Dissertação Marco Aurélio
Dissertação Marco Aurélio
Dissertação Marco Aurélio
CURITIBA
2020
MARCO AURÉLIO DOS SANTOS PINTO
CURITIBA
2020
MARCO AURÉLIO DOS SANTOS PINTO
COMISSÃO EXAMINADORA
__________________________________________________
Professora Doutora Viviane Coelho de Séllos Knoerr (orientadora)
Centro Universitário Curitiba - UNICURITIBA
________________________________
Professor Doutor Luiz Eduardo Gunther
Centro Universitário Curitiba - UNICURITIBA
_______________________________________________
Professor Doutor Ivan Dias da Motta
A minha esposa Ana Lúcia Maggioni e minhas filhas Mariana Maggioni Pinto e
Beatriz Maggioni Pinto, por serem a minha luz e fonte de inspiração para novos desafios.
Aos meus pais Durval Antonio Pinto e Benilde dos Santos Pinto pelo apoio e
incentivo em todos os momentos da minha vida.
Ao me avô João Antonio Pinto (in memoriam), autodidata, que em sua vida sempre
me mostrou que o conhecimento é a base para a evolução espiritual.
AGRADECIMENTOS
LISTA DE SIGLAS
LISTA DE TABELAS
LISTA DE IMAGENS
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO
1 CONTRATO DE TRABALHO
1.1 AUTONOMIA PRIVADA – INDIVIDUAL E COLETIVA
1.2 AUTONOMIA PRIVADA LABORAL
1.3 AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA LABORAL
1.4 Alteração do contrato de trabalho – princípio da imodificabilidade do contrato
de trabalho
1.4.1 Poder Diretivo e jus variandi
1.5 ADERÊNCIA DAS CLÁUSULAS NORMATIVAS AO CONTRATO DE
TRABALHO INDIVIDUAL
1.5.1 Recurso Extraordinário 590.415 Min. Luis Roberto Barroso
1.5.2 Recurso Extraordinário 820.729 Min. Teori Albino Zawaski
1.5.3 Repercussão Geral Min. Gilmar Mendes
1.6 RELAÇÃO CONTRATUAL TRABALHISTA
2 ANÁLISE QUANTITATIVA DOS PRINCIPAIS TEMAS RECORRENTES
SOBRE ABUSO DO PODER DIRETIVO À LUZ DA JUSTIÇA DO TRABALHO
2.1 CONSEQUÊNCIA PELA FALTA DE PARAMETRIZAÇÃO DOS LIMITES E
ALCANCE DO PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR
2.1.1 A Jurimetria e o Direito do Trabalho
2.2 O PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR
2.2.1 Origem do Poder diretivo do empregador
2.3 A SUBORDINAÇÃO JURÍDICA DO EMPREGADO
2.4 O PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR À LUZ DOS FUNDAMENTOS
CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS – CLT
2.4.1 Poder Disciplinar
2.5 NATUREZA JURÍDICA DO PODER DIRETIVO
3 COMPLIANCE COMO MECANISMO DE TUTELA DA RELAÇÃO
CONTRATUAL TRABALHISTA
3.1 CONCEITO DE COMPLIANCE
3.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO NORTEADORES DO
COMPLIANCE TRABALHISTA
3.2.1 Princípio da vedação ao retrocesso
3.2.2 Princípio da justiça social e da valorização do trabalho
3.2.3 Princípio da Valorização do trabalho
3.2.4 Princípio da primazia da realidade sobre a forma
3.3 COMPLIANCE TRABALHISTA COMO PARÂMETRO DE COMPORTAMENTO
DO EMPREGADOR E DO EMPREGADO: EFETIVIDADE CONTRATUAL
3.3.1 Há espaço para o compliance na esfera laboral?
3.4 COMPLIANCE TRABALHISTA COMO INSTRUMENTO DE CONSTRUÇÃO
DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
LISTA DE SIGLAS
Autonomia – pg. 36
Jus variandi – pg. 42
STF: negociado sobre o legislado – pg. 50
Relação laboral – pg. 56
Temas recorrentes – pg. 60
Subordinação – pg. 75
Poder diretivo e disciplinar – pg. 80
Da constituição ao Compliance – pg. 87
LISTA DE IMAGENS
2018
Acúmulo de função – pg. 57
Desvio de função – pg. 58
Assédio moral – pg. 58
2019
Assédio moral – pg. 59
Desvio de função – pg. 59
Acúmulo de função – pg. 59
2020
Acúmulo de função – pg. 59
Desvio de função – pg. 59
Assédio moral – pg. 60
RESUMO
A pesquisa objetiva analisar em que medida o Compliance pode ser utilizado como
mecanismo de tutela dos limites do poder diretivo do empregador no que tange os
contratos individuais e coletivos de trabalho. Para tanto, a análise se desenvolve a
partir da conceituação de contratos, desde a visão de Enzo Roppo, passa pela
peculiaridade do contrato laboral individual e das negociações coletivas de trabalho,
da qual se desenvolve a Convenção Coletiva e/ou o Acordo Coletivo de Trabalho, o
que exige observar institutos que perpassam pela relação contratual, tais como
autonomia privada, individual e coletiva, de modo a contribuir com a indagação quanto
a liberdade de contratar. Examinam-se as condições do contrato individual de trabalho
que, não raramente, deparam-se com o princípio da primazia da realidade sobre a
forma, princípio que vai de encontro com o tema da dissertação, na medida em que o
abuso do poder diretivo, não raramente, pode ocorrer justamente porque aquilo que
se pratica (as execuções das tarefas diárias) nem sempre correspondem com o teor
do contrato. A dissertação se atenta à tutula constitucional e celetário do poder diretivo
do empregador, desde a origem e sua natureza jurídica, de modo a indicar que o Programa
de Compliance trabalhista pode parametrizar o comportamento do empregador em relação
ao seus empregados, bem como antecipa aos empregados suas obrigações. Porém, a
dissertação ainda percorre pelo viés de hipóteses quanto ao fato do Compliance ser
ou não efetivo à tutelar direitos trabalhistas. Nesse sentido, a pesquisa percorre pela
análise de dados extraídos do sítio eletrônico do Tribunal Superior do Trabalho, que
tem o ranking dos principais temas julgados pela Justiça trabalhista, a qual, pela via
da jurimetria, se torna possível verificar que o tema: Abuso do Poder diretivo, e seus
subtópicos, (assédio moral, desvio de função e acúmulo de função), ainda são
recorrentes na justiça especializada. Portanto, fixando parametros de limites do poder
diretivo do empregador em relação às alterações contratuais, bem como às
exigências de atividades alheias àquelas constantes no contrato de trabalho, se
analisará em que medida o Compliance pode ser mecanismo de tutela dos direitos
trbalhista no que tange a relação contratual e abusos do poder diretivo. Para tanto, a
pesquisa se desenvolve com base no método dedutivo dialético com análise
bibliográfica e dados colhidos do Superiror Tribunal do Trabalho (TST), jurimetria, que
tratam do assunto: Abuso do poder diretivo do empregador, delimitado ao período de
2018 a 2020.
The research aims to analyze the extent to which Compliance can be used as a
mechanism to protect the limits of the employer's directive power regarding individual
and collective labor contracts. For this purpose, the analysis develops from the concept
of contracts, from the perspective of Enzo Roppo, through the peculiarity of the
individual labor contract and collective labor negotiations, from which the Collective
Convention and / or the Collective Labor Agreement is developed. , which requires
observing institutes that run through the contractual relationship, such as private,
individual and collective autonomy, in order to contribute to the inquiry regarding the
freedom to contract. The conditions of the individual employment contract are
examined and, not infrequently, they encounter the principle of primacy of reality over
form, a principle that goes against the theme of the dissertation, insofar as the abuse
of directive power, not infrequently, it can happen precisely because what is practiced
(the execution of daily tasks) does not always correspond with the content of the
contract. The dissertation is attentive to the constitutional and celetary tutelage of the
employer's directive power, from the origin and its legal nature, in order to indicate that
the Labor Compliance Program can parameterize the employer's behavior in relation
to its employees, as well as anticipating employees its obligations. However, the
dissertation still runs through the hypothesis bias as to whether Compliance is or is not
effective in protecting labor rights. In this sense, the research goes through the analysis
of data extracted from the website of the Superior Labor Court, which has the ranking
of the main themes judged by the Labor Justice, which, through the use of jurimetry,
makes it possible to verify that the theme: Abuse of Directive power, and its subtopics,
(moral harassment, misuse of function and accumulation of function), are still recurrent
in specialized justice. Therefore, by setting parameters of the employer's directive
power limits in relation to contractual changes, as well as the requirements of activities
outside those contained in the employment contract, it will be analyzed to what extent
Compliance can be a mechanism for safeguarding labor rights with respect to
contractual relationship and abuses of directive power. Therefore, the research is
developed based on the dialectic deductive method with bibliographic analysis and
data collected from the Superiror Tribunal do Trabalho (TST), jurimetry, which deal
with the subject: Abuse of the employer's directive power, limited to the period from
2018 to 2020.
13
do empregador, porém, a questão da pesquisa é: em que medida as ordens do
empregador - exercício do poder diretivo – podem configurar abuso desse direito?
A dissertação parte da premissa que o empregador possui o Direito do
exercício do poder diretivo das atividades. A atenção, é focada quando o exercício
pode se configurar como abusivo.
Então é nesse cenário que se debruça a pesquisa, verificar em que medida o
empregador, com base em seu poder diretivo, pode exigir mais do(s) seu(s)
empregado(s) além daquilo que consta no contrato.
As relações aqui consideradas referem-se àquelas que preenchem os
requisitos do art. 3º da CLT: onerosidade, pessoalidade, habitualidade e
subordinação. Relações também do art. 2º da CLT, ao tratar do empregador. Assim,
por força do art. 442, CLT, a relação jurídica entre empregado e empregador se dá
pelos contratos de trabalho.
Diante do exposto, o problema que a pesquisa visa responder é: Em que
medida o Programa de Compliance trabalhista pode contribuir com a Justiça laboral a
fim de parametrizar os limites do poder diretivo do empregador? Tendo como
objetivos: Analisar as alterações na execução das atividades contratadas, mas que divergem
daquelas previstas no instrumento contratual; Verificar em que medida o empregador,
com base em seu poder diretivo, pode exigir mais do(s) seu(s) empregado(s) além
daquilo que consta no contrato, e, Perquirir a respeito da possibilidade do Programa
de Compliance ser instrumento de tutela das relações contratuais na esfera trabalhista
a fim de parametrizar os limites e alcances do exercício do poder diretivo do
empregador.
Para tanto, vale-se do método dedutivo dialético, pois parte do geral para o
específico, a qual leva-se em consideração hipóteses positiva e negativa quanto à
problemática da pesquisa. A pesquisa se dá com a coleta de dados (quantitativa)
extraídos do sítio eletrônico do TST, a qual se denomina, jurimetria. Assim como se
vale da pesquisa bibliográfica e jurisprudencial (TRT’s, TST e STF).
Nesse sentido, o trabalho está estruturado da seguinte forma.
No primeiro capítulo, se analisa a relação contratual e os institutos que
perpassam pelo tema, tais como autonomia da vontade – individual e coletiva -,
princípios que noteiam a relação, bem como levantamento de dados quantitativos
referente ao tema: abuso do poder diretivo, visando responder: quais os pontos que
14
configuram o abuso? O que permite tecer comentários acerca das consequências
jurídicas quando da constatação do exercício abusivo do poder diretivo, bem como,
analisar os limites e alcance desse poder.
No segundo capítulo, aborda-se o poder diretivo do empregador, desde a sua
origem, passando pela análise constitucional e infraconstitucional, e, delimitando a
natureza jurídica do poder diretivo.
Já no capítulo três, o trabalho se atenta a mecanismos hábeis para repelir
e/ou mitigar os efeitos do – abuso - do poder diretivo, dando destaque ao Programa
de Compliance trabalhista como instrumento para tutela da relação contratual, de
modo a gerar no ambiente laboral a cultura de observância a regras de conduta que
parametriza o(s) limite(s) e alcance(s) do exercício do poder diretivo. Tal instrumento
– compliance – sendo de valia tanto para as relações individuais, assim como
coletivas.
Nesse particular, o Programa de Compliance merece atenção vez que define
padrões ideias de comportamento/conduta, de modo a direcionar-se aos sujeitos de
direito da relação laboral, o que torna-o mais eficaz do que a própria negociação
coletiva, que visa, como regra, apresentar o que pode e o que está proibido de ser
objeto de negociação via CCT ou ACT.
O Compliance trabalhista revela-se como instrumento de tutela, vez que lida
com contudas, o que significa que sua ótica está no sujeito de direitos e não no objeto
da negociação coletiva.
Posteriormente, as considerações finais a respeito dos resultados
encontrados com a pesquisa, e também a apresentação propositiva da pesquisa em
dispor o Programa de Compliance Trabalhista como instrumento de tutela das
relações contratuais laborais, a fim de paramentrizar as condutas das partes.
A dissertação, ainda, apresenta sua pertinência e aderência ao Programa de
Pós Graduação stricto sensu do Centro Universitário Curitiba-Unicuritiba, (linha 01),
na medida em que trabalha com a ideia de “atividade empresarial e constituição:
inclusão e sustentabilidade”. Assim, a dissertação foi construída a partir dos
pressupostos da própria linha e temática do Programa: Direito empresarial e
cidadania.
15
1 CONTRATO DE TRABALHO
A definição de contrato, pela perspectiva de Enzo Roppo (2009, p. 4), fixa que
ele “tornou-se um objecto e um instrumento essencial das políticas de market
regulation, que visam oporem-se às práticas anticoncorrenciais, às assimetrias
informativas e as outras falhas do mercado”.
A forma exposta por Roppo esclarece que o contrato é uma regulação, mas
também informação. Informação aos contratantes, de modo a perceber que o direito
à informação na relação contratual deve ser observado, caso contrário, a possibilidade
de invalidade daquele negócio jurídico se tornará possível, sobretudo em se tratando
de vínculo contratual com a presença do hipossuficiente, como é o caso laboral, bem
como, consumidor1.
Para que não reste dúvida, essa aproximação entre o Código de Defesa do
Consumidor, no que tange o instituto da – hipossuficiência – e as relações laborais, é
prática comum em vários julgados pela justiça especializada trabalhista, bem como
pelo próprio Tribunal Superior do Trabalho – TST.
A título de exemplo, o TST em Recurso de Revista nº. 4821220105090651,
de relatoria do Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, já se manifestou no senguinte
sentido:
1
Código de Defesa do Consumidor - Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do disposto no art.
86, terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e
de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
§ 1º Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em
linguagem de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a
período superior a cinco anos.
§ 2º A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser
comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.
§ 3º O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá
exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a
alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas.
§ 4º Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao
crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público.
§ 5º Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão
fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que
possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores.
16
nacional ou regional. (...). Na jurisprudência atual, mais consetânea
com a finalidade do processo coletivo, em caso de dano de
abrangência regional, que atinge cidades sujeitas à jurisdição de mais
de uma Vara do Trabalho, a competência será de qualquer das varas
das localidades atingidas, ainda que vinculadas a Tribunais Regionais
do Trababalho distintos (item II da OJ nº 130 da SBDI-II, da redação
dada pela resolução nº 186/2012).
2
Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais
ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e
outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de
acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum
interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
17
determinado fim."3
Depreende-se que trabalho não se limita ao físico, de modo que o poder
diretivo do empregador pode direcionar-se ao labor psiquico (intelectual) do
empregado, que a depender da natureza da atividade, é natural, p.ex. jornalista,
escritor, professor, dentre outras profissões em que se exige mais do empregado o
aspecto imaterial, intelecto, do que propriamente a força física de trabalho.
