Rondon 1940 Etnografia RevBrasGeo

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Rondon, Cândido M. Sª. 1940. Etnografia.

Revista Brasileira de Geografia,


ano II, n. 4 (outubro, 1940), p. 594-621

INQUERITOS GEOGRAFICOS

ETNOGRAFIA
Inquérito científico solicitado pela Presidência do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística ao Consultor Téç:nico respectivo, em virtude da Resolu-
ção n.0 37, de 4 de Maio de 1939, do Diretório Central do Conselho Nacional de
Geografia.
QUESITOS:
a) - Qual o conceito moderno, o estado atual dos conhecimentos e dos
métodos de pesquisa referentes à Etnografia ?
b) ~ Que opinião tem sôbre a situação atual no Brasil, das pesquisas
efetuadas e· do emprêgo dos métodos modernos quanto à Etno-
grafia?
c) - Que medidas sugere para que o Conselho Nacional de Geografia 1
dentro das suas atribuições, promova o aperfeiçoamento e a in-
tensificação, no país, das pesquisas sôbre Etnografia ?
d) - Que bibliografia indica sôbre os assuntos constantes do presente
questionário ?

Para cooperar razoavelmente, em espírito de modesta contribuição cultural


l:.ôbre a especialização de um ramo da Antropologia, deficientemente difundido
no Brasil. apesar da existência do Museu .Nacional do Rio de Janeiro, do Museu
de São Paulo e do Museu Goeldi de Belém do Pará, permito-me a liberdade de
apontar indicações dos Mestres na matéria, nacionais e estrangeiros, que do
magno assunto tratavam e tratam, desde a sua penetração no Brasil e na Amé-
rica equatorial.
O problema comporta observações as mais vastas e as mais complexas, se
quisermos percorrer tão dilatada campanha em que os naturalistas se perderam
em congitações antropológicas sôbre o berço do Homem primitivo e consequên-
cias de sua existência e desenvolvimento.
Dada a restrição dos quesitos limitar-nos-emas a considerações bastantes
que em síntese abranjam as questões primordiais da sua interpretação funda-
mental.
Devemos antes de tudo render justa homenagem aos beneméritos Padres
Jesuítas que Manuel da Nóbrega, José de Anchieta, Antônio Vieira e Fernão Car-
dim sintetizam, como os etnógrafos primários que pisaram a Pindorama dos
legítimos brasilianos pelos lusitanos denominada Terra de Vera Cruz.
Entre os demais que surgiram sobressaem Montoya, Restivo, Figuera, Batista
Caetano e o incomparável poeta lírico Gonçalves Dias, cantor dos Timbiras, que
iniciou o estudo da língua tupí no esbôço de gramática conhecido dos estudiosos
da Etnografia.
Seguem-se os Diretores do Museu Nacional, destacando-se o antepenúltimo,
antropólogo conhecido no meio científico do Brasil e do estrangeiro, como aba-
lizado biologista, o simpático Dr. Roquete Pinto. Antes dele ocuparam-se do
estudo da Etnografia brasiliana os Diretores Ladislau Neto e Lacerda, esforça-
dos cientistas que tentaram penetrar os mistérios das raças ameríndias.
A atual Diretora, Professora Heloísa Tôrres, encaminha os estudos etnográ-
ficos e etnológicos pelos métodos modernos da escola americana.
Do Museu de São Paulo destacaremos Von Ihering e o erudito Dr. Afonso de
Taunay; do de Belém do Pará o seu fundador Dr. Emílio Goeldi, a Dra. Emília
Snethlage, e o atual Diretor, Dr. Carlos Estêvão, apaixonado etnógrafo que neste
momento estuda nos sertões de Pernambuco a língua fugitiva dos remanescen-
tes da tribu Carirí, missionada em 1671, no vale do São Francisco, pelo Padre
capuchinho Martin de Nantes. Não devem ser esquecidos Alexandre Rodrigues,
Ferreira Pena, Couto de Magalhães, Barbosa Rodrigues, Basílio de Magalhães,
Stradelli, Rodolfo Garcia, Teodoro Sampaio, e o muito modesto, estudioso etnó-
grafo da Comissão Rondou, João Barbosa de Fari~, cujos trabalhos inéditos sôbre
os índios Bororo, Paricí e Terena, além dos vocabulários coligidos in loco dos
índios Quepqueriuat, Ariqueme, Nhambiquara, Tacuatep, Parnauat, lpoteuat, o
recomendam à simpatia dos mestres da Etnografia nacional.

Biblioteca Digital Curt Nimuendajú


http://www.etnolinguistica.org
INQUÉRITOS GEOGRAFICOS 595

Manda a Justiça histórica colocar à frente dos Etnógrafos estrangeiros que


no Brasil se preocuparam com êsse ramo da Antropologia, o nunca assás lem-
brado Dr. Carl Freder. Phil. von Martius, predecessor da Etnografia indígena
que publicou em 1863 na Cidade de Erlangen (Baviera) o seu tradicional livro
"Glossaria Linguarum Brasiliensium"; glossários de diversas línguas e dialetos
que falam os índios no Império do Brasil", e em 1867 o volume, recentemente
traduzido para o português: "Zur Etnographie Americas zumal Brasiliensís" - ,
reeditado para comemorar o 1.° Centenário da "Flora Brasileira" - , de estron-
dosa repercussão.
Além de grande número de naturalistas que na América do Sul e especial-
mente no Brasil em comêço do século XIX viajaram, dentre os quais destacam-se
Saint Hilaire e o príncipe de Wied Neuwied, que percorreu boa parte do terri-
tório nacional de 1815 a 1817, não devemos olvidar o célebre etnógrafo alemão
Von den Steinen, digno sucessor de Martius, e Ehrenreich, companheiro e con-
tmuador infatigável do chefe das Expedições às Cabeceiras do Xingú, em 1884 e
1887 a 1888, os quais se colocam à frente dos modernos pesquisadores da Etno-
grafia e Etnologia americanas, caracterizados pelos etnologistas franceses, Rivet
e Montandon, americano Roberto Lowie e recentemente o Professor de Etnologia
da Universidade de Barcelona - Luiz Pericot.

PROBLEMA ETNOGRÁFICO
PREÂMBULO GERAL

Se a Etnografia, de um modo genérico, tem por fim, como ramo intrínseco da


Antropologia, o estudo das manifestações materiais da atividade humana, e se
a Antropologia, ou Estudo do Homem, na sua acepção filosófica, positiva, "pode
ser concebida absorvendo, a título de preâmbulo, a Biologia, e a Moral como
conclusão", está bem claro que o estudo especificado do ramo da Ciência fun-
damental, que vai ocupar a nossa atenção, requer conhecimento das leis gerais
da Biologia, Sociologia e Moral.
Pois, não se pode pesquisar em Etnografia sem se preocupar com a Etno-
logia, outro ramo da Antropologia, e, por conseguinte, sem conhecer as leis dos
fenômenos que regulam a vida do Homem, da sua existência individual e da sua
ação na coletividade humana.
Como "os seres vivos seguem sempre as leis mais gerais da ordem material"
claro é que além do conhecimento indispensável, acima apontado é necessário
ter o das ciências que estudam os fenômenos inorgânicos, cuja sede é o planeta
humano -; isto é, preciso será que o pesquisador da Etnografia, de um modo
smtético, conheça as leis gerais dos fenômenos físicos e matemáticos; funda-
mento lógico, aliás, daqueles fenômenos mais nobres. Em uma palavra, que o
pesquisador não ignore as leis intrínsecas dos fenômenos que dominam a Terra
e o Homem. Tôdas as manifestações da inteligência humana se prendem à Etno-
grafia, ao passo que todos os caractéres físicos da casta humana, considerada
dividida em grupos biológicos, ou raças, dizem respeito à Etnologia, que trata
da formação dêsses caractéres físicos peculiares a cada raça.
Augusto Comte afirma que "a verdadeira teoria biológica das raças resulta
da concepção de Blainville, que representa essas diferenças como variedades
devidas ao meio, mas que se tornaram fixas, mesmo hereditariamente, logo que
atmgiram a sua maior intensidade".
Em virtude da concepção do célebre naturalista de Arques, afirma o Filósofo
de Montpelier ser possível "construir subjetivamente uma doutrina essencial-
mente de acôrdo com as únicas diversidades apreciáveis objetivamente nos dife-
rentes grupos biológicos da espécie humana". Donde lógica e racionalmente
surgirá a classificação das diversidades objetivamente verificadas na espécie
humana em três grupos, ou raças distintas: branca, amarela e preta. Pois que,
"as unicas diferenças essenciais e duráveis, afirma A. Comte, que se podem ter
desenvolvido, são as que se referem ao predomínio relativo das três partes fun-
damentais do aparelho cerebral: especulativa, ativa e afética". Tais são, por-
tanto, segundo a concepção positiva dos fenômenos biológicos, as três raças, que
caracterizam a espécie humana. "Cada uma,delas é superior às outras duas, ou
ern inteligência, ou em atividade, ou em sentimento", segundo as observações
precisamente científicas.
Por isso, sentencia ainda o Fundador da Sociologia e Moral, "esta apreciação
final deve ·demovê-las de todo desdém mútuo, e fazer-lhes igualmente compreen-
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der a eficácia do seu concurso íntimo para acabar de construir a verdadeira


concepção abstrata da Humanidade", Gran-Ser que domina a Evolução Humana.
Humboldt, condenando a deplorável doutrina, sistematizada na Política de
Aristóteles, da desigualdade do direito à liberdade entre os homens, e da escra-
vidão como instituição fundada sôbre a Natureza, "concorda com a teoria da
unidade da espécie humana, Homo sapiens, mas rejeita, por uma consequência
necessária, a distinção irracional de raças superiores e de raças inferiores.
"Sem dúvida, diz o grande geógrafo berlinense, naturalista de nomeada,
Alexandre Humboldt, há famílias de povos mais suscetíveis de cultura, mais
civilizadas, mais esclarecidas, mas não há umas mais nobres que as outras.
'l'ôdas são igualmente organizadas para a liberdade, para essa liberdade que,
num estado de sociedade pouco adiantada, cabe somente ao indivíduo, mas que
em associações já bastante desenvolvidas, toca à comunhão inteira".
O Barão de Humboldt, filólogo e estadista, iriPão do naturalista criador da
Geografia Botânica, acrescenta : "Uma idéia que se revela através da História,
nela estendendo seu salutar império cada dia que passa; uma idéia, que me-
lhormente demonstra o fato frequentemente contestado, porém raramente com~
preendido, da perfectibilidade geral da espécie, é a idéia objetiva da humanida-
de. Diz o estadista prussiano, é essa idéia que faz cair as barreiras que dos
preconceitos inferiores e dos -interêsses egoísticos, de tôda sorte, se levantam
entre os homens, e faz encarar a espécie humana, em seu conjunto, sem distin-
ção de religião, de nação, de côr, como uma grande Família de irmãos, como
um corpo único, marchando para um só e mesmo fim, o livre desenvolvimento
das fôrças morais. Jl:sse objetivo é o fim final, o fim supremo da socialidade,
::.o mesmo tempo .que é a direção imposta ao homem por sua própria natureza,
para o indefinido engrandecimento de sua existência".
Que diferença dos tempos ! Entre um prussiano do século passado e o do
Htual! Entre a Alemanha de Frederico 2. 0 , precursor político da regeneração
final, e a grande Alemanha materialista dêstes tristes tempos !
Humboldt, o Naturalista, e o Humboldt filólogo e estadista sentiram, empi-
ricamente, o que A. Comte sistematizou com as descobertas das leis das ciências
finais da ordem humana.
O mais sábio dos Filósofos afirma: "Quando o Positivismo houver saneado
uniformemente o planeta humano, estas distinções orgânicas (de raças> tende-
rão a desaparecer, em virtude mesmo de sua origem natural, e sobretudo me-
diante dignos casamentos. A combinação crescente dessas raças nos propor-
cionará, sob a direção sistemática do sacerdócio universal, o mais precioso de
todos os aperfeiçoamentos, aquele que diz respeito ao conjunto de nossa cons-
tituição .cerebral, assim tornada mais apta para pensar, agir, e mesmo amar".
A Humboldt se refere ainda, a respeito da unidade da raça humana, à obser-
vação lógica de J. Müller sob o ponto de vista biológico das raças animais, atri-
buída ao gênero humano: "As raças humanas são as formas de uma espécie
única, que se juntam e se. perpetuam pela geração.' Não são espécies de um
gênero. Se assim fôsse, cruzando-se tornar-se-iam estéreis. Saber, porém, se as
raças de homens existentes descendem de um ou de muitos homens primitivos,
é o que se não poderia descobrir pela experiência".
o Dr. George Montandon, Professor de Etnologia da Escola de Antropologia
de París, é de opinião que não há berço do gênero humano, nem berço das raças
humanas. ·
o argumento do culto etnólogo se baseia no seguinte raciocínio: "A espécie
humana, como tôda espécie zoológica, teve origem em uma imensa área do
nosso Planeta. Os indivíduos da nova espécie descendem de todos os indivíduos
da espécie ascendente, donde se pode concluir que o fenômeno se produziu sôbre
uma extensa área da Terra -Todo mundo sabe que o Homo-sapiens tem uma
fôrça de expansão especial, por ser a espécie zoológica espalhada sôbre tôda a
Terra, e pela simples razão de ser o ramo retardatário por excelência do Mundo
animado".
Alexandre Humboldt raciocina logicamente dizendo: "Teem um caráter pu-
ramente fabuloso as investigações geográficas a respeito do berço da espécie
humana". E Guilherme de Humboldt afirma: "que não nos sendo conhecjdo
nem historicamente, nem por nenhuma tradição incontestável, um momento em
que a espécie humana se haja separado em grupos de povos, não nos é lícita
uma afirmação positiva sôbre aquela origem. Se êste estado de cousas existiu

