Diss Juliana
Diss Juliana
Diss Juliana
TITUTO
O DE PS
SICOLO
OGIA
Proogramaa de Póss-Graduuação em
e Psicoologia - Mestra
ado
Áreaa de Cooncentração: Psicolog
P ia Apliccada
J
Julliana d Paulaa Medeiroos
de
VÍNCUL
LO MÃE--BEBÊ: OS
O ENCO
ONTROSS POSSÍV
VEIS EM
UMA UTI
U NEON
NATAL
UB
BERLÂNDDIA
2010
Julliana de Paula Medeiros
UBERLÂNDIA
2010
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
CDU: 159.922.74
Julliana de Paula Medeiros
Banca Examinadora
_________________________________________
Profa. Dra. Rita de Cássia Gandini
________________________________________
Prof. Dr. João Luiz Leitão Paravidini
________________________________________
Prof. Dra. Maria José Ribeiro
__________________________________________
Profa Dra. Denise Streit Morsch
Dedico esse trabalho,
Ao Douglas,
Desde que você chegou,
O mundo se tornou um lugar
Melhor pra se viver.
À Daniela Florentino,
Cuja alma se entrelaçou a minha,
Por desígnios do Universo.
Agradecimentos
Aos meus pais, Esmeralda e Luis Carlos, meus primeiros amores, por terem tido a
coragem e o afeto necessário para fazerem do seu desejo de ter um filho, uma realidade. Sou
imensamente grata pela minha vida e pelos cuidados que puderam me ofertar.
À minha madrinha Guaraciaba, por seu amor e compromisso, imprimiu em mim o
significado dessa função. Sempre terá meu carinho pelos cuidados que recebi.
À Profa. Dra. Rita de Cássia Gandini, minha orientadora, pela “maternagem” e pela
disponibilidade para me orientar e supervisionar para muito além dos casos clínicos trazidos
para o estudo. Com seu imenso afeto, nos emocionamos muito, muitas vezes. Obrigada por ter
se encantado junto comigo.
Ao Prof. Dr. João Luiz Leitão Paravidini, pela disponibilidade e generosidade de ter
aceitado ser meu co-orientador, e com o trabalho já andando, ter aberto espaço em sua vida
para contribuir decisivamente com essa pesquisa.
À Marineide D.S.Cabral, secretária do Programa de Pós-Graduação pelo compromisso
com que assume esse lugar, o que é fundamental para que o nosso trabalho aconteça.
Ao meu amigo, Rodrigo, pela amizade, imenso afeto e leitura disponível e atenta a
esse texto. É tão bom saber que é possível construir uma amizade como essa em qualquer
momento de nossas vidas.
À Edma, muito mais que uma amiga, minha irmã, com quem muito aprendo sobre o
sentido da maternagem, na sua prática mais terna.
Aos amigos recentes e antigos, todos eternos, Andresa, Daniel, Walter, Patrícia,
Isabela e Wanderlei, cúmplices carinhosos das minhas conquistas.
Ao serviço de psicologia do HC/UFTM pela viabilização dessa pesquisa e, em
especial, à equipe de profissionais da UTIN dessa instituição, por sua sensibilidade que
possibilitou minha atuação nesse espaço.
Às mães que participaram dessa pesquisa, sou muito grata por terem me permitido
estar junto de vocês, testemunhando suas dores e suas alegrias mais íntimas. Obrigada por
tudo que vivenciei junto a vocês, às vezes entre lágrimas e muitas vezes, entre sorrisos.
Aos bebês da UTIN, por ter podido junto a vocês ser cúmplice do mais radical desejo
de viver e de conquistar o primeiro amor, que afinal, é o primeiro amor de todos nós. Que
saudade!
O encontro entre um adulto e um bebê é
sempre ‘um espaço de narrativa’, no qual cada
um conta ao outro algo do que já viveu.
(Golse, 2004)
Resumo
Esse estudo teve como objetivo compreender como se constitui a função materna em situação
de internação de bebês pré-termo em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN). A
pesquisa foi realizada no Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro
no período entre março e junho de 2009. Foram entrevistadas cinco mães, casadas, com
idades entre 28 e 34 anos. A abordagem utilizada nesse trabalho foi de orientação
psicanalítica e funda-se no fenômeno transferencial. A pesquisa ocorreu em uma perspectiva
dialógica e a intersubjetividade se constituiu um elemento fundamental dessa investigação
psicanalítica. A UTIN pode ser pensada como um espaço simbólico para a ressignificação da
vivência traumática do nascimento pré-termo na medida em que puder transitar entre as
funções materna e paterna dos bebês que ali estão internados. A construção da função materna
depende da relação dessa mãe com sua própria infância, da forma como o bebê foi antecipado
ao longo da gestação e da capacidade de investir seu desejo em seu filho e para além dele. A
maternagem se dá a partir de uma série de atribuições maternas ao seu bebê, pela imersão do
bebê em um universo de palavras, que o inscrevam em uma linhagem familiar e o reconheçam
como um ser desejante. Isso só pode ocorrer se a mãe conseguir investir narcisicamente em
seu filho real, vivendo a elaboração do luto do filho imaginário, criando um espaço psíquico
entre mãe e bebê, o que só é possível se essa mãe tiver inscrito em si o terceiro. Dentre os
fatores e microfatores que contribuem para uma boa vinculação mãe-bebê podemos destacar o
acolhimento da equipe de saúde neonatal e a participação ativa no cuidado do bebê. Como
obstáculos, a ausência de contato no nascimento, a passividade do bebê frente ao cuidado
materno e a dificuldade em manter o resguardo devido aos deslocamentos hospital-casa-
hospital. Ainda como limitante para a vinculação do ponto de vista intrapsíquico, temos a
necessidade de lidar com a possibilidade de perda do bebê e a dificuldade de investimento
narcísico materno, o que pode se tornar intolerável na situação em que o bebê pré-termo
apresente mal-formação visível.
This study has as the purpose of understanding the maternal role in the hospitalization of
preterm infants in a Neonatal Intensive Care Unit (NICU). The research was conducted at
Hospital das Clínicas, Universidade Federal do Triângulo Mineiro in the period between
March and June of 2009. Were interviewed five mothers, married, aged between 28 and 34
years. The approach used in this study is the psychoanalysis and is based on the transference
phenomenon. The research took place in a dialogical perspective and the intersubjectivity has
constituted a fundamental element of this psychoanalytic investigation. The NICU can be
thought of as a symbolic space to the reframing of the traumatic experience of premature
birth, the extent to which you can shift between motherly and fatherly functions of babies who
are hospitalized there. The construction of the maternal function depends on the relation
between this mother with her own childhood, how the baby was anticipated throughout
gestation and the ability to invest in her desire for her son and beyond him. The motherly care
is given from a series of assignments mother to her baby, by immersing the baby in a word
universe that fall into one family line and that recognizes him as a desiring being. This con
only occur if the mother is narcissistically able to reinvest in their real child, living the
elaboration of mourning of the imaginary son, creating a psychological space between mother
and baby, which will only happens if the mother has internalized the third. Among the factors
and micro factors that contribute to a good mother-infant attachment we can highlight the
acceptance of the neonatal health care team and the active participation in the care of the
baby. On the other hand, as barriers, we have the lack of contact at birth, the passivity of the
baby receiving the maternal care and the difficulty in maintaining the confinement period due
to shifts hospital-home-hospital. Yet, as a inner psychic point of view a limitation for the
binding, we need to deal with the possibility of losing the baby and the difficulty of
narcissistic maternal investment, which can become unbearable in a situation where the
premature baby presenting a visible bad formation.
Página
Página
(Adendo)............................................................................................................................109
Sumário
1 Introdução .......................................................................................................................... 1
1.1 Dados sobre nascimentos pré-termo ...................................................................... 6
1.2 Tempo de gravidez: a construção da função materna ............................................ 8
1.2.1 A gestação do filho imaginário ................................................................................ 8
1.2.2 O nascimento pré-termo ......................................................................................... 13
1.2.3 O bebê, um ser da linguagem ................................................................................. 20
1.3 As competências de sua majestade, o bebê .......................................................... 25
1.4 Pesquisas sobre a relação mãe-bebê pré-termo: uma revisão bibliográfica ......... 28
1.5 Objetivos .............................................................................................................. 39
2 Método ............................................................................................................................. 40
2.1 A Unidade ............................................................................................................ 40
2.2 As mães e seus bebês ........................................................................................... 43
2.3 Caminhos percorridos .......................................................................................... 45
3 UTIN: espaço de encontros e despedidas......................................................................... 50
3.1 A função simbólica da UTIN ............................................................................... 50
3.2 Os encontros ......................................................................................................... 54
3.2.1 Raquel, a mãe que precisa de mãe ......................................................................... 55
3.2.2 Gabriela, a mãe que não se encontrou ainda .......................................................... 62
3.2.3 Solange, a mãe que tranquilamente embala ........................................................... 70
3.2.4 Marlene, a mãe que autorizada pelo marido, pôde se vincular. ............................. 78
3.2.5 Carla, a mãe que teme o próprio desejo. ................................................................ 82
3.3 Fatores e microfatores .......................................................................................... 88
4 Uma síntese possível ........................................................................................................ 94
5 Considerações finais......................................................................................................... 98
6 Referências ..................................................................................................................... 100
7 Anexos............................................................................................................................ 105
7.1 Anexo I. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .................................... 105
7.2 Anexo II. Ficha de Registro ............................................................................... 106
7.3 Anexo III. Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos ........ 108
7.4 Anexo VI. Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos sobre
Alterações no Projeto de Pesquisa (Adendo) ................................................................. 109
1 Introdução
compreendido entre setembro de 2007 a junho de 2009 visou o cuidado com as mães cujos
bebês nascidos pré-termo1 foram internados nessa Unidade e o cuidado com a relação dessas
mães com seus bebês, no sentido de auxiliá-las na vivência desses novos significados
atribuídos à maternidade com busca do alívio do sofrimento psíquico por elas vivenciados. Na
minha prática como psicóloga, houve uma preocupação em compreender o estado psicológico
da mãe frente ao que está vivenciando, e seus recursos para lidar com essa nova demanda de
cuidados, e a partir daí, procurar auxiliá-la a entrar em contato com o bebê e com a relação
Quando entrei no ambiente de uma UTIN pela primeira vez, o que foi revelado a mim
em um primeiro plano foi a aparelhagem sofisticada e ainda a equipe técnica com suas
qual as mães de bebês pré-termo, encontravam pela primeira vez seu filho, percebi que os
aspectos facilitadores da construção da relação mãe-bebê, pareciam não caber naquele espaço.
Ali, logo no primeiro momento, o que se revelava era um ambiente de interdição, pois à mãe
1
Definiremos melhor, posteriormente o que significa o nascimento pré-termo, mas para esclarescimento inicial é
terminologia usada para nascimentos que ocorrem antes do bebê completar 36 semanas de idade gestacional. Oss
termos nascimento e bebê prematuros ainda serão usados quando estivermos nos reportando a autores que usem
essa terminologia.
2
Usaremos ao longo do texto as terminologias UTIN e Unidade para me referir à Unidade de Terapia Intensiva
Neonatal e Pediátrica e ainda serviço e equipe quando estiver tratando dos profissionais (de saúde ou administrativos)
que trabalham nesse espaço.
2
era vetado acalentar seu filho no colo, amamentá-lo, e nesse aconchego impossibilitado, não
podia tê-lo face-a-face. Era um ambiente em que, pelo menos num primeiro momento, a festa
do nascimento e a certeza de que tudo correu bem, não estavam presentes (Agman, Druon &
ambiente, meu trabalho como psicóloga se ancorou na Resolução Nº. 13/2007 do Conselho
dentre as quais:
da função materna na situação de nascimento pré-termo que era, para uma parcela
significativa dos casos, inesperada. Era um desafio para essas mães se constituírem como tais
pelo acompanhamento feito a essas mães ao longo do tempo, que algumas conseguiram
encontrar meios de vivenciar a relação com seu bebê desde o primeiro contato na Unidade,
construindo seu lugar de mãe; que outras, com algumas intervenções, fizeram o mesmo
caminho, porém havia algumas mães que apresentavam bastante dificuldade em se constituir
como mães. Essas acabaram também apresentando em suas falas, um sofrimento psíquico
para o qual a intervenção mais apropriada poderia ser psicoterapêutica. Devido à diversidade
relevantes podiam passar despercebidos pela equipe de saúde. Isso nos fez querer, tanto
materna na situação de nascimento pré-termo, mas também encontrar uma forma de avaliação
internação em UTIN.
Ainda nessa Unidade, observei que a relação mãe-bebê estabelecida era mediada pelos
profissionais de saúde que lá estavam garantindo a vida do bebê pré-termo, e realizando desde
higiene dos bebês. Como a presença dos pais era permitida, com raras exceções, apenas nos
horários de visita, à mãe não era possibilitado o compromisso com os cuidados básicos com
seu próprio filho mesmo desejando fazê-lo, nem ficar com seu bebê tempo suficiente para
tinha alta, ele passava da Unidade para a Enfermaria Pediátrica e a partir desse momento, a
mãe se tornava acompanhante obrigatória de seu filho, exigindo-se dela uma constância de
mudanças abruptas na rotina da mãe que por não ter vivido o processo de identificação com o
espaço, insegura para a realização do cuidado básico e até mesmo, às vezes, desvinculada de
seu filho. Em decorrência desse tipo de rotina de trabalho na UTIN, observava-se uma falta de
preparo da mãe para se relacionar com esse bebê real que apresentava demandas que ela
Thomaz, Lima, Tavares e Oliveira (2005), os pais conhecem seus bebês reais à medida que
cuidam dos mesmos e uma rotina na Unidade que permita e estimule esse cuidado facilita a
Essa situação poderia ainda se tornar mais delicada quando posteriormente ocorresse a
alta do bebê para sua casa. Enquanto internado no hospital, seja na UTIN ou na Pediatria, uma
equipe de saúde, de forma mais ou menos intensa, estava presente, respondendo ao bebê em
entre equipe e bebê, incluindo, muitas vezes, demandas emocionais do mesmo. A não
construção do vínculo mãe-bebê podia não ser tão alarmante, já que o mesmo continuava
cuidado, limpo, alimentado. Em casa, não havendo nem mais nenhuma intermediação de uma
equipe de saúde, a ambivalência poderia encontrar espaço para se manifestar sem ser
cognitivo dos bebês pré-termo, embora seja influenciado tanto por fatores neonatais quanto
por fatores sócio-familiares, recebeu maior influência desses últimos. Desse modo, intervir,
tanto auxiliar a inserção do bebê em sua família, quando da sua saída do hospital, como a
unidades de terapia intensiva são recentes e tem sido ainda insuficientes, principalmente em
número e diversidade temática, para embasar a prática dos profissionais que atuam nessas
unidades. Os primeiros estudos foram realizados por Klaus, Barnett, Leiderman e Grobstein
na década de 70 e foram fundamentais para a compreensão de que a entrada das mães nesses
espaços não era fator de aumento de bactérias nas unidades (Klaus & Kennell, 1993). A partir
discussão para a interação entre os pais e o bebê. (Brum & Schermann, 2004; Wendland,
2001). No Brasil, os estudos ainda são muito recentes, produzidos em grande parte a partir do
ano 2000, sendo que a maioria dos trabalhos foca o vínculo da díade mãe-bebê, considerando
a especial importância das primeiras relações entre mãe e bebê como fundamentais no
desenvolvimento do ser humano (Gomes, 2001, 2004; Valansi & Morsch, 2004; Thomaz et
al., 2005; Scortegagna et al., 2005; Wendland, 2001). Trabalhos, ainda pontuais, se ocupam
da estrutura subjetiva dessa mãe analisando seus relatos de suas vivências relativas ao
nascimento pré-termo (Souza et al., 2007; Correia & Linhares, 2007; Correia, Carvalho &
situação em que o bebê pré-termo nasce sem síndromes e malformações. Acreditamos que
esse trabalho venha a acrescentar à literatura sobre esse universo e que o mesmo pode auxiliar
tanto no trabalho de outros psicólogos quanto na própria orientação de mães com relação a
seu bebê, pois os diversos estudos apontam para o reconhecimento do potencial diagnóstico
(Wendland, 2001).
sendo que esse enfatiza duas temáticas: a gestação do filho imaginário e o nascimento pré-
termo. As sessões posteriores abordam o bebê como um ser de linguagem e como um ser de
competências. E, por fim, na última sessão ainda do capítulo 1 descreve os objetivos que se
pretendeu alcançar com esse trabalho. O capítulo 2 aborda o método utilizado; o capítulo 3
traz a transcrição e a análise dos encontros e ainda a identificação e análise dos fatores e
considerações finais que puderam ser tecidas e sugestões para futuras pesquisas.
6
termo é definido quando nasce com idade gestacional3 de 24 a 36 semanas. Quanto maior for
sua idade gestacional, isto é, mais próximo de 36 semanas estiver o bebê ao nascer, menos
dados de estudos sobre o tema tais como o desenvolvido por Silveira et al. (2008) apontam
para um aumento nos índices de nascimentos pré-termo ao longo dos anos. A tabela 1 a seguir
ilustra os dados obtidos pelo SINASC para os anos de 1999, 2000 e 2005. O ano de 1999 foi
usado como limite inferior, pois os dados nos anos que antecedem 1999, se restringem
3
Não há consenso com relação ao procedimento para a estimativa da idade gestacional. A Organização Mundial de
Saúde recomenda a data da última menstruação (DUM) como o método de escolha para o cálculo da idade gestacional.
Em várias partes do mundo, incluindo no Brasil, o método recomendado pela da Sociedade Brasileira de Pediatria, a
idade gestacional é determinada pelo New Ballard Score (NBS) através da análise de parâmetros neurológicos e
físicos. A esses parâmetros são atribuídos uma pontuação que na somatória determinará a estimativa da idade
gestacional, para recém-nascidos com idade gestacional a partir de 20 semanas (Moraes & Reichenheim, 2000).
7
Silveira et al. (2008), destacaram em alguns de seus resultados, que em Ribeirão Preto
prematuridade foi de 6%; 7,5% e 15,5% para os anos de 1982, 1992 e 2004, respectivamente.
Esses dados apontam para a importância do estudo dessa temática, tanto pela
perspectiva de uma melhor formação das equipes multiprofissionais de saúde que tem como
desafio se preparar para atender a essa população quanto pela perspectiva da relevância do
momento, ainda não há a pessoa e sim a perspectiva de seu futuro nascimento, introduzindo a
sua mãe em que se passa por um processo de transição entre a idéia de filho ao filho real
(Aragão, 2004).
manifesta no corpo da gestante nas primeiras semanas de gestação através de uma série de
manifestações físicas (sonolência, cansaço, náuseas) que indicam que o seu corpo começa
funcionar de uma forma diferente da conhecida até então. Por outro lado, na construção
filho edipiano, fruto da cena primária em que grávida do pai, teria o filho ideal destinado a
preencher as falhas narcísicas e que poderia trazer-lhe com a completude, consolo na solidão
não é ainda o filho real o qual será investido na criança a nascer e sim, o filho imaginário ou
recalcamento, em que registros profundos se tornam mais acessíveis a acessos mais ou menos
9
conscientes, num processo que Bydlowski (conforme citada por Aragão, 2004, p.93) chama
sobre os primeiros dias de nossas vidas, pode ser expresso quando é evocado por
circunstâncias particulares que entram em ressonância com esse saber” (Szejer & Stewart,
1997, p. 126).
