Regradescartes

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Sobre zeros de polinômios

Recordar é viver
Seja p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0 um polinômio de coeficientes reais
ou complexos e grau n ≥ 1. Assim, an 6= 0.
Para iniciar, vai-se recordar algumas coisas bem conhecidas e fixar-se
algumas notações.
n
A derivada de p(x) é o polinômio p0 (x) de grau n−1, p0 (x) = kak xk−1 .
P
k=1
Vai-se denotar a k-ésima derivada de p(x) por p(k) (x). Assim, p(1) (x) =
p0 (x).
Seja k um inteiro, 1 ≤ k ≤ n. Um número complexo ξ diz-se raiz de
multiplicidade k do polinômio p(x) se existe um polinômio de coeficientes
reais ou complexos q(x) tal que p(x) = (x − ξ)k q(x) e q(ξ) 6= 0. Uma raiz
de multiplicidade 1 é chamada de raiz simples de p.
Relembre que ξ é raiz de multiplicidade k de p(x) se, e somente se,
p(ξ) = p0 (x) = p(k−1) (ξ) = 0 e p(k) (ξ) 6= 0.
Um dos teoremas mais celebrados da matemática é o Teorema Funda-
mental da Álgebra.
Teorema 1 Seja p(x) é um polinômio de grau n, n ≥ 1, então existe um
número complexo ξ tal que p(ξ) = 0.
Uma consequência imediata deste teorema é o resultado enunciado a seguir,
algumas vezes também chamado teorema fundamental da álgebra.
Teorema 2 Se p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0 é um polinômio de grau
n, n ≥ 1, existem números complexos ξ1 , . . . ξ` , dois a dois distintos, e
(x − ξk )mk

naturais não nulos m1 , . . . , m` , tais que p(x) = an
k=1

Claro que nas condições do teorema 2, ξk é uma raiz de multiplicidade mk



de p(x) e mk = n.
k=1

1 A regra dos sinais de Descartes. . . e o que Gauss


tem a ver com isso
Aqui consideram-se apenas polinômios p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0
de coeficientes reais com grau n ≥ 1.

1
Tome a sequência de coeficientes de p(x), (an , an−1 , . . . , a1 , a0 ) e descon-
sidere os elementos nulos desta. Seja v(p) o número de trocas de sinal que
há nessa sequência (após desconsiderar os zeros).
Exemplo 1
(a) Se p(x) = x7 − 2x6 − x4 − 3x2 + 1, a sequência é (já eliminados
os zeros) (1, −2, −1, −3, 1) e v(p) = 2.

(b) Se p(x) = x4 + x + 17 a sequência é (1, 1, 17) e v(p) = 0.

(c) Se q(x) = x3 + 2x2 − x − 1, a sequência é (1, 2, −1, −1) e v(q) = 1.

Exercı́cio 1 Seja p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0 um polinômio de


coeficientes reais e grau n ≥ 1, com p(0) 6= 0.
(i) Prove que 0 ≤ v(p) ≤ n e apresente um exemplo em que v(p) = n.

(ii) Suponha que n ≥ 2 e considere p0 (x) a derivada de p(x). Prove que


v(p0 ) é igual a v(p) ou é igual a v(p) − 1. Apresente um exemplo em
que v(p0 ) = v(p) e um exemplo em que v(p0 ) = v(p) − 1. (Pode supor
neste item que p0 (0) 6= 0)
A regra de sinais de Descartes-Gauss apresenta uma estimativa para o
número de raı́zes reais estritamente positivas de p(x) em função de v(p).
Teorema 3 Seja p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0 um polinômio de coefi-
cientes reais e grau n ≥ 1. Então se µ(p) é a soma das multiplicidades das
raı́zes reais estritamente positivas de p(x) tem–se que:
(i) µ(p) ≤ v(p).

(ii) µ(p) e v(p) são inteiros de mesma paridade, i.e. v(p) − µ(p) é par.
O item (i) foi enunciado pela primeira vez por Descartes em sua obra “La
Geometrie”, um apêndice de “Discurso sobre o método para bem conduzir a
razão na busca da verdade dentro da ciência” (em francês, “Discours de la
méthode pour bien conduire sa raison, et chercher la verité dans les scien-
ces”) em 1637. Descartes não demonstrou esse resultado, apenas o enunciou,
parece que a primeira demonstração conhecida é de 1740, feita por Malves.
O item (ii) é a contribuição de Gauss ao resultado e data de 1828 (com
demonstração).
Em bom português a regra diz que se p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0
é um polinômio de coeficientes reais e grau n ≥ 1, o número de raı́zes

