu pai, eu te criei. —
Choraminga.
O homem que estava mais perto deu um soco em seu rosto e
o mandou calar a boca.
O outro que estava falando comigo me olhou com um sorriso
no rosto.
— É ela quem vai escolher... então Cecília, o que vai ser?
Como ele pode perguntar tão calmamente? Como é que ele
joga a responsabilidade da vida de alguém nas minhas mãos dessa
maneira sem um pingo que seja de remorso?
Já estava calculando minhas economias, não tinha muito,
apenas o que sobrava de vez em quando.
— Quanto ele está devendo? — Perguntei desesperada.
— Com todos os juros do tempo que estou esperando, o
acumulado está em 35 mil.
Eu quase me engasguei quando ele falou o valor, como é que
eu iria pagar tudo isso? Se eu ainda tiver 5 mil guardado no banco é
muito.
— Eu não... eu não tenho esse dinheiro.
— Ah querida, tenho certeza de que você consegue. — Me
mediu com o olhar — Eu vi o carrão que você chegou, abrindo as
pernas algumas vezes para o dono do carro tenho certeza de que
você consegue o valor total rapidinho... ou se preferir, tenho algumas
casas em que tenho certeza de que alguém como você seria muito
bem aproveitada. —Senti uma náusea forte. — Eu mesmo pagaria
bem para usar você por algumas noites antes que ficasse larga e
gasta de tanto ser fodida.
A gargalhada nojenta dele me fez ficar tonta, o brilho
malicioso em seu olhar arrepiou minha espinha.
Me levantei rápido para me afastar o máximo que consegui
daquele olhar.
— Não! Isso nunca!
— Bem... — Veio para perto de mim novamente. — Te darei
dois dias para pensar, e quando eu voltar quero uma resposta e o
meu dinheiro ou a vida do seu pai, a escolha é sua.
— Você pode parcelar? — Perguntei beirando as lágrimas.
— Claro... mas continuará com os juros diários e a dívida vai
continuar aumentando. — Caminhou em direção a porta. — Pense
bem no que eu te falei, pagaria bem por você, tenho certeza de que
faria uma clientela boa muito rápido! — Seus olhos lamberam meu
corpo e eu tremi.
Minha vontade era meter a mão na cara dele, mas eu sabia
que acabaria arrumando mais encrenca para o meu lado.
Os dois saíram, sorrindo e me olhando, enquanto eu me
afundava no completo desespero.
Minha mente só uma pergunta gritava. “O que vou fazer
agora?”
Olhei para o meu pai, completamente transtornada.
— Como é que conseguiu ficar devendo tanto? Como foi que
fez isso? — Gritei.
Ele se levantou e veio até mim.
— Sinto muito filha, sinto muito, mas sei que o lugar que você
trabalha tem muita gente poderosa, você pode pedir emprestado,
você não vai deixar que eles me matem, não é? — Seu olhar era
uma súplica. — E tem a opção que te deram, não precisa ficar lá por
muito tempo, você faz alguns programas e quando terminar de pagar
você para.
Cada uma das suas palavras chegava em mim como se
fossem facadas no peito.
— Eu deveria deixar que eles fizessem o que querem com
você! deveria deixar que morra, assim eu teria paz na minha vida! —
Gritei a plenos pulmões.
Sua mão acertou um tapa forte no meu rosto, chegou a cortar
a minha boca pelo lado de dentro, senti o gosto do sangue no
mesmo momento.
— Olha o que me fez fazer! — O rosto marcado pela raiva. —
Você me deve respeito! Eu sou seu pai! Depois que a vagabunda da
sua mãe morreu fui eu quem cuidei de você, poderia ter te
abandonado, poderia ter te vendido, feito qualquer coisa com você,
mas te criei, e você vai me respeitar!
Olhei para ele sorrindo como louca.
— Respeito? Que respeito eu te devo? Olha o que está
falando para sua própria filha! Falando para eu me prostituir para
pagar as suas dívidas! Por mim você pode morrer, não me importo
mais! — Continuei gritando.
Ele pegou meu rosto na mão com um aperto forte.
— Você não se atreva a se negar... se você sonhar em fazer
isso, eu mesmo vou te foder para tirar sua virgindade e te jogo no
bordel para pagar a dívida, entendeu? É melhor que pense em algo
se não quiser que isso aconteça. — Ele parece ter ficado louco,
nunca vi tanto ódio assim contra mim. — Ao menos a sua boceta vai
servir para alguma coisa a mais do que a da sua mãe serviu!
Puxei meu rosto me livrando de seu aperto, o deixei falando
sozinho e fui para o meu quarto, sentindo um buraco no estômago.
Não tenho ninguém a quem recorrer, Lucas é próximo a mim,
mas também é meu chefe, eu não posso simplesmente chegar e
pedir 35 mil, como se fossem 35 reais...
— O que eu vou fazer agora? — Sussurrei tristemente.
Meu pai sempre foi um idiota, um escroto, mas nunca foi nada
nesse nível, nunca me disse uma coisa tão horrível e asquerosa
como essa.
Tranquei a porta e fui olhar o aplicativo do banco para saber
como é que estava a minha poupança.
Deixei as lágrimas fluírem livremente, teria que aceitar o
aumento no trabalho e me manter lá, talvez assim eu conseguisse
pagar aos poucos.
Não me lembro de ter ouvido nenhuma palavra de carinho dos
meus pais, não sei o que é amor, nunca tive ninguém por mim,
sempre foi eu por eu mesma, mas isso... o que aconteceu hoje...
não, isso eu nunca imaginei, nunca pensei ser possível.
Amanhã é um novo dia, amanhã erguerei minha cabeça e
decido o que vou fazer, amanhã eu volto a ser forte e destemida,
amanhã vou enfrentar tudo no peito, mas hoje eu me permito ser
fraca, hoje me permito chorar, hoje me deixo sentir a dor de ser tão
insignificante para quem deveria me amar e me proteger.
Fecho os olhos e desejo desesperadamente que se algo ruim
for acontecer, que o de lá de cima não me permita abrir os olhos, que
me leve para o descanso eterno, porque eu já estou cansada de ter
que lutar tanto.
Capítulo 8
Na manhã seguinte, me levantei e fui até a cozinha, precisava
tomar café da manhã, mas como é que se faz o café?
Não consegui dormir nada a noite, a rua barulhenta, carros e
pessoas falando alto, como é que alguém consegue descansar, ou
ao menos ouvir seus pensamentos?
Desisti do café e imaginei que na empresa onde terei que
trabalhar deve ter algo.
No guarda-roupas tinha algumas peças de roupa que minha
mãe descreveu no contrato, a dispensa tinha o necessário até
receber meu primeiro salário e o aluguel do mês estava pago, era
assim que ela estava tentando me “ajudar” como disse no
documento.
Deixou também alguns trocados em minha conta, olhei
horrorizado para o valor, não dava para um bom restaurante no
almoço.
Precisei usar um transporte público, mas não conhecia
absolutamente nada em San Diego e o tempo que levou para que
chegasse até lá foi bem maior do que previ.
A empresa não era uma das maiores, mas até que não era
ruim.
Olhei para a entrada e fui até a recepção do saguão, pedi para
falar com Lucas Santos, que era quem estava ajudando minha mãe
com toda aquela palhaçada.
Não vou me esquecer desse nome.
A recepcionista me olhou desconcertada assim que lhe dei
bom dia, sorri satisfeito, não importa onde eu esteja, ou o que esteja
vestindo, não perco meu charme.
— Me chamo Grazi... a propósito. — Abriu um sorriso sedutor.
— Pode subir.
Em poucos minutos estava no andar da sala dele, parece que
esse Lucas é o figurão por aqui.
Uma mulher de baixa estatura estava atrás de um balcão que
quase a cobria por completo, até ia passar direto, mas ela chamou a
minha atenção.
— Tem hora marcada, senhor? — Perguntou em tom neutro.
— Na verdade ele deve estar me esperando. — Respondi no
mesmo tom.
— Por favor aguarde aqui, ele está em uma reunião, não quer
ser interrompido. — Apontou para o sofá. — Aviso assim que ele
desocupar.
Ela continuava a falar sem sequer olhar em minha direção e
aquilo estava começando a me irritar.
Bufei.
— Não tenho tempo para ficar perdendo com você.
Caminhei em direção a porta e ela não veio até mim, apenas
virou o corpo em minha direção.
Girei a maçaneta e a porta não abriu.
Ouvi o som de uma risadinha e olhei novamente para a
secretária que agora caminhava para o outro lado, os saltos fazendo
barulho no chão e parou diante do que acredito ser sua mesa.
— Essa porta tem um sistema para travar e destravar que sou
eu quem controla, achei interessante fazer isso, dei a ideia a meu
chefe quando algumas pessoas ficavam sempre invadindo a sala. —
O sarcasmo escorria em cada uma das palavras. — Parece que
funciona bem, não é? Agora se puder se sentar e aguardar até que
ele termine.
Andei em direção ao sofá que era bem perto dela.
Olhei para ela de verdade pela primeira vez. É uma mulher
linda, mesmo de salto alto é pequena e parece muito delicada, até
demais para alguém que está me encarando de cabeça erguida atrás
daqueles óculos horríveis.
A medi de cima a baixo, as curvas mesmo com aquelas
roupas que não a favoreciam, eram acentuadas e bem-marcadas.
Seu olhar vacilou apenas por alguns instantes enquanto a
observava, ela estava com vergonha, as maçãs do rosto assumiram
um tom de vermelho vivo, e me dei conta de que ela não estava
usando maquiagem, pelo menos não no rosto todo... olhei
atentamente e em uma parte do rosto a pele estava com outro tom,
como escondendo alguma imperfeição.
Ela limpou a garganta.
— Então, o que vai ser? — Perguntou visivelmente irritada,
endurecendo ainda mais o olhar, mas suas bochechas não negavam
que ela se sentiu mexida. — Se preferir posso chamar a segurança.
Abri meu melhor sorriso.
— Qual o seu nome? — Me aproximei um pouco mais. Ainda
não nasceu mulher capaz de resistir aos meus encantos.
— Cecília. — Deu um passo para trás e endireitou a postura.
— E gosto muito que meu espaço pessoal não seja invadido. —
Abriu um sorriso forçado. — Aceita um café?
Endireitou os óculos horrível.
— Aceito. — Respondi rudemente.
Não gosto de ser rejeitado, na verdade acho que nunca tinha
sido rejeitado e a sensação não é agradável.
Ela se afastou de mim e não consegui evitar olhar para a sua
bunda, mas ela se virou repentinamente e capturou o meu olhar. Seu
rosto assumiu um tom ainda mais vermelho, percebi que naquele
momento não era mais vergonha, era raiva.
— Açúcar, adoçante ou veneno?
Fiquei um pouco desconcertado com a pergunta, sem
acreditar que ela realmente falou aquilo.
— Amargo, como você!
Ela me deu as costas sem falar mais nada e sumiu pelo
corredor, minha mãe tem várias salas de descanso espalhadas pela
empresa, aqui não deve ser muito diferente.
Pouco depois ela retornou com o café, nenhum esboço de
sorriso na cara amarrada, me entregou a xícara e voltou para o seu
lugar.
Lucas demorou mais do que uma hora na sala, abriu a porta e
deu um sorriso amplo a Cecília, a amarga e rude secretária dele,
chegou perto da mesa antes de começar a falar.
— Cecília, preciso dos relatórios semanais e...
Antes que ele prosseguisse ela já estava com uma pasta
levantada na direção dele.
— Obrigada, preciso também...
Ela fez o mesmo movimento com as mãos entregando mais
uma pasta a ele e assim sucessivamente entregando pastas e
envelopes diferentes para ele antes mesmo que ele pudesse solicitá-
los.
— Você é mesmo impressionante, Cecília. — Ele gosta dela,
posso ver no sorriso besta que acaba de abrir.
Acho que já sei o porquê ela ainda está trabalhando aqui,
além de ser proativa, está saindo com o chefe, pela maneira como os
olhos dele brilham quando olha para ela, é quase certo... como
alguém aguenta uma mulher dessas?
Aquilo me incomodou e não entendo o motivo.
— Desculpe atrapalhar o casalzinho, mas estou começando a
ficar enjoado aqui.
Ela ergueu os olhos levemente para mim.
— Este senhor está aguardando aqui por algum tempo, como
estava ocupado não informei.
Lucas olhou em minha direção.
— Ah, sim, bem... — Um suspiro pesado. — Venha comigo
Eduardo, temos algumas coisas a tratar, preciso te informar o que
me foi passado.
Passei por Cecília, mas ela não olhou em minha direção,
continuou revirando alguns documentos e digitando no notebook,
acho que estou sentindo o meu ego sendo ferido.
Que mulherzinha insuportável!
Me sentei com Lucas nas poltronas que ele tinha no canto da
sala.
— O que minha mãe te explicou referente a esse circo que ela
montou? — Quis saber até que ponto ele estava envolvido.
Me olhou seriamente.
— Não pense que concordo com nada disso, na verdade
queria não ter sido eu a ser chamado por ela, mas creio que conheça
bem a sua mãe e sabe o quanto ela pode ser implacável e insistente.
— E como você quer cair nas graças dela, acabou aceitando...
entendo, mas fique certo de algo, um dia tudo será meu e eu tenho
boa memória.
Ele ficou ainda mais sério.
— Bem, você vai trabalhar aqui e irei informar sua mãe do
progresso, ficará no setor da limpeza, e sabe que não pode dizer
nada a ninguém sobre quem você é.
— Limpeza? Acredito que não seja uma boa ideia, você pode
dizer a minha mãe que estou lá e posso te ajudar em algum outro
departamento em troca, sou formado, embora ela pense que eu não
entenda de muito.
— Não. — Me cortou. — Será como ela disse, sem uma
vírgula a mais ou a menos. — Maldito idiota! — Você fará parte da
limpeza, acho que deve saber do restante das regras. Peça a minha
secretária que te leve ao RH.
Ah, ela de novo não.
Não acredito que minha mãe não deixou sequer uma brecha.
Todo mundo tem medo dela, medo de desafiar, com esse
banana não seria diferente.
— Você é quem sabe.
Deixei que as palavras soassem como uma ameaça, porque
era isso, assim que assumir meu lugar de direito ele iria ter de
aguentar as consequências disso.
Me levantei sem dizer muito mais, se minha mãe quer que eu
faça, farei, mas se ela acha que vai adiantar de alguma coisa... Dona
Carmen vai errar pela primeira vez.
Saí e olhei para a pequena Cecília. Ela ergueu o olhar com a
cara fechada assim que me coloquei diante da mesa.
— O que quer agora? — Simpatia zero.
— Lucas pediu que me leve até o RH. — Dei um sorriso largo
diante da cara de desgosto dela. — É querida, vou trabalhar aqui...
você vai ter que me engolir. — O rosto dela assumiu um tom ainda
mais vermelho do que das outras vezes. — Está passando mal? —
Perguntei sorrindo. — Quer que chame alguém para ajudar?
Engoliu seco.
— Me acompanhe por gentileza. — Passou por mim. — E
está enganado, é você quem terá que me engolir...
Mas que mulherzinha...
Capítulo 9
Como se já não bastasse os problemas que venho tendo que
enfrentar, me aparece um cara aleatório para perturbar a minha
cabeça, justamente em um dia que não estou bem.
Fiquei sem jeito de andar na frente depois de tê-lo pegado me
observando pelas costas, então me mantive ao seu lado.
Me custa muito admitir para mim mesma, mas ele é muito
bonito, acho que um dos homens mais bonitos que já vi em minha
vida, e o perfume dele...
— Por que está com o rosto vermelho assim? — Perguntou
com um sorrisinho. — Te incomodo? — Aproximou um pouco demais
o rosto do meu.
Nós estamos no elevador e o espaço pequeno também não
ajuda muito.
— E por que é que está reparando em mim? Não deveria
estar mais concentrado no seu novo emprego? Seria mais
proveitoso.
Minha resposta soou tão rude quanto pretendi, meu rosto
queimava de vergonha por ele ter percebido meu incômodo.
Sua boca se tornou uma linha fina e um vinco se formou em
sua testa.
— Estou me perguntando o motivo de você ser tão amarga.
Se eu contasse... Respirei fundo enquanto descemos e
caminhamos pelo corredor que levava até o RH, aguardei até que ele
fosse chamado.
— Boa sorte. — Disse me levantando.
Tomei o mesmo caminho de volta e pude sentir seu olhar
queimar minhas costas.
Espero que não tenha que ficar esbarrando com ele por aí,
meus dias são sempre tão tumultuados para que ainda tenha que
enfrentar piadinhas constantes de um idiota.
Minha mente está uma bagunça só, mas o primeiro passo
seria conversar com Lucas, teria que aceitar o aumento e não sair
daqui por hora, se fizer isso pode ser que não encontre uma vaga na
minha área que pague melhor, talvez nem o que já recebo aqui sem
o aumento.
A vergonha por ter que voltar a esse assunto me faz ficar
apreensiva, já que tinha praticamente acabado de falar que não
poderia aceitar.
Queria poder decidir, poder tomar as rédeas da minha vida e
ser finalmente livre, acho que liberdade é a única coisa que
realmente quero, não ter esse sentimento de responsabilidade, de
gratidão ao meus pais apenas por existir, por estar viva. Mas jamais
conseguiria conviver com o peso de ter deixado alguém morrer,
ainda mais esse alguém sendo meu pai.
Respirei fundo para não deixar minhas emoções me
dominarem novamente e fui até a sala do meu chefe, porque nesse
momento é isso que ele seria, não o amigo com quem conversei.
— Precisa de algo? — Perguntou diante da minha hesitação.
— Está tudo bem?
Assenti e me sentei diante dele suspirando e buscando
coragem.
— Quero te perguntar uma coisa.
Lucas me observa sem dizer nada, esperando que
prosseguisse, o que me deixa ainda mais nervosa.
— Gostaria de saber se a proposta é séria, sobre o aumento
se eu decidir ficar? — Disse por fim.
Ele estreitou os olhos, é claro que fica confusa a minha
mudança repentina, e não posso explicar isso a ele.
— Você parecia tão decidida, fico feliz que tenha pensado
melhor, é claro que a proposta é séria, não quero perder uma ótima
funcionária como você. — Um sorriso genuíno se espalhou por seu
rosto.
Meu corpo tenso relaxou um pouco, mas ainda tinha algo, o
beijo que ele me deu, ninguém mencionou aquilo, mas não posso
negar que aconteceu.
— Podemos renovar o contrato, já está perto de vencer,
esperaria mais já que faltam alguns meses, mas não quero perder a
oportunidade e você acabar mudando de ideia.
— Pode sim, não vou mudar de ideia. — Garanti.
Senti meu coração despedaçar, é claro que não deixaria de
tentar, mas meu sonho parecia sempre se afastar de mim, cada vez
mais longe e impossível de alcançar.
— Quer almoçar comigo hoje? — Me olhou com expectativa.
Não quero parecer ingrata, o cara tinha acabado de me dar
um aumento, mas estou triste, angustiada, não é um bom momento
para conversarmos.
— Fica para uma próxima, pode ser? — Perguntei lentamente.
— Tudo bem. — Respondeu perdendo aquele brilho no olhar.
Só de ver o rosto dele chateado por alguns segundos, já me
senti mal e culpada.
Saí de sua sala me sentindo o pior entre os seres humanos,
mesmo que pareça ter levado tudo numa boa, me sinto em dívida
com ele, e o fato de recusar seu pedido me faz sentir péssima.
Comprei alguns lanches para comer no almoço, mesmo sem
sentir fome e imagino que não vá sentir tão cedo.

A manhã passou depressa, quando me dei conta estava


quase passando da hora do almoço, me surpreendi ao encontrar o
mesmo homem de mais cedo, mas essa nem foi a surpresa maior, é
claro que iríamos nos esbarrar, não queria que fosse tão rápido, mas
iria acabar acontecendo, mas o que de fato me deixou boquiaberta,
foi ver aquele homem vestido no macacão da faxina da empresa.
Como é que aquela roupa folgada de um cinza apagado,
conseguia parecer sexy nele?
Quando ele chegou, com toda aquela arrogância e cheio de
gracinhas, imaginei que ele fosse trabalhar em algum cargo de alto
nível na empresa, até pensei que poderia ter algum problema
posterior por tê-lo tratado como merecia, nunca me passou pela
cabeça que ele seria faxineiro daqui.
Me recuperei do choque o mais rápido que pude e fui até a
geladeira sem dizer nada.
Seu rosto estava vermelho, parecia muito irritado enquanto
mexia nas coisas de fazer o café.
— Merda! — Exclamou irritado.
Peguei os meus lanches e o escutei resmungando
novamente.
Ele foi um babaca comigo, mesmo assim a porcaria da minha
consciência não quis me deixar sair sem oferecer alguma ajuda.
— Precisa de algo? — Perguntei, chegando mais perto.
Olhei pela lateral de seu corpo e notei que havia um pouco de
pó de café espalhado, além de copinhos descartáveis, mas não
havia sinal do coador e todo o resto.
Sua expressão ao olhar para mim era hostil.
— Não porra! — Dei um passo para trás com a agressividade
da resposta e ergui as mãos.
— Só estava querendo ajudar, não está mais aqui quem falou.
Me virei para sair, mas ele me segurou pelo braço.
Aquele simples toque queimou minha pele, levando um
formigamento que saía exatamente de onde sua pele tocava a minha
para o resto do corpo. Puxei meu braço instintivamente.
— É... foi mal, é que... preciso... não sei fazer café. — Evitou
meu olhar enquanto falava e fez um esforço quase absurdo para se
desculpar.
Procurei algum sinal de zombaria, não acredito que é real,
mas ele não parece estar brincando.
Claro que não era problema meu, mas lá fui ajudar o cara que
tinha sido um completo idiota comigo.
Guardei meus lanches novamente e peguei a leiteira.
— Eu faço. — Dei um sorriso mais amistoso, ou o máximo que
consegui no momento.
Ele me olhou sem dizer nada e foi em direção ao sofá.
— Mas você fica aqui e aprende, não vou fazer sempre. —
Disse perplexa.
Se ele pudesse me matar com o olhar, tenho certeza de que já
estaria estirada no chão, mas mesmo de cara feia voltou e viu como
fiz tudo passo a passo.
— Isso é complicado, não tem uma cafeteira por aqui? —
Perguntou com uma careta engraçada.
— Sim tem, mas normalmente nas salas dos chefes ou nas
salas de reuniões. — Respondi.
— Isso é um absurdo!
— Na verdade, até acho bom, eles montaram um espaço
bacana para os funcionários descansarem aqui. E se os chefes
viessem a todo momento não iriamos ficar tão à vontade.
— Você se contenta com pouco.
O encarei já arrependida.
— E você não me conhece para falar qualquer coisa a meu
respeito! — Fechei a garrafa e o entreguei. — É assim que se faz o
café. — Minha atitude mudando completamente.
Ouvi o estômago dele roncar, mas não me lembrei de ter visto
mais nada na geladeira.
— O horário de almoço está prestes a acabar é melhor se
apressar.
— Não estou com fome. — Mentira...
— Bom, de qualquer maneira, se caso sentir fome antes de
voltar a trabalhar, trouxe um lanche a mais e não estou com fome,
vou comer apenas um para não ficar de estômago vazio até dar meu
horário, se quiser comer o outro fique à vontade, não gosto de deixar
que nada estrague, mas realmente não aguento.
Fui para a geladeira e peguei um e fui em direção a porta.
— Você não come aqui?
— Não... tenho um lugar que é da minha preferência.
Ele não é a pessoa mais adorável do mundo, mas não gosto
de ver ninguém com fome, isso desperta lembranças dolorosas em
mim, coisas que gosto de manter enterradas no passado.
Fui para o terraço e me sentei, observando a imensidão de
prédios em volta, o céu azul e senti o vento no rosto.
Enquanto ali era calmo e silencioso, meu interior era uma
tempestade furiosa, o barulho dos meus pensamentos tentando
arrancar de mim a qualquer custo o resto de sanidade que ainda
tenho.
As palavras do meu pai ecoavam na minha cabeça ferindo
cada canto da minha alma, me diminuindo ainda mais do que já me
sentia pequena.
Para minha mãe eu era apenas a criatura que estragou toda a
vida dela, que modificou seu corpo, que a encheu de estrias e a
engordou ao ponto do meu pai não a querer mais.
Para o meu pai era completamente invisível, até a minha mãe
morrer e me tornar um fardo, um peso morto que ele tinha obrigação
de manter viva, não que ele realmente fizesse isso.
Não deve ser a coisa mais saudável do mundo para uma
criança ouvir durante toda a infância que não passava de algo
desnecessário.
Respirei fundo olhando para o horizonte.
— Quando é que tudo isso vai finalmente ter um fim?
Capítulo 10
O dia foi um verdadeiro inferno!
Nem imaginei que existisse um chefe até mesmo na equipe de
limpeza e fiquei ainda mais puto da minha vida, quando percebi que
o meu “chefe” é um verdadeiro idiota.
— Não precisa esquentar a cabeça com ele não. — Olhei para
o homem ao meu lado. — A maior parte do tempo ele é inofensivo,
mas quando tem gente nova ele sempre fica um pouco mais chato,
acho que para mostrar quem é que está no comando.
Era um senhor, aparentava ter em torno de uns cinquenta
anos, talvez até sessenta, estava com o mesmo uniforme ridículo
que eu.
— Me chamo Jorge, aliás. — Me estendeu a mão com um
sorriso simpático no rosto.
— Eduardo. —Aceitei o aperto de mão. — Então ele não é
sempre assim?
— Não, assim não, mas não significa que ele não seja um
mala.
Jorge tinha uma aparência alegre, mesmo que ainda cansado
e não estávamos nem na hora do almoço.
— Você ficou com qual andar para depois do almoço? —
Perguntou.
Ele não me parecia uma má pessoa, mas ficar conversando
não era um dos meus pontos positivos.
Peguei o papel que tinha colocado no bolso.
— Vigésimo segundo.
— Imaginei, ele sempre faz isso. — Balançou a cabeça
negativamente. — E qual estava antes de vir para cá?
Meu tempo de socialização esgotou!
— Olha eu...
— Eduardo! — O grito estridente que veio do final do corredor
me impediu de pedir para que Jorge me deixasse em paz.
Me afastei da parede e fui em direção ao tampinha que era
meu superior.
— Por que está gritando assim? — Minha irritação evidente
em cada palavra e a antipatia por ele aumentando a níveis
preocupantes.
— Ainda tem coragem de me perguntar o motivo? Me diga
modelinho de cueca, você limpou o que foi designado para limpar?
— Dei risada.
Modelinho de cueca? Essa é nova.
Abri a boca, mas ele não me deixou responder.
— Não, você não limpou! O lugar continua tão sujo quanto
antes de você ir até lá e ainda chegou aqui com essa cara de
cansado. O que ficou fazendo durante o tempo que ficou lá?
Conversando com alguma recepcionista? Você não vai sair daqui
enquanto não fizer o seu trabalho direito, estamos entendidos?
Pensa que a sua carinha bonitinha vai te dar vantagens aqui? Pois
não vai!
Não consegui conter a gargalhada.
Tanto ele quanto Jorge me olharam como se eu tivesse
enlouquecido, mas isso aqui só pode ser uma piada de muito mal
gosto do destino.
Eu, justo eu, Eduardo Alencar, herdeiro de uma multinacional,
levando bronca de alguém com metade do meu tamanho.
— Está achando engraçado?
— Para ser honesto, estou sim! ninguém nunca te ensinou a
ter cuidado com a maneira que você fala com as pessoas? — Me
aproximei um pouco mais. — Tomaria muito cuidado no seu lugar!
Nunca se sabe quem é que pode nos prejudicar.
Arregalou os olhos quase os fazendo saltar das órbitas.
— Fique sabendo que tudo o que está acontecendo aqui será
passado ao RH e aos nossos superiores. Não vou ficar com alguém
que não desempenha bem seu trabalho, porque vai acabar
sobrecarregando os outros e nós dividimos muito bem o serviço.
Se minha mãe ficar sabendo que arrumei confusão logo no
primeiro dia, vai ficar uma fera.
— Deixe que vou ensinar, ele apenas não sabe como é que as
coisas funcionam por aqui, tenho certeza de que quando pegar o
jeito ficará entre os melhores, é jovem, tem muita energia para
gastar. — Jorge, o senhor que a pouco ia pedir que me deixasse em
paz, saiu em minha defesa. — Dê uma chance do menino se ajustar.
— Que seja, se quer ficar carregando ainda mais peso, fique à
vontade. Mas no seu lugar não comemoraria o fato de ele ser jovem,
quem sabe não está aqui para aprender e ficar com o seu lugar! —
Que babaca!
Jorge enrugou a testa, pensei que iria desistir de me ajudar,
mas enquanto o outro se afastava de nós, ele abriu mais uma vez
seu sorriso gentil.
— Não fique parado aí, vamos antes que ele dê mais um piti.
O segui para o elevador e apertei o andar que havia limpado
mais cedo.
— Não está preocupado com o que ele disse? — Perguntei
confuso.
— Estou sim, muito! Tenho esposa e um filho especial que
preciso cuidar, meu trabalho é o que tenho de mais importante, é o
que nos mantém.
— E por que está me ajudando? Deveria querer se ver livre de
mim depois do que ele falou. — Ele é maluco.
Ele sorriu mais uma vez, para alguém preocupado, ele sorri
até demais.
— Você não tem culpa que eu esteja ficando velho, e não é
porque tenho problemas, que devo invalidar os seus. Um rapaz
jovem e bonito como você não viria trabalhar aqui se tivesse tido
uma chance no mundo, então acredito que também deva estar
precisando. A gente faz o que pode para sobreviver e qualquer
trabalho honesto é digno.
Mesmo sem saber, Jorge havia acabado de me dar a maior
surra da vida, sem encostar um dedo sequer em mim.
Eu e meu egoísmo só conseguimos pensar em minha mãe
saber sobre o desentendimento na empresa, enquanto ele
provavelmente vai chegar em casa e dizer para a esposa que podem
ficar sem sua única fonte de renda.
Suspirei pesadamente.
— Vou te ensinar, você realmente não parece levar jeito com a
limpeza. Vamos acelerar, ainda temos que almoçar e pegar nosso
outro andar.
Ele olhou em volta e o que para mim parecia tudo bem, para
ele parecia uma ofensa. E tinham razão.
Jorge passou a mão pelas coisas que estavam cobertas de
pó, o chão estava cheio de manchas de produto que não soube
remover, os banheiros nem sequer cheguei perto, mas dessa vez,
com a ajuda dele, engoli meu nojo e fui lavar.
No fim daquele andar, estava acabado, era como ter passado
a manhã toda na academia e mesmo assim, lá não ficava tão
exausto quanto estou sentindo depois de ter limpado isso tudo.
Completamente esgotado enquanto Jorge ainda teve
disposição para cantarolar.
— Bem, agora que já sabe como é que se faz, vou almoçar
porque depois tem mais, e você deve fazer o mesmo.
Ele seguiu seu caminho e fiquei observando tudo o que
havíamos feito.
Foi então que meu estômago roncou pela primeira vez, havia
tomado só o café que a amargurada me fez, e depois de todo esse
trabalho não tem nem como não estar com fome.