1 Uma das leis da Biologia.


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desde a origem ou se foi produzido mais tarde, é o que a ninguém é permitido


decidir pela história". "Lendas isoladas reproduzindo-se em pontos completa-
mente diferentes. do globo, sem comunicação aparente, estão em contradição
com a hipótese do berço único do gênero humano, e o fazem descender inteira-
mente de um só par".
Essa tradição está tão espalhada que se chega a considerá-la como uma
antiga reminiscência dos homens.
A mesma reflexão faz o antropólogo Edward Tylor: " ... se volvermos o pen-
samento retrospectivamente à época longínqua em que os antepassados do afri-
cano, australiano, mongol e escandinavo constituíam então um ramo indivisível,
a teoria de sua descendência comum há de justificar a existência de causas
bastantes fortes de tempo muito afastado para que se pudessem realizar mudan-
ças que ultrapassam os limites de tôdas as efetuadas durante as idades his-
tóricas. Donde se conclue que os homens negros, morenos, amarelos e brancos
constituem reminiscências de um passado remoto, carregando cada negro, cada
amarelo e cada branco em sua feição a evidência da antiguidade do homem.
E para demonstrar que os argumentos metafísicos da maioria dos especia-
listas etnólogos não satisfazem à lógica, acrescenta Guilherme Humboldt: "Mas,
essa circunstância .mesma mais depressa provaria que não há nessa situação
nenhuma transformação real de um fato, nenhum fundamento verdadeiramente
histórico, e que na realidade só há a identidade de concepção humana, que leva
os homens por tôda parte a uma explicação semelhante de um fenômeno idên-
tico. Um grande número de mitos, sem ligação histórica uns com os outros, deve
assim sua analogia e sua origem à paridade das imaginações ou das meditações
do espirito humano.
Basta citar o único caso apresentado por R. Lowie, provando a origem inde-
pendente de particularidades análogas entre tribus vivendo em regiões profun-
damente afastadas.
"Não se poderia fazer a um australiano Kurnai maior afronta do que cha-
má-lo de órfão. O mesmo trato atribuído ao índio Crow, de Montana, é consi-
derado como afronta grave.
Está bem claro que os Kurnai não herdaram dos Crow tal sentimento, nem
estes daqueles."
A explicação é evidente. Entre os povos primitivos o poder provém, direta-
mente, muitas vêzes, do maior número de parentes devotados. O órfão, sem
família, é considerado um indivíduo sem fôrça ou valor social.
O que à nossa alma, na tradição de que se trata, revela o caráter manifesto
da ficção, é que ela pretende explicar um fenômeno fora de tôda experiência,
da primeira origem da espécie humana, de uma maneira idêntica à experiência
de nossos dias. Tentar descobrir, por exemplo, em uma época em que todo gênero
humano contava já dezenas de milhares de anos de existência, como uma ilha
üeserta ou um vale isolado nas montanhas pôde ter sido povoado. Em vão o
pensamento se mergulharia na meditação do problema dessa primeira origem.
O homem está tão estreitamente ligado à sua espécie e ao tempo que se não
poderia conceber um ser humano vindo ao Mundo sem uma família já existente,
e sem um passado.
Luiz Pericot argumenta, para demonstrar, que a semelhança de objetos etna-
gráficos encontrados na Oceania e na América prova que o homem americano pode
ter vindo da Oceania. Apresentou a zarabatana e o ikatten' como elementos
irrefutáveis da afirmação, por tratar-se de objetos bastante complicados que
não permitem considerar paridade de invenções isoladas; por isto, diz o etnólogo
espanhol, que nem a Geografia nem a História impedem considerar possíveis de
ligação as localidades em que foram encontrados tais artefatos etnográficos.
Humboldt apresenta esta dúvida: "não podendo tal questão ser resolvida
nem por meio do raciocínio, nem da experiência, deve-se pensar, que o estado
primitivo, como no-lo descreve uma pretendida tradição, é realmente histórico,
ou supor que a espécie humana, desde seu princípio, cobriu a terra com tribu
já formada ? E' o que a ciência das línguas não poderia decidir por si mesma,
muito menos procurar alhures uma solução, para dela inferir informações sôbre

2 Ikatten - E' um processo de tingir que permite ao tecido fabricado com o fio proveniente
do ikatten apresentar variada coloração. O processo consiste em dar muitos nós no fio com que
se val tecer o pano; mergulhá-lo na solução da tinta escolhida para o caso, e depois desatar os
nós para levar o fio ao t~ar. Está bem entendido que a parte interior dos nós não sofrerá o
efeito da tinturaria, e por conseguinte o fio, depois de dasatados os nós se apresentará com
duas colorações.
598 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

os problemas que a ocupam". Alexandre Humboldt tenta uma classificação posi-


tiva das raças, já assimilando a classificação respectiva à do reino vegetal, já
à da história natural das aves e dos peixes, sem poder alcançar resultados satis-
fatórios - Critica a classificação geográfica, que não oferece base segura, apoian-
do-se nas observações de Niebuhr e Buschmann. E afirma que "os nomes geo-
gráficos, tomados como designações de raças, são profundamente indeterminados,
~Sobretudo quando o País que deve dar o seu nome a tal ou tal raça, haja sido
nabitado, em diversas épocas por sucessão de povos os mais diversos".
A analogia dos costumes não pode também servir de tipo de identidade das
raças, por isso que a semelhança de vida dos povos nômades faz com que muitas
vêzes os usos sejam comuns.
o mesmo acontece com as línguas, apesar de sua íntima ligação com os
primeiros desenvolvimentos do espírito.
E' verdade que êsse cunho característico nacional que as línguas trazem
consigo mesmas tem uma alta importância como auxiliar para descobrir a iden-
tidade das raças, afirma A. Humboldt. Seu irmão, o filólogo, que fizera o estudo
filosófico das línguas, em sua grande obra "Ueber die Kawi-Sprache, auf der
Insel Java", faz sentir que a semelhança da origem das línguas é um fio con-
dutor que facilita a penetração no mistério do labirinto, em que a íntima ligação
das faculdades físicas do corpo com o surto da inteligência se manifesta sob
múltiplas formas diversas.
Mas, adverte Humboldt naturalista, "como acontece muitas vêzes, n~s esfe-
ras das especulações ideais, aparecer ao lado de um resultado tido como seguro,
o perigo das ilusões frequentes, deve-se estar sempre de sobreaviso".
"Estudos etnográficos positivos, baseados em profundo conhecimento da his-
tória, nos ensinam ser conveniente nos revestir de grandes precauções na com-
paração dos povos e Iinguas de que se servem num dado momento da história",
sobretudo tratando-se de povos indígenas.
O argumento é lógico - "A conquista, um longo hábito de conveniência co-
mum, a influência de uma religião estrangeira, a mistura de raças, mesmo quan-
do tenha tido lugar com um pequeno número de emigrantes mais fortes e mais
civilizados, teem produzido um fenômeno que se nota simultaneamente nos
dois Continentes. Por exemplo : duas famílias de Iinguas inteiramente diferentes
podem estar compreendidas numa mesma raça e vice-versa. Entre povos de
origem totalmente diferente podem ser encontrados idiomas de um mesmo tronco
de línguas.
A cultura não poderá servir de padrão para identificação de diversidade
dos grupos sociais.
A modificação da vida de um povo, tal como acontece com a de sua lingua-
gem, é função de uma série de contingências da evolução fatal por que passa a
terra no decorrer dos tempos: a emigração, a guerra, a conquista, as calamidades
internas, agrupamento de uma raça mais adiantada com outra de evolução mais
atrasada. Pode acontecer que a cultura dos seus antepassados seja menoscabada
ou deixe de ser necessária ou possível, acabando por desaparecer ou ser esque-
cida por desuso"; o que observamos nas tríbus remanescentes dos Tupís, Aruaque
e Caribe, cuja cultura primitiva degenerou incontestavelmente.
Robert Lowie observa que sendo tão lentas as mudanças biológicas quanto
rápidas as modificações culturais, que variam de geração em geração, seria debal-
de querer explicar os fugitivos fenômenos culturais por uma constante racial.
Ainda é o mesmo Lowie quem afirma que, tôdas as raças teem sua peculiar
cultura. Donde se infere a profunda antiguidade da civilização, tomada na
acepção do conjunto das tradições de uma sociedade: aptidões, hábitos adqui-
ridos pelo homem como membro dessa sociedade.
Haja vista a civilização muito antiga do vale do Nilo, dos indígenas de Badari e
dos seus sucessores do Egito; da Inglaterra prehistórica, etc.
A Arqueologia e a Geologia nos permitem verificar todavia uma antiguidade
mais profunda pela descoberta de utensílios depositados nas diferentes camadas
milenares da formação do planeta humano, nas quais se reconhece, a preexistên-
cia de três grandes fases florestais: do pinho, do roble (espécie de carvalho) e
da faia, em cujas respectivas turfeiras se encontram utensílios de pedra, que
caracterizam períodos por John Lubbock denominados paleolítico e neolítico,
isto é, idade da pedra lascada e da pedra polida, sendo que o primeiro período
distingue a civilização. mais remota do gênero humano, da época dos animais
prehistóricos .
Robert Lowie em seu "Manual de Antropologia Cultural", livro atualizado,
pelo qual melhor se pode conhecer o método moderno de pesquisas etnográficas,
INQUÉRITOS GEOGRAFICOS 599

faz considerações aliás já anteriormente admitidas por Tylor, sôbre a época em


que o homem começara a fabricar utensílios de uso indispensável à sua exis-
tência. Admitindo a hipótese de que êsse estado data de cêrca de cem mil anos,
julga que a selvageria reinara universalmente no planeta humano. Nesse perio-
do o homem vagava pela floresta em busca de frutos, raízes, tubérculos, que
adicionados à caça e à pesca a que se entregava, constituíam o seu elemento
de vida.
Seus instrumentos de paz e de guerra, utensílios de uso doméstico, eram de
madeira, de osso, de concha e de pedra - E como só esta matéria é durável e
mdestrutível, somente instrumentos e utensílios desta natureza foram pela ar-
queologia revelados aos naturalistas. Donde a denominação de idade da pedra
lascada, ou paleolítica .
Admitem os especialistas etnólogos que um novo período surgiu na idade
do homem prehistórico em que teriam aparecido a agricultura, e a indústria
aa cerâmica, peculiares à vida já sedentária ou semí-sedentária. Como desen-
volvimento tardio dêsse estado paleolítico aparecem a indústria pastoril sob a
forma de criação de gado, e o progresso da fabricação dos instrumentos de
pedra pelo invento do polimento da parte cortante do machado e de todos os
outros instrumentos correspondentes.
l!:sse período tomou o nome de idade da pedra polida, ou neolítica.
Passam o milênios e os habitantes do vale do Nilo criam novas indústrias.
A fundição do cobre deu lugar à nova idade da civilização, a idade do metal. O
desenvolvimento dessa indústria permitiu o descobrimento da amálgama do es-
tanho que ao cobre deu maior valor industrial na fabricação dos instrumentos
e máquinas. Daí a denominação da idade do cobre e idade do bronze para essas
fases da civilização .
Algum tempo depois surgiram, simultaneamente, o carro, o arado, a roda do
oleiro, e o que mais, a escritura.
Após outros milênios transcorridos, aparece a descoberta do ferro, que substi-
tuiu com vantagem a do cobre e do bronze na indústria dos instrumentos e das
máquinas, dando lugar a novo período da civilização: a idade do ferro.
Com o grande etnólogo Tylor podemo.> incluir a vida humana, a grosso modo,
em três grandes estados: selvagem, bárbaro e civilizado, caracterizando tipica-
mente a marcha da evolução do gênero humano.
Descrevemos já, sinteticamente os dois primeiros. Mencionaremos os pro-
gressos que permitiram a classificação do terceiro período.
Tylor considera período ou estado civilizado aquela fase da vida humana
desde o momento em que surge a arte da escritura até os nossos dias.
O registo na história de todos os acontecimentos que se passam na vida de
um povo, permitindo transmitir às idades vindouras seus hábitos, costumes, leis,
religião e conhecimentos alcançados até então, liga o Passado ao Presente e
êste ao Futuro, na cadeia ininterrupta de progresso moral e intelectual. '
Roberto Lowie resume no seguinte quadro os períodos da vida do nusso
Planeta:
1.0 Selvagismo (Paleolítico) - duração - 100.000 - 10. 000 antes de c.
2.0 Agr!cultura e lavoura à enxada (Neolítico) duração - 10.000 - 4.000
ant2s de C.
3. 0 Id:de do cobre 4.000 - 3.000 antes de C.
4.0 .:-:::de do bronze 3. 000 - 2. 000 antes de C.
5.0 ::. •. ,,de do ferro 2.000 antes de C. até nossos dias.
O mc'.;::o Etnólogo americano observa que os algarismos do quadro apresen-
tado são t .,dos de aproximação, calculados segundo observações geológicas, cuida-
dosas, do.· s::dimentos acumulados nos vales dos grandes rios. Referem-se ao
conjunto ~·.o nosso Planeta.
E' de r. "tar que a evolução da civilização nesses períodos se operou entre
as tribus m~tis bem dotadas moral e intelectualmente. Menciona o atraso dos
habitan~es da Ilha Tasmânia, conservados em estado selvagem até meado do
século :X.!.:C, de acôrdo com o fenômeno de expansão do progresso. Nessas idades,
quando t:.m ponto do globo experimentava um avanço na senda da evolução, as
regiões ma·~ afastadas dêsse progresso não podiam dele participar senão no
decorrer de s::'culos. Foi assim que a indústria rudimentar do ferro se estendeu,
depois de inventada, aos Escandinavos e mesmo às tribus africanas, sem nunca
chegar· à América e à Austrália.
600 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