2
estritamente positivas de p(x), contadas com suas respectivas multiplicidade,
é menor ou igual a v(p) e, além disso, esse número tem a mesma paridade
de v(p).
Alguns exemplos para esclarecer o tema.
Exemplo 2
(A) Se p(x) = x2 − x + 1, tem–se v(p) = 2. Portanto o número
de raı́zes reais estritamente positivas de p(x), contadas com
sua multiplicidade, é par e é menor ou igual a 2. Ou seja, o
número de raı́zes reais estritamente positivas de p(x), con-
tadas com sua multiplicidade, é 0 ou 2. Note que neste caso
o número é igual a 0.
(B) Se p(x) = x4 − 2x2 + 1, tem–se de novo v(p) = 2. Portanto,
outra vez, o número de raı́zes reais estritamente positivas
de p(x), contadas com sua multiplicidade, é par e é menor ou
igual a 2. Ou seja, esse número é 0 ou 2. Note que aqui o
número é igual a 2, pois p(x) = (x2 − 1)2 .
(C) Seja p(x) = x7 − 3x5 − 2x − 1. Nesse caso v(p) = 1. Portanto o
número de raı́zes reais de p(x) estritamente positivas, con-
tadas cim sua multiplicidade, é um natural ı́mpar e menor
ou igual a 1. Ou seja, neste caso a estimativa fornecida
pela regra de Gauss-Descartes é exata, há precisamente uma
raiz estritamente positiva de p(x), e esta é simples (veja o
exercı́cio 2 adiante).
(D) Se p(x) = x7 − 2x6 + x4 − 3x2 − 1 então v(p) = 3, portanto,
contando cada raı́z com sua multiplicidade, tem-se que o
número de raı́zes reais estritamente positivas é ı́mpar e me-
nor ou igual a 3. Ou seja, há uma ou três raı́zes estrita-
mente positivas de p(x), contadas com sua multiplicidade.
(Tente provar que, neste exemplo há apenas uma raiz estri-
tamente positiva de p(x) e esta é simples).
(E) Considere p(x) = x9 − 7x8 − x5 + x4 − 2x3 + x2 , então v(p) = 4.
Então a regra de Gauss-Descartes permite afirmar que o
número de raı́zes estritamente positivas de p(x) é zero, 2 ou
4 (contadas com sua multiplicidade). Note que o fato de
p(0) = 0, ou seja o termo independente de p(x) ser zero, em
nada interfere na aplicação da regra (no caso a sequência
de coeficientes não nulos de p(x) é (1, −7, −1, 1, −2, 1)).

3
Exercı́cio 2 Se p(x) é um polinômio de coeficientes reais e grau n, n ≥ 1,
e v(p) é 0 ou 1, então a estimativa fornecida pela regra de Gauss-Descartes é
exata (ou seja, o número de raı́zes estritamente positivas de p(x), contadas
com sua multiplicidade é v(p)).

Aplicações
1.1 Raı́zes estritamente negativas
Pode-se usar a regra de Gauss-Descartes para obter uma estimativa do
número de raı́zes estritamente negativas de um polinômio p(x) de coefi-
cientes reais e grau n, n ≥ 1.
Para isto note que, se q(x) = p(−x), então α é raiz de multiplicidade m
de q(x) se, e apenas se, λ = −α é raiz de multiplicidade m de p(x). Essa
observação tem como consequência direta o resultado enunciado a seguir.

Teorema 4 Seja p(x) um polinômio com coeficientes reais e grau n, n ≥ 1,


e considere q(x) = p(−x). Então, se µ̂(p) é a soma das multiplicidades das
raı́zes estritamente negativas de p(x), tem–se:

(i) µ̂(p) ≤ v(q).

(ii) µ̂(p) e v(q) tem a mesma paridade.

Exemplo 3

(A) Considere o polinômio p(x) = x7 + x5 + 17x4 − 15x3 − 17x − 40.


Nesse caso q(x) = p(−x) = −x7 − x5 + 17x4 + 15x3 + 17x − 40
e v(q) = 2. Portanto, contadas com suas multiplicidades,
há um número par de raı́zes estritamente negativas, e esse
número é menor ou igual a 2. Ou seja, há 0 ou 2 dessas raı́zes.
(Prove que neste exemplo há duas raı́es estritamente nega-
tivas, ambas simples)

(B) p(x) = x5 + 3x4 − 3x3 + 1. Aqui q(x) = −x5 + 3x4 + 3x3 + 1, então
v(q) = 1 e uma análise similar à feita antes no exemplo 2-
C mostra que há exatamente uma raiz real estritamente
negativa de p(x), e esta é simples (veja também o exercı́cio
2).

4
1.2 Raı́zes estritamente maiores do que α
Aqui usa-se a regra de Gauss-Descartes para obter uma estimativa do número
de raı́zes estritamente maiores do que um real α de um polinômio de coefi-
cientes reais.
A situação é semelhante à discutida ao se encontrar uma estimativa
para o número de raı́zes estritamente negativas, sejam p(x) um polinômio
de coeficientes reais e grau n, n ≥ 1, e um real α.
Considere a mudança de variáveis y = x−α, claro que y > 0 se, e apenas
se, x > α. Então, basta escrever p(x) ma nova variável y, aplicar a regra de
Gauss–Descartes para esse polinômio em y e tem–se uma estimativa para o
número de raı́zes reais estritamente maiores do que α.
Uma maneira de escrever o polinômio p(x) na variável y = x − α é
fazer a substituição x = y + α, e considerar o polinômio qα (y) = p(y + α),
que evidentemente é o polinômio desejado, ao qual deve–se aplicar a regra
de Gauss-Descartes para obter uma estimativa para o número de raı́zes
estritamente maiores do que α de p(x). O resultado abaixo exprime as
conclusões.

Teorema 5 Sejam p(x) um polinômio com coeficientes reais e grau n, n ≥


1, α ∈ R e chame µα (p) à soma das multiplicidades das raı́zes de p(x)
estritamente maiores do que α. Então, se qα (y) = p(y + α) tem–se:

(i) µα (p) ≤ v(qα ).

(ii) µα (p) e v(qα ) tem a mesma paridade.

Há uma maneira mais cômoda de escrever qα do que calcular p(y + α) na


“força bruta”, é usar que, como p(x) é um polinômio de grau n, ele ao seu
polinômio de Taylor de ordem n em torno de qualquer ponto. Portanto

p(k) (α) p(n) (α)


p(x) = p(α) + p0 (α)(x − α) + · · · + (x − α)k + · · · + (x − α)n .
k! n!
Faça a mudança de variável y = x − α na expressão acima e obtenha de
n
P p(k) (α) k
pronto qα (y) = k! y .
k=0
Um ponto interessante a destacar, para fins práticos, é que, para deter-
minar v(qα ) não é necessário calcular p(k) (α), basta determinar seu sinal.
Isto facilita de modo considerável os cálculos, pois as derivadas p(k) (α) po-
dem ser calculadas com o uso do método dos parêntesis encaixados (método
de Horner).