Depois de colocar tudo em seu devido lugar, fui para o andar


que sabia que tinha a sala de descanso, precisava procurar por algo
para comer, ou ao menos um café para enganar o estômago.
Para o meu azar, o que já vem acontecendo muito, a garrafa
estava vazia.
Nesse momento percebi o tamanho da minha inutilidade, não
sei fazer café, moro em uma das cidades que mais consomem café e
não sei fazer um café para mim, nunca precisei fazer e agora que
preciso não sei por onde começar.
Peguei as coisas que acreditei que eram o necessário, mas
nada do que fiz deu certo, o pó ia para todos os lados e ficava no
fundo da xícara, tomar com aquilo quase me fez vomitar.
Como minha mãe conseguiu fazer isso comigo? Ela não tem
uma gota de consideração pelo próprio filho, isso é completamente
desnecessário, é inútil.
E para completar meu dia de merda, a amargurada entrou na
sala e me ofereceu ajuda.
É claro que devo estar parecendo ridículo, provavelmente vai
fazer piada disso.
Rejeitei bruscamente sua oferta, mas quando olhei para seus
olhos me arrependi, mesmo que por uma fração de segundos, ela
pareceu realmente chateada.
Mais uma surra sem um toque sequer... além de me ajudar a
fazer o café e me ensinar, ela ainda me deixou um dos lanches que
estava na geladeira, fui tudo, menos gentil com ela e ela foi gentil e
generosa, mesmo que de seu jeito peculiar.
A parte da tarde foi outra luta, não imaginava que um
escritório poderia ter tanta coisa para fazer.
Meu corpo estava exausto, mas fiz tudo da maneira que Jorge
me ensinou, não vou me esquecer do gesto dele quando voltar para
a minha vida.
Já estava contando os segundos para ir embora.
Meu corpo inteiro estava suado, aquele macacão horrível é
quente demais, estou precisando de um banho com urgência, me
sentindo sujo, mesmo depois de ter lavado as mãos inúmeras vezes
ainda estou com nojo de ter lavado os banheiros.
Aquela casinha pavorosa está me parecendo o céu nesse
momento.
Me troquei no horário, Jorge e eu nos despedimos e fui para a
saída. Só de pensar no longo caminho até a casa, sinto vontade de
dormir na recepção da empresa.
Já no térreo, vi Cecília saindo apressada.
Queria agradecer a ela pelo lanche, não que tenha matado a
fome, mas ao menos diminuiu para que pudesse trabalhar sem
incômodo.
Como é que essas pessoas conseguem viver desse jeito?
Ganhando tão pouco e ainda assim são gentis uns com os outros.
Tentei alcançá-la, mas a uma certa distância, vi um
Lamborghini preto estacionar no meio fio e ela parou para olhar.
Lucas desceu do carro e abriu a porta para ela.
— É claro, ter um caso com o chefe deve ser o maior fetiche
entre as secretárias. Caminho rápido para o topo.
Deve ter sido por isso que ela nem sequer me deu moral...
São todas iguais.
Capítulo 11
Fiquei até um pouco mais tarde, normalmente saio alguns
minutinhos antes porque Lucas me liberou para sair a tempo de
chegar na faculdade, mas hoje o dia acabou enrolando com uns
documentos e não consegui.
Estava indo na velocidade da luz quando Lucas me perguntou
se queria uma carona.
— Não vai te atrapalhar? — Perguntei receosa.
— Não ofereceria se fosse, vamos, eu te levo!
Não estava em condições de recusar, precisava chegar o mais
rápido possível, estou chegando na reta final, não quero começar a
vacilar agora.
— Estou muito feliz que você continuará comigo. Ninguém
jamais vai conseguir ficar no seu lugar. Você é perfeita! —
Comentou, sorrindo.
Senti meu rosto ficar quente, não sei lidar bem com elogios,
nunca sei como reagir a um, então fiquei calada.
Abaixei minha cabeça e comecei a mexer nos dedos, olhando
para tudo, menos para ele.
— Seu rosto não consegue esconder suas emoções, não
precisa ficar com vergonha, é a verdade, você faz seu trabalho com
excelência, deveria ficar orgulhosa disso, não envergonhada.
— Você sabe que não pretendo ficar para sempre, não sabe?
Uma hora ou outra você terá que encontrar alguém.
— Ao menos terei mais algum tempo até que isso aconteça.
Meu coração apertou.
Ficamos em silêncio por uma parte curta do caminho, e ele
desceu para abrir a porta do carro para mim.
— Obrigada por me trazer, foi muito gentil. — Engoli seco,
ainda sem jeito.
— Nada que um jantar não resolva. — Abriu um sorriso
amplo. — Se quiser posso vir te buscar hoje mesmo, assim jantamos
e te deixo em casa.
Não queria ter que recusar, sempre me sinto em dívida
quando fazem algo por mim...
— Por favor? — Fez bico.
Ia responder quando de repente me deu um beijo rápido nos
lábios. Fiquei em choque, com os olhos arregalados e as palavras
presas na garganta.
— Sei que ia responder que não, então... estamos quites! Até
amanhã Cecília.
Fiquei parada com cara de besta já é a segunda vez que ele
faz isso e não sei o que fazer.
“Mais que merda”
Observei enquanto ele partia, as coisas estão fugindo do
controle.
Não me concentrei em muita coisa, antes tivesse perdido o dia
de aula, não fui produtiva de qualquer maneira.
Durante todas as aulas fiquei pensando no beijo que ele me
deu e no que aquilo implicaria.
“Não devia ter aceitado jantar com ele para início de
conversa.”

Assim que coloquei meus pés em casa, meu pai veio me


perguntar se tinha conseguido algo referente ao dinheiro que ele
estava devendo.
— Não pai, ainda não consegui, mas tenho alguma coisa no
banco e vou acertar com eles aos poucos, como disse que faria.
Precisei conter as lágrimas, ainda não tinha me esquecido das
coisas horríveis que ele disse para mim.
— Eles já não têm mais paciência de ficar esperando, tente
algo, fale com seu chefe, consiga um empréstimo na empresa ou no
banco!
Respirei fundo.
— Já disse o que farei, se não está bom, faça você algo! Vá
trabalhar, ou fazer algo que preste na vida, não fique apenas
sugando aquilo que consegui com o meu esforço! — Cada músculo
do meu corpo estava esgotado.
— Já mandei você me respeitar, sou seu pai, sem mim você
nem mesmo estaria aqui! — Gritou.
— E acha o que? Que deveria ser grata a essa vida de
merda? Antes não tivesse sido gerada! Estar aqui não é culpa minha,
foi de vocês, não tenho que ser grata por isso! — Gritei de volta.
Devia escutar minhas palavras e parar de achar que tenho
alguma dívida, parar de querer cuidar dele porque ninguém nunca
fez isso por mim, eu não estou viva graças a ele, estou viva graças a
mim, ao meu esforço em me manter de pé desde pequena e
aprender a me virar, por trabalhar desde que entendi que não fariam
nada por mim.
Desde ontem quando aqueles homens apareceram, meu pai
parece outra pessoa, está ficando mais agressivo, impaciente,
falando comigo como se fosse minha obrigação acertar as coisas.
Antes de tudo ele não era assim, tinha os episódios de raiva,
mas só quando bebia, agora mesmo estando sóbrio está
completamente transtornado.
— Você me deve todo o tempo que perdi pela sua existência
patética, Cecília! E não vou, depois de tudo, ficar no prejuízo!
Não precisava de mais daquela porcaria, virei as costas e
comecei a ir para o meu quarto, mas ele me segurou pelo braço.
— Você não vai a lugar nenhum! Vou te mostrar onde é seu
futuro!
Me arrastou para fora de casa, um carro preto se aproximou,
abriram a porta assim que ele se aproximou.
No banco da frente estava um daqueles homens que esteve
em casa.
— Para onde estão me levando? — Me impedi de chorar. —
Me deixem sair daqui agora!
Meu pai me segurou sentada quando tentei me levantar e o
homem deu partida.
Ninguém falava nada, conseguia escutar o som do meu
próprio coração martelando impiedosamente nos meus ouvidos.
O silêncio é ensurdecedor.
Nos afastamos um pouco do centro da cidade, indo ainda
mais para o fundo, para o lado onde os políticos fecham os olhos e
fingem que não existe.
Paramos em frente a uma casa com uma aparência antiga,
mas muito grande, uma aparência escura e homens estranhos na
porta.
Fui arrancada de dentro do carro à força pelo motorista e
arrastada para dentro da casa.
O que vi lá dentro me fez querer vomitar.
No corredor, as mulheres praticamente nuas ficam nas portas
do que me parecem ser pequenos quartos com apenas uma cama
no meio.
Já outras estavam dentro dos quartos com as portas abertas
sendo usadas como se não fossem nada, por um, dois e em alguns
casos, muitos mais homens.
Meu pai segurou meus cabelos e virou meu rosto para dentro
de um dos quartos.
— Está vendo isso? É aqui que você vai ficar! Observa
bastante para aprender como é que se faz, tem que aprender a
gemer bem direitinho, ninguém vai gostar de uma mulher frígida
como você!
Dentro do quarto uma mulher estava de quatro, com um
homem a fodendo por trás e outro na frente com o pau dentro de sua
boca, os dois sem nenhuma delicadeza, como dois animais.
A cena me causou repulsa e precisei fechar os olhos, não
aguentei ver aquilo.
Me soltou e continuaram me levando mais para dentro, até
parar diante de uma porta fechada.
O homem bateu e aguardou que mandassem entrar.
— Por que estou aqui? — Perguntei ao homem sentado atrás
da mesa, era o outro que esteve em minha casa.
Embaixo da mesa, uma mulher o chupava de joelhos e ele
mantinha os olhos fixos em mim.
— Bom te ver novamente, Cecília! Gostou do meu negócio? É
muito lucrativo! Ao menos para mim. — Abriu um sorriso amplo.
Empurrou a cabeça da mulher e se levantou.
— Você não sabe nem fazer um boquete direito! — Olhou
para o homem que me trouxe. — Leve-a para o quarto dos
seguranças, pode fazer rodízio até ela aprender a fazer alguém
gozar com a boca! Sem dó!
O outro a pegou pelo cabelo e a arrastou para fora.
Ficamos apenas, eu, meu pai e ele.
— Vamos aos negócios. — Caminhou em minha direção sem
se importar que sua ereção estava para fora e foi guardando
enquanto se aproximava.
— O que você tem para mim? Sabe que já esperei muito
tempo e não quero esperar mais...
— Você disse que poderia pensar, me deu dois dias.
Ele deu risada.
— Você não vai pensar em nada sua puta! — Meu pai gritou
para mim. — Você vai pagar e pronto!
— Cala a boca seu idiota! Ela pode pensar, mas já teve um
dia inteiro para isso... então quero minha resposta e algum valor se
for assumir a dívida!
Olhei para o meu pai, a raiva que ele estava olhando para
mim fez meus pelos se eriçarem.
— Ela ainda é virgem. — Pontuou com um sorriso diabólico no
rosto. — Aposto que vale um bom dinheiro.
— Não sou uma mercadoria, seu idiota! — Me lancei em sua
direção e o acertei com um tapa no rosto.
Ele me devolveu com um mais forte ainda, que me fez cair de
bunda no chão do mesmo lugar que já estava ferido do último.
— Ainda sou seu pai vagabunda, é melhor me respeitar, já
disse o que faço se pensar em se recusar e não vou ser cuidadoso!
— Viu, é melhor abrir as pernas para alguém que ao menos
vai te comer com jeitinho e ainda te pagar por isso. — O asqueroso
pontuou, lambendo os lábios.
— Vocês são dois monstros!
— Cala a boca, Cecília, faça o que ele diz e acabe logo com
isso, puta maldita, você é inútil ainda mais do que sua mãe foi, nem
sei se sou mesmo seu pai, não consigo me lembrar quantos me
pagaram para meter nela enquanto estávamos juntos.
Trinquei os dentes, sentindo a bile subir pela garganta e me
levantei pronta para atacá-lo novamente, mas o outro me impediu.
— Já terminaram aí a discussão de família? Bem, sim... sua
virgindade aqui vale muito, mas não aqui, tem uma clientela
digamos... VIP, que gosta muito de moças virgens, eles pagam muito
bem... inclusive se quiser eu mesmo posso pagar muito bem por
isso. — Passou os dedos no meu queixo me analisando. — Você é
tão bonita...
Tirei meu rosto de perto da mão dele e olhei para meu pai.
“E se ele cumprir com o que disse?”
Só de imaginar sinto um arrepio e a náusea.
— Vou te pagar, mas não vou conseguir pagar de uma vez.
— E como te expliquei, terá juros diários e vai chegar uma
hora que você não vai conseguir pagar, acredite... mas faça como
quiser, a dívida é sua agora, mas se você quer assumir, quanto tem
para me dar agora?
— Está no banco, vou ter que tirar amanhã.
— E quanto é?
— Não me lembro, acho que quase cinco mil.
— Isso não é nada!
— É o que tenho e é melhor do que o nada que meu pai
estava te dando, não acha?
— Você é corajosa menina. Passo na sua casa para pegar o
dinheiro amanhã, pode ir embora! Mas se quiser voltar e aprender
um pouquinho de como me satisfazer, meu pau vai te aguardar
pacientemente.
Um calafrio percorreu meu corpo enquanto ele mexia entre as
pernas e me olhava.
Abri a porta e corri para fora daquele lugar sentindo um nó na
garganta, vomitei na calçada e o outro que me trouxe abriu a porta
do carro para me levar de volta.
Capítulo 12
Do ponto de ônibus até chegar naquela casa de filme de
terror, ainda tinha que andar um pouco e quando cheguei, Lucas
estava na porta esperando.
— Avise minha mãe que só tenho que te aguentar na
empresa, aqui não, aqui vim para descansar, se é que isso é
possível.
— Entendo que eu não seja alguém que queira ver hoje, mas
sua mãe me pediu para vir ver se está bem. — respondeu em um
tom de quem está tentando apaziguar as coisas.
— Estou ótimo, não dá para notar?
— Não sabia que estava morando tão perto da casa de
Cecília, vocês foram juntos pela manhã? — Como se eu fosse querer
ver a amarga mais vezes do que necessário.
— Meu contato limitado à empresa com vocês, me agrada.
Nem sabia que ela morava aqui.
— A trouxe depois da faculdade uma vez e...
— Não sei se ainda não percebeu, mas você não é bem-vindo
e estou cansado, louco para entrar e tomar um banho, tem algo que
queira para informar a minha mãe? — Minha paciência já nem existia
mais.
Como se não bastasse ter que me adaptar a essa vida de
merda, ter que aguentar Lucas até nos cupins de mãos dadas que
estou chamando de casa é impossível.
— Bem, boa noite. — Notei que o olhar dele correu para uma
casa um pouco mais à frente.
— Vocês saíram juntos da empresa, não acredito que você
dura tão pouco. — Não consegui conter a piadinha para provocá-lo.
— Só a levei na faculdade porque estava atrasada. —
Respondeu ácido. — Até amanhã.
Parece que meu “querido” chefe tem um ponto fraco.
Olhei adiante para o lugar que ele tinha olhado, talvez seja
algo que possa ser explorado.
O primeiro dia já foi e não consigo imaginar quantos virão a
seguir, mas não vou deixar que a minha mãe saia distribuindo tudo o
que é meu por direito.
Depois do banho me deitei olhando para o teto, tudo estava
bagunçado, minha vida de cabeça para baixo.
Nesse momento pensei em Jorge, com um filho especial e
ameaçado de perder o emprego, se me sinto assim apenas para
recuperar minha fortuna, imagino como ele deve se sentir todos os
dias. Nessa vida.
Pego meu celular e começo a olhar as notícias de Seattle. Um
sorriso brota assim que percebo o que dona Carmen está fazendo.
— Nada sobre meu sumiço... abafando a mídia.
É claro que não deixaria que as pessoas ficassem
perguntando onde seu filho problemático está.
Nessa noite o sono veio, o cansaço me venceu e dormi
profundamente.

No dia seguinte, vi que a amarga ainda não tinha chegado,


então fui para a sala de descanso para fazer o café.
— Bom dia. — Disse entrando, com um sorriso pequeno nos
lábios. — Vejo que está indo bem.
— Estou sim! — Respondi sem sutileza. — O que faz aqui tão
cedo?
— Eu trabalho aqui, não sei se você se lembra, mas eu estava
aqui quando você chegou, estou aqui a um bom tempo na verdade.
— Ela fica estressada tão facilmente.
— Sei que trabalha aqui, mas o que quero saber é o que faz
aqui tão cedo... não deve ser assim tão necessário, normalmente
pessoas como você tem seus privilégios...
Abri um sorriso de pura provocação, chega a ser engraçado
ver como seu rosto fica vermelho quando está nervosa.
— Pessoas como eu? Que privilégios está falando? Desde
que eu entrei aqui, minha função eu desempenho com perfeição e
não tenho nenhum tipo de colher de chá ou privilégio.
Deixei o que estava fazendo de lado e caminhei em sua
direção, chegando perto o bastante para incomodá-la, mas meus
olhos correram para sua boca entreaberta, seguindo para o peito que
subia e descia rapidamente.
Minha pulsação aumentou, seus olhos são tão profundos que
sinto que posso me perder ali.
Não sei quanto tempo levo até recuperar o controle.
— Vai me dizer que não sabe do que eu estou falando,
Cecília? — Ela morde os lábios e isso provoca uma agitação
desconfortável em minha calça.
— Não, eu não sei! — Diz com firmeza erguendo mais o rosto
para me encarar.
— Eu te vi saindo daqui ontem, queria te agradecer, mas
estava com tanta pressa de encontrar seu chefe fora daqui, que...
— O quê? — Me interrompeu. — De que porra está falando?
Observei seu rosto com um pouco mais de calma, a pele
estava com tons diferentes.
— Existem muitas formas para chegar ao topo, às vezes os
caminhos mais rápidos nem sempre são os mais inteligentes. —
Disse, aproximando ainda mais meu rosto do seu.
O cheiro de baunilha que vem dela me fez puxar o ar com um
pouco mais de força.
— Não sei o que pensa que está acontecendo, mas seja o
que for, não é da sua conta! — Trincou os dentes de forma audível.
— Deve ser por isso que não sente atração por mim, não faço
seu tipo...
— Feri seu ego, é? Ah, sinto muito, mas acredite, seu rostinho
bonito não quer dizer nada quando você não tem uma gota de bons
modos correndo por suas veias!
Respirei profundamente e sorri, seu olhar caiu na minha boca.
— Sabe o que eu acho? Que você não é tão imune a mim
quanto quer aparentar.
— Qual o seu problema hoje? Não estou entendendo! Se tem
algum problema, vá até o RH e reclame, não estou aqui para te
agradar, estou aqui para fazer o meu trabalho, e isso eu faço!
Notei que cerrou os punhos e sorri imaginando o que ela
poderia fazer contra mim.
— Faz bem mais do que apenas seu trabalho, não é mesmo?
Lucas ao menos te dá alguma bonificação para que faça tantos
extras?
Sua mão é mais rápida do que minha percepção e ela acerta
um tapa forte em meu rosto.
Dei um passo para trás com a mão no local do tapa.
Os olhos dela ficaram marejados e isso estranhamente me
incomodou.
— Nunca mais fale isso! Não vou aceitar que me trate como
uma prostituta, porque isso é a última coisa que faria, por nada nem
ninguém.
Aposto que o prédio inteiro a ouviu, mas eu sequer cogitei que
ela ficaria irritada a nível de me agredir.
Capítulo 13
— O que está acontecendo aqui? Que discussão é essa? — A
voz de Lucas ecoou atrás de mim.
Seu olhar frio passava de Eduardo para mim aguardando uma
resposta.
Sinto meu rosto queimando pela vergonha e pelo teor daquela
conversa, mantive meu rosto abaixado e evitei seu olhar.
— Cecília? Algo a dizer? — Insistiu.
— Nada! Não tenho nada a dizer, o que foi necessário foi dito
diretamente a ele. — Respondi tentando parecer firme, mas a
verdade é que eu estava tão constrangida com tudo aquilo que só
queria cavar um buraco para me esconder.
Ouvi a risada de Eduardo.
— Estava apenas dizendo a ela como as coisas às vezes são
injustas para alguns, enquanto uma pessoa que pode ter mais
capacidade não chega a lugar nenhum porque outras no lugar do
cérebro, usam o corpo para chegarem onde querem.
Senti minha pele pegar fogo.
— Não acho que tenha alguém aqui que faça tais coisas
Eduardo, todos que trabalham aqui são pessoas capacitadas.
As lágrimas transbordaram, aquilo tudo estava demais para
mim.
— Venha até a minha sala Eduardo, preciso falar com você.
— Sua voz ficou um pouco mais calma. — Leve o tempo que
precisar para se recompor Cecília, você já deixou tudo o que preciso
pela metade do dia pronto se quiser tomar um ar fique à vontade.
Assenti sem me atrever a olhar para nenhum dos dois e saí da
sala antes que dissessem mais alguma coisa.
Corri para o terraço, era o único lugar que me sentia bem na
empresa.
Não sei onde foi que errei na vida para ter que passar por
tanta coisa, pode ser que o erro realmente esteja em mim afinal.
Me esforço tanto para não ser aquilo que meu pai diz de mim,
aquilo que minha mãe dizia, mas no fim das contas quem me vê
sempre acha o mesmo, que não passo de uma vagabunda, talvez
eles tenham razão.

Não vi Eduardo pelo resto do dia e Lucas não mencionou o


ocorrido nos momentos em que nos encontramos.
Tentei fazer as coisas sem pensar muito, porque não
conseguiria fazer meu trabalho direito se remoesse.
Quando a hora de ir para a faculdade chegou, mais uma vez
saí atrasada, mas agora não tive pressa, não estava no clima de ir
para a aula, e acabaria ficando no mundo da lua como no dia
anterior.
O ônibus para casa não demorou a passar e assim que sentei
imaginei como seriam as coisas em casa, não estou mais em paz,
nem em casa e agora nem na empresa.
— Posso me sentar? — A voz me fez congelar.
Olhei para Eduardo e meu coração se encheu de amargura.
— Tem outros assentos vagos, se puder fazer a gentileza de
se sentar o mais longe possível de mim, serei grata. — A resposta
saiu como eu gostaria, seca e rude.
Sem me dar ouvidos, se sentou ao meu lado e eu me encolhi
mais perto da janela, sem me atrever a olhar para o homem que a
poucas horas atrás estava me acusando de me vender a meu chefe.
— Cecília eu... — Começou.
— Você poderia por favor ficar em silêncio? — Interrompi,
cerrando os dentes.
— Cecília. — Suplicou.
— O que foi? Vai falar mais o quê? Encontrou mais alguma
coisa para me ofender? — Me levantei, não aguentando ficar ao lado
dele.
Fui para um assento vazio e me sentei no fundo do ônibus,
quase implorei para que alguém entrasse e se sentasse ao meu
lado.
— Será que você pode ouvir o que eu tenho a dizer? — Mais
uma vez ele veio para o meu lado. — Por favor...
Coloquei as mãos em meu rosto, estava emocionalmente
exausta, não quero ter que ouvi-lo e mais ninguém também.
— Sei que fui um idiota hoje, sinto muito. Tenho tido alguns
dias de merda, mas isso não é culpa sua. — Senti sua mão na minha
e delicadamente a puxou para baixo.
Ergueu meu rosto com a outra mão, estava perto, até demais,
o bastante para notar meu rosto, eu vi quando ele fez uma careta
forçando a vista.
— Já disse que gosto que respeitem meu espaço pessoal! —
Virei meu rosto evitando seu olhar.
— Depois de um dia inteiro de trabalho, a maquiagem que
você passou não está mais cobrindo tão bem e você não sabe se
maquiar. Quem fez isso com você?
Fechei os olhos com força.
— Só me deixe em paz, Eduardo. Não te peço mais nada,
apenas isso, por favor.
Ele não disse mais nada e eu consegui respirar aliviada,
mesmo completamente consciente de sua presença ao meu lado.
Capítulo 14
Entrei na sala do meu “chefe” imaginando que sairia dali com
um sorriso no rosto, mas saí de lá me sentindo o pior entre os
homens.
— O que pensa que está fazendo? — Seu olhar poderia me
perfurar como facas.
— O que foi? Ninguém pode mexer com a sua queridinha?
O rosto dele se torceu de raiva e eu abri um sorriso ainda
mais amplo.
— Acha engraçado ofender uma mulher inocente? Porque eu
honestamente não acho. Cecília é uma secretária excelente e uma
mulher maravilhosa, e sim, Eduardo, eu gosto muito mais dela do
que deveria, mas acredite ou não, ela nunca me deu uma chance
sequer de conquistá-la. E não é que eu não tenha tentado.
Comecei a rir, é bem óbvio que está mentindo apenas para
proteger sua peguete.
— Como eu disse, pode acreditar ou não, escolha sua, mas
ela não merece isso, porque nunca me deu espaço para tal coisa. E
acredite em mim, eu quero, nunca quis tanto alguém na vida, então
se puder fazer o favor de não atrapalhar o meu caminho, agradeceria
muito...
Fiquei surpreso, não vou mentir, poderia jurar que os dois
tinham algum tipo de relacionamento.
— Não atrapalhar seu caminho? O que eu ganharia com isso?
Você está atrapalhando o meu caminho e eu tenho que deixar o seu
em paz? — Lancei um olhar de desafio. — E se eu me interessar
pela linda Cecília?
— Não se aproxime dela, não estou brincando...
— Ela me parece muito interessante e já que você não tem
nada com ela, qual o problema de me aproximar?
— Estou avisando...
— Avisando o quê? Que você a quer e que eu não posso
querer? Isso não me parece muito justo... ela foi a primeira mulher
que não caiu de joelhos com o meu sorriso, pode inclusive, virar uma
questão de honra, restaurar o orgulho que ela feriu.
Não estava pensando em nada disso, quero só deixá-lo azul
de raiva.
— Você não deve agir como se fosse dono daquilo que nem
sequer é seu Lucas, se você não consegue, não deveria estar no
caminho de alguém que pode.
— Ela jamais te daria uma chance. — Deu um passo para
frente trincando o maxilar.
— Será? Se acreditasse mesmo nisso, não ficaria tão na
defensiva. — Abri meu melhor sorriso. — Tenho que ir trabalhar, nos
falamos depois Lucas.
Tudo o que eu quero é voltar de uma vez para a minha vida,
então se ele está se sentindo ameaçado com a minha presença,
pode acabar me ajudando a voltar para casa, não é a minha melhor
ideia, mas pode funcionar.
Saí da sala de Lucas assobiando, me perguntando quanto
tempo levaria até que ele resolvesse que não tenho que estar aqui e
a pequena Cecília é a chave para isso.
Uma coisa é certa, não me sinto bem por tê-la acusado
injustamente, não gosto de injustiças, ela pareceu muito magoada
com isso, me importar não é algo que aconteça frequentemente, mas
é uma das poucas pessoas que se importou comigo quando cheguei
aqui, assim como Jorge e realmente quero poder ajudar quando eu
estiver de volta ao meu lugar de direito.
O resto do dia fiquei imaginando o que poderia fazer, como
me aproximar de Cecília, principalmente depois de ter discutido com
ela.
O primeiro passo, com toda a certeza, será me desculpar, é
por aí que vou começar, tentar me aproximar.