Segundo Soulé (1987), a menina, reconhecendo que lhe falta algo, passa a querer algo
que a complete, o filho do desejo edipiano, fruto do prazer que ela teria tido com o pai. Essa
menina, inicialmente, identifica-se como objeto de desejo da mãe, porém, não satisfaz
completamente a essa mãe, pois essa deseja (função paterna) para além da filha. Essa
incompletude, ao se conceber como um ser da falta, ou seja, castrada, inaugura sua ferida
é oriundo dessas emoções, desse anseio de reencontro com o eu ideal e esse “fantasma está
com efeito destinado a preencher as falhas de seu narcisismo e a trazer consolo na solidão
frente ao casal parental” (Soulé, 1987, p. 134). O objeto investido durante a gravidez não
começado pela mãe em sua própria infância, é a primeira inserção da criança no mundo
imaginário da mãe, e a possibilidade de imaginar esse futuro bebê é o que permite à mãe,
“Se lhe é proibido sonhar com os olhos abertos que esta criança a vir realizará
a volta do seu pai ou da sua mãe, que ela será homem e mulher, que ela estará
para sempre ao abrigo da morte, a mãe tem o direito (e aí uma necessidade para
a criança) de sonhar com a beleza, com semelhanças futuras, com a força deste
corpo a vir” (Aulagnier, 1999, p.21)
pai) a sonhar seu filho, numa gestação do filho imaginário. Inicialmente, podemos considerar
os desejos como uma primeira atribuição ao bebê, enquanto ser desejante, autônomo. Os
10
notícia da realidade do bebê, já que o corpo da mãe ainda não o faz com tanta concretude e “o
bebê de sonho das primeiras semanas de certo modo, toma corpo, aumentado ao mesmo
tempo todo devaneio de que pode ser objeto” (Debray, 1987, p. 29). À medida que a gestação
prossegue, as alterações corporais se tornam mais evidentes, para todos, e não apenas para a
mãe. Mexe-se de forma, agora, perceptível à mãe, e o seu corpo começa a se transformar para
dar espaço a seu filho que passa, então a ocupar seu lugar.
“Esse primeiro lugar que o filho ocupa, pode em parte, explicar o que a mulher
vive no decurso desse segundo trimestre. (...) agora, o bebê se mexe, marca sua
presença, e essa sensação é, certamente, o que faz da gravidez uma experiência
tão insubstituível quanto imaginável” (Szejer & Stewart, 1997, p.151).
Essa experiência se torna mais intensa quando o bebê começa a se manifestar através
de seus movimentos fetais, mas também, quando graças à tecnologia é possibilitado a escuta
São percepções táteis, sonoras e visuais. Quando a mãe está em torno do quinto mês conhece
a primeira imagem de seu bebê, e apesar dele estar ali, ele é parte real, parte imaginário. As
imagens, os sons e as sensações táteis entrelaçam-se aos aspectos remotos do filho imaginário
real”, os pais podem se permitir sonhar sobre suas características e suas futuras aspirações. O
anúncio do sexo do bebê aos pais, informação essa que é possível ser obtida a partir do quarto
mês transforma a relação dos pais com o mesmo, afinal a partir dali, se é pai ou mãe de uma
menina/de um menino. Nesse momento, é necessário fazer o luto do outro, daquele que aquele
bebê não é. A partir daí passa a serem suprimidos alguns dos diversos jogos imaginários que
concordamos com Szejer e Stewart (1997, p. 165), quando diz que “uma mulher pode querer
saber o sexo de seu filho, nas melhores intenções, mas pode não ser capaz de prever o efeito
11
que terá essa notícia sobre ela”. O bebê real, aquele que a capturará, ainda não está ali. O que
se coloca, quando se concretiza a definição do sexo do filho, é um aspecto do filho real, ainda
importantes do ponto de vista simbólico, pois são informações sobre o corpo do bebê que
efetivamente nascerá, e fatores como peso, tamanho, formato de dedos, cabeça, pés passam a
fazer parte da construção de imagens sobre o filho (Szejer & Stewart, 1997). Essas alterações
invadem o espaço subjetivo da mulher, que ao mesmo tempo, passa por rápida transformação
em sua referência de si mesma. É preciso alterar seus limites corporais, como eram
conhecidos, para que o bebê possa ter espaço (Aragão, 2004). Para que isso seja possível, a
plenitude com o filho imaginário gestado não em seu ventre e sim em sua cabeça, e sentir-se
possibilidade de que possa ser construído o espaço subjetivo para que esse bebê, às vezes
altera seu direcionamento ao longo da mesma. No início da gravidez, a mãe não tem certeza
se a gravidez prosseguirá, ainda não sente o bebê se mexendo em seu ventre e é possível,
momentaneamente, não se sentir grávida e ficar bem com esse sentimento. Porém, após
ambivalência começa a ser experimentada como uma angústia pela separação que ela sabe
que virá em algum momento, ainda distante. A angústia pode ser entendida como a
“expressão desse saber, dessa antecipação, e que entra em conflito com o prazer atual,
intenso, mas efêmero” (Szejer & Stewart, 1997, p.153). É o exercício de aceitar o estrangeiro
12
como familiar em si, para depois realizar o exercício de separar-se dele, a partir do
Enfim, a mãe e o pai revivem com o seu bebê, durante a gravidez e após a gestação,
seu próprio narcisismo, elegendo o bebê como objeto libidinal como outrora sua própria mãe
O cuidado para não morrer o ser que por sua condição humana está condenado à morte
é uma contradição, pois o homem cuida de não morrer, sabendo que morrerá (Costa, 2009).
Para não lidar com esse contraditório, no projeto de parentalidade, cuida-se do filho
empenhando toda a vida nele e se algo que traga a finitude para mais próximo, tal como o
nascimento prematuro, é possível, ativa-se nos pais o luto, uma forma de morte em vida
(Costa, 2009).
13
A partir do sexto mês, a mãe começa preparar-se para considerar o nascimento de seu
filho como uma possibilidade viável, ou seja, a partir daí, é permitido fazer planos sobre o
nascimento, o parto e começar se permitir desejar a separação entre ambos. É nesse tempo da
gravidez que a ameaça concreta do nascimento antes do tempo se instala para mãe e bebê4,
instaladas na mãe, podem ser entendidas como descompensações do bebê (Szejer & Stewart,
1997).
Enquanto a completude nos remete a dar à luz ao filho edípico, onipotente, ideal,
incestuoso e remete à fantasia idílica do gozo, o nascimento do bebê real reaviva a ferida
narcísica materna. O que está em questão ao longo de uma gestação, é a própria imagem ideal
da mãe no filho imaginário, em quem se espera sua reprodução, simbólica e real e o filho real,
humano, vai sempre remeter a mãe à falta. A ferida narcísica é reavivada na confirmação da
como baby blues diz respeito ao luto pelo filho incompleto e humano que se teve (Szejer &
Segundo Aulagnier (1999, p.22), esse filho antecipado, sonhado é um risco assumido
pela mãe de pré-investir uma imagem na ausência de seu suporte real e depois o risco de
descobrir o desnivelamento entre imagem e o suporte, embora como dito pela própria autora,
4
Antes de 25 semanas (em torno de seis meses) a interrupção da gravidez por qualquer motivo torna impossível a
sobrevivência do bebê.
14
Quando esse filho real vem de uma condição de nascimento pré-termo, pode
apresentar, então, esse não nivelamento entre real e sonhado e o conflito psíquico estabelecido
pode ser responsável por um luto bastante específico por enfatizar, ainda mais a ferida
narcísica materna.
fantasmático sonhado durante toda a gravidez pela mãe – e também, ao seu modo, pelo pai – e
o bebê real tal qual aparece em seu berço ou no colo de sua mãe ou de seu pai não é grande
demais, e o que é da ordem da desilusão, até mesmo da decepção, pode ser negociado sem
muito sofrimento”. Pode-se pensar que nesse caso, os fatores de ilusão produzidos são amplos
o suficiente para imprimir no filho real, sempre decepcionante, marcas5 do filho ideal (Soulé,
1987).
Esse filho imaginário continua sendo gestado pela mãe que vivencia o abrupto de um
nascimento antecipado. O bebê pré-termo ainda não é o filho e será necessário um tempo,
para essa criança ser inscrita como filho daquela mãe, para que seja possível a produção de
algum momento, e não sem tristeza, a mãe “percebe que terá que abandonar por algum tempo
sua relação fantasmática privilegiada com seu filho imaginário e todas as suas virtudes, e
termo é um acontecimento que irrompe no universo materno quando ainda essa mãe estava
5
As marcas da irrupção do real são sinais, os quais nos remetem a caminhos, pegadas deixadas pelas vivências de
satisfação ou de dor (Garcia-Roza, 1993, conforme citado por Maia, 2004, p.130).
15
sonhando seu filho e esgarça ainda mais a ferida narcísica materna. Com nascimento de um
Uma criança prematura se distancia do bebê cuja gestação foi a termo seja em aspectos
físicos e interacionais, sendo essa diferença mais acentuada quanto maior é a prematuridade
sobreviver. Esses aspectos podem dificultar o processo identificatório, pois para reorganizar a
reconhecimento do bebê imaginário no bebê real e que nessa situação de emergência, esses
É impossível, para Soulé (1987), fazer o luto completo do filho imaginário, pois não se
perde a relação com um objeto fantasmático. O filho imaginário é o filho do desejo e esse
existirá para sempre na sua mãe, independente do investimento que se faça no filho real
(Szejer, 1999). Do que se faz luto é da valorização narcísica, isto é, do investimento narcísico
na própria imagem materna gerando um filho ideal, durante a fabricação do filho imaginário.
Esse luto resulta em uma tristeza específica, o baby blues, que instaura o luto pela
separação, pelo nascimento do filho real. Não necessariamente coincide temporalmente com o
nascimento desse filho e sim, com a confrontação com a necessidade temporária de abandonar
o investimento no filho imaginário para investir na relação com o filho real. São
emocionante para todos que vivenciam a experiência, mãe, pai, equipe, pois, ainda segundo a
16
autora, “não se pode ficar insensível diante do surgimento de uma nova vida, mas podemos
alegria, tomados de angústia e mesmo mais tarde, deprimidos” (Debray, 1987, p.38).
urgência em interná-lo na UTIN, monitorando seus parâmetros, visando salvar sua vida.
Espontaneamente ou não, todas as mães, relatam esse momento em que vêem seu filho de
longe, senão com muita dor, pelo menos, um sentimento de vazio, de algo faltante.
como aquele que ocorre no limite da possibilidade de ser simbolizado. Por trauma,
compreendemos, conforme Agman et al. (1999, p. 18), um “evento que, em função de sua
pode, então, provocar efeitos patológicos duráveis”. De fato, o trauma, enquanto excesso
pulsional não é patológico em si, mas sim pela forma como o psiquismo buscará as soluções
2004).
Em seus aspectos subjetivantes, o que se configura como dor poderá ser significado,
Se, conforme lembrado por Szejer e Stewart (1997), todas as lembranças intensas são
esquecidas quando se toma os bebês nos braços, em um nascimento a termo, nos colocamos a
perguntar sobre quais são os registros que ficam do abrupto do nascimento de urgência, em
que o bebê, na maioria das vezes, sequer é visto pela mãe antes de ser internado na UTIN. O
impacto do nascimento pré-termo impede que naquele momento seja possível qualquer
investimento narcísico. Não raro, quando desacompanhadas dos familiares, as mães chegam à
primeira visita à UTIN, e ao primeiro contato com o filho e perguntando à equipe onde está o
seu bebê. Esse não reconhecimento é da ordem do simbólico e não do biológico. Ou seja,
mesmo que esse bebê tenha todas as características que reportem à sua história familiar, ainda
não é possível considerá-lo assim. É preciso um tempo de elaboração psíquica para que essa
mãe possa olhar para aquele bebê e inscrevê-lo em traços6, simbolizando o traumático e
ambivalência e coloca a mãe em confronto com sua imagem de mãe má, incapaz de carregar
seu filho (Mathelin, 1999). Os bebês internados na UTIN podem recapturar sua mãe e,
novamente se sustentar no desejo da mesma ao manifestar seu desejo de viver, através de sua
6
Os acontecimentos são inscritos na memória através de traços mnésicos (Maia, 2004, p.129). O evento traumático
enquanto não subjetivante fica impossibilitado de ser inscrito.
18
filho ideal e não daquela criança real (ainda não seu filho) que parece tão distante de qualquer
possibilidade de investimento (Debray, 1987; Mathelin, 1999). Por isso, na UTIN o luto não é
feito e o baby blues não pode existir. Não havendo espaço para o baby blues no nascimento
prematuro, de uma forma paradoxal, é como se o bebê ainda não tivesse nascido, como se não
houvesse separação. Segundo Mathelin (1999, p. 67), “o nascimento parece então anular-se, a
mãe permanecendo portadora do filho imaginário para tentar lutar contra a decepção e a
inevitável culpa”.
tempo residual da gestação. Ele sai nos braços da mãe, mais ou menos quando sairia de um
parto a termo e talvez por isso, nesse momento, quando as condições de sobrevivência dessa
criança são afirmadas é que se torna possível o baby blues, isto é, se torna possível chorar o
filho imaginário e investir narcisicamente no filho incompleto que se teve (Szejer, 1999).
Preocupação médico-primária
primária”7 pela força da técnica médica, apresentam um estado que foi chamado por Agman
contraposição ao estado psicológico descrito por Winnicott. A esse estado, as autoras querem
de seu filho, a um estado de alerta médico, em que sua relação com o filho se dará à luz do
dias de internação, uma mãe, ao lhe ser perguntado sobre como está seu filho, acabará por
responder qual o peso dele naquele dia, se está com infecção ou não, e como está sua
7
Estado descrito por Winnicott (1978) que permite à mãe identificar-se plenamente com seu bebê e atender às suas
necessidades de modo adequado.
19
saturação8. Muito dificilmente lhe ocorrerá, olhar para seu filho e falar da tranqüilidade do seu
sono, do quanto ele se parece consigo (ou do pai), de seu desejo (do bebê) de sair do hospital,
“As mães perto de uma incubadora sofrem quase sempre de uma incapacidade
de pensar seu bebê. (...) Nessa impossibilidade de dizer, elas estão como que
parasitadas, presas na armadilha entre o médico que conhece melhor que elas, o
luto do fim da gravidez e os riscos reais de morte da criança” (Mathelin, 1999,
p.70).
identificar-se com o seu bebê, pois “a separação imposta pela necessidade médica ameaçava
agravante é que, com esse vazio da simbolização desse bebê, corre-se o risco de mesmo após
a alta essa mãe continuar a não conseguir se construir um processo identificatório com seu
bebê, que a adapte às necessidades psicofísicas do mesmo (Zornig et al., 2004a). Quando a
mãe entra no estado de “preocupação médico-primária”, a relação que seria mediada por
outros terceiros, passa a ser mediada exclusivamente pela linguagem médica para definir o
8
Taxa de saturação do oxigênio designada Saturação de O2, ou seja, é a medida da oxigenação dos tecidos.
20
A linhagem familiar
De acordo com Aulagnier (1999), o ato que inaugura a vida psíquica correlaciona
psíquico. O filho imaginário se insere como uma primeira versão do filho, construída e
aguardada na psique maternal, enquanto essa acolhe esse corpo. Ela se dirige ao filho
Esse filho, gestado não no corpo, mas na cabeça, é chamado por Aulagnier (1999) de
“eu (Je) antecipado” e pressupõe a antecipação também de uma mãe para esse filho. Durante a
gestação, a construção de um projeto de mãe para esse filho passa pelo endereçamento a esse
bebê de uma série de expectativas, desejos e sonhos. Trata-se da construção de um lugar para
o mesmo. E, segundo Szejer e Stewart, (1997, p.113), “para fazer o lugar de que ele
necessitará ao nascer, tanto o homem como a mulher têm necessidade de antecipá-lo e todos
possível ter um desejo de filho, uma projeção desse filho no futuro, que não corresponde a um
desejo de serem pais, ou seja, que não projete ser pai/mãe desse filho em um futuro (Szejer &
Stewart, 1997, p. 63). Ter um projeto de parentalidade e no caso específico, projeto de ser
mãe, implica construir um espaço subjetivo em si para que o filho possa ser construído,
enquanto ela mesma faz o luto da filha em si, passando por sua vez a se construir como mãe.
A forma como cada mulher se projeta para assumir as funções da maternagem está
relacionado ao modo como vivenciou sua relação com sua própria mãe, e como, por sua vez,
Por isso, podemos pensar a construção da função materna começando muito antes da
concepção do bebê, iniciando-se naquilo que Szejer e Stewart (1997) chamam da pré-história
do bebê e que compreendem todas as narrativas que tecem a história familiar daquele que será
um bebê gestado a partir do encontro de um casal, em uma específica família. As histórias que
o antecedem, a expectativa de como ele será, estão relacionadas à história dessa mãe (e desse
pai) em suas famílias, da história de constituição do casal e de como os sonhos que estão
sendo sonhados para o bebê, alinham-se às histórias dessas famílias e desse casal.
entendido como “todas as palavras que preexistem à vida humana e que concernem a ela de
uma maneira ou de outra” (Szejer & Stewart, 1997, p.44). Esse banho de linguagem é
mundo das trocas através das palavras e por isso, é preciso que palavras sejam ditas a ela.
9
Linguagem é aqui entendido para além das palavras, considerando os sons, os cheiros, tudo o que vindo do
ambiente apresenta o mesmo à criança, inscrevendo-a na ordem do humano (Maia, 2004).
22
de respeito a ela como pessoa humana. Nas Unidades, o respeito se inicia pela garantia do
registro geral da criança, que é gerado tão logo o mesmo receba de seus pais, um nome, um
registro de nascimento em cartório10, assim como pela reintrodução em sua nova vida, dos
cheiros, sons familiares, dos sabores, das sensações familiares registrados por ele ainda na
vida intrauterina.
De acordo com Szejer e Stewart (1997, p.270), “nomear, dizer-lhe quem são seus pais,
seu lugar” e ajudam no processo de introdução ao novo, que é trazido com a experiência do
nascimento.
O manhês
É extremamente significativo ver o impacto da voz de uma mãe sobre seu bebê, que ao
ouvi-la, pela primeira vez, após a internação na Unidade, dirige seu rosto em direção a ela. Se
essa voz passa a produzir um discurso materno específico dirigido ao filho começa-se a
10
a criança passa a ser nomeada e não apenas chamada de “RN de...” (nome da mãe), o que simboliza o registro
daquele bebê como uma pessoa ou outro diferente de sua mãe. Embora aqui, estejamos falando de nomeação, da
enunciação da história da criança, o que a inscreve na linhagem parental (Szejer, 1999).
23
subjetividade, “é preciso que exista um laço entre lingüístico e não lingüístico, para que os
significação, sem que houvesse uma ligação com o corpo, com a ação, com a vida” (Maia,
2004, p. 121). Os processos de significação são produzidos a partir de uma forma singular de
gramática, pontuação e uma prosódia especial (Laznik, 2004, p.81). Muito diferente da
linguagem infantilizada, tipo “tati-bi-tati” que nada simboliza, nada permite atribuir de
eleição do bebê como interlocutor pela voz materna (Laznik, 2004; Cavalcante, 2004).
Quando uma fala desse tipo é produzida, o bebê procura o rosto que corresponde a essa voz
particular e, ele por sua vez, lerá ser ele o objeto do desejo materno, “objeto causa dessa
surpresa e dessa alegria que a prosódia da voz e os traços do rosto materno refletem” (Laznik,
2004, p.82).
