Inserção Do Conteúdo Fitoterapia em Cursos Da Área de Saúde
Inserção Do Conteúdo Fitoterapia em Cursos Da Área de Saúde
Inserção Do Conteúdo Fitoterapia em Cursos Da Área de Saúde
de Saúde
Inclusion of Phytotherapy Content in Health Training
Courses
Maria Helena Alves FeitosaI
Letícia Lopes SoaresI
Guilherme Almeida BorgesI
Marina Magalhães AndradeI
Simone de Melo CostaI
RESUMO
PALAVRAS-CHAVE Este trabalho verificou a opinião de acadêmicos da Saúde sobre a inserção do conteúdo fitoterapia nos
–– Estudantes; cursos de graduação. Trata-se de estudo transversal e analítico, realizado com aplicação de questio-
nário a alunos de Enfermagem, Medicina e Odontologia em 2011. Participaram 248 acadêmicos, a
–– Saúde;
maioria do sexo feminino (69,8%), com idade entre 17 e45 anos. Os estudantes (70,8%) mostraram
–– Plantas Medicinais; interesse pela inclusão da fitoterapia, sem diferença entre os sexos (p= 0,757), sendo 83,1% da En-
–– Fitoterapia; fermagem, 68,2% da Medicina e 63,0% da Odontologia (p=0,019). Entre as motivações destacam-se:
–– Educação Médica. ampliação do conhecimento (35,7%) e constatação da evidência científica (16,5%). O desconheci-
mento da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares foi de 84,7% na Enfermagem,
84,6% na Medicina e 74,7% na Odontologia (p=0,166), sem diferença significativa entre os sexos (p=
0,333). Conclui-se que os estudantes são favoráveis à inserção do conteúdo fitoterápico no currículo,
embora desconheçam a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, regulamentada
para o sistema de saúde brasileiro.
ABSTRACT
KEYWORDS This study examined the views of health academics about the inclusion of herbal medicine content in
–– Students; undergraduate courses. It is cross-sectional analytical study, with a questionnaire applied tonursing,
medical and dentistry students in 2011. The study involved248 students, mostly women (69.8%),
–– Health;
aged 17-45 years. The students (70.8%) showedinterest in the inclusion of herbal medicine, with
–– Medicinal Plants; no difference between genders (p = 0.757) and 83.1% of nursing, 68.2% and 63.0% of medical and
–– Phytotherapy; dentistry students (p = 0.019), respectively. The reasons given for this include: expansion of know-
–– Medical Education. ledge (35.7%) and finding scientific evidence (16.5%). 84.7% of the nursing students, 84.6% ofthe
medical students and 74.7% of the dentistry students (p = 0.166) did not know about the National
Policy on Integrative and Complementary Practices, with no significant difference between genders
(p = 0.333). In conclusion, students favor the inclusion of herbal medicine content in the curriculum,
despite being unaware of the National Policy on Integrative and Complementary Practices, regulated
forthe Brazilian health system.
RESULTADOS
Foram entrevistados 248 acadêmicos, sendo 36,7% do curso
de Medicina. Entre os acadêmicos, 54,4% eram iniciantes, ou
seja, estavam no primeiro ano do curso. A maioria era do sexo
feminino, com idade entre 17 e 45 anos, e média de 22,2 anos.
Quanto à religião, predominou a católica, em seguida a evan-
p=0,019
gélica, e poucos alunos relataram pertencer a outras religiões.
A maioria dos estudantes é natural da cidade de Montes Cla-
ros (62,5%)(Tabela 1).
Quanto à inserção do conteúdo de plantas medicinais e Entre os anos de graduação, o interesse pelo conteúdo de
fitoterapia na graduação, 70,8% dos estudantes se mostraram plantas medicinais e fitoterapia foi maior entre os acadêmi-
favoráveis, sem diferença estatística significativa entre os se- cos concluintes (82,0%) em relação aos iniciantes (61,2%), com
xos, 71,4% das mulheres e 69,4% dos homens (p=0,757). Quan- diferença significativa, p<0,001. A religião não se associou ao
to aos cursos, verificou-se que na Enfermagem o percentual de interesse pela inserção desse conteúdo na graduação, haven-
alunos interessados foi maior, correspondendo a 83,1%, quan- do entre os evangélicos manifestação de interesse de 74,4%
dos estudantes,de 71,6% dos católicos e de58,8% das outras micos iniciantes, na graduação, a maioria (85,0%) desconhece
religiões. A naturalidade também não foi associada ao interes- a PNPIC, sem diferença estatística quando comparados aos
se pelo conteúdo na graduação, relatado por 70,4% dos que concluintes (77,0%) (p= 0,110) (Gráfico 3).
nasceram em Montes Claros e por 71,6% para os nascidos em
outras localidades.
