Sandra Pesavento - Porto Alegre Caricata - A Imagem Conta A História-UE - Secretaria Municipal Da Cultura (1993)
Sandra Pesavento - Porto Alegre Caricata - A Imagem Conta A História-UE - Secretaria Municipal Da Cultura (1993)
Sandra Pesavento - Porto Alegre Caricata - A Imagem Conta A História-UE - Secretaria Municipal Da Cultura (1993)
CD
Prefeifnra m
de Porto Alegre
•CMINISTOUCO BOPVJL"
MAIS CIDADE. MAIS CIDADANIA.
TARSO GENRO
Prefeito
RAULPONT
Vice-Prefeíto
Coordenação
Sandra Jatahy Pesavento
1994
ARICATA
Ficha Técnica:
O
Coordenação: Sandra Jatahy Pesavento
Pesquisa: Adriana Tyburski
s AÍice Trusz
Cláudia Mauch
Maria Angélica Zubaran
Ricardo Pacheco
Sônia Ranincheski
CDD 741.590981651
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g SUMARIO
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A CONSOLIDAÇÃO DO PRR:
O AUTORITARISMO ILUSTRADO 41
REPRESENTAÇÕES DO SOCIAL:
NEGROS E BRANCOS, POBRES E RICOS 51
A TRAGICÓMICA CIDADE:
ADMINISTRAÇÃO, RUAS. SAÚDE PÚBLICA 75
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aparec
ARICATA
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cS' Aristóteles na Rua da Praia
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Jorge Pozzobon
Imaginemos que um dia se achasse o tropólogo sobre o outro cultural, pois, quando
célebre ensaio desaparecido de Aristóteles, se põe a pesquisaro imaginário de outra época,
Sobre o Riso. Os filósofos talvez quisessem o historiador é uma espécie de antropólogo na
verificar se ele desenvolve o que escreveu na máquina do tempo. É o que faz este livro de
Poética: o cômico é algo feio ou equivocado Sandra Pesavento e das pesquisadoras de sua
que não provoca dor ou dano. Os leigos, como equipe. Ao nos apresentarem a história da
monges de Umberto Eco em O Nome da Rosa, caricatura em Porto Alegre no século passado,
procurariam, quem sabe, umas boas piadas. E elas nos jogam dentro de um tempo em que os
os historiadores, o que fariam? critérios do cômico, de certo, eram outros. Mas
Não precisamos recuar dois mil anos na de que natureza seria essa alteridade? Se
história para acharmos tipos de humor diferen descontarmos os conteúdos de época, será
tes do nosso. Uma vez um índio Tucano me que existe uma sintaxe do cômico capaz de
contou uma história: "Um dia, o corococó cha atravessar os tempos? A comicidade é sempre
mou as minhocas e disse: - Saiam da toca, que resultado do equívoco, como quer Aristóteles?
eu vou lhes contar uma história. As minhocas Se um livro se avalia pelas questões que
saíram e foram todas devoradas pelo corococó." coloca mais do que pelas respostas que dá, eis
O índio me contou isso e desatou a rir. Natural aí um exemplo do que este livro pode ensejar.
mente, é preciso buscar o lugar do corococó e Aliás, sua divisão em blocostemáticos já é uma
das minhocas no imaginário indígena para en pista para a formulação de uma série de hipó
tendera piada, coisa que não vem ao caso aqui. teses: Alegorias do processo político; A
O que nos interessa é o olhar do an consolidação do Partido Republicano
Q ARICATA
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O
w Riograndense; Representações do social; A
Q mulhercomo alegoria do poder; Múltiplos retra-
S tos da mulher, A tragicômica cidade,
o
a.
Esse caráter plural do cômico nos remete
de novo a Aristóteles. Ele escreveu na Metafísica
que o ser se diz de muitos modos. Se concor
darmos com Heidegger em que o ser e o tempo
se pertencem, podemos dizer o mesmo dessa
crônica dos tempos que é a história: ela tam
bém se diz de muitos modos, inclusive através
dos vários modos de achar graça. (Que o leitor
vá desculpando essa seqüência de considera
ções sérias e de citações vetustas, mas uma
apresentação engraçada seria pleonasmo.)
