Acordao - 2024-06-20T123412.571

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ

5ª CÂMARA CÍVEL

Autos nº. 0016975-84.2011.8.16.0004

Apelação Cível n° 0016975-84.2011.8.16.0004


Secretaria Unificada das Varas da Fazenda Pública - 2ª Vara
Apelante(s): COPEL DISTRIBUIÇÃO S.A. e MILTON LIMA BONIFACIO
Apelado(s): COPEL DISTRIBUIÇÃO S.A. e MILTON LIMA BONIFACIO
Relator: Desembargador Renato Braga Bettega

APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO MONITÓRIA - COBRANÇA DE


FATURAS DE ENERGIA ELÉTRICA - CORREÇÃO MONETÁRIA -
IPCA-E - ÍNDICE ADEQUADO PARA A REPOSIÇÃO
INFLACIONÁRIA - JUROS MORATÓRIOS - CONTAGEM DESDE O
VENCIMENTO DE CADA FATURA INADIMPLIDA - OBRIGAÇÃO
POSITIVA, LÍQUIDA E A TERMO - INTELIGÊNCIA DO ART. 397
DO CÓDIGO CIVIL - RECURSO I (COPEL) CONHECIDO E
PARCIALMENTE PROVIDO - JUSTIÇA GRATUITA -
CONSUMIDOR ASSISTIDO PELA DEFENSORIA PÚBLICA - SINAL
DE HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA, AVALIZADA POR
CRITERIOSA ANÁLISE DA INSTITUIÇÃO QUE O REPRESENTA -
RECURSO II (RÉU) CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso de apelação cível n.


0016975-84.2011.8.16.0004, da 2ª vara da fazenda pública de Curitiba, em que são apelantes
Copel Distribuição S.A. e Milton Lima Bonifácio, sendo apelados os mesmos.

I - RELATÓRIO

Cuida-se de ação monitória movida por Copel Distribuição S.A. contra Milton Lima Bonifácio.
Segundo consta da inicial, o réu inadimpliu faturas de energia elétrica relativas aos meses de
fevereiro a maio de 2007, no importe de R$ 4.795,21 (quatro mil, setecentos e noventa e cinco
reais e vinte e um centavos).

Assim, seguindo o rito da ação monitória, a autora requereu fosse ordenado o pagamento de
R$ 8.615,41 (oito mil, seiscentos e quinze reais e quarenta e um centavos), valores
correspondentes ao débito principal atualizado até 24/02/2011, com multa moratória de 2%,
juros moratórios de 1% a.m. e correção monetária pelo INPC.

Deferida a expedição de mandado de pagamento, na forma do art. 1.102 e ss. do CPC/73


(mov. 1.2, p. 16).

O réu compareceu aos autos espontaneamente por meio da Defensoria Pública, requerendo a
concessão do benefício da Justiça Gratuita (mov. 1.2, p. 26).

A autora requereu a declaração de revelia do réu, pelo não oferecimento de resposta dentro
do prazo legal (mov. 1.3, p. 12).

A defensoria pública renovou o pedido de Justiça Gratuita e postulou pela designação de


audiência de conciliação (mov. 1.3, p. 24).

A COPEL acusou a ausência de oposição à ação monitória, razão pela qual propugnou pela
conversão do mandado de pagamento em título executivo judicial, inaugurando-se a fase de
cumprimento de sentença (mov. 5.1). Ainda, apresentou planilha de cálculo com os valores
atualizados do débito, no montante de R$ 28.683,31 (vinte e oito mil, seiscentos e oitenta e três
reais e trinta e um centavos) - mov. 5.2.

Os autos seguiram conclusos ao Exmo. Juiz Thiago Flôres Carvalho, que reconheceu a
constituição de título executivo judicial. Na mesma decisão, determinou que a correção
monetária, pelo IPCA-E, seria contada do vencimento de cada fatura, e que os juros
moratórios, de 1% a.m., incidiriam desde a citação (mov. 10.1).

Opostos embargos de declaração pela COPEL (mov. 15.1), inteiramente rejeitados (mov.
34.1).

Ambas as partes recorreram da sentença.

A autora pediu a reforma do decisum, para que os juros moratórios sejam contabilizados desde
o vencimento (art. 397, CC), e para que a correção monetária tenha como índice o INPC,
aplicável às tarifas de energia elétrica à época do inadimplemento (mov. 39.1).

O réu requereu o reconhecimento dos benefícios da Justiça Gratuita, destacando a


representação, em seu favor, da Defensoria Pública. Consequência disto, pediu a suspensão
da exigibilidade das custas processuais e honorários advocatícios estabelecidos em seu
desfavor, com fundamento no art. 98, §3º do CPC (mov. 19.1).

Contrarrazões de lado a lado (mov. 29.1 e 47.1).

É o relatório.