Nessa prática discursiva, o som encontra-se associado ao gesto e ao olhar e a mãe faz
uso da “marcação rítmica para correlacionar gesto e voz possibilitando à criança organizar seu
contínuo experiencial nesta fala ritmada” (Cavalcante, 2004, p.78). Através do diálogo
instaurado pelo manhês, a mãe dá voz ao seu comportamento corporal e/ou vocal mantendo
11
Transitivo é aquilo que é passageiro, efêmero. Aqui, a idéia é daquilo que age sobre outro que não o próprio agente
(Bergés & Balbo, 1998).
24
vividas pelo filho são designados pela mãe e se relacionam às referências da própria mãe. É
pela interpretação dada pela mãe que o filho se integra ao simbólico (Bergés & Balbo, 1998).
“A materialidade sonora das palavras (voz) faz com que o bebê se interesse
pelo Outro. O sentido que elas veiculam, e que o bebê não compreende do
mesmo modo que o adulto constrói para ele, um lugar no mundo” (Catão,
2004, p.135).
Através do manhês, a mãe constrói suposições sobre as demandas que ela criou para
seu filho, verbalizando-as, e ainda constrói a resposta para essa demanda. Como a demanda
foi suposta pela mãe, essa resposta não corresponde jamais àquilo que a criança deseja, e que
a própria criança também desconhece. Esse jogo de posições entre mãe e filho revela sobre o
ser subjetivo, desejante. Esse filho é estranho à mãe, mas nem tanto, por isso é possível supor
demandas, mas também não é familiar demais, que nada se suponha e tudo sejam certezas
A construção da maternagem desse bebê será mais bem sucedida, quanto mais estiver
preparada, a mãe, para compreender o que seu bebê pode oferecer em função de sua
singularidade nascente. O estudo dos bebês a partir de suas competências precoces foi
iniciado por autores da teoria do apego que enfatizaram a tendência inata dos bebês para
entrar em comunicação com seus parceiros humanos (Bowlby, 2002; Brazelton, 1981; Golse
ativo desse na interação com o adulto (Wendland, 2001). E é importante considerar aqui que,
embora a teoria do apego não seja a fundamentação teórica adotada em nossa abordagem
quanto os bebês reagem aos afetos veiculados pela fala, pela voz e que podem, quando estão
succionando, mudar o ritmo da sucção para solicitar uma específica estimulação. Ainda
segundo Mathelin (1999, p. 36), com algumas horas de vida, o “bebê reconhece e prefere a
voz de sua mãe que já ouviu in utero, àquelas de outras mulheres”. Os bebês reconhecem
odores familiares desde as primeiras horas de vida, assim como apresentam sensibilidade tátil
desde o período fetal. E quais seriam as competências de um bebê pré-termo? Cunha (2004)
ressalta que com 21 semanas de vida intra-uterina, o bebê já tem desenvolvido o sistema
sua dor e dela não tenha consciência, registra-a como memórias afetivas representadas em seu
26
corpo, primeiro espaço de psiquismo, e serão incorporadas como elementos de sua história
singular.
Als, o funcionamento global de uma pessoa compreende vários níveis, que ela denomina
regulador emergente, os bebês procuram adequar suas respostas aos estímulos a que estão
submetidos. Para um bebê pré-termo, a variedade de estímulos que são lançados nos
subsistemas que ainda não estão prontos para tal estimulação, resulta num gasto energético
idade gestacional na qual o bebê pré-termo nasce, pode estar ainda em diferentes estágios de
pelo bebê na relação com seus cuidadores, especialmente sua mãe, e se torna responsável pela
constituição subjetiva do bebê antecede seu nascimento. O bebê não é apenas reativo ao meio
sobre o processo interacional com os adultos que o circundam (Zornig, Morsch & Braga,
2004b).
Debray (1987, p.37) nos fala de bebês que em singularidade “sabem tornar suas mães
competentes, e são, ao mesmo tempo investidos de retorno de uma maneira feliz e completa
para eles”. As Unidades são repletas de relatos sobre os feitos dos bebês, pelo modo como
pedem a presença da equipe ou dos pais, ou por um mal-feito que provoca risos. Conforme
observado por Zornig et al. (2004a, p.139), “as diferenças individuais observadas nos bebês
em sua maneira de interagir com a mãe parecem influenciar o tipo de maternagem que lhes é
oferecida, indicando uma reciprocidade nas trocas estabelecidas e não só a ação do desejo
bebê, vindo das experiências em vida intrauterina, para o enfrentamento as novas situações,
sob o risco de que sem essa ligação, o bebê não consiga se construir (Szejer, 1999).
28
parto antecipado e pela irrupção do bebê real confrontando os pais ainda em processo de
dificultaria a construção de um olhar narcísico que superasse o bebê orgânico diante dos seus
temporais na constituição subjetiva do bebê poderiam ser superadas. O artigo foi interessante
intervenção precoce. Lendo outros trabalhos das autoras, incluídos nessa revisão da
bibliografia, entendo que essa não era a ênfase desse artigo, pois estes outros artigos trataram
mais especificamente de processos interventivos (Scortegagna et al., 2005; Valansi & Morsch,
2004).
interação entre mãe e bebê pré-termo e dos indícios de desenvolvimento do vínculo afetivo no
hospital, as autoras apontaram que as manifestações corporais, visuais, faciais e vocais eram
compreender e responder aos sinais advindos do bebê seriam ações fundamentais para o
situação de internação”, a pesquisadora Gomes (2001) a partir de três casos estudados, teve
como objetivo procurar entender como mães de bebês pré-termo lidavam com a questão da
maternidade ao serem submetidas a um parto pré-termo e tendo que se confrontar com esse
bebê. A abordagem teórica e clínica em relação aos casos e a análise de toda a situação que os
segundo a perspectiva psicanalítica e ainda sobre a inclusão do bebê no mundo segundo essa
de Obstetrícia do Instituto Central Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo e seus
do mesmo hospital. Cada caso apresentou uma especificidade: o primeiro deles foi escolhido
mãe se implicar nesse processo. No segundo caso, foi explorada a questão do pouco contato
último caso estudado, foi explorado o impacto causado diante da possibilidade de perda,
sendo discutido o quanto isso interferiu na relação que essa mãe estabeleceu com o seu filho
mulheres diante do nascimento pré-termo, a psicóloga observou que essas mães muitas vezes
não aceitavam a aproximação ao longo das primeiras horas após o parto por confrontarem-se
30
com a possibilidade de perda, por verem-se separadas do bebê e ainda precisarem lidar com
sua própria alta hospitalar sem o bebê. Percebeu que passado esse período, houve espaço nas
mães para iniciarem o processo de elaboração dos sentimentos que estavam sendo
vivenciados. Em sua dissertação conseguiu com esses três casos construir reflexões acerca da
feita junto a uma mãe de uma criança pré-termo, como essa mãe, em um acompanhamento
aproximação em relação à filha. Reforçou com seu estudo a importância da intervenção a ser
feita pela equipe no sentido de contribuir para a aproximação e contato da mãe com seu bebê.
uma abordagem teórica em situação de nascimento de risco” propôs uma abordagem histórica
subjetiva do bebê como sujeito a partir dos autores que abordaram a temática a partir da
importância da mãe nessa relação e outros que a estudaram a partir das condições do bebê
Bowlby. Entre esses dois últimos, elas diferenciaram o apego de Bowlby da dependência
absoluta de Winnicott. Para tratar desse aspecto, as autoras citam Bowlby (2002) que diz que
enquanto que o inverso ocorre com relação ao apego. Ainda segundo Bowlby (2002) citado
pelas autoras, o bebê ao nascer é dependente, mas não é apegado, e à medida que passa para a
dependência relativa e independência se torna mais apegado, sendo que o apego se torna
31
evidente após o bebê completar seis meses. Quero me ater nesse momento, na afirmação de
evidencia substancialmente depois que a criança completou seis meses”. Bowlby por seu
trabalho de resgate dos estudos feitos por etologistas como base para o estudo do
comportamento humano tem como método para a demonstração do apego que o mesmo se dá
humano, isso não é possível de ser verificado, devido à sua ausência de força para se agarrar à
mãe ou mesmo para se mover em direção à mesma (Bowlby, 2002, p.301). Ora, não poder se
mover em direção à mesma, não quer dizer não desejar fazê-lo e sim, faltar ainda um estado
fundamental, que um ambiente favorável seja estabelecido, para que essa necessidade seja
atendida e a organização psíquica do bebê seja constituída com mais esse elemento
integrativo.
Ainda no estudo teórico sobre as relações iniciais, quanto aos estudos sobre os
recursos do bebê para a interatividade e de seu papel ativo na construção da relação mãe-bebê,
as autoras (Brum & Schermann, 2004), trouxeram as contribuições dos primeiros teóricos a
apresentam uma grande capacidade de responder às interações nos primeiros minutos de vida,
sendo capazes de realizar discriminações importantes pelo olhar, de identificar a voz dos pais,
o cheiro da mãe, uma capacidade de se moldar ao corpo de seus pais (reflexo de aconchego).
Outro aspecto abordado no artigo referiu-se a um histórico dos cuidados neonatais, desde o
sobrevivência dos bebês pré-termo e isso trouxe novas demandas como o cuidado com o bebê,
ambiente onde possa ser acolhida em seu processo de luto do filho imaginário, mas que
também propicie a ela informações sobre as capacidades interativas do bebê, pois isso é
Penso ser importante relembrar aqui que esse luto do filho imaginário se faz em um processo
contínuo ao longo da vida, pois o filho imaginário continua sendo gestado no desejo dos pais
e pode ser acionado pelos mesmos a qualquer momento. Em qualquer etapa, a frustração de
um pai/mãe com relação a seu filho, que traga uma imensa tristeza, se relaciona ainda a
constatar que o filho real difere do imaginário. Entendo que esse artigo é uma contribuição
importante com vistas ao foco do estudo que proponho sobre a temática, principalmente por
de uma UTI Neonatal, para introduzir a discussão da reorganização psíquica da mãe durante a
gestação e as implicações da chegada de um novo bebê para os filhos mais velhos do casal.
norteadoras para a atuação do psicólogo nesse espaço. Segundo as mesmas, seu trabalho deve
trabalho com os pais, irmãos e bebês internados em UTI Neonatal. Na perspectiva de trabalho
atendimento aos pais dos bebês, ajudando-os a falaram sobre esse nascimento, ser facilitador
além disso, propiciar espaço de acolhimento à família sobre as possíveis perdas reais (mortes,
bebê, ainda segundo as autoras, deve ser prioridade do psicólogo o trabalho de aproximação
de toda a família com o bebê. No trabalho com irmãos de bebês em UTI Neonatal (Morsch &
Delamonica, 2005), o psicólogo deve auxiliar aos pais a se disponibilizarem para os outros
filhos, apesar da situação de crise vivenciada, e deve ainda, promover visitas supervisionadas
dos irmãos dos bebês visando, dentre outros aspectos, facilitar o desenvolvimento do vinculo
familiar. Com esse artigo, as autoras propuseram que a oferta de sustentação e que ser
variáveis sociais e perinatais”, Thomaz et al. (2005) tiveram como objetivo analisar as
diferenças nessa relação e a importância do contato físico entre mães e bebês para a formação
dessas relações. Além disso, levantou dados sobre a história da gravidez e a condição sócio-
referiram a 28 mães participantes, mas em outros momentos, inclusive na análise dos dados,
entende-se que foram de fato 20 participantes, sendo 10, mães de bebês pré-termo, e 10, de
observações não puderam ser feitas com as mesmas participantes, pois essas mães ficaram
34
internadas por, no máximo, 48 horas. Isso se apresenta como um limitante do método, porém
a meu ver, para participantes com características similares, justificável para pesquisas
inseridas em serviços que apresentam alta rotatividade de pacientes devido a períodos curtos
de internação. Para a análise das entrevistas foi utilizada a análise de conteúdo e levantaram-
que estavam grávidas; do companheiro, ao ficar ciente da gravidez da mulher; das mães, no
momento em que o feto mexeu pela primeira vez; e ainda, o imaginário das mães sobre como
o bebê iria ser ao nascer; percepção das mães sobre a possibilidade dos bebês nascerem
prematuramente; sentimentos das mães com o nascimento do filho e o seu pensamento sobre
o futuro dos bebês. Dentre os resultados encontrados, perceberam que mães de bebês a termo
aceitação da gravidez e ainda que a aceitação da gravidez pelo companheiro foi determinante
de uma vivência mais tranqüila desse momento. Além disso, as mães de recém nascidos pré
termo vivenciaram o nascimento de seus filhos de forma diferente das outras, pois a ligação
afetiva dessas mães com seus bebês estava permeada pelo “fantasma” da morte, mesmo que
de forma não explícita nos discursos. O contato físico com os bebês foi percebido como
importante para a ligação afetiva mãe-bebê e todas as mães sentiram a necessidade de estarem
próximas aos filhos, sendo que a relação de segurança no cuidado com o seu bebê foi mais
demorada nas mães cujos bebês eram pré-termo. Esse trabalho evidenciou que as mães de
construção de um espaço para a escuta dessas mães, compreendendo o momento em que estão
No artigo “Ansiedade Materna nos períodos pré e pós natal: revisão da literatura”, as
pesquisadoras Correia e Linhares (2007) analisaram a produção cientifica entre 1998 e 2003
de estudos empíricos sobre a ansiedade materna nas fases pré e pós – natal, focalizando
35
nascimentos pré- termo e a termo. Foram discutidos 19 estudos, sendo que seis avaliaram a
ansiedade materna na fase pré–natal, 12 avaliaram ansiedade das mães na fase pós–natal e um
metade dos estudos foi o Inventário de Ansiedade Traço- estado (IDATE). Os resultados
mostraram que altos níveis de ansiedade materna na fase pré- natal foram associados a
indicaram maior vulnerabilidade das mães. E redução nos níveis de ansiedade das mães de
importância da intervenção precoce, pois esta contribui para a promoção do bem estar
psicológico materno. Foi verificado ainda existência de altos níveis de ansiedade materna
científicos e por essa razão os mais relevantes livros relativos ao trabalho aqui proposto serão
Wanderley (1999) confirmando quão recente é a produção científica brasileira com relação a
esse universo. A autora buscou subsídios para a construção do livro nas experiências
psicológicas em neonatalogia e a ajuda ao bebê e pais em terapia intensiva neonatal. Nos dois
bem como auxiliando a equipe a compreender alguns aspectos subjetivos que permeiam a
relação entre pais, bebê e equipe. No terceiro capítulo, foi abordada a questão da alimentação
que na UTI Neonatal deixa de ser aconchego, alimento emocional além nutricional, e passa a
ser mais uma prescrição médica. No último capítulo dessa primeira parte, discutiu dois casos
que dão entrada na unidade de terapia intensiva simultaneamente, e que suscitam na equipe
atenção e cuidados de forma bastante intensa – de forma similar à sua mãe – e outra, era
tranqüila e segundo a autora, com uma tranqüilidade indiferente, como sua mãe. Diante disso,
discutiu essas situações à luz das questões das pulsões de morte e de vida na unidade de
terapia intensiva. Na segunda parte do livro, foram abordados caminhos para uma atuação
interdisciplinar. No primeiro deles, tratou-se uma pesquisa que solicitava que os pais fizessem
uma avaliação sobre o atendimento em UTI após a alta do seu bebê. Na minha avaliação, as
questões (não foram mostradas no relato feito no livro), apesar de abertas não possibilitaram
ao participante se colocar mais livremente. Dessa forma a pesquisa acabou por não abordar
ambivalência dos pais em relação à equipe, um dos itens pesquisados em algumas questões, e
que foi um importante aspecto apontado por diversos autores (Thomaz et al. 2005; Agman et
al., 1999; Gomes, 2001, 2004) não foi verificada na mesma. Nos três capítulos que se seguem,
potencialidades, a conhecer suas capacidades e seus limites e ainda, ajudando os pais a viver
com suas crianças descobrindo suas potencialidades. Os outros dois capítulos trataram de
37
crianças que chegaram às psicanalistas com idades um pouco maiores. Em ambos, foi
analisado como as palavras descritoras dos possíveis limitadores das potencialidades dos
filhos acabaram por definir o olhar dos pais em relação aos mesmos marcando não só o corpo
desses filhos como, também, sua constituição subjetiva. Por tudo que foi tratado, esse é um
livro extremamente importante para a discussão da dimensão subjetiva que atravessa a relação
organizado por Moreira, Braga e Morsch (2006) contribui com uma importante organização
terapia intensiva, sendo dirigido para a comunidade em geral. Seus capítulos foram escritos
por diversos profissionais que compõe uma equipe de saúde que atua em uma UTI Neonatal e
abordou diversas questões tais como o que é esse nascimento diferente, qual o ambiente e a
aparelhagem de uma UTI Neonatal, bem como quem são as pessoas que compõem sua equipe
e abordou as intercorrências e exames mais freqüentes pelos quais pode passar o bebê.
da participação dos irmãos mais velhos e do método canguru. No último capítulo abordou a
nascimento pré-termo.
com as crianças internadas na Unidade, o trabalho com os seus pais e o trabalho com a equipe.
criança e o discurso que a anima, restabelecendo nos pais a capacidade de amar seus filhos e,
no bebê, seu desejo de viver. Utilizou a metáfora do sorriso da Gioconda, para falar do desejo
a dois, mãe e filho, quanto como proibição do acesso à felicidade proporcionada pela relação
com outros objetos de amor. Tratou da necessidade de que essa relação se submeta à entrada
de um terceiro na relação e que no caso dos bebês pré-termo e suas mães, esse terceiro seria
estes bebês a respeito de suas histórias, através do que ela chamou de “fala verdadeira”, tudo
que está sendo vivenciado pela criança durante sua internação. Fez uma crítica, importante em
tempos de programas de Humanização de UTIN, que seria fundamental que todas as pessoas
envolvidas neste trabalho pudessem “deixar-se tocar” pela criança, e não falar mecanicamente
com ela só porque se sabe que isso é importante. Com relação ao trabalho com os pais,
caberia ao psicanalista a criação de um espaço para que essas mães pudessem fazer um
partir do momento em que elas pudessem simbolizar esta falta, poderiam voltar a projetar um
futuro sobre o filho. Quanto ao trabalho com a equipe, primeiramente, a autora refletiu de que
naquele espaço, o psicanalista seria tanto parte da equipe quanto, precisaria colocar-se para
além da mesma para uma escuta distanciada, buscando auxiliar a equipe a perceber a história
singular daquela criança bem como os mecanismos transferenciais que essa história mobiliza
mecanismos psíquicos seriam acionados nesse espaço do ponto de vista da criança, de seus
1.5 Objetivos
2.1 A Unidade
região do triângulo sul, podendo abranger também outras macro regiões do estado e ainda
poder aquisitivo, porém em alguns casos, mesmo possuindo planos de saúde suplementar, se
utilizam da internação na UTIN pública, pois alguns desses planos não cobrem a permanência
dos bebês em unidade de terapia intensiva por um tempo que pode se estender por cerca seis
meses.
relativo ao Centro de Terapia Intensiva que contém também 10 leitos para UTI Adulto e 10
para UTI Coronariana. Em um longo corredor, à esquerda de quem entra, tem-se a Unidade de
familiares pela perda de pais, mães, irmãos internados na UTI Adulto, pois era em uma sala
contígua a sala de espera que o médico noticiava o óbito do paciente internado à família.