G r á f ico 3
Para analisar os motivos de interesse dos alunos sobre a
Distribuição dos estudantes, iniciantes e concluintes
INTRODUÇÃO do conteúdo plantas medicinais e fitoterapia
conforme o desconhecimento da Política Nacional de
como disciplina nos cursos de graduação, as respostas foram
Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC)
agrupadas em categorias: ampliar o conhecimento (35,67%),
conhecer a evidência científica acerca das plantas medicinais
(16,56%), eficácia no tratamento e cura (11,46%), acesso fácil e
econômico (7,00%) e outros (29,29%). Na categoria outros, os
acadêmicos relataram justificativas tais como toxicidade, inte-
resse profissional, medicina alternativa, ser muito utilizada e
também não ser a inserção importante.
Quando perguntados sobre a Política Nacional de Práti-
cas Integrativas e Complementares (PNPIC), a grande maioria
(81,3%) dos estudantes afirmou não conhecer o assunto, ou seja,
apenas 18,7% a conhecem. A frequência do desconhecimento da
PNPIC atingiu84,7% dos estudantes na Enfermagem, 84,6%na
Medicina e 74,7% na Odontologia (p=0,166) (Gráfico 2).
G r á f ico 2
DISCUSSÃO
Distribuição dos estudantes conforme o conhecimento
A maioria dos participantes é do sexo feminino. A entrada das
da Política Nacional de Práticas Integrativas e
mulheres nas universidades brasileiras, na década de 1970,
Complementares (PNPIC) entre os cursos da Saúde
representou um marco das mudanças na sociedade, que con-
siderava as instituições de ensino superior um espaço mas-
culino12. A superação do contingente feminino no curso de
Odontologia da Unimontes foi constatada desde a implan-
tação desse curso, na década de 199013. A predominância da
religião católica indica um aspecto cultural, característico da
região, pois a cidade de Montes Claros se desenvolveu sobre
uma matriz social eminentemente católica. Sua população re-
sidente é composta por 68%de católicos14.
Quanto ao interesse dos estudantes em incluir o conteúdo
p=0,166
fitoterapia em seus cursos de graduação, um grande percentu-
al manifestou-se favorável, apesar de não conhecer a eficácia e
as indicações dessas práticas alternativas. Esses resultados en-
Em relação ao conhecimento da PNPIC conforme a na- fatizam a importância da inserção do conteúdo na graduação,
turalidade, constatou-se que 81,3% dos nascidos em Montes pois se considera que os profissionais de saúde com embasa-
Claros afirmaram desconhecer a prática, sem diferença signi- mento científico se tornarão aptos e preparados para lidar com
ficativa para os procedentes de outros municípios (81,3%) (p o uso e avaliar os teores dos princípios ativos, possibilitando
=0,996). A religião também não se associou ao fato de conhe- a aplicação da medicina alternativa na assistência em saúde.
cer ou não a política: entre os católicos, o desconhecimento foi Nesse contexto, pode-se afirmar que os conhecimentos
de 80,3%, entre os evangélicos, 79,1%, e entre outras religiões, científicos e familiares levam ao processo dinâmico de estímu-
88,9%. Entre os sexos, o desconhecimento foi de 79,7% no fe- lo ao pensamento crítico e consciente, gerando mudanças na
minino e de 84,9% no masculino (p=0,333). E entre os acadê- vida dos indivíduos. Esse encontro facilita o desenvolvimento
da autonomia do sujeito e abre possibilidade para a liberdade, Um trabalho conduzido com professores sobre a inserção
permitindo realizar escolhas de modo consciente15. da Medicina Tradicional Chinesa (acupuntura) na graduação
Na avaliação entre cursos, houve associação entre o inte- dos cursos da Saúde observou que a maioria reconhece a im-
resse da inserção e os cursos de graduação, com maior aceita- portância dessa temática para o exercício da docência, contudo
ção no curso de Enfermagem. Destaca-se a importância de os negligencia sua abordagem enquanto profissional médico e
profissionais de saúde, independentemente da formação pro- professor, demonstrando dificuldades para articular o objeto
fissional, exercerem um papel fundamental no cuidado com o das aulas com outra visão mais ampliada sobre o corpo e o ado-
paciente, na recuperação e na promoção da saúde. ecer. Os professores demonstram interesse na inserção das prá-
Em estudo com alunos de Enfermagem, foi observado ticas não convencionais nos currículos dos cursos de Medicina,
que algumas terapias alternativas já estão sendo inseridas no diluída em alguma disciplina ou como disciplina optativa19.