Resta dizer, enfim, que este livro resulta
de uma exposição com o mesmo título, inaugu
rada em novembro de 1993 no Museu de Porto
Alegre - um órgão da Secretaria Municipal da
Cultura que vem se mostrando cada vez mais
apto a expressar a riqueza histórica da cidade,
quer através de iniciativa própria, quer através
de colaborações como esta, em que a Prefeitu
ra Municipal e a Universidade Federal do Rio
Grande do Sul estiveram concretizando o con
vênio firmado no início do ano.
8
ARICATA
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o DIABO ESCONDIDO
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O (DA ARTE DO CÔMICO)
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tí. Sandra Jatahy Pesavento
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O.
Alusão ao relacionamento do Partido Liberal, liderado por Gaspar Silveira Martins, com seus eleitores antes e depois
das eleições.O Século, 25 jun. 1862
tecnológico. Mas, por outro, as grandes tira da impressão, concebida para ser um suporte
gens, a preço mais acessível para as camadas da mensagem discursiva, tornou-se também
populares, foram ao encontro do aumento das um veículo de propagação da imagem visual.^
populações urbanas e da complexificação da Conquistando as ruas e os espaços públi
vida social. cos tanto quanto o interior do lar burguês, as
É neste contexto que o desenvolvimento imagens do cômico, associadas às legendas
Agulhon, Maurice, Préface. In: Mlchaut, Stéphane et alli. Usages de rimage au XIXe siècle. Paris. Créaphis, 1992.
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2Baudelaire, Charles. Da essência do riso e, de um modo geral, do cômico nas artes plásticas. In; Baudelaire, Charles. Escritos sobre arte.
Org. Plínio Augusto Coelho. Sâo Paulo, Imaginário/Ed. da USP, 1991. p.34-5.
^Vailiant, Alain. Le rire. Paris, Quintette, 1991. p.6.
* Ibidem, p.15.
^ Marín, Louis. Despouvoirs de llmage. Paris, Seuil, 1992. p.14.
12
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®Bertrand, JeanPierre, Uhumorjaunedescomplaints. In:Romantísme, Revuedu DixneuvièmeSiècle. Les petitsmaítresdu rire. Paris. CDU
SEDES, n. 75, 1992. p.3,
' Gonçalves, Aguinaldo José. 0 olhar refratãrlo de Charles Baudelaire. In: Baudelaire. op. cit., p. 16-7.
®Baudelaire, op.cit., p.39-40.
Q ARICATA
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®Ginzburg, Cario Mitos, emblemas, sinais. Sâo Paulo, Companhia das Letras, 1989.
No sentido usado por:
BsMhm.MikhaW.WoeuvredeFrançoisRabelaisetIaculturepopulaireau Moyen âge et sousia Renaissance. Paris, Galíimard, 1970.
C ARICATA
caricaturais, fazendo chegar até o presente do racional, a leitura da crítica deve ser resga
uma visão alternativa e dissonante. Neste sen tada na legenda completa que acompanha o
tido é que a concepção benjaminiana pode ser desenho: "La fantasia abandonada de Ia razón,
resgatada, entendendo a caricatura como par produce monstruos imposibles: unida con ella,
te do imaginário de uma época que, do passado, es madre de Ias artes y origen de sus
nos acena com uma outra possibilidade de maravillas..."^L A concepção, implícita, a nosso
atingi-la. ver, recupera a força criadora da imaginação
Por outro lado - ainda usando Walter
" Benjamin. Walter. Paris, capitale du XIXe siécie. Lelivre des passages. Paris, CERF, 1989.
" Goya, Francisco. Los caprichos. New York, Dover Pubíications, 1969.