Percebemos que essa riqueza emocional desse contato não pode ser negligenciada, sendo mais
Por ser uma UTI Neonatal e Pediátrica, o setor recebia bebês pré-termo ou nascidos a
termo com problemas que comprometiam sua sobrevivência sem cuidado intensivo, e ainda
crianças até 14 anos de idade (Ministério da Saúde, 1998). Em termos proporcionais, cerca de
2% dos casos que internavam na UTI eram pediátricos, não havendo uma separação do espaço
físico para essas diferentes faixas etárias e demandas, embora houvesse uma separação dentro
bebês pré-termo internados, incluindo suas mães, só tinham acesso à Unidade em dois
expansão passando de 12 leitos para 20 leitos. Mesmo com a expansão, a taxa de ocupação da
Unidade continuou alta tendo em média 98% dos leitos ocupados. Dois leitos estavam
bloqueados devido à falta de profissionais para atender adequadamente aos leitos conforme
prevê a Portaria No 3.432 do Ministério da Saúde que estabelece como equipe básica:
básica, pois a portaria prevê apenas que o hospital deve contar com um Serviço de Psicologia.
Considerei importante ressaltar que da forma como está, essa portaria não garante a
sim, que em momentos que se considerar importante, um psicólogo de algum setor pode ser
12
Esses horários podiam ser flexibilizados, em função da dificuldade de locomoção das mães, por exemplo, horários
de saída de vans para seus municípios de origem.
42
deslocado para atender à solicitação. Por isso, atendendo à portaria, na UTIN a equipe médica
Naquele momento, o staff era compreendido por 20 médicos nos diferentes turnos e plantões.
Eram duas as equipes de enfermagem em cada um dos três turnos. Cada equipe de
outros hospitais ou estavam em cursos superiores de formação, o que fazia com que tivessem
Durante as manhãs e tardes, a Unidade contava com uma fisioterapeuta por turno. A
intensiva fez com que desde 2007 fosse aberto um espaço para a minha atuação como
13
A residência médica oferecida pela UFTM era em UTI Pediátrica.
14
Em julho de 2009 foi contratada uma psicóloga exclusiva para o atendimento à UTI Neonatal e Pediátrica.
43
recém nascidos pré-termo que deram entrada na UTIN acompanhados por suas mães,
participaram desse estudo, cinco mães, cujos filhos, recém-nascidos, foram internados na
Como nosso estudo focou a construção da função materna, na relação que as mesmas
estabelecem com seu filho recém-nascido, não foram analisadas as situações em que outros
familiares assumiriam a maternagem do bebê, mesmo sabendo que, a ausência materna pode
bebê. Além disso, mães de recém-nascidos pré-termo que após o parto, se encontrassem
internadas em Unidade de Terapia Intensiva Adulta ou ainda mães que apresentassem algum
Isso se justificou naquele momento, por fugir do alcance pretendido por essa pesquisa. É
importante ressaltar que, durante o período da pesquisa, nenhum desses casos previstos
inicialmente como critérios de exclusão de amostra ocorreu e, por isso, não nos deparamos
com uma possibilidade de alteração desse critério de exclusão a partir de questões que fossem
mãe de Lorena; Gabriela, 28, casada há 6 anos, mãe de Viviane; Solange, 33, casada há 10
anos, mãe de Henrique; Marlene, 33, casada há 15 anos, mãe de Oliver; e Carla, 34, casada há
13 anos, mãe de Marcelo. Lorena nasceu com idade gestacional de 30 semanas com peso ao
15
Os nomes das mães e de seus filhos são fictícios.
44
nascer de 1310g e ficou internada na UTIN por de cerca de um mês. Henrique nasceu com
idade gestacional de 30 semanas e seu peso ao nascer era de 1140g. Sua internação foi de
cerca de quatro meses. Oliver nasceu com idade gestacional de 30 semanas, seu peso ao
nascer de 1445 g e sua internação durou cerca de um mês. Marcelo nasceu com idade
gestacional de 28 semanas e peso ao nascer de 935 g. Sua internação durou cerca de quatro
meses. Para todos eles, o motivo da internação era o nascimento pré-termo e complicações
funções fisiológicas e motoras que davam apenas condição para uma vida limitada e
dependente de ventilação mecânica. Tinha hidrocefalia e nasceu com macrocefalia, sem nariz,
com olhos praticamente não formados. Essa descrição é importante para boa parte da
Embora não tenha sido um critério inicial de seleção da amostra, todas as mães que
participaram da pesquisa eram casadas há pelo menos, cinco anos. Apenas Gabriela, estava
separada quando soube da gravidez, e, nesse momento, tinha se reaproximado do marido. Já
na alta da filha, estavam novamente se separando.
de sua execução. Somente mediante esses procedimentos é que foram contatadas as mães no
significações produzidas pelo pesquisado se dão diante da posição do pesquisador e, por sua
complexidade de sua inserção na natureza, de sua dinâmica emocional, sua potência criadora
e sua necessidade radical de sentido”. Nessa perspectiva, o ser humano é um sujeito aberto,
internação de seus filhos recém nascidos e de como as mesmas construíram recursos para
46
possibilitar a expressão das diversas representações das participantes em seus aspectos verbais
e não-verbais.
horário de visita, procurando não causar prejuízo nas visitas feitas pela mesma a seus bebês
realizados em diversos espaços nos quais nós (eu e a mãe participante) nos encontrávamos.
Na Sala de Espera, no Banco de Leite16 e, em sua maioria, diante das incubadoras, na própria
Unidade, durante as visitas da mãe ao filho internado. Esse espaço em particular, foi
Na entrevista inicial foi priorizada a escuta das mães, com o objetivo de propiciar o
esclarecidas dúvidas com relação à rotina na Unidade e ainda, na ocasião, foi preenchida uma
ficha de identificação da mãe e do bebê. Com relação à ficha do bebê, na mesma foram
registrados alguns aspectos da história clínica retirados do prontuário médico e que foram,
16
O banco de leite do HC/UFTM fica em uma sala do hospital e é um espaço para a coleta do leite materno. Nesse
espaço são oferecidos instruções sobre como coletar e armazenar o leite em casa, em recipientes esterilizados
fornecidos pelo setor. E como as mães vão para essa sala para realizar a coleta do leite, o mesmo se torna um espaço de
acolhimento às mães, uma espécie de sala de espera.
47
novas significações, diminuindo o impacto futuro que esses elementos não expressos
poderiam vir a ter (Druon, 1999). A entrevista se propôs a “evocar o traumático” e facilitando
a expressão dos sentimentos, tentando evitar o adoecimento da mãe e ainda contribuir para a
Durante os encontros que ocorreram em momentos em que a mãe estava com seu bebê
no sentido de juntamente com as informações obtidas nas entrevistas, cujo objetivo inicial era
através de categorias sensoriais. Para Tronick e Cohn (conforme citado por Wendland, 2001),
e a criança”, ou seja, o foco da investigação nesse caso se volta para aquilo que é observável
do comportamento da díade.
registro posterior das observações da relação mãe-bebê segundo as categorias corporal, visual,
comportamental desenvolvida por Lamor e Lebovici (conforme citado por Wendland, 2001)
disposição de encontrar o seu bebê. Para isso, foram utilizadas algumas categorias desse
técnica de análise que capte o fenômeno da interação”. Temos aqui um limite metodológico,
importante. Sempre haverá na singularidade humana e das relações humanas, algo que escapa
o observável, que vai além do que se percebe e que se pode registrar. Apesar desse limite, as
observações tiveram implicações significativas do ponto de vista clínico sobre a relação que
algumas variações em relação ao método clássico construído por Esther Bick e buscou,
prematuro através de uma abordagem mais atenta aos aspectos emocionais da interação”. A
principal variação se deu do ponto de vista do método, pois, aqui se tratou de observações e
intervenções dirigidas aos vínculos que se tornaram manifestos através das condutas das
mães. E foi possível, como observadora, oferecer à mãe “a continência que resulta de suas
atitudes de receptividade, reflexão, não atuação, não julgamento” (Mélega, 2008, p.132).
Segundo Palmigiani (1997, p. 189) o observador, com a atitude acima descrita e mínimas
intervenções “tenta alcançar o objetivo de proporcionar o setting à mãe (quando junto com a
Penso ser importante, refletir aqui que ao observarmos a díade, levamos conosco
nossos afetos e nossos próprios modos de comunicação verbal e não verbal, que influenciam
sujeito” (Simon, 1989, p. 69). Esses podem ser negativos ou positivos, sendo importante
ressaltar que a forma como esse fator negativo ou positivo conduz a uma determinada
estudo, uma gravidez de risco pode se constituir um fator interno negativo, porém pode ser
adaptativa (Simon, 1998, p. 69). Estão muito relacionadas àqueles eventos em que,
aparentemente, nada está acontecendo, mas, segundo a narrativa das pessoas ao redor, “de
repente, a mãe não quer ficar com seu bebê”. O “de repente” quando nada parece estar
acontecendo pode estar relacionado a diversos microfatores externos ou internos, que atuando
feita a partir da análise dos relatos. E, clinicamente, são bons parâmetros indicando a que o
A UTI Neonatal é um espaço em que o limiar entre vida e morte é tênue, as notícias da
evolução do bebê são dadas dia a dia, um lugar em que se evita fazer prognósticos para além
daquele dia. Deparamo-nos com a iminência da morte, que nos desarma de nossa capacidade
Qual a função da Unidade na vida psíquica do bebê e sua mãe? Hoje se encontra em
muitos textos e no imaginário dos serviços de neonatalogia que, com relação ao vínculo mãe-
bebê, a ação dos profissionais seria orientada para, a todo custo, a manutenção do laço, da
presença materna junto ao seu bebê. Eu mesma, ao começar o trabalho na Unidade, fui
convidada a me ocupar de facilitar a presença da mãe junto à criança internada. Claro que
psíquica de mãe e bebê, entretanto, à medida que o trabalho vai sendo construído, somos
Para ocupar essa posição de sustentação à mãe, para que a mesma possa se colocar
como suporte psíquico para o seu bebê, a equipe em um UTIN precisa suportar seus próprios
medos e lutos, pois afinal, vive com o bebê internado uma intensa relação de cuidado.
ambiente que o cerca através dos vários sentidos, olfato, tato, visão, discriminando, logo nos
primeiros dias, os rostos familiares dentre outros e, com isso, se colocando pronto para uma
interação com o outro. Para o bebê internado, os primeiros cheiros, os primeiros ruídos e
das enfermeiras conversando perto ou com o bebê se tornam a ambiência conhecida, materna.
Desse ambiente provêm os cuidados que possibilitam a vida biológica e psíquica do bebê. É o
51
serviço que fornece os cuidados que reconhecem o bebê como um sujeito desejante. É a
enfermeira que dá ao bebê uma fralda para que o mesmo a leve quando da alta da Unidade.
Fralda essa a qual ela aprendeu, no encontro com esse bebê, que o tranqüiliza para lidar com o
desejosa de adoção, como eu mesma já me vi, desejo esse que se instaura em relação àqueles
bebês que foram dados para adoção, ou que foram abandonados por seus pais na Unidade.
Nessa situação em que a mãe de nascimento não se faz presente, nossas fantasias de boa mãe
assumem sua plenitude e permitem um investimento narcísico diferente. Afinal, como dito
por Mathelin (1999, p.97), “quem não tem em um momento ou outro o fantasma de levar para
casa esse bebê abandonado”? É solicitado à equipe, continuamente, a realização do luto pela
separação dos bebês que depois de meses de internação saem no colo de seus pais biológicos
ou adotantes.
É dessa posição maternante que a Unidade pode exercer a função de suporte para a
mãe, ajudando a mãe realizar o luto daquele bebê que, naquele momento, simboliza perda e
fracasso para então se permitir “descolar o filho do horror do real e projetar sobre ele um
A função da UTIN é dupla. Por um lado, exerce a função materna, para o bebê e sua
mãe. Mas é o serviço que redefine papéis, nomeando quem é mãe, pai, avó, quando e qual o
tempo de permanência desses personagens da história do bebê. A Unidade com seus ritos de
em uma função de terceiro, simbolizante vindo “proibir à mãe e ao filho que se devorem um
ao outro” (Mathelin, 1999, p.18). Ao mediar o encontro da mãe e seu filho, separa-os,
protegendo a ambos, num momento em que extremamente ferida, a mãe se vê como uma
52
ameaça a seu bebê. A Unidade absorve para si a violência do encontro e permite que o real
mesmo tempo um ódio disparado ao bebê por tê-la frustrado tão profundamente em seu
narcisismo e contra si mesma, por não ter se provado como uma boa-mãe. O hospital, num
primeiro momento, segundo Mathelin (1999, p. 29), “vem garantir à mãe que o filho, num
primeiro tempo, viverá apesar dela, o que atenua sua culpa e, num segundo momento, caso a
puder, ainda, aceitar que o chamado instinto materno são relações construídas a partir de
Na Unidade, deparei-me com mães que, em seu imenso sofrimento, não dispunham de
nomear o filho que estava morrendo devido a sua prematuridade extrema, ou a experiência de
ter um bebê que dentre outras mal-formações, apresentava genitália ambígua, e sem sexo
definido, não tinha nome e depois de morto, não pôde ter seu óbito atestado. A mãe que
vivenciou a primeira experiência me disse “não consigo pensar em um nome”, já a outra mãe
que ela sente como monstruoso e perseguidor, um filho que significa sua impotência e seu
possibilidade de simbolização quando essas mães não conseguem imprimir seu desejo naquele
que foi gerado, seja pela iminência da morte, seja porque o que foi gerado, não pode ser
53
absoluta poderiam nos servir de amparo frente a esses eventos que nos fragilizam, tornando-
os um pouco mais suportáveis”. São caminhos perigosos, que se excedidos, tornados reais,
monstro” e não conseguia deixar de sentir dores, enjôos, centrada em si mesma, incapaz de
ver o filho e de se ver no mesmo, impotente para construir novas significações que tornassem
A UTIN nos confronta com a finitude, com a mortalidade e com o fato de que nosso
aparente controle de nossas vidas é ilusório. Instaura-se como lugar em que na articulação
entre vida e morte, pode ser construída a simbolização, os registros iniciais na ordem do
estávamos e nos induz, após um encontro com velhos fantasmas, a fazer emergir o novo, a
ascender a uma nova posição na vida”. Concordamos com Mathelin quando diz que
A UTIN pode ser pensada como esse portal que conduz a ressignificações em regime
bebês que ali estão internados. Uma hora é a Unidade que reconhece no bebê um sujeito que
deseja. Outra hora a UTI é o pai, o terceiro, que funciona como mediador entre a mãe e seu
bebê.
54
3.2 Os encontros
encontros com as mães participantes. Optei por esse formato, por acreditar que essas notas já
participante quanto minhas. Concordo aqui com Hermann (Silva, 1993), quando diz que a
por descobrir na ação a sua própria estratégia”. A partir da construção do espaço dialógico, é
falado aquilo que é urgente para o entrevistado. A transcrição de minhas notas, às vezes é a
transcrição de um encontro, e em outros momentos, notas sobre vários encontros, e tem como
finalidade, colocar o leitor em contato com o processo no qual foram produzidos os relatos
analisados. Logo após as transcrições segue a discussão suscitada tanto pelas entrevistas com
Foram realizados seis encontros com Raquel e Solange durante o tempo em que seus
realizados inúmeros encontros, cerca de dois por semana. Para transcrição e posterior análise
nesse estudo, optei por relatar aqui os dois primeiros encontros e posteriormente alguns
registros de nossos encontros ocorridos durante esse tempo. Com Marlene e Carla foram
realizados quatro e cinco encontros, respectivamente, antes da alta de seus filhos, Oliver e
Marcelo.
Gabriela, a mãe que não se encontrou ainda; Solange, a mãe que tranquilamente embala;
Marlene, a mãe que autorizada pelo marido, pôde se vincular e Carla, a mãe que teme o
próprio desejo.
55
Todas essas mães foram acompanhadas desde a internação de seus bebês até a alta
para a Enfermaria Pediátrica. Duas delas, Gabriela e Carla, ainda foram entrevistadas após a
alta da UTIN, na Enfermaria Pediátrica e devido a isso, acompanhei Carla e seu filho até a
alta do hospital. Esses encontros que se prolongaram após a saída da Unidade se justificaram
esperando pela chamada para entrar na UTI Neonatal pela primeira vez. Como não haviam
tido nenhuma orientação ainda sobre o funcionamento da Unidade, eu realizei algumas delas,
inclusive sobre o Banco de Leite17. Ela disse que estava bem e percebi não haver naquele
2º encontro: Encontrei Raquel na Unidade junto à sua filha e me relatou que já a pegou
no colo. Estava ansiosa para conversar com os médicos sobre alguns exames que disseram a
ela que seriam feitos no dia anterior. Disse-me que foi preparada para a gravidez de risco, pois
desde o sétimo mês sua pressão arterial começou a aumentar e o líquido amniótico o que
trazia muito sofrimento para a filha. Raquel sentiu-se aliviada ao ver que a filha estava viva,
fora de sua barriga. Ficou muito tensa durante a gravidez e “quanto mais tensa, mais a pressão
aumentava”. Teve quatro anos antes, uma gravidez que não foi a termo devido também a
pressão alta gestacional. E por isso seu medo era maior. Tinha dois filhos adolescentes, com
15 e 12 anos que estavam ansiosos por conhecer a irmã. Estava na casa de apoio18 sozinha,
pois o marido voltou para cuidar dos outros filhos. Perguntei se ela esteve no Banco de Leite e
17
Embora algumas pesquisas apontem criticamente para um enfoque da assistência nos serviços materno-infantis
esteja centrada nos aspectos biológicos da amamentação (Vasconcelos, Leite & Scochi, 2006), a intervenção foi feita
por compreender que a contribuição da mãe para o cuidado do seu bebê com seu leite, é uma dos primeiros aspectos de
relação mãe-bebê que se mantém exclusivos e cuidar dessa forma de vinculação é também cuidar dessa maternagem
que está se construindo em um ambiente inesperado.
18
As casas de apoio são casas alugadas em Uberaba pelas prefeituras das cidades compreendidas pela região de
abrangência do HC/UFTM para os familiares dos pacientes internados no hospital.