curso, seja de forma optativa ou obrigatória, e que o interesse Um trabalho de revisão sobre medicinas alternativas e
por tais terapias vem crescendo nos últimos anos. Verificou-se complementares no ensino médico observou que o aumento
também que a fitoterapia foi uma das técnicas mais utilizadas, da utilização dessas práticas requer que os profissionais de
e o principal motivo para o uso foi a crença dos estudantes Saúde estejam aptos a informar e atender seus pacientes, reco-
na sua eficácia16. Outro estudo demonstrou a aceitação de aca- nhecer efeitos colaterais e interações medicamentosas, e prati-
dêmicos de Medicina do tema práticas não convencionais em car com segurança as medicinas complementares, isoladas ou
saúde. Mais da metade dos entrevistados indicaria ou apoiaria associadas às práticas convencionais.
o uso de práticas alternativas para seus pacientes, evidencian- Há diferentes formas de inserção dessas técnicas no ensino,
do a necessidade de inclusão de disciplinas curriculares que e o ensino dessas técnicas tem como fundamento adicionar à
abordem essas práticas na graduação17. prática médica ferramentas diagnósticas e terapêuticas para a
Na atual pesquisa, entre os motivos de inserção do conte- atenção, prevenção e promoção nos diversos níveis de comple-
údo fitoterápico na graduação, a ampliação do conhecimento xidade do sistema de saúde. Destacam-se os seguintes tipos de
foi o mais citado pelos acadêmicos. Neste sentido, os estudan- inserção: incluir tópicos ao longo de todo o currículo, além de
tes pesquisados reconhecem a importância das plantas medi- desenvolvê-los nas residências médicas e educação continuada.
cinais e aceitam se aprimorar nessa área de conhecimento para A inserção deve utilizar recursos locais e respeitar os costumes,
uma atuação segura como futuros profissionais. Brandão et leis, valores e símbolos culturais do ensino-aprendizagem con-
al.18, em estudo com alunos dos cursos de Farmácia e Biologia, tinuada20. Ainda quanto à inserção do conteúdo plantas medi-
observaram que o motivo de interesse por plantas medicinais cinais, considera-se que a fitoterapia é uma especialidade ofe-
e fitoterapia mais citado foi o interesse profissional, ficando recida no sistema de saúde de nosso país, fato suficiente para
em segundo lugar a aquisição de conhecimento. incluir tal disciplina no currículo acadêmico, sem esquecer que
O ambiente acadêmico é o local apropriado para novas ela também está inserida nas políticas do Ministério da Saúde.
discussões. O conhecimento didático da fitoterapia favorece o A grande maioria dos estudantes desta pesquisa afirmou
encontro de futuros profissionais com o que há de novo e os não conhecer a Política Nacional de Práticas Integrativas e
condiciona a formar opiniões e a filtrar informações adquiri- Complementares (PNPIC), implantada no SUS em 2006. Em-
das em meio leigo. Existe também um interesse crescente da bora esse desconhecimento apresente um percentual maior
população por tais tratamentos. entre os acadêmicos iniciantes comparado aos dos concluin-
Em 2002, a Organização Mundial da Saúde registrou um tes da graduação, a diferença não foi significativa. Acredita-
aumento do uso dessas práticas, principalmente em países -se que os resultados sejam decorrentes da falta de discussão
desenvolvidos, e vem incentivando seu emprego com base sobre o tema na universidade, tanto no início como no final
em evidências de segurança e qualidade7.Essa inclusão irá dos cursos.