II - VOTO E FUNDAMENTAÇÃO

Os recursos preenchem todos os pressupostos - intrínsecos e extrínsecos - de admissibilidade.

Cuida-se de ação de cobrança, processada pelo rito monitório, que conta com a COPEL
DISTRIBUIÇÃO S.A. no polo ativo e MILTON LIMA BONIFÁCIO no polo passivo.
A sentença, de lavra do Exmo. Juiz Thiago Flôres Carvalho, condenou o réu ao pagamento de
4 faturas de energia elétrica, inadimplidas entre os meses de fevereiro e maio de 2007, com
correção monetária pelo IPCA-E desde cada vencimento e juros moratórios de 1% a.m.
contados da citação. Ainda, arbitrou os honorários advocatícios em R$ 3.000,00 (três mil
reais).

Ambas as partes recorreram. A autora, para que o débito seja corrigido pelo INPC/IBGE, com
juros moratórios de 1% a.m. contados do vencimento, e não da citação. O réu, para que lhe
sejam concedidos os benefícios da Justiça Gratuita (JG), com a consequente suspensão da
exigibilidade dos encargos sucumbenciais.

É o que se passa a analisar.

RECURSO DE APELAÇÃO I (COPEL)

Como adiantado, a autora insurge-se contra 2 (dois) aspectos da sentença: a) correção


monetária (aplicação do INPC/IBGE ao invés do IPCA-E); b) juros moratórios (incidência desde
o vencimento, e não desde a citação).

A correção monetária sobre débitos de energia elétrica, desde a vigência da Resolução


414/2010 da ANEEL, tem como índice o IGP-M, com fundamento no artigo 126.

Contudo, no presente caso, os débitos dizem respeito aos meses de fevereiro a maio de 2007.
E a Resolução 456/2000 da ANEEL, então vigente, não contém disposição semelhante. O art.
89, que versa sobre encargos moratórios, trata apenas sobre multa:

Art. 89. Na hipótese de atraso no pagamento da fatura, sem prejuízo de


outros procedimentos previstos na legislação aplicável, será cobrada multa
limitada ao percentual máximo de 2 % (dois por cento) sobre o valor total
da fatura em atraso, cuja cobrança não poderá incidir sobre o valor da
multa eventualmente apresentada na fatura anterior.

Assim, no silêncio dos atos normativos aplicáveis ao setor, entende-se por bem manter o
IPCA-E, índice este que, aliás, vem sendo aplicado por esta Câmara de forma geral, dada a
sua capacidade de preservar o poder da moeda contra o fenômeno inflacionário.

No que concerne aos juros moratórios, estabelece o art. 397 do CCB/02 que: “O
inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em
mora o devedor”.

Sobre a norma em comento, Carlos Roberto Gonçalves ensina que:

“... quando a obrigação é positiva (dar ou fazer) e líquida (de valor certo),
com data fixada para o pagamento, seu descumprimento acarreta,
automaticamente (ipso iure), sem necessidade de qualquer providência do
credor, a mora do devedor (ex re), segundo a máxima romana dies
interpellat pro homine (o dia do vencimento interpela pelo homem, isto é,
interpela o devedor, pelo credor”. (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito
Civil Brasileiro. Teoria Geral das Obrigações. 13ª Edição. Editora
Saraiva. Ano: 2016. P.: 388).

A partir do momento em que o réu inadimpliu cada fatura, ele automaticamente entrou em
estado de mora, pois o vencimento interpela pelo homem (dies interpellat pro homine),
dispensando qualquer providência do credor (mora ex re).

O assunto não é inédito para este Tribunal, que assim já decidiu:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - FATURAS DE ENERGIA


ELÉTRICA - CÔMPUTO DE JUROS MORATÓRIOS A PARTIR DO
VENCIMENTO DE CADA FATURA - PRESTAÇÃO POSITIVA E LÍQUIDA -
MORA EX RE - DESNECESSIDADE DE PROVIDÊNCIA DO CREDOR
PARA CONSTITUIÇÃO DO DEVEDOR EM MORA - INTELIGÊNCIA DO
ARTIGO 397 DO CÓDIGO CIVIL - SENTENÇA CONFIRMADA. Nos
termos do caput do artigo 397, do Código Civil, em se tratando de
prestação positiva e líquida, com termo de vencimento definido, a
constituição em mora independe de qualquer ato do credor. Nessa
situação, os juros moratórios são computados a partir do vencimento da
obrigação. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 12ª
C.Cível - AC - 1014491-1 - Campo Mourão - Rel.: DESEMBARGADORA
ROSANA AMARA GIRARDI FACHIN - Unânime - J. 21.08.2013).

Em reforço, o CPC/15, quando diz que a citação constitui o devedor em mora, excetua
expressamente o caso do art. 397 do CCB/02 (obrigação positiva, líquida e a termo).
Observe-se:

Art. 240, CPC. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo
competente, induz litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em
mora o devedor, ressalvado o disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº
10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

Em remate, o voto é pelo conhecimento e parcial provimento do recurso I, da COPEL, para


que os juros moratórios, de 1% a.m., sejam contados do vencimento de cada fatura.