5
Exemplo 4 Vai-se obter uma estimativa para o número de raı́zes
de p(x) = x6 + 2x5 − 2x4 − 3x3 + x2 − x + 1 estritamente maiores do
que α = −2, contadas com sua multiplicidade.
Para isso, escreve-se p(x) usando seu polinômio de Taylor de
ordem 6 em torno de α. Para isso, note que p(−2) = −1 < 0 e com
o cálculo das derivadas de p em α obtém–se:
p0 (x) = 6x5 + 10x4 − 8x3 − 9x2 + 2x − 1, ∴ p0 (−2) = −9
p(2) (x) = 30x4 + 40x3 − 24x2 − 18x + 2, ∴ p(2) (−2) > 0. (de fato,
p(2) (−2) = 102).
p(3) (x) = 120x3 + 120x2 − 48x − 18, ∴ p(3) (−2) < 0.
p(4) (x) = 360x2 + 240x − 48, ∴ p(4) (−2) > 0.
p(5) (x) = 720x + 240, ∴ p(5) (−2) < 0.
p(6) (x) = 720, ∴ p(6) (−2) > 0.
Dessa forma, a ao tomar-se a sequência dos sinais dos coefi-
cientes de qα (y) obtém–se (+ − + − + − −). Portanto v(qα ) = 5 e
conclui–se que há, contadas com sua multiplicidade, o número
de raı́zes de p(x) estritamente maiores do que −2 é ı́mpar e menor
ou igual a 5, ou seja, esse número é 1, 3 ou 5.

Exercı́cio 3 Prove que o número de raı́zes do polinômio p(x) do exemplo


4 maiores ou igual a α = −2, é 3, e todas são simples.

Uma demonstração da regra de Descartes


Aqui apresenta-se uma demonstração da regra de Descartes, o teorema 3.
Considere um polinômio de grau n, n ≥ 1 e coeficientes reais p(x) =
n
ak xk , isto é, aj ∈ R e an 6= 0.
P
k=0
Denote por µ(p) a soma das multiplicidades das raı́zes estritamente po-
sitivas de p, tome a sequência finita (an , an−1 , . . . , a1 , a0 ) dos coeficientes de
p(x) (tomados pela ordem decrescente de grau), desconsidere os zeros desta
sequência e chame de v(p) o número de trocas de sinal desta sequência (após
eliminar os zeros).
Deve-se demostrar que µ(p) ≤ v(p) e que os números µ(p) e v(p) tem
mesma paridade.
Como as raı́zes de p(x) e de q(x) = −p(x) são as mesmas e têm a
multiplicidade igual, nada se perde em generalidade ao supor an > 0.
• Uma demonstração para o caso em que a0 6= 0 (i.e. p(0) 6= 0):

6
Fato 1 u(p) e v(p) tem mesma paridade.

Demonstração: Esta afirmação é consequência imediata das seguintes ob-


servações triviais:
(i) Se a0 > 0 então, como an e a0 tem mesmo sinal, tem–se v(p) par. De
modo análogo, se a0 < 0 então v(p) é ı́mpar.

(ii) Se x é uma raiz de multiplicidade ı́mpar de p(x) então o polinômio


p(x) troca de sinal em x, de modo mais formal, existe ε > 0 tal que,
se x1 ∈ (x − ε, x) e x2 ∈ (x, x + ε), então p(x1 )p(x2 ) < 0. Já se x é
uma raiz de multiplicidade par de p(x) então p(x) não troca de sinal
em x, de modo mais formal, existe ε > 0 tal que, se x1 ∈ (x − ε, x) e
x2 ∈ (x, x + ε), então p(x1 )p(x2 ) > 0.

(iii) Note que lim p(x) = +∞ (pois an > 0), então resulta de (ii) que, se
x→+∞
a0 = p(0) > 0 então µ(p) deve ser par e, se a0 = p(0) < 0 então µ(p)
é ı́mpar.
Portanto, segue-se de (i) e (iii) que se a0 > 0 (ou, em termos mais gerais,
se an a0 > 0) então v(p) e µ(p) são ambos pares e, se a0 < 0 (ou, em termos
mais gerais, se an a0 < 0) então tanto v(p) como µ(p) são ı́mpares.

Para encerrar a demonstração da regra de Descartes resta provar a afirmação


µ(p) ≤ v(p), isso será feito por indução em n com o uso de observações
simples de cálculo e uma aplicação interessante do teorema de Rolle que vai
permitir comparar µ(p) e µ(p0 ).
n
ak xk a derivada de p(x) é o polinômio de grau
P
Lembre que se p(x) =
k=0
n
n − 1, p0 (x) = kak xk−1 .
P
k=1
Agora recorde que, se x é uma raiz de multiplicidade m de p(x), então
x é uma raiz de multiplicidade m − 1 de p0 (x) (em particular, se x é raiz
simples de p(x) então p0 (x) 6= 0).
Para enunciar o próximo resultado, que será o ponto principal na prova
de µ(p) ≤ v(p) é cômodo introduzir aqui uma notação a mais.
Seja s∗ = min{k ∈ N : 1 ≤ k ≤ n, a.k 6= 0}.
Note que como 1 ≤ s∗ ≤ n e está-se a supor a0 6= 0, então a0 as∗ 6= 0.
O sinal de a0 as∗ terá certa relevância no resultado a seguir.