Somente com a conquista da América e das ilhas do Pacífico se difundiram


as indústrias européias nessas partes do Planeta. A experiência nos faz sentir
de um modo edificante com que velocidade uma dada cultura se pode modifi-
car favoravelmente sem que nenhuma transformação biológica se opere nos
indivíduos do mesmo grupo social. E a propósito, Lowie faz outra observação
lógica, a respeito do progresso ou evolução humana. Seu ritmo não é e nunca
foi uniforme. Durante milhares de anos o homem permanece no estado de sel-
vageria.
De um momento para outro, entretanto, a transformação positiva ou nega-
tiva se opera sem outra explicação senão a da constatação dos fenômenos sociais.
E' fato que a história regista e nós observamos nas populações indígenas da
América e principalmente do Brasil.
A emigração e a conquista são fenômenos sociais de grande relêvo na evolu-
ção ou progresso social dos povos.

PROBLEMA ETNOGRÁFICO AMERICANO


O problema americano da Etnografia se resume, em uma palavra, no Pro-
blema da origem do Homem americano.
Todo o mundo compreende a dificuldade da solt.ção de tal problema, que
deu lugar a hipóteses fantasiosas, próprias das concepções primitivas desenvol-
vidas pela Teologia e pela Metafísica, filosofias que guiaram a evolução do espí-
rito humano depois das concepções de Confúcio e de Buda, da primitividade
fetichista, até a concepção positiva do surto humano apresentada por Augusto
Com te.

Os estudiosos do americanismo, os pesquisadores irredutíveis, pululam desde


os séculos das Descobertas. As mais ilusórias ou disparatadas hipóteses surgiram
com visos de seriedade para explicar ou esclarecer o misterioso problema, que
só no século passado começou a ser abordado com vislumbre científico.
E nesse sentido não se pode imaginar o sem número de hipóteses apresen-
tadas pelos pesquisadores para a pretensa explicação do fenômeno concretizado
pela denominação de Americanismo.
Todos os autores modernos são unânimes em afirmar que somente após os
primeiros decênios dêste século fôra o problema abordada ou esboçado com se-
riedade científica pelos métodos antropológicos, com detalhes etnológicos e etna-
gráficos, proporcionados pelos materiais que a Paleontologia, a Arqueologia e a
Geologia fornecem ..
Apesar de renunciados os métodos antiquados, quasi todos sobrecarregados
de interpretações, superstições ou prejuízos, provenientes de convicções obsole-
'tas, um excessivo número de teorias criadas por meras hipóteses, avulta ainda
no campo das discussões estéreis. Considerável número dessas ficções se reúne
em tôrno de duas escolas contemporâneas, que podem ser consideradas apoiadas
em dados, relativamente de caráter lógico.
1.a A escola da unidade racial, de origem única e recente.
2.a A Escola de diversidade racial, de origem múltipla e muito antiga.
Tôdas as tentativas de interpretações, com verniz científico, da origem do
homem americano se enquadram nas hipóteses fundamentais sustentadas pelas
seguintes teorias:
a) Poligenismo, com o Continente americano para um dos centros de
origem.
b) Monogenismo, admitindo ser o homem originário do Continente ameri-
cano ou de outro Continente qualquer: Europa, Asia, Africa, Oceania ou quem
sabe, de algum outro Continente desaparecido, Atlântida, por exemplo.
Além dessas teorias antigas surge a moderníssima, defendida por Montan-
don, sob a denominação de "Ologenismo", isto é, da aparição simultânea do
homem, como de outros animais, em todo o Globo.
Todavia, não devemos deixar de consignar as soluções mistas.
Nestes casos para explicar a existência de população na América e noutros
Continentes busca-se a solução do fenômeno social das grandes migrações mile-
nárias da Prehistória: de ou .para a América pelo caminho do Nordeste, Noroes-
INQUitRITOS GEOGRAFICOS 601

te; Atlântida e Oceano Atlântico, Continente e Oceano Pacífico ou Continente


Antártico (Mendes Correia). O grande número de hipóteses e outro tanto de
soluções apresentadas para cada uma das grandes divisões acima apontadas é
fácil de compreender. Tais são as inumeráveis literaturas que a respeito teem
sido publicadas, enchendo as bibliotecas dos Museus, sociedades congêneres e
dos estudiosos da Natureza americana.
Logo após a Conquista ocorre a hipótese mediterrânea da origem do homem
americano. • E' a época da hipótese bíblica.
Quando apareceram as primeiras investigações com bases científicas, surgi-
ram as suposições de origem asiática bilateral.
Contemporaneamente parece prevalecer a hipótese de origem múltipla e
complexa.
Simultaneamente com a preocupação das origens do homem americano
fixa-se o pensamento dos investigadores nas culturas correspondentes a cada
povo. Essas culturas serão importadas ou evolutivamente autóctonas ? Como é
natural imaginar surgiram correntes diversas, com argumentos científicos de
tôda espécie para demonstrar uma e outra idéia.
A emigração teria sido o fenômeno esclarecedor das civilizações aztecas, incai-
cas, chibchas, etc.
o isolamento histórico em que jazeu por largo tempo o Continente ameri-
cano constitue fundamento contrário e fortalece a hipótese do evolucionismo
autóctono das culturas encontradas pela Conquista entre os diversos povos do
Novo Mundo. A hipótese bíblica ou mediterrânea deu lugar a diversas discus-
sões, calorosas muitas delas, baseadas até em razões filológicas, a respeito das
origens semitas.
As pesquisas de Villamil de Rada • deram lugar à identificação do idioma
aimará com a língua falada no Paraíso Terrestre, o que nos leva ao terreno da
mais fantasiosa das ficções.
Os estudos de A. Berloin • permitiram-lhe analogia diferente, levando-o
à comparação do idioma primitivo com as expressões algonquinas.
A respeito dos descendentes de Noé como povoadores da América o número
de argumentadores antigos merece atenção.
Enfileiram-se nessa argumentação Arias Montano que publicou em 1593 em
Leyden o seu famoso livro "Antiquitatum Indaicarum". Segundo sua teoria
Ofir, filho de Jectan, neto de Heber, povoou a América até o Perú, e Jobal
o Brasil.
Os argumentos com que o célebre historiador do fim do século XVI justi-
ficou essa teoria do povoamento da América são estupendos, na opinião de
L. Pericot.
Para provar que Perú da descoberta de Pizarro é o mesmo Perú da Bíblia
(Paruain), frei Gregório Garcia, explica como Arias Montano em sua acrobacia
filológica pretende justificar a identidade de Perú com Ofir, afirmando que
esta palavra é a mesma que a antecedente transpondo a letra O para o íim
da palavra e mudando-a para U, abusando da ingenuidade dos filólogos antigos,
escravos das crendices da Bíblia.
Montano e frei Gregório Garcia para confirmar a identidade da desco-
berta de Pizarro com o País visitado pela frota de Salomão e do rei Hiram
citam fatos históricos. Corrobora esta opinião de Montano e de frei Gregório
Garcia o fato de ser o Perú de Pizarro abundante em ouro e prata como Ofir
de Salomão e do rei de Tiro.
Comungam na opinião de Montano a respeito das descendências de Noé
como povoadoras da América, além de Piedrahita, Zamora, Pinedo, Echevarria,
Veiliaz, Mac In tos, F. de Castelnau, o dominicano Torquemada, para quem a côr
dos índios seria indício certo de uma descendência de Cam.
Da opinião dos múltiplos partidários da emigração fenícia, ou simples pas-
sagem dêste povo semita pela América do Sul, participam o arqueólogo Ladislau
Neto e L. A. Childe, do Museu Nacional do Rio de Janeiro.

• Elliot Smith, defensor da íntima relação entre as grandes culturas americanas e a antiga
civilização egípcia.
• "La lengua de Adan y el hombre de Tiahuanaco", La Paz, 1888.
• "La parole humaine", Paris, 1908.
602 :REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

Tôdas as inscrições rupestres existentes pelo nosso dilatado litoral e vales


de quasi todos os rios do interior do Brasil, foram motivo das hipóteses que os
exploradores estrangeiros e nacionais formularam nas suas viagens a respeito
da probabilidade do povoamento da América pelos fenícios e até pelos próprios
egípcios, cartagineses, hebreus, gregos, etc.

Segundo a fábula de Esdras, as tribus Hebraicas passaram da Palestina para


Arsareth com o intuito de fugirem de perseguições e poderem viver em pleno
reino da Paz. Pois bem, êsse país desconhecido teria sido o Novo Continente.
Dessa fabulosa hipótese participaram os Padres Las Casas e Durán, segundo
a .teoria do ilustrado Padre Gregório Garcia, que se firmou no século XVIII, da
qual é digno de ser citado como fervoroso adepto James Adair, que estudou os
índios da América do Norte.
Precederam os partidários da teoria dêste último século Diego Andrés Rocha,"
que chegou a admitir a entrada na América, pelo Noroeste, das dez tribus de
Israel; Thorowyood, John Eliot; os judeus Antônio Montesinos e Menasseh Ben
Israel, autor de uma obra que se tornou célebre e que visava demonstrar es-
pecialmente a origem hebraica dos índios. Assunto que provocou por parte de
Hugo Grocio intransigente contenda, revelada no livro publicado em París, em
1642, sob o título: "De origine arnericanorurn dissertatio".
No século XIX como sectários da mesma teoria sobressaem: o inditoso lord
Kingsborough, conhecido pelo seu intrépido entusiasmo na organização da Ex-
pedição que o levou ao cárcere e à morte; o notável viajante delineador dos
costumes dos índios - George Catlin.
Modernamente Paul Gaffarel julga provável que os povos de Canaã, os
jebuseus, no tempo de Josué, e os judeus depois da conquista de Salmanasar,
emigraram, descobriram as ilhas da Oceania e chegaram até a América. Consi-
dera surpreendente a analogia de tradições, costumes, línguas e tipos semáticos
dos ameríndios.
P. Mossi, segundo Imbelloni, considera o Quichuá muito parecido com o
hebreu, admitindo como de origem hebraica as inscrições da baía Newark, em
New-Jersey, EE.UU. Outros argumentos de caráter histórico, antropológico (etno-
lógico e etnográfico) são apresentados para caracterizar a semelhança entre
hebreus e os índios da América. Até a prédica da Bíblia foi apontada como
prova histórica. São Tomé é apresentado como tendo sido o apóstolo que per-
correu a América, não faltando menções de autores católicos para provar êsse
postulado: a impressão nas rochas dos pés do apóstolo encontrada principal-
mente na América do Sul; a existência do símbolo da cruz, atribuída a particula-
ridades das tradições verificadas na religião dos aztecas e dos incas; assim como
a boa vontade dos autores católicos em querer descobrir nas três cabeças que em
alguns vasos da cerâmica pré-incaica aparecem, a representação do símbolo da
Santíssima Trindade.

Múltiplas opiniões apareceram desde a antiguidade até hoje para demons-


trar as origens mediterrâneas dos índios americanos, já de autores estrangeiros
e mesmo de alguns nacionais. Dentre estes é de notar. o historiador Varnhagen,
que imaginou a emigração dos habitantes das ilhas do Mediterrâneo oriental,
os Carios, para o vale do Amazonas, de onde provieram os tupís e os caribes,
segundo êsse autor, aparentados ou constituindo um tronco único. Essa hipó-
tese aliás já havia sido apresentada no comêço do século XVII, por Joseph Fr.
Láfitau, reproduzida por aquele historiador brasileiro no fim do século passado.
Gregos e troianos; etruscos e filisteus; árabes e romanos, e tantos outros
povos mediterrâneos foram apontados como emigrantes para a América.
A mais interessante, porém, de tôdas as ficções que abarrotaram a barca
de Noé das hipóteses fantasiosas, consiste na origem espanhola dos índios ame-
ricanos na opinião de vários autores, entre os quais se destacam frei Gregório
Garcia, P. Maluenda e Gonzalez de Oviedo, em que se fundamentou o Papa
Alexandre VII para estender à América certos privilégios eclesiásticos só con-
cedidos até então à Espanha, sob a pretensa alegação de que a América fôra
povoada por espanhóis desde antes da sua descoberta por Colombo.