A vi saindo mais uma vez, mas agora Lucas passou direto por
ela e ele me viu na mesma calçada indo em direção ao ponto. Seu
olhar para mim foi assassino.
Vi meu ônibus chegando ao ponto e, para a minha surpresa,
Cecília entrou, apressei o passo e entrei também.
Não imaginei que ela estava tão brava com o que tinha
acontecido, além de não me querer ao seu lado, ela também saiu do
lugar onde estava sentada.
Mas nada foi mais chocante do que ver que a maquiagem que
ela passou estava saindo e que por baixo havia uma mancha roxa
que se destacava na pele branca.
“Que porra é essa?”
Ela carregou um pouco na base onde a marca estava, mas
depois de um dia inteiro de trabalho, a maquiagem não estava sendo
mais eficiente e seus olhos inchados mostram que ela provavelmente
esfregou muito o rosto depois de chorar.
Também não deve ter ideia de como se usa, porque ela
passou apenas na mancha e um pouco em volta, mas não no resto
do rosto, o que deixou a pele com um tom diferente.
Sem aguentar ficar calado como ela pediu, perguntei
novamente quem fez aquilo.
Ela parece uma criatura tão delicada, é difícil de imaginar que
alguém possa querer machucá-la.
— Vem cá, você tem algum tipo de problema psicológico? —
A pergunta me pegou de surpresa. — Eu não sou médica, mas as
suas mudanças drásticas de comportamento não devem ser
completamente naturais!
Abri a boca para responder, mas ela não me permitiu.
— Eu honestamente estou cansada e você não tem nada a
ver com a minha vida! Então por que não continua sendo o babaca
que eu conheci no primeiro dia e para de me perturbar?
— Por quê? Se sente mais à vontade quando eu estou sendo
detestável porque tem medo do pode sentir se eu me tornar alguém
melhor?
Ela não me respondeu e seu rosto ficou completamente
vermelho.
É quase impossível para mim não achar graça daquilo, não só
era a primeira mulher que tinha coragem de falar daquela maneira
comigo, mesmo que não saiba quem eu sou, como também cora
como uma adolescente e isso chega a ser excitante.
Mas se eu quero que ela se torne a chave para o meu retorno
para casa, preciso que ao menos me tolere, o que parece não ser o
caso no momento.
Ergui as mãos em sinal de rendição.
— Vim em paz, não quero te irritar, juro, só quero realmente
que me desculpe, quanto ao seu rosto, estou mesmo preocupado,
não sou só um curioso. Se puder ajudar em algo...
Cecília me olha dentro dos olhos pela primeira vez, era como
se visse meu interior, os olhos grandes e penetrantes me causaram
um arrepio, senti que seu olhar pode analisar minha alma.
— Não guardo rancor, não se preocupe.
— Não é apenas com isso que estou preocupado. — Toquei
seu rosto.
A sensação que tenho ao continuar a olhando nos olhos foi de
que estava falando a verdade, que não era apenas uma encenação
para ter o que quero.
Ela parece tão indefesa, que liga todos os botões dos meus
instintos de proteção.
— Por que está aqui? — Mordeu o canto dos lábios.
— Porque eu pego esse ônibus para ir para casa também. —
Desconversei por estar me sentindo inquieto.
Assentiu e se calou.
Não puxo mais assunto, fiquei me analisando e pensando no
que tinha acontecido ali, por que a minha preocupação era tão real?
Devo ser um bom ator, ou no mínimo, realmente sinto que
meu ego foi jogado de cima de um penhasco.
Seja qual for das opções, o que me importa é sair dessa droga
de cidade e voltar para a minha maravilhosa Seattle, meu
apartamento luxuoso, minhas festas e mulheres.
Nunca pensei que eu sentiria tanta falta de ingerir qualquer
coisa com álcool, e nem meu cigarro estou conseguindo comprar,
então reduzi consideravelmente o meu vício.
De vez em quando sinto o olhar dela em mim e quando está
olhando para o outro lado eu a olho.
Cecília é muito bonita, principalmente sem aqueles óculos no
rosto, é delicada, a boca é de um tom rosado que me faz pensar
muitas besteiras, como por exemplo, como ficaria se estivesse
envolvendo meu pau, como suas maçãs do rosto poderiam estar
coradas e a cor de sua bunda redonda depois de um tapa.
A direção que meus pensamentos me levaram fez com que a
calça ficasse desconfortável, precisei mudar um pouco minha
posição para que o volume aparente não a deixasse chocada.
“Caralho! Virei algum tipo de animal irracional agora? Será
possível que não consigo controlar a porra do meu pau?”
Me levantei e ela se levantou ao mesmo tempo.
— Você também mora aqui? — perguntou fazendo uma careta
estranha. — Nunca te vi por aqui.
Deixei-a passar na minha frente e não consegui evitar de olhar
para a bunda.
— Me mudei a pouco tempo. Te acompanho até sua casa. —
Comentei, trincando os dentes.
— Não precisa, tenho o costume de voltar só, obrigada.
Mesmo tendo dito não, a acompanhei, ela mora a apenas três
casas de distância da minha.
— Boa noite, Cecília. — Seu nome pareceu deslizar na minha
língua. — Nos vemos amanhã.
Capítulo 15
Passei a sair no mesmo horário que Cecília, pegamos sempre
o mesmo ônibus de manhã e depois de uma semana indo juntos
todos os dias, ela ficou mais tranquila com a minha presença.
— Bom dia, Eduardo! — Estou esperando por ela na calçada
em frente à sua casa.
Torci a boca.
— Já te pedi um milhão de vezes que me chame de Edu. —
Abri um sorriso sedutor. — É apenas para os mais íntimos.
Bateu com seu ombro no meu braço.
— Ainda bem que não sou tão íntima assim. — O sorriso dela
é contagiante e eu acompanho sorrindo também.
Vi um homem na porta nos observando, imagino que deva ser
alguém da família dela.
— Como está indo no trabalho? Eu soube que você não teve
um bom feedback nos primeiros dias. — Disse quando nos sentamos
no ônibus.
— Digamos que eu estou aprendendo mais rápido do que eu
imaginei. — Para alguém com todas as minhas mordomias durante a
vida toda, uma semana já estar mais à vontade com o trabalho
chega a ser assustador.
— Que bom que se adaptou. — Me olhou nos olhos com um
sorriso de canto.
Nesse momento percebi o quanto estou viciado no sorriso
dela, virou minha meta diária e mesmo quando Lucas não está por
perto, me sinto bem ao vê-la sorrir.
— Como está o seu dia hoje? Muita coisa na agenda do
chefinho? — Revirei os olhos ao falar.
— O que tem contra ele? Vocês dois parecem se conhecer de
antes do trabalho e não se dão bem.
— Impressão sua, não tenho nada contra ele, só não aguento
desaforo, nada demais.
Cecília estreitou os olhos, mas não fez mais nenhum
comentário.
Chegamos à empresa e como em todas as manhãs, Grazi
veio até mim com um sorriso largo no rosto.
— Bom dia, Eduardo! — Olhou para Cecília desfazendo o
sorriso. — Bom dia!
Acenei com a cabeça e fui para o elevador.
— Ela me odeia.
— Impressão sua. — Respondi e ela balançou a cabeça
sorrindo.
— Vou fazer o café. — Apertou no andar da sala de descanso.
— Desce para tomar um golinho depois.
— Vou me trocar e já vou para lá.
O elevador apitou, mas antes de descer ela impediu as portas
de fecharem.
— Hoje tem ramen burrito[6], trouxe para você. Espero que
goste!
— Preciso aprender a cozinhar para fazer algo para você. —
Comentei pensativo.
— Não, obrigada, prefiro viver. — Soltou a porta e saiu dando
risada.
Fui para o vestiário colocar meu macacão para iniciar o dia,
Jorge estava lá, terminando de se vestir.
— Bom dia!
— Bom dia menino, como está? — A voz dele estava
estranha.
— Bem, muito bem. — Observei com mais calma. — Você
está bem? Parece um pouco cansado.
— Meu menino está doente, tenho passado a noite no hospital
e o dia trabalhando.
— Doente? O que ele tem? — Me aproximei um pouco dele.
— Ele está internado com pneumotórax e para falar a
verdade, não sei se o hospital vai dar conta disso, ele deveria estar
na UTI, mas não há mais leitos disponíveis, então estão fazendo o
que podem.
Vê-lo ali, de pé e trabalhando, mesmo passando por algo
assim é de impressionar qualquer pessoa, e eu muitas vezes,
mesmo saudável e sem problema algum, nunca quis chegar nem
perto da empresa, e nem é um trabalho difícil e braçal o que tenho
que desempenhar com a minha mãe, não é como aqui e mesmo
assim nunca me interessei pelo trabalho.
— Não precisa fazer essa cara, estamos lutando para que ele
fique bem. Vamos começar o dia, temos muito o que fazer.
Quero achar uma maneira de ajudar esse homem, ele
merece, precisa que alguém faça alguma coisa.
Me troquei e fui para a sala de descanso tomar café, mas
parei um pouco antes quando ouvi a voz de Lucas.
— Você vai para a faculdade hoje? — Perguntou a ela. —
Estava pensando se gostaria de ir jantar comigo hoje? Tenho apenas
uma reunião importante no final do dia, depois estamos mais
tranquilos.
— É... acho que pode ser, eu estou com tudo pronto, todos os
documentos estão revisados, aqui nesse envelope.
— Combinado então, jantamos depois da faculdade.
Escutei os passos vindo no corredor e me escondi observando
Lucas passar.
“Jantar com ela é? Vamos ver se você vai.”
Fui para a sala e a encontrei de costas.
— Cheguei!
Meu humor mudou completamente depois que a ouvi aceitar o
convite de Lucas.
Servi uma xícara de café para mim e me apoiei na bancada
para tomar.
— Oi, eu estava te esperando.
— Sei. — Olhei para um envelope grosso na bancada e
coloquei minha xícara perto. — O que vai fazer depois do trabalho?
— Quero saber se ela vai me contar.
Seu rosto assumiu um tom avermelhado que sei que é de
vergonha e ela não me respondeu, só deu de ombros.
Senti a raiva tomando controle de mim, sem entender bem o
motivo e sem querer pensar demais, levei a mão para a xícara, mas
não a peguei, a derrubei de propósito em cima dos documentos.
Cecília colocou as duas mãos na cabeça.
— Eu sei que você fez de propósito! — Gritou comigo. —
Céus! Eu não vou ter tempo de fazer tudo isso mais uma vez! Ele vai
brigar comigo...
— Lucas está caidinho por você, Cecília...
— Ainda é o meu chefe, nunca misturou as coisas, quando
precisa me dar uma bronca, ele faz! — Ela ficou realmente com
muita raiva. — Merda! — Ele vai precisar disso para hoje... — Tirou
os documentos molhados de café de dentro do envelope.
— Eu sinto muito...
— Não! Você não sente, você fez porque quis! — Os olhos
marejados fizeram meu estômago se contrair.
Passou esbarrando em mim como uma onça brava,
praguejando e batendo os saltos no chão com força.
Soquei a parede atrás de mim.
— Porra!
Por que foi que eu fiz isso?

Durante o resto do meu dia evitei ir até o café ou o andar da


sala de Lucas, tive vergonha da minha atitude infantil.
Não almocei com ela como fazia de costume, mesmo
morrendo de vontade de experimentar o prato que trouxe, Cecília
cozinha muito bem.
Pouco antes do horário de saída, decidi ir pedir desculpas a
ela e a acompanhar até o ponto, mas ela não estava em sua mesa.
Escutei a voz de Lucas, estava dando uma bronca nela e ele
realmente não aliviou, como ela tinha mencionado.
Entrei na sala dele depois que a vi saindo.
— Não foi culpa dela! Estava tudo pronto e eu derrubei o café
em cima.
— Gosto muito que batam na porta antes de entrar, Eduardo e
não me importa de quem você é filho, aqui mando eu! — Respondeu
com as sobrancelhas formando um vinco na testa.
— Não estou interessado nisso, vim só te falar que a culpa
dos documentos não foi dela, foi minha!
Ele cruzou os braços.
— Sabe o que é pior? Cecília está aceitando estar perto de
você, isso é o que me deixa mais abismado. Ela sempre foi muito
seletiva com as pessoas que estão ao seu redor, age com total
profissionalismo na empresa, mas com você, justo você que ela vive
brigando, que atrapalha o trabalho dela, que implica com tudo o que
ela faz, ela deixa se aproximar.
Ele está com ciúmes, já deve saber que não foi ela e mesmo
assim brigou porque está com raiva.
— E você vai descontar nela suas frustrações? Não é assim
que vai ganhar pontos.
— Se isso ajudar a afastá-la de você, é exatamente o que eu
farei.
— Sabe o que ajudaria a me afastar? Ligue para minha mãe,
diga que eu sou um novo homem, que aprendi tudo o que ela queria,
ela vai me mandar voltar e eu desapareço da sua vida e da dela para
sempre.
Só de mencionar isso senti um aperto estranho no peito, mas
ignorei, não quero ter que analisar isso agora.
— Ela vai cair na real Eduardo, vai perceber que você não
gosta dela de verdade mais cedo ou mais tarde.
Me senti mal por vê-la daquela maneira, mas eu o escutei
depois de ouvir Cecília aceitar o convite dele, fiquei completamente
cego de raiva.
— Ela está mais próxima de mim do que você imagina Lucas,
se continuar sendo tão orgulhoso, pode acabar perdendo a única
chance que pensa que tem. — Me virei para sair, mas parei e voltei.
— E outra coisa, brigar com ela para tentar fazer com que ela me
odeie, vai acabar virando contra você.
Me senti estranho quando falei sobre ir embora e me manter
longe dela, em pouco mais de uma semana já estamos nos dando
tão bem, Cecília é uma pessoa fácil de lidar, simples e honesta, não
posso dizer que ela me aceita pelo dinheiro, como sei que as outras
faziam, porque ela nem sequer sabe quem eu sou.
Capítulo 16
Eduardo tem tornado meus dias uma aventura, tanto para o
lado bom, quanto para o ruim.
Às vezes quero jogá-lo do último andar e depois que ele
descobriu o meu lugar, sequer consigo mais me esconder quando
me faz passar raiva, ele vai direto lá para me encontrar.
— Preciso encontrar um lugar melhor agora. — Funguei e
enxuguei minhas lágrimas. — Por que o segurança te deixou
passar?
— Porque pedi com educação. — Se aproximou de mim aos
poucos. — Me desculpe. — Me encarou suplicante. — Eu não queria
te causar problemas.
— E pensou que causaria problema para quem? Lucas é meu
chefe, eu sou a funcionária, se cometo um erro, o problema é
inteiramente nos meus ombros que vai cair.
Ele deu um suspiro.
— Mas não foi você quem cometeu um erro, e fui dizer isso ao
Lucas...
— Você o quê? — Arregalei os olhos com o espanto. — Você
não fez isso...
— Eu só expliquei.
— Eduardo, eu não sou uma princesa e eu não preciso de um
príncipe para me proteger, cuido de mim sozinha, aconteceu, ele
falou comigo e foi isso, não quero que repita isso, se quer me ajudar,
não derrube café em documentos importantes e já estará de bom
tamanho.
Seus olhos me passaram toda a sua confusão, mas ele não
pode fazer isso, me colocar em encrenca e depois querer resolver a
seu modo.
Fez um bico quase imperceptível, como uma criança que foi
pega aprontando.
— Me desculpe.
— Tudo bem, só não quero que isso se repita.
Queria muito conseguir ficar irritada de verdade com ele, mas
desde que nos aproximamos sinto cada vez mais dificuldade de me
afastar.
Essa do café foi apenas o começo...

Nas semanas seguintes, Eduardo e eu discutimos um dia sim


e o outro quase.
— Vocês estão parecendo um casal. — Jorge, seu
companheiro de equipe comentou quando se juntou a nós no
almoço. — Nem mesmo eu e minha esposa discutimos tanto assim,
vai acabar em casamento!
Meu rosto esquentou e sabia que estava vermelha como um
pimentão.
— Imagina só se eu vou querer me casar com a amarga,
não... ela colocaria regras para falar comigo! — Meu rosto ardeu
ainda mais. — Mas vamos ser sinceros, olha esse rosto vermelho se
não é o mais bonito que você já viu.
Ele me colocou em cada saia justa até seus dois meses de
empresa, que em alguns momentos eu poderia jurar que seria
demitida.
Se acabaram meus dias monótonos, por outro lado, Lucas se
tornou cada dia mais ranzinza e impaciente. Implicando com coisas
que antes dizia que eu executava com perfeição.
Lucas me pediu que levasse um café para ele e a papelada
que seria entregue a sede da empresa, passamos a tarde quase
inteira no escritório, perdi inclusive meu horário de almoço.
— Por que não me avisou? — Sua voz me chamou atenção.
— Você deveria ter saído para almoçar faz uma hora.
Sorri levemente.
— Também não percebi. — Não estava mentindo, estávamos
tão entretidos que não senti fome.
— Se quiser ir comer pode ir, eu termino aqui.
— Tudo bem. — Comecei a juntar minhas coisas para me
retirar.
— Cecília. — Parei e voltei para perto dele. — Teremos uma
reunião de funcionários na semana que vem, será no sábado você
pode me acompanhar? Não tenho proximidade com mais ninguém,
além disso posso acabar precisando de você.
Não imaginei que ele me convidaria, desde o episódio do café
ele não tinha se aproximado mais de mim, não que isso fosse ruim,
não queria ter que dar um fora nele principalmente depois daqueles
dois beijos que ele me deu, mas também não estava nada normal.
— Claro. Posso sim.

Os dias passaram rápido, já é quinta-feira. A empresa inteira


está uma agitação só, não é uma simples reunião como Lucas fez
parecer, é comemoração de mais um ano. No meu horário de saída,
ele veio até minha mesa.
— Isso aqui é para você. — Abriu um sorriso amplo. — Tenho
certeza de que ficará linda.
Colocou uma caixa branca com um laço azul em cima da
mesa.
— O que é isso? — A confusão tanto pelo comportamento
mais gentil, quanto pelo presente ficou estampada em meu rosto.
— Veja quando chegar em casa. Até amanhã. — Virou as
costas e sumiu de volta em sua sala, me deixando com cara de
boba.
Terminei de organizar minha mesa e fui para o ponto.
— Demorou. — Um Edu impaciente está com as sobrancelhas
unidas.
— Lucas pediu que mudasse mais algumas coisas, hoje eu
vou para casa, não tenho aula.
Muitas vezes Edu me acompanha até a faculdade e de lá ele
vai para casa, já disse que não precisa, mas ele insiste que não há
problema.
— Ele está pegando muito no seu pé. — Seus olhos pousam
na caixa em minhas mãos. — E isso? O que é?
— Sim. — Olhei para a caixa. — Ainda não abri. — Dei de
ombros.
Nos tornamos bons amigos nesse tempo, mas me sinto
estranha perto dele, fico ansiosa para vê-lo, para conversar, não é o
que pode ser considerado normal e sei disso, porque ainda não tinha
me sentido assim com mais ninguém.
— Ele é um idiota! — Rosnou.
— Nem sempre. — O ônibus chegou e entramos. — Você vai
para a festa da empresa?
— Não! — A resposta foi imediata. — Já me basta ter que ver
todos de segunda a sexta.
— Lucas me chamou para acompanhá-lo.
Ele levantou uma sobrancelha, já notei que faz isso quando
está irritado.
— Você não aceitou, não é? Quer dizer, ele tem sido um
idiota com você.
Fiz uma careta dando risada.
— Você também é, uma boa parte das vezes, e estamos aqui.
— Revirei os olhos. — E sei que teria que estar presente, sou
secretária dele.
Edu ficou estranho depois disso, às vezes ele tem algumas
atitudes estranhas, como se estivesse com ciúmes, mas nunca me
deu a entender de que quer algo além da minha amizade.
Descemos no ponto perto da nossa casa, mas não foi como
das outras vezes, ele não se demorou para me dizer tchau, apenas
deu boa noite e foi.
Fiquei olhando por um tempo, mas ele não olhou para trás.
— Boa noite, Cecília! — Aquela voz me arrepiou. — Saudade
de mim querida?
Olhei para trás e vi o homem a quem meu pai deve.
— O que faz aqui? Eu tenho enviado dinheiro tanto no meu
vale, quanto no meu pagamento. — Minha voz falhou com o pânico.
— Já fez as contas de quanto você adquiriu de juros? Acho
que não... quando te procurei, a oque? Cerca de dois meses e
alguns dias, a dívida estava em trinta e cinco mil, agora está quase
em cinquenta, os juros são diários Cecília, você não vai conseguir
pagar me mandando de quinhentos, ou mil. Está achando que isso
aqui é brincadeira?
Meu pai abriu a porta.
— Levem-na de uma vez! Façam um leilão, tentem conseguir
o maior valor, ela vai me agradecer depois. Ainda vai ter um dinheiro
no bolso.
Sinto o peito ser esfaqueado. O ar fugiu dos meus pulmões
quando dois outros homens se aproximaram de mim.
— Não! Não encostem em mim! — Gritei.
Me pegaram pelos braços, minha cabeça começou a girar,
meu estômago embrulhou.
— Soltem ela! — Era a voz de Edu.
Olhei na direção de onde veio a voz e lá estava ele, ali bem
perto de nós.
— E você quem é? — Meu pai perguntou.
— Soltem ela! — Edu repetiu.
— E se não soltarmos, você vai fazer o quê? Ela assumiu a
dívida do pai e não está conseguindo pagar, agora terá que pagar do
jeito que pode... afinal de contas alguém como ela vale muito.
A mão do homem asqueroso encostou em meu queixo e um
sorriso macabro se estendeu em seus lábios.
— Então me deixe negociar, me dê cinco dias, em cinco dias
eu consigo o valor total da dívida, não é o que quer? Receber? Eu
pago o valor, acrescido dos juros dos dias que vai esperar.
— Não vou esperar mais cinco dias se ela pode conseguir
mais do que o dobro em três.
— Te pago o dobro, o dobro se esperar os cinco dias!
Eduardo não pode estar falando sério, esse homem vai matar
nós dois.
— Se você não acertar esse valor em três dias, volto aqui, e
antes de matar você, farei com que assista enquanto a levo para ser
estuprada de todas as formas possíveis em todos os puteiros que eu
conheço na cidade, por todos os homens que puderem pagar,
mesmo que um mísero centavo, entendeu? — Encarou Edu de perto.
— É o dobro do valor ou juntarei aos centavos os cem mil, ou até
que ela morra, o que vier primeiro.
Os homens me jogaram no chão.
— O tempo está passando, se eu fosse você começava a
correr, uma buceta não vale a sua vida. — Ele olhou para mim
enquanto Eduardo me levantava do chão. — Nos vemos em três
dias, Cecília e agora você me deve o dobro. — Lambeu a boca de
uma maneira nojenta. — Terei prazer em ser o primeiro, um centavo
não fará cócegas no meu bolso para foder você.
E os três se foram dando risada.
Meu pai saiu do encosto da porta vindo como um touro bravo
em minha direção.
— O que foi que você fez, sua vadia? Ele aceitou te levar
como pagamento, estava tudo certo para o seu leilão, seria bom para
todos nós e ainda sobraria!
Sua mão se ergueu para me acertar, mas Eduardo a segurou.
Capítulo 17
— Encoste uma porra de um dedo nela e eu arranco a suas
duas mãos! — Eduardo rosnou entre os dentes como um animal. —
Então é você quem a deixa marcada quase sempre, não é? — A
fúria em seus olhos assustou até a mim. — Vou te ensinar como se
bate.
Acertou o primeiro soco no meu pai, que cambaleou para trás.
Antes mesmo que eu pudesse raciocinar, Edu já estava desferindo
diversos golpes contra ele, me coloquei em sua frente, o corpo
trêmulo e assustada com tudo o que tinha acontecido.
— Ele não vale a pena... não vale... me tira daqui, por favor...
— Minha voz é apenas um sussurro.
Depois de conseguir arrancar Eduardo de cima de meu pai,
ele me levou para sua casa.
Meu corpo treme convulsivamente, o medo do que poderia
acontecer comigo, o medo por ter envolvido Edu, uma pessoa que
não tinha absolutamente nada com isso e agora corria risco de vida,
o medo do que iria acontecer em três dias.
Assim que entramos na casa, ele tirou o braço dos meus
ombros.
— Preciso saber o que é que está acontecendo Cecília, desde
quando isso tem acontecido?
Precisei de um certo esforço para encontrar a minha voz.
— Que eles vêm assim, para me levar, é a primeira vez, mas
faz um pouco mais de dois meses que eu soube dessa dívida do
meu pai e que venho pagando por isso.
Funguei e enxuguei as lágrimas.
— E agora você se envolveu nisso, droga, como é que vou
conseguir pagar o dobro do que já devia, isso é impossível, nós
estamos ferrados, você nem sabia de nada, e agora...
Voltei a chorar, não acredito que graças a meu pai, agora duas
pessoas estão com os dias contados.
— O que esperava que eu fizesse? Que ficasse olhando
enquanto eles te arrastavam sei lá para onde? — Bufou frustrado. —
Não! Nem pensar! Mas agora quero que me conte direitinho essa
história, preciso entender o que está acontecendo primeiro.
— Deveria ter deixado, deveria! Ao menos você não estaria
nessa situação, pelo menos só um de nós teria um fim trágico, agora
nós dois teremos! — Gritei.
Eu poderia fugir, mas como já não sei, porque tudo o que não
vai para casa, ia para as mãos daquele nojento, não tenho nenhuma
reserva no banco, nada que consiga me levar pelo menos para longe
daqui.
— Você consegue sair da cidade? — Perguntei.
— O quê?
— Sair da cidade, se mandar daqui, você consegue? Não
quero que nada te aconteça por minha culpa.
— Se entendi bem, nada disso é culpa sua, foi seu pai, não
foi? É ele quem te deixa às vezes com marcas roxas pelo corpo?
Não consigo entender como ele está tão calmo.
— Você entendeu o que foi que acabou de acontecer? —
Deixei meu pânico evidente.
Não é possível que ele realmente tenha plena consciência do
que aconteceu. Não parece sentir medo.
— Quem parece não estar entendendo é você, eu consigo
esse dinheiro, tudo bem? Vou pegar emprestado, pago, e vai ficar
tudo bem, só preciso que me conte tudo.
— Foi dívida do meu pai, eles disseram que se eu não
assumisse iriam matá-lo. Eu não conseguiria viver sabendo que ele
morreu, me sentiria culpada... teria que carregar esse peso pelo
resto da minha vida.
Ele olhou para mim como se não entendesse o que eu estava
falando.
— Isso é sério? O cara te trata como se você não fosse nada
e está me dizendo que ficou com pena de que o matassem pelas
contas que ele mesmo fez? Agora você tem problemas por culpa
dele e ele quase te mandou para um bordel! Você tem noção da
dimensão dessa loucura?
Respirou fundo colocando a mão no rosto.
— Ele não merece a sua compaixão! Será que você entende
isso? — Acalmou um pouco a voz.
— Ele é meu pai...
— E o que tem? Eu não o vi te tratar como filha! Na verdade,
ele nem te tratou como um ser humano, Cecília ele ia te bater por
não ter se vendido, você... você não pode, não pode ter
consideração por uma pessoa assim! — Sua voz aumentou
novamente.
Não sabia o que responder, sei que ele está certo, mas esse
senso de gratidão por existir não me ajuda, apenas por ser pai, o que
não parece ser, mas é algo marcado tão profundamente no meu ser,
que mesmo sabendo que é errado, não consigo parar.
— Edu, vá embora, é sério, não vou me importar, só não
quero que sobre para você que não tem nada com isso.
Agora sua raiva se direciona a mim.
— Não vou a lugar nenhum, vou pagar aqueles idiotas e
acertar as coisas, mas você tem que se afastar de seu pai! Você não
merece nada do que vi acontecer hoje, ainda menos por alguém que
não tem o mínimo de respeito pela sua vida!
Me sentei no pequeno sofá de dois lugares na sala e olhei ao
redor.
— Obrigada. — Olhou para mim. — Por ter me ajudado, muito
obrigada.
Soltou o ar com força.
— Não precisa me agradecer. — Caminha em minha direção
e se senta ao meu lado. — Quer ir tomar um banho? Espero você ir
primeiro.
Me guiou até o quarto e me entregou uma toalha e uma
camiseta dele.
— Eu tenho minhas cuecas, se quiser posso ir até sua casa
buscar algo para você, mas não garanto que seu pai vai ficar inteiro
se vier com desaforo.
— Visto qualquer coisa, só não sei o que vou usar amanhã
para trabalhar. — Abri um sorriso triste.
— Vemos isso amanhã, ou simplesmente faltamos. Aposto
que você nunca faltou e uma única vez não vai matar ninguém. —
Pensou por um instante. — Peguei aquela caixa, vamos ver o que
tem dentro depois, pode ser algo que possa usar.
Realmente não me sinto bem para ir trabalhar, mas não posso
deixar Lucas na mão, faço tudo para ele com relação a
documentação e se faltar vai acabar atrapalhando muito o dia dele.
Entrei no banho e desejei que a água levasse toda a angústia
que sinto.
Meu coração parece pequeno e a dor chega a ser física,
Eduardo tem toda a razão, eu nunca fui tratada como filha, não devo
nada a ele, e saber de tudo isso dói ainda mais.
Quando saí ele estava deitado na cama sem camisa, foi
impossível não encarar, nunca havia visto um homem tão bonito.
— Não sei se você se dá conta. — Me obriguei a tirar os olhos
de seu corpo e olhei para seu rosto. — Mas você é muito expressiva,
não consegue esconder o que está passando pela sua cabeça.
Baixei os olhos para minhas mãos que agora parecem muito
interessantes enquanto sinto meu rosto arder de vergonha.
Ouvi Edu se mover e vir para perto de mim, seu dedo
indicador ergueu meu rosto pelo queixo.
— Para ser honesto, eu gosto muito disso, muitas vezes
consigo te entender quando você evita se expressar em palavras,
isso é bom.
Me perdi dentro do seu olhar, sentindo um arrepio gostoso
percorrer o meu corpo.
Mordi meus lábios, e seus olhos encaram minha boca como
se fosse arrancá-la para si.
Seu polegar pressionou abaixo do meu lábio puxando-o para
fora do aperto de meus dentes.
— Não faça isso. — A voz mudou, está mais profunda e ele
engoliu seco. — Não sabe o quanto é tentadora.
Passou por mim e entrou no banheiro, me deixando
completamente inerte e com as pernas bambas.
“O que foi que acabou de acontecer aqui?”
Estou impossibilitada de tentar entender.
Voltei à sala para que quando ele voltasse pudesse se trocar e
ir dormir em paz, deitei-me sofá e fiquei ali pensando nos
acontecimentos recentes, na forma como fui tratada e no que poderia
ter acontecido se Edu não tivesse aparecido. Estava prestes a dormir
quando escutei a voz dele.
— O que pensa que está fazendo?
Levantei rapidamente e me sentei.
— Acha mesmo que eu vou deixar que durma no sofá? —
Jogou as mãos para cima. — É preciso muita paciência para lidar
com você!
Ainda na névoa da sonolência o senti me puxar pelo braço me
guiando de volta para o quarto.
— Não vou tirar seu espaço Edu, posso me acomodar no sofá
mesmo, é praticamente do meu tamanho.
— Você não vai tirar meu espaço. Minha cama é de casal.
Meu coração começa a martelar forte contra o peito e minha
boca seca, nunca dormi acompanhada por um homem, mas minha
vontade de estar perto dele venceu o medo.
Edu esperou que eu me deitasse e em seguida se deitou de
costas para mim.
— Boa noite, Ceci!
— Boa noite, Edu!
Capítulo 18
Quero dormir, mas é impossível fechar os olhos, sinto algo se
remexendo dentro de mim cada vez que ouço o soluço baixinho de
Cecília, meu peito se aperta.
Ver seu pai tratando-a da maneira que presenciei, me faz
questionar a quanto tempo ela vem sofrendo esse tipo de maus-
tratos.
O corpo dela tremeu e como um impulso me virei e a puxei
para mim pela cintura, comecei a acariciar seus cabelos para tentar
fazer com que se acalme.
— Você quer conversar? — Perguntei na esperança de
distraí-la.
Cecília fungou e puxou o ar com força.
— Podemos apenas ficar assim? Você mexendo no meu
cabelo está muito bom. — Sorri sabendo que ela não via.
— Podemos ficar como quiser, se você se sente bem assim...
— Não terminei a frase, não é apenas ela que se sente bem assim,
eu também me sinto.
Não sei em qual momento Cecília deixou de ser a secretária
amargurada para ser alguém com quem me preocupo tanto, que eu
não quero que saia de perto de mim, nem mesmo por um instante.
Assim que o dia amanhecer terei que dar um jeito de
conseguir o dinheiro, minha mãe está fora de cogitação, com todas
as regras que me impôs, ela provavelmente pensará que quero
algum conforto ou luxo.
A única com quem posso falar é Paula, mesmo depois de
termos nos despedido da maneira como foi, sei que ela não vai me
dizer não e não fará tantas perguntas quanto minha mãe faria.
Continuo acariciando o cabelo de Cecília até perceber que ela
pegou no sono.