Fato 2 Para todo polinômio de grau n ≥ 1 tem–se µ(p0 ) ≥ µ(p) − 1 e, se


a0 as∗ > 0, então µ(p0 ) ≥ µ(p).

7
Demonstração: Primeiro será mostrado que para todo polinômio tem–se
µ(p0 ) ≥ µ(p) − 1.
SDe fato, se p(x) não tem raı́zes estritamente positivas ou se tem apenas
isso é óvio.
Suponha então que p(x) tem ` raı́zes estritamente positivas, ` ≥ 2,
denote-as por x1 < x2 < · · · < x` e seja mk a multiplicidade de xk .
Para ≤ k < ` considere Ik = [xk , xk−1 [ e faça I` = [xk , +∞[.
Em cada Ik a única raiz de p(x) é xk e sua multiplicidade é mk , no mesmo
intervalo tem–se que xk é raiz de multiplicidade mk − 1 e, para 1 ≤ k < `, o
teorema de Rolle garante que há pelo menos uma raiz de p0 (x) em (xk , xk+1 ).
Assim, para 1 ≤ k ≤ ` − 1 a soma das multiplicidades das raı́zes de p0 (x) em
Ik = [xk , xk−1 [ é dk ≥ mk e, em I` = [xk , +∞[, a soma das multiplicidades
das raı́zes de p0 (x) é d` ≥ m` − 1.

Como em (0, x1 ) não raı́zes de p(x) resulta que µ(p) = mk e, portanto,
k=1
`−1 `−1
µ(p0 ) ≥
P̀ P P
dk ≥ dk + d` ≥ mk + m` − 1 = µ(p) − 1.
k=1 k=1 k=1
Isso mostra a primeira parte do resultado, sempre vale µ(p0 ) ≥ µ(p) − 1.
Para encerrar a demonstração será provado que se a0 as∗ > 0 então p0 (x)
tem pelo menos uma raiz em (0, x1 ). Como nesse intervalo p(x) não se anula,
basta usar a parte já demonstrada do resultado para concluir que nesse caso
µ(p0 ) ≥ µ(p).
Considere primeiro a situação em que a0 = p(0) > 0, então se a0 as∗ > 0
tem–se as∗ > 0 ou seja, a primeira derivada não nula de p(x) em zero é
estritamente positiva, portanto existe ε > 0 tal que p(x) é estritamente
crescente em (0, ε). Como p(0) = a0 > 0 e x1 é a menor raiz estritamente
positiva de p(x), isso mostra que o máximo de p(x) no intervalo [0, x1 ] é
atingido num ponto x0 do interior desse intervalo (não pode ser atingido em
zero). Portanto p0 (x0 ) > 0 e isso termina a prova.
Caso a0 = p(0) < 0 então se a0 as∗ > 0 tem–se as∗ < 0, portanto a
primeira derivada não nula de p(x) em zero é estritamente negativa, o que
mostra existir ε > 0 tal que p(x) é estritamente decrescente em (0, ε). O
resto da prova de p0 (x) ter uma raiz em [0, x1 ] é análoga à anterior, basta
trocar ali máximo por mı́nimo.

A prova da regra de Descartes será concluı́da com o uso deste resultado e


da seguinte observação simples.
Como as∗ é o coeficiente do termo de menor grau de p0 (x) é claro que:

(A) Se a0 as∗ > 0 os sinais de a0 e as∗ são os mesmo e portanto v(p0 ) = v(p).

8
(B) Se a0 as∗ < 0 então a0 e as∗ tem sinais diferentes, assim v(p0 ) = v(p)−1.

Agora o final da demonstração da regra de Descartes, se a0 6= 0.


n
ak xk é um polinômio de coeficientes reais e de grau
P
Fato 3 Se p(x) =
k=0
n ≥ 1 e p(0) 6= 0 então µ(p) ≤ v(p).

Demonstração: Será feita por indução em n.


O caso inicial, n = 1 é de todo trivial.
Suponha então que a o resultado vale para polinômios de grau n e con-
n+1
ak xk um polinômio de coeficientes reais e de grau n + 1.
P
sidere p(x) =
k=0
Note que p0 (x) é um polinômio de coeficientes reais e grau n então, pela
hipótese de indução, µ(p0 ) ≤ v(p0 ).
Agora analisam-se as duas possibilidades para o sinal de a0 as∗ .

• Caso a0 as∗ > 0.


Então, pela observação (A), pela hipótese de indução e pelo fato 2,
tem–se v(p) = v(p0 ) ≥ µ(p0 ) ≥ µ(p).

• Caso a0 as∗ < 0.


Então use a observação (B), a hipótese de indução e o fato 2, para
concluir que v(p) = v(p0 ) + 1 ≥ µ(p0 ) + 1 ≥ µ(p).

Exercı́cio 4 Faça uma demonstração da regra de Descartes para o caso


a0 = 0.

2 Raı́zes em um intervalo: Budan e Sturm


ak xk de coeficientes reais
P
Considere mais uma vez um polinômio p(x) =
k=0
e grau n ≥ 1. O problema que se discute aqui é contar o número de raı́es de
p que estão nym intervalo [α, β]. Apresentam-se dois resultados, o teorema
de Budan (também conhecido como teorema de Budan-Fourier) e o teorema
de Sturm. O primeiro é uma generalização da regra de Gauss-Descartes
e, como esta, fornece uma estimativa para esse número, nessa estimativa
a multiplicidade das raı́zes é levada em conta, os cálculos envolvidos nesse
resultado são simples. O segundo fornece o número exato de raı́zes de p no
intervalo considerado, mas sua aplicação exige cálculos que, embora sejam
todos algébricos sobre os coeficientes de p, são muito mais complexos e bem
mais sujeitos a erros numéricos do que os envolvidos no teorema de Budan.