Do texto constitucional brasileiro, se extrai que o trabalho também tem valor
social, (art. 1º, IV, CF/88), o que se denota, portanto, é que o trabalho físico e
psiquico/intelectual, reflete no social, o labor tem valor em si mesmo e essa previsão
constitucional quanto ao seu valor social, extrapola o interesse individual ao ponto de
impactar a coletividade, e, por conseguinte, contribuir para alcançar os objetivos do
art. 3º da CF/88.
A propósito, Reale (1997, p. 11) assim se manifesta:
3
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. 15.ed. reform. e
ampl. São Paulo: Saraiva, 2000. p.23.
4
REALE, Miguel. Introdução. In: BAGOLINI, Luigi. Filosofia do trabalho. 2.ed. São Paulo:
LTr, 1997. p.11.
5
BARACAT, Eduardo Milléo. A boa-fé no direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2003.
p.151.
18
da CLT de 1943, o cenário jurídico, econômico, social e político mudou, é uma nova
realidade da qual não se pode ignorar, sob pena de tornar a nova legislação
trabalhista ineficaz, e se abstrair do fenômeno tecnológico que alterou os vínculos
laborais não é a melhor saída.
Se antes ocupavam-se os operadores do direito laboral com as novas formas
de produção, hoje a questão se asseverou ao mundo tecnológico, tecnologia
disruptivas que impulsionam a flexibilização do trabalho, ora, o home office é uma
opção da qual se utilizou (se utiliza) muito, sobretudo no período de calamidade
vivenciada em 2020 com a pandemia.
Nesse sentido, pensar a respeito dos requisitos do contrato de emprego do
art. 3º, CLT, torna-se cada vez mais presente, pelo menos para atualizá-los à nova
realidade das prestações de trabalho que se intensificaram com a tecnologia. Contudo,
considera-se a premissa constitucional do valor social do trabalho humano, (art. 170,
caput, CF/88), portanto, embora a tecnologia esteja presente, isso por si só não acarreta
na mitigação do valor do trabalho humano, muito menos, na diminuição da dignidade da
pessoa humana do empregado.
Essa afirmação, é corroborada por César Arese que menciona:
6ARESE, César. Direitos Humanos Trabalhistas. Teoria e prática de um Novo Direito do Trabalho.
Trad. Luiz Eduardo Gunther, Marco Antônio César Villatore. Curitiba: Instituto Memória, 2020, p. 65.
19
econômica, a princípio desprovido de atributos jurídicos, tem
aparecido, ainda que pareça óbvio, como um homem de Direitos
Humanos dono de dignidade, liberdade, dotado de direitos como tal
e em relação de dependência7.
7ARESE, César. Direitos Humanos Trabalhistas. Teoria e prática de um Novo Direito do Trabalho.
Trad. Luiz Eduardo Gunther, Marco Antônio César Villatore. Curitiba: Instituto Memória, 2020, p. 68.
8
§ 3º Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços,
com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de
serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo
de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por
legislação própria. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
9
A data da referida notícia é: 02 de dezembro de 2020.
http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=456516&ori=1 Acesso em
05 de dezembro de 2020.
(...)O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar, nesta quarta-feira (2), as Ações
Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 5826, 5829 e 6154, que questionam os dispositivos da
reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) que criaram o contrato de trabalho intermitente. Único a
votar até o momento, o ministro Edson Fachin propôs a declaração da inconstitucionalidade
da regra. Segundo ele, a imprevisibilidade nesse tipo de relação de trabalho deixa o
trabalhador em situação de fragilidade e vulnerabilidade social. Além do relator, se
manifestaram as partes e as entidades interessados admitidas no processo. O julgamento
prosseguirá na sessão de amanhã (3).
A reforma trabalhista regulamentou, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o contrato
de trabalho intermitente. Essa modalidade de prestação de serviços, com relação de
subordinação, alterna períodos de prestação de serviços e de inatividade, que podem ser
determinados em horas, dias ou meses. A regra é válida para todas as atividades, exceto para
os aeronautas, regidos por legislação própria. (ADI 5826; ADI 5829; ADI 6154).
10
CUNHA, Carlos Roberto. Flexibilização de direitos trabalhistas à luz da constituição federal.
20
Assim, o contrato de trabalho, que vincula empregador e empregado,
experimenta essa (re)significação, marcadamente, ele se diferencia dos outros
contratos civilistas, p.ex., pela presença do requisito (art. 3º, CLT) subordinação. Que
em outras palavras é a sujeição jurídica do empregado em relação ao empregador,
onde se constata o poder diretivo.
Nesse sentido, constatada a situação jurídica da subordinação, de um lado
subordinado, de outro, superior hierárquico, configura-se a desigualdade entre as
partes contratantes. Não é por outra razão, que João Caupers, afirma que: “no
contrato individual de trabalho existe um manifesto desequilíbrio entre os poderes
patronais – poder determinativo da função, poder conformativo da prestação, poder
regulamentar e poder disciplinar – e os direitos do trabalhador –11 “, assim,
prepondera a superioridade do empregador, o que é corrobolarado por Pavelski12.
Resta deixar claro que a superioridade jurídica, por si só, não é um problema
por si só, na medida em que, aquele que assume o risco pela atividade econômica
que explora, tem o direito de gerir a empresa da forma que lhe aprouver, respeitado
os direitos do trabalho previstos no art. 7º, CF/88, aqueles da CLT, bem como os
oriundos das Convenções e Acordos Coletivos de trabalho, portanto, há um leque de
direitos pró empregado que o empregador deve respeitar, contudo, não afasta o
poder diretivo.
21
particular, o Direito do Trabalho, o instituto da autonomia privada merece atenção, de
modo que, conforme destacado por Martins, “da análise quanto a diferenciação entre
autonomia privada e autonomia da vontade extrai-se o fato do fenômeno de
deslocamento de uma era de patrimonialização para um novo momento de
personificação14”, o que é corroborado com a ideia de que, aquele diz respeito a
valorização do patrimônio em detrimento ao indivíduo, de maneira que superando
esse conceito materialista, vive-se o período da valorização da pessoa humana15.
Contudo, embora essa valorização da pessoa humana, os contratos, como
espécies de negócios jurídicos, que decorre do exercício da autonomia da vontade,
estes são regulados e tutelados pelo ordenamento jurídico, além dos instrumentos de
negociação coletiva (CCT e ACT)16.
Uma vez manifestada a vontade das partes em contratar, estabelecer vínculo
laboral formal, nasce a eventual possibilidade de intervenção do Estado, seja pelo
Poder Legislativo, ou Judiciário nas relações interpessoais, é, em última análise o
comando normativo disciplinador daquele conteúdo que gerará maior ou menor
liberdade de atuação às partes. Corrobora com essa tese as palavras de Meireles.
14
MARTINS, Gustavo Afonso. GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE. Acesso à justiça do
trabalho e o princípio da intervenção mínima. Instituto Memória, 2019, p. 58.
15
CASSETTARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo, 2ª ed. Saraiva, 2013, p.
188.
16
MARTINS, Gustavo Afonso. GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE. Acesso à justiça do
trabalho e o princípio da intervenção mínima. Instituto Memória, 2019, p. 67.
17
MEIRELES, Rose Melo Vencelau. Autonomia privada e dignidade humana. Rio de
Janeiro, Renovar, 2009, p. 74.
22
sociais descompassadas das previsões legais.
Todavia, merece ater-se ao fato de que, por ser autonomia privada, cabe
ainda esclarecer quem é o privado a que se refere. Dentro da esfera da autonomia
privada pode-se encontrar atos de autonomia individual e coletiva. Os atos de
autonomia individual são aqueles realizados pela pessoa, individualmente
considerada, a exemplo do contato de compra e venda.
Conforme dispõem Adalberto Martins:
18
MARTINS, Adalberto. A autonomia privada coletiva de trabalho: da reforma trabalhista
à covid-19. Revista de Direito do Trabalho | vol. 213/2020 | p. 147 - 168 | Set - Out / 2020
DTR\2020\11502
19 MEIRELES, Rose Melo Vencelau. Autonomia privada e dignidade humana. Rio de
23
O princípio da autonomia privada – mais conhecido como princípio da
autonomia da vontade –, constitui a pedra angular do sistema de
direito privado, consubstanciando a ideia de liberdade contratual e
representando o poder assegurado pela ordem jurídica, a cada
pessoa, de dispor acerca de seus interesses, negócios e bens21.
21
SANSEVERINO, Paulo de Tarso. A função social da empresa na recuperação judicial.
Cadernos – FGV Projetos, Recuperação de empresas. 2018, p. 56.
22 MEIRELES, Rose Melo Vencelau. Autonomia privada e dignidade humana. Rio de
24
manifestou a respeito diversas vezes quanto a predominância da negociação coletiva:
25
BARBOSA, Mafalda Miranda Barbosa. A recusa do jurídico pelo econômico. 2014, p.
633.
25
Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre
estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha
às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que
lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste
artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta
Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os
instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de
nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas
vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência
Social. (BRASIL, 2017a).
26
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, 3ª ed. Impitus, 2014, p. 193.
27
SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima.
Instituições de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 152.
26
Villatore28.
Contudo, há ressalvas apresentas por Cassar29 que entende que a partir da
Lei nº. 13.467/2017 (BRASIL, 2017a), os empregados portadores de diploma de nível
superior e que recebem salário igual ou superior a duas vezes o limite dos benefícios
da Previdência Social poderão negociar com seus empregadores os direitos previstos
no art. 611-A da CLT, com prevalência desse negócio individual escrito sobre a lei.
Poderá, ainda, renunciar os direitos previstos nas normas coletivas, pois o ajuste
individual prevalecerá sobre a norma coletiva.
À luz principiológica da proteção do trabalhador, nos ditames acima, verifica-
se que a legislação trabalhista nasce visando tutelar os direitos e obrigações oriundas
da relação laboral, sobretudo, garantir ao empregado condições de dignidade, a
propósito, assim se manifestou Maranhão:
Assim, o princípio da proteção, bem como artigo 444 da CLT (BRASIL, 2017a)
que estabelece que:
Isso equivale a dizer que a previsão legal, bem como a tutela jurisdicional do
28
GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE, Marco Antônio César. MARTINS, Gustavo Afonso.
Acesso à Justiça do Trabalho e o acesso à justiça. Instituto Memória. Curitiba-PR, 2018,
p. 134.
29
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, 3ª ed. Impitus, 2014, p. 193,
p. 47.
30
MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de Direito do
Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 254.
27
trabalho vem para proteger o empregado de ações que possam lhe causar prejuízos
econômicos e, inclusive de subsistência, mas também de proteção contra si próprio
de maneira que não há que se falar em autonomia privada individual quando
desrespeitar e ferir condições contratuais mínimas.
A propósito, corrobora com essa afirmação Maranhão31 ao dizer que a
autonomia da vontade individual, portanto, embora limitada no que respeita às
condições contratuais mínimas, resultantes da lei, do contrato coletivo ou da sentença
normativa, subsiste no contrato de trabalho, seja, necessariamente, na formação do
contrato, que é um acordo de vontade, seja na estipulação de seu conteúdo quando
este for além do mínimo legal.
Diante do que até aqui exposto, a autonomia privada individual subsiste em
um Estado Democrático de Direito também porque há a Intervenção do Estado que
lhe garante condições contratuais mínimas condizentes com valores fundamentais do
trabalho e dignidade da pessoa humana.
31
MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de Direito do
Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 254.
32
SILVA, Homero Batista Mateus da. Comentários à reforma trabalhista, análise da lei
28
A conceituação do que vem a ser Convenção Coletiva encontra-se no artigo
611 da CLT, (BRASIL, 2017a): que em síntese define ser a Convenção Coletiva de
Trabalho um acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos
representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de
trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais
de trabalho.
Esse conceito, nas palavras de Silva (2015, p. 157/158), encaixa-se à
perfeição no ideal trabalhista de solução rápida de conflitos e de fixação de patamares
melhores para atender às peculiaridades de cada profissão33, segmento e região
geográfica, é o que se depreende das palavras de Adalberto Martins:
29
sindicato obreiro nas negociações coletivas de trabalho. Assim, a
autonomia, na esfera do direito coletivo do trabalho, é o poder-dever
que possuem os sindicatos, com vistas a capitanear a negociação
coletiva, com vistas à elaboração de regras de conduta e equilíbrio, no
confronto de interesses defendidos pelos participantes do processo de
negociação35.
35
MARTINS, Adalberto. A autonomia privada coletiva de trabalho: da reforma trabalhista
à covid-19. Revista de Direito do Trabalho | vol. 213/2020 | p. 147 - 168 | Set - Out / 2020
DTR\2020\11502
36 MEIRELES, Rose Melo Vencelau. Autonomia privada e dignidade humana. Rio de
Instituições de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 1078.
30
a restrição no que tange o conteúdo negociável, menor será a autonomia privada.
Corrobora com essa alegação as palavras de Teixeira Lima:
38
SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima.
Instituições de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 1078.
31
comandos normativos que esvaziam a amplitude de atuação do Poder Judiciário,
sobretudo dos juízes trabalhistas, nos termos do §3º do art. 8º da Lei nº. 13.467/2017
(BRASIL, 2017a), prevendo o princípio da Intervenção Mínima, o que ocorre também
com outros dispositivos alterados pela Reforma Trabalhista.
A título de exemplo, nas palavras de Araújo:
39
ARAÚJO, Éder Francelino. Lei da Reforma Trabalhista, comentada artigo por artigo.
São Paulo, Jhmizuno, 2017, v. 01, p. 36-39.
40
LOPES FILHO, Abel Ferreira. Lei da Reforma Trabalhista, comentada artigo por artigo.
São Paulo, Jhmizuno, 2017, p. 159.
32
daquelas disposições legais, no que tange a autonomia privada, em nome da
segurança jurídica, a Intervenção do Estado legislador vem para reverenciar a
autonomia privada fazendo com que o Estado Juiz tenha atuação mitigada naquilo
que seja objeto de negociação entre os sujeitos de direito envolvidos em determinada
relação laboral.
Nesse sentido Teixeira Lima explica (1997, p. 1079):
As razões para isso são óbvias: é para que haja uma ampla e saudável
descentralização capaz de dar respostas e soluções mais justas e
mais racionais às demandas; para que se estimule o senso de
responsabilidade e de participação de cada cidadão, que, assim,
assumirá o papel de artífice de seu próprio destino e não ficará
esperando as soluções padronizadas do Estado; e para evitar que os
cidadãos tenham de enfrentar-se sempre diretamente com o próprio
Estado, sem os amortecedores dos corpos mediadores41.
33
o plano da existência, validade e eficácia, e, ainda, privilegiou a autonomia privada,
seja a individual ou coletiva, esse cenário se dá em um ambiente de relações
contratuais, ou seja, onde há interesses econômicos, seja daquele que detém os
meios de produção, ou daqueles que se valem da força física e/ou capacidade
intelectual para auferirem renda para subsistência.
Assim, é nesse espaço econômico, denominado de mercado, que contratos
são firmados, direitos, obrigações e deveres nascem e se extinguem pela via da
prestação jurisdicional, é nesse contexto que se depara com necessidades essenciais,
pretensões resistidas, vulnerabilidade dos agentes econômicos, instabilidade nas
negociações e relações jurídicas frustradas, que se faz necessária a presença do
Poder Judiciário a fim de prestar a tutela aos jurisdicionados. De igual modo, é no
mesmo cenário que o Poder Legislativo enfrenta tais questões a fim de mitigar os
efeitos nocivos à sociedade.
A questão reside quando o fenômeno econômico sobressai sobre o jurídico,
quando interesses econômicos ganham espaço nas decisões legislativas a ponto do
jurídico, restar-se a se conformar com as imposições do mercado e/ou interesse de
classes dominantes.