56
ela diz que não, que tentou ordenhar sozinha e não conseguiu. Levei-a até o mesmo, visando
mostrar o caminho e também por saber que aquele seria um espaço que ofereceria a ela um
cheios de lágrimas. Convidei-a para ir para fora da Unidade, ao que ela atendeu. Perguntei o
que ocorreu, ela disse que a filha estava fazendo exames, e que ela não agüentava ver a filha
sendo picada. Mas repetiu “são apenas exames”, como se dissesse, “sou eu que estou
sofrendo” Falou que está separada dos três filhos e que ao mesmo tempo em que estava com a
filha internada, não estava. Repetiu algumas vezes “é para o bem dela”. Relatou que não
deixava ninguém vir ver a filha, só ela, e não queria que ninguém visse o que ela estava
vendo, “pra sofrer, para quê?”. Estava chorando muito e nervosa. Ela disse querer esquecer
tudo e não queria que ninguém guardasse na lembrança a filha com o tampão nos olhos (para
a fototerapia). As técnicas de enfermagem vieram nos avisar que ela já podia entrar. Deixei-a
com a filha. Quando retorno, ela estava com a filha que dorme em seu colo e me disse “ela
estava chorando, foi só eu chegar, falar com ela e pegar ela no colo que ela parou de chorar na
hora e dormiu”. Começou a falar de seu sentimento anterior dizendo, “a gente tem altos e
baixos, mas sei que minha filha está bem”. Relatou que era super-protetora, que não soltava
nenhum dos filhos e que sentia que os sufocava. Ainda em seu relato, o marido falava para ela
que seus filhos sofreriam quando crescessem por serem muito protegidos. Porém sua
percepção de quem sofreria era outra, pois disse a seguir, “quando eles se forem, quem vai
sofrer sou eu, pois eles irão viver a vida deles e eu vou ficar”. Contou-me que era órfã de mãe
e que parou de estudar nessa época, pois arrumava a casa, ficava cansada, e seu pai não ligava
se ela ia ou não para a aula. A mãe morreu no parto, de eclampsia, dando à luz à irmã mais
nova há 25 anos atrás. Raquel relatou ainda que, durante a gestação, teve muito medo de
morrer, que ao todo, teve cinco gestações. O primeiro filho de Raquel morreu, ainda durante a
57
gravidez, mas ela não ficou sabendo o motivo da morte. Teve os outros dois filhos cujas
gestações ocorreram sem nenhuma intercorrência. Depois teve outra gravidez, quatro anos
atrás, que teve que ser interrompida devida novamente à ameaça de pressão alta gestacional.
Engravidou de Lorena quando estava preparando a papelada para a laqueadura. Ela não foi
esperada, mas ela disse saber que Lorena veio ajudá-la a perceber que ela, Raquel, “dá conta”.
Nos dias que antecederam ao parto, ficou internada no hospital e subia até o berçário para ver
os bebês e pensava que não suportaria vê-los lá, e como dito por ela “foi pior, ela veio pra cá,
pior ainda”.
4º encontro: Raquel quando me viu relatou que “começou a falar”. No dia anterior
mesmo ligou para o marido e contou como estava a filha, sobre os exames de controle que
estavam sendo feitos. Falou também com os filhos, e contou como estava Lorena, “que ela
estava sem roupinha, em uma incubadora, embaixo de uma luz forte, com os olhos
tampados”. Perguntou a eles se gostariam de ver a irmã, ao que ambos responderam que não.
Ela disse que aceitou o desejo deles, até porque era o que ela esperava mesmo. Perguntei a ela
como se sentia, falando, e ela disse que mais forte, que parecia não ter mais medo.
5º Encontro: Sobre seu trabalho em sua cidade natal, disse-me ser empregada
doméstica e estava em uma casa já há quatro anos. Disse-me que olhou o primeiro filho da
patroa, que agora tem seis anos, e olhou também uma menina de 1 ano e 4 meses, que a
chama de mãe. Disse que a patroa quase não parava em casa, e que por isso, a filha quase não
a via. A patroa ficava chateada, mas ela entendia a confusão da menina. Percebi que ela
mesma se identificava muito com essa filha da patroa, pois relatava sentir muita saudade da
menina. E começa a falar com Lorena sobre sua irmãzinha postiça, que logo elas iam se
conhecer e brincar. Falou que o leite parecia estar secando, e que por sentir a pressão para ter
leite, parecia que o mesmo secava mais ainda. Disse ainda que não perguntava muito aos
médicos sobre como estava sua filha, pois sabia que ela está bem e que se algo ocorresse à sua
58
filha, ela saberia. Achava que agora os médicos tinham outros bebês em estado mais grave
6º Encontro: Reafirmou que tudo mudou que estava falando mais, e que agora seus
filhos, principalmente o mais novo, queriam vir ver a irmã. Estava em pré-alta, esperando
apenas vaga na Enfermaria Pediátrica. Percebia-a feliz consigo mesma, por ter encontrado em
si, um jeito de ser que ela não conhecia. Lorena estava dormindo e ela falou do quanto era
bom ver a filha olhando para ela. Com olhos sorridentes ela disse que o olhar da filha parecia
Análise
Raquel foi acompanhada desde o dia de sua chegada até a alta do bebê para a
Enfermaria Pediátrica. Sua gravidez foi interrompida devido à pressão alta gestacional que
começou quando estava com cerca de sete meses. Ela tomou corticóides, uma medicação que
propicia o acelerado amadurecimento dos pulmões dos recém nascidos pré-termo, e que
A hipertensão gestacional ocorre em mulheres que quando não grávidas tem pressão
arterial normal e que podem, ocorreu com Raquel, desenvolver uma crise de hipertensão em
uma gestação, mas não em outras. Segundo Szejer e Stewart (1997, p.191), “apesar da
hipertensão arterial dita essencial ter suas causas fisiológicas evidentes, também pode ser
entendida como um sintoma mental”. Do ponto de vista fisiológico, se a hipertensão “não for
controlada pode, de fato, ameaçar o funcionamento da placenta20, pela qual passam as trocas
sanguíneas entre a mãe e a criança, e colocar em risco tanto a vida de uma quanto da outra. Os
médicos vigiarão de perto essa gravidez e estarão atentos para que o bebê não sofra intervindo
19
Dentre as intercorrências típicas dos nascidos pré-termo, tem-se: a instabilidade térmica, as crises de apnéia, as
hemorragias intracranianas, as infecções adquiridas e a anemia da prematuridade.
20
A hipertensão arterial provoca alteração na vascularização da placenta (Szejer & Stewart, 1997).
59
com urgência se, pelos exames realizados, for verificado que ela está em sofrimento” (Szejer
e Stewart, 1997, p.192). E concordando com o texto, com essa díade, as evidências de
sofrimento fetal fizeram com que fosse necessário intervir, pois o bebê havia parado de
ganhar peso.
A placenta representa as trocas entre a criança e sua mãe, e seu mau funcionamento
devido à alteração da vascularização da placenta e das trocas sanguíneas entre a mãe e o bebê
dão lugar ao simbolismo de uma dificuldade nas trocas entre a mãe e a criança. No final dessa
gestação, quais foram as pressões que Raquel vivenciou e que fizeram com que sua pressão
arterial aumentasse? Pelo seu relato percebi que ela tem uma grande dificuldade em
essa gravidez trouxe em termos de completude, que, em seus meses finais, tornou a futura
separação impensável, gerando um nível de angústia, que acabou por antecipar a própria
separação.
“Foi um alívio”, diz a mãe, “ela estava sofrendo”. Sua filha ou ela, e ainda ela, filha ou
mãe? Alívio, do sofrimento gerado pela crise de hipertensão ou daquele que gerou a crise? O
relato sobre a morte de sua mãe no parto remete à fantasia de um “filho que mata a mãe”.
filho que mata a mãe, essa mãe vive a sua concretude a experiência inversa, a mãe que mata o
filho. Foram duas, as gestações que não vingaram. Logo na sua primeira gravidez, aquele que
seria o primogênito se tornou um natimorto e ela, de tão alienada de si naquele momento, não
soube explicar o que ocorreu naquela gestação. E, após duas gestações bem sucedidas, há
quatro anos, outra gravidez foi interrompida devido à hipertensão arterial, o que quase se
repetiu agora.
“Cada linhagem tem sua história com os ditos e os não ditos que fazem sua
especificidade. (...) É a partir de todas essas palavras mais ou menos
convergentes e de todos esses não ditos, que se criam as bases das formações
60
inconscientes, que se tornam depois conscientes, a partir das quais toda nova
vida pode ser pensada” (Szejer e Stewart, 1997, p.44).
Na história de Raquel, com tantas perdas reais, podemos pensar nos interditos que
foram vividos por essa mãe, e também no que lhe foi permitido, no que tange à sua
maternagem. Raquel me contou que com os papéis preparados para a laqueadura tubariana21,
engravidou, produzindo aí um ato falho. Conforme Szejer (1997, p.56) “os atos falhos podem
ser entendidos como discursos (do inconsciente) bem sucedidos”. Sabemos o quanto o desejo
torna permitido ser mãe novamente? A forma afetiva como fala de sua relação com a filha de
sua patroa, me pareceu ter relação com seu desejo, dentro de sua história singular de casal e
família. Com relação à filha de sua patroa, atualmente com quatro anos (momento em que
quis engravidar novamente?), ela foi responsável por cuidados reais. Sua patroa trabalhava o
dia todo, o que a deixava com a criança durante todo o dia. Segundo ela, a criança às vezes a
chamava de mãe. Penso que esse momento, começando a ver seus filhos pré-adolescentes,
criando vínculos fora de casa, vínculos esses que consolidam a separação que tanto teme, foi
sendo fomentado o seu desejo de ser mãe novamente. Inicialmente, repete a concretude do
“mãe mata filho”. Após essa repetição, frente ao desejo, se lança conscientemente em busca
Com esse nascimento bem-sucedido, que culmina em vida após a crise de hipertensão,
essa mãe ressignifica uma repetição familiar, que a remete à sua própria história como filha.
21
Forma permanente de esterilização feminina na qual os tubos de falópio são cortados e/ou
ligados cirurgicamente de modo a prevenir a fertilização.
61
O nascimento dessa filha, repetição que ressignifica, permite que um novo discurso
possa ser construído. Essa mãe, na escora transferencial oferecida pelos nossos encontros,
elabora sua história ao superar seu impeditivo, reconhece sua orfandade e marca uma nova
inscrição nessa história familiar. Sua separação de sua própria mãe foi, sim, dramática e
acredito que pouco tenha podido elaborar de sua história naquele momento. Ao reconhecer
sua orfandade, a qual se exerce sobre toda e qualquer mulher e, sobre todos nós, no sentido
simbólico, ela pode se reinscrever em sua história, reconhecendo que o nascimento traz em si
o luto da impossível fusão mãe-bebê e traz a separação, condição para que a vida seja
possível, elaborando a “falta que inaugura o nascimento” (Benhaïm, 2007, p.18). A angústia
sentida por Raquel, por não poder ver os olhos da filha, nas observações iniciais em contraste
com seu enamoramento quando relata que o olhar da filha parece que vai lá no fundo, remete
à filha que nela, a mãe, reside. Segundo Benhaïm (2007, p.15), “a criança em nós se inscreve
Ao lidar com seu “ódio simbólico pode elaborar, re-elaborar, sua perda simbólica (a
falta estrutural) e pode fazer com que seu desejo recomeçasse a encontrar meia satisfação
junto a outro além da criança” (Benhaïm, 2007, p.18). Raquel passa a partilhar seu drama com
seu marido e seus outros filhos e segundo seu próprio relato passa a se sentir menos só, mais
forte. Aquilo que antes não podia ser dito, a história dessa própria criança e de ambas na
UTIN que não podia ser conhecida por ninguém mais na família (somente elas mesmas) passa
a ser partilhada, circulando na família e marcando o lugar da Lorena como parte dessa
linhagem.
62
1º Encontro: Ela começou a me contar que nada parecia estar acontecendo de verdade,
que algo mudou, mas não sabia bem o que. Contou-me que durante a gravidez, disseram a ela
que a filha tinha a Síndrome de Alpert22 e que não sobreviveria ao nascimento. Ela e o marido
fizeram, na época, uma pesquisa sobre a síndrome na internet, o que a deixou preparada para
o que viria, mas desde a notícia, sentia uma tristeza23. A mãe me disse que tinha uma filha de
cinco anos, normal. Relatou ser muito difícil sair de perto da filha, e que se sentia muito só,
sem ela. Gostaria que fossem somente as duas no mundo e que ela teria força para enfrentar se
existissem somente as duas. Disse que estava tentando entender tudo o que estava
2º Encontro: Disse que acordava sempre muito pesada, muito triste, sem vontade de
fazer nada e, que, ao longo do dia, começava a fazer as coisas. Estava nervosa com a filha,
bastante nervosa e sentia-se culpada por estar “brigando com a filha à toa”. Disse sentir medo
de como a filha iria tratá-la quando soubesse da filha internada, que achava que ela não iria
aceitar, que iria “perguntar por quê?”. Depois, disse que a filha era tão bondosa e aceitaria e
iria ajudá-la a cuidar da filha internada. Relatou não ter desejo de conversar com ninguém e
que agora, não quer mais saber dos amigos, que ela não queria ter que falar de nada disso.
Como dito no início da sessão, a partir daqui estão transcritas impressões ao longo dos
outros encontros, pois foram cerca de cinco meses de internações. O diagnóstico médico da
síndrome anunciada não se confirmou, pois, como característica dessa síndrome, a filha
deveria apresentar mal-formação nas mãos e também em órgãos internos vitais e por isso um
22
A Síndrome de Apert é um defeito genético e caracteriza-se por má formação específica do crânio, terço médio da
face, mãos e pés, além de diversas alterações funcionais (Fonte: www.alpert.org).
23
Achei importante registrar aqui que, em conversa com o marido, ele me relatou que fez uma pesquisa na internet,
colocou fotos de crianças com a síndrome em um envelope, entregou para a esposa e saiu de perto. Voltou correndo
quando ouviu seu grito ao ver as fotos.
63
própria equipe era ambivalente com relação à Viviane. Havia profissionais que achavam que
medicamentos. A família que a visitou da internação foram: as duas avós, o pai e a mãe. Ela
foi visitada todos os dias de sua internação de quatro meses, e essa visita sempre, por parte de
todos, com uma qualidade de interação muito grande. Conversavam com ela, choravam,
desejo de que a filha mais velha conhecesse a irmã. Mas, paralelamente ao desejo, disse ter
medo que a filha se impressionasse com a mal-formação dos olhos e nariz. Propôs que se
concordou em realizar esse procedimento. A partir daí, inúmeras visitas foram marcadas as
quais, por um motivo ou outro (ora por esquecimento, ora confusão de horário, ora outros
compromissos), nunca se cumpriram. Com relação ao casal, havia sempre uma tensão no ar,
percebia uma falta de cumplicidade. Mais tarde isso foi confirmado pela mãe, dizendo que
eles estavam separados e voltaram a morar juntos quando ela ficou grávida. Quando Viviane
Relatava recorrentemente que sua prima estava grávida também, de mesmo tempo e
que o bebê nasceria a termo. Falava das conquistas do desenvolvimento normal que esse bebê
estava fazendo. Por duas vezes, me perguntou sobre a existência de grupos de pais com filhos
“como a dela”, um lugar onde ela pudesse se sentir compreendida. Ela dizia que achava que
se sentiria mais tranqüila se encontrasse pais com a mesma experiência que a dela.
24
O Programa de Visita dos Irmãos foi por mim instituído na UTIN do HC/UFTM em 2008 a partir da experiência
relatada por Morsch, D.S. & Braga, N.A. (2006) e Morsch, D.S. & Delamonica, J. (2005). Propus no mesmo o
acompanhamento da visita dos irmãos ao bebê internado.
64
Depois de cerca de quatro meses, fui convidada a ouvir a família, pai e mãe,
principalmente mãe, sobre suas expectativas com relação à vida de Viviane. Pretendiam
e ir para a casa. Quando falado com Gabriela, ela disse que era o que mais desejava e que
reconhecia a força da filha e disse que tinha se tornado mais forte. Paralelamente a isso,
pensava em como “proteger a filha”, imaginando colocá-la em um quarto, onde ela não
pudesse ser vista e “ficasse livre do julgamento das pessoas”. Disse ainda que as pessoas não
a entendiam quando ela falava isso, ficavam julgando-a, como se ela não tivesse amor de mãe,
mas ela sabia o que estava vivendo, não era hipócrita, e sabia que uma criança como Viviane
iria chamar a atenção, as pessoas iriam ficar espiando, que nunca poderia passear de carrinho
com a filha. Dizia querer protegê-la desses olhares. Pouco antes de fazer a traqueostomia, com
apenas quatro meses, Viviane aprendeu a respirar pela boca, o que deixou a todos surpresos.
Continuou se alimentando pela sonda gastroenteral, o que não era empecilho à sua alta.
inconformada. Fui ao seu encontro na Enfermaria Pediátrica, num quarto com isolamento, no
qual ainda a filha foi colocada para a proteção da mãe e a mesma me disse que, mesmo
sabendo que tudo isso iria acontecer, não achava que seria agora, que ainda não estava
preparada. Disse que ninguém a entendeu, que ficaram julgando o seu amor pela filha, e que
ela mais que ninguém lutou por ela. Disse que não conseguia dormir no hospital com a filha e
que queria começar a trabalhar. Quando retornei no outro dia, ela já não estava lá. A
enfermagem falou de uma grande discussão que ela teve com os residentes. Uma tia estava
cuidando de Viviane, que com movimentos de corpo e sons pedia colo. Gabriela começou a
Análise
65
Viviane foi sido marcada por diversos discursos médicos que, ao procurar dar conta de
seu estado físico, construíram falas que foram se modificando ao longo dos meses e cujos
impactos na subjetividade materna não podem ser negligenciados. Em torno do quinto mês de
gestação, Viviane foi diagnosticada com uma possível Síndrome de Alpert com sérias mal-
formações externas e internas e que devido a essas, não sobreviveria ao parto. Logo após
nascimento, foi dito que Viviane não sobreviveria ao primeiro mês devido a seqüelas
decorrentes de hidrocefalia grave, que ela não tinha, praticamente, nenhuma atividade
cerebral, apenas poucas funções fisiológicas e motoras, que davam condição de uma vida com
ventilação mecânica. A despeito dessas falas, sobreviveu e por volta dos quatro meses de
vida, decidiu-se que com uma traqueostomia (por não ter formação completa das vias
respiratórias) poderia ter alta e viver em casa. Apesar dos diversos discursos e de apresentar,
meses, passou a respirar espontaneamente pela boca. Dois meses depois, teve alta.
discursos sobre o engajamento materno? Concordo com Lacerda (2004, p. 153) quando diz
falados aos pais, pode produzir importantes efeitos”. É possível então, para Gabriela e
Viviane, levantar a questão de como repercutiu no psiquismo materno, saber, no quinto mês,
que sua filha apresentava mal-formações. Como se deu para essa mãe, ter um estrangeiro em
si, continuar uma gestação em que se via, gestando um ser deformado, cuja imagem remetia a
distância e temor? Sabemos que para a familiarização, fatores de ilusão são necessários para
fazer a ancoragem do filho imaginário sobre o recém-nascido. Poder projetar no bebê, o bebê
que foi, a maternagem que recebeu, são fatores de ilusão desde que os mesmos não gerem
66
profunda angústia (Soulé, 1987, p.154). Em meus contatos iniciais com Gabriela, percebo sua
angústia pela sua busca pelo que Mathelin (1999) vai denominar de causalidade. Segundo a
autora,
Nesse caso, as explicações foram buscadas pelo próprio serviço, pois a ferida narcísica
visitantes por algum tempo. Gabriela, na busca de significação, dizia-me que “não conseguia
parar de pensar”. Volto a evocar aqui, o indizível relativo a uma vivência catastrófica, do
ponto de vista da gestação dessa criança, para a mãe, distante do humano, do familiar
(Mathelin, 1999; Maia, 2004). Laznik, (2004) relata o desarvoramento que se produziu na
vida psíquica de uma mãe a notícia de uma suspeita de uma síndrome. No caso descrito pela
autora, como em Gabriela, a mãe tenta racionalizar, “não parar de pensar”, como uma forma
humanos, daquilo que inscreve o bebê em uma determinada família. Conforme Soulé (1987),
“A alegria de uma mãe que constata que tudo está aí: olhos, nariz, dedos, dedos
dos pés, se acompanham de uma grande perplexidade. (...) A pesquisa dos
traços semelhantes é a maneira de reasseguro dos adultos restabelecendo uma
filiação e ‘inscrevendo’ o recém-nascido numa linhagem” (Soulé, 1987, p.150).