9
2.1 O Teorema de Budan, lembranças de Descartes
Considere um intervalo [α, β] em que p(α) 6= 0 e p(β) 6= 0 (na verdade só a
útima restrição importa, mas aqui vão supor-se ambas).
Como na seção 1.2, se c ∈ R, considere o polinômio qc (y) = p(y + c).

ak xk de coeficientes reais e grau n ≥ 1 e tome reais


P
Fato 4 Seja p(x) =
k=0
α < β tais que p(α)p(β) 6= 0. Chame ρ à soma das multiplicidades das
raı́zes de p em [α, β].
Nessas condições:

(i) 0 ≤ ρ ≤ v(qα ) − v(qβ )

(ii) Os naturais ρ e v(qα ) − v(qβ ) têm mesma paridade.

A demonstração deste resultado não é apresentada aqui, embora possa ser


feita de forma simples e muito similar à da Regra de Gauss-Descartes.
Note que este é um resultado de aplicação direta e simples.
Exemplo 5 Considere, como no exemplo 4, p(x) = x6 + 2x5 − 2x4 −
3x3 +x2 −x+1. Vai analisar-se as raı́zes deste polinômio em [−2, 1].

Aqui α = −2, β = 1 e no supracitado exemplo 4 mostrou-se que v(qα ) = 5.


Para calcular v(qβ ) vai avaliar-se o sinal de p e das suas derivadas nesse
ponto, claro que p(6) (1) = 6! > 0, além disso:

• p(1) = −1 < 0

• p0 (x) = 6x5 + 10x4 − 8x3 − 9x2 + 2x − 1, ∴ p0 (1) = 0.

• p(2) (x) = 30x4 + 40x3 − 24x2 − 18x + 2, ∴ p(2) (1) > 0.

• p(3) (x) = 120x3 + 120x2 − 48x − 18, ∴ p(3) (1) > 0.

• p(4) (x) = 360x2 + 240x − 48, ∴ p(4) (1) > 0.

• p(5) (x) = 720x + 240, ∴ p(5) (1) > 0.

Portanto, ignora-se o zero de p0 (1) na sequêcia de sinais de qβ e tem–se que


esta sequência é (− + + + +), assim v(qβ ) = 1.
O fato 4 mostra que o número de raı́zes de p em [−1, 2] é, contadas com
a sua multiplicidade, par e menor ou igual a v(qα ) − v(qβ ) = 5 − 1 = 4.

10
2.2 O Algoritmo de Sturm
Aqui será enunciado um resultado bem mais sofisticado do que a regra de
Gauss-Descartes e do teorema de Budan, estudados nas seções anteriores,
apesar de mais poderoso do que os resultados de Gauss-Descartes e Budan,
em dois aspectos ele é mais limitado nas aplicações:
• Seu uso tem um custo computacional bem maior, e está sujeito a erros
numéricos, coisa que não acontece com Gauss-Descartes.

• A regra de Descartes tem generalizaçõess que aplicam-se a classes de


funções maiores do que a dos polinômios, isso não é conhecido para o
algoritmo de Sturm (por exemplo, no caso de funções racionais).
Em termos simples o algoritmo de Sturm, ou teorema de Sturm, faz o
seguinte, dados:
n
ak xk de coeficientes reais e grau n ≥ 1.
P
(i) um polinômio p(x) =
k=0

(ii) um intervalo [α, β] ⊂ R tal que p(α) 6= 0 e p(β) 6= 0.


fornece, após um número finito e determinado de adições e multiplicações (ou
seja, é um algoritmo algébrico), determina o número de raı́zes de p em [α, β],
de modo mais formal, calcula σ = σ(α, β, p) = #{x ∈ [α, β] : p(x) = 0}.
Ao comparar este resultado com os anteriores deve salientar-se que:
• Ao contrário dos resultados de Gauss-Descartes e Budan, o número
σ(α, β, p) supramencionado não leva em conta as multiplicidades das
raı́zes de p que existem em [α, β], cada raiz é contada uma vez, inde-
pendente de qual é a sua multiplicidade.

• Aqui não se apresenta uma estimativa do número de raı́zes de p em


[α, β], calcula-se o número exato de raı́zes em [α, β].
A chave para o resultado de Sturm é a construção, a partir de p da
sequência de Sturm de p, uma sequência finita de polinômios (no máximo
n + 1 polinômios) que é feita a seguir.

2.3 Sequência de Sturm de p


n
ak xk um polinômio de coeficientes reais e grau n ≥ 1.
P
Seja p(x) =
k=0
Considere a sequência de polinômios h0 (x), h1 (x), . . . , hs (x) definida de
forma indutiva por:

11
(I) h0 (x) = p(x), h1 (x) = p0 (x);

(II) Pra k ≥ 1, conhecidos h0 (x), h1 (x), . . . , hk (x), se hk (x) ≡


0 faça s = k − 1 e a sequência de Sturm de p é
(h0 (x), h1 (x), . . . , hk−1 (x)) e saia daqui, acabou! Caso hk (x)
não seja o polinômio nulo, seja rk+1 (x) o resto da divisão eu-
clidiana de hk−1 (x) por hk (x) e defina hk+1 (x) = −rk+1 (x).

(III) Troque k por k + 1 e volte ao passo anterior.

Note que, como o grau de p é n ≥ 1, o polinômio h1 (x) não é identica-


mente nulo, assim s ≥ 1.
Além disso tem–se que o grau de h1 (x) é n − 1 e, da divisão euclidiana
de polinômios vem que o grau de hk é estritamente menor do que o grau
de hk−1 , portanto, para algum k ∈ {1, . . . , n} tem–se hk+1 (x) ≡ 0, o que
mostra que s ≤ n.
Exemplo 6 Determinar a sequência de Sturm de p(x) = x4 − 4x3 −
x + 1.