É importante situar que o objeto deste livro se encontra em um Estado
Democrático de Direito, sob o regime econômico liberal, que tem como marca a
civilização capitalista, contudo, com regime jurídico também voltado ao social. Com
tutela constitucional tanto para o livre mercado, bem como para direitos sociais.
A liberdade econômica outorga aos agentes a autonomia privada, portanto,
inegável a importância desse modelo de Estado que privilegia o princípio da liberdade,
entretanto, a outra face deste mesmo modelo de Estado, direciona-se ao social,
prestigiando, por sua vez, o princípio da solidariedade, exemplo disso é a função social
do contrato, assim, conciliar interesse coletivo e individual torna-se um desafio. E
nesse viés, há estreita convivência entre a ciência econômica e a ciência do direito.
Nessa perspectiva, Barbosa, levanta a indagação, “qual a relação que se
estabelece entre àquela e o direito”42. A questão exposta pela portuguesa, vincula-se
à pesquisa no tocante à autonomia privada individual ou coletiva em um cenário de
preponderância econômica, ainda mais quando esta é capaz de influenciar na
42
BARBOSA, Mafalda Miranda Barbosa. A recusa do jurídico pelo econômico. 2014, p.
633.
34
elaboração da norma jurídica.
Barbosa ainda enfatiza que:
43
BARBOSA, Mafalda Miranda Barbosa. A recusa do jurídico pelo econômico. 2014, p.
633.
44
BARBOSA, Mafalda Miranda Barbosa. A recusa do jurídico pelo econômico. 2014., p.
638.
35
de veto a essa lei pelo governo Temer45”. Em ambos os casos, a motivação era
econômica. Se prevalecer a pretensão econômica sobre o direito, consequentemente,
o acesso à justiça tender-se-á a ser cada vez mais limitado, vez que para tanto, há
custos, o que por si só já mitiga o exercício do direito constitucional de busca da
prestação jurisdicional do Estado.
Ocorre com certa frequência, se valer da via legislativa para tentar resolver
questões econômicas, dentre outras, a propósito, Vaz, esclarece:
45
GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE, Marco Antônio César. MARTINS, Gustavo Afonso.
Acesso à Justiça do Trabalho e o acesso à justiça. Instituto Memória. Curitiba-PR, 2018,
p. 30.
46
VAZ, Manuel Afonso. A Problemática de um Direito Econômico. Coimbra, 1989, p. 83.
36
jurídica vigente para além das normas, como que estas têm de
encontrar a sua legitimidade em algo que vá para além da forma do
poder politicamente legitimado para as produzir47.
Tabela do autor
47
BARBOSA, Mafalda Miranda Barbosa. A recusa do jurídico pelo econômico. 2014., p.
638, p. 638.
48
Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas
condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou
indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta
garantia.
§ 1º Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o
respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício
de função de confiança. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
37
5º, XXXVI e 7º, VI, VII, X, CF/88, é o que se extrai das palavras de Ildelio Martins:
§ 2º A alteração de que trata o § 1º deste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao
empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não
será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função.
(Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
49
MARTINS, Ildélio. Alteração do contrato de trabalho: limites ao poder de comando da
empresa. RDT 52/39, Nov/1984, p. 39.
50SILVA. Homero Batista Mateus. Comentários à Reforma Trabalhista. São Paulo, Revista dos
Tribunais, 2017, p. 86.
38
dolo, coação, simulação)51.
51
MARTINS, Ildélio. Alteração do contrato de trabalho: limites ao poder de comando da
empresa. RDT 52/39, Nov/1984, p. 39.
39
Recurso ordinário. Rebaixamento de cargo com o propósito de
compelir o empregado a pedir demissão. Assédio moral configurado.
O assédio moral é uma violência psicológica reiterada por meio de atos
diretos ou indiretos em que o agressor investe contra as esferas física,
psíquica, moral ou social da vítima, mantendo-a acossada a fim de
forçá-la a agir segundo os seus interesses. O rebaixamento de função
com o propósito de constranger o empregado, compelindo-o a pedir
demissão excede os limites do poder diretivo do empregador. A
manutenção do empregado nessa situação configura assédio moral.
O abuso do poder organizacional configura ato ilícito e,
consequentemente, gera o direito a justa reparação pelos prejuízos
sofridos pelo empregado (art. 187 do CC/2002).
40
por se situar num campo em que a outra vontade não se expressou de
antemão52.
Os limites que o jus variandi encontram, diz respeito ao contrato, o que pode
ser em vários sentidos, à alteração do contrato, portanto, este instituto decorre do
poder diretivo que é mais amplo, o que significa dizer, que o empregador além de
deter o direito de variar, possui também a direção das atividades econômicas da
empresa, o que inclui os empregados. Portanto, se trata de gênero (poder diretivo), e
espécie (jus variandi).
Constata-se que as decisões do TST, a respeito do poder diretivo, no Recurso
de Revista nº. 11276-14.2015.5.03.0060: que entendeu, não estar configurado abuso
de poder diretivo, a exigência de teste de bafômetro realizado mediante sorteio53.
Contudo, em análise ao RR nº. 889-41.2013.5.09.0965: entendeu que houve aubuso
do poder diretivo, portanto, devida a indenização54.
Portanto, depreende-se tratar de análise causuística, a análise do caso
concreto é que definirá quando há abuso do poder diretivo e quando não existe. Assim,
mesmo pós Reforma Trabalhista, o poder diretivo ainda é tema a ser discutido e
analisado a eventual abusividade de seu exercício.
http://aplicacao4.tst.jus.br/consultaProcessual/consultaTstNumUnica.do?consulta=Consultar&conscsjt
=&numeroTst=11276&digitoTst=14&anoTst=2015&orgaoTst=5&tribunalTst=03&varaTst=0060&submit
=Consultar Acesso em 14 de dez. 2020
54
http://aplicacao4.tst.jus.br/consultaProcessual/consultaTstNumUnica.do?consulta=Consultar&conscsjt
=&numeroTst=889&digitoTst=41&anoTst=2013&orgaoTst=5&tribunalTst=09&varaTst=0965&submit=
Consultar Acesso em 14 de dez. 2020
41
da prestação laboral; num sentido amplo, abrange igualmente
determinadas alterações ao programa contratual, normalmente
designadas por ius variandi. Mediante o ius variandi admite-se que,
em certas circunstâncias, o empregador introduza modificações
quanto a vários aspectos da actividade do trabalhador, mormente, em
relação ao modo de efectuar a prestação. (…)
O ius variandi pressupõe um desvio ao princípio pacta sunt servanda
(art. 406.º do CC), justificado por motivos empresariais, que não
constitui uma especificidade do domínio laboral; veja-se, por exemplo,
em sede de empreitada, o disposto nos arts. 1.216.º e 1.229.º do CC.
(…) As alterações impostas pelo empregador podem estar abrangidas
pelo típico poder de direcção, por exemplo, alterar a atividade impondo
a realização de funções afins (art. 151.º, n. 2, do CT) e, nesse caso,
não se incluem no ius variandi. Para haver ius variandi torna-se
necessário que a alteração determinada pelo empregador esteja em
contradição com o programa contratual, isto é com as regras que direta
ou indiretamente regem aquela relação laboral; concretamente, que se
imponha a realização de uma atividade diversa, não compreendida
nas funções afins ou funcionalmente ligadas. (…)
De igual modo, não corresponde ao exercício do ius variandi a
alteração de funções para atividade afim ou funcionalmente ligada,
para a qual o trabalhador tenha qualificação, nos termos estabelecidos
no art. 151.º, n. 2, do CT. (…)”.
42
A tabela acima é inicial, de modo que ao longo dessa dissertação, o poder de
direção ganhará cada vez mais características. Assim como apresentar-se-á numa
coluna à esquerda, na sequencia do trabalho, o que configura abuso do poder de
direção.
55
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a
lei quando, entre outros, dispuserem sobre: (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (...)
56
Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de
trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos: (Incluído
pela Lei nº 13.467, de 2017) (...)
43
sobre o legislado, não é bem assim. Isso porque o art. 468, CLT, não foi revogado
expressa nem tacitamente pela Reforma Trabalhista, de modo que a irredutibilidade
do salário, e a alteração lesiva do contrato de trabalho, ainda vigora mesmo com a Lei
nº. 13.467/2017.
Importa frisar que a mesma ementa do TRT-SP, apresenta alguns critérios de
observância para, eventualmente, reduzir direitos previstos, seja constitucionalmente
ou infraconstitucionalmente, quiça, em instrumentos oriundos de negociação coletiva.
Isso importa em afirmar que há limites nessa peculiaridade do exercício do poder
diretivo do empregador, ele pode muito, mas não pode tudo, e uma limitação é a
alteração contratual lesiva financeiramente ao empregado.
A ementa acima indica justamente o que é o teor do art. 611-B, CLT, de modo
que, embora a negociação seja livre, ela sofre limitação textual-normativa, no sentido
de proteger o empregado do poder abuso do empregador. Contudo, é uma análise
causuística, têm-se a regra quanto ao que se pode negociar, e, por outro, regra sobre
o que não pode negociar, vez que fere direitos trabalhistas constitucionais.
Por outro, as Côrtes Superiores, por diversas vezes, se manifestaram pró
aderência das cláusulas convencionais aos contratos de trabalho individuais, a título
de exemplo, TST em Recurso de Revista nº. 764556-81.2001.5.09.5555:
44
Trabalho, por meio da Súmula nº. 277, cuja incidência não é restrita à
sentença normativa, mas abrangente dos acordos coletivos de
trabalho e das convenções coletivas de trabalho, conforme a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, adotou a teoria da
aderência da norma coletiva ao contrato individual de trabalho liitada
pelo prazo de vigência da norma coletiva, preconizando a não-
incorporação ao contrato de trabalho de vantagens instituídas
mediante acordos e convenções coletivas de trabalho.
57GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE, Marco Antônio César. MARTINS, Gustavo Afonso. Acesso
à Justiça do Trabalho e o acesso à justiça. Instituto Memória. Curitiba-PR, 2018, p. 121.
45
exploração da atividade econômica, sendo, portanto, dessa forma possível atender a
interesses mútuos em determinado lapso temporal.
Diante da tendência de prevalecer o negociado sobre o legislado, o Supremo
Tribunal Federal, já adotou alguns posicionamentos que reforçam essa afirmação, os
debates pela Corte enfrentados, sinalizam a necessidade de se valorizar a autonomia
coletiva da vontade e de se estimular a auto composição nos conflitos trabalhistas,
incentivo este já prescrito no art. 7º, inciso XXVI, da Constituição de 1988 (BRASIL,
1988).
Essas decisões do STF, sucintamente, ficam arroladas a seguir a fim de deixar
como fundamento da preponderância do instituto da autonomia privada
individual/coletiva.
46
O julgamento no Plenário do Supremo Tribunal Federal se deu em
unanimidade, destacando-se o fundamento de se preservar as normas coletivas,
como preconizam “os diversos dispositivos constitucionais que prestigiam as
negociações coletivas como instrumento de solução de conflitos coletivos”.
58
Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso
extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos
termos deste artigo.
§ 1º Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões
relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os
interesses subjetivos do processo.
47
ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo”.
Assim, abaixo segue a decisão do Min. Gilmar Mendes sobre o tema que
ladeia a negociação coletiva.
59
Inconstitucionalidade da contribuição assistencial imposta aos empregados não filiados ao
sindicato, por acordo, convenção coletiva de trabalho ou sentença. <Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incident
e=5112803&numeroProcesso=1018459&classeProcesso=ARE&numeroTema=935> Acesso
em: 17.11.2018
48
critérios, mas o fato é de prevalência. Por outro, no voto do Ministro Gilmar Mendes,
se verifica a fragilidade das negociações coletivas vez que sujeitas ao controle de
constitucionalidade, portanto, não é um imperativo que a negociação deve prevalecer
sobre o legislado, mas uma tendência.
Quanto a parametrização constitucional no que tange às negociações não
restam dúvidas, contudo, vale ressaltar que esses precedentes acórdãos revelam uma
tendência da prevalência do negociado sobre o legislado.
60
DELGADO, Maurício Godinho. Capitalismo, trabalho e emprego: entre o paradigma da
destruição e os caminhos da reconstrução. 2. tir. São Paulo: LTr, 2007. p.63-64.
61
CORREIA, Rosani Portela. Novos paradigmas do contrato de trabalho no Brasil. São
Paulo: LTr, 2008. p. 23.
49
sobretudo, no que tange os negócios jurídicos, isso porque, também com a reforma
trabalhista, foi inserido o parágrafo terceiro, no art. 8º, definindo que a no exame de
convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analise
exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico,
respeitado o disposto no art. 104 do Código Civil brasileiro. (BRASIL, 2002).
Quando o legislador da Reforma Trabalhista inseriu os elementos constantes
do art. 104 do Código Civil brasileiro (BRASIL, 2002), ao §3º do art. 8º da
Consolidação das Leis Trabalhistas (BRASIL, 2017a), apenas o fez de forma
superficial, na medida em que não adentra nas peculiaridades de cada um daqueles
elementos essenciais do negócio jurídico.
Portanto, o art. 104 do Código Civil brasileiro, que é diluído e/ou esclarecido
na sequência daquele diploma legal, Lei nº. 10.406/2002, (BRASIL, 2002) os
elementos essenciais e suas derivações, forma de aplicação, validade e/ou invalidade
do negócio jurídico, incapacidade de uma das partes, entre outras questões que se
ligam às relações humanas com reflexo no campo do direito. O fato é que a Lei nº.
13.467/2017, (BRASIL, 2017a) apenas faz referência ao art. 104, que dispõe que a
validade do negócio jurídico requer, I – agente capaz, II – objeto lícito, possível,
determinado ou determinável; e, III – forma prescrita ou não defesa em lei.
Com base na previsão legal do parágrafo primeiro do art. 8º da Lei nº.
13.467/2017, (BRASIL, 2017a) ter-se-á o direito comum como fonte subsidiária do
direito do trabalho, portanto, as explicações dos elementos essências do negócio
jurídico ficará a cargo do Código Civil brasileiro. O que não é uma novidade,
entretanto, faz-se imprescindível apresentar a classificação civilista aplicável ao direito
do trabalho.
Para Venosa, “o negócio jurídico consiste na manifestação de vontade que
procura produzir determinado efeito jurídico”62. Portanto, trata-se de uma declaração
de vontade que não apenas constitui um ato livre, mas pela qual o declarante procura
uma relação jurídica entre as várias possibilidades que oferece o universo jurídico.
Essa conceituação do autor, faz refletir que as várias possibilidades que o
direito oferece no que tange os negócios jurídicos e seus efeitos, que poderia o
legislador da Reforma Trabalhista, ater-se as peculiaridades das contratações e
62
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005, p. 381.
50
negociações na esfera laboral. Há questões nas relações trabalhistas que o direito
civil não contempla, e que dizem respeito à validade do negócio jurídico entabulado
entre as partes.
Veja-se que, segundo Venosa (2004, p. 382), “é por meio do negócio jurídico
que se dá vida às relações jurídicas tuteladas pelo direito”. Assim, ao se deparar com
as negociações coletivas, por exemplo, que se caracteriza pela bilateralidade ao
depender de mais de uma manifestação de vontade para se definir o objeto da
Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo de Trabalho, a legislação
trabalhista não apresenta como elemento essencial.
Por mais que se diga que foi opção legislativa, compete frisar ser um
equívoco, vez que no artigo 611-A acrescido pela Lei nº. 13.467/2017 à CLT, (BRASIL,
2017a) aparece os sindicados subscritores de convenção coletiva ou de acordo
coletivo de trabalho como obrigados a participarem, como litisconsortes necessários,
em ação individual ou coletiva, que tenha como objeto a anulação de cláusula desses
instrumentos.