• "Ortgen de los tndios del Perú, Me:Jico, Santa Fé de Bogotá, Chile" - Lima 1681 (reim-
presso em Madri, 1891).
INQ~ITOS GEOGRAFICOS 603

Gomára, em sua história indígena, afirma que os espanhóis passaram a


Cozumel e Yucatan fugindo à invasão dos Mouros, do que é prova cabal a exis-
tência das cruzes que nessas paragens encontraram os conquistadores. J!:ste
argumento não seria cabal, se admitíssemos a primazia do apóstolo São Tomé
que pregara na América antes dessa época.
São tão curiosas as ficções da origem espanhola dos índios americanos que,
vale a pena citar a opinião do Ouvidor de Lima Andrés Rocha, o qual afirma
categoricamente, segundo L. Pericot, que Deus mandou ao Novo Mundo os Es-
panhóis, e, depois de muitos séculos os restituiu à. respectiva metrópole, a título
de direito de restituição.
Aquele Ouvidor de Lima, escritor tido como muito erudito, supunha que os
espanhóis que povoaram na prehistória o Continente americano eram descen-
dentes dos hebreus que povoaram a Espanha, prevalecendo entre êles o tronco
de Tubalcain. Pela Atlântida teriam atingido a América independentemente da
hipótese de Wegner.
Andrés Rocha apresenta uma série de paralelismos, de hábitos, costumes,
línguas, cultura, tradições, entre espanhóis e habitantes do Perú e Nova Es-
panha (México) para estabelecer a conformidade dos dois povos.
E' profundamente acomodativa a comparação do idioma basco com a língua
do quichua. Como conclusão final dessas lucubrações o erudito Ouvidor de Lima
perora com estas fervorosas palavras de crente: "Envió a este Nuevo orbe los
espafío - les y después de muchos siglas se los restituyó a Espafía Dios, usando
deZ derecho de reversión. . . oh protundidad de la sabidoria y ciencia deZ
Altíssimo!" • ..
Pericot acresrenta em sadia crítica sôbre a ficção de Andrés Rocha:
"Además, Espafía es la que se halla mas cerca de America y Dios
no hizo otra cosa que devolver lo que habia sido suyo. Claro está que
Rocha con la misma ~P. que cree en el origen espafíol de lós americanos,
cree qM de nuestro país salió la población de Frigia, Toscana, Irlanda,
Galia, Narbonense y Roma".
Origens européias, tártaras e chinesas, mongólicas de um modo geral, asiá-
ticas, mesopotâmicas, até africanas puras; oceânicas até de continentes desa-
parecidos, foram lembradas, como: Atlântida, Pacífico, Lemúria, Antártico, por
Mendes Correia, arqueólogo português, considerando-os caminho de passagem
dos Australianos e Tasmanianos para a América. Os poligenistas encaram a
população da Amériaa "ipso fato" sua cultura, como autóctona, argumentando
com o fenômeno da criação espontânea de Lamarck, tendo por confirmação a
homogeneidade somática e antropológica quasi absoluta, em oposição às con-
siderações científicas indiscutíveis da concepção de Blainville sôbre as dife-
renças antropológicas da espécie humana.

Outras teorias surgiram contemporaneamente para explicar a origem do povo


americano: a wegneriana, que supõe a união primitiva dos Continentes e sepa-
ração lenta posterior. Donde a explicação muito simples da passagem do homem
e dos animais superiores do Velho para o Novo Mundo e vice-versa.
A outra hipótese é a que Montandon classificou com o título de ologenismo,
nuança simpática da teoria poligenista.

HIPÓTESES MODERNAS AMERICANAS


ORIGEM úNICA

Defendem esta hipótese Hrdlichka e Holmes, os dois campeões americanos


da unidade da sub-raça americana.
Para êsses dois etnólogos o Ameríndio provém da Asia, de onde terá passado
pelo Noroeste dêsse Continente para o americano pelo estreito de Behring. Esta
hipótese é universalmente aceita por quasi todos os antropólogos modernos,
formando entre estes o grande mestre de Etnologia da Sociedade Americanista
de París, P. Rivet, que explanou· em diversas conferências realizadas no Rio de
Janeiro a sua teoria antropológica da origem do homem americano, publicando
604 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

a respeito obras que fizeram época: "Les origines de l'homme américain"; "Les
australiens en Amerique"; "Recherches d'une voie de migration des australiens
vers l' Amérique".
Desde Humboldt que essa teoria foi tomando vulto por demonstrações de
caráter científico, até firmar-se na escola norte.:americana, formada pelos es-
tudos especializados de etnografia e etnologia dos sábios da grande República
norte-americana.
Se os ameríndios, de um modo genérico, constituem uma só raça ou sub-raça
do Continente, é assunto que se não pode em absoluto afirmar. ·
Temos que separar os índios da América do Norte, onde se observa maior
homogeneidade entre os diversos tipos, dos que viveram espalhados pelos vastos
territórios da América Central e do Sul, entre os quais a diferenciação é mais
pronunciada.
Em que consiste a hipótese de uma só raça americana?
Essa hipótese é baseada na possibilidade da migração de um só povo da
Asia para a América, o Mongol ou Mongolóide, por exemplo, em ondas sucessivas
de grandes intervalos.
A hipótese contrária se fundamenta na possibilidade da multiplicidade de
emigrações de povos diferentes da Asia, Oceania, etc.
Desde Cuvier que os traços antropológicos do índio americano foram assimi-
lados aos do tronco mongol, já pelo pigmento avermelhado, que deu nome aos
índios da América do Norte, característico que se aproxima grandemente dos
habitantes asiáticos da Mongólia e já pela forma e côr do cabelo, constituindo
êsses povos o grupo lisótrico, um dos três em que se enquadrou a espécie humana
pela natureza do cabelo. Outros característicos etnológicos: forma do ôlho,
largura da cara com pômulos salientes, incisivos em forma de pá, mancha de
genipapo, etc., levam os ameríndios ao grupo dos mongóis ou mongolóides.
O raciocínio dos partidários desta hipótese os induz a considerar, principal-
mente o seu maior entusiasta, Hrdlichka, que estudou o tipo puro dos mongóis
setentrionais, que nestas tribus paleoasiáticas é que se encontra o resto do
primitivo tronco que passou para a América, ou vice-versa, de cá para lá, tal
a semelhança dos tipos étnicos.
E' verdade que há muitos caracteres entre os ameríndios que diferem dos
que apresentam, por exemplo, os chineses e japoneses, o que leva alguns dos
partidários da hipótese da parecença dos ameríndios com os puros mongóis,
a estender essa solução a outras regiões da costa oriental da Asia. Donde a
opinião de outros autores como Holmes, Chamberlain, Wissler, Hamy a incluir
os ameríndios nas tribus mongolóides protomongóis e indomongóis. Em uma
palavra, segundo a opinião de Pericot, as migrações asiáticas para a América
podem ser consideradas formadas de elementos de origem variada, saídos do
litoral asiático, tecnicamente denominados mongolóides ou premongóis.
Trombetti aduz argumentos filológicos de valor para concretizar o foco asiá-
tico na população ameríndia.
As línguas indochinas, particularmente a da tribu Munda Kmer, na opinião
daquele etnólogo e de outros, parecem ser o tronco dos idiomas ameríndios.
A Etnografia e a Arqueologia apresentam também, segundo muitos pes-
quisadores, motivos apreciáveis que fazem a ligação antropológica dos dois Con-
tinentes em discussão.
Parece que o critério da multiplicidade, em parcelas relativamente pequenas,
de emigrações das ilhas oceânicas conjuntamente, ou em épocas separadas,
com as mongólicas puras não deve ser desprezado, tal como não seria pos-
sível negar no Brasil, a relação prehistórica do tipo da Lagoa Santa, descoberto
por Lund, com o resto dos íncolas brasileiros.

As vias ou os caminhos segundo os quais as emigrações diversas seguiram


para passar ao Continente colombiano, não sofrem mais dúvida. Deve-se tirar
uma média dos mil raciocínios apresentados pelos fogosos argumentadores desde
Wegner até recentemente o bravo etnólogo português Mendes Correia.
Resta saber se essas emigrações são paleoliticas, neolíticas ou holocenas.
Não só Hrdlichka, como Holmes, Vignaud e o próprio Paul Rivet, se firmam
na convicção de que o atraso dos amerín1ios, sua ignorância de certos inventos
úteis, (Rivet citou na conferência do Rio de Janeiro, a roda) ; a pequena den-
INQUÉRITOS GEOGRAFICOS 605

sidade de sua população, são causas para se pensar na contemporaneidade re-


lativa de seu aparecimento na América, nunca porém antes do desenvolvimento
das civilizações propriamente mongólicas, chinesas e vizinhas.
O fenômeno da linguagem é outro argumento contra a antiguidade dos
ameríndios. As línguas dos povos da espécie humana estavam em formação na
antiguidade. Demandavam tempo para a sua aproximação, unificacão ou sim-
plificação. •
Para atenuar as hipóteses, evitar a barafunda, ou em linguagem literária
a confusão das conclusões, Vignaud apresenta a idéia, logicamente aceitável de
admitir que as emigrações asiáticas provieram dos elementos mais rudimentàres
do tronco mongol ou premongol. Esclarecer-se-ão dessa forma tôdas as im-
pugnações de outros autores, que argumentam alegando a contradição sôbre a
ignorância dos emigrantes que teriam vindo para a América quando na Asia
as culturas mongólicas se achavam muito avançadas, sem que essa circunstân-
cia pudesse ser revelada nas culturas ameríndias a respeito de certas particula-
ridades não encontradas nos povos indígenas de cultura mais adiantada, por
exemplo a ausência da roda e outros inventos úteis em uso na civilização
mongólica.

A respeito do autoctonismo das culturas ameríndias não só Hrdlicka, como


principalmente Brinton, o consideram efetivo.
Povoada a América teria ela caído em um longo período de isolamento,
sugerindo a seus habitantes, em cada centro de sua existência, o fenômeno da
evolução natural, as invenções que suas necessidades faziam espontaneamente
surgir: agricultura, cerâmica, navegação, metalurgia rudimentar na fundição
do cobre, do estanho, do ouro e da prata. Depois de terem sido primitivamente
nômades, caçadores e pescadores, foram adquirindo hábitos sedentários de pas-
tores, agricultores e até industriais.
Foi na fase dessa evolução em que já se encontravam os aztecas, os incas, os
chibchas e outros povos guatemalenses que surgiu a conquista européia que
perturbou-a, destruindo a . cultura existente, e apagando por completo a luz
daquela evolução, dando lugar ao caos em que se debatem os antropólogos, ar-
queólogos, paleontólogos e todos os investigadores da Etnologia e Etnografia para
descobrir a origem do Homem americano. O absolutismo da Doutrina que pre-
sidiu a Conquista e o Descobrimento da América, destruindo quasi todos os
fundamentos da cultura pagã, rasgou uma interessante página da História, e
suprimiu assim todos os dados essenciais, positivos, que podiam nos orientar
na avaliação da capacidade do índio americano para o progresso intelectual,
moral e prático.

A hipótese do isolamento total da América não tardou a sofrer severas críti-


cas, dando lugar a admitir-se a intervenção de vários elementos na constituição
da população americana.
Conforme lembramos atrás os melanésios, polinésios e· australianos teriam
sido possíveis elementos, embora em proporções diminutas, a mesclar na massa
mongólica ou premongólica tida como fundamento da população pré-colombiana
do Novo Mundo.
Rivet, um dos mais famosos campeões da teoria da origem múltipla do homem
encontrado na América na época de sua descoberta, comunicou à Academia de
Inscrições e Belas Letras de Paris, em 12 de Dezembro de 1924, as suas conclusões
etnológicas, a respeito, na monografia, que intitulou: "Les melaneso polinesiens
et les australiens en Amérique". Aliás, essa hipótese, como já referimos, havia
sido formulada por Hugo Grocio e Andrés Rocha. Frei Gregório Garcia torna a
seus argumentos anteriores, apoiados em observações próprias e coligidos em
conhecimentos históricos de certa profundidade, mais sólidos, afirmando que a
variedade de línguas, leis, ritos, cerimônias, costumes e vestimentas, levam-no
à conclusão de uma origem múltipla para os ameríndios.
Quatrefages com seus estudos de antropologia da América criou o sistema
em que a população ameríndia foi incluída nas raças mistas. Tentou demonstrar
a parecença dos crânios da Lagoa Santa e dos contemporâneos Aimorés com os
dos negróides oceanianos de Nova Guiné, e ilhas adjacentes. 7

7 Introduction à l'étude des races humaines, - Paris, 1887 - L'homme fosslle de Lagoa.
Santa au Brésll et ses descendents actuels, Moscou, 1879.
REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