Neste caso, h0 (x) = p(x) = x4 −4x3 −x+1 e h1 (x) = p0 (x) = 4x3 −12x2 −1.
A divisão euclidiana de h0 (x) por h1 (x) tem quociente q2 (x) = x−1 4 e
resto r2 (x) = −3x2 − 3 x−14 . Assim, h2 (x) = −r 2 (x) = 3x 2 + 3 x−1 .
4
Ao dividir h1 (x) por h2 (x) obtém-se quociente q3 (x) = 4x−13 3 e resto
43x−25 −43x+25
r3 (x) = 12 , assim h3 (x) = 12 .
36
Por fim, a divisão de h2 (x) por h3 (x) tem quociente q4 (x) = − 43 x − 1287
1849
e resto r4 (x) = 2219
1849 . Então h4 (x) = − 2219
1849 .
Como o grau de p é 4 tem-se que s ≤ 4 e isso mostra que a sequência de
Sturm de p é (h0 (x), h1 (x), h2 (x), h3 (x), h4 (x)).

Com a sequência de Sturm (h0 (x), h1 (x), . . . , hs (x)) de p vai-se definir


agora a função contadora de Sturm νp , definida em Sp = {x ∈ R : p(x) 6= 0}.
Para α ∈ Sp considere a sequência (h0 (α), h1 (α), . . . , hs (α)) e remova os
zeros dessa sequência, veja que h0 (α) 6= 0, portanto após remover os zeros
ainda existe uma sequência (a0 , . . . , a` ) com 0 ≤ ` ≤ s.
Defina então νp (α) como o número de trocas de sinal que há na sequência
supracitada (a0 , . . . , a` ).
Por exemplo, se p(x) = x4 − 4x3 − x + 1, tem–se p(2) = −17, p(4) = −3
e p(5) = 121, assim pode-se calcular νp nesses valores.

12
Com os cálculos feitos no exemplo 6, tem-se que
51 61 2219
h0 (2) = −17, h1 (2) = −17, h2 (2) = , h3 (2) = − , h4 (2) = −
4 12 1849
201 49 2219
h0 (4) = −17, h1 (2) = 63, h2 (2) = , h3 (4) = − , h4 (4) = −
4 4 1849
95 2219
h0 (5) = 121, h1 (5) = 199, h2 (5) = 78, h3 (5) = − , h4 (5) = −
6 1849
portanto νp (2) = νp (4) = 2 e νp (5) = 1.
O leitor fica convidado a mostrar que νp (0) = 3.
n
ak xk de coeficientes reais e
P
Note que, dado um polinômio p(x) =
k=0
grau n ≥ 1, todos os cálculos envolvidos para obter a sequência de Sturm
de p e para calcular νp em um ponto envolvem apenas operações de adição
e multiplicação feitas a partir dos coeficientes de p(x). Podem ser cálculos
tediosos e em grande quantidade (de fato, são), mas envolvem apenas essas
operações, todos os cálculos, sem nenhuma exceção, são algébricos, tudo
nesta subseção é “construtı́vel”.

2.4 O Teorema de Sturm


Com a parafernália vista pode-se agora enunciar o teorema de Sturm.
n
ak xk um polinômio de coeficientes reais e grau
P
Teorema 6 Seja p(x) =
k=0
n ≥ 1 e considere νp a função contadora de Sturm de p definida na subseção
2.3.
Se α < β são reais e p(α)p(β) 6= 0 então o numero de raı́zes de p em
[α, β], contadas sem levar em conta sua multiplicidade é

σ(α, β, p) = #{x ∈ [α, β] : p(x) = 0} = νp (α) − νp (β).

Assim se p(x) = x4 − 4x3 − x + 1, mostrou-se na subseção 2.3 que


νp (2) = νp (4) = 2 e νp (5) = 1, então p não tem raı́zes em [2, 4] e tem
uma raiz em [4, 5]. Uma observação simples é que, embora não se saiba
qual a multiplicidade da raiz que está em [4, 5], é simples concluir que essa
multiplicidade é ı́par (porque?).
Na verdade o seguinte exercı́cio é simples.

Exercı́cio 5 Nas condições do teorema 6 mostre que νp (α) − νp (β) > 0


a soma das multiplicidades das raı́zes de p em [α, β] é par se, e só se,
p(α)p(β) > 0.

13
As dificuldades no uso do teorema 6 são de natureza técnica, se feitos em
aritmética de ponto flutuante, os cálculos envolvidos para obter a sequência
de Sturm de p são amiúde bastante sujeitos a erros e imprecisões.

Exercı́cio 6 Considere p(x) = x6 + 2x5 − 2x4 − 3x3 + x2 − x + 1 (polinômio


estudado nos exemplos 4 e 5), e prove que no intervalo [−2, 1] este polinômio
tem 2 raı́zes diferentes e ambas simples.

Pode-se melhorar o teorema de Sturm enunciado acima, no seguinte sen-


n
ak xk de coeficientes reais e grau n ≥ 1,
P
tido, dado um polinômio p(x) =
k=0
reais α < β com p(α)p(β) 6= 0 e um natural m ∈ {1, . . . , n}, é possı́vel,
através apenas de operações algébricas a partir dos coeficientes de p(x) cal-
cular o número de raı́zes de p em [α, β] que tem multiplicidade m.
O leitor fica convidado a obter um algoritmo algébrico para resolver esse
problema no caso m = 1 (isto é, um algoritmo que calcule o número de
raı́zes simples de p em [α, β]). Uma sugestão é criar um algoritmo a partir
do teorema de Sturm com o auxı́lio de “algo mais”sobre polinômios, por
exemplo, usar de forma conveniente o m.d.c. entre p e p0 .