Quando a legislação trabalhista se socorre subsidiariamente do direito
comum, e nesse quesito, do Código Civil para tratar da validade do negócio jurídico,
o faz com base no art. 104 deste diploma legal, o qual está inserido no livro III – Fatos
Jurídicos, título I – Do negócio Jurídico, Capítulo I – Disposições gerais. Isso é
importante porque o mesmo livro e título, também prevê o Capítulo V – Da invalidade
do negócio Jurídico, no art. 166 (BRASIL, 2002).
Isso para localizar o dispositivo do Código Civil e demonstrar ser incapaz de
desassociá-lo aos demais artigos que integram o mesmo livro e título referentes ao
negócio jurídico. Contudo, para que o negócio jurídico exista e seja válido, carece de
explicações, vez que o §3º do art. 8º, da Lei nº. 13.467/2017 (BRASIL, 2017a) lhe faz
menção. Para tanto, vale-se das palavras de Venosa:
63
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005, p. 411.
51
Para fins da dissertação, resta deixar claro que os elementos essências do
negócio jurídico são os elencados no art. 104 do Código Civil brasileiro de 2002,
(BRASIL, 2002) agente capaz, o objeto lícito e a forma, essa composição dará a
validade ao negócio jurídico para que produza seus efeitos.
A título elucidativo, esclarece cada um desses elementos. Inicia-se com a
conceituação de agente capaz, que segundo Venosa64, “a capacidade é conceito,
portanto, referente à idoneidade da pessoa para adquirir direitos ou contrair
obrigações no universo negocial”. (...), continua o autor, “o que nos interessa
primordialmente é a capacidade negocial, aquela que dá aptidão para o agente intervir
em negócios jurídicos como declarante ou declaratório”65.
A ideia que se extrai de um agente capaz, reside no fato deste ser responsável
a ponto de ter condição de exercício de seus direitos sem a necessidade de
interlocutores. Em outras palavras, e se valendo da conceituação de Cassettari, “a
capacidade é a aptidão para adquirir direitos e exercer por si, ou por outrem, atos da
vida civil. A capacidade é a medida, a extensão da personalidade, mas com ela não
se confunde”66.
Quanto ao objeto, este deve ser idôneo, isto é, apto a regular os interesses
sobre os quais recai o negócio jurídico. Para esclarecer o que significa o objeto
determinado ou determinável, o autor acima ressalta que “pode o objeto não ter sido
determinado no próprio ato, mas há de ser determinável, pelo menos.”67.
Objeto, enquanto um dos elementos do negócio jurídico, é aquilo que
interessa às partes, Cassettari, se esse objeto de interesse da parte for ilícito,
impossível ou indeterminável, de acordo com o art. 166, II, do CC o negócio jurídico
será nulo68.
No que tange à forma, enquanto requisito do negócio jurídico, destaca-se que
deve obedecer à prescrição normativa, ou por ela não ser proibida. Nas palavras de
Venosa, “é requisito de validade dos negócios jurídicos obedecerem à forma prescrita,
64
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005, p. 418.
65
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005.
66
CASSETTARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo, 2ª ed. Saraiva, 2013,
p. 50.
67 VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005, p. 422.
68
CASSETTARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo, 2ª ed. Saraiva, 2013,
p. 97.
52
ou não adotarem a forma proibida pela lei”69. Apenas a título de fixar esse conceito,
destaca-se as palavras de Cassettari:
O Código Civil de 2002, trouxe uma nova teoria geral dos contatos
para o Direito civil, inspirado no Código de Defesa do Consumidor (Lei
nº. 8.078/90). Isto pode ser verificado no Enunciado 167 do CJF, que
estabelece que, com o advento do Código Civil de 2002, houve forte
aproximação principiológica entre esse Código e o Código de Defesa
do Consumidor, no que respeita à relação contratual, uma vez que
ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos71.
Isso também se liga aos contratos de natureza laboral vez que disciplina a
relação contratual entre partes desiguais economicamente, pelo menos em sua
maioria. Portanto, a posição de inferioridade técnica e/ou econômica tanto na relação
de consumo como na relação de trabalho se assemelham na medida que se está
69
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005, p. 421.
70
CASSETTARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo, 2ª ed. Saraiva, 2013,
p. 97.
71 CASSETTARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo, 2ª ed. Saraiva, 2013, p.
182.
53
diante de uma dicotomia de posições e condições de negociar e estabelecer cláusulas
contratuais.
De qualquer sorte, importante destacar a aproximação principiológica entre
ambos os códigos se dá em função do Código Civil incorporar dois princípios
contratuais sociais: função social do contrato e boa-fé objetiva. Veja-se que os
princípios acima dialogam com a relação contratual empregatícia além daqueles
próprios do direito do trabalho.
O Código Civil de 2002 (BRASIL, 2002) apresenta as disposições gerais no
que tange os contatos a partir do artigo 421, versa que “a liberdade de contratar será
exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Este é um dos princípios
que norteiam as relações contratuais, contudo, é oportuno destacar que com o
advento da Constituição de 1988 (BRASIL, 1988) o Direito Civil (BRASIL, 2002) passa
a ser constitucionalizado e os princípios da Carta Magna, por exemplo, da dignidade
da pessoa humana (art. 1, III, CF/88), da solidariedade social (art. 3, I, da CF/88) e da
isonomia (art. 5 da CF/88) também se aplicam ao Direito Civil, e, consequentemente,
ao contrato. (BRASIL, 1998).
Portanto, nas palavras de Cassettari “os princípios que norteiam a relação
contratual são: autonomia privada; função social do contrato; boa-fé objetiva; força
obrigatória; e relatividade dos efeitos do contrato”72.
Essa é a conceituação e base principiológica dos contratos de natureza civil,
por outro, para atingir a correlação e aproximação existente, vale-se, por oportuno, da
classificação de Maranhão (1997, p. 247/247) que entende:
A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT – dispõe em seu artigo 443 que
72CASSETTARI, Christiano. Elementos de Direito Civil. São Paulo, 2ª ed. Saraiva, 2013,
p. 188.
54
“o contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente,
verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para
prestação de trabalho intermitente”. (BRASIL, 2017a).
O contrato de trabalho, assim como outro negócio jurídico, para a sua validade
depende do preenchimento de alguns requisitos disciplinados no Código Civil de 2002
no artigo 104 que dispõe: “a validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II
– objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não
defesa em lei”. (BRASIL, 2002).
Assim, dada a extraordinária importância social do fato da prestação de
trabalho subordinado, embora a constituição da relação jurídica dependa, também
aqui, de um contrato, sua disciplina decorre, cada vez mais, de fontes estranhas à
vontade dos contratantes73. Isso significa a vinculação do direito do trabalho com a
constituição federal e demais diplomas legais protetivos às partes vulneráveis nas
relações que lá são disciplinadas.
Ora, as relações contratuais sejam elas cíveis ou especificamente
trabalhistas, guardam relações, respeitadas suas peculiaridades e princípios próprios
que dão diretriz às relações laborais, sendo que dessa relação contratual nascem
direitos e obrigações de maneira a repercutir na esfera econômica das partes
contratantes. Do empregado porque receberá a remuneração a título de
contraprestação, e do empregador porque receberá o serviço – força de trabalho –
por parte do obreiro.
Nessa relação jurídica as regras devem estar claras, ocorre que o contrato,
por si só, nem sempre consegue antever possíveis conflitos, razão pela qual gera-se
enorme volume de demandas visando discutir a força obrigatória do contrato, na visão
clássica da pact sunt servanda, ou meios teóricos para rever as cláusulas que se
tornam excessivas, onerosas e ocasionaram desiquilíbrio econômico.
No Direito do Trabalho, as discussões perpassam da relação contratual,
mesmo que, ainda exista, na modalidade tácita/oral, o que dificulta a fixação de regras
e previsibilidade e segurança jurídica às partes. Assim, o abuso do poder diretivo pode
se intensificar atingir o contrato laboral, de modo que mecanismos inter partes
73
SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima.
Instituições de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 237.
55
merecem atenção para regulamentar comportamentos de modo a direcioná-los ao
viés da dignidade da pessoa humana, e, por conseguinte, ético.
Relação trabalhista
Expressa ou tácita
Individual Coletiva
Contrato Negociação Coletiva: CCT/ACT
Art. 442, CLT Art. 8º, art. 611-A e 611-B, CLT
Tabela do autor
O abuso do poder diretivo pode se operar por várias vertentes, comandos, por
exemplo, que excedem o contrato de trabalho, o que pode se manifestar por algumas
hipóteses: Desvio de Função, acúmulo de função, dupla função e o próprio assédio
moral que gera o dano extrapatrimonial.
Assim, a pesquisa trabalha com essas figuras a fim de mostrar
quantitativamente a repercussão delas na Justiça do Trabalho, delimitado aos anos
de 2018, 2019 e 2020:
Todas as informações abaixo – figuras – foram extraídas do sítio eletrônico do
TST74.
Ano de 2018:
74
http://www.tst.jus.br/web/estatistica/jt/assuntos-mais-recorrentes
56
O tema: Acúmulo de função se encontra da 43ª posição dos temas mais
recorrentes na justiça do trabalho.
Ainda, para o ano de 2018, o tema Desvio de Função, encontra-se na 60ª
posição dos temas mais recorrentes na justiça trabalhista.
57
na 29ª posição do ranking da justiça do trabalho. Observe que o assédio moral não
pode ser visto como abuso do poder diretivo, vez não existe previsão deste direito ao
ponto de ser abusado em seu exercício, porém, o seu uso aqui se dá por conta do
exercício dessa prática ilegal – Assédio moral – para impulsionar o empregado a se
demitir, a acatar ordens que lhe são desfavoráveis justamente porque se encontra em
situação de dependência e vulnerabilidade.
Acúmulo de função, por sua vez, no ano de 2019, ocupou a 47ª posição:
Por fim, para o ano de 2020, os temas: Acúmulo de função, desvio e dano
moral, estão assim rankiados:
Acúmulo de função está na 54ª colocação:
58
Desvio de função por sua vez está na 69ª colocação:
59
2.1 CONSEQUÊNCIA PELA FALTA DE PARAMETRIZAÇÃO DOS LIMITES E
ALCANCE DO PODER DIRETIVO DO EMPREGADOR
60
período de janeiro a novembro de 2017.75
75 http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/primeiro-ano-da-reforma-trabalhista-
efeitos#:~:text=Segundo%20a%20Coordenadoria%20de%20Estat%C3%ADstica,para%201.287.208
%20reclama%C3%A7%C3%B5es%20trabalhistas. Acesso em 15 de Dez. De 2020.
76 http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/primeiro-ano-da-reforma-trabalhista-
efeitos#:~:text=Segundo%20a%20Coordenadoria%20de%20Estat%C3%ADstica,para%201.287.208
%20reclama%C3%A7%C3%B5es%20trabalhistas. Acesso em 15 de Dez. De 2020.
61
A reforma trabalhista não só impacta no direito material, mas também no
direito processual, ao introduzir o instituto da Transcendência, art. 896-A, CLT, que
serve como um filtro para a Corte Superior analisar os Recuros de Revistas. Assim,
numa análise fria, quantitativa, a redução das demandas ocorreu após a Reforma
Trabalhista.
Curiosamente, conforme a tabela abaixo, do ano de 2018 para o ano de 2019,
no que tange o tema: Desvio de função, houve aumento de demandas discutindo esse
tema.
Temas
2018 2019 2020
Recorrentes
Assédio 113.945 112.022 68.635
Desvio de função 51.582 55.189 29.597
Acúmulo de função 71.625 66.472 38.301
62
Nesse sentido, extraí-se do sítio eletrônico do TST, os seguintes números:
63
1ª Instância: Recebeu: 3.685.238, equivale: 70,26%
2ª Instância: Recebeu: 1.152.208, equivale: 21,97%
TST: Recebeu: 407,565, equivale: 7,77%.
64
1ª Instância: Recebeu: 2.472,114, equivale: 69,55%
2ª Instância: Recebeu: 863.680, equivale: 24,30%
TST: Recebeu: 218.711, equivale: 6,15%.
Total
Ano Julgados Recebidos Resíduo81
2020 147.150.960 152.306.883 55.175.178
Tabela do autor
65
Contudo, em uma análise em percentual, chega-se a seguinte tabela:
Temas
2018 % 2019 % 2020 %
Recorrentes
Julgados83 319.741 331.040 147.150.960
Assédio 113.945 64% 112.022 65% 68.635 70%
Desvio de função 51.582 84,5% 55.189 83% 29.597 87%
Acúmulo de função 71.625 77% 66.472 80% 38.301 82%
Tabela do autor.
83
Conforme dados extraídos do sítio eletrônico do TST e exposto acima no mesmo capítulo.
84NUNES, Marcelo Guedes. Jurimetria. Como a estatística pode reinventar o direito. São Paulo,
Thomson Reuters, 2019, p. 11.
66
superação dos conflitos de interesse85.
85 NUNES, Marcelo Guedes. Jurimetria. Como a estatística pode reinventar o direito. São Paulo,
Thomson Reuters, 2019, p. 11.
86 NUNES, Marcelo Guedes. Jurimetria. Como a estatística pode reinventar o direito. São Paulo,
67
Dignidade da pessoa humana, vez que se refere a sujeitos de direito, valor social do
trabalho, vez que o trabalho/labor, é o foco da pesquisa e prevista na constituição,
assim como a livre iniciativa vincula-se a exploração da atividade econômica, e, por
conseguinte, fonte de geração de emprego e renda.
A razão de se analisar a dignidade da pessoa humana, é o fato de que a
pesquisa analisa a temática do poder diretivo do empregador e eventual abusividade,
o que será melhor analisado no transcurso da dissertação. Contudo, o tema da
dignidade da pessoa humana está sempre presente quando se refere a questões de
direitos sociais, sobretudo, trabalhista, nesse particular. E a razão se encontra no art.
1º, IV, e art. 170, caput, CF/88.
Como se verifica, a relação contratual, bem como a atividade econômica
empresarial, decorrem destas premissas constitucionais. A livre iniciativa vincula-se
à atividade empresarial, da qual decorre o contrato de trabalho. Essa é a razão –
também – que justifica o princípio da preservação da empresa, vez que sem ela, não
há que se falar em emprego.
A título exemplificativo, verifica-se que o art. 47, da Lei nº. 11.101/2005,
apresenta o instituto da recuperação judicial, que tem “por objetivo viabilizar a
superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a
manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos
credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o
estímulo à atividade econômica”.
Com efeito, as relações de trabalho, especialmente as empregatícias (art. 3º
da CLT), importam para o estudo da atividade empresarial porque o empregador,
para o direito pátrio (art. 2º da CLT), aparece como, essencialmente, a empresa.
Na perspectiva empresarial, a "liberdade de iniciativa envolve a liberdade de
indústria, e comércio ou liberdade de empresa e a liberdade de contrato" possibilita a
realização de uma atividade econômica, uma atividade empresarial. O
empreendedor, por força da liberdade conferida pelo ordenamento jurídico –
constitucional e (in)fraconstitucional, (lei nº. 13.874/2019) organizará e estabelecerá
sua atividade, de modo que se denomina poder diretivo.
O poder de dirigir a prestação de serviços é conferido ao empregador por
conta do contrato de trabalho. A origem contratual do poder de direção do
empregador consta da CLT, quando esta define em seu artigo 442: "Contrato individual
68
de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego."