colaborar para auxiliar o aluno a explorar as potencialidades A PNPIC recomenda a implementação de ações e serviços
das terapias ainda consideradas não usuais, mas que estão ga- no SUS com o objetivo de garantir a prevenção de agravos, a
nhando espaço entre os indivíduos. A capacitação profissional promoção e a recuperação da saúde4. O impacto da publicação
sobre plantas medicinais pode contribuir para a garantia do dessa política alcança os campos econômico, técnico e socio-
direito de escolha dos usuários ao tratamento fitoterápico, res- político, pois tira da sombra e promove a inclusão de práticas
guardando, assim, o princípio da autonomia e se contrapondo de cuidado subsumidas no discurso e na ação dominadora do
ao paternalismo profissional, que adota medicamentos alopá- complexo mercado de produtos e serviços da racionalidade
ticos como único recurso terapêutico. biomédica21.
O Ministério da Saúde vem investindo no uso da fitotera- 3. Batista LM, Valença AMG. A fitoterapia no âmbito da
pia como complemento para o SUS, mas, para que isso ocorra atenção básica do SUS: realidade e perspectivas. Pesq Bras
de forma correta e segura, é necessário formar profissionais Odontoped Clin Integr 2012;12(2):293-6.
capacitados e que compreendam a química, toxicologia e far- 4. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 971. Aprova a Polí-
macologia das plantas, sem desconsiderar o conhecimento tica Nacional de Práticas Integrativas e Complementares
popular. Programas de fitoterapia já foram implantados em (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2006.
diversas regiões brasileiras. Isto se deve à busca das Secreta- Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publica-
rias Municipais de Saúde em facilitar o acesso da população coes/pnpic.pdf
aos fitoterápicos, visando ao uso correto dos mesmos8. A PN- 5. Carvalho ACB, Perfeito JPS, Silva LVC, Ramalho LS, Mar-
PIC contempla a biodiversidade brasileira, aliada ao compro- ques RFO, Silveira D. Regulation of herbal medicines in Bra-
misso de seguir ou propor legislações específicas para o setor. zil: advances and perspectives. Brazilian Journal of Pharma-
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mentação4. Neste sentido, existe uma preocupação governa- -82502011000300004&lng=en. Acesso em: 22 maio 2014.
mental em colocar novas técnicas alternativas à disposição dos 6. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n°886 de 20/05/2010.
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dos tratamentos. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudele-
Quanto às limitações do atual estudo, por se tratarde uma gis/gm/2010/prt0886_20_04_2010.html
amostra de conveniência, estudantes iniciantes e concluintes 7. Organização Mundial da Saúde. Estratégia de la OMS so-
da graduação em Saúde, há possibilidade de haver menor va- bre medicina tradicional 2002-2005. Disponível em:http://
riabilidade quando comparada a toda a população de acadê- whqlibdoc.who.int/hq/2002/WHO_EDM_TRM_2002.1_
micos, limitando os resultados, com associações decorrentes spa.pdf
do viés de seleção. Tratando-se de estudo transversal, não se 8. Santos RL, Guimarães GP, Nobre MSC, Portela AS. Análi-
permite estudar a causalidade das associações. Consideram-se se sobre a fitoterapia como prática integrativa no Sistema
também possíveis vieses de informação, inerentes ao levanta- Único de Saude. Rev Bras Plantas Med 2011;13(4):486-91.
mento de dados tendo por base um questionário. 9. Born MC, Ceolin S, Badke MR, Vargas NSC, Ribei-
ro MZ, Ceolin T, Heck RM. Saberesdo Corpo e da
CONCLUSÃO Natureza:Despertando talento nos escolares sobre o uso de
Conclui-se que os estudantes são favoráveis à inserção do conte- plantasmedicinais. Rev Lat Am Enfermagem 2011;14(3):1-
údo fitoterápico no currículo da graduação, embora desconhe- 4. Disponível em: http://formularios.extension.edu.uy/
çam a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementa- ExtensoExpositor2013/archivos/877_resumen1099.pdf .
res regulamentada para o contexto do sistema de saúde brasilei- 10. Brasil. Ministério da Saúde. Resolução nº 466/12. So-
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