Na manhã seguinte, acordo antes de Cecília, me movo o mais


devagar que posso para que ela não acorde, ela teve uma noite
longa é bom que descanse.
Vou para a cozinha ver o que posso fazer para o nosso café
da manhã, olho para o horário e me pergunto se devemos ou não ir
trabalhar e se ela ficará com raiva se eu não acordar a tempo para o
trabalho.
Suspiro.
— Vou pensar nisso enquanto busco pão e torradas. — Olho
para o meu celular e abro o aplicativo do banco.
Tenho lidado bem com as minhas finanças, pago minhas
contas em dia, compro o bastante de mantimentos para me manter,
só fazer comida mesmo que ainda não consigo, acabo comprando
comida pronta em restaurantes da vizinhança para jantar e Cecília
sempre leva o almoço para mim. O caminho para a pequena padaria
do bairro, passava pela casa dela, então tive uma ideia.
Bati na porta e aguardei até que o “pai” dela aparecesse.
— O que quer aqui? — Gritou com espanto assim que abriu a
porta. — Eu vou chamar a polícia! — Tentou fechar a porta, mas eu a
empurrei e abri de uma vez.
Observei o que aconteceu com seu rosto e sinto um enorme
prazer ao ver que ele mal consegue abrir os olhos e que está com
diversos hematomas, assim ele vai saber como é bom o que tem
feito com a própria filha.
— Não vim aqui para falar com você! Onde é o quarto da
Cecília? — Não me respondeu. — Vai querer que eu repita a
pergunta? — Me aproximei ameaçadoramente.
— Final do corredor. — Apontou a direção com o dedo
trêmulo.
Entrei no pequeno quarto, não há nada demais, nenhum luxo,
nem fotos, apenas a cama de solteiro, um pequeno guarda-roupas
antigo e uma mesa de cabeceira cheia de livros empilhados assim
como no chão em alguns lugares.
Me lembro de meu apartamento, o quarto de hóspedes é
maior que a casa inteira, o meu lavabo é maior que o quarto dela, e
eu reclamando da porra da minha vida, sem imaginar o que boa
parte do mundo passa dia após dia.
Peguei o primeiro lençol que vi pela frente e coloquei em cima
da cama e coloquei todas as roupas, que não são muitas, produtos
de higiene e outros pertences dela que estavam no quarto, amarrei o
lençol e joguei no ombro.
— O que pensa que está fazendo?
— Estou levando as coisas dela, Cecília não vai pôr mais os
pés nesta casa e você nunca mais a procure!
Voltei para casa e coloquei as coisas dela no sofá, em seguida
retomei o plano inicial e fui buscar algumas coisas para o nosso café
da manhã.
Quando cheguei fui até o quarto ver se ela já está acordada,
mas ainda não, ainda dorme como um anjo, um lindo anjo de
estatura diminuta e olhos grandes.
Me abaixei ao seu lado, ficando com o rosto a poucos
centímetros do seu, não pude evitar tocá-la, passei os dedos
suavemente por sua pele macia.
Cecília abriu os olhos sonolentos devagar olhando
diretamente para os meus.
— Bom dia bela adormecida, como está se sentindo? —
Perguntei quase em um sussurro.
— Bom dia, me sinto melhor.
— Fiz o café da manhã, vamos tomar?
Assentiu.
Demorei a perceber que ainda estava com a mão em seu
rosto, me levantei assim que dei conta disso.
— Espero por você na cozinha.
Saí do quarto e parei do lado de fora da porta esfregando meu
rosto com as mãos.
“O que é que está acontecendo comigo?”
Nunca me senti assim perto de mulher nenhuma, mas com
ela... é diferente.
Segurei as mãos na nuca por alguns instantes e depois fui
para cozinha esperar por ela.
— A hora está certa? — Entrou na cozinha com os olhos
arregalados. — Nós estamos mais do que atrasados!
Ergui a xícara de café e tomei um gole.
— Nós não vamos trabalhar, é por isso que não estamos
atrasados. — Sorri sentindo o gosto forte do café, está do jeito que
eu gosto. — Apenas um dia na vida não vai te matar e não vai matar
o seu querido “chefinho”, ele sobrevive.
— Não gosto de faltar. — Suspirou. — Mas acho que você
tem razão, não estou bem para ir hoje. Amanhã tem a reunião da
empresa e nem sei o que vou vestir.
Apontei para a caixa que Lucas deu para ela, conheço bem
aquele tipo de caixa, é um vestido, tenho certeza disso.
— Creio que alguém pensou nisso por você. — Senti minha
boca amargar por imaginar que ela vai junto com ele.
Cecília pegou a caixa de cima da bancada da cozinha e puxou
o tecido desfazendo o laço azul que a fechava.
Mesmo de longe pude ver o tecido vermelho brilhante que
estava lá dentro com um par de salto prateado.
“Se eu tivesse apostado, teria ganhado.”
Apertei o maxilar com força, ver o sorrisinho bobo dela para
aquilo me encheu de raiva, ela é mulher afinal, mesmo que diferente
das outras, que mulher não gosta de ser mimada?
O fato é que queria que tivesse sido eu a dar a ela um
presente para arrancar esse sorriso doce de seus lábios.
Pigarreio chamando sua atenção de volta para mim.
— Eu busquei algumas coisas para você.
— O quê? — Suas sobrancelhas se ergueram.
— Vamos tomar café primeiro, estava te esperando.
Fechou a caixa e veio até mim se sentando à mesa e servindo
sua xícara, me surpreendeu o quanto aquilo pareceu natural para
mim. Nunca dormi ao lado de mulher nenhuma, geralmente quando
estão na minha cama não é para dormir e jamais tomei café da
manhã com nenhuma, além da minha própria mãe, vou embora
antes que quem me acompanha acorde.
Capítulo 19
Edu ficou um pouco estranho depois que eu olhei a caixa,
seus olhos desviam dos meus o tempo inteiro.
— O que é isso? — Perguntei passando pelo sofá da sala.
Coçou a cabeça. — Busquei enquanto você dormia, não
quero que volte para aquela casa Ceci. Fique aqui, podemos dar um
jeito nas coisas.
“Está me chamando para morar com ele?”
— Não acho que...
— Você não volta para lá Cecília! Só por cima do meu
cadáver! — Começou a andar de um lado para o outro passando as
mãos pelos cabelos. — Por que você tem que ser tão teimosa?
— Eu só não quero incomodar Edu, você está acostumado a
viver sozinho e eu estou bagunçando a sua rotina e...
— Já chega Cecília! — Cortou a distância entre nós e me
segurou pelos braços prendendo os olhos aos meus. — Você vai
ficar aqui até que tenha outro lugar para ir, você não me incomoda
porque... — Respirou fundo como se as palavras seguintes o
fizessem sentir dor. — Porque eu me importo com você, entendeu?
Meu coração acelerou e seu rosto se aproximou mais do meu.
Mordi os lábios e vi seus olhos fitando minha boca, se
aproximou mais e mais e eu fechei os olhos, senti sua respiração
acelerada a milímetros e esperei, mas nada aconteceu, ele me soltou
de repente e virou as costas indo para o seu quarto sem olhar para
mim novamente.
Fiquei parada na sala, soltando o ar que eu nem percebi que
estava segurando, pensei que ele iria me beijar, mas o que me deixa
mais chocada é o quanto eu queria que ele tivesse beijado.
Enquanto ele estava fazendo, sei lá o que, no quarto, eu lavei
a louça do café da manhã e organizei tudo em seu devido lugar.
Por ser a casa de um homem solteiro, Edu até que é
organizado, mas a casa está com uma cor triste e apagada... tive
uma ideia.
Já que vamos morar juntos por algum tempo, vou comprar
tinta e vamos pintar a casa, dar um ar mais feliz.
Até que eu fizesse tudo ele ainda não tinha aparecido, deixei
um recado na geladeira avisando que voltaria logo e pesquisei o
depósito mais próximo para pegar as tintas.
“Ao menos será algo para distrair a minha cabeça”
Temos apenas três dias para pagar aquele homem, Edu diz
que vai pagar, mas como ele fará isso?
No caminho até o depósito, peguei o celular para informar
Lucas sobre o motivo da minha falta.
— Cecília? O que houve? — Seu tom de voz demonstra uma
certa preocupação. — Por que não veio hoje?
Mordi o interior da boca, não gosto de mentir, mas eu não
posso dizer o motivo real a ele. — Eu sinto muito, não me senti bem
quando acordei, agora já estou melhor, mas achei que devesse
descansar um pouco mais, espero não ter complicado muito seu dia.
— Não vou dizer que as coisas sem você ficam fáceis por
aqui, mas eu me viro, seu computador é muito bem-organizado, não
é difícil me encontrar.
Aposto que quando ele souber que Edu também não foi para
a empresa, vai acabar pensando alguma besteira, mas não quero
pensar muito sobre isso agora.
— Sinto muito pela falta. — Me desculpo sinceramente.
— Não se preocupe, isso nunca aconteceu, mas amanhã você
virá, não é? Posso ir te buscar a que horas? Vai começar às sete.
A minha vontade real era dizer que não iria, mas eu não
poderia fazer tamanha desfeita.
— Eu vou sim, claro, se quiser vir vinte minutos antes já
estarei pronta. — Limpei a garganta. — Muito obrigada pelo vestido e
a sandália, é tudo lindo, não precisava ter se incomodado.
— Estarei ao lado da mulher mais bonita daquele jantar, o
vestido é apenas um mero detalhe insignificante.
Meu rosto esquentou, provavelmente estou vermelha como
um farol.
— Nos vemos amanhã. — Finalizei a ligação.

Entrei com as latas de tinta e vi Eduardo parado no meio da


sala.
— O que pensa que está fazendo? — Perguntou irritado. —
Por que saiu de casa sozinha? E se um daqueles malucos te
encontram na rua? Me dê isso aqui. – Pegou as latas de tinta da
minha mão.
— Eu não fui muito longe e ainda temos mais dois dias, não
acho que viriam me procurar hoje.
— E para que são essas tintas?
Abri um sorriso sem jeito, eu não sabia se ele iria concordar,
eu apenas fiz, agora já foi, já comprei tudo, não tenho o que inventar.
— Comprei para pintarmos a casa, o que acha? Eu pensei
que já que vou ficar aqui por algum tempo, poderíamos deixar mais a
nossa cara. — Segurei o riso. — Tudo bem que você não é a pessoa
mais alegre e gentil do mundo, mas você também não é tão
incrivelmente frio e sem vida quanto essa casa.
Consegui arrancar um meio sorriso dele. — Tudo bem,
podemos começar pelo lado de fora, eu também sinto arrepios
quando vejo as paredes dessa casa.
— Então já podemos começar! — Anunciei contente por ele
ter concordado.
Capítulo 20
Quase a beijei, foi por pouco, e eu queria beijá-la, sentir o
sabor de seus lábios tem se tornado quase uma obsessão, cada vez
que eu chego perto sinto um desejo intenso de fazê-la minha, preciso
me esforçar muito para não deixar que esse desejo tome conta de
mim.
Praticamente fugi dela, antes que acabasse fazendo uma
loucura, Cecília está chegando perto, muito perto e isso está me
deixando apavorado... não gosto disso, não gosto da ideia do amor,
é tolice, é uma forma de ser enganado, uma maneira de ser traído,
não vou deixar que entre, não confio o bastante em ninguém para
isso.
Com Cecília me sinto bem, confortável e atraído de uma
maneira que ainda não havia sentido. Ela é simples, é sincera,
espontânea, não fica fazendo jogos para me atrair para si, é natural,
é bom... mas eu não posso sentir.
Em breve volto para a minha vida, para minha casa, para
meus velhos hábitos, Cecília e tudo o que eu vivi aqui ficará no
passado.
Ela também quer, sei que sim, ela fechou os olhos e aguardou
em expectativa, e eu a deixei esperando, fugi para o quarto como um
covarde.
Aproveitei que estava só para ligar para Paula, precisava
saber se ela poderia transferir o dinheiro para a conta com urgência,
mas não poderia ser a minha, teria que ser para a do Lucas, minha
mãe bloquearia qualquer coisa suspeita.
— Edu?
— Sim, preciso falar com você, pode ser agora? Ou te ligo
mais tarde? — Não quero que tenha alguém com ela e sei o quanto
é ocupada.
— Posso falar sim, é só que fiquei um pouco surpresa com
sua ligação.
Não sei como entrar nesse assunto, então resolvo que uma
abordagem direta é a melhor.
— Paula, eu preciso de um favor, e acredite eu não ligaria se
não fosse urgente.
— Fala Edu, está me deixando preocupada!
— Preciso que me mande cem mil, mas não na minha conta.
Ela ficou muda, mas sei que está na linha, ainda ouço sua
respiração.
— Vou querer saber o motivo de estar me pedindo isso?
Não sei o que dizer a ela, não tenho uma desculpa plausível e
não quero que ela saiba da existência de Cecília.
Pensando bem, tem algo que qualquer um acreditaria.
— Me envolvi com algumas pessoas erradas, nada demais,
fiquei devendo uma grana, mas não são o tipo de pessoas que eu
quero ficar devendo, entendeu? Se puder me enviar vinte mil a mais
te agradeço.
Não sei se aquele homem vai honrar a palavra dele, ao menor
sinal de perigo terei como mandar Cecília para longe daqui, para
algum lugar seguro.
— Sua mãe vai me matar se souber que te emprestei esse
dinheiro, mas tudo bem, eu posso emprestar sim, mas eu te
entregarei em mãos, não vou mandar para conta de ninguém, quero
falar com você pessoalmente.
Droga!
— Paula...
— É minha única condição. Irei até aí, para quando você
precisa?
— O mais rápido possível, tenho apenas dois dias.
— Vou no domingo, amanhã ainda tenho assuntos a tratar, se
sua mãe ficar sabendo que eu fui até aí, pode desconfiar... bem você
sabe, conhece sua mãe.
Suspirei. — Tudo bem. — Não tenho muita escolha. — Não se
atrase, preciso disso até a noite.
— Nos vemos no domingo, não se preocupe.
Desliguei e fiquei no quarto encarando o teto.
— O que está acontecendo comigo? Desde quando eu me
importo tanto?
Fechei os olhos e tentei me convencer de que estava perto
dela apenas para forçar Lucas me ajudar a ir embora.
Passado algum tempo, percebi que estava tudo muito quieto e
me levantei.
Cecília não estava em casa, deixou um recado na geladeira
avisando que saiu, mas que não demoraria.
“MAS O QUE PORRA ELA PENSA QUE ESTÁ FAZENDO?”
Como é que uma pessoa que quase foi sequestrada sai de
casa assim, como se nada tivesse acontecido?
Comecei a ficar agoniado pensando que poderia ter
acontecido algo com Cecília, quando a porta se abre e ela aparece
com latas de tintas nas mãos.
Precisei respirar fundo e contar até dez para não arrancar o
couro dela.
— Ainda está bravo comigo? — Perguntou com biquinho
enquanto estávamos pintando a lateral da casa. — Eu não pensei
que você ficaria tão irritado.
— Não estou bravo, estou me perguntando como é que você
sobreviveu até hoje? Você não tem senso, não tem noção do perigo.
— Suspirei. — Você não deve sair por aí sozinha Ceci.
— Estive sozinha a minha vida inteira Edu, eu não sei fazer
diferente disso...
Não imaginei que aquelas palavras iriam ferir tão fundo minha
alma, olho para ela mais uma vez, parando de passar o pincel nos
cantos da parede.
Me acostumei com a minha solidão, não me importo de estar
sozinho e até gosto disso, mas ela? Cecília não parece ser alguém
que deveria estar só e a maneira como ela falou, com uma tristeza
profunda, uma ferida que ainda não cicatrizou, me incomoda que ela
precise ser forte mesmo parecendo tão frágil.
— O que foi? Você está me encarando de um jeito estranho.
— Deu um sorrisinho.
Não tinha percebido. — Desculpa, não é nada demais. — Não
posso me aproximar assim, em breve não estarei mais aqui.
Voltamos a nos concentrar na pintura, rimos e brincamos, ela
pintou meu rosto e eu o dela até chegar o horário do almoço.
— Vamos entrar, já estou começando a sentir fome. —
Comentou.
— Eu também.
— Mas hoje você vai aprender a cozinhar! Vem fazer a comida
comigo.
Eu não imaginei que fazer o almoço pudesse ser tão divertido
e o riso contagiante dela deixa tudo melhor.
E Ceci me ensinou mais uma coisa. — Pronto, agora você
pode fazer o básico para não morrer. — Disse sorrindo enquanto
colocava um garfo de carne assada com fritas na boca. — O tempero
está maravilhoso, meus parabéns.
— Você me ajudou em cada detalhe.
— Eu apenas auxiliei, você fez tudo sozinho.

