Analise de ObrAs LiterariAs
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Analise de ObrAs LiterariAs
libertinagem
mAnuel cArneiro de
sousA bAndeirA filho
3. o Autor................................................................................................. 12
4. A obrA .................................................................................................... 15
5. exercícios .......................................................................................... 36
Aol-11
libertinagem
mAnuel cArneiro de
sousA bAndeirA filho
libertinagem
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libertinagem
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
11
manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
3. O aUTOR
MaNUEl BaNdEiRa
o autoretrato é de 1948. ele nos apresenta de forma direta alguns dos prin-
cipais traços do autor: ironia desencantada, sentimento de frustração e tísico
proissional. Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho nasceu no Recife, em
Pernambuco, e passou a infância na casa de seu avô Costa Ribeiro, que icava na
rua da união. As experiências vivenciadas nesse período marcaram para sempre
a sensibilidade do poeta.
Aos dez anos de idade, foi com a família para o rio de Janeiro, onde fez
os estudos secundários, permanecendo até os dezessete anos. Aos dezoito anos,
seguiu para são paulo, com o intuito de cursar Arquitetura na escola politécnica
de são paulo, curso que precisou abandonar ao término do primeiro ano, pois
havia contraído tuberculose.
naquela época, por volta de 1904, o diagnóstico de tuberculose anunciava
uma morte próxima.
À procura de um clima adequado ao seu estado de saúde, esteve em vá-
rios lugares, inclusive num sanatório na suíça, onde entrou em contato com o
jovem poeta paul éluard, que viria a ser um dos principais representantes do
surrealismo francês.
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libertinagem
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
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libertinagem
4. a OBRa
Aol-11
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
pORqUiNHO-da-íNdia
Quando eu tinha seis anos
ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
pROfUNdaMENTE
(A temática da família, dos amigos, da infância e da morte estão presentes
no poema.)
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libertinagem
– Estão dormindo
Estão deitados
Dormindo
Profundamente.
o poema possui 38 versos livres, divididos em cinco estrofes, e pode ser divi-
dido em dois momentos: o passado e o presente. As três primeiras estrofes referem-
Aol-11
EvOCaçãO dO RECifE
(A temática da família, recife, dos amigos, da infância e da morte estão
presentes no poema.)
recife
Não a Veneza americana 1
Não a Mauritssatd 2 dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates 3
nem mesmo o recife que aprendi a amar depois –
Recife das revoluções libertárias 4
mas o recife sem história nem literatura
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libertinagem
Coelho sai!
Não sai!
De repente
nos longes da noite
um sino 8
Rua da União...
Como eram lindos os nomes das ruas de minha infância
rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame do Dr. Fulano de Tal)
Atrás da casa icava a Rua da Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da rua da aurora...
Aol-11
Capiberibe
– Capibaribe 10
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento
novenas
Cavalhadas
Eu me deitei no colo da menina e ela começou a passar a mão nos meus cabelos
Capibaribe
– Capibaribe
Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas com o xale
[vistoso de pano da Costa
e o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
que se chamava midubim e não era torrado era cozido
me lembro de todos os pregões:
Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...
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libertinagem
recife...
meu avô morto.
recife morto, recife bom, recife brasileiro como a casa de meu avô
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
pOéTiCa
estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo
[de um vocábulo
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libertinagem
abaixo os puristas
O ÚlTiMO pOEMa
* o texto tanto pertence à temática da própria poesia quanto à temática
da morte.
assim eu quereria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das lores quase sem perfume
a pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
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libertinagem
o poeta emprega o primeiro verso para anunciar seu desejo: “Assim eu que-
reria o meu último poema”. em seguida, apresenta comparações que traduzem
seu desejo: “Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais”,
o eu lírico almeja a simplicidade oriunda da espontaneidade, capaz de traduzir
sem artifícios prévios o carinho afetivo; “que fosse ardente como um soluço
sem lágrimas”, o poeta almeja um verso capaz de portar toda a intensidade da
emoção sem, entretanto, resvalar na pieguice sentimental, sobretudo a pieguice
sentimental dos românticos; “que tivesse a beleza das lores quase sem perfu-
me”, o poema desejado teria uma beleza discreta, incapaz de alarde, comedida a
ponto de revelar-se discretamente, impondo-se pela forma, sem necessidade de
espraiar suas intenções; “A pureza da chama em que se consomem os diamantes
mais límpidos”, o poeta almeja um poema que seja capaz de conter toda a beleza
e preciosidade dos sentimentos e intenções raros, mas que toda a preciosidade
possa ser consumida, isto é, dissolvida por uma “chama”, por um estilo simples
capaz de conter em sua simplicidade e pureza a nobreza dos sentimentos afetivos.