ARICATA
S como base da atividade artística e científica, povo francês. Cremos que Daumier, com argú
Ü
3 enquanto formas de representar o real ou para cia e traço fino, ultrapassou o anedótico e a
<
o ele voltar-se como objeto de análise. A partir daí crítica de costumes e chegou a captar a fragili
o é que podemos apreciar a obra satírica do dade das relações entre os homens e suas
Om
''Daumier. 120great Êhographs. Edited by Charles Ramus. New York, Dover Publications, 1978.
20
ARICATA
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GOYA -LOS (^APRICIIoy
Q ARICATA
S ção do cômico na arte remete mais uma vez a sonagens e condutas, estabelecendo uma
^ Baudelaire, com a sua concepção do "cômico verdadeira crítica social do cotidiano.
22
C ARICATA
ARICATA
2 que tinham seus traços fisionômicos muito bem "No caso específico do Zé do Povo, a
^ caracterízados. Há quem diga, inclusive, que o vontade de crítica, expressa na denúncia dos
Imperador devesse grande parte de sua popu- efeitosproblemáticos que 'coisas governamen
laridade às inúmeras caricaturas que tais' e outros núcleos de poder produziam em
popularizavam a sua imagem, e também à sua vida, evidencia articulações explícitas com
tolerância com que enfrentava seus críticos, a vida social brasileira. Seu próprio nome fazia
ficando por vezes envaidecido de ser o tema de referência ao regime político ( república, 'coisa
tantos artistas gráficos.. do povo'), aproximando-o do desengano crítico
Parte significativa deste universo em relação as virtuais dimensões igualitárias
caricatural foi resgatada pela obra de Herman anunciadas quando da luta por sua instaura
Lima, História da Caricatura no Brasil, editada ção'"^.
pela José Olympio. E como se comportaria frente a este estilo
República proclamada, o gênero irreverente e transgressor da ordem o Rio Gran
caricatural ganhou novo alento com as revistas de do Sul, que tradicionalmente tem o seu papel
Fon-Fon! , O Malho e Careta, nas quais se associado a imagens tão sérias quanto a guer
destacava a representação esteriotipada do Zé ra, o positivismo, os grandes líderes políticos,
Povo^^. etc., etc.?
Personagem síntese do tipo popular bra Na Porto Alegre da virada do século aos
sileiro, Zé Povo vivia a reclamar da injustiça anos 10, jornais e revistas caricaturavam a vida
social e de sua situação como cidadão de político-partidária e as instituições da terra,
segunda classe, fazendo reflexões sobre o aludiam à precariedade dos serviços públicos
regime e a vida das camadas subalternas. urbanos e às más condições de vida e trabalho
Refere Marcos Silva: do povo, zombando também dos hábitos da
'®lbidem. p. 12-3.
^^Silva, MarcosA. da. CaricataRepúbBca. Zé Povo e o Brasil. São Paulo, MarcoZero/CNPq, 1990.
Ibidem, p.10.
24
(2 ARICATA
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1 ^
que se trata de um lado "mais leve" de vislum Mais do que isto, resgatar as imagens do
brar o passado, mas a seriedade nào pode ser cômico implica surpreender novas facetas da
confundida com a sisudez.., vida da cidade, descobrindo uma alegre - ou
Caricaturas, charges, piadas e sátiras trágica - Porto Alegre, que se expressou no
revelam um olhar crítico e mordaz sobre o real, traço ágil dos seus caricaturistas, verdadeiros
cabendo ao historiador realizar as mediações espectadores do urbano.
necessárias, possiveis e múltiplas com o con Encarada desta forma, a arte do cômico
texto econômico, social e político onde pode ser um assunto muito sério...
medrarem aquelas expressões da arte do cômi-
Sandra Jatahy Pesavento: Doutora em História
7 X:-
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Moh\s DK p\iu/
Míi^fKili .1 l.f chfvai
A Sentinella do Sul, 08 dez. 1867
ARICATA
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"Os nossos pinta-monos'
' 'como disse onosso bom eerudito amigo dr. Alcides Cruz, acaricaturaéaalma-
mater do jornal moderno. Sem ella, hoje em dia, a vista do jornal ou da revista literária
é monotona e a leitura despida do attractivo confortante do riso.