Com Viviane, um bebê com graves más formações, e principalmente facial, essa
conferência ficou comprometida. A fala recorrente das avós era que isso nunca havia
acontecido em nenhuma das famílias (materna e paterna) e dessa forma percebi Viviane como
que inscrita numa atmosfera de estranhamento, numa história que remetia ao absurdo.
67
Como que engolida por um “fluxo de culpa” (Mathelin, 1999), percebo a dificuldade
dessa mãe em se ver narcisicamente nessa criança com mal-formações faciais, sem olhos, sem
nariz, e a qual era investida de profundo desejo de viver. Recorrente, relata as conquistas do
desenvolvimento normal do filho de sua prima (grávida de mesmo tempo que ela e cujo bebê
nasceu a termo e normal). É percebido nessas falas que são pontuais e recorrentes, que esses
relatos se inscrevem num reconhecimento que faria sentido a ela, e do qual ela gostaria de
relatar. Em suas visitas, constantes e freqüentes, Gabriela estava sempre conversando com a
sempre repetindo que era preciso abandonar os amigos, bem como sua recusa mesmo de ouvir
que remetiam à própria história de como fomos aceitos e inscritos em nossa humanidade
(Aragão, 2004).
O espaço psíquico para que uma criança possa se constituir como sujeito subjetivo se
faz dentro de um tempo da gravidez, no qual a representação do bebê vai encontrando lugar
tornando familiar.
Não foi o que ocorreu com Gabriela, pois ao mesmo tempo em que essa mãe
procurava me relatar uma profunda ligação com essa filha, do sentimento de vazio com o seu
narcísico. Ficou durante toda a internação, por exemplo, alternando o agendamento de uma
25
Para a autorização para a pesquisa, sua única pergunta foi se seria colocado alguma foto da filha.
68
visita de sua filha mais velha para conhecer a irmã internada, com cancelamentos e
adiamentos, que se estenderam até a alta. Sempre que falava de seus impedimentos, relatava o
medo do olhar da filha. Que olhar seria esse? O olhar que revela o esgarçamento de sua ferida
narcísica, sua condição narcísica pouco estável. Afinal, segundo Freud (1914, p.41), “era
necessário, para ter um filho, amar o que somos, o que fomos e o que gostaríamos de ser,
assim como aqueles que cuidaram de nós”. Aceitar sua imperfeição, hipoteticamente
projetada nos olhos de sua filha mais velha, lhe era intolerável.
Viviane ficou internada na Unidade muito além de sua necessidade e num determinado
momento, foi transferida para a Enfermaria Pediátrica. Essa mãe que até ali havia investido
nessa filha, autorizado procedimentos que conduziriam à alta, se tornou enfurecida, disse ter
sido traída. A Unidade funcionou claramente como o espaço seguro para essa mãe ser mãe.
Raramente o exercício da maternagem pode se dar exclusivamente na díade mãe filho. Aqui
vemos que essa mãe precisou estar amparada por uma diversidade de terceiros, entre
familiares e serviço. Diversas pessoas foram convocadas para a maternagem dessa criança, e
percebo que essa mãe pôde, pelo menos durante a internação da filha na Unidade, se permitir
ser mãe. Logo após a alta da Unidade, ela se demitiu desse posto, o qual foi na vida de
vezes, a mediar a relação entre serviço e mãe, na busca da confirmação pelo primeiro, do
desejo da mãe de que se continuasse a investir em seu bebê (desejo esse considerado, pela
equipe, intrínseco a qualquer outra relação mãe-bebê). Acompanhei uma divisão na equipe
quanto ao esforço de reanimação nos dias iniciais, e posteriormente, as dúvidas sobre se esse
esforço teria valido a pena. A questão com que se depara a equipe neonatal, em seu confronto
com a morte, nos coloca em contato com a finalidade do cuidado oferecido por uma equipe de
69
reanimação. Viver o risco de que a ambivalência da própria equipe faça com que a mesma se
identifique com a inexorabilidade da morte e deixe de cuidar. Ou que por outro lado, decida
pela vida, quando não há mais vida possível. A delicadeza envolvida em intervenções de
reanimação suscita essas questões, pois o custo de que vida será essa, deve sempre ser
A ambivalência materna era sempre difícil de ser aceita pelo serviço, pois vinha falar
de um desejo de morte que se dirigia na direção oposta a todos os esforços empreendidos pela
equipe, que esperava ainda, que o mesmo desejo ressoasse uníssono na mãe. É extremamente
doloroso quando, segundo Mathelin (1999, p.18), “a mãe vinha falar, de uma história
impossível de ser ouvida pelos reanimadores, já que se trata de suportar nela ouvir a morte
inscrita como a realização de um desejo”. E nesse contexto, mais importante que manter o
vinculo mãe-bebê a qualquer preço, é preciso permitir que essa relação se construa também na
perda, na falta, no luto do bebê imaginário, e que para que o investimento narcísico possa ser
realizado, terceiros, familiares e equipe, se fizeram presentes, mediando a relação mãe e filha.
que a sustentava. Aqui voltamos a pensar na função simbólica da UTIN como o ambiente
continente que a autorizou a ser mãe. Podemos questionar quais foram seus medos quando se
viu sozinha com sua filha, sem a UTIN para mediar sua relação com a filha.
70
1º Encontro: Logo no primeiro encontro essa mãe estava sorridente, de uma forma
muito tranqüila. Estava me esperando porque havia ficado sabendo que fazíamos o Programa
Visita de Irmãos e ela desejava que seu filho de 7 anos conhecesse Henrique. Perguntei como
ela estava e disse-me que tranqüila, dormindo bem e esperando. Disse que o estado dele
estava melhor segundo os médicos. Disse que era difícil, mas tinha muita fé. Conversava com
seu bebê, e seu olhar, luminoso, era dirigido para ele. Acariciava as mãos do seu filho, e
conversava comigo olhando para ele, e com uma voz muito suave, inserindo-o em sua
conversa comigo.
2º Encontro: Foi realizada a visita do irmão. Compareceram além dela e do filho mais
velho, o marido. Os três ficaram juntos e a mãe procurou ajudar o filho a interagir com o
irmão mais novo. Abriu a incubadora para que ele pudesse tocar no bebê. Ficaram todos
juntos por cerca de uma hora. O irmão fala que seu irmãozinho é muito bonito.
feliz, disse ter percebido as mudanças. Falamos sobre a visita, e ela disse que o irmão mais
velho contou para todos os colegas sobre a mesma e que continuava ansioso para que ele vá
embora logo. Conversando sobre sua gravidez já que a diferença de idade entre os irmãos era
relativamente grande, ela disse que eles esperaram, “cada hora por uma coisa”, tal como
arrumar a casa, ter melhor condição e que ela, em janeiro parou de tomar pílula esperando que
nos próximos seis meses engravidasse. Engravidou logo em janeiro, e ele ainda, segundo ela,
não esperou nem o tempo certo e já quis nascer. Segundo ela, sorrindo, “estava com pressa”.
Posteriormente, analisando a ficha clínica foi constatado que pré-eclampsia foi o motivo do
parto pré-termo.
71
4º Encontro: No final de semana que antecedeu a esse encontro foi o dia das mães.
Solange estava bastante sensível e disse que “chorou o dia todo”. Era para ele ainda estar em
sua barriga e não estarem passando por tudo isso. Pela primeira vez vi seus olhos
lacrimejando.
5º Encontro: Henrique estava sem ventilação mecânica e estava perto de ir para a outra
ala da unidade que era destinada aos cuidados intermediários. A mãe estava cuidada, e ao
elogiá-la disse que teve permissão médica para alisar o cabelo desde que não fosse com
formol. Perguntei sobre o leite e ela disse que estava descendo o suficiente para não secar e
que quando ele for pro seu peito que ela tinha certeza que iria descer. Pôde pegar o filho no
colo pela primeira vez naquele dia e disse que chorou muito.
alta para a enfermaria pediátrica. Solange contou-me que seu marido veio visitar o filho
(ultima vinda dele tinha sido no dia que trouxe o irmão para visitar) e pegou-o no colo. Disse
que todos “choraram um bocadinho”, mas que tinha sido um choro bom. Naquele momento
não ia pegá-lo, pois tinha acabado de adormecer. E como à tarde ele ficava “mais
acordadinho”, ela ficava todo o tempo com ele no colo e cuidando dele. Segundo ela, já pôde
fazer algumas trocas de fraldas e estava muito feliz, pois sentia cuidar dele. Relatou que agora
que pode pegá-lo no colo sentia que sua ansiedade passou e que era só esperar um pouco para
ir para casa. Despeço-me dela e quando me viu indo em direção a outra mãe, recém-chegada,
disse que estava bordando toalhas para o bebê dessa mãe. Perguntei se ela bordava e ela disse
que sim, e que no trabalho terminava de cuidar da casa (ela trabalhava como doméstica) e
ficava com o bebê da família bordando o enxoval do filho. Disse que tem coisa que ela não
terminou ainda.
72
Análise
No meu primeiro encontro com essa mãe e seu bebê, a demanda que me foi trazida era
permitir a entrada de seu filho mais velho na Unidade para conhecer o que acaba de nascer.
No ambiente de uma UTIN, para que a família nuclear pudesse se reunir, era preciso a
Unidade. A UTIN se tornaria, para essa família, nesse momento, espaço de uma interdição,
onde outras regras, não as familiares, valeriam nesse espaço em que se estabelecia a luta pela
vida, o confronto com a morte. Nessa interdição, foi possível ver ilustrado uma das funções
simbólicas da UTIN, pois Solange ao apoiar seu desejo na UTIN, pôde por sua vez, sustentar
seu próprio bebê como um ser desejante (Rabello, 2007). Durante o tempo no qual ocorreram
as observações, conversou o tempo todo com seu filho e ainda, o inseriu em nossas conversas,
quando eu me aproximava de ambos. Essa mãe inscreveu seu bebê no mundo da linguagem e
conferiu a ele demandas, atribuindo sentido a seus gestos e expressões faciais, inscreveu-o no
Em nossas conversas, relatou que esse filho só pôde ser concebido “quando tudo
estava no lugar: a casa própria, o trabalho”, mas também quando pôde entender os afetos. E
de “tão no lugar”, de tão permitida, essa gravidez veio no primeiro mês em que parou de usar
contraceptivo. Esse filho inscreveu-se na história familiar como um filho do desejo, sendo que
sua existência o precedeu (como de todos os filhos), começando nesse projeto do casal.
Talvez, por isso, desde o início de sua vida extra-uterina, ele teve lugar. Segundo Szejer e
Stewart (1997, p.55), “do encontro dois desejos, o desejo do homem e o da mulher vai nascer
um projeto”. Projeto esse que marcou essa criança desde sua origem e por toda sua história. É
uma verdade que pertenceu à criança em sua história singular. E para essa criança, desde o
nascimento foi desejado que fosse apresentado à família da qual faz parte, foi desejado a esse
pulmões. No dia da visita familiar apresentava-se como um bebê pequenino, entubado, além
de ter os olhos vendados devido à fototerapia. Nessa visita, o que vimos ao redor da
incubadora foram pais e irmãos que investiram no bebê, dirigiram-lhe palavras que lhe
conferiram o status de pessoa, atribuindo-lhe, citando Szejer e Stewart (1997, p.274) “os
meios para que ele se considere um sujeito por inteiro, autônomo, responsável, livre... para
escolher viver”. E, logo após essa visita, na semana seguinte, pareceu maior, mais forte,
É possível aqui citar Rabello (2004, p.180), quando diz que “todos se lançam na tarefa
de resgate do bebê em risco, inclusive o próprio”. Reafirmo aqui que principalmente o bebê
luta por sua vida física e psíquica. Pois toda sua aparente inércia perante o meio exterior teve
como objetivo primordial uma otimização de seus recursos para a manutenção de seu conforto
físico, conforme Zornig et al. (2004a, p.140), “frente às exigências de processos fisiológicos
As palavras, na linguagem do manhês, que Solange dirigiu a seu filho tiveram uma
vital função simbólica. Ao falar com seu filho, ela o reconheceu como diferente dela, um ser
desejante, de um desejo sobre o qual ela pode estabelecer hipóteses, mas nunca conhecer de
fato, criando assim um espaço entre eles. Segundo Catão (2002, p.133), “o exercício da
função materna está intimamente ligado a uma dupla capacidade da mãe: por um lado
“Quando se vem colocar na posição do filho, a mãe exprime que ele deveria
sentir uma dor; caso contrário ele não a sentiria. Ela toma como sua a hipótese
do que ele teria sofrido em um jogo de identificação, pois no momento em que
se põe na posição de seu filho, ela se divide, visto que ela é nessa posição, ela e
ele” (Bergés e Balbo, 1998, p.23).
74
Só foi possível a Solange estabelecer essa relação dialógica da forma conseguiu com
seu bebê, por ter inscrita em si a função paterna, esse terceiro, simbolizante da sua relação
com Henrique.
A internação foi um processo lento, porém estável, um pouco além do tempo médio
necessário para o amadurecimento pulmonar. Foram cerca de dois meses até que essa mãe
pudesse pegá-lo no colo pela primeira vez e um pouco mais que isso para que o pai o fizesse.
Ela me relatou que houve lágrimas de alegria. Eu entendi que também lágrimas de luto, pois
ao longo desses meses iniciais, fez-se o daquilo que se está despedindo, da valorização de um
filho ideal, do nascimento ideal, para permitir a vinda do filho real. Sua tristeza no dia das
mães por não estar mais grávida tratou-se do luto “por aquele que acaba de nascer”, conforme
dito por Benhaïm (2007, p.14). Entendi ainda que Solange, antes de poder embalar seu filho,
constituindo como eixo psíquico estruturante para seu bebê (Rabello, 2004).
Assim que foi autorizada pela equipe médica, fez alisamento de cabelo, o que atribuí ao seu
cuidado de si como mulher. E citando novamente Benhaïm, (2007, p.18), ao elaborar não
mais a perda simbólica, mas sim a falta estrutural, passa a desejar outros que não seu bebê.
Era saudável que o filho não a preenchesse e que a ele não estivesse direcionado todo o seu
desejo. A esse bebê, confrontando-se com a falta, foi permitido diferenciar-se, tornando-se
Outro aspecto a ser abordado sobre os encontros com Solange é que em nenhum
momento ela relatou que teve início uma pré-eclampsia que colocou a vida de ambos em
risco. Isso foi por mim visto quando da leitura do prontuário do bebê. O discurso que preferiu
26
Olhar aqui entendido como diferente de visão, implica presença, pois “traz consigo a possibilidade de
expressão para além de um campo verbal” (Maia, 2004, pp. 133).
75
circular foi da entrada em trabalho de parto prematuro. Além dos aspectos já abordados com
“É claro que essa ruptura27 terá sentidos diferentes, conforme ocorra próximo
ao termo ou muito antes dele. No primeiro caso, estará muito perto do parto
normal, mas apenas um pouco apressado; no segundo, a criança estará se
colocando em perigo. Será que ela se encontra numa situação de desconforto
muito grande? As trocas com a mãe estão muito difíceis? (...) Podemos supor
que o bebê tem suas razões, há um sentido para que isso ocorra, mesmo que
não seja acessível a nós” (Szejer e Stewart, 1997, p.197).
Quando perguntei a ela sobre essa disfunção que acelerou o nascimento, ela falou
tranquilamente que sim, tinha sido grave, que não havia entrado em trabalho de parto
espontaneamente e que sua pressão arterial se regularizou tão logo o bebê nasceu. O fato de
não ter em momento algum falado do seu estado clínico que deu inicio ao trabalho de parto
poderia estar associado a uma ambivalência com relação à própria UTIN. Essa mãe se
amparou na Unidade para cuidar de seu bebê em situação de risco e, paralelamente, procurou
manter uma parte de sua história inacessível a mim. Agman et al. (1999) apontam para essa
ambivalência ao refletir sobre como as mães com bebês internados em UTI Neonatais nos
percebem.
psicologia nesse lugar da que auxilia a re-elaboração dessa vivência traumática, não
27
Ruptura da bolsa, que provoca o início do trabalho de parto.
76
Ficou ainda uma questão com relação ao período final dessa gestação que não foi
explorada em nossos encontros. Ela estava com seu bebê em pré-alta e preparava o enxoval de
outros bebês internados na Unidade. Podemos pensar nesse fazer como uma reparação, e
experiência do sofrimento que essa realidade causa e na adoção de medidas apropriadas para
bebê e de sua mãe. Esses últimos meses são fundamentais para a futura a ancoragem do bebê
filho, pois “preparar o enxoval fabrica para além da roupa, os braços, as pernas, a imagem do
corpo do bebê na cabeça da mãe. Instalar a cama, preparar seu espaço lhe permite começar a
como indicadores para atribuições que a mãe acerca de seu bebê, dando-lhe materialidade
(Almeida, 2004). Com o impacto vivido pelo parto prematuro, o bebê real, seu filho, estava
ali, não cabendo mais a Solange produzi-lo e produzir-se através de outros meios que não sua
própria relação concreta com ele. O mecanismo reparador da produção de enxoval para outros
bebês internados na UTIN foi extremamente importante para sua própria elaboração de si
Quero também tratar aqui do incômodo por mim vivido, logo no início, quando soube,
nesse último encontro, desse aspecto até então não tinha sido mencionado, isto é, que ela
estava produzindo enxoval para outros bebês e não para o seu próprio. Num primeiro
momento, não consegui ver nisso um mecanismo reparador. Fiquei incomodada com a
frustração de uma minha suposta onipotência insuflada na relação com ela. Encontrá-la
sorrindo, por um lado, vivenciando sua experiência, por outro se esquivando do meu contato,
77
deixou-me com a sensação de estar deixando escapar algo. Podem-se levantar várias questões.
Tais como sobre o tempo de internação de Henrique, um pouco maior que o esperado para um
dispensado ao filho. Entretanto, para que essas questões pudessem ser compreendidas seria
Havia ali um funcionamento da equipe, incluindo a mim, que via nessa mãe, uma mãe
idealizada, não sendo adequando que aparecem aspectos ambivalentes. É difícil para a equipe
a escuta de aspectos que não se enquadram em uma determinada moldura e o risco que se
corre é de não conseguir acolher a ambivalência quando a mesma surge e/ou de não perceber
estava se afastando da incubadora para dar a vez ao marido. No momento em que cheguei
começou a dizer que, “ele (Oliver) só reage ao pai, só abre os olhos e se mexe para o pai, eu
mesma tava lá falando com ele e ele nada”. O pai estava tocando afetivamente, e falando em
uma espécie de manhês com seu filho. A mãe estava visivelmente incomodada com tudo isso.
Quando voltou a ficar próxima do filho e o mesmo abriu ligeiramente os olhos, ela não
percebeu isso como uma busca de contato com ela. Disse, olhando para o bebê, mas falando
comigo, o quanto ele é pequeno. Perguntei se tinha outros filhos e se queria que os mesmos o
visitassem, ela disse que tinha um filho de 13 anos, mas que não queria que ele visse o irmão
daquele jeito. Como não são de Uberaba, perguntei se ela ficaria, disse-me que não e que eles
Marlene no horário de visita familiar. Nesse encontro, ela estava com seu filho no colo.