“A paixão dos suicidas que se matam sem explicação”, o poeta almeja um poema
capaz de conter os mais intensos sentimentos sem, entretanto, ser sentimental,
sem anunciar de forma dramática a intensidade das emoções, guardando em si o
mistério que enaltece a alma humana.
curiosamente, “o último poema” é o último poema de libertinagem e manuel
bandeira, certamente, conseguiu atingir o tão almejado comedimento estilístico.
a doença
pNEUMOTÓRaX
1
espectoração sangrenta
Aol-11
2
Respiração diicultosa
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
o poema pode ser dividido em três partes. na primeira parte, nos dois pri-
meiros versos, temos a agonia de um tuberculoso, que, em face ao seu sofrimento,
lamenta toda a vida que não pôde viver. O terceiro verso reitera as diiculdades
de respiração e a razão do acesso de tosse.
Na segunda parte, temos o exame médico. A diiculdade respiratória é
indicada pela aliteração da oclusiva linguodental /t/ e pela linha pontilhada.
na terceira parte, o médico dá ao paciente o diagnóstico “– o senhor tem
uma escavação no pulmão esquerdo/ e o pulmão direito iniltrado”. O paciente
tenta agarrar-se a uma esperança: “– então, doutor, não é possível tentar o pneu-
motórax?” mas o médico, ironicamente, lhe diz que qualquer tratamento será
inútil e, eufemisticamente, lhe diz para “...tocar um tango argentino”. eufemismo
consiste em dizer de uma forma suave algo trágico; o que o médico faz é dizer
ao paciente que não há esperanças para o seu mal. como o tango é música de
tragédias, a sentença do médico é simultaneamente irônica e eufemística, porque
anuncia de forma indireta a iminência da morte do paciente.
mesmo abordando o tema da própria doença e da morte, manuel bandeira
o faz de forma comedida, sem resvalar na dramaticidade. em “pneumotórax”,
a dramaticidade cede lugar à ironia.
Morte
A temática da morte aparece de forma determinante nos seguintes poemas:
“o anjo da guarda”, “A Virgem maria”, “oração no saco de mangaratiba”, “o major”,
“Poema de inados”, e mesclada a outros temas em “O cacto”, “Poema tirado de uma
notícia de jornal”, ”evocação do recife”, “profundamente” e “o último poema”.
O aNjO da gUaRda
Quando minha irmã morreu,
(Devia ter sido assim)
Um anjo moreno, violento e bom,
– brasileiro
Veio icar ao pé de mim.
O meu anjo da guarda sorriu e voltou para junto do Senhor.
mais uma vez, a referência à morte é tomada de uma passagem da vida
do poeta. sua irmã maria cândida de sousa bandeira, que foi sua enfermeira
desde o inal de 1904, quando o poeta adoeceu dos pulmões, faleceu em 1918.
ela, segundo o poeta, foi o seu “anjo da guarda”.
o tratamento dispensado à morte é comedido. em versos livres e brancos, o
poeta manifesta seu afeto pela irmã, comparando-a com um anjo. no verso inicial
“Quando minha irmã morreu”, seguido de um verso entre parênteses “(devia
ter sido assim)”, o eu lírico manifesta sua hipótese sobre a morte da irmã: “ um
anjo moreno,violento e bom / brasileiro”, veio guardá-lo e, em seguida, voltou
para junto do “senhor”.
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libertinagem
Ao dispor a palavra “brasileiro” de modo a aproveitar criativamente o
espaço em branco da folha, o poeta sugere a descida do anjo, que “veio icar ao
pé de mim”. A imagem do “anjo” é brasileira, ele é “moreno”, violento e bom”.