A critica perde aquele sabor picante que reside na ironia do traço e somente
nelle, para assumir, muita vez, a attitudéoffensiva de um termo que não representa
fielmente o que queremos enunciar.
A caricatura é o meio termo, malhavel por excellencia, tem a feitura bifronte de
Jano, interpreta, quasi sempre, o pró e o contra veladamente.
Nisto consiste sua necessidade nas revistas de arte, em que a crítica se impõe
aos homens e ás coisas, de um modo frisante, porem macio e educado. (...)
29
(2 ARICATA
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O civilista Rui e o militarista Hermes, segundo a Careta
ARICATA
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I - ALEGORIAS DO PROCESSO POLITICO:
o DA MONARQUIA À REPÚBLICA
Oí Ricardo Pacheco
2
O contexto do início do século, quando se cartunistas que aludem o limite desse processo
alterava o regime político do país, é marcado político.
pela existência de três partidos políticos: o Como cães que disputam um osso, como
Conservadore o Liberal, oriundos e comprome a briga de cão e gato ou como Dom Quixote que
tidos com a monarquia, e o Republicano, ataca inimigos imaginários, a disputa política
precursor do novo regime. entre os partidos de então não envolve, como
O tom da sátira política desse momento, nos mostram essas representações, profundas
porém, trata essas diferentes estruturas parti diferenças ideológicas. Ao contrário, cada um
dárias como possuidoras de uma identidade dos grupos espera, como bezerros desmama-
comum. Quando observa-se a prática política dos, o momento de desfrutar das tetas da mãe
mostram-se, os três, elitistas e fisiológicos. pátria.
Tratam, os grupos sociais agremiados, de man Não se apresenta, entre os diferentes
ter as camadas subaltemas da sociedade partidos políticos, discórdia quanto ao objetivo
isoladas do processo político, fazendo desse a primeiro da prática política ou quanto ao papel
arte de manter, através do controle absoluto do a ser desempenhado pelos grupos subaltemos
Estado, as estruturas que estabelecem a desi nessa esfera. Estando baseados na mesma
gualdade da sociedade. classe social- a dos proprietários dos meios de
Assim, não é de estranhar que o Zé produção - os partidos estão dispostos a pro
Povinho, personagem caricato dos grupos su mover, sempre que for preciso evitar a
balternos, não tenha seu retrato nessas participação popular, uma ampla conciliação.
alegorias ou o tenha como um coitado, a quem A adesão ás causas populares, tais como
tudo é ofertado no momento do voto para, a abolição, são tomadas e cobradas no mo
depois das eleições, ser chutado do cenário mento oportuno, quando essas já se tomam
político. A compra de votos e o peso do dinheiro inevitáveis. O adesismo é visto, então, ou como
no processo eleitoral, mais do que metáforas, uma postura para agradar ao eleitorado
são denúncias apresentadas claramente pelos ou como uma imposição que não encabula
31
ARICATA
eí OS parlamentares. O que está em jogo, nesses cartunistas, mais uma troca do grupo político
ü
Cd momentos, é que as reformas se façam, antes dirigente do Estado.
O
que as forças populares se descontrolem, pe
los grupos políticos dominantes. Ricardo Pacheco: bolsista de iniciação científica curso
de História/UFRGS
2 Enquanto isso, a cidade, os serviços ur
banos e as camadas populares ficam
abandonadas por esses administradores públi
cos. O Estado, refém dos propósitos políticos
das elites, se encontra descomprometido com
as condições de vida da maior parte da popula
ção e não investe na infra-estrutura urbana.
Cidadania é, nesse momento, um concei
to obtuso. Responde por cidadão, de um lado,
as elites que, administradoras do Estado, se
pronunciam defensoras do bem comum e, por
outra parte, é um cidadão de bem aquele popu
lar que aceita as arbitrariedades do processo
político estabelecido e não questiona a estrutu
ra excludente então montada.