RECURSO DE APELAÇÃO II (CONSUMIDOR)

O pedido de concessão do benefício da Justiça Gratuita e suspensão da exigibilidade dos


encargos sucumbenciais merece acatamento.

Veja-se que o réu tem seus interesses custodiados pela Defensoria Pública do Estado do
Paraná (mov. 1.2, p. 28), instituição responsável pela representação jurídica dos necessitados,
conforme dicção do art. 134 da CF:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à


função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e
instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação
jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus,
judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma
integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art.
5º desta Constituição Federal .

Se o réu está sendo representado pela Defensoria Pública, é porque comprovou seu estado de
hipossuficiência financeira, tendo passado pelo criterioso processo de triagem da
instituição que o representa. Inúmeros precedentes desta Câmara apontam neste sentido. A
propósito:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO


EXTRAJUDICIAL – DESISTÊNCIA DA AÇÃO – CONDENAÇÃO DA
PARTE DESISTENTE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS -
PEDIDO DE CONCESSÃO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA -
PARTE ASSISTIDA PELA DEFENSORIA PÚBLICA - PROCEDIMENTO
DE TRIAGEM RIGOROSO PARA OS ASSISTIDOS DA DPE/PR - ART. 5º
DA DELIBERAÇÃO Nº 042/2017 DO CONSELHO SUPERIOR DA DPE/PR
- CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 5ª C.Cível -
0023840-88.2018.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR
RENATO BRAGA BETTEGA - J. 08.02.2021).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE


FINANCIAMENTO COM GARANTIA EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.
PEDIDO DE CONCESSÃO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA
FORMULADO EM SEDE RECURSAL. RÉU REVEL. ALEGAÇÃO DE
HIPOSSUFICIÊNCIA. PARTE ASSISTIDA PELA DEFENSORIA
PÚBLICA. PROCEDIMENTO DE TRIAGEM RIGOROSO AOS
ASSISTIDOS PELA DPE/PR. ART. 3º DA DELIBERAÇÃO Nº 19/2014 DO
CONSELHO SUPERIOR DA DPE/PR. CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA GRATUITA. RECURSO PROVIDO. (TJPR - 18ª C. Cível -
0005102-21.2019.8.16.0194 - Curitiba - Rel.: Desembargador Espedito
Reis do Amaral - J. 01.06.2020).

APELAÇÃO - BUSCA E APREENSÃO - CONTRATO DE


FINANCIAMENTO COM GARANTIA EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA -
PEDIDO DE CONCESSÃO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA -
PEDIDO FORMULADO EM SEDE RECURSAL - RÉU REVEL -
ALEGAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA - PARTE ASSISTIDA PELA
DEFENSORIA PÚBLICA - PROCEDIMENTO DE TRIAGEM RIGOROSO
PARA OS ASSISTIDOS DA DPE/PR - ART. 3º DA DELIBERAÇÃO Nº
19/2014 DO CONSELHO SUPERIOR DA DPE/PR - CONCESSÃO DA
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA - RECURSO CONHECIDO E
PROVIDO. (TJPR - 4ª C. Cível - AC - 1709614-5 - Curitiba - Rel.:
Desembargadora Regina Afonso Portes - Unânime - J. 04.12.2018).

Assim, a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita é medida de absoluto rigor, tendo como
consequência a suspensão da exigibilidade dos encargos sucumbenciais (art. 98, §3º do
CPC).

Não se desconhece o entendimento da jurisprudência no sentido de que a concessão da JG


tem eficácia “ex nunc”. Contudo, no caso em apreço, o réu requereu em 02 oportunidades a
concessão do benefício (mov. 1.2, p. 26, 1.3, p. 24), não sendo o pedido apreciado.

Logo, como a parte não pode ser prejudicada pela falta do Poder Judiciário, o reconhecimento
do benefício deve retroagir à data do primeiro requerimento (mov. 1.2, p. 26), abrangendo os
encargos sucumbenciais estipulados na sentença.

Em conclusão, o voto é pelo conhecimento e provimento do recurso de apelação II, do


consumidor, para conceder-lhe os benefícios da Justiça Gratuita e determinar a suspensão da
exigibilidade da verba sucumbencial (art. 98, §3º do CPC).

III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 5ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso I
(COPEL) e provimento ao recurso II (consumidor).
O julgamento foi presidido pelo Desembargador Renato Braga Bettega (relator), com voto, e
dele participaram Juiz Subst. 2ºgrau Marcelo Wallbach Silva e Desembargador Carlos Mansur
Arida.

03 de dezembro de 2021

Desembargador Renato Braga Bettega

Relator

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