No sábado fizemos tudo novamente, tomamos café da manhã


juntos, conversamos sobre a empresa, finalizamos a parte exterior
da casa e eu orgulhosamente fiz o almoço novamente, mas dessa
vez pedi que ela não me ajudasse e segui uma receita da internet.
— Isso está maravilhoso, em outra vida você com certeza foi
um grande chefe!
Tudo é tão simples e natural com ela.
Quando a noite começou a se aproximar, Cecília foi tomar
banho e levou a maldita caixa para o quarto e foi quando me lembrei
do jantar e a segui.
— Você vai? — Perguntei sentindo a raiva borbulhando dentro
de mim.
— Você não vai? — Neguei. — Eu vou, liguei para Lucas
ontem e confirmei, não posso fazer desfeita depois de ele ter
mandado tudo isso e...
Não consegui mais ficar e ouvir o que estava dizendo, virei as
costas sem deixar que ela prosseguisse e fui para a sala.
Uma hora se passou e Cecília ainda não tinha saído do
quarto, comecei a ficar preocupado, fiquei alguns minutos parado na
frente da porta até criar coragem para bater.
— Entre.
— Está tudo bem?
— Te faço a mesma pergunta, você saiu sem dizer nada.
Olhei para seu corpo precisando de toda a minha
concentração para voltar a respirar, não gosto de Lucas, mas uma
coisa é certa, ele tem bom gosto para vestido.
O vermelho se destacou e a vestiu como uma segunda pele,
marcando suas belas curvas exatamente nos pontos certos
O decote leve deixando apenas um vislumbre de seus seios
fartos.
Tentei encontrar minha voz, pigarreei e continuei. — Eu só...
— Pode me ajudar a fechar o zíper? Não estou conseguindo.
Ela se virou de costas para mim, me chocando ainda mais
com a visão de sua bunda, travei as pernas sentindo meu pau
respondendo ao estímulo visual que recebi.
Me aproximo e puxo seus cabelos para o lado, passando os
dedos suavemente por sua pele e observo enquanto ela se arrepia.
Sua respiração ficou acelerada, ela também sente isso.
Fecho o zíper e acaricio seu pescoço, inalando o perfume
doce de baunilha que exala dela.
Cecília se virou de frente para mim, seus olhos se afundaram
nos meus queimando de desejo, sua respiração pesada fazendo
seus seios subirem e descerem de maneira sensual.
— Você está linda Cecília. — Não pude deixar de falar.
Passei a mão por seu braço, chegando até a pequena alça do
vestido colocando-a no lugar em seus ombros.
— O que está acontecendo entre nós Edu? — Seus olhos
grandes e esperançosos me tirou dos eixos.
Sua pergunta me pegou desprevenido, e me dei conta do
quão íntimo aquilo tudo estava parecendo.
Voltei a mim. — Não está acontecendo nada, estou apenas
dizendo o quanto está linda... — Me afastei e o celular dela tocou.
— Estou indo. — Respondeu assim que desligou olhou para
mim. — Lucas chegou, nos vemos mais tarde, uma pena que você
não vá. — Os olhos dela estão marejados.
— Ceci...
Passou rapidamente por mim sem me olhar novamente. —
Boa noite Edu.
Ela ficou chateada.
Capítulo 21
Saí da casa me sentindo uma idiota, eu não sei o que está
acontecendo, mas sei que há algo mais entre nós do que apenas
uma mera amizade, mas perguntar a ele me fez parecer uma tola.
Caminhei apressada até a frente da minha casa, onde Lucas
está com o carro estacionado no meio fio.
Seu olhar escureceu quando viu de que direção estou vindo.
— Por que estava na casa dele? — Seu tom de voz foi
grosseiro, muito diferente do que estava na ligação.
— Meu chuveiro queimou. — Menti mordendo o canto interior
da boca. — Precisei ir tomar um banho.
Meu rosto queimou, sei que estou vermelha, mas não posso
contar a verdade.
Lucas ergueu as sobrancelhas, mas não fez nenhum
comentário. — Vamos, estamos em cima da hora.
Abriu a porta para mim e fomos para a empresa.
O caminho foi silencioso, ele não puxou assunto como
costuma fazer, ficou calado olhando fixamente para frente, o corpo
tenso e os dedos apertados no volante que fez seus tendões ficarem
brancos.
Na entrada, ele me ajudou a descer, entregou o carro na mão
do manobrista e estendeu o braço para mim.
— Estamos apenas alguns minutos atrasados. — Limpou a
garganta. — Você está linda Cecília.
— Obrigada. — Baixei o olhar envergonhada.
Há muitos rostos conhecidos, de muitos funcionários da
empresa, mas também estão presentes alguns sócios e boa parte da
diretoria, aqueles que nós raramente vemos por aqui.
— Está tudo tão bonito. — Olhei em volta para a decoração e
as pessoas, todos elegantes com suas melhores roupas.
— É uma data importante para a empresa e eu faço questão
de que todo ano seja comemorado, não sei por que você nunca veio,
já que é uma parte importante na empresa.
Sorri sinceramente. — Para ser honesta, na verdade eu não
sei, parece muito divertida.
— Vou buscar uma bebida para nós, um momento.
Notei o olhar de muitas pessoas em minha direção, em alguns
momentos até olhei para a roupa para ver se tinha algo errado.
Fiquei tão incomodada que fui obrigada a perguntar para
Lucas. — Tem alguma coisa no meu vestido?
Lucas deu risada balançando a cabeça. — É sério que não
consegue perceber o que há?
Meu coração disparou. — Não... não sei... por que não me
avisou que tinha algo errado? Eu...
Seu rosto assumiu uma expressão séria. — Porque não há
nada de errado com você Cecília, muito pelo contrário, está tão bela
que a maioria dos olhos aqui não conseguem desviar a atenção de
você, alguns de cobiça, algumas de inveja ou surpresa. Por que você
pensa tanto sempre no pior?
Não tinha reposta para aquilo, faz parte de mim, sempre
espero o pior.
Durante as duas horas seguintes que ficamos ali, Lucas era
chamado por diversas pessoas, parabenizado por seu excelente
trabalho durante mais aquele ano, e com toda a educação do mundo
ele me guiou e apresentou a todos.
— Tenho que ir até sua sala mais vezes, deve ser maravilhoso
ver a bela Cecília todos os dias. — Um dos sócios que nunca
aparece comentou.
Me sinto desconfortável com tanta atenção voltada para mim.
— Me deem licença. — Pedi educadamente para ir até o bar,
já estava sonhando em ir embora e os poucos drinks que tomei
começaram a me dar sono.
Quase como se sentisse sua presença, meus olhos correram
para a entrada e vi quando Edu chegou com Grazi, a moça da
recepção que sempre sorri para ele e me fuzila com os olhos.
Os dois também estão muito bem-vestidos e Eduardo está
maravilhoso com roupa social. Seus olhos encontraram os meus, eu
sorri, mas Edu não retribuiu.
— Está tudo bem? — Não vi Lucas chegar.
— Tudo sim. — Respondo desviando o olhar de Eduardo. —
Estou com sono, acho que bebi um pouco mais do que deveria, não
estou acostumada. — Beberiquei o drink que havia pedido no bar.
— E continua bebendo? — O olhar brincalhão de Lucas me
fez sorrir.
Não quis dizer, mas aquela era a primeira vez que eu ia a
algum lugar para me divertir.
Senti o olhar de Edu me queimar durante algum tempo antes
que se aproximasse de nós.
— Como está a noite de vocês? — Eduardo perguntou sem
tirar os olhos dos meus.
Lucas foi quem respondeu primeiro.
— Está muito agradável Eduardo. — Pelo canto dos olhos vi
ele olhar para Grazi que estava ao lado de Eduardo. — Como vai
senhorita? Espero que esteja gostando da festa. — Muito educado
como sempre.
— Está maravilhosa Sr. Jones, obrigada por mais uma vez
fazer algo assim para os funcionários. — A acompanhante de Edu
respondeu no mesmo tom educado.
— Divirtam-se. — Se virou para mim estendendo o braço. —
Vamos dançar um pouco Cecília?
Desviei do olhar de Edu e peguei o braço estendido de Lucas,
mas antes de nos afastar, senti a mão de Eduardo um pouco acima
do meu pulso.
Olhei para meu braço em seguida para ele.
— Posso falar com você por um momento? — Seu rosto
estava sério.
— Precisa ser agora? Cecília e eu estamos tentando
aproveitar a noite. — Lucas o encarou com raiva.
— Eu não estou falando com você! — Edu chegou mais perto
e os dois se encararam a uma curta distância, seus corpos
separados apenas por mim que acabei ficando entre os dois.
— Edu deixe os dois irem dançar, por que não fazemos o
mesmo? — A voz manhosa de Grazi foi ouvida, mas completamente
ignorada por ele.
— Eduardo... — A voz de Lucas em tom de alerta. — Chega
disso.
Edu me puxou e eu me deixei ser levada.
— Cecília...
Tentei responder, mas Edu me impediu me arrastando para
longe de Lucas.
— Mais devagar, não consigo andar tão rápido com esses
saltos! — Reclamei, enquanto ele me leva para um canto mais
afastado, uma sala de reunião vazia.
Me soltou assim que notou que estávamos a sós, não disse
nada, apenas ficou com as duas mãos na cabeça respirando
pesadamente.
Esperei um pouco para ver se ele diria algo, mas nada
aconteceu, então decidi perguntar.
— O que quer falar comigo? Estamos aqui.
Capítulo 22
Não consegui ficar em casa pensando no que poderia
acontecer entre ela e Lucas, aproveitei que Grazi tinha me convidado
para ir até a maldita festa e ver a proximidade dos dois só serviu
para fazer meu sangue ferver.
Agora Cecília quer uma explicação e eu não sei o que dizer.
— Podemos ir para casa? Lá nós conversamos melhor.
— Conversamos sobre o que? — A voz dela já parecia estar
ficando irritada. — Quer saber? Eu cansei de ficar aqui, Lucas deve
estar me procurando.
Ela ia sair, mas a peguei pelo braço mais uma vez.
— Não vai para lá com ele Cecília!
— Me dê uma boa razão para eu não ir Eduardo!
Ela está me encarando de perto com a cabeça erguida, seu
rosto está vermelho de raiva.
— Ele tem segundas intenções com você Cecília, você...
— Ótimo! Ao menos ele demonstra o que quer e tenta! Ele
não se esconde atrás de uma amizade para fugir do que sente. —
Aumentou a voz e apontou o dedo para mim. — É bom me sentir
desejada, e como você mesmo disse Edu, somos amigos, então por
favor não interfira nisso! — Me deu as costas.
A raiva borbulhou dentro de mim.
— Você não vai!
A puxei de volta para mim, mas dessa vez seu corpo se colou
ao meu, seus olhos grandes e nervosos me encarando
profundamente.
— Me dê um motivo para não ir... — Disse devagar.
Cecília lambeu os lábios e aquele foi o fim de todo o meu
autocontrole.
Tomei sua boca para mim, em um beijo urgente, repleto da
minha necessidade e foi melhor do que eu vinha imaginando nas
últimas semanas, tão doce e inebriante, sei bem que com a
proximidade que estávamos eu iria perder a cabeça a qualquer
momento.
Cecília correspondeu com igual intensidade, minha língua
invadiu sua boca, explorando cada canto.
A empurrei contra a parede, fazendo seu corpo se encaixar
com o meu, como a peça perfeita que faltava.
Minhas mãos passearam por seu corpo, precisando de mais
contato, necessitando de mais dela, mais daquela conexão que ia
além do que eu já tive na vida.
— Vamos sair daqui...
Sussurrei na boca dela.
— Mas a festa. — Sua voz está carregada de desejo.
— Foda-se essa maldita festa Cecília, eu preciso de você!
Ela assentiu e eu precisava apenas daquilo para arrancar ela
daquele lugar.
Peguei o primeiro táxi que passou e fomos direto para casa.
Entrei em casa já tomando posse de sua boca, explorando,
mordendo, lambendo e absorvendo seus doces gemidos.
Subo uma de suas coxas, passando sua perna pela fenda do
vestido que me enlouqueceu assim que o vi naquele corpo
pecaminoso, e aperto com força sua bunda, mas nossa diferença de
altura atrapalha um pouco, então a encosto na parede ao lado da
porta, fazendo o vestido subir até onde iniciava a fenda e deixando
sua calcinha exposta, passei suas pernas em torno de minha cintura
roçando meu pau na fonte de meu desejo.
Preciso estar dentro dela, preciso me afundar em Cecília e
esquecer que o resto do mundo existe, se eu não a tiver agora
mesmo vou enlouquecer.
Beijei seu pescoço, mas a mulher que a pouco estava
pegando fogo começou a se retrair, seu corpo ficou tenso de repente.
— Algum problema? — Afastei o rosto do dela. — Você está
bem?
Ela engoliu seco. — Pode me colocar no chão, por favor? —
Ela fugiu do meu olhar e eu a coloquei no chão.
— Cecília? Estou começando a ficar preocupado. — Ela
colocou as duas mãos na cabeça e evitou olhar para mim. —
Cecília? — Ergui seu rosto. — O que está acontecendo?
Deu um suspiro fundo. — É que eu... — Olhei atentamente. —
Eu sou... eu não tenho ideia do que estou fazendo.
Estreitei os olhos. — Não tem ideia do que? — Não pode ser
disso que ela está falando, eu devo estar ficando louco.
— Eu sou...
— Você é virgem? — Pergunto incrédulo.
— Você diz como se isso fosse uma ofensa. — Baixou o olhar
envergonhado para o chão e mordeu o interior da boca.
Ergui seu rosto pelo queixo e encontrei seu olhar aflito.
— Isso não é uma ofensa, não foi isso que eu quis dizer, mas
é algo especial, que você deve fazer com alguém especial. — Senti
um nó na garganta só de imaginar Cecília em outros braços. — E
você tem que ter certeza...
— Eu tenho certeza. — Me interrompeu. — Você é a minha
pessoa especial Edu.
O impacto de suas palavras surtiu um efeito dentro do meu
peito que foi bom experimentar pela primeira vez, mas ao mesmo
tempo preocupante.
Sacudi a cabeça para afastar qualquer pensamento sobre isso
no momento e me concentrei no que ela quer.
— Tem mesmo certeza disso?
— Sim! Nunca estive tão certa quanto a nada em minha vida.
— Me olhou decidida.
Choquei meu corpo contra o dela mais uma vez, tomando
seus lábios viciantes novamente, mas dessa vez com menos
intensidade, quero fazer com que ela tenha uma noite memorável, a
melhor de sua vida.
Passei suas pernas em torno de mim mais uma vez, mas
agora para carregá-la até o quarto.
Deitei Cecília na cama e olhei em seus olhos.
— Vai obedecer a tudo que eu disser? — Assentiu. — Muito
bem, então toque-se.
Seu rosto assumiu um tom de vermelho intenso. — Tenho
vergonha.
— Você não precisa ter vergonha de mim, quero que esteja
completamente pronta. — Me aproximei, fazendo-a abrir as pernas,
ergui seu vestido peguei sua mão e levei até o interior de suas
coxas, afastando a calcinha do caminho e esfregando sua mão ali e
observando seu rosto. — Continue.
Me afastei e observei enquanto ela se dá prazer, me
torturando ainda mais como o perfeito masoquista que sou.
Meu pau já está latejando e beirando a dor debaixo daquela
calça, e a visão de Cecília se tocando está quase me deixando
louco.
Sua boca está entreaberta gemendo e seus olhos focados em
mim, me chamando, implorando para que eu vá até ela.
— Está molhada?
— Sim. — Exclamou com gemido mal contido.
Fui até ela, peguei sua mão e coloquei em minha boca,
experimentando do seu gosto.
Seus olhos se arregalaram e eu sorri. — Você tem um sabor
extremamente maravilhoso. — Lambi mais uma vez. — Continue.
— Não... — Choramingou.
— O que quer?
— Não tenho coragem de dizer.
— Quer que eu faça por você? Quer que eu te faça gozar, é
isso?
— Edu...
— É só pedir Ceci, e te dou tudo o que quiser. Peça.
— Por favor... por favor me faça gozar.
Sorrio para ela e a ajudo a se livrar do vestido, depois me livro
da calça que já me incomoda e me deito ao seu lado na cama,
virando-a de costas para mim fazendo sua bunda maravilhosa
encostar no meu pau.
Puxei sua perna nua para cima da minha coxa e coloquei a
mão em sua carne úmida. — Você está muito excitada. — Beijei seu
pescoço e acariciei seu clitóris, fazendo-a gemer e se contorcer de
prazer
— Edu... — Sua voz doce gemendo meu nome está me
perturbando.
— Você não tem noção do que tem feito comigo Cecília. Do
quanto está me deixando quase louco para possuir você.
Ela se remexe, se esfregando em meu pau, o atrito me faz
quase rosnar de desejo.
Massageio seu clitóris com o indicador, enquanto esfrego o
dedo médio em sua entrada molhada.
Ela tenta fechar as pernas, mas a impeço com o cotovelo que
está apoiado em sua coxa. — Quietinha Cecília... apenas sinta.
Capítulo 23
A voz de Eduardo aquece cada centímetro do meu corpo e
sua mão me acariciando dessa forma me deixa a ponto de explodir
de tesão.
Rebolo em sua mão, completamente perdida, sem pensar
onde havia ido parar meu pudor, eu só o quero, preciso de mais e
sentir ele tão grande e rígido em minha bunda me deixa ainda mais
ensandecida.
Sinto algo se formando em meu ventre e começo a gemer
ainda mais alto, sem conseguir me controlar.
— Edu... — Meu gemido é seguido da tentativa de fechar as
pernas novamente, mas ele me segura e aumenta os movimentos de
seus dedos.
— Você vai gozar, Cecília.
Com a mão livre, puxou meu rosto para ele e capturou meus
lábios em um beijo profundo e finalmente senti, meu corpo
estremeceu e um prazer absurdo e absoluto tomou conta de mim.
Gemi seu nome por diversas vezes, me esquecendo
completamente da vergonha, fui até o céu, Edu foi diminuindo o ritmo
até eu voltar aos poucos a nossa órbita.
— Nada em toda a minha vida foi tão sexy quanto te ver
gozar, Cecília. — Seus olhos mergulharam profundamente nos
meus. — Agora eu quero que você repita tudo isso na minha boca
enquanto eu te como com a língua.
Arregalei os olhos e ele deu um sorriso safado.
— Mas...
— Shiiii... nada de “mas”, você disse que me obedeceria.
Se levantou e foi até o meio das minhas pernas, pensei em
protestar, mas seu olhar me calou, ficou de bruços com a cabeça
próxima a mim.
Meu corpo ficou tenso, até sentir sua língua passando por
minha carne quente e foi impossível não me contrair e gemer.
— Você é ainda mais gostosa assim. — Chupou meu clitóris
me arrancando um gemido ainda mais alto jogando a cabeça para
trás. — Olhe para mim, quero te ver enquanto meto minha língua
muito fundo em você.
A mistura de sensações que é ele falando aquelas coisas
sacanas, somado ao que estava fazendo me deixou com o corpo
inteiro ardendo de desejo, nem que eu quisesse eu conseguiria
parar.
Eduardo me chupa, lambe, coloca a língua dentro de mim e
eu sinto que estou cada vez mais perto do ápice novamente.
Sinto seus dedos em mim e meu corpo enrijece.
— Relaxa Cecília, relaxa. — Ele diz e volta a me chupar,
escorrega um dedo para dentro de mim aos poucos e um grito de
puro prazer escapa, ele começa a movimentar devagar, indo e vindo
num ritmo agradável.
Empurro meu quadril na direção dele, completamente louca
de desejo e prazer.
— Edu, por favor. — Seus olhos estão em mim.
— Peça-me o que quiser, Ceci. — Empurra mais um dedo
para dentro de mim.
— Céus. — Exclamo sentindo a invasão maior.
— Preciso estar dentro de você Cecília, eu não aguento mais
esperar, sinto que vou enlouquecer se não estiver enterrado na sua
boceta agora mesmo.
Olho para ele com a respiração acelerada.
— E eu quero ter você dentro de mim, Edu. — Respondo.
Se põe de pé e pega um preservativo.
— Tem certeza disso?
— Nem que eu quisesse eu conseguiria parar, eu preciso de
você, Eduardo!
Fechou os olhos respirando pesadamente.
— Não pode dizer essas coisas para mim, Cecília.
— É a verdade. Te quero desde o dia em que coloquei os
olhos em você. — Edu fechou os olhos com força, como se minhas
palavras o ferissem e quando os abriu estavam repletos de luxúria.
Caminhou de volta para a cama desenrolando a camisinha em
sua extensão, engoli seco quando olhei o tamanho e Edu sorriu.
— Não precisa se preocupar, ele cabe sim. — Seus dedos
acariciaram meu rosto. — Você é tão linda... — Sua voz rouca me
arrepiou. — Eu vou fazer isso com toda a calma e cuidado que
puder, mas não posso te prometer que não vai doer.
Assenti e mordi os lábios.
— Tudo bem.
Ele colocou o dedo na minha boca.
— Não imagina o tesão que me dá toda vez que morde o lábio
assim.
Edu me chupou novamente, me deixando molhada e
desejosa. Posicionou a glande e empurrou lentamente para dentro
de mim, parando para deixar que me acostumasse com a invasão.
— Tudo bem? — Respirei fundo. — Não minta! Quer parar?
— Não. — Quase gritei e senti meu rosto esquentar quando
ele me olhou sorrindo.
— Como está se sentindo?
— Já foi tudo?
Negou.
— Metade.
— É estranho, incômodo, mas gostoso... não sei explicar.
— Vou empurrar o que falta, vai doer um pouco, mas logo
passa.
Fiquei tensa e Edu empurrou tudo de uma vez, a dor fez meus
olhos encherem de lágrimas e me agarrei a ele, cravando as unhas
em suas costas.
Ele ficou parado por um tempo, me beijando, beijando meu
pescoço e quando eu relaxei começou a se mover lentamente.
Capítulo 24
Estou precisando de toda a minha força para me conter, o que
vai completamente ao contrário do que meu corpo implora.
Impulsiono para dentro, um choque de prazer me atinge e a
culpa me toma. Sinto um aperto estranho no peito quando vejo seus
olhos marejados.
— Está doendo muito?
Acena com a cabeça.
— Aos poucos vai melhorar, a dor é apenas inicial.
Volto a beijá-la para que relaxe, a boca, o pescoço, os seios,
acariciando tudo o que minha boca pode alcançar enquanto me
movimento lentamente.
A tensão do meu corpo está quase me matando com a
vontade de fodê-la com força, mas me contenho para não machucá-
la ainda mais, não quero que ela tenha uma má recordação desse
momento, quero que seja único, que ela nunca mais se esqueça.
Quando ela está finalmente gemendo de prazer com os
pequenos movimentos que estou fazendo, saio e volto metendo nela
profundamente.
Um gemido alto escapa de sua boca entreaberta, seguido por
outro e mais um, enquanto aumento o ritmo.
Passo minha mão entre nós para alcançar seu clitóris e fazê-
la relaxar ainda mais, faço movimentos circulares e a vejo perder o
controle, projetando o quadril para mim, buscando por mais do que
estou lhe dando.
— Edu... mais, por favor, mais...
— Porra! — Rosno me movendo mais rápido, forte e profundo
para dentro e fora dela.
Sua boceta me recebe, apertando meu pau e me dando ainda
mais tesão, nada que eu já tenha vivido se compara a estar dentro
de Cecília, é meu céu particular.
Estou completamente alucinado, sentindo necessidade de
marcá-la para sempre como minha, um pensamento invade minha
mente “vou embora e darei espaço para alguém entrar em sua vida e
em sua cama” balanço a cabeça tentando afastar aquilo, tentando
não pensar, mas a verdade é essa, a estou tomando para mim por
puro egoísmo, porque sei que não poderei mantê-la em minha vida,
sei que Cecília merece alguém muito melhor do que eu.
Cada vez que sinto meu pau no fundo dela, sei que estou me
viciando e fico me lembrando de que não posso fazer isso, mas o
problema de um vício, é que não temos controle sobre eles.
Os gemidos de Cecília preenchem todo o quarto, é como
música para os meus ouvidos, aumentando meu prazer a um nível
quase inumano.
Aumento meus movimentos para apagar qualquer coisa que
queira se infiltrar em minha mente além dela, sinto sua boceta se
contrair ao redor do meu pau, ela está quase lá.
Meu corpo se contrai avisando que eu também estou
alcançando o meu alívio.
— Porra, como você é gostosa! — Cecília é tão apertada que
eu não sei como estou conseguindo aguentar.
Saio de dentro dela antes de gozar porque a quero de quatro,
tenho medo de que possa perder o controle e a machucar.
— Fica de quatro Cecília, eu preciso ver meu pau entrando
em você! — Minha voz está quase irreconhecível.
Ela faz o que peço.
— Me avise se incomodar ou machucar, por favor.
— Sim...
Seu gemido de prazer escapa quando volto a penetrá-la, mas
dessa vez não há tanta delicadeza, é impossível.
Cecília geme meu nome o que me dá ainda mais tesão e
enterro nela rápido e forte, sua bunda batendo contra mim é uma
visão impressionante e suas reações me enlouquecem ainda mais,
alimentando o vício crescente.
Finalmente chego ao limite e ela também, aperto sua bunda
puxando-a ainda mais para mim.
— Goza, Cecília! — Ordeno.
Um som quase animalesco escapa da minha garganta quando
sinto que me derramo dentro dela e seus gemidos enquanto goza
prolongam ainda mais o meu prazer.
Saio de dentro dela devagar e a viro para mim.
— Você está bem? — Pergunto, quase sem fôlego.
Sua respiração está descontrolada, ela luta para encontrar as
palavras para responder e vejo o exato momento em que desiste e
apenas balança a cabeça.
Vou até o banheiro para pegar uma toalha úmida e meu
espanto é gigante quando vou tirar o preservativo.
“Não! Caralho!”
A camisinha estourou, tento controlar minha pulsação,
resolvemos isso amanhã, meu coração está palpitando com a
preocupação, mas sei que agora ela não está em condições de
pensar em mais nada.
Volto para ela que ainda está da mesma maneira que a deixei,
mas parece um pouco mais calma.
Abro suas pernas e passo a toalha levemente, seu corpo se
contrai e vejo ali o sangue, a prova de que acabei de roubar sua
inocência.
Me deito a seu lado e sem mais nenhuma palavra apenas a
puxo para meu peito, abraçando-a como se o resto do mundo não
existisse.
Ela adormece e eu fico ali, sentindo seu cheiro enquanto uma
enxurrada de pensamentos invade a minha cabeça.

Vi os primeiros raios da manhã passarem pela janela, Cecília


ainda dorme exausta e não parece que vai acordar tão cedo.
Passo os dedos suavemente por seu rosto, e um sorriso se
espalha por meus lábios sem que eu me dê conta.
“O que será de nós depois disso?”
É uma questão que não deixa de martelar meu juízo, sei que
eu não posso levá-la comigo, ela jamais aceitaria a vida que levo, e
nem merece isso também.
Jogo o pensamento de lado e me levanto devagar, não quero
que ela acorde antes de estar recuperada da nossa noite.
Tomo banho antes de ir para a cozinha fazer o nosso café da
manhã, fico parado por muito tempo tentando decidir se eu levo para
ela na cama ou se espero que acorde para vir para a mesa.
No final das contas decido levar, Cecília deve estar cansada e
dolorida, não me custa nada fazer isso por ela.
Nunca havia feito isso por alguém, Cecília é a primeira, mas
isso não me incomoda, eu quero fazer o que for possível para vê-la
bem, ainda mais por saber que não terei tanto tempo para fazer isso.
Peguei a bandeja e fui em direção ao quarto, mas escutei uma
batida na porta da sala.
— Paula? — Não consegui esconder meu espanto. — Como
me encontrou?
Seus olhos passearam por meu abdômen nu.
— Não vai me convidar para entrar, Edu? — Ergueu uma
sobrancelha olhando para a bandeja de café que eu ainda tinha em
minhas mãos.
— É claro, entra... é só que eu não sabia que conhecia meu
endereço. — Dei passagem. — Pensei que me ligaria para nos
encontrarmos em algum lugar.
Paula olhou ao redor com aquele ar soberbo de sempre.
— Peguei o endereço com Sr. Jones. — Olhou mais uma vez
para a bandeja, você vai tomar café? — Me perguntou.
— Eu já volto. — Disse ignorando a pergunta.
Peguei a bandeja e fui para o quarto, assim que abri a porta
Cecília se moveu.
— Bom dia! — Abriu um lindo sorriso. — Acho que dormi um
pouco demais.
Passei a mão no seu rosto e mostrei a bandeja. — Fiz seu
café da manhã. Coma, você deve estar com fome, e volte a dormir,
hoje é domingo, não precisa se levantar tão cedo.
— Temos que pintar a casa. — Seu olhar mudou. — E hoje
aqueles homens...
— Não se preocupe com isso, já estou dando um jeito em
tudo. — Aproveite seu café da manhã. — Não consegui me manter
longe dela, dei um beijo leve em seus lábios doces e sorri. — Volto
já.
Eu não sei por que, mas não quero que Cecília veja Paula.
Capítulo 25
Meu corpo inteiro sente o que fizemos na noite passada,
mesmo que Edu tenha tomado muito cuidado, ainda estou dolorida e
muito cansada.
Quando ele entrou me trazendo uma bandeja de café, meu
coração acelerou, batendo tão rápido quanto as asas de um beija-
flor.
“Essa deve ser a sensação de ser cuidada por alguém.”
Olhei para a bandeja, mas não quis ficar sozinha, fui para o
banheiro tomar um banho rápido e ir para cozinha ficar com Eduardo,
mas no sofá da sala estava sentada uma mulher, muito bonita e
elegante. Seus olhos caíram sobre mim como se visse um inseto.
— Bom dia. — Consegui dizer, sentindo meu rosto esquentar.
— Edu eu não sabia que tinha alguém aqui, poderia ter avisado, não
quero parecer mal-educada.
Estendi a mão para ela, mas a bruxa apenas a olhou como se
fosse uma doença.
Eduardo olhou para ela com a cara fechada.
— Paula... — Edu falou entre dentes, com os punhos
cerrados.
— Quem é essa, Edu? — Me mediu.
Estava vestida apenas com a camisa de Edu, o que me fez
sentir que estava nua pela maneira que ela me olhou.
— Cecília, essa é Paula, uma velha amiga. — Pontuou.
Ignorei a mulher que continuava me olhando feio.
— Vim para tomar café da manhã, não imaginei que estaria
ocupado. — Olhei para Paula novamente, sentindo uma palpitação
no peito.
Mordi o interior da boca, a mulher é linda e eu não sou idiota,
a maneira que reagiu mostra que ela tem interesse nele.
— Não estou ocupado, podemos ir tomar café juntos. — Edu
sorri para mim e Paula nos observa atentamente. — Aceita Paula?
— Eu já tomei meu café. — Respondeu franzindo o cenho.
— Não sabe o que está perdendo, o café do Edu é muito
melhor do que o meu. — Sei que eu não deveria, mas estou
incomodada com a presença dela aqui.
Ela olhou para Eduardo como se o estivesse vendo pela
primeira vez e fosse algo completamente estranho.
— Você fez o café? — Sua feição não esconde seu espanto.
— O que mais ainda não sei sobre você, Eduardo? — Sorriu
amargamente.
— Ele também é um bom pintor, você precisava ver a casa
antes de comprar as latas de tinta, achei que ele teria trabalho para
pegar o jeito, mas foi muito rápido! — Seu olhar voltou para mim,
mas dessa vez ela deu um sorriso mais amigável.
— Acho que vou aceitar o café, vamos? — Se levantou e veio
para perto de mim. — Edu não me disse que morava com alguém.
Sua mudança drástica de atitude me deixou mais confortável.
— Não faz muito tempo. — Respondi com um sorrisinho
enquanto olhava para ele.
Eduardo está sério, nem parece a mesma pessoa que me
levou café da manhã na cama agora a pouco.
Na cozinha, a mesa já estava posta e eu servi nossa visita, já
que Edu está agindo de um jeito estranho.
Paula começou a fazer perguntas mais pessoais.
— Por que vocês estão morando juntos? — Sorriu. — Não me
leve a mal, Eduardo sempre foi uma pessoa difícil de lidar e que não
gosta de companhia, ver você aqui com ele foi uma surpresa e tanto.
Mudou mais do que eu esperava. — Seu rosto se voltou para ele. —
Nem parece o mesmo Edu de sempre.
Ele fechou a cara ainda mais.
— Isso não é do seu interesse Paula, e eu ainda sou o
mesmo, nada mudou. — Olhou para mim sério e repetiu. — Nada.
Aquela conversa parece sobre algo que eu não estou à par,
algo diferente de uma simples mudança de comportamento.
Me levantei incomodada.
— Vou deixar que conversem, não quis interromper. — Olhei
para Edu. — Vou proteger as coisas do quarto para começar a pintar.
— Ele apenas assentiu, sua postura fria e distante me incomodou.
Os deixei e voltei para o quarto.
Meu celular havia descarregado, coloquei para dar uma carga,
prendi o cabelo e comecei a mexer em tudo.
Minutos depois, eu já tinha plastificado o necessário e
colocado para fora o restante, ligo o celular.
“Céus”
Há muitas mensagens de Lucas, perguntando sobre mim
desde ontem a noite. Sua última mensagem estava dizendo que viria
até aqui, e isso já faz algum tempo.
Fechei os olhos inspirando profundamente.
— Mais essa não...
“Mas o que tem de mais? Ele está preocupado, eu sumi da
festa sem dizer absolutamente nada, é normal que esteja
preocupado.”
Não sei a quem estou tentando enganar, meu coração está
quase saltando para fora do peito.
Capítulo 26
O sorriso largo dela é visivelmente falso, mas Cecília não
parece conviver com esse tipo de pessoa, Paula sabe fingir, já Ceci
acredita nas pessoas e espera o melhor delas, assim como sei que
espera o melhor de mim.
— O que é isso Edu? Se sentindo bem em sua nova vida?
Está me parecendo confortável demais. — Olhou em volta torcendo
os lábios. — Nisso aqui. — Completou.
Respirei fundo.
— Você vai conseguir fazer o que pedi? Ou veio aqui apenas
para matar a curiosidade sobre como estou levando a minha vida?
Recostou o corpo na cadeira.
— Eu trouxe Eduardo, mas quero saber o que é que está
acontecendo direito.
— Já disse, estou devendo as pessoas erradas e como deve
imaginar pedir a minha mãe não é uma opção.
— E a garota? Quem é?
Dei um sorriso amplo.
— Acha que eu consigo ficar tanto tempo sozinho, Paula? —
Encarei seus olhos. — Ela só uma distração bem-vinda nessa droga
de vida!
Sua sobrancelha se ergueu.
— E desde quando você leva café na cama para as suas
distrações?
Bati com as mãos na mesa.
— Já chega! A porra da minha vida já está uma merda e eu
não vou ficar discutindo isso com você, vai poder me emprestar ou
não?
Ela abriu a bolsa e tirou um cartão.
— Está tudo aqui com a senha, basta passar no caixa, sabe
como funciona.
— Ótimo. — Peguei das mãos dela. — Eu te devolvo assim
que voltar para casa.
— Sabe que não faço questão, para nós isso aí é só um
trocado. Só cuidado com o que anda fazendo Edu, para nós não é
nada, mas para ela pode ser muita coisa. — Ia protestar, mas ela
ignorou minhas explicações com um aceno de mão. — Não precisa
me dizer mais nada, eu vou indo, mas estarei na cidade por alguns
dias resolvendo algumas coisas, se precisar ou quiser, me ligue.
Me levantei para levá-la até a porta e vi Cecília na porta do
quarto, seu rosto com uma expressão indecifrável.
— Até logo Cecília, foi um prazer te conhecer. — Paula sorriu
e acenou. — Até breve, Edu.
Abri a porta para que Paula pudesse sair, mas dei de cara
com Lucas.
— O que faz aqui? — Perguntei trincando o maxilar.
Lucas olhou para além de mim, virei a cabeça e olhei na
direção em que ele estava focado.
Paula também notou.
— E você quem é? A casa de Edu parece bastante
movimentada. — Sorriu.
— Vim falar com a Cecília, Eduardo, não com você.
— Conheço a sua voz, Lucas... seria Lucas Jones? — Ele
assentiu. — Falei com você mais cedo para pedir o endereço. É um
prazer conhecê-lo pessoalmente. Tenham um bom dia.
Paula saiu, indo em direção a um carro que havia estacionado
na frente da casa e Lucas continuou olhando para Cecília.
— Posso falar com você por um minuto. — Perguntou a ela.
— Não, ela não pode, Lucas! — Respondi cobrindo à visão
dele de Cecília. — Melhor você ir embora, amanhã ela estará na
empresa e aí você fala com ela se quiser.
— Você não fala por mim, Eduardo! — A voz irritada veio de
Cecília, que até então havia se mantido em silêncio. — Me dê alguns
minutos, eu vou tirar a tinta e já volto. — Me virei para olhar, mas ela
já estava se virando para ir de volta para o quarto, olhei de volta para
Lucas e seu sorriso me deixou ainda mais irado.
— Ouviu o que ela disse, não ouviu? — Passou por mim
esbarrando em meu ombro. — Você não fala por ela!
— O que faz aqui? — Perguntei. — Por que não a deixa em
paz?
Lucas sorriu amargamente.
— Deveria te fazer a mesma pergunta! Em breve você vai
voltar para a sua vidinha de luxo e mulheres, e ela? Já se perguntou
o que vai acontecer? Cecília nunca teve sequer um namorado e você
a está usando apenas para me atingir e depois abandoná-la como se
não fosse nada!
— Eu não vou...
— Não vai? Tem certeza de que não vai machucá-la?
Travei o maxilar, não sabia o que responder, não tenho
resposta para isso, Lucas tem razão, mas eu sei que não quero fazê-
la sofrer.
O deixei na sala e fui para o quarto, Cecília está estranha e
não quero que ela saia daqui com Lucas.
Entrei e ela tinha acabado de sair do banho, está apenas de
calcinha e meu corpo respondeu de prontidão a visão daquela
mulher magnífica.
Cecília cobriu os seios com os braços.
— Não há nada aí que eu não tenha visto, Ceci. — Seu rosto
enrubesceu e os lábios se fecharam em uma linha fina. — O que
você tem?
Os olhos dela estão marejados.
— O que eu tenho? O que eu tenho? O que é que você acha?
Que eu ficaria aqui para ser seu brinquedinho?
“O quê?”
— Cecília, do que está falando?
Deu uma gargalhada histérica.
— Só uma distração bem-vinda, não é? — A dor em seus
olhos me fez recuar. — Eu confiei em você! Pensei que pudesse ser
diferente, que você... esquece, deixa para lá, eu me enganei, está
tudo bem. Só saia daqui, preciso me trocar.
— Cecília, o que eu disse para ela foi só para... só não queria
que ela soubesse o que temos.
— E o que temos? Você conseguiu me levar para a cama,
meus parabéns, conseguiu o que outros falharam. — Uma lágrima
escorreu e ela a limpou. — Mas a distração abriu os olhos.
Me deu as costas e pegou um vestido em suas coisas.
— Ceci...
— Não me chame assim!
— Sabe que hoje temos que levar o dinheiro. — Mencionei. —
Eles virão.
Riu amargamente.
— E agora nem para o leilão eu sirvo mais.
— Estou com o dinheiro Cecília, eu disse que conseguiria,
Paula veio me trazer, depois devolvo a ela. O que mais você ouviu?
— Não consegui ficar depois da distração.
Menos mal.
— Você não pode sair com ele assim, você está brava, e eu...
quero me explicar.
— Então explique-se. — Gritou. — Me dê uma boa
explicação.
— Não posso dizer tudo...
— Sai da minha frente.
Passou por mim como eu furacão e saiu do quarto.
— Cecília...
— Volto daqui a pouco para resolver as outras coisas, não
demoro. — Respondeu sem me olhar. — Vamos Lucas.
Saiu sem dizer mais nenhuma palavra, me deixando para trás
com o peito palpitando.
Capítulo 27
Estou muito confusa!
Eduardo parece gostar de mim, de estar comigo, mas por que
ele disse aquilo para a sua “amiga”?
Do lado de fora da casa, não soube por onde começar a me
desculpar com Lucas, estava com vergonha pelo que aconteceu na
noite anterior.
— Você quer ir à algum lugar? Um café?
— Na verdade, eu não posso demorar muito, tenho algumas
coisas para resolver... mas um café parece bom. — Completei
quando vi seu olhar chateado.
Entrei no carro e Lucas deu a partida.
— O que aconteceu?
Sei exatamente do que ele está falando, mas não sei como
responder.
— Sinto muito, não imaginei que não iria voltar.
Não consegui olhar para ele, mas senti seu olhar me
queimando.
Lucas encostou o carro, não estávamos perto de lugar
nenhum, ele só parou no acostamento e se virou para mim.
— Se eu te pedir algo, você pode fazer por mim, Cecília?
— Eu não sei, me diga e eu falo se posso ou não.
— Se afasta dele.
— Perdão, não entendi. — Disse expressando minha
confusão.
Ele inspirou profundamente.
— Sei que pode parecer estranho o que vou pedir, mas
acredite, eu só quero o que é melhor para você. — Fechou os olhos
por alguns segundos. — Se afaste do Eduardo, ele não é
exatamente o que você pensa.
— Um momento. — Disse pedindo que ele parasse com um
sinal de mãos. — Lucas você não pode me pedir isso, você é meu
chefe e eu tenho uma consideração enorme por você, mas você não
pode querer tomar uma decisão sobre a minha vida, a menos que
possa me dar um bom motivo. Se Eduardo não é o que eu penso,
quem é ele então?
— Não posso dizer...
— E o que espera de mim então? Não consigo entender...
— Quero que confie em mim, é isso, só que confie em mim.
— Sem motivos sólidos, a decisão de estar ou não com ele é
apenas minha Lucas, você não pode querer que eu faça algo apenas
porque você quer. — Suspirei e passei as mãos no rosto. — Isso sou
eu quem vai decidir.
— Mas e nós, Cecília?
— Eu te disse, desde o início que nós somos amigos Lucas, e
que eu não queria mudar isso. Você me deu aqueles dois beijinhos e
só não soube o que dizer, mas sabia que iria acabar acontecendo
isso.
Lucas cerrou as mãos em punho, sua respiração está agitada.
— O que ele tem que eu não tenho? Eu tento a tanto tempo,
mas você nunca me deu uma chance de verdade.
Acariciei seu rosto levemente.
— Honestamente não sei, e não sei o que sinto agora, mas
quero estar com ele. — Omiti a parte de Edu dizer que sou apenas
uma distração, não quero que Lucas tenha esperança mesmo que
Eduardo e eu não tenhamos nada.
Seus olhos se entristeceram, mas ele assentiu.
— Se incomoda se eu te levar de volta? Acho que não vou
conseguir ir ao café agora.
— Tudo bem, vamos voltar.

