Diversidades Sexuais e Expressões de Gêneros Os Direitos À Cidadania
Diversidades Sexuais e Expressões de Gêneros Os Direitos À Cidadania
Diversidades Sexuais e Expressões de Gêneros Os Direitos À Cidadania
DOI: https://doi.org/10.35919/rbsh.v24i1.188
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ARTIGOS OPINATIVOS E DE ATUALIZAÇÃO
Resumo: Este artigo se divide em três momentos: um panorama histórico-conceitual que dialoga com
o ativismo político e emancipatório das lutas empreendidas pelo movimento LGBTTTI – Lésbicas, gays,
bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros e intersexos; um compilado teórico conceitual advindo de
pesquisas e estudos acadêmicos; problematizações a respeito da emergência das homofobias, lesbofo-
bias e transfobias.
Palavras-chaves: diversidades sexuais; gêneros; direitos humanos; cidadania
Abstract: This paper is divided into three stages: a historical and conceptual overview that dialogues with political and eman-
cipatory activism of the struggles undertaken by LGBTTTI movement – Lesbian, gay, bisexual, transsexual, transgender and
intersex; a conceptual theoretical compiled arising from academic research and studies; problematizations about the emergence
of homophobia, lesbofobias and transfobias.
Keywords: sexual diversity; genders; human rights; citizenship
2013 SBRASH - Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana RBSH 2013, 24(1); 53 - 69
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História social, política e cultural de dissidências: Friedman em 1963, e na Inglaterra por “Políticas
do ativismo político à produção acadêmica. sexuais” de Kate Millett, em 1969.
As décadas de 1960 e 1970 podem ser Em consonância com os estudos
consideradas como os mais importantes anos feministas, questões relacionadas aos estudos
disparadores de acontecimentos sociais, políticos, sobre as homossexualidades, avançarão em suas
intelectuais e culturais em diversas partes do reflexões através do ensaio a respeito do papel
mundo. O final da década de 1960 foi marcado como do homossexual na Inglaterra, de Mary McIntosh
um período de muita contestação e rebeldia, sendo (1968), promovendo o primeiro enfrentamento sobre
muito conhecida a referência ao maio de 1968 na as questões da identidade sexual. Este trabalho
França, mas também por diversas manifestações apenas obteve reconhecimento a partir da metade
coletivas que eclodiam em outros países, tais como dos anos 1970, quando foi retomado por escritores
Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha, quando que relacionavam questões do feminismo e da
intelectuais, jovens estudantes, trabalhadores e liberação gay. Esses estudiosos da história gay e
trabalhadoras, negros e mulheres expressaram suas lésbica deram início ao resgate de documentos e
insatisfações diante dos conservadores arranjos biografias invisíveis, negligenciados ou suprimidos
sociais e políticos que se orientavam por teorias por arquivistas e historiadores.
universalistas que, por sua vez, produziam um Jeffrey Weeks (1977) será reconhecido
grande vazio acadêmico, colocando em discussão e considerado o primeiro historiador inglês a se
questões como segregação e discriminação que interessar pelo estudo da sexualidade na Inglaterra.
eram silenciadas pelo aparelho de Estado e seus Recorrendo ao estudo de McIntosh sobre o papel da
seguidores. Surgiram, então, movimentos políticos homossexualidade na Inglaterra, Weeks apresenta
e culturais que se solidarizaram com os grupos que a distinção entre comportamento homossexual
eram colocados à margem ou desvalorizados por – universal – e identidade homossexual –
suas origens. desenvolvida histórica e culturalmente – pautado
Em consequência dessas ações, alguns pela relação com a reorganização da família, gênero
desdobramentos se efetivaram em acréscimo às e do lar da Grã-Bretanha do século XIX. Em 1975,
preocupações sociais e políticas do movimento Gayle Rubin publica o celebre ensaio “Tráfico de
feminista que estavam em processo, tais como mulheres”, criticando a visão essencialista de que
as lutas pela emancipação social e política de sexualidade e reprodução estabeleciam os gêneros.
direitos de igualdades entre homens e mulheres, Para ela, existe um aparelho social que toma as
culminando em algumas construções teóricas fêmeas como matérias-primas e molda as mulheres
e reflexivas emergidas pelas próprias mulheres domesticadas como produto de troca. Neste ensaio
que adentraram o universo acadêmico, ficando a autora desenvolve o conceito de sistema sexo/
conhecido como a “segunda onda” do feminismo. gênero criticando o atrelamento desses termos
Foi, portanto, nesse contexto social e entre si, evidenciando que nem sempre existem
político que a emergência de livros, jornais e revistas relações entre eles, muito embora esse sistema
fez surgir uma nova conjuntura discursiva para o funcione como um dispositivo de organização das
universo acadêmico, demarcando o surgimento dos relações sociais e da sociedade como um todo.
estudos sobre a mulher. Entre as mais evidentes Em 1984, Gayle Rubin apresenta o texto
publicações houve maior visibilidade para o célebre “Thinking sex” e sugere nova desconstrução do
livro publicado na França por Simone de Beauvoir sistema sexo/gênero, dividindo-o em dois domínios,
“O segundo sexo”, de 1949, sendo seguido nos diferenciando sexualidade e gênero como sistemas
Estados Unidos por “O feminino místico” de Betty distintos por requererem estruturas explicativas