3 Localização de raı́zes de polinômios


Nesta seção seá indiferente que o polinômio p(x) considerado tenha coefici-
entes reais, basta ser de grau n ≥ 1 (e prova-se assim que o processo descrito
acima acaba no máximo em n + 1 etapas).
Assim, seja p(x) = an xn + an−1 xn−1 + · · · + a0 um polinômio de coefici-
entes complexos e grau n ≥ 1, portanto an 6= 0.
O primeiro resultado que se enuncia aqui é de todo óbvio.
n−1
P |ak |
Fato 5 Suponha que x ∈ C seja diferente de zero e tal que |an | > |x|n−k
,
k=0
então p(x) 6= 0.

n−1
 
ak
xn
P
Demonstração: Claro que p(x) = an + xn−k
, então segue-se da
k=0
desigualdade triangular e da hipótese que:
n−1 n−1
X |ak |
X ak
≤ < |an |
xn−k |x|n−k
k=0 k=0

e isto implica de pronto que p(x) 6= 0.

14
n−1
P |ak |
Note que a desigualdade da hipótese deste resultado, |an | > |x|n−k
, pode
k=0
ser reescrita como
n−1
X |ak |
1> . (1)
|an | |x|n−k
k=0
Uma consequência interessante destas observações é a seguinte estimativa
para o maior valor absoluto das raı́zes de p.
q
|ak |
Fato 6 Se M = max n−k |a n|
e z ∈ C é uma raiz do polinômio p então
0≤k≤n−1
|z| ≤ 2M .
|ak |
Demonstração: Note que, se 0 ≤ k ≤ n − 1, então |an | ≤ M n−k , agora
veja que, se x ∈ C satisfaz |x| > 2M tem-se:
|ak | 1 |ak | 1 1
n−k
< n−k n−k
≤ n−k .
|an | |x| |an | M 2 2
n−1 n−1
X |ak | X 1 1
Assim, n−k
< n−k
= 1 − n < 1 o que, pelo fato 5, im-
|an | |x| 2 2
k=0 k=0
plica p(x) 6= 0.

Uma estimativa de aparência similar à do fato 6 é a seguinte:


|ak |
Fato 7 Se L = max e z é uma raiz do polinômio p então |z| ≤ 1+L.
0≤k≤n−1 n |
|a

Demonstração: Seja z ∈ C uma raiz de p. Se |z| ≤ 1, é claro que o


resultado é verdadeiro.
Suponha então que |z| > 1, considere L1 = max |ak | e use que p(z) =
0≤k≤n−1
0 e a desigualdade triangular para ver que
n−1 n−1 n−1
|an z n | ≤ ak z k ≤ L1 |z k | = L1 |z|k .
P P P
k=0 k=0 k=0
n−1
L1
Portanto, se z é raiz de p e |z| > 1, tem–se |z|n ≤ |z|k .
P
|an |
k=0
n−1 n |z|n n
L1
|z|k = |z| −1 |z|
resulta então |z|n ≤ L |z|−1
P
Como |an | =Le |z|−1 < |z|−1 .
k=0
Isso mostra que, também no caso |z| > 1, tem-se |z| < 1 + L.

Agora apresentam-se alguns exercı́cios e exemplos para aplicar e compa-


rar os fatos 6 e 7.

15
Exercı́cio 7 Considere M e L definidos nos fatos 6 e 7.

(i) Prove que L ≥ 1 se, e só se M ≥ 1.

(ii) Suponha que L > 1 e compare as estimativas apresentadas nos fatos 6


e 7, qual é melhor (ou seja, suponha L ≥ 1 e compare 2M e L + 1)?
Sugestão: Considere duas situações, o caso em que M = |a|an−1
n|
|
e
aquele em que M > |a|an−1
n|
|
. A segunda destas situações é “simples”de
ser analisada, a primeira. . .

Exemplo 7 Considere p(x) = x5 + x4 − 3x3 + x2 − 3x + 2.



Neste caso L = 3 e M = 3 ≈ 1.732050808. Então a estimativa fornecida
pelo fato 6 é mais acurada que a vista no fato 7, pois 2M < 3.6 < 4 = L + 1.
A melhor conclusão a que se pode chegar com os resultados obtidos é √ que
todas as raı́zes de p (reais ou não) tem valor absoluto menor ou igual a 2 3.
Exemplo 8 Seja p(x) = x5 − 5x4 + 6x3 + 4.

Aqui L = 6 e M = 5, então L + 1 = 7 < 10 = 2M , portanto neste exemplo,


a estimativa do fato 7 é a melhor, ela permite concluir que se ξ ∈ C é raiz
de p então |ξ| ≤ 7.

Exercı́cio 8 Considere α ∈ C e o polinômio p(x) = x5 − 5x4 + 6x3 + α.

(i) Mostre que se |α| ≤ 6 e ξ ∈ C é uma raiz de p então |ξ| ≤ 7.

(ii) Mostre que se 6 ≤ |α| ≤ 9 e ξ ∈ C é uma raiz de p então |ξ| ≤ |α| + 1.

(iii) Mostre que se 9 ≤ |α| ≤ 55 e ξ ∈ C é uma raiz de p então |ξ| ≤ 10.


p
(iv) Mostre que se |α| > 55 e ξ ∈ C é uma raiz de p então |ξ| ≤ 2 5 |α|.