Assim como o art. 2º, CLT, atribui ao empregador o risco da atividade
econômica que desenvolve, denominado de princípio da alteridade, ele, por
conseguinte, detém a prerrogativa de dirigir seu empreendimento. Caso o
empregador não tivesse o poder de direção, ele não poderia ser responsável pelos
riscos que atividade econômica proporciona, o que acarretria no fracasso do
empreendimento vez que não conseguiria desempenhar sua atividade econômica.88
Ocorre que a atividade econômica – empresa – antecede qualquer vínculo
empregatício, até mesmo precede as negociações coletivas, de modo que toda a
organização da empresa está estabelecida preteritamente aos vínculos contratuais
laborais.
88
GONÇALVES, Simone Cruxên. Limites do "jus variandi" do empregador. São Paulo:
LTr, 1997.
89
MORAES FILHO, Evaristo de. Do contrato de trabalho como elemento da empresa. São
Paulo: LTr, 1993, p. 46.
90
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 23.ed. São Paulo:
69
Analisando a CLT, identifica-se a teoria institucionalista, por exemplo, nos
artigos 2º, 10 e 448, porque trazem a empresa como empregador, quando este, em
verdade, será uma pessoa física ou jurídica.91
Maurício Godinho Delgado, tratando da teoria em questão, define-a como
uma situação jurídica objetiva, ou seja, o "[...] simples fato da prestação de serviços
seria o elemento essencial e gerador de direitos e obrigações na ordem jurídica."92
A vertente de tal pensamento restou sobrepujada pela crítica, porque, por
mais dirigido que seja o contrato de trabalho, denota-se um acordo de vontades entre
empregado e empregador, como se verá a seguir. Ademais, tal teoria não se coaduna
com o ordenamento pátrio na medida em que, por exemplo, o art. 4º da CLT trata
como serviço efetivo o tempo de aguardo de ordens pelo empregado, estando à
disposição do empregador.
Por certo que ainda no liame anticontratualista, ergue-se a teoria da propriedade
privada, a qual afirma que o poder diretivo do empregador tem origem na propriedade:
"[...] a propriedade como título é o fundamento da empresa."93 O empregador, porque
detém os meios de produção e porque assume o risco da atividade econômica tem
o poder de dirigir a prestação de serviços, assim, formalmente há um contrato entre
empregado e empregador, mas sua principal causa é o direito de propriedade.
O direito de propriedade, direito sobre as coisas, no entanto, não explica um
comando em relação a pessoas, observação importante quanto ao pensamento da
vertente da propriedade privada. Aldacy Rachid Coutinho, por sua vez, argumenta
que, o fato de o empregador ter o poder, por ser o dono, implica a impossibilidade de
que o delegue a terceiros ou a empregados. Caso existisse participação igualitária na
gestão da empresa e entre o trabalho e o capital, verificar-se-ia a desnecessidade não
só do contrato de trabalho, mas também de sua tutela.94
De outra banda, há a teoria contratualista, devendo como tal ser visualizada
em clássica e moderna.
A visão clássica ou tradicional costuma definir o contrato de trabalho por um
70
viés civil. Aproximam-no da locação ou arrendamento, da compra e venda, da
sociedade e do mandato.
A propósito, Pavelski enfatiza que “a idéia de locação ou arrendamento tem
sua gênese no Direito Romano, por meio dos institutos da locatio operarum e da
locatio operis”95. Respectivamente, uma pessoa locava seu trabalho para outra, ou,
ainda, uma pessoa comprometia-se a realizar um determinado trabalho ou obra para
outra.
Em termos de compra e venda, concebe-se o empregado como vendedor de
seu trabalho para o empregador. O trabalho corresponde a uma mercadoria e o preço
desta seria o salário.
Ambas as teses não podem ser sustentadas porque confundem o
trabalhador com a sua própria força de trabalho96. Admitida a locatio operarum como
válida, ratificar-se-ia o trabalho escravo.97
Quanto à compra e venda, ainda, restaria difícil sustentar a característica da
continuidade inerente à relação empregatícia. Em tal concepção, outro caractere
importante tratava-se da autonomia da vontade: as partes estipulariam livremente as
cláusulas objeto da pactuação. Porém, o empregador não pode dispor da força de
trabalho do empregado como dispõe de qualquer outro meio de produção, o trabalhador
não é objeto. Não se confundem, como dito, a pessoa do trabalhador e sua força de
trabalho.
A correlação entre contrato de trabalho e contrato de sociedade sustenta que
existe um objetivo comum entre empregado e empregador, ou seja, poder dividir o
resultado da produção98. Todavia, não prospera a afirmação porque subordinação
não se confunde com a relação entre os sócios (affectio societatis)99, e também por
causa do contido no art. 2.o da CLT, onde categoricamente está determinado o risco
95
PAVELSKI, Ana Paula. Os direitos da personalidade do empregado em face do
exercício abusivo do poder diretivo do empregador. Dissertação apresentada em 2008, p.
73.
96
PAVELSKI, Ana Paula. Os direitos da personalidade do empregado em face do
exercício abusivo do poder diretivo do empregador. Dissertação apresentada em 2008, p.
73.
97
BARACAT, Eduardo Milléo. A boa-fé no direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2003.
p.82.
98
PAVELSKI, Ana Paula. Os direitos da personalidade do empregado em face do
exercício abusivo do poder diretivo do empregador. Dissertação apresentada em 2008, p.
76.
99
DELGADO, Curso de direito..., p.310.
71
da atividade econômica como característica do empresário.
Ainda na visão tradicional, a teoria do contrato de trabalho como mandato.
Tendo em vista a confiança que permeia a relação de emprego, o empregador seria
o mandante e o empregado, o mandatário. A recusa da teoria é óbvia. O primeiro
argumento está galgado no sentido de que somente nos cargos de confiança as
relações de trabalho transferem ao empregado poderes de mando ou de gestão
característicos de um mandatário100. Por outro lado, o mandato aceita revogação a
qualquer tempo e nos contratos de trabalho a rescisão tem impedimentos, citando-
se como exemplo os trabalhadores estáveis. Finalmente, o mandato pode ser
gratuito e o contrato de trabalho detém como um de seus requisitos a onerosidade.
Finalmente, o pensamento contratualista moderno, pelo qual não se vincula
o contrato de trabalho a um contrato civil específico como antes se tentou, em vista
da autonomia do Direito do Trabalho.
As partes declaram, ajustam suas vontades quanto às condições de trabalho
e o contrato se desenvolverá de acordo com tais definições. O contrato, dessa forma
– visto como um negócio jurídico – cria uma relação jurídica, existe antes da relação
de emprego e não apenas corresponde a ela.
A vontade livre resgata a dignidade do ser humano, e, portanto, por isso
partiu da análise da autonoia (privada individual e coletiva) vez que é a manifestação
plena de liberdade em contratar, se associar ou não. O trabalhador se vincula ao
empregador na relação jurídica de trabalho por meio da manifestação de sua
liberdade, de sua vontade de trabalhar sem que isto lhe tenha sido imposto.101
O poder diretivo do empregador passa a ter sua sede no contrato de trabalho,
ou seja, é tal contrato que determina a possibilidade de que a entidade patronal dirija a
prestação de serviços do empregado. Duas posições correlatas: o trabalhador com seu
dever de obediência e o empregador, estabelecendo o conteúdo do trabalho prestado.
Refletindo sobre a natureza contratual da relação de emprego, Amauri Mascaro
Nascimento diz que “o vínculo entre empregado e empregador é uma relação jurídica
72
porque há uma relação social que liga tais sujeitos, mostrando-se regulada por normas
jurídicas”. No mesmo sentido, Pavelski assim se manifesta, e “Afirma ser a relação
jurídica mencionada negocial, porque nela se identifica a vontade das partes,
especialmente no momento da formação do vínculo jurídico”102. Então, a mesma
vontade que impulsinou à relação contratual, deve manter-se durante a sua
execução, e, quiça, após, vez que os dados devem ser preservados, p.ex.
informações confidenciais que o empregado obteve durante o vínculo contratual.
Nesse sentido, o elemento volitivo continuará subsistindo durante a execução da
relação contratual, ainda que de maneira mais esparsa, pois as partes precisam
respeitar as disposições legais e coletivas que versam sobre a relação empregatícia,
o que, contudo, não impedirá a fixação de regras por livre estipulação.103
Importante destacar que a vontade das partes não é ilimitada, assim, pode
parecer contraditório em se falar sobre autonomia privada, mas com limites. Ora,
essa aparente contradição se justifica justamente para que a própria norma possa
proteger o empregado de si mesmo, ao ponto de evitar tomar atitudes preciptadas
que lhe prejudique.
É o que se percebe, a principal diferença entre a relação contratual
empregatícia e as demais não está no objeto, mas na maneira como ele se realiza
na prática. É o que se depreende das palavras de Nilson de Oliveira Nascimento:
73
autonomia da vontade, um dos ícones do Estado Liberal, individualista, preocupado
muito mais com a propriedade, pela autonomia privada.
A liberdade de contratar, a autonomia privada em decidir as regras desse
contrato, dentre outras expressões que envolvem a livre iniciativa, se entrelaçam de
modo a repercutir no direito das partes/contratantes, a esse respeito, asism se
manifestou Rosa Maria de Andrade Nery:
74
Há entendimento de que sequer há manifestação da vontade por parte do
empregado, é o que sustenta Eduardo Milléo Baracat, que parte do pressuposto que
o trabalhador não exprime sua vontade quando da contratação, diz, ainda, que muito
menos é livre tal vontade, a razão dele se baseia no fato de ser impensável
empregador e empregado ajustando valores em função da contraprestação. O autor
explica a vontade do trabalhador como fenômeno social, diz que quando este aceita
uma proposta de trabalho "[...] não o faz em seu nome, nem manifesta um atributo
de sua alma; ele expõe, na verdade, a vontade do conjunto das relações sociais nas
quais vive."109
Então, embora se trate de negócio jurídico, portanto, regulado pelo art. 104,
CC/02, dentro dessa capítulo do Código Civil, - parte geral -, ainda há as tratativas
quanto as invalidades e às nulidades, o qual deve ser interpretado
concomitantemente com o artigo 7.o, XXXIII da Constituição Federal.
A crítica do autor - Baracat - vai no sentido de um princípio do Direito do
trabalho, da vedação do retrocesso social, caso queira partir do pressuposto que as
relações laborais são equiparadas aos negócios jurídicos regulados pelo Código
Civil. Pavelski110 esclarece o posicionamento defendido por Baracat, que
fundamenta-se na história, ressalta haver autonomia entre os dois ramos do Direito
justifica-se pelo rompimento das regras calcadas no individualismo jurídico do Estado
burguês para ascensão do bem comum, por meio de "[...] novas categorias e normas,
fundamentadas nas idéias de empresa, empregador, instituições repre- sentativas,
relações coletivas, etc."111
Porém, pela natureza da pesquisa ser dialética, (ponto e contraponto),
Dallegrave Neto, também ao partir da historiografia sobre os negócios jurídicos, reafirma
a “aplicação de sua estrutura geral aos contratos de trabalho, ante o paradigma de
solidarismo constitucional hodierno, bem como das cláusulas gerais como boa-fé e
função social dos contratos e por que não mencionar o abuso de direito”.112
2003, p. 112.
109
BARACAT, Eduardo Milléo. A boa-fé no direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2003,
p. 112
110
PAVELSKI, Ana Paula. Os direitos da personalidade do empregado em face do
exercício abusivo do poder diretivo do empregador. Dissertação apresentada em 2008, p.
113.
111
BARACAT, Eduardo Milléo. A boa-fé no direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2003,
p. 113.
112
DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Análise de conjuntura socieconômica e o impacto no
75
O autor explica o surgimento da idéia de negócio jurídico a partir da escola
pandectista alemã, precursora de um profundo abstracionismo, propagadora da
igualdade meramente formal das partes contratantes, resultando na excessiva
valorização da autonomia da vontade de tais personagens – a jurisprudência dos
interesses. Considerando necessárias a justiça comutativa e a igualdade também
material, surgem intervenções do agora denominado Estado Social e a autonomia
privada, como dito, supera a autonomia da vontade113.
Repensa-se o ordenamento pelo viés constitucional, um norte inspirado pela
dignidade da pessoa humana, pelo solidarismo e pela ética, impregnado de
considerações sobre o progresso social. A influência de tais axiomas no Código Civil
de 2002 é visível para o autor, no qual continuam presentes a acepção do negócio
jurídico e sua regulação, mas assentes nos valores constitucionais mencionados,
demonstrando a passagem da jurisprudência dos interesses para a jurisprudência
dos valores, ocorrendo o denominado dirigismo contratual.
Quanto aos problemas das nulidades, o autor ressalva a existência de incom-
patibilidades entre os institutos dos negócios jurídicos e os do Direito do Trabalho.
Contudo, há um contraponto àqueles que entendem com ressalvas os contratos
trabalhistas como negócio jurídico, assim, nas palavras de Gunther, Villatore,
Martins:
76
peculiaridades de cada um daqueles elementos essenciais do negócio
jurídico114.
114
GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE, Marco Antônio César. MARTINS, Gustavo Afonso.
Acesso à Justiça do Trabalho e o acesso à justiça. Instituto Memória. Curitiba-PR, 2019,
p. 50.
115
Art. 2.o Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os
riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.
§ 1.o Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os
profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras
instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.
[...]
Art. 3.o Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não
eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
77
subordinação é econômica, técnica ou jurídica. A concepção a respeito do significado
de dependência para a legislação pátria coube à doutrina.
Analisando-se o tema, contudo, tem-se que a subordinação não pode ser
vista como meramente dependência econômica, técnica ou social.
Quanto à dependência econômica, justificar-se-ia pelo fato de o salário
significar o meio (exclusivo ou principal) de subsistência do trabalhador. Sem
embargo, há casos em que o trabalhador possui uma condição econômica de mais
expressividade que o seu empregador. Outras ocorrências denotam que o
trabalhador se dedica a outra atividade que lhe rende além do trabalho subordinado.
Pense-se em alguém que, além de trabalhar por conta alheia numa empresa
qualquer, faz artesanato e o comercializa em feiras e outras exposições.
No Brasil, a ocorrência de contratos de trabalho para mais de um empregador
mostra-se possível, por exemplo, quanto aos contratos a tempo parcial e também
para os trabalhadores que laboram sob o regime de jornada 12 x 36. No que toca à
realização de outra atividade além daquelas caracterizadas como uma relação
empregatícia para complemento da renda, não são raras as pessoas que vendem
artesanato, cosméticos e outros diversos produtos por catálogos, doces e salgados
caseiros, fazem peças de design e publicidade, traduções e tantas outras atividades
realizadas sem a configuração do vínculo empregatício. No jargão popular, fala-se em
"criatividade" para obter renda complementar e conferir mais dignidade à subsistência
própria, assim como do seio familiar.
Dessa maneira, embora seja permitido dizer que a maioria das relações de
emprego possui uma dependência econômica, não se pode utilizar do vocábulo
"todas". De outra banda, os proventos de ordem econômica também ocorrem sem a
presença de um vínculo empregatício, notem-se as diversas atividades citadas.
Adentrando-se o tema da dependência técnica, concebe-se como a orientação
técnica do serviço passada pelo empregador ao empregado. Ao empregador
caberiam os conhecimentos técnicos e científicos para a realização do trabalho.
A dependência social funde os dois critérios, quais sejam o econômico e o
jurídico. O contrato de trabalho normalmente conteria subordinação econômica e
jurídica, sendo excepcionalmente presentes uma ou outra. O critério não se perfaz
suficiente, porque a dependência econômica existe mais como um suporte fático na
relação de emprego, como dito, ainda que o empregado não dependa economicamente
78
do empregador, subsiste a subordinação jurídica, adiante tratada.