Quando cheguei estava acabando de passar o bebê para o colo do pai e veio conversar
comigo. Disse-me que Oliver tem “a cara feia do pai”. Disse isso pelo menos mais duas vezes
e depois trocou a expressão para “a cara séria do pai”. Enquanto isso o pai estava envolto com
o filho, conversando, olhando. A mãe virou para mim e falou do quanto o “pai era coruja”.
Inquieta, movimentava-se o tempo todo. Relatou-me que está na casa de apoio e que quando
seu marido não estava na cidade ficava o dia todo no hospital. Todos os dias, Marlene
chegava para a visita da manhã e ia para a sala de ordenha e depois voltava para a visita da
tarde. Quando o marido estava na cidade, ele a levava do hospital para a casa de apoio. Disse
que ele estava lá quase todos os dias. Sobre a ordenha disse que não estava saindo muito leite,
mas o suficiente para não secar, cerca de 50ml a 60ml por ordenha. A mãe relatou ainda,
preocupação com os pontos que ainda não cicatrizaram por não ter guardado resguardo e que
79
tinha medo de isso trazer conseqüências no futuro. Lembrou um ditado, mas não completou:
“Resguardo não guardado...”. Perguntei mais claramente, e ela disse que somente alguns
pontos estavam ainda vermelhos, mas que estava com medo por não estar descansando. Disse
ainda que Oliver não foi planejado, mas não vi nessa fala, nenhum sentimento de posterior
recompensa com o nascimento do filho. Ser mãe para ela foi ter um prognóstico muito ruim, o
que pareceu que ela esperava que se confirmasse futuramente em manifestações físicas,
3º Encontro: Encontrei a mãe no corredor para entrar na UTI Neonatal. Ela passou por
mim e quando estava indo ao seu encontro uma medica da equipe veio me dizer para ampará-
la pois Oliver havia tido uma intercorrência que ninguém esperava. Quando entrei na
Unidade, ela estava perto do filho chorando. Ele estava dormindo, entubado, uma visão muito
diferente do que todos estávamos acostumados. Ela só repetia que “estava esperando a gente
ir embora logo... já estava de pré-alta... ele nunca ficou assim...”. Nesse momento acolhi sua
dor e percebi que ficar do lado dela, era o que podia ser feito naquele momento.
Posteriormente, no mesmo dia, encontrei essa mãe no Banco de Leite. Ela ainda estava
chorosa, tentava sorrir e as lágrimas desciam. Perguntei como ela estava se sentindo agora, ao
que ela falou da tristeza, da vontade de ir embora, e que não esperava que isso fosse ocorrer.
Disse que falou com seu marido e que ele ficou nervoso e deu a entender que ele acha que “ou
ela não está entendendo o que está acontecendo ou a equipe não está falando a verdade”. Que
é o jeito dele e ainda, que ele fica sempre cobrando dela, estar mais por dentro do que estava
acontecendo. Perguntei se ele foi assim também com seu primeiro filho, e ela disse que ele
gosta muito de bebês, que por ter mais jeito que ela, foi sempre ele que pegou o mais velho e,
lá ela ficava mais insegura ainda pra pegar no colo, por que era muito estabanada e o bebê,
muito frágil.
80
Análise
Durante nossas conversas, em que Marlene se queixava, olhando para seu marido, me
ocorriam questionamentos sobre qual o desejo que esse filho veio atender. A seu desejo sim,
mas desejo de que, como esposa, pudesse satisfazer a seu marido, sendo mãe? É o que parece
filho fala de sua própria inadequação como mãe, de não ter embalado nenhum de seus filhos
(muito menos esse, muito frágil) e de uma desconfiança de seu marido quanto à qualidade de
seus cuidados (e que sustenta seu sentimento de inadequação). Essa mãe, talvez se não fosse
por esse homem, não engravidaria novamente, o que é talvez a história de todo nascimento, de
uma forma menos explícita, pois segundo Mathelin (1999, p. 11), “não sabemos que a mãe
não está sozinha com este filho? Ela estava marcada estivesse o pai presente ou não, pelo
desejo que foi seu desejo de mulher por ele, da mesma forma que nela está inscrito o desejo
desse homem?”
Embora o trabalho limite-se ao estudo da díade mãe-filho, o pai não é uma figura
ausente. Esse caso deixa claro que o pai está lá, na relação e embora não seja discutido nesse
trabalho, tem uma função clara de sustentação da mãe, para que a mesma possa exercer a
função maternante para seu filho. Para ela, ser mãe é difícil e remete a sua insegurança, mas
ela assume fazê-lo, e ao longo dos dias, se aloja mais e mais em seu lugar de mãe. A tal ponto
que quando da alta da UTIN, é ela (e não o pai) que estava lá com seu bebê.
“Para que a criança “seja”, parece-nos com efeito que ela deva estar presa em
múltiplas “redes de atenção”. Um certo tipo de comunicação, um modo de
tocá-la, de responder a seu olhar, de endereçar-se a ela, enquanto humano
endereçando-se a outro humano, habitado por seus afetos, pensamentos,
desejos” (Mathelin, 1999, p. 44).
81
Aqui o discurso materno aqui produziu um endereçamento, que inscreveu esse filho na
ordem do humano. Dentre outros momentos, quando essa mãe constrói uma intencionalidade
dos gestos do filho, dizendo que o mesmo os faz (seja olhar, mover a mão ou se espreguiçar)
respondendo ao pai; ou ainda quando diz “que ele é como o pai”. Essa foi sua forma de se
relacionar Oliver, foi a forma como se permitiu-se ser tocada por ele, produzindo, pela
Marlene desde o início inscreveu seu filho num universo de símbolos que marcaria sua
origem e sua história futura. Essa mãe parecia ter uma dificuldade em confiar em si mesma
para ser mãe. Ao longo dos encontros, ela foi ocupando seu lugar e exercendo a função
materna, mas precisou para isso da autorização de seu marido. Foram encontros muito difíceis
para mim, pois vi, claramente, o risco desse pai, ocupar a função materna, tal como uma mãe
má, que roubaria o filho de sua própria mãe, não permitindo a ambos a vivência da
maternagem (Mathelin, 1999). Entendo que isso possa ter acontecido por ser extremamente
difícil conviver com relações de maternagem em que a ambivalência fica evidente. Todo
nascimento vivido ou assistido remete à dolorosa relação de nós mesmos com nossas mães.
Esses mecanismos transferenciais precisam ser percebidos na nossa relação (equipe de saúde)
com os pais. Uma boa mãe pode ter comportamentos não desejados pela equipe, e mesmo
assim, ser uma boa mãe. Essa era uma mãe, que precisava do serviço e do marido para
autorizar-se para ser mãe e foi construindo essa autorização durante o processo de internação
1º Encontro: Tive o primeiro contato com Carla cerca de quinze dias após a internação
de seu filho na UTI Neonatal. Ela estava olhando para a incubadora, de braços cruzados, em
conversar. Ela me falou da pré-eclampsia e de como foi difícil para ela entrar na UTI
Neonatal e que seu marido esteve com o bebê durante os dez dias em que ela não pode fazê-
lo, por ainda estar com hipertensão arterial. Aquele era seu primeiro dia visitando o bebê. Fiz
algumas orientações sobre como ela poderia se aproximar de Marcelo e dos recursos do
mesmo para interagir com ela. A partir disso, ela saiu para lavar as mãos e volta até ele e
começou a tocá-lo, não dizendo nada. Relatou-me que está em uma Casa de Apoio em
Uberaba, sozinha. Pareceu-me ao primeiro olhar, uma pessoa bastante reservada, que não
2º Encontro: Estava junto com seu marido, ambos visitando o filho. Ele pareceu
bastante sorridente e os dois não pareceriam formar um casal e sim dois pais visitando seu
bebê. Ele falava que a filha queria conhecer o irmão, que ela não combinava muito com a
mãe, e que ele se dava melhor com a menina. Para ele, a filha estava nervosa porque a mãe já
havia perdido um filho cinco anos antes em um aborto. Quando esse bebê morreu, a menina
passou por acompanhamento psicológico, até que a psicóloga se afastou do trabalho por estar
grávida. A mãe não havia me falado nada sobre isso. Combinamos a vinda da filha para
visita para o final da semana, desde segunda-feira a filha havia vindo para a cidade e estava
com a mãe na Casa de Apoio. Em um momento ao final da visita, a filha me falou de algo que
me pareceu ser um sentimento de responsabilidade pela morte do irmão. A mãe me falou que
83
a filha nem se aproximava dela durante a gravidez ao que a filha respondeu que ficou muito
4º Encontro: Carla me falou que está dando curso de pintura na Casa de Apoio e que lá
tinha algumas pessoas conhecidas. Relatou que na visita anterior, Marcelo teve apnéia na sua
frente, apnéia essa percebida pela técnica de enfermagem e não por ela. Ela teve que sair
durante mesmo o horário da visita. Perguntei como ela se sentiu e ela disse que, talvez por
estar indo à igreja todo o dia, permaneceu bastante calma e que em outros momentos teria se
desesperado. Disse-me que mudou nesses últimos meses, pois não pensava que conseguiria
relata seu cansaço, pois seu bebê tinha chorado por três dias consecutivos. Relatou que seu
leite que estava jorrando até três dias atrás secou no instante em que seu filho foi para o seu
colo para a primeira mamada (foram dois meses e meio de internação na UTIN). Disse
acreditar que o amamentaria quando estivesse em casa e, naquele momento, o importante era
que o leite se mantivesse mesmo que pouquinho e que ele ganhasse peso tomando o leite no
copinho, tomando NAN, pois com o ganho de peso ele iria para a casa. Achava errado que
Marcelo fosse acordado para tomar a dieta de leite, pois para ela, isso faria com que ele
perdesse energia, pois não repousava, mas ao conversar com a médica, ela disse que “tinha
que acordar sim”. Percebi que havia nessa fala um inconformismo, como se nesse espaço o
saber da mãe sobre o cuidado com o bebê não tivesse valor diante do saber médico. Quanto à
alta da Unidade, disse-me que foi de surpresa. Tinha acabado de chegar a sua cidade para o
fim-de-semana prolongado devido a um feriado e teve que retornar. Disse ao marido e à mãe,
Análise
vivenciar a relação com seu filho. Afinal, ele, nascendo antes do tempo esperado, repetia para
ela uma afirmação de ela gerava filhos imperfeitos. Os abortos deixaram marcas na mãe, as
quais apenas foram possíveis ser mencionadas, quando deslocadas para a filha.
“A vivência traumática não comporta sentido em si. Será a partir dos afetos
desencadeados pelo transbordamento de excitações que o psiquismo buscará
soluções possíveis: aquilo que se configura como dor ganhará “significância”
ou não, mediante um desdobramento do psíquico frente ao impacto traumático.
Este terá seu desfecho definido em uma complexa rede intersubjetiva em que
estarão implicados tanto aspectos intra quanto interpsíquicos” (Maia, 2004, p.
94).
gestações marcadas pela morte, pareceram imprimir nessa mãe um sentimento de impotência
quanto ao impacto de sua ambivalência sobre seus bebês. Entendo que essas marcas ficaram
evidentes nas duas observações feitas da interação entre mãe-bebê, sempre havendo algo de
contido com poucas palavras dirigidas ao filho. Como se, devido aos dois abortos
consecutivos, Carla estivesse em uma condição narcísica fragilizada, e por isso, ela precisasse
muito mais da restituição narcísica que pudesse vir dele, reconhecendo-a, para ela conseguir
No entanto, devido à grande prematuridade desse filho, dificilmente ele poderia vir ao
seu encontro e conforme dito por Mathelin (1999, p.67), esse bebê “havia deixado sua mãe
sozinha diante de sua angústia. Ele faltou ao encontro da reparação”. Ele expunha aos olhos
dessa mãe, sua ferida narcísica, falhando em gerar aquele que apaziguaria sua angústia.
modelam a gestualidade subjetiva” (Maia, 2004, p.132), Carla expressa em seu corpo o
85
intenção de ir ao encontro de seu filho na incubadora. Estava tão inerte quanto parecia estar
Quando lhe contei que esse bebê tinha competências, ou seja, que era capaz de
suportar o encontro com ela, vejo-a se disponibilizando para ir ao encontro dele, que era, de
fato, todo o seu desejo (e temor), investi-lo. Pela mediação da linguagem, construímos ali, eu
que estava posto para ela, até então, o bebê inerte, incapaz, próximo da morte. Ocorreu nessa
mãe, através da linguagem, uma transformação na imagem inconsciente do bebê, que teve
conseqüências sobre a imagem do corpo para ele (Laznik, 2004). E essa competência própria
Para uma mãe que tem consciência de sua ferida narcísica reaberta, os sentimentos
tranqüilidade vivida por saber que a equipe salvava a vida de seu filho, polariza a relação
Afinal, foi essa que devolveu a vida a seu filho, enquanto que ela só pode conceder-lhe uma
vida profundamente frágil, dependente de outros que não ela mesma. Essa ambivalência
apareceu em vários episódios. No momento em que seu bebê teve uma intercorrência
relativamente grave se não percebida como é o caso da apnéia, e essa não foi vista por ela e
sim por um membro da equipe isso pareceu a Carla reforçar seu lugar de incompetência para
reconhecer as necessidades de seu filho. Talvez por isso, ao me relatar o ocorrido, transferiu
para a fé religiosa, a confiança que a sustentou naquele momento e que a fez ir embora da
Unidade, deixando Marcelo aos cuidados da equipe. Esse não reconhecimento da confiança
86
que atribuía à equipe foi uma forma de rivalização com a mesma, porém sem expressá-lo
claramente, pois, não se sentiria má com relação a quem permitia que seu filho sobrevivesse
(Agman et al., 1999). A alta da UTIN pareceu devolver a essa mãe a confiança em sua
produção de vida. E por isso, foi possível a ela deixar transparecer novamente a ambivalência
com relação ao serviço. E para poder se permitir realizar as primeiras trocas verdadeiras com
ele, ainda se ressentia desse espaço, que salvando a vida do filho confirmava, parte de sua
falência, pois segundo Mathelin (1999, p. 18), “ao sair do serviço, essa mãe deverá conviver
com um filho que está vivo graças a outros, que a feriu narcisicamente, um filho que lhe deu o
gosto do fracasso”.
No sentido de poupar mãe e filho, é compreensível que a equipe ocupe o lugar de ser,
para essa mãe, “má”. E pela função simbólica exercida pela equipe, suportando esses
Pediátrica, ficando a sós com seu filho, seria ela a sua cuidadora, ou seja, seria possível voltar
a investir narcisicamente em seu filho, filho gerado por ela e não pela UTIN.
Quando pôde amamentar Marcelo, segundo Carla, seu “o leite secou”. O ato de
amamentar pode ser entendido como o primeiro diálogo entre mãe e bebê, agora lado a lado,
em que a criança desempenha ativamente seu papel, ocupando seu lugar e se fazendo
reconhecer (Szejer & Stewart, 1997). Na UTIN, a alimentação dos bebês pré-termo deixa de
ter esse caráter prazeroso, se caracterizando por uma prescrição. Sendo impossibilitado o ato
bebê28. Através de sonda29, o alimento é então ministrado ao bebê, que deixa de ser parte
28
Mas mesmo sem poder amamentar, à mãe é prescrito que continue ordenhando. Parte do primeiro conjunto de
informações oferecidas à mãe, logo que a mesma pode adentrar a Unidade são instruções sobre como coletar e
armazenar o leite em casa, em recipientes esterilizados fornecidos por um setor específico do hospital.
87
estimulada nesse bebê, também como uma prescrição, através de uma técnica denominada
sucção não nutritiva”30. É, para mãe e bebê, uma promessa da futura recompensa de
amamentar e ser amamentado, após sua alta da Unidade. Para Carla, ainda era muito difícil no
espaço hospitalar se permitir ter tal vivência com seu filho. Medo renovado de que seu bebê
não suportasse todo seu desejo ou dificuldade para viver a mãe cuidadora no ambiente
hospitalar?
Entendo que apesar da ferida narcísica esgarçada durante todo o tempo em que ficou
na UTIN, ela conseguiu, tanto pelo suporte à sua ambivalência promovido pelo serviço quanto
pela sua capacidade de erotização de sua própria vida, ela conseguiu esperar pelo tempo em
que pudesse se reconstituir como mãe que gera vida. Durante seu tempo de espera, como de
uma continuidade da gestação, “de barriga vazia”, ela foi capaz de certo desinvestimento
materno, ou seja, se permitiu investir para além do filho, ensinando outras mulheres, o que
entendo como fundamental para que o bebê não fosse naquele momento o único objeto de
desejo, o que se faria insustentável para o mesmo e para ela (Benhaïm, 2007). Ao fazer uma
rede de relações com quem contar durante sua permanência em Uberaba, através da
religiosidade e do trabalho, e ela pôde transformar sua relação consigo mesma para viver essa
nova maternagem.
29
Sonda naso ou orogástricas é prescritas pela equipe médica para alimentação enteral, sendo que a sonda, um tubo
finíssimo, trasparente, plástico, deve ser tecnicamente introduzido desde as narinas ou pela boca do recém nascido até
o seu estômago.
30
A estimulação da sucção não-nutritiva utiliza diferentes técnicas: o estímulo pode ser feito através de uma chupeta
(em desuso); pode ser realizada colocando um dedo enluvado para o bebê sugar ou ainda pela estimulação da sucção
não-nutritiva utilizando-se a mama vazia, onde a mãe é orientada a esvaziar completamente a mama e oferecê-la ao
bebê.
88
bebê, a ênfase maior foi dada aos aspectos ambientais. O ponto de vista intrapsíquico foi
amplamente abordado durante as análises dos casos. Por isso aqui enfatizei, principalmente, o
que o ambiente, seja ele compreendido como a família e/ou a equipe de saúde da UTIN
Microfatores externos
Conforme apontado por diversos autores (Brum & Schermann, 2004; Valansi &
Morsch, 2004) e corroborado por nós, o acolhimento da equipe de saúde neonatal foi de
fundamental importância para que, conforme percebido nos encontros com Raquel, Gabriela e
função materna. A forma como esse acolhimento se dará dependerá do que demanda a
situação vivida por mãe e filho. Para Raquel, suas necessidades foram expressas
principalmente como um suporte psíquico a ela para que pudesse, por sua vez, proporcionar a
psíquica para a mãe, quanto como função paterna, a qual criando um espaço entre mãe e filha,
pôde conter a ambivalência da mãe em relação à Viviane. Essa é outra função importante da
UTIN, ser continente aos sentimentos de fracasso da mãe, e conseguir ser o elemento de
separação que cria um espaço psíquico entre mãe e bebê. Já para a Carla, a equipe foi o objeto
para o qual ela pôde transferir seus sentimentos de fracasso. Protegendo a mãe, para que essa
equipe de saúde neonatal frustram a aproximação mãe-bebê, o que, embora não tenha sido
explicitado, foi percebido, porém na dor sentida por Raquel quando sua filha estava sendo
Confirma-se esse microfator externo negativo à vinculação que já foi apontado por Agman
Além disso, conforme relatado por Raquel e por Solange, a participação ativa no
seu bebê. Quando ela se vê cuidando de seu filho, sua condição de boa mãe é reconstruída.
Reiteramos os achados de Thomaz et al. (2005), com relação a esse aspecto que depende
equipe de saúde.