Enfim, os antropólogos por um lado, e os etnológos, arqueólogos e filólogos


de outra parte, em pesquisas incessantes impugnam a hipótese sustentada por
Hrdlicka e seu imediato colaborador Holmes.
Após essa escola heliolítica surge outra sustentada pelos pesquisadores dos
centros culturais, com intuito de comparações concretas das culturas corres-
pondentes de épocas diversas.
Essa escola levantada por Graebner, seguida por P. W. Schmidt Nordens-
kiõld, e os linguistas Sauvageot, C. Thomas, Tregear, Hill Tout, Anton e Sanchez
e tantos outros, chegaram à conclusão da possibilidade de grupos oceanianos,
europeus e africanos, terem aportado casualmente na América. Dentre êsses des-
taca-se Theodor Koch - Grünberg, cujo túmulo visitei à margem direita do rio
Branco, quando subia êste rio em demanda da fronteira britânica em 1927.
:msse infatigável etnólogo se distingue pela energia de seu caráter e persis-
tência profissional nos demorados estudos que fez nos vales dos rios Urariquera
e Tacutú, e cordilheira Pacará-:imq, que transpôs para o vale do Orenoco,8 dando
a vida em holocausto a seus devotados estudos etnólogicos e etnográficos.
As divergências fundadas aparentemente em pesquisas de caráter científico
são múltiplas. Entre a escola histórico-cultural e a da unidade de origem do
índio americano, Rivet parece traçar um meio têrmo baseado em seus estudos
resultantes de investigações diretas que teve a fortuna de realizar no Equador.
Pericot argumenta para divergir da hipótese de um tipo único do indígena
americano salientando as diferenças profundas existentes entre muitas tribus
da América do Sul. E supõe, com vários autores, que Hrdlicka e Holmes foram
levados à hipótese da emigração em massa dos mongóis e mongolóides baseados
na aparente unidade de feições físicas apresentadas pelos pele-vermelha.
Entre os tipos da Rondônia, Serra do Norte, que Roquete Pinto estudou e
os que Koch-Grünberg apresenta de sua pesquisas no vale do Cuquenã, contri-
buinte do Caroní, vale do Orenoco, serra Roraimã, a diferença somática e dos
costumes é profunda.
Lá o tipo da Lagoa Santa faz-se lembrar; aquí o caráter caucasóide é des-
vendado, tudo de acôrdo com as observações dos dois eminentes etnólogos que
estudaram os ameríndios daqueles extremos opostos das fronteiras brasileiras.
A êsses pontos de vista se alistam etnólogos do quilate de Keane, Martin,
Fritsch, Biasuti, Oencking, Eikstedt, e outros.
A diferenciação dos tipos espalhados por todo o Continente é palpável -
Ji;sse fato levou · a discussão entre os etnólogos americanos e os europeus com
tal paixão que Mendes Correia declara que a tese unitária é preconceito geográ-
fico, e que desprezar as diferenças de caractéres equivaleria a destruir os méto-
dos antropológicos. Se se admitir com Quatrefages e Lund a existência do homem
quarternário na América, é lógico pensar no autoctonismo do ameríndio. Mas,
como está mais que provado que as migrações asiáticas constituem realidades
incontestáveis, claro está que as populações emigradas teriam sido superpostas
às autóetonas, podendo acontecer que a mescla fôsse de tal natureza e em
proporção tal por parte dos asiáticos que viesse a dar a feição de uniformidade
de tipo que justificasse, por momentos, a idéia da unidade sustentada__por
Hrdlicka e Holmes.
Rivet, o pioneiro das migrações múltiplas, no seu livro: "Les origines de
l'homme américain" pg. 207, diz: "A tese da população da América por emigra-
ções da Asia, através do estreito de Behring, contém sem dúvida alguma grande
parte da verdade e esclarece de certo modo os problemas americanos, sem abran-
ger contudo a sua totalidade. O vício dos defensores dessa tese está no seu abso-
lutismo. Por minha parte aceito de boa mente que a massa principal da popu-
lação americana é de origem asiática, e que foram os asiáticos que uniformiza-
ram o aspecto físico aparente de todos os índios, parecendo-me evidente que
outros elementos étnicos intervieram na formação dessa população". • .

• Vom Rorôimã Zum Orinoco, vol. I, Berlin, 1916.


• Rlvet admite provisoriamente os seguintes grandes movimentos migratórios para a América:
1. 0 - Elemento australiano.
2. 0 - Elemento de lingua malaio-polinéslca, que se aproxima pelos caracteres fislcos do
grupo melanêslo.
3. 0 - Elemento asiático que é, Indubitavelmente, o mais importante, causador da aparente
unidade visível nos ameríndios.
4. 0 - Elemento urállo, esqulmau.
INQtmRITOS GEOGRAFICOS 607

Os mais acirrados defensores do unitarismo da raça americana chegaram


por fim a uma transição que permite razoável conciliação com a hipótese de
Rivet, estendendo a zona das migrações mongolóides até as ilhas Formosa e
Filipinas, donde as nuanças no tipo mongol ou premongol.
Nas conferências do Rio de Janeiro, nos seus livros e dissertações na So-
ciedade dos Americanistas de París, o grande etnólogo contemporâneo, discute
o magno assunto apresentando razões lógicas, baseadas em provas de caráter
científico.
Demonstrações antropológicas, segundo Quatrefages confirmadas por Ver-
neaud, Nordenskiõld, Wegner, Eickstedt, assinalam a analogia de tipos ameri-
canos com os asiáticos, melaneso-polinésicos e autralianos.
Provas etnográficas esporádicas, nos achados arqueológicos aquí e alí foram
aparecendo.
Rivet apoiando-se em parte na escola histórico-cultural e muito nas pesqui-
sas de Nordenskiõld, deduz as semelhanças de costumes, artefatos, utensílios, etc.
dos ameríndios com os da civilização malaia, melanésia ou polinésia, como dan-
sas, rituais com máscaras, redes, pontes suspensas, fundas, zarabatanas, arcos
para diversos fins, machados, cabeças como troféus, flautas, tambor de madeira
para sinais, tambor cilíndrico com membrana de peles de animais, trombetas
de conchas, remos enforquilhados, instrumentos para preparação da entrecasca
da madeira destinada à confecção de vestidos, plantações em terraços, uso das
conchas para diversos fins, fundas para o penis, processo dos nós para tingir
fibras (ikatten), a mastigacão de frutas e massas para o preparo de bebidas
fermentadas, amputação das falanges e talhos nos membros do corpo em sinal
de luto, trepanação e outras tantas analogias.
As provas filológicas constituem a pedra de toque dos argumentos de Rivet,
desenvolvidos com dados concretos em seu livro: "Les Zangues américaines",
pág. 147.
As mesmas provas de caráter científico êste já famoso batalhador etnólogo
apresenta para demonstrar a presença dos elementos raciais australianos na
América; época e condições de sua emigração. '
A êsse respeito continuam a discordar de Rivet não só os partidários da
escola histórico-cultural de que Nordenskiõld é o principal baluarte, mas tam-
bém outros mais modernos como Imbelloni, Mendes Correia, Frenquelli.
Diversos etnólogos italianos entregaram-se aos estudos linguísticos dos ame-
ríndios, Imbelloni e seu colaborador Palavecino, citam grande número de pala-
vras quichuas semelhantes às dos Maorí da Nova Zelândia, raça polinésica. E.
Biasuti apresenta um interessante diagrama segundo o qual o "Homo ameri-
canus" é constituído por antigo philum enriquecido de caractéres australo- cau-
cásicos posteriormente metamorfoseado pelo "Homo asiaticus". Outros antro-
pólogos: Sergi, Mendes Correia, Aichel sugerem argumentos diversos no mesmo
sentido, isto é, de mescla na constituição primitiva da população ameríndia.
As conclusões de Oetting e Eickstedt são as que estão fadadas a prevalecer
sôbre a rigidez da hipótese de Hrdlicka. O primeiro, por estudos morfológicos
dos americanos, deduz uma camada de povoação de caracteres protomorfos com
manchas neandertalenses, excluindo portanto sua origem autóctone e sua entra-
da na América em época pleistocena, em que se incluem os Esquimaus, as raças
da Lagoa Santa e da Terra de Fogo.
As povoações arquimorfas são formas mistas, que sofrem as influências do
ambiente, mantendo o conjunto americano caractéres próprios.
Eickstedt imagina que o homem chegou à América numa fase interglacial,
havendo uma .camada dolicocéfala anterior à braquicéfala, com três camadas
distintas na América do Sul: punimóide (romanos), lágidos (egípcios) e bra-
sílida.
:l!:ste antropólogo afirma a existência da raça branca na América prehistó-
rica, qualificando os americanos de puro-peóides, sob o ponto de vista da altura,
contôrno do nariz, barba inferior do queixo, bôca. Estas modalidades morfoló-
gicas só se explicam pela presença dos europeóides no Norte da Asia em virtude
da expansão dos mongolóides.
:l!:ste conjunto de citações que deixo aquí palidamente exposto, colhí nas
grandes searas acumuladas pelo autor de Ia "América Indígena", o Professor de
Etnologia de Barcelona - Luiz Pericot. Suas conclusões são lógicas. E como
elemento para o tirocínio dos que se dedicam às pesquisas etnológicas e etnográ-
ficas, transcrevo-as nestas nótulas em bosquejos.
Pericot pondera que tôda hipótese para ser aceitável deverá basear-se nos
seguintes assuntos, reais ou prováveis.
608 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

1.0 - O tipo americano não constitue. uma raça única. Seu tipo físico apre-
senta variantes bastante consideráveis, fruto da reunião de diversos elementos
antropológicos, que pelo contacto criaram feições de rosto comuns à maior parte
da povoação, indicando antiguidade no contacto. Os elementos primitivos en-
contram-se isolados.
2. 0 - Do estudo das línguas e dos costumes se deduz semelhante variedade
de certa unidade.
3.o - o estudo arqueológico e antropológico não permite uma conclusão
definitiva, porém, o que não admite dúvida é o homem encontrar-se na Amé-
nca desde o fim da época glacial e é provável que entrasse durante o Pleis-
toceno.
4.0 - Não há razões para supô-lo autóctono.
5.0 - ·o fundo primitivo da população é formado por elementos dolicocé-
falos (punimóides, Lagoa Santa, etc.) com caractéres primitivos e parecenças
ainda não explicadas com neandertalóides, (homem fóssil de Neanderthal, vale
da bacia do Reno), e australóides, melanésios e europeóides.
6.0 - Sôbre êste fundo se superpuseram vários movimentos de gente nova,
especialmente braquicéfalos asiáticos de tipo mongolóide. Nas povoações paleo-
asiáticas e nas ilhas que bordam o Continente asiático encontram-se restos dos
tipos que entraram na América.
7.0 - O grupo esquil:nau (aurálio ?) será o último que chegara.
8.0 - O único caminho conhecido com segurança é o do estreito de Behring,
que gozou noutros tempos de condições mais favoráveis para a vida.
9. 0 - Nenhuma das emigrações pode ser posterior à formação das grandes
culturas do oriente asiático.
10.0 - Combinados, de acôrdo com os fenômenos da evolução e de mútuas
reações, todos estes elementos, desenvolveram por si próprios civilizações origi-
nais, extremamente relacionadas entre si, sem receber do exterior qualquer imi-
tação ou influência esporádicas pela via do Pacífico (navegações polinésicas) .
11.0 - O esfôrço dos futuros investigadores deve dirigir-se a assegurar a
existência destas relações oceanianas e a procurar o caminho e a época em
que as emigrações puderam chegar à América, a circunscrever as camadas de
população americana e a resolver o problema das semelhanças e relações com as
civilizações oceanianas e do sudeste asiático (civilização cambodjeana dos
mon-kmer) e outras com esta relacionadas.