A subordinação mais aceita nos dias de hoje a justificar a sujeição do
empregado ao empregador é aquela denominada como jurídica, pela qual o empregado
cumprirá as ordens emanadas pelo empregador ou por seus prepostos.
Verifica-se nas palavras de Nilson de Oliveira do Nascimento que: “o critério da
subordinaçã jurídica se fundamenta no contrato de trabalho. O contrato de trabalho cria
um estado de subordinação hierárquica, em virtude do qual o empregado trabalha sob a
direção do empregador”116.
Em verdade, de um lado tem-se que ao empregador é lícito, é necessário
este poder de comando a fim de que a empresa possa ser organizada e atinja sua
finalidade econômica. De outro lado, tem-se que o empregado está subordinado ao
empregador e necessária se faz sua sujeição a tal poder diretivo.
Ocorre que tal sujeição deve ser pautada por limites, como já dito. De fato,
as mudanças econômicas refletem mudanças nas relações que contemplam esse
poder. "Não se pode esquadrinhar a ciência jurídica divorciada do modo de produção
e do modelo de Estado a ela subjacente."117 Como demonstrado, cada vez se
concebe como mais difícil definir o significado de subordinação.
Relembre-se aqui, desde logo, um dos princípios da Organização Internacional
do Trabalho (OIT), constante da Declaração de Filadélfia: "o trabalho não é uma
mercadoria". Não se pode confundir o trabalho com mercadoria. "O trabalho, como
causa primária de todas as mercadorias, não pode ser idêntico ao seu produto.
É uma atividade potencial, capaz de produzir por si própria. Materializa-se no objeto
que produz ou transforma."118
Em relação aos aspectos tratados como de subordinação jurídica, tem-se
concebido que são carregados de intersubjetividade, de pessoalidade. Por isso
mesmo que a doutrina os tem considerado como subordinação jurídica subjetiva,
personalista ou hierárquica.119
79
Nesse sentido, Arnaldo Süssekind que:
80
Para a corrente que considera a subordinação como de caráter objetivo, o
poder diretivo do empregado encontrará limite de fácil identificação: deve atuar
somente na atividade do empregado, de modo a orientá-la, defini-la, desenvolvê-la.
Desta forma, não se justificam intervenções do poder diretivo do empregador que
venham a espraiar efeitos na pessoa dos empregados.
Ainda que sejam várias as concepções sobre a subordinação, traço marcante
na relação entre empregado e empregador, é sensível a preocupação com os direitos
de personalidade dos empregados, até mesmo decorrente das tecnologias
disruptivas e redes sociais, vide legislação atual, Lei Geral de Proteção de Dados,
Lei nº. 13.709/2018, que tutela os direitos das pessoas físicas, o que, em certa
medida, pode ocorreu são afrontados pela atuação abusiva do poder diretivo do
empregador.
Subordinação Dependência
Objetiva Subjetiva
o poder diretivo do empregado
encontrará limite de fácil identificação:
deve atuar somente na atividade do
empregado, de modo a orientá-la, defini-
la, desenvolvê-la.
Tabela do autor
81
constitucional, é a constitucionalização do direito civil, por exemplo. Os operadores
do direito e mesmo as leis, cada vez mais, abrem seus discursos e sua prática à
dignidade da pessoa humana, em detrimento da visão patrimonialista que marcou os
Códigos que se seguiram ao modelo francês napoleônico.
No plano nacional, a Constituição de 1988, em seu capítulo II, intitulado: Dos
Direitos Sociais, dispõe em seu art. 6º, entre outros, que são direitos socais o trabalho
na forma desta Constituição. Em seu art. 7º, prevê os direitos dos trabalhadores, além
de outros, que visem a melhoria de sua condição social.
Como a pretensão não é analisar inciso por inciso, a abordagem se dará de
forma ampla quanto a tutela constitucional dos direitos dos trabalhadores. Veja-se
que, segundo as palavras de Lima “a Constituição de 1988 supervalorizou o ser
humano. (...). Com isso, a Constituinte manifesta seu desejo de mudar o eixo de
prioridade: do Estado para o homem”123.
Segundo o autor acima, pelo viés constitucional, a partir de 1988, a atenção
passa a ser com maior intensidade ao indivíduo e não tanto para o Estado. Com isso
não está a proteger e/ou prestigiar somente o trabalhador, mas a todos os indivíduos,
que se inserem na relação laboral.
Pela localização do art. 7º dentro da Constituição de 1988, é nítido que os
direitos trabalhistas, quanto previstos no Capítulo dos Direitos Sociais, não são
exclusivos e únicos, mas apenas parte importante daquilo que se fixou após
conquistas que a história revela. A propósito, vale destacar as palavras de Lima:
123 LIMA, Francisco Meton Marques. Elementos de direito do trabalho e processo trabalhista. São Paulo,
LTr, 2013, p. 38.
124 LIMA, Francisco Meton Marques. Elementos de direito do trabalho e processo trabalhista. São Paulo,
82
porque há previsão constitucional, pela segunda, basta que garanta que o disposto na
Constituição seja prestada por ele ou por particulares.
Quanto a tutela constitucional dos direitos dos trabalhadores, e direcionando
o tema ao que se pretende oportunamente analisar, o princípio da intervenção mínima,
far-se-á uma breve descrição de alguns dispositivos atinentes a alguns direitos
trabalhistas indagando-os em razão da inovação trazida pelo §3º, art. 8º, CLT.
Dos 34 incisos, mais o parágrafo único do art. 7º, da Constituição de 1988,
todos, sem exceção, devem ser lidos e interpretados a partir do caput, que em síntese
estabelece quais são os direitos dos trabalhadores, além de outros que visem a
melhoria de sua condição social.
Além dos casos mencionados e elencados na pesquisa (assédio moral, desvio
de função e acúmulo de função), pode ocorrer abuso em outras tarefas/funções, p.ex.
o trabalho intermitente; Duração do trabalho normal superior a oito horas e quarenta
e quatro semanais; ou ainda, negociar que a gestante não será afastada de suas
funções, mesmo que trabalhe em local insalubre? Isso seria abuso do poder diretivo?
Veja que essa questão é metaindividual, vez que liga-se ao seio familiar e à
expectativa de direitos dos nascituro. Nas palavras de Lima:
O art. 394-A da CLT, tem redação que não é destinada apenas à trabalhadora,
mas também à sua família e ao nascituro que está em constante desenvolvimento.
Esse dispositivo é questionável na medida em que atenta contra os direitos da
personalidade, à vida.
São apenas alguns exemplos extraídos do Direito Individual do Trabalho que
certamente reduzem a condição social do trabalhador, mas, com base numa
compreensão fria quanto ao Poder diretivo, pode se presumir que o empregador
LIMA, Francisco Meton Marques. Elementos de direito do trabalho e processo trabalhista. São Paulo,
125
83
poderia tudo, o que não se revela na prática da justiça especializada. Vide pesquisa
quantitativa.
No último capítulo será analisado mais atentamente a origem, significação e
aplicação deste princípio nas relações trabalhistas a fim de tentar chamar a atenção
a algo com potencial devastador na clássica e tradicional forma de vínculos laborais
de proteção e garantias.
126
Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:
a) ato de improbidade;
b) incontinência de conduta ou mau procedimento;
c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando
constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial
ao serviço;
d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido
suspensão da execução da pena;
e) desídia no desempenho das respectivas funções;
f) embriaguez habitual ou em serviço;
g) violação de segredo da empresa;
h) ato de indisciplina ou de insubordinação;
i) abandono de emprego;
j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas
físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e
superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
l) prática constante de jogos de azar.
m) perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão,
em decorrência de conduta dolosa do empregado. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
Parágrafo único - Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática,
devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança
nacional. (Incluído pelo Decreto-lei nº 3, de 27.1.1966)
84
caso de violação das obrigações assumidas pelo empregado. Daí por
que o dever de obediência é limitado em razão da matéria (obrigações
relativas ou conexas à prestação de trabalho) e em razão do tempo
(vigência do contrato). Dado, porém, o elemento fiduciário, ínsito no
contrato de trabalho, esta última limitação deve ser entendida em
termos: mesmo durante os períodos de suspensão ou interrupção do
contrato, continua o empregado sujeito à obrigação de acatamento às
normas de disciplina e respeito ao empregador e superiores
hierárquicos. A sanção disciplinar pressupõe, ainda, sempre a culpa
do empregado, impondo-se, por outro lado, seja guardada certa
proporção entre a falta e a sanção127.
127
SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima.
Instituições de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 236.
128
SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima.
Instituições de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 1997. v. 1, p. 237.
85
encontra limite quanto as formas de sancionar o empregado, sendo vedado, p.ex.
multa salarial ou puní-lo com transferência da qual o único objetivo é prejudicial.
86
Ao ser contratado pela empresa o empregador transfere ao
empregador o poder de direção do seu trabalho, passando a ser
subordinado ao mesmo. Assim estrutura-se a relação jurídica objeto
do direito do trabalho: de um lado: o poder de direção reconhecido
pela ordem jurídica ao empregador e exercida como contrapartida
aos riscos da atividade econômica inerentes à atividade empresarial;
de outro lado: o estado de subordinação do empregado, que se
submete às regras de caráter hierárquico emandas do
empregador.129
87
preenchidos pelo poder diretivo. Não é uma obrigação de trabalhar
qualquer, genérica ou abstrata e até mesmo inexequível, mas de
acordo com o especificado pelo empregador.133
A tabela acima, foi para evidenciar que a relação jurídica estabelecida entre
empregador e empregado é um negócio jurídico, respeitada as pecurialidades do
Direito do trabalho se comparado ao Direito Civil, mas deixa claro se tratar de relaçao
mútua, prestação e contraprestação.
Assim, contemporaneamente, se reconhece os avanços nas negociações
laborais, de modo que, à luz da Constituição de 1988, bem como princípios da
dignidade da pessoa humana, e princípios próprios – mais evidentes – no direito
comum, também se aplicam no âmbito trabalhista, p.ex. boa-fé objetiva, a função
social dos contratos, vedação ao retrocesso, dentre outros que refletem nas relações
laborais.
Diante do objeto da pesquisa, que é analisar – o abuso do poder diretivo -, e
medidas para mitigá-lo, direciona-se para a definição que respalda a pretensão da
pesquisa, que é defendida por Rui Assis, que sustenta que o contrato de trabalho tem
peculiaridades, como a mencionada correlação de créditos e débitos para
empregado e também para empregador.
Assim, esclarece Pavelski:
133
VIANA, Marcio Túlio. Direito de resistência: possibilidades de autodefesa do
empregado em face do empregador. São Paulo: LTr, 1996, p.134.
134
PAVELSKI, Ana Paula. Os direitos da personalidade do empregado em face do
exercício abusivo do poder diretivo do empregador. 2008, p. 119.
88
relação empregatícia não se compreende tão-somente como mero negócio bilateral,
mas como uma relação jurídica complexa.
O direito também é mais complexo, há quem destoe da exposição acima, o
que nas palavras de Carlos Alberto da Mota Pinto, direito subjetivo é sinônimo de
liberdade de atuação e poderes, assim entendidos os poderes-deveres ou poderes
funcionais, que não englobam tal liberdade de atuação, porque:
não podem ser exercidos se o seu titular quiser e como queira, mas
devem ser exercidos pelo modo exigido pela função do direito. Se não
forem exercidos quando deviam sê-lo, ou forem exercidos de outro
modo, o seu titular infringe um dever jurídico e é passível de
sanções."135
135
PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do direito civil. 3.ed. atual. 11. reimp.
Coimbra: Coimbra Editora, 1996.p.169-170.
136
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil: introdução ao direito civil constitucional. 2.ed.
Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p.123.
89
jurídicas que decorrem das situações subjetivas, dentre elas: direitos subjetivos (v.
g. direito de o empregado exigir seu salário e o direito do empregador de se beneficiar
da prestação de serviços), ônus (obrigação de o empregador homologar a rescisão
de contrato de trabalho com mais de um ano junto ao sindicato profissional ou ao
Ministério do Trabalho), poderes (poder diretivo do empregador).137
Eduardo Milléo Baracat, identificando o poder diretivo como situação jurídica
subjetiva, diz que ele não gera uma pretensão, no sentido declinado quanto ao direito
subjetivo, mas a sujeição do empregado. Esclarece o autor, ainda, que o poder de
direção do empregador não pode ser renunciado, porque se o fizer, perderá sua
titularidade.138
Além das teorias acima, há uma terceira corrente defendida por Maurício
Godinho Delgado, que, assim, se manifestou:
137
BARACAT, Eduardo Milléo. Poder de direção do empregador: fundamentos, natureza jurídica e
manifestações. In: _____ (Coord.). Controle do empregado pelo empregador: procedimentos
lícitos e ilícitos. Curitiba: Juruá, 2008, p.34-35.
138
Ibidem, p.36.
139
DELGADO, Mauricio Godinho. O poder empregatício. São Paulo: LTr, 1996. p.191-192.
140
DELGADO, Mauricio Godinho. O poder empregatício. São Paulo: LTr, 1996, p.193.
141 PAVELSKI, Ana Paula. Os direitos da personalidade do empregado em face do exercício
90
3 COMPLIANCE COMO MECANISMO DE TUTELA DA RELAÇÃO
CONTRATUAL TRABALHISTA
142
MANZI, Vanessa Alessi. Compliance no Brasil: consolidação e perspectivas. São
Paulo: Saint Paul, 2008, p. 15.
91
Da Constituição ao Compliance
Contituição CLT Convenções CCT/ACT Compliance
Art. 7º - Art. 7º Art. 3º - Convenções Convenção Programa
São direitos Considera-se internacionais coletiva de interno de
dos empregado do trabalho: Trabalho e observância
trabalhadores toda pessoa OIT – Acordo obrigatória
urbanos e física que Organização Coletivo de tanto pelo
rurais, além prestar Internacional Trabalho. empregador
de outros que serviços de do Trabalho P.ex. art. 611- como pelos
visem à natureza não A, art. 611-B, empregados
melhoria de eventual a CLT prevê o quanto ao
sua condição empregador, que pode e o que se deve
social: sob a que não pode observar e
dependência ser objeto de cumprir.
deste e negociação.
mediante
salário.
Tabela do autor
143
SILVA, Daniel Cavalcante. Compliance como boa prática de gestão de ensino
superior privado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 2.
92
Tal relação se fundamenta de modo que o compliance é essencial no que tange
às práticas negociais.
É nesse sentido, que Bertoncini e Ferreira:
144
BERTONCINI, Mateus Eduardo Siqueira Nunes. FERREIRA, Daniel. A importância
do controle cidadão nos programas de integridade (compliance) das empresas estatais
com vistas ao desenvolvimento nacional. Revista Jurídica UNICURITIBA, v. 04, n. 45,
p.126-138, 2016. Disponível em:
http://revista.unicuritiba.edu.br/index.php/RevJur/article/view/1771/1162>. Acesso em
13 de nov.de2020.
145
SAAVEDRA, Giovani Agostini. Reflexões iniciais sobre criminal compliance. In:
Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 18, n. 218, jan., 2011. p. 11/12.
93
3.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO NORTEADORES DO
COMPLIANCE TRABALHISTA
94
cultural, garantido pela constituição já estivesse inserido como valor social.
Sendo o direito do trabalho um valor social constitucionalmente
garantido, torna-se aplicável o princípio da vedação do retrocesso na medida em
que se presenciar potencial aplicação diminutiva de direitos trabalhistas,
sobretudo aqueles condizentes com direitos fundamentais do trabalho.
Importa esclarecer não ser tal princípio algo vitalício, contudo, deve
haver medida compensatória em caso de supressão de um direito por outro.