Vemos, então, que as desigualdades so
ciais e a irresponsabilidade dos homens públicos
não é originalidade de nossa época, assim
como encontramos, já naquele momento, críti
cos corrosivos dispostos a denunciar as
contradições de uma estrutura que comporta
mais excluídos que inclusos no sistema político.
As alegorias do processo político: da mo
narquia à república nos mostram, assim como
concluem diversos estudos com outras fontes,
que a passagem da monarquia à república não
causou grandes transtomos nas estruturas so
ciais existentes. Foi, como denunciavam os
32
Q ARICATA
MIGUEL DE WERNA^
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Crítica à prática dos partidos políticos imperiais (Partido Liberal e Partido Conser
vador), extensiva ao recente Partido Republicano, representado pelo barrete frígio.
O Século. 16 nov, 1884
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A Federação, Jornal do Partido Republicano Riograndense, fundado em 1884, ataca a Monarquia. O Século. 20jan
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Crítica d'0 Sécu/o àqueles conservadores que se apegaram à Leido Ventre Livre de 1871 como solução final da questão
servií. O Século. 20 ago. 1884
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II - A CONSOLIDAÇÃO DO PRR:
O O AUTORITARISMO ILUSTRADO
Cláudia Mauch
2
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Accidcntc' ! ! ! Um dos i)alrador('s do casarão rua da
I.urcja, depois de muito falar, cahiu exhaiisto, vSeudo,
carinhosamente, conduzido para a sua residência pela
nossa ei uz vermelha^ .
Sátira alusiva aos longose cansativos discursos proferidos pelos deputados na Assembléia Legislativa. Kodak. 151
1913
CJARICATA
Ecos da eleição
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— O seu coroné stá ?
— Está; diga o que quer.
—Vancê diga a eile que eu já votei naa
quatro, si é pereiso Ir votá eni Canoa...
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47
ARICATA
Afino I *• Porto Alegre - Sabbado. 7 de Dezembro de 1912 » N. II
l'..i IV—), .un-i»it;ií!io^ ijni; í» si'iw<l(>f Pir»lU'iro eslcjii, ih' facto, a i'PCM'v<'i c.irtav
. .íiM.iv iiiima^ i-anas, /»<j/s une só n-i larUf r •/"•' /••'i/mif stUenr H sua sifnaiva.
íT. Ki;i,tma tfu C<irnn> Je
/< <unc.li,e ecinruiamlo: I),* cscít-vci i' |oi;;íi
nuiiio ni>^ia ti v.utnj, I
— Ctanlei/er .•simIíi.i . .h .. j
A charge evoca a atuação do senador gaúcho Pinheiro Machado e seus conchavos políticos em
nível nacional, envolvendo a articulação das pequenas oligarquias regionais com a sustentação
do PRR frente à aliança café com leite (São Paulo e Minas Gerais) através da criação de uma nova
agremiação partidária, o Partido Republicano Conservador (PRC). Kodak, 07 dez. 1912
A.
dente da República,
achado, queagiu com(
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O
u III - REPRESENTAÇÕES DO SOCIAL:
O NEGROS E BRANCOS, POBRES E RICOS
Sônia Ranincheski
2
Final do século XIX. Porto Alegre vive este personagem questiona a desatenção do
uma nova realidade. Crescimento industrial, poder público ao cidadão pobre, de segunda
passagem para o trabalho livre, expansão urba categoria, marginalizado social e politicamen
na e modificações econômicas. Este contexto te. Ser Zé Povinho era ser subalterno, andar
de mudança, contudo, não altera a questão mal vestido, viver precariamente. Direitos, pou
social; continua a diferenciação entre pobres e cos podiam ter. Ao trabalhador, ao Zé Povinho,
ricos, negros e brancos. Em poucas palavras, a só tocavam deveres.
cidade se transforma sem deixar, porém, de Além dessa diferenciação social, havia
reproduzir mecanismos e situações de discrimi outro tipo de preconceito: o preconceito moral.
nação, segregação e confinamento. A condição de pobreza estava associada à
A utopia é de progresso ilimitado. No vagabundagem, gatunagem, vadiagem. E a
entanto, esse progresso não é voltado para a ação repressiva da polícia traduzia essa visão.