Exercı́cio 9 Caso você ainda não tenha resolvido “por inteiro”a parte (ii)
do exercı́cio 7, tente fazer isso agora.

Até aqui analisou-se a situação em que L > 1, agora algumas coisas do caso
em que L < 1 (lembre que L < 1 se, e só se, M < 1).
Alguns exemplos para começar.
Exemplo 9 Considere p(x) = x5 − 0, 9x4 − 0.7x3 + 0, 8.

Neste caso L = 0, 9 e um pequeno (e direto) cálculo mostra que M =



5
0, 8 ≈ 0, 9563524998.

16
Então se o número complexo ξ verifica p(ξ) = 0 a melhor conclusão que
se pode chegar com o que foi exposto nesta seção é que |ξ| ≤ L + 1 = 1, 9
(pois 2M > 1, 9).
Exemplo 10 Seja p(x) = x5 − 0, 9x4 − 0.7x3 + 0, 6.

Mais uma vez L = 0, 9 e agora M = 5 0, 6 ≈ 0, 9028804514.
Assim, L + 1 = 1, 9 > 1, 81 > 2M . Portanto, neste caso, se p(ξ) = 0 a
melhor conclusão que se pode chegar com o que foi exposto nesta seção é
que |ξ| ≤ 2M ,
Esses exemplos mostram que se L < 1 há situações em que a estimativa
fornecida pelo fato 6 é melhor do que a obtida no fato 7 e há também
exemplos do contrário.
Para encerrar duas obervações, uma simples e imediata pra relacionar
o teorema de Sturm e os resultados desta seção, colocada na forma de
exercı́cio, e uma nada trivial, apenas para talvez motivar o leitor interes-
sado em aplições a aventurar-se pelos caminhos do estudo de funções bem
comportadas de C em C.
Primeiro o exercı́cio simples.

Exercı́cio 10 Seja p(x) um polinômio de coeficientes reais e grau n ≥ 1.


Considere a função contadora de Sturm νp definida na seção 2.3 e a
constante M dada no fato 6. Prove que νp (−2M ) − νp (2M ) é o número
de raı́zes reais de p (contadas sem levar em conta a multiplicidade destas
raı́zes).

Agora a observação que nada tem de trivial.


Um resultado que é visto no estudo de funções analı́ticas de C em C é o
teorema de Rouché que é enunciado a seguir no contexto de polinômios (o
resultado vale para o caso em que f e g são funções analı́ticas de variável
complexa, seja lá o que for isso).
n m
ak z k e g(z) = bj z j polinômios de coeficientes
P P
Fato 8 Sejam f (z) =
k=0 j=0
complexos e de grau, respectivamente, n e m.
Suponha que R > 0 e, para todo z ∈ C tal que |z| = R, tem–se
|f (z) − g(z)| ≤ |f (z)| + |g(z)|, então o número de raı́zes de f e g, contadas
com sua multiplicidade, em DR = {x ∈ C : |x| ≤ R} é o mesmo.

Uma aplicação imediata deste resultado de Rouché é a seguinte genera-


lização do fato 5.

17
n
ak z k é um polinômio de coeficientes com-
P
Fato 9 Suponha que p(x) =
k=0
plexos e grau n ≥ 1 e R > 0 é um real tal que, para algum ` ∈ {0, 1, . . . , n}
tem–se
n
|a` |R` > |ak |Rk .
P
(†)
k=0,k6=`
Então a soma das multiplicidades das raı́zes de p em DR = {x ∈ C : |x| ≤ R}
é `.
Note que o fato 5 é um caso particular deste, na situação em que ` = n.
Demonstração: Veja que, de (†), tem–se a` 6= 0.
Faça f (z) = p(z), g(z) = a` z ` , e note que, se |z| = R então
n n
ak z k ≤ |ak |Rk < |a` |R` = |g(z)| ≤
P P
|f (z) − g(z)| =
k=0,k6=` k=0,k6=`
|f (z)| + |g(z)|.
Segue-se do fato 8 que a soma das multiplicidades das raı́zes de p(z) e g(z)
em DR é a mesma e como a` 6= 0 tem-se a tese.

Aplicação:
Considere p(x) = x5 − 5x4 + 6x3 + 4 que foi analisado no exemplo 8.
Como p(2, 6) = −0, 21824 < 0 tem-se que 5(2, 6)4 > (2, 6)5 + 6(2, 6)3 + 4,
assim, uma aplicação direta do fato 9 mostra que a soma das multiplicidades
das raı́zes de p em {z ∈ C : |z| ≤ 2.6} é 4.
Agora veja que, no exemplo 8 viu-se que todas as raı́zes de p estão em
{z ∈ C : |z| ≤ 7}, então, como p tem grau 5, tem–se:
(i) A soma das multiplicidades das raı́zes de p em {z ∈ C : |z| ≤ 2.6} é 4
(ii) Há uma, e apenas uma raiz, ξ, de p tal que 2, 6 < |ξ| ≤ 7 e esta raiz é
simples (use o teorema fundamental da álgebra para ver isso).
(iii) Como p tem coeficientes reais, tem–se que ξ ∈ R. (porque?)
n m
ak z k e g(z) = bj z j polinômios de coefi-
P P
Exercı́cio 11 Sejam f (z) =
k=0 j=0
cientes complexos e de grau, respectivamente, n e m.
Suponha que R > 0 e, para todo z ∈ C tal que |z| = R, tem–se
|f (z) − g(z)| ≤ |g(z)| e prove que, então o número de raı́zes de f e g, con-
tadas com sua multiplicidade, em DR = {x ∈ C : |x| ≤ R} é o mesmo.
Sugestão: Use que |g(z)| ≤ . . . e aplique o fato 8.

18

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