Quando entrei em casa Eduardo me olhou com raiva.


— Como foi estar com o seu chefinho?
— Da mesma maneira de sempre, eu devia uma explicação.
— Respondi séria. — Lucas é uma boa pessoa e não merece ficar
triste com nada.
Ele deu uma gargalhada.
— Ah, é claro, ele é um ótimo homem!
— Sim, ele é! Ao contrário de você Edu, ele não faz joguinhos
comigo, Lucas diz o que quer, demonstra o que quer e pronto.
— E por que não corre para os braços do seu ótimo e perfeito
homem? Por que não dá a ele a chance que tanto quer?
Me aproximei e o encarei bem de perto.
— Porque infelizmente eu não fui capaz de mandar no que
sinto! Mas não vou errar novamente.
Virei as costas para escapar de seu olhar, aguentar isso é
demais para mim, mas Edu impediu segurando meu braço e me
puxando de volta para ele.
— E o que isso quer dizer, Cecília? Não me quer mais na sua
vida?
— É você quem não me quer na sua!
Nos encaramos por alguns segundos, nossas respirações
pesadas e fortes. Meu coração batendo tão rápido que chega a doer.
Os lábios dele se chocaram com os meus, exigentes e
famintos, tomando de mim toda a força e confiança que eu tinha para
mantê-lo afastado de mim.
— Você não vai me deixar. — Sussurrou entre os beijos. —
Você é minha, Ceci! — Suas mãos escorregam por meu corpo,
fazendo cada pedacinho de pele se acender e a raiva que estava foi
completamente esquecida em meio aos meus gemidos de prazer.
Voltamos para o quarto e repetimos várias vezes mais do que
tivemos na noite anterior.
— O que é que você está fazendo comigo? — Perguntou
quando me deitei exausta em seu peito.
— Respondo quando souber o que fez comigo. — Ele sorriu e
me beijou.
Ficamos ali por um bom tempo, até ouvirmos batidas na porta.
Meu corpo ficou instantaneamente tenso e notei que o dele
também.
— Você fica aqui e se veste, vou colocar a bermuda e vou
atender a porta. — Disse já se levantando. — Só sai daqui se eu vier
te chamar, tudo bem?
Minha voz está presa na garganta, não consigo mais falar,
meu corpo inteiro está tremendo e os olhos escorrendo lágrimas.
Edu beijou meus lábios levemente para me acalmar e saiu.
Capítulo 28
Não quero que eles cheguem perto de Cecília, mas também
não confio neles para deixá-la sozinha, não quero tirar meus olhos
dela, enquanto esses filhos da puta, não estiverem com o dinheiro
que querem nas mãos.
A pior parte é ter que ver a cara asquerosa do pai dela.
— Boa noite, como vai? Pronto para o seu fim? — O cara da
última vez perguntou me olhando.
— Estou pronto para te pagar e não ter que ver sua cara
nunca mais. — Respondi seco.
— Quer me dizer que está com o dinheiro?
— Cada centavo! — Peguei o cartão que Paula me entregou.
— Bem aqui, só precisa ir em qualquer caixa eletrônico de sua
preferência para sacar, mas como não confio em vocês, temos um
impasse, não vou deixar que você vá sozinho sacar porque pode me
dizer que não tem nada no cartão.
— Pode vir comigo. — Respondeu. — Onde está Cecília?
Me levantei e fui até o quarto chamá-la, seu corpo está
tremendo muito, mas ela não deixa de estar de cabeça erguida.
— Temos que ir até lá, eu não quero te deixar aqui sozinha. —
Ela assentiu e me seguiu para fora.
Seu olhar caiu em seu pai, mas o do homem a quem ela deve
lambeu seu corpo inteiro, e senti uma vontade homicida de arrancar
seus olhos das órbitas apenas por olhá-la daquela maneira.
— Boa noite, Cecília! — Abriu um sorriso nojento para ela e
eu a protegi com meu corpo impedindo a visão dele. — Onde estão
seus modos? não cumprimenta mais as visitas?
— Vamos de uma vez, estamos perdendo nosso tempo aqui!
— Intervi com raiva. Sinto uma necessidade absurda de tirar Cecília
de perto dele, esse homem olha para ela de um jeito que parece
querer devorá-la. — Nós vamos com vocês, mas voltaremos de táxi.
Ele assentiu e caminhou para a porta seguido por mais dois
homens e o pai de Cecília, enquanto ela e eu vamos mais atrás.
— Vai ficar tudo bem. — Cochichei pegando sua mão gelada.
— Não se preocupe. — Não se estava tentando convencer a ela ou a
mim.
Ainda não era tão tarde, muitas pessoas andavam para lá e
para cá completamente alheias à nossa situação.
Cecília não parece mais a mesma mulher que vi no nosso
primeiro dia, está acuada, com medo, mas julgando pelo pai que
tem, posso ver os estragos que ser negligenciada a vida toda fizeram
nela.
Não sei como é que ela sobreviveu.
Paramos em um caixa eletrônico, passei a senha do cartão.
— Aqui tem mais do que nós combinamos.
— É pelo tempo que teve que esperar. — Respondi mantendo
Cecília atrás de mim.
— Eu peguei o que me pertence e transferi para a minha
conta! A dívida dela está paga. — Me devolveu o cartão e inclinou a
cabeça de lado para ver Cecília. — Você está livre da dívida Cecília,
mas será sempre um prazer te ver se quiser.
— Não se aproxime mais dela. — Dei um passo a frente
ficando cara a cara com ele. — Ela pagou o que devia, FIQUE
LONGE! — Rosnei cerrando os punhos.
Ele sorriu para Cecília antes de se virar e ir embora com seus
homens. Pareceu tudo fácil demais.
O pai dela ficou parado por algum tempo olhando para nós.
— E você, quem é? Como arrumou tanto dinheiro assim?
— Isso não interessa a você! Saia daqui e não volte a
perturbá-la! — Respondi afastando-a dele e indo para o táxi que já
havia chamado pelo celular.
Cecília parece estar em choque.
— Acabou mesmo? — Falou pela primeira vez. — Eles vão
me deixar em paz e não vão me levar para aquele lugar horrível
novamente?
Lugar horrível?
— Do que está falando? Para onde te levaram? — Ela se
abraçou, como se estivesse tentando se proteger. — Ceci?
Não posso, eu não posso deixá-la, não posso abandoná-la,
seja como for, quando eu voltar e se eu voltar, ela vai comigo, eu não
posso deixar que ela fique aqui sozinha.
— Está tudo bem agora, não é?
— Sim, está sim. — Ela parece ainda mais frágil do que antes.
Respirando profundamente várias e várias vezes. — Para onde te
levaram?
— Para o lugar que meu pai disse que iria ficar, um bordel nos
arredores da cidade. — Segurou um soluço. — Vi coisas horríveis
lá... — Sussurrou.
Beijei o topo de sua cabeça e a abracei com força, ela não
merece passar por esse tipo de coisa.
O estado dela no momento me preocupa, mas julgando tudo o
que ela passou, é normal que fique assim, tudo o que ela precisa é
de cuidado e isso logo vai passar.
Durante toda a noite Cecília está agarrada a mim, e eu não
consigo dormir, imaginando que tudo tenha sido apenas um teatro
daquele homem, que ele pode querer voltar aqui e nos pegar de
surpresa.
Na manhã da segunda, não me sinto bem, não consigo
imaginar como será trabalhar sem ter conseguido pregar os olhos,
mas Cecília se levanta no horário e diz que precisa ir, que precisa
distrair a cabeça, que não vai aguentar simplesmente ficar em casa.
— Se não quiser ir, eu entendo, mas eu tenho que estar lá,
consegui esse trabalho com muito esforço, não posso me dar o luxo
de perder. — Já não parece a mesma criatura frágil que vi ontem.
Olhei para ela profundamente, vi algo que eu nunca vi em
mais ninguém, a vontade de tê-la ao meu lado sempre.
— Você iria embora comigo?
— Como? — Arregalou os olhos.
— Sei que não faz muito sentido, mas já moramos juntos a à
pouco tempo e nos conhecemos a poucos meses e sei que nós nos
gostamos. — Respirei fundo, aquilo soava tão estranho para ela
quanto para mim. — Você iria embora comigo, viver em algum outro
lugar? Eu não acho que estamos seguros aqui.
Ela pensou por algum tempo.
— Ainda tenho algumas semanas na faculdade e quando você
chegou na empresa meses atrás renovei meu contrato...
— Isso não é um problema, esperamos você terminar e
quebramos o contrato. Você iria?
— Sim.
Capítulo 29
Cinco semanas se passaram desde o dia em que Eduardo
acertou as contas do meu pai, nunca mais vimos aquele homem e
meu pai foi o único que me importunou por duas vezes, mas com
Edu por perto ele tentava se fazer de pai arrependido, mas eu
consegui ver nitidamente o quanto estava sendo falso.
Nós ficamos mais tranquilos depois de perceber que o homem
manteve sua palavra, mas Eduardo insiste que assim que minha
faculdade terminar, nós vamos tentar a vida em outro lugar, Seattle,
mais especificamente.
Paula, a amiga que emprestou o dinheiro a ele, apareceu em
casa mais duas vezes, mas dessa vez foi muito mais amigável
comigo.
— Esse nem chega perto de ser o mesmo Edu que eu
conheci. — Comentou em uma das vezes. — O que foi que você fez
para deixá-lo dessa maneira? — Olhei para Eduardo que estava
terminando de fazer o nosso almoço.
— Não sei, talvez ele tenha mudado na mesma medida que
conseguiu me mudar.
Ela sorriu e deu um suspiro profundo. — Você já deve ter
notado que eu gosto dele, um pouco mais do que deveria. — Fiquei
desconfortável. — Ele nunca retribuiu meu sentimento, mas eu estou
muito feliz por ele ter te encontrado. E quero que saiba que pode
contar comigo como uma grande amiga, seja o que for que faça bem
a ele, me deixa feliz.
Imaginei o quão difícil deve ser para ela, e fiquei encantada
com sua atitude.
— Fico feliz por pensar dessa maneira. — Sorri.
Lucas foi quem ficou mais estranho depois da nossa
conversa, ficou mais distante, fechado, mas consegui compreender
seus motivos, não posso exigir que ele continue o mesmo depois de
tudo o que eu disse e depois de ter certeza de que estou mesmo
envolvida com Edu, ele assumiu uma outra postura, muito frio e
distante.

— Por que não pode ir almoçar hoje comigo? — Edu


pergunta, fazendo um biquinho. — Nós sempre almoçamos juntos.
— Lucas terá uma reunião bem longa que inicia antes do
almoço, e para que ninguém fique sem almoçar vai ser em um
restaurante.
Me deu um beijo leve e franziu o cenho.
— Não gosto que ele te tire de perto de mim. Eu sei bem que
Lucas quer você muito mais do que como uma funcionária.
— O que importa aqui, é que eu quero você, não é?
Seu sorriso surgiu.
— Isso é verdade!
Depois da conversa com Edu, saí da sala de descanso e vi
Jorge no corredor.
— Onde é que está o menino? O chefe está uma fera com ele.
— E quem é que não fica? — Ele sorriu e eu apontei na
direção de onde ele estava.
Lucas e eu não demoramos a sair, como de costume nesses
últimos dias, está sério e focado em qualquer coisa, menos em mim.
— Como está a faculdade, Ceci? Está prestes a encerrar, não
é mesmo?
Sorri amplamente.
— Sim, falta pouco.
— E pretende mesmo ficar? —
Fiquei em silêncio. — Já entendi, está pensando em
reconsiderar...
— Não sei ainda Lucas, só quero terminar por enquanto,
depois vou ver com calma qual o rumo que minha vida irá tomar.
Chegamos ao restaurante e fiquei surpresa ao ver Paula entre
as pessoas que nos esperavam.
— Cecília, que bom te ver. — Me deu um abraço. — Como
tem passado?
— Muito bem, obrigada. — Sorri amigavelmente. — Vamos
nos sentar? Desculpe tê-los feito esperar.
— Pegamos um pouco de congestionamento. — Lucas
completou.
A reunião começou, logo fizemos nossos pedidos e
aguardamos enquanto as conversas importantes fluíam.
Anotei tudo o que é necessário e li partes do projeto quando
alguém precisou entender algo melhor.
O almoço foi servido, mas assim que o cheiro invadiu meu
nariz senti meu estômago se contorcer e me levantei correndo para ir
até o banheiro.
Um enjoo me atingiu e quase não consegui chegar a tempo.
Dentro do banheiro coloquei todo o meu café da manhã para
fora e um pouco mais.
— Cecília? — A voz de Paula veio do lado de fora da porta. —
Você está bem?
A náusea continuou me contorcendo as entranhas e não
consegui me impedir de vomitar novamente.
Quando finalmente consegui respirar, saí do banheiro e me vi
pálida no espelho que estava diante de mim.
— Como se sente? — Ela ainda ficou me esperando sair. —
Precisa de algo?
Neguei com a cabeça.
— Já me sinto melhor, não sei o que foi que aconteceu.
Paula olhou diretamente para a minha barriga.
— Você não acha que pode estar...
Coloquei as mãos na barriga instintivamente.
— Não... não, eu não estou.
— Tem certeza?
Pensei no dia que era.
— Acho que estou atrasada...
Ela arregalou os olhos.
— Vou buscar um teste para você.
— Não precisa, não precisa se incomodar.
— Não é incômodo algum.
Capítulo 30
Alguns minutos mais tarde, Paula voltou com cinco testes
diferentes.
— Não sabia qual era o melhor, então pedi um de cada que foi
indicado, faça todos eles. — Seu sorriso cordial havia sumido, ela
parece mais desesperada do que eu, mas deve mesmo ser
desesperador saber que o homem que você gosta pode ter um bebê
com outra mulher.
Os minutos que esperei antes de olhar para aqueles testes,
estavam quase me matando, mas depois de três minutos espiei para
ver se algo já havia aparecido.
Meu coração acelerou e cobri minha boca com as mãos.
Abri a porta do banheiro ainda sem acreditar.
— Estou grávida!
O rosto de Paula era uma máscara indecifrável.
— Vamos sair desse banheiro, mas eu preciso falar com você
Cecília, antes que você cometa um enorme erro. — Ela olhou para
os testes em minhas mãos e respirou profundamente. — Vamos
terminar essa reunião, mas fique aqui para que tenhamos um
momento a sós, eu te levo para a empresa.
As horas seguintes que ficamos na reunião duraram uma vida
e quando tudo se acertou, avisei a Lucas que eu iria depois.
— Tem certeza?
Assenti.
— Tenho sim, Paula me leva até a empresa quando
terminarmos de conversar.
Lucas e os outros se foram, nos deixando a sós.
— Cecília, você tem ideia de quem é Eduardo Alencar? —
Perguntou como se aquilo fizesse sentido.
— Nós nos conhecemos a pouco mais de cinco meses, não
tenho como saber tudo a respeito dele, mas sei que é um bom
homem.
Ela se recostou na cadeira.
— Cecília, pesquise na internet, aí no seu celular mesmo.
Eduardo Alencar é herdeiro de uma fortuna, ele nem deve saber
quantas empresas possuí. Edu não é um pobre coitado, não é uma
pessoa simples...
Peguei meu celular sem acreditar no que Paula disse e
escrevi o nome dele, cada uma das notícias me deixou mais chocada
que a anterior, a quantidade de mulheres com quem ele saiu me
deixou mais enjoada.
— Não é possível!
— E como você pôde observar, Edu não é um bom homem,
na verdade ele já quebrou centenas de corações e o meu está nessa
contagem.
Mesmo vendo é difícil acreditar.
— O que ele faz aqui? Por que ele está vivendo como está?
— Castigo da mãe dele, mas ela já vai chamar ele de volta,
essa empresa que você trabalha é uma filial da dela, por isso
mandou Eduardo para cá, Lucas sabe de tudo. — Ergui o olhar para
ela. — Não o culpe, tenho certeza de que ele queria dizer que você
estava sendo enganada, mas Carmen não é alguém com quem ele
possa se meter e ela pediu segredo.
Voltei a olhar as notícias, as modelos, atrizes, em cada uma
das fotos ele estava com alguém diferente, outras perguntavam onde
é que ele tinha se metido para sumir dos tabloides.
Senti uma tontura horrível.
— Não estou me sentindo bem, preciso ir... — Para casa?
Que casa? Como eu vou olhar para ele agora?
— Ele só está brincando com você Cecília, você é só uma
distração. — Me lembrei da conversa que ouvi dos dois. — Mas um
bebê? Eduardo não é idiota, ele sempre se preveniu, ele não vai
acreditar que é dele, com certeza pensará que descobriu que ele é
rico e quer dar o golpe da barriga.
— Mas nós nos prevenimos, ele... — Meu coração e
respiração estão acelerados. — Eu não faria isso.
— Outras já tentaram, acredite, ele vai fazer o mesmo que fez
com todas elas, isso se acreditar que esse bebê é mesmo dele. —
Ela segurou minha mão em cima da mesa. — Eu conheço Eduardo
desde que éramos crianças, entendo que em tão pouco tempo você
não o conheça bem, mas ele não vai aceitar esse bebê, nem adianta
falar para ele. — Se aproximou mais de mim. — Vou te dar um
conselho do fundo do coração, se essa criança for mesmo dele, tire,
não prossiga com essa gestação.
— O quê? — Puxei minha mão de volta para mim. — Não vou
tirar, eu não posso fazer isso!
— Por enquanto ainda é fácil Cecília, você deve estar de
poucas semanas, eu pago para você, em uma ótima clínica, não
quero que você e esse bebê sofram.
— Não!
— Pense, pense com cuidado, não precisa me responder
agora. Você está terminando a faculdade, como vai se manter e
manter um recém-nascido? A mãe dele me disse que terminaria o
castigo em breve, você tem para onde ir? Vocês estão morando
juntos e quando ele for embora?
Para onde eu vou?
Não acredito que eu fui tão boba, que acreditei assim, tão
cegamente em tudo o que ele me disse e em tudo o que me fez
sentir, mesmo depois de tê-lo escutado falar que eu era só uma
distração.
— Paula, agradeço por ter me aberto os olhos, mas preciso
voltar, não sei o que pensar ainda, mas eu não vou tirar essa criança,
é um ser inocente que não merece pagar pelos nossos pecados.
— Mas que vai acabar pagando com um pai ausente, até
mesmo uma vida medíocre e passando necessidades. Pense bem
Cecília, não seja egoísta ao ponto de pôr uma criança no mundo
apenas para sofrer. — Se levantou. — Vamos, te levo para a
empresa.
— Não, obrigada, vou caminhar um pouco, preciso colocar
minha cabeça e meus pensamentos em ordem.
— Minha proposta está de pé. Anote seu número para mim,
assim consigo manter contato com você, estou voltando para Seattle
essa noite e vou ficar preocupada, conte comigo para o que for.
Agradeci a ela e saí do restaurante no piloto automático, olhei
algumas vezes para o celular, as matérias sobre ele, nem sequer
parece o mesmo Edu.
Em várias fotos ele está fumando, eu nunca o vi fumar, já
encontrei um maço no quarto, mas nunca foi aberto, quem é esse
Eduardo que Paula me mostrou?
Será que posso confiar nele para dizer que estou esperando
um filho seu?
O restaurante não fica muito longe da empresa, então
caminho lentamente para lá, não sei como vou encarar toda essa
situação, mas preciso conversar com ele.
Deixo minha bolsa em minha mesa e vou em direção a sala
de Lucas para avisar que cheguei, mas paro antes da porta quando
ouço as vozes dele e de Edu alteradas.
— Você sabe que ela não merece ser enganada dessa
maneira! Você venceu Eduardo! Já liguei para sua mãe e disse que
você pode voltar. — A voz de Lucas soou mais distante da porta. —
Você me disse que se aproximaria dela até que eu fizesse o que
você queria, eu fiz, agora deixe-a em paz antes que ela se apaixone
ainda mais por você.
Senti uma pontada forte no peito.
— Você deveria ter feito isso antes Lucas, poderia ter evitado
todo esse transtorno, mas quis pagar para ver...
— Eu não pensei que seria tão sem escrúpulos para fazer
alguém se apaixonar por você por pura pirraça, só para me atingir...
Neste momento não consegui pensar e entrei na sala.
— O que disse Lucas? — Os dois se viraram em minha
direção com espanto. — Pode repetir?
Capítulo 31
Quando Cecília saiu da empresa, não imaginei que ela iria
demorar tanto, e sabendo que estava com Lucas, fiquei ainda mais
inquieto.
— Isso tudo é pela menina Cecília? — Jorge perguntou
sorrindo. — Vai acabar tendo um colapso nervoso. — Sorriu
— Não é isso. — Respondi de mau humor. — Só não gosto
daquele chefe dela! Como está seu filho?
Sorriu levemente.
— Felizmente bem melhor, já voltou para casa.
Terminei tudo no andar e fui até o andar onde Ceci deveria
estar, para a minha surpresa Lucas já está em seu escritório, mas
Cecília ainda não.
— Onde ela está? — Perguntei sem me anunciar entrando em
sua sala.
— Aqui ainda usamos da educação, Eduardo. — Levantou a
cabeça olhando para mim. — Cecília ficou no restaurante falando
com Paula, a sua amiguinha.
O que diabos aquelas duas teriam para conversar? Paula não
é exatamente a pessoa mais indicada para Ceci começar uma
amizade, mas parece que ela ainda não entendeu isso.
— Por que deixou as duas juntas? — Não fez sentido nem
para mim a pergunta, mas fiz mesmo assim.
Lucas sorriu.
— Eu sou apenas o chefe Eduardo, não posso dizer com
quem Cecília deve ou não falar, ninguém pode. — Ele saiu de trás da
sua mesa e ficou de frente para mim em pé. — Sabe o que eu não
consigo entender? Como é que ela se apaixonou por você? Cecília
sempre foi tão esperta, mas se enganou tão facilmente.
Não respondi, ele não sabe que não estou tentando enganá-la
e não serei eu a avisá-lo disso, Lucas tem esperança de que eu saia
da vida dela na primeira oportunidade e eu quero que ela vá comigo.
— Conquistar mulheres é um dom, mesmo as que me odeiam.
— Abri meu sorriso mais sínico.
— Você sabe que ela não merece ser enganada dessa
maneira! Você venceu Eduardo! Já liguei para sua mãe e disse que
você pode voltar. — Me encarou com a mandíbula travada. — Você
me disse que se aproximaria dela até que eu fizesse o que você
queria, eu fiz, agora deixe-a em paz antes que ela se apaixone ainda
mais por você.
Abri um sorriso amplo.
— Você deveria ter feito isso antes Lucas, poderia ter evitado
todo esse transtorno, mas quis pagar para ver...
— Eu não pensei que seria tão sem escrúpulos para fazer
alguém se apaixonar por você por pura pirraça, só para me atingir...
Abri a boca para protestar, mas a voz dela atrás de mim fez o
ar fugir dos meus pulmões.
— O que disse Lucas? — Me virei na direção de Cecília. —
Pode repetir? — Seu rosto está vermelho, seus olhos marejados e os
punhos cerrados.
Ergui as mãos porque ela parece que vai me atacar a
qualquer momento.
— Ceci, calma...
— Calma o cacete, você ainda não me viu com raiva! E não
estou falando com você, é com ele. — Apontou para Lucas. —
Repete o que foi que você disse!
Olhei para Lucas fuzilando-o com o olhar, se ele abrir a boca
sou capaz de matá-lo agora mesmo.
— Cecília, eu não queria que você ouvisse isso. — Ele
começou.
— Você sabia que ele estava me usando e deixou? Deixou
que ele me enganasse e me manipulasse? — Olhei para ela, a
mágoa e dor nos seus olhos fizeram meu estômago se contrair.
— Cecília, não é assim, me deixa te explicar, por favor...
— Explicar o quê? — Perguntou com um sorriso forçado? —
explicar que eu sou uma idiota? Que você conseguiu me conquistar
por uma mera brincadeira, por pura sacanagem? Não precisa me
explicar isso, eu já consegui entender.
Ela deu as costas para sair da sala, mas eu a segurei pelo
braço.
— Ceci, não é assim...
— Eu devia ter acreditado no que ouvi falar com a Paula, mas
deixei você me enganar, chega! Eu já tenho a vida fodida demais
para deixar que você destrua a porra do meu juízo também. — Senti
algo estraçalhando dentro de mim. — Acabou Edu, faça um favor a
nós dois e desapareça da minha vida!
Puxou seu braço se soltando do meu toque.
— Ceci.
— Pode sair daqui, por favor? Eu preciso falar com meu
chefe. — Perguntou evitando me olhar.
Respirei fundo.
— Sei que está magoada, mas você tem que me dar uma
chance de explicar, você precisa me ouvir.
— Eu não preciso de nada Eduardo, a única coisa que eu
realmente quero de você, é que me deixe em paz, é que eu não seja
obrigada a ver sua cara nunca mais!
A maneira como ela está falando comigo, ainda mais na frente
dele, me deixa com o sangue fervendo de raiva.
— É isso mesmo que quer, Cecília?
— Sim!
— Então farei o que está me pedindo, fique tranquila, você
não vai precisar me ver mais. — Parece que um buraco está sendo
aberto em meu peito, mas se ela pensa que eu vou implorar para
que me ouça, está muito enganada.
— Ótimo! — Cerrou a mandíbula. — Antes que você chegue
na sua casa, minhas coisas já não estarão mais lá!
Quase perguntei para onde ela vai, mas mordi a língua, se ela
me quer fora de sua vida, é isso que ela terá.
Capítulo 32
Não imaginei que aquilo iria doer tanto, Edu passou por mim
em direção a porta e precisei me segurar para meus joelhos não
cederem.
— Cecília...
— Não quero mais falar sobre isso! Por favor. — Eduardo não
será a primeira pessoa que eu amo e me decepciona, meus pais já
me deixaram suficientemente escaldada com relação a isso.
— Se eu puder fazer algo por você...
— Pode sim. — Respondi de imediato. — Preciso retirar
minhas coisas da casa dele e não tenho transporte para isso, posso
utilizar a vã da empresa?
— Sim... eu posso te ajudar com isso.
— Não, eu me viro, vou encontrar uma casa primeiro, preciso
de um adiantamento para o depósito, pode fazer isso para mim?
— É claro Cecília... mas você não acha que está tudo muito
rápido? Tenho certeza de que ele não vai se importar se você fizer
isso depois.
— Mas sou eu quem não quer.
O resto do meu dia foi uma correria sem tamanho, procurei
casas que eu pudesse pagar na internet, liguei, comprei alguns
móveis no meu cartão de crédito de emergência, apenas o bastante
para começar.
Cheguei na casa para pegar tudo o que tinha deixado e só de
entrar senti um vazio imenso no peito.
“Te proíbo de sentir falta de alguém que te enganou, Cecília!”
Alisei minha barriga, que ainda não tinha nada aparente.
— Somos apenas nós dois agora, sementinha.
Marquei uma consulta com o ginecologista para a tarde
seguinte, por ser perto do escritório marquei no meu horário de
almoço assim conseguiria ir sem precisar faltar.