Assim, enquanto os direitos sociais exigem uma prestação e intervenção positiva
do Estado, o princípio da vedação do retrocesso exige uma obrigação de não
fazer, uma abstenção, uma ação negativa. Portanto, este princípio busca evitar
que a Intervenção do Estado ao legislar, por conseguinte, intervir na economia
de forma indireta, enfraqueça os direitos fundamentais outrora reconhecidos e
outorgados pelo próprio Estado.
Para que não se pense em aparente conflito entre o princípio da vedação
do retrocesso e o Estado Democrático de Direito, Barroso149 esclarece que tal
princípio decorre justamente do princípio do Estado Democrático e Social de
Direito, do princípio da dignidade da pessoa humana, do princípio da máxima
eficácia e efetividade das normas definidoras dos direitos fundamentais, do
princípio da proteção da confiança e da própria noção do mínimo existencial.
Portanto, o cenário que se constrói nesse capítulo é a existência dentro
de um mesmo diploma legal de dois princípios, um que prima pela abstenção do
Estado (por parte do Poder Judiciário), e, outro que prima pela presença do
Estado a fim de garantir a efetividade dos direitos sociais, sobretudo,
trabalhistas.
Os direitos sociais, também conhecidos como direitos de segunda
dimensão, estão, ou devem estar intrinsecamente conectados às possibilidades
de o Estado em efetivá-los. Não obstante a isso, fato é que, após trazidos ao
ordenamento jurídico, a sua supressão ou restrição encontra grande resistência
na doutrina em virtude do princípio da vedação ao retrocesso social.
Nesse sentido, não se pode olvidar que o Estado conceder direitos é
149
BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas
normas. 5.ed. Rio de Janeiro, Renovar, 2001, p. 158.
95
algo de suma importância, mas, mais do que isso, é preciso que se permita a
sua estabilidade, de modo que o cidadão dele possa usufruir ao longo do tempo.
Apesar disso, o tema desperta uma certa dose de discussão, pois há três
correntes distintas que possuem as seguintes considerações: a) os direitos
sociais não são cláusulas pétreas, e portanto, poderiam ser abolidos, b) todos
os direitos sociais estão inseridos nas cláusulas pétreas, e por isso, não podem
ser abolidos, e, c) somente os direitos sociais, cuja a titularidade seja individual
são considerados cláusulas pétreas, e assim, estes direitos não poderiam ser
abolidos.
Em que pese as várias vertentes citadas, é preciso ressaltar a análise
realizada por Sarlet (2014, p. 582) sobre a questão no Brasil:
150
SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional brasileiro. 3.ed. rev.
atual. e ampl. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2014, p. 582.
151 SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional brasileiro. 3.ed. rev.
96
além disso, considerando que a Constituição de 1988 é dirigente, ou seja, que
possui como escopo transformar a realidade do Estado, a reforma demonstra
não guardar compatibilidade com tal característica.
Complementa-se ainda, nas palavras de Sarlet que:
152
SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional brasileiro. 3.ed. rev.
atual. e ampl. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2014, p. 583.
153 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e a Teoria da Constituição. 7.ed.
97
possível sustentar que a reforma trabalhista, quando suprimiu direitos, perpetrou
uma violação constitucional, consubstanciada na ofensa à segurança jurídica, à
confiança, e aos princípios do Estado Democrático Social de Direito, além de
demonstrar incompatibilidade com o dirigismo, característica marcante da
Constituição de 1988, fato que permite a arguição de inconstitucionalidade das
modificações realizadas perante o Poder Judiciário, que em última análise
deverá trazer à tona debates em torno dos princípios como o da justiça social e
da valorização do trabalho humano, objetivos a serem perseguidos pelo Estado
brasileiro.
154
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. São Paulo: Editora
Malheiros, 1992, p. 137.
98
Nesse sentido, os princípios são, no ordenamento jurídico, os
norteadores para que as normas sejam editadas. Deste modo, merecem ser
analisados, três princípios relevantes no âmbito das relações de trabalho:
princípio da justiça social, da valorização do trabalho humano e da vedação ao
retrocesso social para descobrir em que medida a reforma na legislação do
trabalho os observou ou não.
Essa organização codificada e/ou de interpretação das normas jurídicas,
faz-se necessário na medida em que refletem diretamente na sociedade.
Noutras palavras, Grau esclarece que “podemos dizer que o direito é um
instrumento de organização social: sistema de normas (princípios) que ordena –
para o fim de assegurá-la – a preservação das condições de existência do
homem em sociedade”155.
Percebe-se, que o princípio da justiça social enquadra-se em uma ideia
de equilíbrio de interesses individuais e/ou coletivos, onde a ponderação e
razoabilidade ganham espaço e protagonismo, essa afirmação é cabal vez que,
segundo Grau o “direito pretende proteger e assegurar a liberdade de agir do
indivíduo, subordinando-a ao interesse coletivo, tendendo à determinação de um
ponto de equilíbrio ente esses dois valores”156.
Importa destacar que ambos sendo previstos na Constituição de 1988,
esta é o fundamento de validade das demais normas, regras e princípios
hierarquicamente inferiores a ela, de modo que a inserção somente será válida
se respeitadas as diretrizes constitucionais. Nas palavras de Streck:
155
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 11.ed. rev. e
atual. São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 23.
156
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 11.ed. rev. e
atual. São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 23.
157
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e decisão jurídica. 3.ed. São
Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, p. 37.
99
constitucionalidade das ações submetidas a ela, na medida em que todas devam
ser direcionadas às finalidades constitucionais previstas. As demais normas que
a complementam são para dar efetividade e concretude às suas previsões.
Porém, como explicita Streck, “parcela expressiva das regras e princípios nela
previstos continuam ineficazes”158. E o acesso à justiça é um bom exemplo para
o livro, vez que com a inserção do princípio da intervenção mínima, a tendência
é de mitigar aquele princípio constitucional.
Nesse sentido, Streck, faz a seguinte indagação:
158
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e decisão jurídica. 3.ed. São
Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, p. 39.
159
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e decisão jurídica. 3.ed. São
Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, p. 39.
100
Aqui dois pontos preliminares, os quais serão analisados com mais
detalhes no tópico seguinte, merecem destaque: a valorização do trabalho
humano e a livre iniciativa, o que implica o reconhecimento de que a existência
do trabalho, seja ele com vínculo empregatício ou o desenvolvido pela força do
empreendedor (pautado na livre iniciativa) é considerado fundamental para que
o país atinja os seus objetivos sociais, no caso, que todos os cidadãos possuam
uma vida digna em conformidade com os ditames da justiça social.
Porém, cabe verificar outro princípio constante no caput do art. 170: O
Princípio da Justiça Social (BRASIL, 1988). Expressão que conduz a um conceito
contingencialmente indeterminado, que não tem o vocábulo “social” funcionando
como adjetivo de justiça, mas sim como outro substantivo, e o seu significado
deve ser compreendido como a junção de ambos, é nessa perspectiva que se
manifesta Grau:
Após esta lição, Grau prossegue e expõe o que deve ser considerado o
conceito de justiça social:
160
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 11.ed. rev. e
atual. São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 223/224.
101
qualquer política econômica capitalista161.
161 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 11.ed. rev. e
atual. São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 224.
162
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e decisão jurídica. 3.ed. São
Paulo, Revista dos Tribunais, 2013, p. 113-114.
102
aplicação somente será possível se ocorrer nas definições constitucionais a fim
de concretizar direitos sociais e, sobretudo, não restringir direitos lá contidos,
nesse particular, o acesso à justiça.
Diante disso, o Estado brasileiro tem a obrigação de perseguir a justiça
social, de modo que, segundo Canêdo (2014, p. 23):
163
CANÊDO, Paula Fernandes Teixeira. Direitos à liberdade e à igualdade – Estado
da (in) justiça social. Disponível em <http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,direitos-
a-liberdade-e-a-igualdade-estado-da-in-justica-social,46851.html> Acesso em
11.out.2020.
103
A valorização do trabalho humano e reconhecimento do valor
social do trabalho consubstanciam cláusulas principiológicas
que, ao par de afirmarem a compatibilização – conciliação e
composição – (...) portam em si evidentes potencialidades
transformadoras164.
164 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 11.ed. rev. e
atual. São Paulo, Malheiros Editores, 2006, p. 198.
165 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 11.ed. rev. e
104
fiscais, ainda que este favorecimento decorra da própria constituição, no caso,
do inciso IX do art. 170, (BRASIL, 1988) no atual cenário pátrio, observa-se um
desequilíbrio quando comparado ao trabalho realizado no âmbito das relações
de emprego, pois, os empregados enfrentam situação diversa, com as reformas
na legislação passaram a conviver com direitos relativizados, tanto materiais
como os relativos ao acesso ao Poder Judiciário.
Verifica-se haver enorme incongruência no ordenamento jurídico
brasileiro, pois, o trabalho advindo da vertente decorrente do princípio
constitucional da livre iniciativa tem sido favorecido, enquanto o trabalho, oriundo
a vertente das relações de emprego, tem sido duramente desvalorizado, com o
esvaziamento de garantias e direitos.
Neste contexto, é inevitável olhar para a reforma trabalhista como uma
medida de redução de custos com mão-de-obra para os empreendedores,
concedendo, por mais uma vez um tratamento favorecido a esta classe. O
desequilíbrio entre o trabalho desenvolvido pelo empregado e o explorador de
atividade econômica é algo gritante, atualmente a valorização não está no
trabalho em si, mas da maneira como é realizado.
A consequência disso é o impacto no princípio já tratado anteriormente,
o da justiça social. Ao beneficiar uma forma de trabalho em detrimento de outra,
o que se está a permitir é que exista um abismo maior entre o empregado e o
empresário, fato que em última análise em nada contribui com a distribuição de
renda, pelo contrário, estimula a sua concentração.
Ao que parece, o próprio princípio da valorização do trabalho está
sofrendo com uma dicotomia com a reforma trabalhista, pois é patente a
discriminação entre as suas formas, quando na verdade deveriam convergir para
o mesmo objetivo e valorizá-lo como um todo, independentemente da forma e
como o trabalho é prestado.
105
prevê determinada função e, o que pode ocorrer, é o exagero do poder diretivo
que impulsiona o empregador a exigir tarefas alheias àquelas outrora
contratadas e postas no instrumento de contrato.
Nesse sentido, o denominado princípio da primazia da realidade sobre a
forma, esclarece que em uma relação de trabalho o que importa são os fatos,
mesmo que a formalidade contratual seja em sentido diverso. Assim, têm-se uma
ideia que se agrega aos elementos do negócio jurídico – contrato de trabalho -,
a realidade e o contrato devem se espelhar.
Nas palavras de Américo Plá Rodriguez:
168
PLÁ RODRIGUEZ, Américo. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2015,
p. 339.
106
espelhe a realidade. É o que se extrai, inclusive do entendimento sumular do
TST, Súmula 12 ao definir que “as anotações apostas pelo empregador na
carteira profissional do empregado não geram presunção ‘juris et de jure’, mas
apenas ‘juris tantum’.”.
A razão de analisar brevemente este princípio, é porque atos praticados
com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos
contidos na constituição, no que tange ao Direito do Trabalho, serão nulos de
pleno direito, é o que se verifica no art. 9º, CLT.
O legislador assim fixou as regras do Direito do Trabalho, o contrato e a
realidade devem estar alinhadas, sob pena de configurar o abuso do poder
diretivo e, eventuais ações administrativas (MPT), ou judiciais, visando a
indenização correspondente e/ou o restabelecimento do contrato em sua origem
ou a sua adequação com a realidade.
169 Segundo ensina Anaruez Mathies (2017, p. 146) “a aprovação da Lei Anticorrupção,
coibindo a prática de condutas relacionadas à corrupção, decorreu do compromisso
assumido pelo Brasil por meio das Convenções de Combate à Corrupção da
Organização das Nações Unidas (ONU), da Organização dos Estados Americanos
(OEA)525 e da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos
Estrangeiros em Transações Internacionais da Organização para a Cooperação
Econômica e Desenvolvimento (OCDE) ”.
170
SÉLLOS-KNOERR, Viviane Côelho, ZAGONE, Marina. BARACAT, Eduardo Milléo.
Compliance e assédio moral nas relações de emprego: Análise do programa da
companhia paranaense de energia – COPEL. Curitiba, Instituto Memória, 2018, p. 7-
28.
107
O objetivo pode se verificar no art. 41, do decreto 8.420/2015:
171
SÉLLOS-KNOERR, Viviane Côelho, ZAGONE, Marina.. BARACAT, Eduardo Milléo.
Compliance e assédio moral nas relações de emprego: Análise do programa da
companhia paranaense de energia – COPEL. Curitiba, Instituto Memória, 2018, p. 7-
28.
172
CORREIA, Henrique. Compliance nas Relações Trabalhistas. Revista do Tribunal
Regional do Trabalho da 9ª Região V. 9. n.91. Agosto/20. Disponível in
http://www.mflip.com.br/pub/escolajudicial/?numero=91&edicao=11438 Acesso em 16
de nov. 2020.
108
Depreende-se, portanto, que coibir eventuais irregularidades, é também
compatível com o verbo: prevenir. De modo que o Compliance pode ser mais do
um instrumento que prevê punições a atitudes que contrariam os ideiais
valorativos da Empresa, é assim que Viviane Séllos e Leoni:
Assim, diante desse breve contexto, nada impede que tais medidas que
miram na integridade, possa ser ampliada à toda a corporação, de modo a gerar
a cultura íntegra e previsível, que todos aqueles que integram a estrutura
daquela pessoa jurídica, (de direito privado ou público), bem como aquelas
pessoas naturais ou jurídicas que com ela pactue, saibam previamente que estão
173
SÉLLOS-KNOERR, Viviane Côelho. LEONI, Jaqueline. A importância do
compliance na comunicação empresarial. Revista Percurso, vol. 02, n. 33, 2020.
Disponível em:
http://revista.unicuritiba.edu.br/index.php/percurso/article/view/4354/371372608>
Acesso em 10 de nov. De 2020, p. 83.
174
LEDESMA, Thomás Henrique Welter, RODRIGUES, Maria Lúcia de Barros.
Iimplementação do compliance na fundação nacional do índio – FUNAI. Revista
Jurídica UNICURITIBA, v. 02, n. 43, p.127 2016. Disponível em:
http://revista.unicuritiba.edu.br/index.php/RevJur/article/view/1822/1199>. Acesso em
13 de out.de2020, p. 127.
109
contratando com uma empresa em que se observa e se presa por condutas
lícitas, éticas e íntegras.
Se por um lado o Compliance – no Brasil – surgiu para combater práticas
de corrupção, por outro, já se revela cada vez mais eficaz para repelir qualquer
conduta antiética, assim, Zagonel, Séllos, Baracat, enfatizam que “em âmbito
trabalhista está intimamente relacionado aos processos internos de gestão de
pessoas e ao Direito do Trabalho”175.
O Programa de Compliance pode ser elaborado concomitantemente
com os procedimentos de constituição da sociedade (empresarial e/ou simples),
mas também pode ocorrer já na vigência dos contratos de trabalho, vez que as
empresas estão cada vez mais adequando-se a novas tecnologias, mas também
atentas para regras de conduta e certificados de integridade, conformidade e
profissionalidade.
Colabora com essa afirmação, Henrique Correia:
110
Obviamente que o Programa de Compliance é para parametrizar, dar
forma àquilo que se espera. O que é, eventualmente venha a ser feito de
ilíticirregular, é um problema a posteriori, mas que em nada desabona o
programa em si, tampouco a sua importância. Portanto, conforme se extrai das
palavras de Zagonel, Séllos, Baracat: “muito além do cumprimento das normas
previstas no ordenamento jurídico, a implementação do compliance social busca
promover a ética nas relações de emprego e, consequentemente, mitigar riscos
judiciais”177.