CONCEITO MODERNO; ESTADO ATUAL DOS CONHECI-


MENTOS E MÉTODOS DE PESQUISA REFERENTES A
ETNOGRAFIA
Devemos concluir pelo apanhado, embora desconexo, que conseguimos reunir
das informações e pesquisas acumuladas, desde a Descoberta do Continente Ame-
ricano até hoje sôbre as concepções antropológicas do Ameríndio, visando o
conhecimento da sua história e da sua introdução no Continente, da sua civili-
zação, em uma palavra, que tudo isso se conseguirá melhormente mediante o
estudo preliminar da Etnografia, método empregado pelo Professor americano
- Robert H. Lowie.
Evitando francamente as discussões teóricas, o método americano de estudos
antropológicos culturais procura apresentar sistematicamente os fatos e dados
particularmente essenciais. Daí julgar êsse eminente Professor conveniência
fundamental o estudo direto da etnografia indígena sôbre cada tribu do grupo
de que se pretende inferir conclusões a respeito de sua civilização própria.
As conclusões positivas são função direta das observações de relação entre
tribus de diferentes estados místicos da evolução mental.
Lowie julga indispensável insistir nas pesquisas etnográficas e etnológicas
sôbre tribus as mais atrasadas para depois comparar a civilização do tipo sim-
ples à do que já tenha alcançado uma estrutura mais complexa, passada ou
presente.
O conceito moderno, estado atual dos conhecimentos e métodos de pesquisa
referentes à Etnografia, baseiam-se nos resultados práticos que os Museus dos
Estados Unidos, principalmente, veem adquirindo com as pesquisas diretas sôbre
cada caso particular de suas investigações.
INQUJ!:RITOS GEOGRAPICOS 609

1ilsse conceito e êsses métodos foram de iniciativa de Von den Steinen, que
para alcançar resultados positivos empreendeu duas Expedições longínquas às
cabeceiras do Xingú afim de recolher materiais de cada tribu acaso encontrada
em seu percurso geográfico, para dêsses estudos parciais destacar ensaios gerais
sôbre a história do Continente sul-americano, particularmente sôbre a do Brasil
pré-cabraliano.
Identicamente procedeu Rivet em suas pesquisas sôbre algumas tribus da
República do Equador. 10 E modernamente Robert Lowie, que estudou detida-
mente a etnografia e etnologia da tribu Crow do Estado Montana dos Estados
Unidos da América do Norte.
O conceito moderno da pesquisa referente à Etnografia é que a Arqueologia
como instrumento técnico-histórico fornece o elemento essencial às comparações
respectivas que os estudos modernos vão realizando para melhor assentar a base
lógica dos conhecimentos da Antropologia americana, isto é, para estudo siste-
mático do Ameríndio.
O método de pesquisas diretas, criado por Lowie, é o que modernamente tem
produzido resultados positivos, já para os Museus americanos, já para o nosso
Nacional.
Lá, aquele Professor estudou a etnologia e etnografia dos índios Crow; aquí
o Professor Roquete Pinto pesquisou diretamente os hábitos, costumes e tôdas as
manifestações materiais da atividade de algumas tribus da Nação Nambiquara
da Serra do Norte no Estado de Mato Grosso.
O mesmo fez há pouco tempo nos Estados da Baía e de Pernambuco o Di-
retor do Museu Goeldi de Belém do Pará, Professor Carlos Estêvão, que pesquisou
diretamente nos remanescentes de grupos da tribu Carirí daquelas zonas geográ-
ficas o que de etnologia e etnografia ·ainda podem oferecer aqueles derradeiros
abencerragens da grande tribu, que, como já lembrámos, em fins de 1671 era
missionada pelo Reverendo Padre capuchinho Martin de Nantes nas regiões de
Oeste daqueles Estados, no vale do rio São Francisco.
O diligente etnólogo Curt Nimuendajú, ex-funcionário do Serviço de Pro-
teção aos índios, incansavelmente tem feito pesquisas diretas em dezenas de
Aldeias de diversas tribus, desde São Paulo até o vale do rio Oiapoque, pelos rios
Araguaia, Tocantins, Tapajós e Madeira, neste último concorrendo para a con-
solidação da atração dos guerreiros Parintintins, cuja pacificação, iniciada pela
Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas de Mato Grosso ao Amazonas
foi arrematada pelo Serviço de Proteção aos índios. '
1ilste etnólogo forneceu ao Professor Carlos Estêvão notas esclarecedoras,
aduzidas à Separata do "Boletim do Museu Nacional", de sua autoria, sôbre os
remanescentes dos índios Apinagé do Alto-Tocantins. O mesmo método empre-
gou o chefe daquela Comissão Telegráfica no perfuntório apanhado de ligeiras
nótulas que pessoalmente colheu em sua rápida passagem pelas restantes tribus
do antigo reino dos índios Paricí ( Arití) e através das dezenas de grupos ou
sub-tribus da populosa nação N ambiquara. 11
O etnógrafo da mencionada Comissão João Barbosa de Faria, ex-funcionário
do Serviço de Proteção aos índios, pesquisou diretamente, principalmente com
intuitos filológicos, nas aldeias dos índios Terénas, Bororos (como Encarregado
da Povoação Indígena de São Lourenço, antiga Teresa Cristina), Paricís, Nambi-
quaras, Quep-queriuats, Ariquemes, Galibís, Paricurás, Caripunás (rio Uaçá) ·
Macuxís, Uápixánas (rio Branco, fronteira britânica), Uabois (rio das Trombetas/.
Identicamente teem procedido viajantes dos Museus americanos. Ultima-
mente alguns deles penetraram o rio Tapirapés, permanecendo meses entre os
índios da tribu dêste nome, investigando os hábitos e costumes dêsses índios e
coligindo vocabulário de seu idioma. 1!lsse material será o elemento essencial
para o estudo que os professores dos respectivos museus farão pelo método
de Lowie.
Podemos, sem receio de exagêro nem de fantasias, afirmar que o estado
atual dos conhecimentos referentes à Etnografia é lisongeiro, pela extensão das
pesquisas e estudos realizados na América e especialmente no Brasil, desde
Anchieta, Lery Staden, até Von den Steinen, Ehrenreich, Roquete Pinto, Petrul-
lo, Koch Grünberg, K. G. Grubl. ·

10 "Ethnographie ancienne de Z'Equateur-Mission du Service géographique pour Za mesure


dun Are de meridien". Paris, 1912-1922 - Verneau et Rivet.
11 Etnogra!Í.a - Anexo n.o 5 - História Natural - Comissão de Linhas Telegráficas Estra-
tégicas de Mato Grosso ao Amazonas, pelo Coronel Cândido M. S. Rondon.
610 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

Os métodos modernos se distinguem pelas pesquisas diretas sôbre cada zona


geográfica com intuitos lingisticos, etnológicos e etnográficos peculiares a cada
grupo biológico, como também, segundo Metreaux, para poder apreciar ou ve-
rificar as influências acaso por estes grupos experimentadas de tribus estranhas.
A propósito desta apreciação me permito franca corroboração à afirmativa
do fervoroso adepto do método de Robert Lowie, reproduzindo aquí suas próprias
palavras com que prefaciou a preciosa obra dêste etnólogo americano na tra-
dução que fez do magnífico "Manual de Antropologia Cultural". . . "C'est de
l'ensemble de ces résultats parciels que nous pourrons dégager quelques aperçus
genéraux sur l'histoire d'un continent peut-être, dans l'avenir de l'humanité.
"Rien n'est plus absurde et nejaste pour le progrés de la science que les
attitudes unilatérales. Les jaits humains ne seront jamais expliqués en vertu
d'un systeme donné, mais chaque phénomene requiert un ordre d'explication
dijjérent. ll est essentiel pour l'etnologue de posséder un sens délicat du jeu
des jacteurs contradictoires ou divergents et de la jaçon dont ils donnent nais-
sance à l'aspect général du groupe social qui est leur résultant. Celui-là seul s'ap-
prochera de la vérité qui ne sera pas strictement évolutioniste, historien, géogra-
phe ou économiste, mais tout cela à la jois, Le gout de la formule et de la classiji-
cation est un des plus rédoutables dangers qui aient manecé la science nouvelle
de l'homme".
Em etnografia o método moderno de pesquisas diretas, de que depende o
conhecimento dos fenômenos etnológicos, é completamente díspar do método
clássico cartesiano de fórmula abstrata e classificação teórica.

SITUAÇAO ATUAL DAS PESQUISAS ETNOGRAFICAS NO BRASIL

A situação atual no Brasil das pesquisas efetuadas é evolutiva. Acompanha


a marcha do desenvolvimento intelectual da Nação.
Desde a sua descoberta que o português deparou um tipo estranho ao que
habitualmente conhecia. •
Logo depois os Missionários começaram, por necessidade e conveniência de
seus deveres religiosos, a estudar o homem brasiliano sôbre o qual teriam que
atuar moral e socialmente.
Dentre êles surgiu o primeiro etnógrafo, que pesquisou na Terra descoberta.
Foi o apóstolo do Brasil, o venerável Padre Joseph Anchieta, que apresentou o
primeiro estudo etnográfico dos índios Tupís, na gramática que elaborou da
língua dêste povo brasiliano. Outros missionários se foram ocupando do mesmo
estudo, sobretudo linguístico. Dos continuadores de Anchieta destaca-se o
Padre Fernão Cardim, autor do inédito aparelho de notas erudito-elucidativas,
sob o título: "Tratados do Padre Fernão Cardim sôbre o Brasil", - escritas,
as relativas aos índios do Brasil, em 1584, e cujo manuscrito foi arquivado
em Évora.
Aos Padres missionários seguiram-se viajantes diversos, dentre os quais
mencionamos Hans Staden, Jean Lery, Alexande Rodrigues Ferreira,ll! Martius,
Wied, Von den Steinen, Ehrenreich, Koch-Grünberg, e tantos outros que seria
longo citar. Recentemente, o último etnógrafo que viajou no Brasil em objeto
de pesquisas etnográficas e etnológicas foi o Professor do Museu de Filadélfia,
V. M. Petrullo, que no alto Paraguai, Descalvado, fez estudos arqueológicos, etno-
lógicos e etnográficos entre os Bororos da Campanha e os Tugocures do São
Lourenço.
Nos rios Culisêvu e Culuêne (Xingú) fez pesquisas entre os índios Iauala-
pitís, Meinacos, Cuicuros, Naravutes, Calapálus, Anahúcuáas e Suiás, outrora
visitados por Von den Steinen e Ehrenreich. No alto Teles Pires, abaixo da
confluência do Paranatinga, com o São Manuel, Pôsto Indígena Simões Lopes,
colheu dados etnológicos e elementos etnográficos para os estudos dos índios
Bacaêris.
Os Museus, Nacional do Rio de Janeiro, Paulista, e Goeldi, de Belém do Pará,
manteem os seus viajantes em serviço de pesquisas dentro dos limites das verbas
orçamentárias para cada exercício.
Devemos, entretanto, confessar a penúria dos resultados alcançados, função
direta do raquitismo dos respectivos orçamentos anuais.

10 Memórias sôbre os Gentios Guaná e Guaicurú, Caripuna, Uerequena, Cambeba e sôbre as


máscaras e farsas que fazem para suas festas os índios Iurúpixuna. '
INQUJ!:RITOS GEOGRÃFICOS 611

Comparadas as searas científicas dessas Instituições com as congêneres dos


Estados Unidos da América do Norte, não encontramos têrmos capazes de de-
finir a míngua brasileira diante da opulência americana.
O Museu Nacional do Rio de Janeiro recebeu da Comissão Rondou um re-
gular contingente etnográfico, recolhido durante o tempo em que operou ela
nos sertões de Mato Grosso, Goiaz, Pará e Amazonas, entre os índios: Paricí,
.Nambiquara, Quepí-queri-uat, Jarú, Urupá, Orumí, Ariqueme, Tariana, Tucano,
Macuxí, Uapixana, Taurepã, Galibí, Paricurá, Caripuná; inclusive caveiras ar-
queológicas dos índios Parawiana e Urupá, dos campos do Rio Branco e de
Cataqueimãi, bem como artefatos dos índios Uaboi, e outros que habitavam os
lagos da foz do rio das Trombetas.
Essa mesma Instituição tem precioso acervo científico inserido no seu "Bole-
tim" mensal, onde estão arquivados todos os trabalhos dos diferentes ramos da
História Natural, entre os .quais os de arqueologia, etnologia e etnografia, não
só dos seus Diretores e Professores, como · de vários cooperadores desta
especialidade
De autoria do seu Diretor Professor Roquete Pinto temos: "Ensaios de An-
tropologia Brasiliana" e "Rondônia", mimo de literatura da antropologia dos Aritís
e Nambiquaras, sob os aspectos etnológico e etnográfico.
O Dicionário Histórico, Geográfico e Etnográfico, publicado para celebrar,
em 1922 o primeiro centenário da Independência do Brasil, no Capítulo Décimo
apresenta uma substanciosa monografia com a respectiva bibliografia, sôbre a
Etnografia, elaborada pelo ilustre etnógrafo Rodolfo Garcia.

O Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro é o maior repositório


das memórias, monografias, roteiros, vocabulários e relações das populações in-
dígenas que se hajam publicado no Brasil desde a sua fundação pelo Cônego
Januário da Cunha Barbosa. Quanto a publicações dos livros resultantes das
expedições e viagens pelo interior do Brasil, visando o conhecimento das tribus
ali existentes e seus respectivas estudos a messe é muito grande, quer tratando-
-se de nacionais quer, principalmente, de estrangeiros.
Dos brasileiros destacamos Couto Magalhães, que publicou: "Viagem ao Ara-
guaia" e "O Selvagem", livros de impressões fortes e documentação proveitosa.
João Barbosa Rodrigues, conhecido botânico, ex-Diretor do Museu Botânico
do Amazonas e ex-Diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, publicou dois
livros de valor, tanto como pesquisas etnográficas e etnológicas, quanto de fundo
histórico: 1.0 "O Muyrakitã e os ldolos Simbólicos"- "Estudo da origem asiática
da civilização do Amazonas nos tempos prehistóricos"; obra em dois volumes, -
2.o "Pacificação dos Crichanás", do rio Jauaperi. Neste livro o autor estuda:
I - passado e presente dos Crichanás; 11 - etnografia, arqueologia e geografia;
III - Documentos; IV - Vocabulário; V - Apêndice
Roquete Pinto publicou: - "Rondônia", que encerra as informações com-
pletas de caráter científico que caracterizam o método moderno das pesquisas
etnográficas. O Diretor do Museu Nacional deixou indicado aos seus suces-
sores, em traços bem largos, o exemplo a seguir no desempenho da laboriosa
missão a cargo dos Museus, como Professor e como pesquisador direto dos ramos
da Antropologia que concorrem para a solução do complicado problema da
origem do homem americano. E "Rondônia" já está na sua terceira edição após
a Expedição que êle empreendeu quando a construção da Linha Telegráfica do
Noroeste matogrossense transpunha o paralelo de 12.0 de latitude sul.
A atitude decidida dêsse cientista em querer, para estudar o índio, penetrar
pelo caminho mal aberto dos longínquos e inhóspitos sertões dos extremos rincões
brasilianos, mostra bem nitidamente a bravura do seu amor científico guiado
pelo rasgo patriótico de uma alma viril, cheia de sonhos maravilhosos pela
grandeza do Brasil.
Serviu-lhe de vaqueano sertanejo o intrépido Coronel Antônio Pirineus de
Sousa, então Tenente de Infantaria, infatigável, inteligente, devotado e lúcido
comandante do contingente que acompanhou a Expedição do Grande Reconheci-
mento que estudou o traçado da Linha Telegráfica de Cuiabá a Santo Antônio
do Madeira e Pôrto Velho, em 1909.
612 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

