Aula 2
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Morgenstern, Flávio
ISBN:
CDD 400
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SINOPSE
Neste e-book, segundo dentre quatro do curso “Mito, Linguagem e Mídia”, com
Flávio Morgenstern, continuamos nossa jornada para compreender como ocorreu o
surgimento da linguística e de que forma esta se opõe à filosofia. Também exploramos
as diferentes funções que as palavras podem apresentar e a forma como essas
funções são utilizadas nos discursos atualmente.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Ao final desse e-book, pretende-se que você saiba como a linguística surgiu;
quais os desafios impostos pela linguística moderna; quais as funções das palavras;
RÁPIDOS ESCLARECIMENTOS
No e-book anterior, identificamos problemas que ocorreram durante o
desenvolvimento da filosofia e como estes implicaram em empecilhos para a
linguagem em si e para as línguas. Também mencionamos brevemente dificuldades
postas à linguística moderna.
Antes de prosseguirmos para o conteúdo deste e-book, é preciso esclarecer
que filósofos que trabalham com linguagem não são, necessariamente, filósofos da
linguagem. Sócrates, por exemplo, não era um filósofo da linguagem, ainda que tenha
diuturnamente lidado com esta.
O SURGIMENTO DA LINGUÍSTICA
Uma parcela considerável dos filósofos do século 19 pensou acerca das
questões envolvendo a linguagem e a língua. Em sua maioria, eram tradutores, e
muitos pertenciam ao romantismo alemão que, apesar de seu teor nacionalista,
traduziu obras das línguas mais diversas como sânscrito, grego e até mesmo o persa
antigo.
A evolução tardia desse movimento está presente em Schopenhauer. Ainda
que crítico aos expoentes do nacionalismo alemão, em seus escritos, esse pensador
destacou a importância do poliglotismo para o desenvolvimento intelectual. Em sua
perspectiva, o aprendizado de uma nova língua não significava apenas aprender
novas palavras, mas igualmente introjetar novos conceitos, novas estruturas de
pensamento. Em outros termos, aprender uma nova língua era equivalente a
aprender uma nova forma de pensar. Para evidenciar ainda mais a relevância de ser
poliglota, Schopenhauer também chamava atenção para o fato de que somente é
possível pensar sobre certos objetos em línguas específicas. O sânscrito é um
exemplo disto, pois apresenta seis palavras distintas, as quais não são traduzíveis,
para denominar diferentes tipos de respiração.
Como estavam traduzindo muitas obras, esses filósofos pensavam acerca dos
desafios impostos por essa atividade. Não à toa, a linguística surgiu precisamente
nesta época.
Embora tenha sido desenvolvida em diversas culturas diferentes, a Bíblia é
outro exemplo. Em suas três primeiras palavras - “bereshit bará elohim” -, o livro
apresenta obstáculos para ser transposto para outra língua.
O primeiro problema é o fato de bará estar no singular enquanto Elohim está
no plural. É como se estivesse escrito: Deuses criou. Aparentemente, há um erro de
concordância. Isso acontece porque, assim como, no português, utilizamos a segunda
pessoa do plural (vós) para demonstrar autoridade, em outras línguas, é a terceira
pessoa do plural que exerce essa função. Deste modo, é possível que o plural esteja
presente a fim de cumprir essa finalidade. Contudo, há discussões para entender por
que o verbo bará está escrito no singular.
Outro ponto. A palavra Bereshit foi traduzida como “no princípio”. Esse b
equivale a nossa preposição em, indicando “em um lugar”. Reshit, por sua vez, foi
traduzido como princípio. No entanto, no hebraico, somente as consoantes constam
na grafia, sendo as vogais excluídas da escrita. Por isso, reshit está escrito rsht. Rsht
foi traduzido como princípio porque realmente indica primeira coisa, aquela coisa que
dá origem a algo. Só que, como somente as consoantes estão marcadas, é possível
ler a palavra com a inclusão de vogais distintas, o que resultaria no significado cabeça.
Ou seja, “no princípio criou Deus” não está necessariamente fazendo referência à
criação física do mundo. Nesse sentido, muitos, por desconhecerem o hebraico,
apontam uma contradição no início da Bíblia, como se Deus houvesse criado o mundo
duas vezes. Como seria possível saber isso lendo ou a vulgata ou a versão do Lutero?
Para identificar tais complexidades, foi preciso conhecer o hebraico.
É precisamente este o caldo cultural que vai propiciar o surgimento da
linguística moderna.
O PAPEL DO ROMANTISMO ALEMÃO
No final do século 18, início do século 19, o romantismo alemão inteiro estava
focado na busca de traduções e tradições, tanto alemãs quanto de outras
nacionalidades. Ao realizarem traduções do persa, do sânscrito, do grego, os
expoentes desse movimento expuseram a existência de várias culturas. A
propagação da ideia de que não existia somente o cristianismo no mundo, engendrou
o enfraquecimento da visão cristã. Consequentemente, no romantismo, tem início o
ateísmo e há um reavivar do paganismo.
Alguns desses nacionalistas identificaram nas tradições orais, compiladas
sobretudo pelos Irmãos Green, a grande tradição germânica, que desde o Império
Romano havia levado a alcunha de bárbara. Por se reconhecerem como os
germanos, os bárbaros, os godos, visigodos, ostrogodos, buscaram reviver as
culturas desses povos.
Eles apresentavam um conhecimento gramatical muito aprofundado e
começaram a estudar muitas línguas e traduções. O resultado é esse caldo cultural
que vai ser chamado de linguística. Esses estudiosos perceberam que a língua
variava com o passar do tempo e que apresentava suas próprias histórias. Prova
disso era que os alemães que participavam do romantismo tinham extrema
dificuldade em compreender os cânticos de amor medievais escritos em alemão,
sendo que, supostamente, tratava-se do desenvolvimento da mesma língua. Por isso,
nesse primeiro momento, a linguística estava centrada no estudo histórico da língua.