Um passo inicial para a implementação do Programa de Compliance
trabalhista, é detectar o problema que se deseja combater/repelir. O que na
dissertação se destaca como problema é: O abuso do poder diretivo. Assim, o
Programa de Compliance vem para fixar limites e alcance no exercício do poder
diretivo. Em outras palavras, tanto o empregado saberá o que se espera dele,
quais outras condutas, comportamento, atividades está contemplado no contrato
de trabalho, assim como o empregador terá um limite prefixado quanto até onde
poderá exigir do empregado.
A eficácia do Programa de Compliance trabalhista depende da
integração no momento da sua elaboração, de modo que não compete somente
ao setor jurídico, ou ao Recursos Humanos, mas a um corpo de profissionais e,
quiça, com participação de um representante dos empregados, para que se
identifique o problema, e se capte meios de resolve-lo. Com cooperação, as
chances de êxito aumentam. A propósito, Zagonel, Séllos, Baracat, entendem
que é, “oportuno reiterar que os programas de compliance devem integrar-se à
toda gestão da empresa, envolvendo desde diretores até fornecedores de
serviços e produtos”178.
Como já mencionado, o Compliance trabalhista não vem para substituir
e/ou competir com outras normas, pelo contrário, vem para somar e mais do que
111
isso, vem a ser desenvolvido em observância com o ordenamento jurídico
vigente. “Por isso, o compliance encontra-se em conexão com a relação
trabalhista, pois visa conscientizar e treinar os empregados, trabalhadores a
respeito das normas éticas internos, de modo a prevenir qualquer ato de fraude
ou conduta irregular dentro e fora da organização”179.
O compliance se mostra de fundamental relevância, eis que padroniza e
tipifica condutas de acordo com o posicionamento ético da instituição, que são
dirigidas por pessoas naturais, e se faz necessário enfatizar isso, para que não
parta de interpretações equivocadas de atribuir à pessoa jurídica
responsabilidades por atitudes ilícitas decididas e praticas pelas passoas
naturais que a compõem. Tanto é assim, que existe o instituto da
desconsideração da personalidade jurídica, que recebeu tratativa nova no art.
50, CC/02.
Ora, se é possível desconsiderar a personalidade jurídica, é porque se
verificou no caso concreto, que as pessoas naturais que compõem o quadro
societário dela agiram em desconformidade com a lei, art. 50, CC/02, p.ex., por
isso a dissertação enfatiza que o Programa de Compliance é mais particular ao
caso concreto de cada empresa, na medida em que verifica o problema e trata
de padronizar condutas íntegras que aquela corporação exige dentro de padrões
éticos e, legais.
Para tanto, é imprescindível ater-se ao fato de que o código só será
efetivo se, “entre outras características, tenha diretrizes justificadas e que
estejam sujeitas a constante revisão, e, além disso, tenham linguagem de fácil
compreensão, de forma a atingir todos os parceiros da empresa”180.
Além da descrição de condutas no código de conduta é preciso que as
consequências em caso de inobservância estejam também previstas. Ademais,
179
NASCIMENTO, Juliana Oliveira. Compliance e sustentabilidade: perspectivas do
futuro corporativo sob o prisma do direito do trabalho. In: Direitos humanos e meio
ambiente do trabalho. São Paulo: LTr, 2016, p. 81-90.
180
MATHIES, Anaruez. Assédio moral na relação de emprego no Brasil: uma
análise dos custos sociais e do mecanismo de compliance. Dissertação (Mestrado
em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa
Catarina. Florianópolis, 2017. Disponível em:<
https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/176788>. Acesso em: 20 abr. 2019
112
um programa efetivo necessita da implementação de mecanismos de auditoria,
monitoramento, denúncia e desenvolvimento de ações corretivas181.
Embora as empresas não estejam obrigadas a implementar o
Compliance, como visto acima, está em ascensão, mas que exige, por
conseguinte, que os empreendedores internalizem a ideia de se criar código de
condutas éticas que parametrize toda a organização, bem como aqueles que
com ela se relaciona.
O Compliance trabalhista, além de prevenir de problemas processuais,
padronizar comportamentos éticos, também revela a função social da empresa
que o adota, sobretudo pelo impacto que as empresas exercem na vida de seus
empregados, o que contribui para atingir os objetivos constitucionais do art. 3º,
CF/88.
181
MATHIES, Anaruez. Assédio moral na relação de emprego no Brasil: uma
análise dos custos sociais e do mecanismo de compliance. 2019, p. 159.
Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito,
Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2017. Disponível em:<
https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/176788>. Acesso em: 20 abr. 2019
182 http://www.cge.pr.gov.br/Categoria-de-Pagina/Compliance
113
ou privado.
Para a pesquisa, o foco é o Compliance na iniciativa privada e as
relações contratuais laborais. Corrobora com a resposta positiva, o fato de que
a própria Companhia Paranaense de Energia Elétrica – COPEL, possui seu
programa de compliance, isso parametriza e orienta o comportamento daqueles
que:
183 https://www.copel.com/hpcweb/institucional/compliance/
114
sua condição empregador, pode e o que
social: sob a não pode ser
dependência objeto de
deste e negociação.
mediante
salário.
Tabela do autor
184 https://revistapegn.globo.com/Administracao-de-empresas/noticia/2019/07/tudo-nos-
conformes-empreendedores-aderem-ao-compliance.html Acesso em 15 de Dez. 2020
115
dos dados coletados do TST, o compliance também se revela em estatísticas
interessantes, uma ascensão sem volta, ao que tudo indica e se depreende da
matéria do jornal Folha de São Paulo:
185http://estudio.folha.uol.com.br/petrobras/2017/06/1892322-mais-empresas-adotam-praticas-
de-compliance.shtml Acesso em 15 de dez. 2020.
116
Resgatar essa essencia, é ter o Direito do Trabalho Constitucional.
Muito embora o STF já tenha proferido decisões que contrariam súmulas
desenvolvidas ao longo da cultura jurídica do TST, p.ex. Súmula 331, sobre a
terceirização, o Min. Luis Roberto Barroso, na ADPF 324 e no RE 958252, que
discutia a licitude da terceirização da atividade-fim, entendeu e prosperou o seu
voto, de que a terceirização agora passa a ser irrestrita e lítica. Foi para o mundo
do direito do trabalho uma decisão emblemática, vez que contrariou tudo aquilo
que já se tinha pacificado pelo TST.
Então o que o Compliance poderia ter de diferente? E ele estaria sujeito
à apreciação do poder judiciário? Provavelmente sim, vez que se trata do
princípio constitucional de acesso à justiça.
O Programa de Compliance trabalhista se refere aos sujeitos de direito
que integram a relação jurídica laboral, por isso ele não colide com as espécies
de negociação coletiva e/ou individual.
Assim, considerando a valorização da autonomia privada
(individual/coletiva), o que se verifica é o contrato de trabalho com semelhanças
ao contrato cível, mesmo com a presença da subordinação jurídica, isso quanto
aos seus princípio da eticidade e boa-fé por exemplo. Integram, portanto, aquilo
que se denomina, negócio jurídico o qual, segundo Pontes de Miranda, é
composto por elementos os quais são definidos no art. 104, CC/02. A sua
plenitude exige a observância de três planos, o da existência, validade e eficácia.
A negociação coletiva de trabalho, não é alheia a essas questões, é um
negócio jurídico que exige-se a atenção a princípios próprios do Direito do
Trabalho, e também o da boa-fé. Por ser um negócio jurídico, exige-se a
presença dos elementos do negócio jurídico, isso por força do art.8º, CLT. A esse
respeito, Teixeira Filho (1995, p. 1082), explicita quanto ao princípio da boa-fé
nas negociações coletivas:
117
As negociações coletivas tiveram origem na Inglaterra, no início do século
XIX186, é na definição de Orlando Gomes, "[...] é uma prévia regulamentação
convencional das condições do trabalho".187 Nesse prisma, a negociação
coletiva visa aproximar os interesses de grupos antagônicos, mas com algo
comum que os unem, o capital e o trabalho. Assim, nas palavras de Gunther e
Villatore:
186
GOMES, Miriam Cipriani. Convenção coletiva de trabalho como meio de preservação
de direitos fundamentais e harmonização de interesses econômicos. In: GUNTHER,
Luiz Eduardo (Coord.). Tutela dos direitos de personalidade na atividade
empresarial. Curitiba: Juruá, 2008. p.228. em nota de rodapé, a autora completa que o
surgimento ocorreu pro força do abandono dos trabalhadores, perpetrado pelo Estado
Liberal, em que empregadores e empregados eram tratados igualmente.
187
GOMES, Orlando. A convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 1995. p.11.
188
GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE, Marco Antônio César. Negociações
coletivas de trabalho: As decisões judiciais e o princípio da fraternidade. Curitiba:
Juruá, 2018, p. 109.
189
MARTINS, Gustavo Afonso. Princípio da intervenção mínima: modelo de análise
cartesiana aplicada ao direito do trabalho e o princípio da intervenção mínima.
Dissertação apresentada em 2018, p. 174, para obtenção do título de mestre em Direito.
Programa de mestrado e doutorado em Direito Empresarial e Cidadania do Centro
Universitário Curitiba-Unicuritiba.
118
seja mantida a paz social”.
É uníssono, portanto, que a negociação coletiva é o elo entre interesses
coletivos divergentes, é nesse instrumento que o diálogo entre as partes será
redigido, para tanto, também não destoa a unidade ao exigir tratamento e
condições igualitárias aos negociantes. A este respeito, Gunther e Villatore,
expressam o entendimento da professora Roberta Bortone, que “ao relacionar
lei e contrato coletivo de trabalho com os problemas atuais do direito sindical,
registrou que, para negociar coletivamente, é preciso certo equilíbrio de
forças”190.
No plano constitucional, o art. 7º, XXVI, CF/88, reconhece as
convenções e acordos coletivos de trabalho, ora, o reconhecimento dado pela
Constituição de 1988, não é meramente exemplificativo, mas taxativo a lhe
outorgar importância enquanto instrumento de efetivação de direitos
fundamentais sociais dos trabalhadores.
Quanto à negociação coletiva, seu âmbito é de tamanha importância
que até mesmo o Tribunal Superior do Trabalho191, na Súmula 364, II reconheceu
a validade de cláusulas convencionais que reduzem o percentual do adicional
de periculosidade.
Assim, ao se falar em negociação coletiva, fala-se em classe
representativa daquela categora, portanto, em síndicatos, os quais passaram a
ser enfraquecidos econômicamente com o passar do tempo, sobretudo após a
Reforma Trabalhista.
Fato é que o modelo constitucional de representação de classe
trabalhadora se dá pela via sindical, o qual se vale da negociação coletiva, que
119
curiosamente, pela redação do art. 611-A e art. 611-B, CLT, (oriundos da
Reforma Trabalhista) tratam mais do objeto daquilo que pode ser negociado e
daquilo que está proibido de ser entabulado, o que, por outro, o Programa de
Compliance, direciona-se ao comportamento das partes, portanto, atenta-se
aos sujeitos de direito, o que, por sua vez, para que seja eficaz, o teor do
referido Programa, tenderá a aproximar interesses no que se refere às condutas
dos empregados, assim como poderá prever qual é o limite e alcance do poder
diretivo do empregador em exigir tarefas que – supostamente e eventualmente
– não estejam previamente contidas no contrato de trabalho.
Outra justificativa para essa metodologia escolhida, é o fato de se
trabalhar com uma perspectiva econômica e social reflexas no Direito do
Trabalho. A propósito, vale-se das palavras de Bauma:
192
BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo, a transformação das pessoas em
mercadoria. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro, Zahar, 2008, p. 15.
120
mitiga os direitos trabalhistas.
Diante do enfraquecimento sindical, as negociações coletivas nem
sempre representam e/ou atendem os interesses dos empregados, decorrente
do fato de estar sem força de reivindicação perante a classe patronal. As
discussões a respeito de que se Sindicatos são ou não bons, isso não é
fundamental e objeto da pesquisa, o que é importante e fato, é que se trata de
ser constitucional.
Se a pretensão da Reforma Trabalhista é reformar a hipótese da
negociação prevalecer em relação ao legislado, não seria mais coerente com a
Constituição de 1988, reforçar a atuação das entidades representativas das
categorias profissionais?
Diante da temática negociação coletiva e função sindical, Gunther,
Villatore e Martins, indaga-se:
193
GUNTHER, Luiz Eduardo. VILLATORE, Marco Antônio César. MARTINS, Gustavo
Afonso. Acesso à Justiça do Trabalho e o princípio da intervenção mínima. Instituto
Memória. Curitiba-PR, 2019, p. 173.
121
CONSIDERAÇÕES FINAIS
122
o empregador, com base em seu poder diretivo, pode exigir mais do(s) seu(s)
empregado(s) além daquilo que consta no contrato.
Diante da constatação de que reiteradamente a Justiça do Trabalho se
depara com questões que ladeiam o abuso do poder diretivo, a pesquisa propôs
a elaboração do Programa de Compliance ser instrumento de tutela das relações
contratuais na esfera trabalhista a fim de parametrizar os limites e alcances do
exercício do poder diretivo do empregador.
Assim, alguns resultados foram encontrados com a pesquisa:
O Programa de Compliance possibilita a parametrização da
(des)configuração do abuso do poder diretivo do empregador;
De igual forma, verifica-se o compliance trabalhista como instrumento de
efetividade ao princípio da boa-fé nas relações contratuais laborais;
Por fim, propõem o Programa de Compliance trabalhista como
parâmetro de comportamento do empregador e do empregado a fim de conceder
segurança jurídica aos contratantes, mais do que isso, a dissertação desloca o
foco que as Negociações Coletivas – CCT/ACT -, que apresenta no art. 611-A e
art. 611-B, CLT, permissões e proibições quanto ao que pode ser objeto de
negociação, e a mudança da ótica se dá porque se retira do objeto da
negociação para o sujeito de direitos daquela negociação.
Nesse sentido, pela natureza do Compliance Trabalhista em definir
condutas, está a tutelar os sujeitos da relação jurídica e não mais o objeto.
Acredita-se ser uma contribuição da pesquisa também esse viés, a mudança de
paradigma do objeto para o sujeito.
123
REFERÊNCIAS
124
18.03.2016 Disponível em: <
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.
asp?incidente=2629027&numeroProcesso=590415&classeProcesso=RE&num
eroTema=152>. Acesso em: 15 de nov. 2020
125
CORREIA, Henrique. Compliance nas Relações Trabalhistas. Revista do
Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região V. 9. n.91. Agosto/20. Disponível in
http://www.mflip.com.br/pub/escolajudicial/?numero=91&edicao=11438 Acesso
em 16 de nov. 2020.
COUTINHO, Aldacy Rachid. Poder punitivo trabalhista. São Paulo: LTr, 1999
126
2018.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 24.ed. São Paulo: Atlas, 2008.
127
24.ed. Saraiva. 2009.
PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do direito civil. 3.ed. atual. 11.
reimp. Coimbra: Coimbra Editora, 1996
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 27.ed. 4. tir. São Paulo: Saraiva,
2004
128
SILVA, Daniel Cavalcante. Compliance como boa prática de gestão de
ensino superior privado. São Paulo: Saraiva, 2015.
VENOSA, Silvio Salvo. Direito Civil – Vol. 3 – Contratos, 18ª edição, 2005.
http://estudio.folha.uol.com.br/petrobras/2017/06/1892322-mais-empresas-
adotam-praticas-de-compliance.shtml Acesso em 15 de dez. 2020.
https://revistapegn.globo.com/Administracao-de-
129
empresas/noticia/2019/07/tudo-nos-conformes-empreendedores-aderem-ao-
compliance.html Acesso em 15 de Dez. 2020
130