UMA DIGRESSÃO QUE SE IMPõE


Conceda-se desviar por um momento do assunto propriamente desta me-
mória, para prestar homenagem a companheiros desaparecidos desta expedição:
Pirineus foi companheiro dos distintos oficiais que integraram essa Expe-
dição: - Tenente João Salustiano Lira, astrônomo, Tenente Emanuel Silvestre
do Amarante, topógrafo e Tenente Dr. Joaquim Augusto Tanajura, médico,
único sobrevivente do Estado Maior do Ten. Cel. Rondon, chefe da mesma.
Lira foi tragado pelas aguas revoltas do salto Rondon"' do rio Sepotuba,
sintetizando nesse implacável destino todo o espírito do sacrifício e civismo da
pléiade de brasileiros que devassou a vastidão da terra sertaneja compreendida
entre Cuiabá e Pôrto Velho, de Mato Grosso ao Amazonas; trato de terra brasi-
leira só em pequena parte penetrado, no comêço do século XVIII, pelos bandei-
rantes dê Antônio Pires de Campos, e no advento do século XX pelos catadores
do ouro negro, os denodados caucheiros e seringueiros continuadores dos auda-
zes bandeirantes paulistas.
Emanuel Silvestre do Amarante, vítima de uma agressão de febre tífica no
rio Jamarí, veio a falecer no hospital da Candelária, de Pôrto Velho, onde o
fizera recolher o então Tenente Aloísio Ferreira, seu ajudante da Secção do
Norte, de que foi incomparável chefe, como derradeira tentativa para salvar tão
preciosa quanto devotada vida.
Roquete Pinto, que foi hóspede dêste brioso oficial no seu acampamento da
Aldeia Queimada, da· sua dinâmica atividade e raro engenho técnico, traça êste
eloquente e fiel retrato póstumo: "Conheci Emanuel Amarante no lugar mais
triste que até hoje encontrei: Aldeia Queimada. Ainda era mais triste que o
nome. No deserto areia! onde começa o chapadão Paricí, resto de um grande
mar mediterrâneo, depois de muitas horas de marcha fatigante, num solo que
parecia prender os pés do caminheiro, ao longe, ao entardecer,. negrejou um
grande rancho: era Aldeia Queimada, oasis sem palmas, daquele saara peque-
nino, taba aproveitada dos índios, que só por causa da água tinha alí oosicão
justificável. Mas ao chegar naquela "aldeia" de um rancho só, uma surprêsa:
o rancho era uma oficina. Mecânicos ajustavam mancais teimosos de grandes
bielas, ferreiros batiam na bigorna ferro, de formas esquisitas, serras trincha-
vam grandes toros, gritando, plangentemente como se fôsse a madeira esquar-
tejada chorando a mágua infinita das transformações. Na parte da frente, um
recanto do grande casebre era a morada do chefe. Algumas redes, ambos os
punhos recolhidos no mesmo gancho, posição de repouso; uma grande mesa em
cavaletes, onde havia papéis e mapas. Sôbre êsses documentos, absorto, olhos
brilhantes cravados nas linhas e nas cifras, magro, alto, nervo!lo: Tenente
Amarante.
Era aí, então o seu pôsto de engenheiro encarregado dos transportes mecâ-
nicos da comissão de Linhas Telegráficas. Alí era o hospital dos caminhões
que o sertão fazia também adoecer.
Moço e ardente, de uma inquietação que impressionava, de uma curiosidade
intelectual que prendia, dominadora, os seus interlocutores, de uma amabilidade
agressiva, dessas que não escolhem pessoa nem hora. Amarante vivia preocupa-
do com uma questão fundamental: dar aos automóveis a faculdade de varar as
areias e os atoleiros. Então explicava-me no papel, desenhando e calculando, que
o problema seria resolvido se fôsse possível dar aos veículos rodas virtuais de
tal madeira, largas e grandes que o seu pêso, repartido pela superfície, seria mí-
nimo em cada centímetro de plano de sustentação. Nessas condições já não
afundariam as rodas na areia fôfa ou no barro plástico. Como conseguir?
Lembrou-se o moço engenheiro dos trens de "cadeia sem fim" aparecidos, se bem
me recordo, na Exposição Universal de Paris, em 1889. Em 1912 construiu nos
sertões dos Paricí, um aparelho semelhante, mas de largas sapatas, que aplicou
aos caminhões automóveis.
E o primeiro "auto-chenille", o primeiro "tank", o primeiro "carterpillar",
rodou anônimo, hoje talvez deslembrado de suas testemunhas, até agora ignora-
do do resto do mundo, varando o chapadão, do Juruena ao Sepotuba, no coração
do Brasil.
Eram os "tacos do Amarante" as sapatas de madeira que em 1912 faziam
o milagre atualmente reproduzido no Saara, pela Missão Citroen.
O nosso engenheiro; mais tarde, por falta de meios, abandonou as suas pes-
quisas. Veio a guerra; e o que êle fizera, em 1912, com pedaços de madeira, os

lB Denominação oriunda do nome do seringueiro proprietário das terras do alto Sepotuba,


coronel da Guarda Nacional. - Manuel Pedroso Rondon,
INQUI!:RITOS OEOGRAFICOS 613

''tanks" ampliavam, em 1918, providos de chapa de aço. O seu grande sonho·


de progresso, estava sendo praticado, por gente possuidora de outros recursos,
em outras terras, gente animada pela fúria de vencer ...
Amarante morreu há cêrca de um mês, lá longe, perto dos índios, perto das
florestas, vitimado pela doença que é a fera pior dêste continente. li:le não tinha
nada do que, à primeira vista, distingue o homem naturalmente indicado para
viver naquelas asperezas: era fino, era curto, era meigo. Amava o Brasil. Tinha
diante dos olhos, à frente daquela emprêsa, um exemplo magnífico de energia
e desinterêsse no serviço de sua terra. Cupriu o seu dever: o Brasil deve
guardar o seu nome".
Registadas estas patrióticas palavras, prossigo ría minha exposição.

o Museu paraense de História Natural publicou num dos seus "Boletins"


de 1900, as Memórias do Professor Dr. Emílio Augusto Goeldi, seu Diretor, sôbre
arqueologia e etnografia.
li:sses estudos, resnltn"'t""' -· · ·· :1~squisas da Expedição de 1895, deram lugar
à revelação do estao., _. -.vnhecimentos sôbre os índios do Brasil, es-
pecialmente sôbre os índios da foz do Amazonas, no passado e no presente,
diante da coleção de produtos cerâmicos que a Expedição obteve em escavações
feitas nas regiões compreendidas entre os rios Cunaní e Cassiporé, e na zona
dos lagos da terra firme do Amapá artefatos de índios que outrora alí viveram.
A respeito da cerâmica dos índios da Amazônia inferior, aquele Professor
cita a literatura colhida nos trabalhos de Domingos Soares Ferreira Pena,
Ch. F. Hartt, Ladislau Neto e Barbosa Rodrigues, todos publicados no Arquivo
do Museu Nacional do Rio de Janeiro.
Recentemente foi publicado o livro: "índios" - "História de uma grande
Nação" pelo Dr. Otto Willi Ulrich, tratando a primeira parte dos índios da Amé-
rica do Sul e da América Central; a segunda dos índios da América do Norte.
Como o seu autor viveu durante muito tempo entre os indígenas é recomendável
a sua leitura, pelas observações pessoais do viajante a respeito do que, sôbre
etnografia e etnologia dos ameríndios visitados, pôde colhêr e registar.
As Missões religiosas atualmente existentes no Brasil teem publicado estudos
sôbre as línguas dos Ameríndios como outrora fizeram Montoya, Las Casas,
Anchieta, Fernão Cardim, e tantos outros ilustres capuchinhos, dominicanos e
jesuítas que engrandeceram a Etnografia antiga com brilhantes produções.
A Missão Salesiana, que pretende prosseguir as pegadas dos filhos de Santo
Inácio, oferece aos Etnógrafos a Monografia do Padre Antônio Colbachini, mis-
sionário italiano, relativa à Etnografia e à Etnologia dos Bororos orientais -
"Orarimugudoge", habitantes do vale do rio das Garças.
li:sse livro que foi prefaciado por Luiz da Câmara Cascudo, conhecedor da
acidentada vida do Conde Ermano Stradelli na Amazônia, onde sucumbiu levado
pelo seu entusiasmo geográfico, contém, de fato, importantes ensinamentos e
curiosidades sôbre o índio Bororo, rei do sertão, na expressão de Couto Magalhães.
Só quem, como Colbachini, conviveu 30 anos ininterruptos com êsses valentes
caçadores, pescadores, e incomparáveis nadadores, é que podia decifrar o enigma
bororo, tentado por tantos ilustres etnólogos como Von den Steinen, Ehrenreich,
Koch-Grüberg e João Barbosa Faria.
E' merecedor de felicitações o autor do "A Luz do Cruzeiro do Sul", que veio
iluminar a floresta dos Etnógrafos preocupados no Brasil em estudar a língua, a
vida, os hábitos, os costumes e o Ser do Ameríndio.
A mesma Missão publicou outro livro interessante sôbre a Prelazia do Rio
Negro, sob o título "Pelo Rio Mar", com profusas informações condensadas em
múltiplos capítulos: 1.0) Esbôço Geográfico; 2. 0 ) Esbôço Climatológico; 3.0 ) esbô-
ço Etnográfico; 4.0) Síntese Antropológica; 5.0 ) Esbôço Histórico; 6. 0 ) A Obra
Salesiana no rio Negro; 7. 0 ) Estatística dos índios do Alto rio Negro (1931);
8.0) O Apostolado no rio Negro; 9.0 ) :J.j:pisódio da Vida Missionária; 10.0) Do-
cumentos Honrosos" - Como obra de propaganda, é extraordinário.
Devemos, porém, ser justos em apreciar o que ela tem de realmente pro-
veitoso, encerrado nos cinco primeiros capítulos, que derramam a luz da his-
tória sôbre os restos da antiga população dos Caribe, Aruaque, e Tupí da bacia
do Rio Negro, acumulada hoje na sua vertente ocidental.
614 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

Os Missionários franciscanos, capuchinhos que pregam aos índios Mandu-


rucús, localizados no alto rio Cururú, afluente da margem direita do rio Tapajós,
desde 1910, como todos os catequistas estudaram a língua da tribu dos seus
catecúmenos para melhor alcançar espiritualmente a finalidade da sua obra
evangélica.
Publicaram "Pequeno catecismo Cabi-á", "História Bíblica", "Dicionário" e
"Gramática", do vernáculo mundurucú.
O mesmo fez a Missão Dominicana, que fundou a Cidade de Conceição do
Araguaia, sede de seu Apostolado. O Chefe dessa Missão, Bispo D. Sebastião,
publicou "Gorotirés" que elucida e define a ação apostólica desenvolvida no
baixo Araguaia; Frei Antônio Salá apresentou "Elemento gramatical da língua
Caiapó"; Frei Hilário Tapie "Chez les peau rouge" e "Chevauchant". Possivel-
mente do mesmo modo terão procedido: a Missão Capuchinha de São Paulo de
Olivença; a Missão da Congregação do Espírito Santo, sediada na Cidade de
Tefé, estendendo-se ao Alto Juruá; as Missões Protestantes da Ilha do Bananal,
do rio S. Lourenço, do /pegue, junto ao Pôsto Indígena do Serviço de Proteção
aos índios, no Município de Miranda.
A Junta de Missões Nacionais da Convenção Batista Brasileira enviou à
Ilha do Bananal uma Expedição de estudo das condições dos aborígenes dessa
região, dando lugar à publicaçãodo livro: "O Indígena Brasileiro". "Expedição
entre as tribus selvagens da Ilha do Bananal e Norte de Mato Grosso", de
autoria do chefe da Expedição Benedito Profeta.

Não conheço as publicações da Missão Beneditina do Rio Branco, que prega


na Fronteira Britânica e estende a sua função apostólica até Roroimã, o que
tive oportunidade de observar quando, em inspeção àquela Fronteira em 1927,
estive entre os missionários, na cidade de Boa Vista, e verifiquei nas aldeias
dos Macuchí, Uapixana e Taurepã os efeitos da catequese daqueles reveren.,.
dos Padres.