Antes de sair do escritório para a consulta, meu celular tocou


e no identificador de chamadas mostra que é Paula.
— Cecília como está querida? E os enjoos, diminuíram?
Mal ela sabe que hoje estou passando o dia todinho hoje
enjoada.
— Estou bem.
— Eduardo voltou para casa ontem, então pensei em ver se
você precisa de algo, como vocês moravam juntos...
— Não, eu não preciso de nada, pode ficar tranquila.
Ele já foi embora, nem soube disso, mas é melhor assim,
melhor que ele siga sua vida e eu a minha, eu não pertenço ao
mundo dele e ele jamais pertenceu ao meu.
— E quanto ao que te falei? Já pensou? Não acha que seria
melhor fazer um aborto agora? Se ele souber dessa criança
futuramente, tanto ele quanto a mãe podem tirá-la de você, não sei
se conhece a fama da Sra. Alencar, mas ela é uma pessoa ainda
mais complicada de lidar do que o filho.
Meu corpo estremeceu.
— Não vou fazer isso, se eles não souberem de nada, nunca
saberão do meu bebê, então por favor, apenas guarde esse segredo,
que tem contato com eles, você é a única que sabe disso.
— Bem, se precisar do dinheiro para o procedimento e a
clínica, eu te levo e fica entre nós.
— Tudo bem, sobre o dinheiro que ele pegou emprestado com
você, eu não consigo devolver muito, mas posso te transferir...
— Ele já me pagou. — Me cortou. — Como eu disse, Edu é
bilionário e não gosta de dever favores.
— Se eu te enviar o dinheiro você pode repassar para ele?
— A única coisa que vai fazer com isso, é irritá-lo.
Falamos por mais alguns instantes e ela encerrou a chamada.
Estou sentindo um enorme desconforto, principalmente agora
que soube que ele não está mais aqui, parece que isso mexeu muito
com meus hormônios.
Já no ginecologista, tudo se confirmou, estou grávida de
pouco mais de quatro semanas, ainda não foi possível ver nada além
do saco gestacional, mas a médica disse que é normal para o tempo
de gestação.
Sorri emocionada, os olhos cheios de lágrimas e o medo do
que seria de nós futuramente, mas de uma coisa eu tinha certeza,
esse bebê receberia todo o amor que eu não tive a vida inteira,
porque eu já sabia tudo o que não fazer como mãe.
De volta à empresa, Lucas me convidou para almoçar, mas
dessa vez recusei sem sentir nada.
— Vamos manter as coisas no âmbito profissional. — Sorri. —
Será melhor dessa maneira, tentamos ser amigos mais íntimos e não
deu certo, as coisas ficaram confusas e foi um erro.
Sua expressão se tornou mais dura.
— Eu só queria ter a chance de te fazer feliz como merece
Cecília, mas tudo bem... eu já percebi que insistir é inútil em alguns
casos. — Desviou o olhar.
Repassamos o trabalho e a agenda da tarde, mas uma hora
após nossa conversa ele pediu que desmarcasse todos os
compromissos e foi embora.
— E eu aqui pensando que tudo voltaria ao normal... —
Comentei sozinha, observando Lucas indo embora.
Capítulo 33
Dois meses depois
Minha mãe entrou na minha sala.
— Foi você quem preparou esses documentos? — Ergueu a
mão com a pasta e os colocou em minha mesa.
Desde que voltei, finalmente tomei meu lugar na empresa e
passei a ajudar minha mãe em tudo, parei de fumar e me envolver
em escândalos, ao menos tentei me manter longe de escândalo, mas
sempre que penso em Cecília acabo indo parar em alguma coluna
de fofoca por estar em um bar.
— Sim mãe, algum problema com eles?
— Não! — Respondeu com veemência. — E esse é o
problema! O que é que aconteceu com você, Eduardo?
Não consegui segurar a gargalhada amarga que estava presa
em minha garganta.
— Essa pergunta é séria? — Balancei a cabeça indignado. —
Mãe, estou muito ocupado agora, o que acha de jantarmos mais
tarde depois do expediente?
Ele respirou fundo.
— Podemos ir almoçar.
— Não, almoço não, o jantar, pode ser? Tenho um
compromisso no almoço.
Dona Carmen me olha com desconfiança, mas acaba
aceitando.
— Tudo bem, vamos ao mesmo restaurante de sempre, vou
pedir que façam as reservas.
— Não mãe, vou te mostrar algo que aprendi, vou fazer o
jantar! — Segurei o riso diante de sua cara de puro espanto. — É
bom, eu garanto. — Completei.
Ela aceitou meu convite e saiu da minha sala.
Falar sobre cozinhar me fez lembrar dela, evito o máximo ficar
pensando, mas tudo no meu dia joga na minha cara que eu fui um
idiota e deixei que ela saísse da minha vida, mas sou orgulhoso
demais para correr atrás dela.
Meu celular começou a tocar.
— Paula, como vai?
Ela deu um suspiro.
— Estou com saudades, desde que você voltou que tem me
evitado.
— Só estou trabalhando demais.
— Podemos nos ver amanhã para almoçar?
Fiquei pensando por alguns instantes e realmente está na
hora de seguir adiante, preciso tirar Cecília do meu sistema.
— Podemos sim. — Respondi finalmente.
— Nos vemos amanhã então. — Seu tom demonstra toda a
animação. — Na minha casa ao meio-dia, não se atrase.
Hoje eu tinha um almoço marcado com um médico
especialista, demorei muito tempo para conseguir, ele iria cuidar do
caso do filho do Jorge, pedi que não dissesse quem havia feito a
indicação, mas aquele homem merece ter um pouco de paz de
espírito e vou ajudar no que ele precisar.
O almoço foi longo, consegui todos os laudos e fiquei aliviado
quando o doutor aceitou trabalhar no caso.
— Não posso prometer nada, mas farei tudo o que estiver ao
meu alcance.
— É tudo o que estou pedindo doutor.

Já em casa, peguei tudo o que seria necessário para fazer o


jantar para a minha mãe, ela não iria demorar a chegar.
Enquanto cozinho, minha mente vaga para os momentos
leves e felizes que tive com Cecília.
“Você sente falta dela idiota!” — Minha mente ladra raivosa
para mim.
Sim, eu sinto, mas foi ela quem não quis me ouvir, ela quem
colocou um ponto final em uma história que poderia ter sido muito
mais.
Balanço a cabeça para tentar me livrar dos pensamentos,
quando ouço minha mãe batendo à porta.
— Boa noite, mãe!
— Boa noite, Edu! — Está séria, como sempre.
— Venha, vamos jantar antes que esfrie.
Dona Carmen ficou durante todo o tempo me observando e
analisando tudo o que faço.
— Eduardo...
— Mãe... por favor, para de me olhar dessa maneira, isso está
me incomodando muito. — Larguei os talheres na mesa e a encarei.
Ela abriu a boca para falar, mas a fechou novamente, fazendo
a mesma coisa outra vez.
— Edu, você tem que admitir que isso... tudo isso é... eu
pensei que estivesse apenas fingindo, mas estou te vendo se
esforçar dia após dia... — Suspirou. — Isso é diferente.
— E não foi exatamente por isso que me mandou para lá? E
por que foi que me trouxe de volta? Fiquei curioso. — Encarei por
alguns instantes.
— Paula... ela me disse que você havia conhecido alguém,
que estava muito diferente, é claro que eu não acreditei pensei que
ela estivesse apenas querendo que eu o deixasse vir, mas Lucas
também ligou.
Apenas ouvir o nome dele faz meu corpo retesar.
— Está tudo bem mãe, entendi e aprendi com o que fez, não
sou perfeito, mas estou tentando melhorar.
Não consigo entender, não era exatamente isso o que ela
queria?
— A mulher, essa que você conheceu, ela é a causa de toda
essa mudança? — Seus olhos estavam colados nos meus.
Desvio o olhar.
— Não quero falar sobre isso.
— Tem certeza? Eu gostaria de saber mais sobre a mulher
que fez tudo isso. —Estreitei os olhos. — Não seja tão desconfiado.
— Aprendi a ser assim com você.
— Sim, eu sei, e me arrependo muito da maneira como tudo
foi, como você foi criado. — Não escondi o choque. — Eu errei, falhei
com você, mas foi tentando acertar, me dói que você não confie em
mim, mas respeito e entendo isso.
Dei um sorriso sem humor.
— Parece que o tempo que passei fora não fez bem apenas
para mim.
Ceci tem um dom único de modificar as pessoas, eu só não
pensei que isso influenciaria até na minha mãe.
Capítulo 34
Eu sempre fico de bom humor quando é dia de consulta,
Lucas já percebeu minha gestação, ele soube assim que me viu
rejeitar café e passar mal o tempo inteiro.
— Tem consulta hoje? — Lucas perguntou quando me viu
ajeitando as coisas para sair. — Posso te levar. — Sorriu.
Ele tem voltado a ser o mesmo de antes.
— Na verdade, eu sempre vou andando, é bem pertinho
daqui.
— Posso te acompanhar?
Não consegui dispensar.
— Tudo bem.
Eu sei que ele quer me perguntar alguma coisa, parece estar
agoniado, suspirando enquanto andamos.
— Cecília você... — Parou e me olhou.
— Fala logo, Lucas.
— Você não pretende contar para ele? — Sei de quem está
falando, ele não precisa dar nome.
— Olha, pelo que sei, ele jamais iria aceitar isso, sei quem ele
é agora, e não vou me iludir com isso, ele já provou que não é
confiável, pode até querer que eu tire meu bebê e isso não vai
acontecer.
Ele assentiu ficando sério.
— Entendo, eu não gosto dele, nunca vou perdoar o fato de
ele ter tirado você de mim. — Sorriu tristemente. — Mas ele é o pai,
eu realmente não acho que ele faria algo assim... bem, é seu filho e
quem decide é você, perdoe estar dando minha opinião, só um
comentário.
Sorri levemente e olhei para frente.
Sei que o que estou fazendo não parece ser o certo, mas eu
não confio mais em Eduardo, eu não tenho coragem de ligar para ele
e contar que vamos ter um filho, além de ter medo de sua reação,
tenho medo de que ele tente tirar meu filho de mim depois que ele
nascer, ou pior, que ele nem deixe essa criança vir ao mundo.
Imagino o escândalo que seria, Eduardo Alencar e uma
simples secretária. Eu não faço parte do mundo dele, e talvez seja
melhor que seja assim.
— É aqui. — Apontei para a entrada do prédio onde faço meu
acompanhamento. — Eu disse que era perto. Se quiser voltar eu já
vou entrar...
Nesse momento as coisas parecem ter começado a ir mais
devagar, dois homens se aproximaram aos poucos olhando
diretamente de mim, empurraram Lucas com muita força e me
enfiaram dentro do carro que estava parado na frente do prédio.
Ainda vi Lucas correndo atrás do carro, mas aceleraram o
carro e ele ficou para trás.
— Quem são vocês? O que querem? — Perguntei segurando
as lágrimas.
Minha respiração está acelerada e meu coração está a mil por
hora.
— Calada! Se quer ficar bem, é melhor que você coopere.
Isso não pode estar acontecendo, eu não devo mais nada a
ninguém, nem sequer tenho mais contato com aqueles homens, eles
sumiram desde aquele dia...
Olho para cima tentando conter a enxurrada que se forma em
meus olhos.
“Eu nunca pedi nada, eu sempre aceitei o que a vida me deu
sem pestanejar, mas agora não, por favor, eu tenho um inocente
aqui.” — Roguei mentalmente a qualquer um no universo que
pudesse me ouvir.
Nos afastamos muito da cidade, nem consigo definir se ainda
faz parte de San Diego.
Me tiraram do carro para levar até dentro de uma pequena
casinha em uma clareira, bem escondida no meio do nada.
— Boa tarde Cecília, quanto tempo. — Aquela voz fez meus
ossos estremecerem. — Temos muito o que conversar.
Capítulo 35
Paula me recebeu com um sorriso imenso, ela já vinha
tentando se aproximar, mas a estava ignorando sempre.
— Finalmente! — Exclamou assim que abriu a porta. —
Pensei que não viria. — Me deu um beijo de cada lado do rosto.
— Você sabe que se eu digo que venho, é porque eu venho.
— É nítido que ela quer chamar minha atenção.
Paula sempre foi uma mulher linda, mas hoje ela caprichou,
maquiagem, roupas, nada é para alguém que está apenas
almoçando em casa.
— Sei que é um homem de palavra. A comida já chegou há
alguns minutos, vamos para a sala de jantar, a mesa já está posta.
Mesmo que esteja me esforçando para seguir com a minha
vida, não consigo mais, cada detalhe me faz lembrar Cecília.
— No que está pensando que está tão distante?
Jurei a mim que não faria isso, mas é mais forte do que eu.
— Você tem falado com a Cecília?
Ela torceu o rosto de desgosto.
— Não, desde a última vez na sua “casa”, por assim dizer, eu
não tive mais nenhum contato. — Mas ela almoçou com Cecília na
reunião com Lucas. — Deixe essa mulher para trás Edu, ela não faz
parte do nosso mundo, jamais se adaptaria a nossa vida e ela
escolheu te deixar, não foi? Ela te mandou embora!
— Só quero saber se ela está bem, nada demais. — Respondi
calmamente.
— Por que ela?
— Como?
— Por que ela e não eu? Eu me esforcei tanto tempo para ser
quem você iria querer estar, mas nada é o bastante. — Seus olhos
marejam. — Eu sou a mulher ideal para você, Eduardo! Eu! Mas só
você não é capaz de ver isso! — Arrastou a cadeira. — Já volto.
Me levanto também, pensando em ir embora, mas meu celular
começa a tocar.
— Pronto. — Atendo sem saber quem é.
— Eduardo! — Ah não. — Sou eu, Lucas... eu preciso da sua
ajuda, por favor, converse com a Paula, pergunte a ela se Cecília
mencionou estar sendo perseguida ou ameaçada, qualquer coisa, as
duas estão sempre em contato, pode ser que tenham conversado
sobre.
— O quê?
— Cecília acaba de ser sequestrada, bem na minha frente...
— E como deixou que ela fosse levada? Por que não
impediu? — Grito sentindo meu sangue se tornar fúria líquida.
— Foi tudo muito rápido... eu nem sei de onde vieram,
estávamos na calçada para o ultrassom. — Se calou.
— Ultrassom? Do que está falando?
Os dois estão juntos, só pode ser isso... ele finalmente
conseguiu o que tanto queria.
— Que gritaria é essa? — Paula apareceu na sala.
O visor de seu celular começou a brilhar e o nome de Cecília
apareceu, ela pegou rapidamente e desligou fazendo minha raiva
aumentar.
— Se ela ligar mais uma vez, atende.
— Edu, eu não sei por que ela está me ligando, deve ser
algum engano...
— Você está mentindo, eu sei que está porra! — Gritei
fazendo-a se assustar.
Paula caiu nas lágrimas, mas o showzinho dela não me
convence, sei que está apenas fazendo drama.
— Ela só queria mais dinheiro, fica constantemente falando
comigo porque quer que eu mande dinheiro para ela, sabe que eu
amo você e diz que vai te procurar se eu não fizer o que diz!
Gargalhei histericamente.
— Acha que vou acreditar nisso? Eu conheço a Cecília, Paula!
E conheço você!
O celular voltou a tocar e ela me olhou assustada.
— Edu.
— Atende essa porra, ou juro que não sei o que vou fazer com
você! — Minha preocupação maior agora é onde Cecília está e se
estão ligando para Paula é porque sabem que são próximas. — No
alto-falante.
— Cecília? — Disse atendendo. — Como está?
— A Cecília está indisposta agora, preciso que me faça um
favor, você conhece Eduardo Alencar, não é?
Acenei com a cabeça para que ela dissesse que sim.
— Sim, eu o conheço.
— Eu queria falar diretamente com ele, mas diga que estou
com a gravidinha e o filho bastardo dele em minhas mãos e que se
quer vê-la com vida e ter a chance de ver a criança nascer, que ele
entre em contato por esse número. — A voz era familiar para mim. —
E mostre a foto que vou te enviar a ele. — Encerrou a chamada.
— Deixa eu ver! — Falei entre dentes apontando para o
celular.
Paula virou o visor para mim, Cecília está amarrada a uma
cadeira amordaçada, os olhos vermelhos e inchados e preso em seu
peito a página de um exame de ultrassom.
Meu corpo inteiro treme convulsivamente, a raiva tomando
conta de mim.
Pego meu celular e ligo para o piloto do nosso jatinho.
— Prepare tudo para irmos para San Diego, preciso estar lá o
mais rápido possível!
Essa criança sendo ou não minha, ainda é Cecília quem está
lá, ainda é a mulher que virou meus sentimentos do avesso e não
vou deixar que aconteça nada.
Pego o celular de Paula e verifico a quantidade de vezes que
ela e Cecília conversaram, tanto por ligações quanto por mensagens.
— Você já sabia da gravidez. — Mas o tempo que Paula fala
com ela sobre a gestação data de pouco depois de eu ter vindo
embora.
— Chega Edu! Você não tem o direito de mexer, isso é
pessoal! — Ela tenta desesperadamente tirar o celular das minhas
mãos, mas a impeço.
Então chega o que penso ser o que ela não queria que eu
visse.
— VOCÊ ESTAVA TENTANDO CONVENCÊ-LA A
ABORTAR!? — Grito, desacreditado.
Capítulo 36
Meu coração bate na velocidade da luz enquanto encaro meu
raptor.
— Por quê? — É a pergunta que eu não consigo calar. — O
que foi que eu fiz de tão errado?
— Você nasceu, esse foi o problema inicial, a vagabunda da
sua mãe não quis te tirar enquanto teve tempo.
Olhei para o homem que chamo de pai e que venho cuidando
a vida toda, quanta ingratidão pode caber em uma única pessoa?
— Eu não consigo entender... — Senti meus olhos
transbordando. — Eu sempre me virei sozinha e depois que minha
mãe se foi, eu quem cuidei de você! — Deixei o meu choro livre, mas
isso não parece mexer com ele.
Fez uma careta teatral ofendida.
— Você nem ia me contar que vou ser vovô? Isso magoa,
Cecília. — Pegou meus exames antigos. — Amordace e amarre! A
voz dela me irrita.
Não entendi o que ele queria até ele pegar meu celular e pedir
o número de Eduardo para mim.
Neguei e ele puxou a mordaça.
— Eu não tenho, excluí a muito tempo.
Continuou mexendo no meu celular até encontrar minhas
conversas com Paula.
— Essa conhece ele então? Ótimo, vai ser ela que vai nos
levar até ele.
Ele ligou para Paula e fez toda uma cena, mandando foto e
tudo.
Fiz barulho tentando falar e ele deixou novamente.
— Então é isso? Tudo isso por dinheiro? Você não tem
vergonha?
— E você não tem vergonha de dar o golpe da barriga? Sua
mãe quis você pensando que iria me prender a ela, e não funcionou,
continuou sendo só uma vagabunda, como você é para ele. —
Sorriu.
— Está perdendo tempo pai, ele não se importa comigo, nem
sabe da existência dessa criança, Eduardo não vai te dar o que quer!
— Se ele não der o seu chefe dá. — O sorriso se ampliou. —
Estou te observando já tem um tempo, e aquele ali vai pagar o que
quer que eu peça, talvez eu peça aos dois. — Puxou de volta a
mordaça. — Agora fica quietinha aí.

Uma hora se passou até Eduardo entrar em contato, eles não


me soltaram nem um instante, nem mesmo para ir ao banheiro e
como estou grávida quero ir constantemente.
— Olha quem é que está ligando... — Virou o visor para mim,
era uma chamada de vídeo com a foto de Eduardo. — Vamos ver se
vai ser ele ou seu chefe quem vai vir montado no cavalo branco para
te salvar.
Meu pai paga uma máscara para não ser reconhecido e
atende à ligação.
— Queria que eu entrasse em contato, pronto, agora me diga
o que quer. — A voz de Edu me fez voltar a chorar. — Mas antes de
mais nada, onde ela está?
— Não é assim que funciona, primeiro eu vou te dizer o que
quero, depois que você me disser se está ou não disposto a fazer, aí
sim eu te dou uma prova de que ela está bem.
De onde estou, não consigo visão da tela, mas já imagino sua
cara, Eduardo não gosta de ser contrariado.
— Então me diz de uma vez o que porra você quer!
— Dinheiro, é isso que queremos. Você paga e ela e seu
bastardinho não sofrem um arranhão sequer.
— Quanto?
— Quinhentos mil.
— Feito, me deixe vê-la!
O quê?
— Você aceitou muito fácil, que tal um milhão?
— O que quiser, me deixe vê-la caralho! — Não imaginei que
essa seria a reação dele.
Meu pai virou a câmera do celular para mim, mas baixei o
olhar, não sei se suportaria isso agora.
— Como pôde ver, ela está inteira, mas se vai continuar
depende de você, mande o valor em um cartão...
— Um cartão? — Ficou em silêncio por um segundo. —
Entendi. Vou levar pessoalmente, me dê mais duas horas, já estou
indo para San Diego.
Ele está voltando para cá, por quê? Ele foi embora tão fácil,
ele me deixou para trás sem pestanejar, sem pensar duas vezes, por
que ele voltaria assim?
— Tudo bem, você tem duas horas, não demore muito, ou
podemos ficar entediados. — Desligou e veio em minha direção. —
Seja lá o que for que você tenha feito abrindo as pernas, funcionou,
os dois fariam qualquer coisa para ter você de volta, o outro está
aqui enchendo de mensagens, achei a galinha dos ovos de ouro.
Inspiro profundamente tentando manter a calma e faço uma
prece silenciosa para que eles não tentem nada mais idiota.
Edu não deveria vir, muito menos vir só, espero que ele não
faça isso.
Capítulo 37
— Paula, me diz que você não fez isso... que você não estava
tentando fazer ela abortar a criança porque é meu filho...
Eu não a amo, isso é óbvio, mas eu confiava nela, Paula era a
única mulher que eu mantinha contato, que de certa forma, estava
em minha vida.
Seu choro não me deixa dúvidas.
— Edu eu fiz isso por você, por favor me entenda, tudo o que
eu queria era te proteger, sabe que ela poderia voltar futuramente, te
obrigando a assumir a paternidade, exigindo coisas de você...
Precisei buscar forças para não fazer uma besteira.
— VOCÊ NÃO TEM O DIREITO DE TENTAR DECIDIR
ABSOLUTAMENTE NADA A RESPEITO DA MINHA VIDA! — Gritei
desesperado.
— Edu, eu te amo, eu te amo tanto... por que ela?
— Você não me ama Paula, só quer aquilo que não pode ter.
— Me aproximei olhando dentro dos olhos dela. — Fique longe de
mim. — Rosnei entre dentes. — Nunca mais se atreva a me dirigir
uma palavra sequer!
Dei as costas ouvindo seus gritos e saí da vida dela para
nunca mais voltar.

Em pouco menos de uma hora já estou a caminho de San


Diego.
“Eu não devia tê-la deixado.” — É o pensamento que continua
indo e vindo constantemente enquanto estou na aeronave a
caminho.
Lucas esteve em contato comigo, avisei sobre o resgate e ele
ficou me esperando no aeroporto.
— Entraram em contato com você novamente? — Perguntou
assim que desembarquei.
Neguei.
— Ainda não, mas eu disse que viria. — O delegado e o
detetive também estavam lá, me estenderam a mão e se
apresentaram.
— Viemos o mais rápido que pudemos desde que Sr. Jones
nos passou o que aconteceu, já estamos tentando localizar, como
eles estão utilizando o celular da vítima será mais fácil, por enquanto
o celular está desligado, assim que estiver ligado eles conseguem o
endereço. — O delegado me avisou. — Seja quem for, não é
experiente, o desleixo é exorbitante.
— Ótimo. Quando me ligarem novamente pode ser que
marquem um local para receber o dinheiro.
— Não se deve negociar com essa gente, Sr. Alencar. — O
detetive me chamou atenção.
— Esperava o quê? Que eu dissesse que eles não teriam o
dinheiro e que poderiam matá-la? Por favor, não teste a minha
paciência, combinado? — Inspirei profundamente. — Posso falar
com você a sós? — Perguntei a Lucas.
Ele assentiu e nós fomos andando para fora da pista e
conversando no caminho.
— O que quer saber? — Lucas iniciou.
— Por que não me avisou que ela estava grávida? Aquele
bebê é meu, não é? — Assentiu. — Não tinha o direito, a única que
poderia decidir isso, era Cecília e se ela não te contou, é porque não
confiava mais em você.
É claro que ele tem razão, eu tentei me explicar, mas tinha
que ter tentado mais, tinha que ter insistido até que ela me ouvisse,
mas deixei meu orgulho falar mais alto, mesmo sentindo falta dela
em cada partícula do meu ser.
— Entendo. — Respondi finalmente. — Obrigado por estar
com ela quando eu fui um idiota e não estive.
— Não fiz nada por você, e ela também não me deixou fazer
muita coisa, acredite, não foi por falta de tentar.