Violento e bom formam, em princípio, um paradoxo, pois aproxima conceitos
contrários. mas os conceitos se irmanam, pois “violento e bom”, ligados pela
conjunção aditiva, parecem realçar a forma como o “anjo” impõe seus cuidados.
Aqui, talvez, seja possível associar a imagem do anjo à forma dedicada e intensa
(violenta) com que a irmã dedicava-se a cuidar do poeta. em seguida, o sorriso
do “anjo” tranquiliza o poeta, pois anuncia sua ascensão, isto é, a imagem da
irmã funde-se à imagem do anjo, que sobe em direção a deus.
O MajOR
O major morreu.
reformado.
Veterano da guerra do Paraguai.
Herói da ponte do Itororó.
apenas
À hora do enterro
O corneteiro de um batalhão de linha
Deu à boca do túmulo
O toque de silêncio
João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num
[barracão sem número.
Uma noite ele chegou no bar Vinte de novembro
bebeu
Cantou
Dançou
Aol-11
mais uma vez a morte é vista com simplicidade, narrada de forma neutra e
objetiva. A linguagem despojada não atribui nenhuma importância à morte de um
homem do povo, de um favelado. Aqui não há sequer a presença do corneteiro
do poema “o major” para atribuir uma mínima solenidade ao evento.
Ao intitular seu poema “poema tirado de uma notícia de jornal”, bandeira
revela a forma fria que a imprensa dispensa às pessoas comuns, tratando-as como
seres despojados de humanidade, o que signiica tratá-las de forma violenta;
todo tratamento que despoja a pessoa de sua humanidade é um tratamento
violento. entretanto, bandeira consegue extrair do jornal um poema e, ao fazer
isso, acaba por tirar, da indiferença do discurso da imprensa, as pessoas comuns,
atribuindo-lhes a dignidade do discurso poético. A poesia de manuel bandeira
confere dignidade à simplicidade porque insere as pessoas simples na dimensão
humana da vida.
amor
A temática do amor aparece também em “mulheres”, “teresa”, “na boca”,
“namorados” e “o impossível carinho”.
paliNÓdia
Quem te chamara prima
arruinaria em mim o conceito
De teogonias velhíssimas
todavia viscerais
naquele inverno
tomaste banhos de mar
Visitaste igrejas
(Como se temesses morrer sem conhecê-las todas)
tiraste retratos enormes
telefonavas telefonavas...
o verso inicial do poema indica que o termo “prima” ultrapassa o sentido que
em geral lhe é atribuído, pois já o segundo verso informa que, se mantido o sentido
coloquial, “arruinaria em mim o conceito/ de teogonias velhíssimas”. teogonia signi-
ica “a origem dos deuses”, o que nos permite perceber que para o eu lírico a visão da
“prima” está associada a um momento especial, ao momento do nascimento de um
deus, no caso uma deusa, a deusa do amor – Afrodite. embora a visão esteja associada
aos valores míticos, ela é sentida pelo eu lírico como uma realidade visceral.
A segunda estrofe conirma a primeira, pois nela o poeta recorda-se do
momento em que viu a prima tomando banho de mar (no nordeste, o termo in-
verno designa os meses da chuva, que coincidem com o verão). essa visão parece
ser a primeira lembrança da manifestação do desejo erótico e, por isso, o poeta
associa a imagem da prima à imagem da deusa grega. entretanto, as atitudes
da prima não condizem com as atitudes da deusa, pois a prima visita as igrejas,
manifestando um comportamento acentuadamente cristão.
Na terceira estrofe, justiica-se o título do poema, porque para o eu lírico
aquela imagem da prima vista na infância é agora (“hoje”) percebida de outra
forma: “Que não és prima só / senão prima de prima / prima-dona de prima
/ – primeva”, ou seja, ela é a representação mítica da primeira mulher (prima
+ eva), existindo na memória do poeta como símbolo da descoberta do desejo
erótico. daí a retratação poética realizada, pois a prima, no momento presente,
transcende o mero signiicado de parentesco para se converter em símbolo da
descoberta do amor erótico. A visão da prima pode ser entendida como um
acontecimento epifânico, um “alumbramento” capaz de permitir ao poeta a
descoberta de signiicados até então ocultos em sua vida.