Também desconheço a obra dos m1ss1onanos Jesuítas, recentemente insta-


lados na Prelazia de Diamantino, cidade matogrossense, situada nas cabeceiras
do rio Paraguai. ·
A julgar pela brilhante tradição dêsses apóstolos da América, podem-se es-
perar apreciáveis resultados, já sôbre a catequese propriamente, já sôbre os
estudos linguísticos.
A Comissão Telegráfica de Mato Grosso, criada para ligar a Capital Federal
ao extremo Oeste da República, que acabava de ser fundada, no decorrer dos
seus trabalhos, que se prolongaram de 1890 a 1930, teve oportunidade de devas-
sar quasi todo o sertão daquele Estado, pelos roteiros de Anhanguera e Antônio
Pires de Campos, rumo de Oeste e Noroeste até atingir o rio de Orellana.
Nesses 40 anos teve a ventura de conhecer e estabelecer contacto com os
restos dos primitivos povoadores do Brasil. Para fugirem às perseguições inva-
soras se acantonaram nas ínvias regiões, onde supunham encontrar proteção
segura. Lá, nesses bravios rincões a Comissão os surpreendeu. Pôde assim vê-los,
conhecer de perto seus hábitos, seu método de vida, sua cultura.
Era natural que a ela desperta~..,c interêsse a civilização dêsses povos. Tratou
de estabelecer relações de amizade com todos. Com algumas tribus não foi
fácil. Demandou tempo. Mas, foi afinal conseguido o seu intento. Uma vez
alcançado êsse objetivo, tratou a Comissão de ganhar melhor sua confiança.
Pelo comércio livre da troca dos seus produtos pelos da indústria civilizada que
deslumbravam a sua curiosidade, dentro de pouco tempo tínhamos alcançado
parte do nosso intuito. O resto foi conseguido pelo carinho com que os acolhe-
mos e os tratámos. Não tardou retribuírem com usura a confiança que sua
ingênua atitude nos inspirava. Verificámos quão significativas foram as im-
pressões de Vaz de Caminha ao transmitir . ao Rei a sua admiração pelo povo
que a caravela de Pero Alvares Cabral surpreendera no Continente de Colombo.
:tlesultou das nossas sucessivas penetrações por todos os quadrantes de Mato
Grosso e seus extremos lindes com Paraná, São Paulo, Goiaz, Pará, Amazonas,
Bolívia e Paraguai, o conhecimento que adquirimos não só dêsse trato do ter-
ritório nacional e povo sertanejo, como particularmente dos seus habitantes
inC::genas.
Daí proveio a possibilidade de recolhermos ao Museu Nacional do Rio de
Janeiro a coleção etnográfica que o comércio da troca nos proporcionou. E foi
I.NQUJ!;ltll'O~ GEQGRAFICQS

êsse ausp1cwso encontro e consequente amizade firmada com os fncolas das


regiÕes penetradas que nos permitiram e favoreceram o ensêjo de tentar estudar
a civilização daquelas tribus.
Dessa tentativa resultaram a publicação do anexo n. 0 5 dos Relatórios da
Comissão sôbre Etnografia do Coronel Rondon e o preciosíssimo e substancioso
livro "Rondônia".• de Roquete Pinto, concernente aos. estudos antropológicos,
etnológicos e etnográficos dos índios Pfl,ricí e Nambiquara, e da sua civilização,
conforme referências já feitas linhas atrás. Outros trabalhos foram sendo su-
cessivamente esboçados, não alcançando publicidade por esgotamento das verbas
à disposição da Comissão para publicação de seus Relatórios.
Foi assim que as pesquisas do etnógrafo da Comissão, João Barbosa de Faria,
permaneceram inéditas, aguardando melhor oportunidade oficial para serem
encorporadas à literatura respectiva.
Além dos 17 vocabulários coligidos por aquele etnógrafo, estudou êle a língua
dos Bororos e Paricís, em dois exhaustivos trabalhos a que já aludí.

MEDIDAS A ADOTAR

Quanto às medidas de que o Conselho Nacional de Geografia deva lançar


mão para intensificar e aperfeiçoar no país as pesquisas sôbre Etnografia, sou
de parecer que só há uma: E' conjugar esforços com o Museu Nacional, que
atualmente emprega o método moderno de Lowie nas pesquisas etnográficas
que promove, para as necessárias observações e aquisição do material indispen-
sável, elementos de estudo da antropologia cultural, sociologia primitiva e con-
sequente conhecimento da mentalidade indígena dos grupos raciais dos índios
brasileiros .
Não sendo fácil criar no Conselho de Geografia um Museu etnográfico que
permitisse os estudos respectivos para o aperfeiçoamento dos métodos de pes-
quisas, dado o desejo manifestado pelo Conselho de concorrer para o seu aper-
feiçoamento e intensificação, é lógico pensar que a conjugação de esforços das
duas Instituições, nesse sentido, traria para a ciência proveitosos resultados.
Os membros do Conselho que se entregassem a explorações geográficas no
interior do País consultariam previamente a secção respectiva do Museu Na-
cional quanto às pesquisas etnográficas que a exploração pudesse proporcionar
no decorrer dos seus trabalhos. Discutiriam os métodos mais consentâneos para
a consecução do intento científico comum, com o intuito de alcançar o material
de estudo, que seria depois recolhido àquele Museu. ·
Para facilitar o aperfeiçoamento e. intensificação das pesquisas sôbre a
Etnografia no país, seria necessário obter o auxílio financeiro ao Museu Nacional,
para que êste pudesse aumentar o seu corpo de pesquisadores, o que permitiria
anualmente estender as suas atividades por todo o território nacional habitado
ainda por índios, isto é, ao Amazonas, Pará, Maranhão, Goiaz, Mato Grosso,
Paraíba, Pernambuco, Baía, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo, Paraná,
Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Território do Acre. Alguns dos pesquisa-
dores podiam também se dirigir a outros países do Continentr . principalmente
sul americanos, para procederem como fazem os Museus ame.hcanos e os da
Europa, afim de colherem o necessário material de estudo, visando o conheci-
mento da cultura e civilização do Ameríndio.
O resultado não se faria esperar: o Conselho Nacional de Geografia aper-
feiçoaria êsse ramo da Geografia Nacional pelos estudos a que se obrigaria, e o
Museu Nacional enriqueceria as suas coleções, ao mesmo tempo que mais acura-
das observações seriam permitidas aos Professores na aplicação dos métodos
que melhores conclusões proporcionassem sôbre a origem do homem americano,
a civilização que os ameríndios chegaram a alcançar, se provieram de um só
tronco ou de origem múltipla; se oferecem um tipo único ou variado; se seu
aparecimento na América é recente ou antigo; qual a via ou vias de penetração,
se êsses povos com;tituem ou não camadas de população que se superpuseram
sôbre as que já existiam na América, permitindo a ctmclusão do autoctonismo,
segundo o poligenismo ou ologenismo.
Se o Conselho Nacional de Geografía quiser agir paralelamente ao Museu
Nacional terá então que criar o ramo especializado da Geografia Etnográfica
com o seu corpo de especialistas e um novo Museu etnográfico como arquivo do
material de estudo. E só por observações demoradas sôbre investigações pró-
prias, realizadas diretamente em cada caso, poderia êsse corpo de pesquisadores
formar critério seguro para a escolha do método capaz de levar a conclusões lógi-
cas e positivas sôbre a biologia, e sociologia primitiva da América, especialmente
do Brasil.
616 REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA

CONCLUSõES
Em conclusão:
Penso, com Rivet e Metreaux, que o conceito moderno, estado atual dos
conhecimentos e dos métodos de pesquisa referente à Etnografia, é o que Robert
Lowie adotou para construir o ''Quadro da vida indígena". Desprezando hipó-
teses teóricas, aquele mestre da Etnologia mostra, em têrmos claros e rigorosos,
o método moderno, racional, no seu meditado julgamento, que se deve hoje
empregar para ter uma idéia integral, exata, da primitividade humana, caracte-
rizada pela vida do íncola.
Ji:sse conceito e êsse método consistem:
1.0 - Insistir nas observações detalhadas da atividade das tribus mais pri-
mitivas, estudando a fundo a sua vida no seu próprio "habitat".
2.0 -Ligar as culturas ou civilizações de um tipo rudimentar às de estru-
tura mais complexa, passada ou presente para, por comparação, surpreender os
efeitos dos fenômenos de contacto das civilizações correspondentes, onde a lei
da imitação revelará todo o profundo senso da realidade.
Portanto, o método das pesquisas diretas de detalhes é hoje, pelos ameri-
canos e por todos os etnólogos e etnógrafos modernos, o único adotado, capaz
de proporcionar melhores conhecimentos dos respectivos fenômenos, contra os
audaciosos ensaios que as hipóteses teóricas fragilmente apresentavam.
3.o - Minha opinião a respeito da situação atual das pesquisas efetuadas
no Brasil e do emprêgo dos métodos modernos quanto à Etnografia, é que o
Museu Nacional se orienta, depois da República, pelo método moderno das pes-
quisas diretas, deixando de lado o método histórico-cultural, tradicionalmente
empregado antigamente por todos os Museus e Academias em que se estudava a
Antropologia com especialidades etnológicas e etnográficas.
4.o - Para aperfeiçoamento e intensificação das pesquisas etnográficas no
Brasil, por parte do Conselho Nacional de Geografia, apresento a idéia da cons-
tituição de um grupo de etnógrafos do Conselho, anexo aos técnicos exploradores
dos nossos sertões, agindó nas suas pesquisa$ de' acôrdo com o processo moderno
adotado pelo Museu NacionaL li:sses especialistas pelos seus estudos aprofun-
dados poderiam apresentar - quem sabe? - conclusões capazes de aperfeiçoa-
mento das pesquisas, proporcionando maior entusiasmo nesse estudo, com inten-
sificação, portanto, das viagens em busca de novos elementos.

BIBLIOGRAFIA

A bibliografia sôbre pesquisas e estudos da Etnografia americana é exhaustiva.


Ela começou a aparecer volumosa desde o "século das Descobertas.
Para ter uma idéia da profusão de escritores que se preocuparam com êsse
momentoso assunto basta ler as obras publicadas pelos Professores que dele
se ocuparam.
Todavia me abalanço a indicar os autores nacionais e estrangeiros, que estu-
daram o índio Americano com fins científicos:
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tos Históricos" (1584-1585).
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General Rondou.
139 - Congresso Indigenista - Pátzcuaro - "Edución" - Revista de Peda-
gogia y orientación Sindical - Número Especial - Junho de 1940.
140 -Roquete Pinto - "Rondônia" - Terceira Edição, aumentada e
ilustrada, 1934.

VOCABULARIOS MANUSCRITOS DA COMISSÃO RONDON E


INSPEÇÃO DE FRONTEIRAS:

1- Tribu Nenê (Nambiquara) .


2- Tribu Taganani (Nambiquara) .
3 - Tribu Caripuna (Taminari) - Rio Curupí (Uaçá do Oiapoque) .
4 - Tribu Macú (rio Branco).
5- Tribu Mayongon (Iêcona) Uraricuera - Rio Branco.
6- Tribu Macuxí - Rio Branco (bacia de Uraricuera).
7- Tribu Taurepã (Jaricuna) - Rio Branco.
8- Tribu Caripurá (Caripuenel - rio Uaçá - Oiapoque.
9- Tribu Oyamby - Rio Oiapoque.
10 - Tribu Galibi - Rio Uaçá (Oiapoque).
11 - Tribu Caripuna - Rio Uaçá (Oiapoque).
12 - Tribu Tacuatep - Rio Gi-Paraná.
13 - Nomenclatura das habitações da Aldeia dos índios Bororos.
14- Tribus Jarú, Urupá, Uemo, Pacahá-novo.
15 - Tribu Ariqueme (Uitat) .
16 - Tribu Quepqueriuat.
17 - Tribu Uapixana (bacia do rio Uraricueral.
18 - Tribu Rangú (Tirió) cabeceir~s do rio Cuminá, Cordilheira de Tu-
mucumaque.
19 - Tribu Pianacotó, Alto rio Cuminá.
20 - Tribu Anahuquá - rio Xingú.
21 - Tribu Apiacá - rio Tapajós.
22- Tribu Arauá - rio Guaporé.
23 - Tribu Aueti - Xingú.
24 - Tribu Bacaeri - Alto Teles Pires.
25 - Tribu Barbado - Alto Paraguai.
26 - Tribu Bororo - Rio São Lourenço e rio das Garças.
27- Tribu Camaiurá - rio Xingú.
28 - Tribu congorê - rio Burití, af. Juruena.
29 - Tribu Guaicurú - Aquidauana.
30 - Tribu Ipot-uat.
31 - Tribu Laiana - Miranda.
32 - Tribu Macurape - Guaporé.
33 - Tribu Mundurucú - Tapajós.
'34- Tribu Paricí - Vale Juruena.
35 - Tribu Burú - Borá - Guaporé.
36 "'""" Tribu Terena - Miranda.
37 - Tribu Uamdzê - Juruena.
38 - Tribu Xirihaná - rio Uraricapará.

Além dêsses vocabulários organizados por exploradores da Comissão Rondou


(Linhas Telegráficas, Inspeção .de Fronteiras e Serviço pe Proteção aos índios),
no arquivo da mesma Comissão, -em manuscritos a serem publicados, existem
mais os seguintes trabalhos de J. Barbosa de Faria:
a) "Esbôço Gramatical da Língua Bororo (BoeuadaroJ".
b) "Estudos Paricís - Esboço Gramatical - Vocabulário - Lendas
Cantigas e poemas".
a) Cândido M. sa. Rondon

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