população em geral. Persistem as péssimas Expoente máximo do Zé Povinho era o
condições de trabalho, a miséria da população, negro, que carregava um duplo estigma: a
a carência de moradia, o alto custo de vida, a miséria e a falácia da condição de liberto.
permanente falta de direitos para os de baixo. Ambas se relacionavam. A libertação não signi
A crítica a toda essa situação se dá de ficou melhoria social, pois, se antes eram
várias maneiras. Uma delas é a caricatura. O discriminados por serem escravos, continua
deboche mais uma vez é usado para questionar vam a ser discriminados por serem negros e
a condição imposta a uma parcela da popula pobres. Na tentativa de ascensão social, o
ção... negro vai buscar atingir o ideal da branquidade,
Surge o Zé Povinho. De forma burlesca. difundido pela elite da época, através da misci-
51
ARICATA
ü
genaçâo ou da absorção dos valores do bran
Cd
co. Éa contradiçãodoeufemismo da democracia
g racial (e social) que ao longo da história perma-
O neceu como uma verdade, procurando ocultar
a realidade da discriminação.
Pobres e ricos, negros e brancos. O bene
fício do tempo mostrou que o recurso da
caricatura foi um importante meio de represen
tação da desigualdade social. Veiculada com o
apoio da elite alfabetizada, reproduziu pela
ironia uma situação trágica, sem compromisso
de mudança. Na Porto Alegre da virada do
século, democracia poderia ser uma realidade
para brancos ricos. Para negros e pobres - a
imensa maioria - era um conceito vazio, tão
distante quanto a possibilidade de acesso a
estas caricaturas...
52
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tà IV - A MULHER COMO ALEGORIA DO PODER:
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V - MÚLTIPLOS RETRATOS DA MULHER:
O MORAL, MODA, SEDUÇÃO
Mana Angélica Zubaran
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69
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Á Sra. lí*** u-n .-..jiio aiHjuiíílwi nrn coIcbiVo. E como Itio poso muito,
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o VI - TRAGICÔMICA CIDADE:
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ADMINISTRAÇÃO, RUAS, SAÚDE PÚBLICA
Alice Dubina Tmsz
Uma cidade existe no tempo e no espaço. A Porto Alegrte de 1885-1915 era uma
No espaço porque constitui um quarto de ocu cidade pequena, mas era a capital. O século
pação e povoamento-que se traduz na ação do XiX foi um período de grande crescimento da
homem sobre o meio, transformando-o e sendo cidade, em área e demografia. Vivia-se a "Era
por ele influenciado em suas determinações e dos transportes mecânicos", da máquina a
construções. vapor. A indústria progredia neste ritmo. Para o
A população mantém com a estrutura deslocamento, a população dispunha de bar
urbana uma relação dialética, portanto. Este cos a vapor, locomotivas e bondes movidos a
movimento dinâmico e ininterrupto é a base do tração animal. No final do século, duas compa
desenvolvimento da comunidade, do seu cres nhias dividiam os serviços de abastecimento de
cimento quantitativo e qualitativo. O aumento água, que eram insatisfatórios. A rede pública
da população e a complexificação social de de encanamento atingia apenas algumas ruas.
sencadeiam uma necessidade de reordenação Em 1867, passava a ser utilizado, no consumo
da vida, provocando a multiplicação de meca doméstico e na iluminação da zona central, o
nismos que possam atender às novas gás de hidrogênio. Nos subúrbios, a Intendên-
exigências, o que é fundamental para o funcio cia (Prefeitura) instalara lampiões a querosene.