Embora não tenha sido explicitamente reportado pelas mães participantes desse
estudo, a possibilidade da mãe ter seu leite utilizado na dieta do filho é considerada um
Muitas mães sentem-se novamente impotentes por não conseguir continuar alimentando-os,
emergência que se instaura, conforme percebido no relato de Raquel, que não se imaginava
sequer suportando essa separação e ainda o próprio resguardo sendo dificultado pelos
tempo acima de seis horas no hospital, muitas vezes, sem que esse tenha um espaço adequado
90
para que essa mãe pudesse descansar. É importante ressaltar que, embora os deslocamentos
al., 2006) apontando que, por outro lado, uma espécie de confinamento da mãe junto do seu
bebê, também podem ser geradores de angústia, pois, impedida de sair do hospital até a alta
carregado de dor de qualquer forma. O acompanhamento, privado de contato com sua família,
de participar do dia-a-dia de outros filhos, do marido, pode ser visto como uma internação da
mãe e também como uma punição por ter dado à luz a um frágil ser. Mas como as autoras
apontam, vivencia-se a ambigüidade também por outro lado, por não conceberem sua própria
Outro aspecto importante que pode funcionar como um microfator ambiental negativo
é a passividade do bebê frente ao cuidado materno (Zornig et al., 2004a). Essa passividade
pode tanto ser fruto da extrema prematuridade do bebê, quanto a tratamentos que levam
sofrimento psíquico, pois essas mães sentiram-se incapazes de recapturar o desejo do filho e,
delas mesmas, para o investimento narcísico, fundante da vinculação mãe-bebê. Aqui está em
jogo uma forma de proto-singularidade do bebê que está diretamente relacionada à capacidade
de sedução desse bebê (Zornig et al., 2004a; Aragão, 2004; Brum & Schermann, 2004),
materno (Zornig et al., 2004a; Aragão, 2004; Brum & Schermann, 2004).
91
Microfatores internos
2004b) são obstáculos a que a mãe possa reconhecer-se como mãe daquele bebê passando a
inscreve na ordem da cultura (Agman et al., 1999). Quando existe uma dificuldade de
identificação, devido a uma condição narcísica fragilizada tal qual a de Marlene, que sentiu
dificuldade de identificar-se com Oliver, o mecanismo de endereçamento por ela utilizado foi
uma forma de inscrição na linhagem familiar, através do pai, com quem seu filho podia
identificar-se.
No relato de Raquel, podemos pensar que a relação da mãe com sua própria infância é
um importante microfator ambivalente interno (Zornig et al., 2004b), pois boa parte da forma
um bebê será investido está relacionado a quanto investimento narcísico essa mãe
experimentou. Uma parte das falas de Gabriela, mãe de Viviane, abordava por uma veemente
necessidade de fazer tudo perfeitamente, de não tolerar em si a falha. Não foi possível a ela
investir em uma filha com mal-formação, pois isso implicaria em aceitar as imperfeições, as
deformidades de si mesma.
Fatores externos
Das mães entrevistadas, Raquel foi a única preparada pela equipe de saúde para a
gravidez de risco. Isso trouxe a ela a possibilidade de iniciar a elaboração do nascimento pré-
termo antes mesmo de sua vivência. Em seus relatos, fala da decisão médica de interrupção da
gravidez, de suas visitas ao berçário, elaborando ainda grávida, a dor da separação que o
nascimento nesse momento traria. Essa antecipação dos sentimentos, bem como a
participação na decisão do parto, se dado o suporte adequado a mãe para sua expressão, pode
ser um importante fator externo positivo. Aqui temos a importância da equipe se preparar no
92
sentido de promover o acolhimento da mãe e sustentação para que a mesma possa subjetivar
Um fator ambiental negativo vivido por essas mães é a premência de lidar com a
possibilidade de perda do bebê (Thomaz et al. 2005; Gomes, 2004) em um momento em que
narcísico se dá numa condição subjetiva em que o cuidado pelo filho é concebido como um
cuidado para que ele não morra. A concretude da possibilidade de perda pode dificultar a
vivência da experiência do cuidado, já que traz toda a angústia da condição humana finita de
todos nós (Costa, 2009). Nesse contexto, cuidar para que não morra parece inútil e é preciso a
construção de um ambiente de continência para que a mãe possa suportar a angústia suscitada
fator que impossibilite a construção da relação entre mãe e filha, como vimos nos encontros
com Gabriela, em que esse aspecto sempre trazido junto a uma possibilidade de morte
acarretou em profunda ambivalência. Uma condição narcísica mais estável seria necessária
para que seja possível, em situação tão não-familiar, se gere sentidos subjetivantes para essa
para investir em sua filha, porém quando ficou a sós com ela tornou-se insustentável a
vinculação a Viviane.
nascimento pré-termo faz emergir, do ponto de vista de fatores e microfatores, pode ser um
A presença de síndromes ou
mal-formações no filho pré-
termo.
4 Uma síntese possível
Nesse trabalho nos propusemos a pensar nos atributos que fazem parte do que
chamamos de função materna em uma situação em que o nascimento pré-termo faz emergir
impressões profundas estão guardados os registros da filha que foi, dos cuidados que recebeu
amor, sua própria mãe. O filho concebido em sua cabeça é o filho que suprirá, idealmente,
essa falta, um filho da imaginação, que trará de volta à mãe sua potência e a cura da sua ferida
narcísica original. Durante a gestação, esses registros primevos e o bebê que está sendo
mãe e do filho.
A linguagem é entendida aqui como muito além das palavras, um conjunto verbal e
não verbal, com função simbolizadora do lugar do bebê no mundo, funda o bebê como
humano. Desde esse bebê antecipado, o mesmo está inserido numa linhagem, numa ordem
temporal, a partir da qual o bebê pode nascer, e onde se fabricam histórias, expectativas e
sonhos para ele. Sem isso, sem essa concepção da cabeça, não há inscrição possível na ordem
do humano, e um vazio de palavras se forma ao redor desse bebê. Um bebê não pensado terá
O olhar e a voz maternas fabricam o bebê como um ser que deseja, mesmo que esse
ainda não saiba o que deseja. Através da maternagem, do jogo de atribuir uma demanda ao
filho, de integrar-lhe suas experiências sensoriais em um universo psíquico, a mãe usa de suas
referências pessoais, sobre si mesma e sobre o que antecipou para seu filho e supõe-se ali um
sujeito desejante. Importantíssimo ressaltar que aquilo que o filho deseja e, também,
desconhece, a mãe jamais conhecerá, ela só poderá supor e responder a ele de forma
95
incompleta, sempre faltante. Esse espaço entre ambos é que permite que o encontro mãe-filho,
quando possível o investimento narcísico, seja atravessado por prazer e espanto. Esses afetos
despertados e que uma mãe revela no discurso que dirige ao filho nos possibilitam pensar na
e uma mãe prematura, do ponto de vista da subjetividade. É uma violência, que traz as marcas
Ao tentar descrever o parto pré-termo, as mães se reportam ao filho que se vai para um lugar
desconhecido, e a quem elas não podem conhecer, ao encontro impedido. Para dar conta do
que ocorre nesse momento, o que se registra e a que se recorre no parto pré-termo são apenas
traços, registros os quais a mãe irá se apegar para reconstituir a história desse nascimento. O
não verbais que constroem uma narrativa, uma simbolização para o acontecimento.
narcísica, ferida essa que emergiria em qualquer nascimento, mas que, no nascimento fora do
tempo, aumenta sua tangibilidade. O filho pré-termo é uma criança que pouco pode seduzir a
pais, o cheiro da mãe e, ainda, a capacidade de se moldar ao corpo de seus pais. Este último é
96
um tipo de reflexo que não é perdido, mesmo no caso de bebês que ficam semanas e até meses
internados, sem irem uma única vez para o colo dos pais. Mesmo sem intervenção clínica,
algumas mães começam a investir naquele filho na incubadora, sentindo que ele as
responderá. Essas mães conseguem então, olhar para o bebê real, tão distante do filho da
O bebê precisa ser o objeto de desejo de alguém para que sua vida seja possível. Não
estamos falando da vida biológica, embora dela também, mas da vida psíquica. O bebê nasce
em um mundo de palavras que vão nomeá-lo, inseri-lo em uma história familiar, ancestral e
próxima. Uma imagem que construí vendo os pais impotentes, parados diante da incubadora,
olhando perplexos para o filho, é como se eles estivessem olhando para um aquário. E se ali
tem um aquário, é necessário então fisgar o bebê. Capturá-lo como o objeto de desejo de
outrem, isso é da função materna. Entretanto, não basta. É ainda necessário que a mãe deseje
para além do filho, e aí vemos a importância de outros investimentos afetivos que venham
despertar o prazer materno. Essa falta fará com que esse bebê não seja engolido pela mãe e
sim, que se abra espaço para que certa não familiaridade surja, para que ele possa então, de
fato, desejar.
terceiro, desse que não deixa mãe e filho serem capturados um pelo outro, sem escapatória.
mãe, tomada de sentimentos que a identificam como a mãe-má, deparar-se com o filho pode
ser assustador. Nesse momento, a UTIN faz o papel do outro que cuida de seu filho,
tranqüilizando ambos que mãe e filho não estão mais apenas um com o outro e a maternagem
mais essa relação, deixando a ambivalência ainda mais evidente. Nesse caso a Unidade se
97
torna um espaço protetor o suficiente para possibilitar a maternagem. Fora das paredes da
Podemos compreender a existência de uma dupla função para a UTIN. Por um lado,
função terceira, por outro, função de sustentação psíquica para a mãe e para o bebê. A UTIN
nesse papel é a mãe boa, todo poderosa, que vence a morte. Torna-se a referência primeira de
cuidado do bebê e por estarmos nesse lugar é que somos capturados por tantos bebês. É desse
lugar ainda que oferecemos à mãe a acolhida aos seus sentimentos, permitindo a expressão de
toda a sua dor, mesmo que para poder fazê-lo, ela tenha que dirigi-la contra a Unidade, contra
Para algumas mães, a UTIN funcionará na função maternante, para outras, como
aquele que nomeia e oscilando entre ambas as funções possibilita que se produzam condições
permitir ocupar essas duas funções e transitar entre elas, de acordo com a demanda
psicológica que se faça, é preciso, citando Mathelin (1999) que a equipe se permita ser
“tocada pela criança”. É preciso que a equipe reconheça sua própria ambivalência, que se
que a mãe, sentindo-se amparada, possa reconhecer seu bebê e fabricarem juntos a relação
entre ambos.
5 Considerações finais
Nenhum trabalho em minha vida foi tão prazeroso e tão doloroso de ser feito. Afinal,
considerado nos trabalhos acerca da constituição subjetiva de mães e bebês pré-termo, quando
pensamos sobre essa problemática a partir de autores que pensaram a gestação a termo. Em
que difere a estruturação da condição subjetivante tanto da mãe quanto do bebê, diante de um
nascimento pré-termo? Esse é um campo ainda a ser constituído com futuras pesquisas, no
sentido de se apreender, principalmente, o que se passa com o bebê pré-termo. Ao longo desse
trabalho foram surgindo perguntas sobre a capacidade de superação dos bebês a esse
nascimento traumático e de que forma esse nascimento se tornaria construtor de seu processo
adaptação dos bebês pré-termo, que não só resistem a procedimentos dolorosos, como
nascidos pré-termo, após a alta hospitalar, pois é a partir daí que o baby blues se instala.
melhor as relações vinculares entre a família nuclear e ampliada e o bebê, tanto do ponto de
pré-termo, o psicólogo na UTIN precisa intervir no sentido de construir junto às mães uma
segurança que seus bebês darão conta do impacto do encontro com elas, pois o serviço pode
garantir um ancoradouro para os intensos sentimentos que a violência desse parto faz emergir.
passa pela construção do vínculo mãe-bebê. Isso tem feito com que a equipe de saúde
neonatal exija dessa mãe sua presença e maternagem. Embora saibamos que facilitar essa
esse mesmo espaço seja continente à ambivalência que surge devido ao sofrimento da
vivência de sua própria prematuridade como mãe, que passa, pela necessidade de elaboração
possível para o psicólogo, abordados nesse trabalho, podemos ainda pensar no suporte aos
pais para que continuem a cuidar da família, não deixando de investir em seus outros filhos. O
psicólogo tem um lugar na equipe, tanto no atendimento a família e ao bebê, quanto na escuta
da equipe e ainda fazendo o papel de mediador da relação entre a equipe e a família. Podemos
pensar que se faz urgente asseguração pelas políticas públicas e gestores de hospitais
privados, desse lócus de trabalho, não mais em modelos emergenciais, atendendo à demanda
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Gomes, A.L.H. (2004). A relação mãe-bebê na situação de prematuridade extrema:
possibilidades de intervenção da equipe multiprofissional. Psicologia Hospitalar. 2 (2).
102
Você está convidada a participar desta pesquisa que pretende avaliar a adaptação de mulheres cujos filhos
recém-nascidos estão internados em uma UTI Neonatal, no momento da internação desse bebê. E ainda, nesse
trabalho, pretendemos avaliar como os aspectos relacionados à suas relações afetivas, sociais, trabalho e suas
funções físicas contribuem para a formação do vínculo mãe-bebê. Caso você aceite participar, serão realizadas
duas a três entrevistas com cerca de uma hora cada e observação do seu comportamento perante seu bebê
internado. Com relação às entrevistas, a primeira terá o objetivo de compreender o seu estado geral e esclarecer
os aspectos da internação do seu bebê, dando início à coleta de informações acerca da adaptação. Caso seja
necessário, você poderá ser acompanhada pela psicóloga-pesquisadora durante a internação do seu bebê na
unidade e, havendo necessidade, será discutido com você o seu encaminhamento para uma psicoterapia.
Sua participação não é obrigatória, ou seja, você decidirá pela sua participação ou não nesse estudo. Se você
concordar em participar, a você é dado o direito de desistir em qualquer momento da pesquisa, sem precisar
apresentar justificativas para essa desistência, retirando seu consentimento a qualquer momento. Essa desistência
não fará com que você seja prejudicada em nenhum atendimento no Hospital Escola da UFTM, tendo a garantia
da continuidade dos cuidados ao seu bebê durante e após a conclusão dos trabalhos de pesquisa. Você poderá
receber a resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a qualquer dúvida acerca dos procedimentos, riscos,
benefícios e quaisquer outras questões relacionadas à pesquisa a que será submetida, ainda que esta possa afetar
sua vontade de continuar participando deste estudo. Você não será identificada em momento algum e será
mantido o caráter confidencial da informação relacionada com sua privacidade. Se você concordar, as entrevistas
poderão ser registradas em um gravador. Não haverá nenhum gasto e nenhum ganho financeiro decorrente da
pesquisa. As entrevistas ocorrerão em seus dias de visita ao Hospital e de acordo com sua disponibilidade.
Os resultados desta pesquisa poderão fornecer condições de entender melhor o processo da adaptação das mães
de bebês pré-termo internados em UTI Neonatal e serão publicados e divulgados em eventos científicos.
Eu, ___________________________________________________________________,
R.G. ___________________, abaixo assinado, tendo sido convidada para participar desta pesquisa e recebido as
informações acima, ciente dos meus direitos, concordo em participar deste estudo.
Tenho ciência do exposto acima e aceito participar desta pesquisa como forma de contribuir com o responsável
que subscreve este documento.
____________________________________ ___________________________________
Participante Pesquisadora Responsável
Julliana de Paula Medeiros
Universidade Federal de Uberlândia
e-mail: julliana.pp.m@hotmail.com
CEP/UFU: Av. João Naves de Ávila, nº 2121, bloco J, Campus Santa Mônica – Uberlândia –MG, CEP: 38408-
100; Telefone: 34-32394531.
106
Da Participante da Pesquisa
NOME:.....................................................................................................................................................
IDADE:..........................................
DOCUMENTO DE IDENTIDADE Nº:......................................................................
REGISTRO GERAL MÃE:.........................................................................................
REGISTRO GERAL BEBÊ:........................................................................................
ESTADO CIVIL:
SOLTEIRA ( ) CASADA ( ) AMASIADA ( )
DIVORCIADA/SEPARADA ( ) VIÚVA ( )
NIVEL DE INSTRUÇÃO:
( ) FUNDAMENTAL INCOMPLETO ( ) FUNDAMENTAL COMPLETO
( ) MÉDIO INCOMPLETO ( ) MÉDIO COMPLETO
( ) SUPERIOR INCOMPLETO ( ) SUPERIOR COMPLETO
( ) PÓS-GRADUAÇÃO
OBSERVAÇÕES
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31
Os dados de identificação tanto da participante quanto do bebê ficarão arquivados com a pesquisadora e serão
protegidos por sigilo e confidencialidade.
107
Do recém-nascido
NOME DO BEBÊ:................................................................................................................
REGISTRO GERAL:............................................................................................................
SEXO: ( ) M ( ) F
DATA NASCIMENTO:......../......../...... PESO AO NASCER:...............
IDADE GESTACIONAL:...................................................
MOTIVO DA INTERNAÇÃO:.......................................................
OBSERVAÇÕES
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7.3 Anexo III. Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos
ANÁLISE FINAL Nº. 001/09 DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA PARA O PROTOCOLO REGISTRO
CEP/UFU 378/08
Projeto Pesquisa: Eficácia adaptativa de mães de bebês pré-termo internados em uma UTI Neonatal e sua
influência na construção do vínculo mãe-bebê.
Pesquisador Responsável: Juliana de Paula Medeiros
De acordo com as atribuições definidas na Resolução CNS 196/96, o CEP manifesta-se pela aprovação do
projeto de pesquisa proposto.
O protocolo não apresenta problemas de ética nas condutas de pesquisa com seres humanos, nos limites da
redação e da metodologia apresentadas.
7.4 Anexo VI. Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos sobre
De acordo com as atribuições definidas na Resolução CNS 196/96, o CEP manifesta-se pela
aprovação do adendo proposto.
A co-orientação do Prof. Dr. João Luiz Leitão Paravidini, a mudança do título do projeto e dos
objetivos não apresentam problemas de ética nas condutas de pesquisa com seres humanos, nos
limites da redação e da metodologia apresentadas.
• O sujeito da pesquisa tem a liberdade de recusar-se a participar ou de retirar seu consentimento em qualquer
fase da pesquisa, sem penalização alguma e sem prejuízo ao seu cuidado (Res. CNS 196/96 - Item IV.1.f) e
deve receber uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, na íntegra, por ele assinado (Item
IV.2.d).
• O pesquisador deve desenvolver a pesquisa conforme delineada no protocolo aprovado e descontinuar o
estudo somente após análise das razões da descontinuidade pelo CEP que o aprovou (Res. CNS Item III.3.z),
aguardando seu parecer, exceto quando perceber risco ou dano não previsto ao sujeito participante ou quando
constatar a superioridade de regime oferecido a um dos grupos da pesquisa (Item V.3) que requeiram ação
imediata.
• O CEP deve ser informado de todos os efeitos adversos ou fatos relevantes que alterem o curso normal do
estudo (Res. CNS Item V.4). É papel de o pesquisador assegurar medidas imediatas adequadas frente a evento
adverso grave ocorrido (mesmo que tenha sido em outro centro) e enviar notificação ao CEP e à Agência
Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA – junto com seu posicionamento.
• Eventuais modificações ou emendas ao protocolo devem ser apresentadas ao CEP de forma clara e sucinta,
identificando a parte do protocolo a ser modificada e suas justificativas. Em caso de projetos do Grupo I ou II
apresentados anteriormente à ANVISA, o pesquisador ou patrocinador deve enviá-las também à mesma, junto
com o parecer aprobatório do CEP, para serem juntadas ao protocolo inicial (Res. 251/97, item III.2.e). O prazo
para entrega de relatório é de 120 dias após o término da execução prevista.