Cotidiano
o cotidiano aparece em vários poemas de libertinagem, como “camelôs”,
“comentário musical”, “poema tirado de uma notícia de jornal” e “o cacto”.
O CaCTO
Aquele cacto lembrava gestos desesperados da estatuária:
laocoonte constrangido pelas serpentes,
Ugolino e os ilhos esfaimados.
evocava também o seco nordeste, carnaubais, caatingas...
era enorme, mesmo para esta terra de feracidades excepcionais.
Um dia um tufão furibundo abateu-o pela raiz.
O cacto tombou atravessado na rua,
Quebrou os beirais do casario fronteiro,
Impediu o trânsito de bonde, automóveis, carroças,
arrebentou os cabos elétricos e durante vinte e quatro horas privou
A cidade de iluminação e energia:
Aol-11
pENsãO faMiliaR
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libertinagem
33
manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
5. EXERCíCiOs
texto para as questões 1 e 2.
36
libertinagem
1.
sobre o poema, é incorreto airmar que:
a) sugere dinamismo, provocado pelo ritmo marcado da redondilha maior e
pela presença de verbos de movimento.
b) projeta um lugar onde se pode viver pelo imaginário, o que a vida madrasta
não ofereceu.
c) apresenta o tema da evasão da realidade como forma de libertar-se das limi-
tações da vida presente.
d) constrói-se pela oposição entre dois advérbios de lugar e estabelece diálogo
com o tema romântico.
e) apresenta versos brancos e livres, bem como linguagem simples e coloquial,
porém desprovida de procedimento metafórico.
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
2.
poema dos mais populares de manuel bandeira, “Vou-me embora pra pasárgada”
constrói uma realidade em que se oferece a promessa de outra vida. Que tipo de
vida? descreva-a sucintamente.
pNEUMOTÓRaX
Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
– Diga trinta e três.
– trinta e três... trinta e três... trinta e três...
– respire.
.............................................................................................
– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o
[pulmão direito iniltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
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manuel Carneiro de Sousa bandeira Filho
8.
em uma das suas ocorrências, no poema “pneumotórax” , a conjunção e poderia ser
substituída por MAS, sem prejuízo semântico. Tal possibilidade veriica-se em:
a) “dispneia e suores noturnos” .
b) “trinta e três... trinta e três...”.
c) “diga trinta e três”.
d) “pulmão esquerdo e o pulmão direito iniltrado”.
e) “ter sido e que não foi”.
9.
A presença do humor negro e o feitio de poema-piada são traços modernistas de
“pneumotórax”. Quando, nesse poema, o médico enuncia a frase: “A única coisa
a fazer é tocar um tango argentino”, o paciente deve entender que:
a) não há mais nada que a medicina possa fazer por ele.
b) ainda há solução para o seu problema de saúde.
c) o tango argentino é o processo terapêutico para curá-lo.
d) igurativamente, deverá ir buscar ajuda com especialistas portenhos.
e) nem a musicoterapia é recomendável para o tratamento de seu problema
pulmonar.
gaBaRiTO
1. e b) o poeta apresenta uma cena típica da
2. em “Vou-me embora pra pasárgada”, sociedade senhorial nordestina, em que
manuel bandeira cria para si um mundo sobrevivem valores do tempo da escravidão
perfeito, onde todos os desejos podem ser e do colonialismo.
realizados. nesse mundo utópico, pasárgada, 4.
o poeta pode viver tudo aquilo que a vida, em a) trata-se do grupo social dos humildes, dos
razão da doença, não lhe permitiu viver. excluídos: camelôs, prostitutas, favelados,
3. tipos pelos quais manuel bandeira revela
a) irene preta, simpatia e solidariedade.
irene boa, c) A relação de manuel bandeira com o ca-
irene sempre de bom humor. tolicismo é antes poética e cultural que
religiosa. para ele, o catolicismo funde-se
Imagino Irene entrando no céu: com a cultura brasileira, aparecendo nas
festas populares e no sincretismo religioso
– Licença, meu branco!
afro-brasileiro.
E São Pedro, bonachão:
5. A 6. b 7. c
– Entra, Irene, você não precisa pedir licença.
8. e 9. A
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