Ficamos aguardando notícias, tanto da polícia rastreando o


celular, quanto do sequestrador me ligar.
Um rapaz entrou na sala do delegado com os olhos
arregalados.
— Ligaram o celular! Já temos o endereço.
Nos levantamos todos.
— Vocês não vão! — O delegado falou para mim e Lucas. —
Ter civis só serve para nos atrapalhar.
— Eu não vou discutir. Vamos de uma vez! — Respondi com
raiva mal disfarçada.
— Tenho que concordar, estamos perdendo tempo aqui. —
Lucas me apoiou.
— Me obedeçam.
Assentimos sem paciência e fomos para o local.
Meu celular começou a tocar quando a polícia estava se
posicionando ao redor da casa.
— Atenda. — O delegado disse.
— Pensei que fosse um homem de palavra, parece que me
enganei. — A voz parece mais aflita dessa vez.
— Queremos apenas negociar, vocês estão cercados, então o
que acham de se entregarem e saímos todos bem daqui? — O
negociador foi quem falou.
— Quero a porra do meu dinheiro! Mandem o engomadinho
entrar e me entregar o cartão e saiam daqui!
— Isso infelizmente não será possível, não podemos colocar
em risco a vida de mais um civil, vamos, colabore comigo.
— O que pode fazer?
— Se entregue, não há muitas saídas para vocês.
A negociação durou mais de uma hora, até que um acordo foi
feito, eles sairiam para pegar o dinheiro, mas queriam um carro na
frente da porta para irem embora e que o cartão estivesse lá, mas foi
convencido de que um policial entregaria o cartão para pegar Cecília.
Assim que eles passaram pela porta os olhos passou por
todos e parou quando encontrou com os meus.
Tentaram me impedir, mas passei por todos e corri em direção
a ela pela lateral, já que estavam parcialmente cobertos pelo carro.
— O dinheiro que me pediu está todo aí, soltem ela! — O
policial estava equipado e me arrastou para trás dele.
— Como vou ter certeza disso? E se estiver me enganando?
— Estavam os 3 homens de máscaras e armados.
— Estou te garantindo.
O carro está ligado com a chave no contato e ele olhou para
dentro, os outros dois entraram e a porta ficou aberta.
— Não acredito em você!
Ele tentou entrar dentro do carro com Cecília, mas eu passei
pelo policial que estava na minha frente e me joguei entre eles, puxei
Cecília para mim e ouvi o primeiro disparo.
Meu braço começou a arder, mas a arrastei para o mais longe
que pude rapidamente.
O caos havia se instaurado, outros policiais se aproximaram
assim que viram o que aconteceu.
A polícia acabou matando os três homens, vi pela lateral da
casa onde havia levado Cecília.
— Está tudo bem, tudo bem. — Seu pequeno corpo sacudia
como uma folha ao vento. — Está tudo bem, você está a salvo. —
Repeti várias vezes tentando fazê-la se acalmar.
Soltei a mordaça que estava em sua boca e as cordas em
seus pulsos. A abracei como se precisasse daquilo para sobreviver,
porque honestamente, sinto que preciso.
Capítulo 38
Eduardo me abraçou e começou a se mover para me tirar dali.
— Não olha...
Fixei meus olhos nos homens mortos.
— É meu pai. — Consegui pronunciar me libertando de seus
braços e caminhando em direção ao homem que estava no chão me
abaixei do lado do corpo. — Eu imaginei que seria pior, que quando
ele se fosse eu me sentiria só, mas tudo o que sinto é alívio. — Olhei
para Eduardo.
Senti que muitos ao meu redor estavam me observando.
— Você tem a mim... se quiser, é claro... e agora tem nosso
filho, não precisa se sentir só. — Eduardo está agachado ao meu
lado.
Levei as mãos instintivamente para meu ventre, que ainda é
pequeno, mas já mostra que eu não ando mais sozinha.
Uma paramédica se aproximou de mim.
— Senhora, não fique aqui, venha, vamos ver se está tudo
bem com você e com seu bebê.
Lucas também veio para perto de mim.
— Você está bem? — Perguntou. — Sinto muito por não ter
conseguido impedir que te levassem.
Tentei falar, eu queria mesmo não deixar que se sentisse mal,
mas não consegui, estou exausta, sentindo finalmente o peso de
tudo o que tinha acontecido ali.
— Ela só precisa de um tempo para processar tudo. — A
paramédica falou. — Vem querida. — Ela olhou para o braço de
Eduardo, estava sangrando, coisa que eu ainda não tinha notado. —
Você também.
— Está ferido. — Olhei com preocupação.
— Foi só de raspão, não foi nada.
Fui com ela até uma ambulância, com Eduardo e Lucas me
observando de perto, os dois tão ansiosos e angustiados quanto eu
enquanto sou examinada.
Um homem se aproximou e sorriu para mim. Se apresentou
como delegado.
— Teremos que nos falar em breve, sei que não é o melhor
momento, mas preciso entender melhor o que foi que aconteceu
aqui.
— Isso pode esperar um pouco, não pode? — Eduardo não
disfarçou a irritação para falar.
— Pode sim, mas vou procurá-los em breve.
Assenti e ele se foi.
— Bom, aparentemente está tudo bem com ela e com a
criança, mas sugiro que façam exames mais aprofundados o mais
rápido possível, ela passou por fortes emoções. — A paramédica
sorriu para mim de maneira calorosa. — Fique bem, querida.
— Posso levar você? — Eduardo ofereceu com os olhos
esperançosos.
Lucas estava um pouco mais atrás, seu rosto já demonstrando
tristeza.
— Acho que vocês precisam conversar, não é? Vou indo,
Cecília... — Seu olhar se demorou no meu por um momento, mas em
seguida se virou e foi.

O carro está um silêncio mortal, estou abraçado ao meu


próprio corpo, não consegui iniciar uma conversa e ele parece
ansioso e agoniado, não para de se mexer e olha constantemente
para mim.
Ele parou diante de um hotel.
— Você precisa de um banho e descansar um pouco, vou
pedir que venha uma equipe médica te avaliar com mais calma, em
menos de uma hora eles provavelmente estarão aqui.
Balancei a cabeça positivamente.
— Poderia ter me levado para minha casa.
— Me desculpe, eu não te perguntei para onde gostaria de ir...
se quiser...
— Não, tudo bem. — O interrompi. — Preciso ir para o banho.
Eduardo me guiou até o banheiro e implorou que eu não
fechasse a porta, está preocupado que eu possa cair, desmaiar, ficar
presa, citou inúmeras coisas que podem dar errado.
— Você acaba de passar por um trauma e o estresse pode se
manifestar de formas diferentes e em momentos distintos, me chame
se precisar.
Agora que ele mencionou, acho que estou mesmo em choque,
porque não estou conseguindo sentir, não sinto absolutamente nada,
não consigo chorar, não consigo ficar feliz com a presença dele, nem
nervosa, nem angustiada, é como se fosse só um grande vazio.
Em um momento do banho Eduardo bateu na porta dizendo
que deixou roupas limpas penduradas na maçaneta, eu nem tinha
pensado nisso...
Saí do banho e uma equipe estava me esperando, não
percebi que demorei tanto debaixo do chuveiro.
— Vamos fazer um ultrassom, para saber como é que seu
bebê está e examinar mais a fundo sua situação.
Eduardo está andando de um lado para o outro, mas quando
o médico foi encostar o aparelho na minha barriga, ele se sentou na
ponta da cama olhando fixamente para a tela.
O som do coração do nosso filho começou a soar e o vi tremer
levando as mãos à boca.
— Isso é...
— Sim, está tudo muito bem com a criança.
Observei atentamente a reação de Edu, seus olhos não
contêm as lágrimas incessantes, ele não desgruda da tela, pergunta
cada detalhe ao médico, pede para filmar e enviar para ele.
— É tão lindo... — Finalmente me olhou. — É perfeito,
obrigado, Cecília! — E volta a chorar como uma criança que quebrou
o presente favorito.
Depois que todos saíram, olhei para ele e resolvi iniciar a
conversa que sei que precisamos ter.
— Eduardo, eu...
— Você precisa comer e descansar Ceci, nós vamos
conversar, mas hoje você já passou por coisas demais, vou esperar
seu tempo, aguardar que você esteja recuperada.
Senti meu corpo inteiro implorar por descanso.
— Acho que é uma boa ideia.
Abriu um sorriso terno.
— Eu sei...será que eu posso? — Apontou para a minha
barriga. — Quero sentir, está tão pequenina ainda.
Acenei com a cabeça e ele aproximou as mãos com cuidado,
o choque de suas mãos em minha pele novamente fez com que eu
finalmente sentisse algo.
Edu acariciou com calma e delicadeza, parecendo
completamente encantado com o que estava vendo e meu coração
acelerou juntamente com a respiração.
“Ele está realmente aqui, ele veio por nós!”
Capítulo 39
Precisei esperar até ter certeza de que ela está bem, deixei
que descansasse e depois, no dia seguinte, quando se sentiu à
vontade, veio até mim.
— Está tudo bem? — Perguntei.
— Estou sim, muito obrigada por tudo.
— Não precisa me agradecer. — Ela brincou com os dedos
nervosamente, sem me encarar. — Você não pretendia me contar
nada?
— Para ser honesta, não, eu não pretendia, queria apenas
seguir minha vida e cuidar do meu filho bem longe de você. —
Respondeu me olhando nos olhos.
Não consigo entender, sei que nos separamos, mas um filho
não é algo que se deva manter escondido apenas por um término.
— Pode me explicar por quê?
Ela puxou o ar com força, seu olhar vagou para algum ponto
longe de mim, talvez decidindo se deveria ou não me contar.
— Quando Paula me contou sobre você, o Eduardo Alencar
de verdade, e eu vi todas aquelas fotos, todas aquelas notícias e
mulheres... fiquei chocada, não posso mentir, mas eu queria ouvir
você, queria acreditar que ficaríamos bem. — Ela respirou e
prosseguiu. — Passei mal, Paula estava comigo, foi no banheiro do
restaurante que eu descobri a gravidez, ela comprou os testes para
mim. — Cada vez que ela fala o nome de Paula, sinto meu estômago
se comprimir. — Mesmo depois de tudo o que ela disse, eu quis falar
com você, mas quando cheguei na sala de Lucas e escutei que eu
era apenas um jogo, um meio que você encontrou dele falar com sua
mãe e te mandar embora, então resolvi que seria apenas eu e o
bebê.
Respirei fundo, ela passou por muita coisa e o que menos
precisa nesse momento é discussão.
— Entendo, mas ainda assim sou o pai e deveria saber da
existência do meu filho, Ceci. — Fechei os olhos por alguns
segundos. — Isso não importa mais, agora eu sei e não vou deixar
você nem nosso filho sozinhos.
— Você não precisa fazer isso se não quiser Eduardo, eu
posso muito bem continuar sozinha.
— Mas não precisa mais estar, sei que se acostumou a não
ter ninguém por você, mas tem a mim agora e mesmo que não
queira me dar uma chance de consertar as coisas entre nós, estarei
sempre cuidando de você e do nosso bebê.
— A sua vida, ela não combina com nada disso Eduardo, você
está sempre cercado de mulheres e...
— Sim Cecília, eu era assim, não vou mentir, mas você me
mudou, procure, em todo esse tempo que estive fora eu só trabalhei
e me mantive completamente recluso, não há nada sobre mim na
internet. Eu mudei por você Cecília, e eu senti tanto a sua falta.
Pela primeira vez depois de tudo o que aconteceu ela chorou,
seu corpo se sacudiu libertando toda a dor que ela passou.
Estranhei por ela ainda não ter desabado, mas a barragem
finalmente se rompeu e ela está colocando tudo para fora.
Se passaram mais de duas horas até ela se acalmar e durante
todo o tempo fiquei ao seu lado, abraçando e dando todo o apoio que
poderia.

Uma semana se passou e eu ajudei Cecília a resolver tudo o


que precisava, a apoiei durante o velório de seu pai, fiquei com ela
no depoimento na delegacia, não a deixei só em nenhum momento.
Durante esses dias, não falamos sobre nós, mas em algum
momento eu terei que perguntar, Seattle está me aguardando, mas
se Ceci não for comigo, ficarei em San Diego por ela e nosso
pequenino.
Em uma manhã após o café, eu tomei coragem para
perguntar.
— Ceci, eu preciso saber de algo, não quero te pressionar,
mas preciso saber. — Respirei fundo. — Você me daria mais uma
chance? De fazer as coisas direito, retomar de onde paramos...
Ela ficou calada por alguns segundos, segundos que se
pareceram horas e que estavam consumindo minha alma.
Seus olhos grandes não desviam dos meus, como se
observassem minha alma.
— Como é que eu recusaria o pedido de alguém que se jogou
na frente de uma bala, arriscando a própria vida para me salvar? —
Perguntou e prosseguiu sem esperar uma resposta. — Por que eu
rejeitaria o pai do meu filho e o homem que eu amo?
Desabei!
Meus olhos inundaram com a emoção das palavras que ouvi e
eu a beijei como se o mundo fosse acabar naquele instante, como se
dependesse daquilo para sobreviver.
— Eu te amo Ceci, não sei por que não te disse isso antes,
mas eu amo, passei pelo inferno nesses dias em que você não
estava ao meu lado. — Ela abriu seu sorriso mais lindo. — Vem
morar comigo? Casa comigo?
Sua boca se abriu em um O de espanto que ela cobriu com as
mãos alguns instantes depois.
— Não há mais nada que me prenda aqui... eu vou...
— Eu te fiz duas perguntas. — Sorri.
— Sim!
Ataquei seus lábios viciantes novamente.
Capítulo 40
Eu o amo, e jamais senti nada tão forte e poderoso assim,
Edu errou comigo, eu errei em não dar a chance que me pediu de se
explicar, mas alguém que não me ama e que não se importa comigo,
jamais pularia na frente de uma bala por mim.
Não quero mais ficar longe dele, e mesmo que quisesse, não
poderia, Edu fará para sempre parte da minha vida.
Retribuo seu beijo com igual intensidade.
— Vou te fazer a mulher mais feliz desse mundo! — Sorrio.
Suas mãos passeiam pelo meu corpo, deixando um rastro de fogo
por onde passam. — Senti tanto a sua falta. — Sussurra em meus
lábios. — Preciso de você...
Sua mão puxa levemente meu cabelo pela nuca, deixando
meu pescoço completamente exposto e ele beija cada pedacinho da
pele ali, arrancando de mim suspiros e gemidos de prazer.
Desde que ele se foi eu não fui tocada dessa maneira, e céus,
como isso é bom!
Edu me carrega no colo até o quarto e me deita na cama, ele
esfrega a ereção na minha fonte de maior desejo.
Em questão de segundos estamos os dois nus, sua língua
está explorando o meio de minhas coxas e me levando ao céu.
— Como você é gostosa! — As lambidas fazem meu corpo se
contorcer.
— Edu... — Imploro e ele entende o recado.
Se posiciona entre minhas pernas e mergulha em mim, seus
movimentos começam suaves, mas isso não dura muito, logo ele
está se movendo para buscar seu orgasmo e eu o meu.
As palavras que saem dos meus lábios já deixaram de ser
coerentes a muito tempo, a única coisa que é possível entender é
seu nome, que repito como uma prece.
— Não me canso de ouvir você gemer meu nome Ceci.
Agora eu consigo entender por que dizem sobre reconciliação,
é muito intenso.

No dia seguinte fui até a empresa para conversar com Lucas,


não queria deixá-lo na mão, ele estava ao meu lado em muitos
momentos.
Edu não gostou da ideia de me deixar ir sozinha falar com ele,
mas o convenci.
— Como está se sentindo? — Perguntou assim que me viu. —
Esse escritório não é o mesmo sem você, mas pela sua cara, já sei o
que veio fazer aqui.
Baixei o olhar.
— Fizemos as pazes e ele me chamou para ir morar com ele
em Seattle, eu aceitei.
Seus olhos tristes se encontraram com os meus.
— Só quero que seja feliz Cecília, e mesmo que anos se
passem, saiba que você tem para onde voltar.
Se aproximou de mim e me prendeu em um abraço apertado.
— Obrigada. — Sussurrei.
— Eu te amo Cecília, e estarei aqui sempre que precisar. —
Meus olhos se encheram de lágrimas.
— Você é um homem bom Lucas, espero que um dia encontre
alguém que te dê o valor que merece.
Ele me soltou e olhou em meus olhos.
— Seja muito feliz, e não se preocupe, eu procuro alguém
para trabalhar aqui.
— Obrigada, por tudo Lucas.
Lucas era a única pessoa que eu tinha realmente próxima
aqui, mas agora eu iria iniciar mais um capítulo em minha vida.
Estava finalmente formada, iria ter meu filho em alguns meses
e estava noiva de Eduardo, o playboy mais desejado de Seattle...
Capítulo 41
Aproveitei o tempo que Ceci estava fora resolvendo as coisas
com Lucas e depois com a faculdade, para ligar para preparar nossa
ida para casa e depois liguei para Dona Carmen.
— Mãe?
— Edu, onde é que você se meteu? Te liguei várias vezes, já
faz dias que não aparece!
— Eu sei mãe, me desculpe, mas garanto que foi por um bom
motivo.
— Paula me disse que você a dispensou, o que é que está
acontecendo? Pensei que vocês tinham voltado a se aproximar.
— Se preza por nossa relação, por favor, nunca mais
mencione essa mulher.
— Me diga o porquê.
— Eu vou ser pai, mãe! E acabei de pedir em casamento a
mulher que eu amo, Paula sabia da gravidez dela a meses e tentou
fazer com que ela tirasse o meu filho da forma mais baixa possível. É
o bastante para a senhora?
Ela ficou muda por algum tempo.
— Eu vou matá-la! — Sorri.
— Deixe isso para lá, por favor.
— Ela tentou tirar meu neto de mim! E você diz para que eu
deixe isso para lá? Aquela garota vai ter uma lição, a farei fechar as
portas da empresa dela, você vai ver só! — Está completamente
alterada. — Quando você vem para casa?
— Hoje mesmo, Cecília aceitou meu pedido, está apenas
resolvendo algumas coisas e vamos sair daqui. Preciso de um favor
mãe, é urgente...
— Diga.
— Quero que prepare meu apartamento para um pedido
formal de casamento, e escolha um lindo anel para ela.
— Pode deixar, eu farei!
— A senhora está bem, mãe? Estou um pouco preocupado...
— Eu terei o maior prazer em conhecer e ter em minha vida a
mulher que fez meu filho se tornar um homem e de quebra me deu
um neto... não se preocupe, estará tudo pronto.
Minha mãe também havia mudado muito desde que voltei
para casa, é uma boa versão dela e estou vivendo minha melhor
fase.
Ceci não demorou muito a chegar, parecia tranquila.
— Levei flores para minha mãe. — Disse. — Acho que
finalmente a perdoei, depois de ver como meu pai falava dela, acho
que não tinha como ter uma boa sanidade... — Deu um sorriso triste.
— Quer levar algo da sua casa? Podemos ir buscar.
— Não! — Respondeu com firmeza. — Não quero nada que
me lembre desse lugar, não tem muita coisa boa para me lembrar e o
que vou levar de coisas boas estará em meu coração.
Assenti e suspirei aliviado.
— Vamos conhecer nossa casa?
Ceci dormiu por quase todo o caminho, precisei chamar
quando pousamos no aeroporto.
No carro ela observou tudo com admiração.
— Espero que goste daqui.
— Tenho certeza de que vou me adaptar bem. — Respondeu
animada. — Você mora em apartamento, não é?
— Nós moramos. — Sorri.
— Eu gosto de casas, espaço para ter um jardim, para nosso
bebê correr e brincar.
— É algo a ser estudado, mas vamos pensar nisso depois,
tudo bem? Prometo que vamos analisar com calma.
Cecília fechou o sorrisinho que estava no rosto.
— Você falou com sua mãe sobre mim?
Assenti.
— Ela sabe sim.
— Será que ela vai gostar de mim? — Mordeu o interior da
bochecha. — Eu não sou como vocês Edu, e se ela me odiar? Ou
não gostar dos meus modos? Ou da minha origem.
— Cecília, calma!
Chegamos na frente do prédio e ela olhou para tudo com
deslumbre.
O porteiro pediu que nós o acompanhássemos.
— Sua mãe está aguardando no salão.
Arregalei os olhos.
— Obrigado. — Respondi já imaginando o que Dona Carmen
fez.
Ceci me olhou.
— O que está acontecendo? Já vou conhecer sua mãe? Eu
não estava preparada, Edu...
— Vamos, vai dar tudo certo. Estou ao seu lado, lembra? —
Aproximei minha boca de sua orelha. — Você está maravilhosa,
principalmente com essa barriguinha de grávida...
Ela sorriu e eu a guiei até o salão.
Capítulo 42
A entrada do salão estava completamente decorada com
flores, e assim que colocamos os pés para dentro eu fui cegada
pelos flashs.
— Droga, mãe! — Eduardo exclamou enquanto pedia para
que as pessoas parassem de fotografar.
Uma senhora elegante veio caminhando em nossa direção.
— Bem-vindos. — Disse com um sorriso grande. — A
querida... — Colocou as duas mãos na boca e seus olhos
lacrimejaram.
— Mãe? Está chorando? — Edu perguntou com espanto. —
Acho melhor chamarmos um médico, ou um exorcista, você não é a
minha mãe.
— Não seja indelicado, Eduardo Alencar! Que avó não ficaria
feliz em ver onde está sendo gerado seu netinho? — Ela se
aproximou de mim e estendeu a mão. — Posso? — Acenei com a
cabeça e ela encostou a mão na minha barriga sorrindo feliz. —
Ainda está tão pequenininha, não está? tem certeza de que está tudo
bem? Vamos ao médico amanhã mesmo!
— Mãe, não a assuste, por favor, ainda quero me casar com
ela...
— Eu sou Carmen, é um prazer te conhecer...
— O prazer é todo meu, sou Cecília.
— Um nome tão lindo quanto você!
Eduardo pegou em minha mãe e me conduziu para o centro
do salão, notei que Paula estava entre os rostos sorridentes, ela nos
olhava sem esboçar nenhuma expressão.
Eduardo se ajoelhou abrindo uma caixinha de veludo.
— Cecília Richards, você é a mulher mais incrível que eu já
tive o prazer de conhecer, mudou toda a minha vida e me deu o
presente mais lindo que alguém poderia me dar, ainda assim, quero
algo mais, seja minha, case-se comigo?
Cobri minha boca, já deixando as lágrimas escorrerem, mas
não consegui abrir a boca.
— Será que poderia não me deixar preocupado e responder?
As pessoas estão esperando e meu joelho está começando a doer.
— Sorri.
— SIM! — Gritei.
Para mim, naquele momento existe apenas nós dois. Nada
mais ao redor importa.
Ele se levantou, me abraçou e me deu um longo beijo.
Um estouro de palmas começou.
Procurei com o olhar pela minha futura sogra e ela estava
arrastando Paula para perto de nós, estava disfarçando, mas parecia
um pouco rude.
— Está vendo essa família? Isso inclui a criança que está no
ventre, não se aproxime ou farei você viver o inferno. — Ela estava
falando baixo, mas com a proximidade conseguimos ouvir. — Nunca
mais mexa com a minha família.
Paula olhou para mim com uma raiva mal disfarçada puxou o
braço das mãos de Dona Carmen e sumiu no meio das outras
pessoas.
Não entendi o que foi que aconteceu, mas com certeza não
perguntaria nada.

O decorrer da festa foi lindo, Edu me apresentou a muitas


pessoas, em um momento foi dar uma entrevista e Dona Carmen me
chamou para conversar em um canto mais reservado.
— Tudo entre vocês aconteceu muito rápido. — Comentou.
— Eu sei, mas garanto a senhora que antes eu nem sabia
sobre quem ele era de verdade.
— Sei disso, essa regra quem colocou fui eu, ninguém deveria
saber. Eu não poderia estar mais feliz vendo o desenvolvimento do
meu filho. — Ela sorriu. — Cecília você operou um milagre, e não
apenas nele, mas na nossa relação como mãe e filho.
— Imagina, eu não fiz nada.
— Fez, Edu e eu nunca fomos próximos, o jeito dele, as
coisas que ele fazia, bastávamos estar perto um do outro que
estávamos discutindo. Hoje eu posso dizer que além de um filho eu
tenho um amigo e parceiro nos negócios, era tudo o que eu queria...
que meu filho amadurecesse, que se tornasse um homem, isso eu
devo a você.
Não soube o que responder, então sorri para ela.
— Obrigada por me receber tão bem.
— Bem-vinda a família Alencar querida.
Quatro anos depois
— Emily, venha almoçar meu amor, você não quer perder o
passeio mais tarde, não é? — Minha menina estava prestes a
completar cinco anos e pediu ao papai que a levasse para conhecer
as princesas, ela é apaixonada pela Merida.
— Sim mamãe. — Me respondeu com sua voz doce.
— Você é mais obediente que seu pai. Onde é que ele está?
vamos acabar nos atrasando desse jeito!
Eduardo assumiu a frente das empresas, mas não sozinho,
estou ao seu lado e fazendo minha segunda faculdade, para poder
entender ainda melhor sobre a empresa.
Minha sogra e eu nos damos muito bem e ela faz questão de
estar com Emily enquanto eu e Edu estamos na empresa.
— Não se preocupe querida, ele deve estar aqui em breve,
sabe que ele jamais decepcionaria o nosso docinho. — Carmen
acariciou os cabelos de Emy. — Já pensou no que farão no
aniversário de casamento?
— Ainda não, não sei se conseguiremos viajar duas vezes
assim, talvez seja melhor deixar para o próximo.
Meu casamento com Edu foi como um conto de fadas, ele
preparou tudo em menos de um mês, de acordo com ele, não queria
que eu percebesse o quanto ele não merecia se casar com um anjo.
A cerimônia foi em uma ilha, com poucos convidados, do
jeitinho que eu sempre sonhei.
Ele tentou reproduzir cada uma das coisas que pedi com a
maior perfeição que pode, e eu me sinto cada vez mais apaixonada
pelo homem que escolhi amar.
— De forma alguma, se for necessário fico na empresa para
vocês. — Sorriu. — Me aposentei, mas ainda sou a mesma Carmen
que conduz tudo com punhos de ferro.
— Obrigada! — Peguei minha bolsa para verificar pela
milésima vez os documentos. — Será que está mesmo tudo aqui?
Carmen caiu na gargalhada.
— Cecília, se acalme um pouco, a viagem não é nada demais
e se algo faltar conseguimos em poucos minutos.
— Estou ansiosa porque Emy nunca viajou para tão longe e
quero que seja perfeito porque ela idealizou tanto esse momento...
—Imagino que esteja tão ansiosa quanto ela para vê-la feliz.
E estou, minha pequena foi o maior presente que essa vida já
proporcionou e amo cada minuto ser sua mãe.
— Cheguei! — Edu anunciou.
— O que é que estava fazendo para demorar tanto assim? —
Ele me deu um beijo, depois beijou a mãe e pegou Emily no colo.
— Tive problemas de última hora, sinto muito meu amor,
vamos almoçar e iniciar nossa viagem em família!
Emy bateu palmas animada e seu riso contagiou a todos nós.
Antes de me sentar para o almoço, verifiquei as malas mais
uma vez, e os remédios na minha pequena maletinha de primeiros-
socorros, depois de me tornar mãe eu nunca mais pude deixar de
andar prevenida.
Nos sentamos e iniciamos uma conversa descontraída, mas
assim que eu coloquei o primeiro garfo de comida na boca, meu
estômago protestou e eu me levantei às pressas para ir ao banheiro.
Edu veio logo atrás de mim e segurou meu cabelo enquanto
eu colocava até o que eu não tinha para fora.
Quando finalmente consegui parar, nós nos olhamos por
alguns instantes.
— O que foi isso? — Perguntou me olhando.
Comecei com as contas mentais e depois passei a contar nos
dedos, nesse momento Carmen e Emy também já estavam lá.
Os olhos de Eduardo estão arregalados enquanto me espera
terminar de contar.
— Estou atrasada... acho que... — As palavras estão presas
na garganta. — Acho que a família vai crescer novamente.
Os risos e lágrimas de felicidade preencheram o banheiro,
uma explosão de emoções indescritíveis.
Edu e eu estamos vivendo da melhor forma possível o nosso
FELIZES PARA SEMPRE!
Angel nasceu em 9 de fevereiro de 1995 em SP.
Desde os 8 anos sempre foi apaixonada pela leitura e quem
quer que quisesse vê-la feliz, bastava que lhe trouxesse um livro,
mas seu gênero favorito sempre foi o romance.
Apaixonada por seu esposo, seus dois filhos e seus três
doguinhos, cada um de seus dias é mais corrido que o anterior com
essa turminha.
Escritora a pouco mais de dois anos, iniciou na plataforma
Dreame, onde há outros trabalhos. Tem paixão por romances
clichês, dark e new adult.
Na data de 28/03/2023 lançou seu primeiro livro na
plataforma Amazon “O play boy e a secretária”
Me acompanhem no instagram para ficar por dentro de todas
as novidades.
https://instagram.com/angel_autora?igshid=YmMyMTA2M2Y=

Próximo lançamento – Vamos conhecer Cedric e Blair.


Agradeço a Ane Le e Helô Oliveira, por ajudarem a entender
como deveria fazer para que tudo fosse perfeito e por não me
deixarem desistir... e até aguentar alguns surtinhos às vezes.
Ao dom que me foi presenteado e a tudo de bom que ele
influencia em minha vida.
Agradeço também a cada um de vocês que estão aqui.

[1]
Prédio de apartamentos de luxo localizado na 1301 Spring St, Seattle.
[2]
Festa na piscina

[3]
Cidade da Califórnia, EUA.
[4] Considerado um carro raro, já que apenas 5 unidades foram fabricadas.
[5]
Atividade que é praticada por prazer nos tempos livres.
[6]
Comida típica da Califórnia, macarrão com ovos, carnes, bacon e cebolinha se
“unindo em matrimônio” num delicioso Wrap.

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