namento e vitalidade do complexo urbano. Neste O serviço era deficitário e a ampliação da rede
sentido, são mecanismos os serviços de forne de abastecimento esbarrava nos custos do
cimento de água e luz, transporte, saúde, combustível. Apenas em 1908 seria criada a
segurança, etc... Usina Municipal, permitindo a extensão da luz
75
ARICATA
elétrica aos bairros. O recolhimento do lixo foi mostrada de forma crítica e inteligente pelos
ü
bà
urbano era realizado por empresas privadas cartunistas e chargistas daquela antiga Porto
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O até 1898, quando seria municipalizado. Alegre, que optaram por rir de si próprios e de
s A cidade em expansão começava a con sua cidade, ao invés de chorar por ela. Porque
viver também com problemas como a o riso é a melhor arma contra a acomodação, o
especulação imobiliária. Se, por um lado, cres desleixo e a prepotência. Embora possa pare
cia o número de prédios, fábricas e residências cer apenas "engraçado".
de luxo, por outro, proliferavam os casebres,
porões e cortiços superlotados e sem qualquer Alice Dubina Trusz: Bolsista de iniciação científica no
curso de História/UFRGS
higiene. Essa questão estava intimamente liga
da à incidência de epidemias e ao crescimento
da criminalidade. O combate desta última cabia
76
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Na falta de uma atuação governamental eficaz, só resta esperar pelas forças da natureza \
O Século. 07 aao. 1881
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ou Dt\T\aos.\yt eSTO\.. V c, ri\«rfsÍTO. PtNA 6coo i^eiS Dl MULTA.
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Descaso para com a observância das normas municipais tanto por parte dos moradores, como do poder público. O
Guarani, 15 nov. 1874
81
(J lARICATA
ARICATA
Crítica aos deficientes serviços de iluminação pública e limpeza da cidade. A Sentinella do Sul, 03 nov. 1867
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Pi".;íieiras instrucçòes à Guarda do Convênio
ma.x uo MLHCaíK)
- Ki« fi praça principal de nossacapital t
- Tuis a^si-íikíllia-se tnais a um poiuode Uopciros
— \ á •*»«) visua a nossa edilidade
Critica ao incômodo aspecto "rural"que persiste na zona central da cidade. O Guarani. 06 dez. 1874
PORTO ALEGRE
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Jjetn Ififa • Luainòo Je òii aj Xi EJgi^inho atit «eíeiíáe munictyí etoma tuatte seriaj ellt n-if' g
yUayiro, le^ur u nrn« <* chapinha marcada 3«iii}e a //íiarág^p ( . 0 «pi
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Crítica à acomodação doZé Povinho frente aos problemas urbanos, deixando de exercer seus direitos de cidadão na
hora das eleições. O Século. 07 ago. 1881
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/jÍ*j OAT'f'ÍI(^: —Bhos dias sru iiii'oI.., \;;:;í't' assim itrsh' |iassÍ!i!i'* '
Ka«íado nslo chc^a ao tmaia» «Ia jnruada !
Í)R. M()XTAriiY:--\'occ nào salii' o ípir di/. >i'ii /('. a h)c<)íií(a;:"ni inai*'
^iifíi ó osta. Assim cíhuo vocò nw \ i'-. m csi'!!! livre d.i* mii posir i"
trmde ou do um descarrüaimailo iiixppcriuth».
Pi/MjO. Diano si va loola-uj . ^ :
Kodak, 24 maio 1913
o século XIX foi
um momento de ampla
divulgação e socialização
das imagens. Marcado
pelo advento da foto
grafia, pelo cinema e pelo
nascimento do cartaz pu
blicitário. viu ainda surgir,
ao lado da grande
imprensa, uma multipli
cidade de pequenos
jornais com fotos e
ilustrações satíricas.
Numa sociedade
convulsionada pela mo
dernidade e pela urbani
zação. de valores cambi-
antes, uma combinação
de talento artístico, ironia
e irreverência fez explodir
um novo olhar sobre o
mundo, produzindo uma
arte que mede sua força
pelos seus efeitos mobilí-
zadores e não pela sua
veracidade: a caricatura.
o cômico com
porta uma teia de
relações que, por
cáustica ou grotes
ca, proporciona a
teatralização de
uma identidade
que se denuncia.
Através do humor
e produzindo o rir,
as caricaturas
proporcionam, co
mo disse Baude-
laire, o poder do
ser humano de ser
às vezes si próprio
e um outro.