História Da Televisão - Teoria e Prática

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História da Televisão: Teoria e Prática1


João Freire Filho 2

Resumo: Na primeira parte deste artigo, apresento um panorama internacional da


emergência da história da televisão como objeto de estudo acadêmico. Examino, em
seguida, embaraços teóricos e metodológicos enfrentados pelo historiador do meio,
ressaltando, ainda, os principais domínios de investigação explorados a partir dos anos 90.
Na conclusão, discuto os propósitos e as práticas dos trabalhos acadêmicos a respeito da
história da TV brasileira, refletindo sobre minhas próprias incursões no campo.
Palavras-chave: Televisão; Estudos Televisivos; História da TV; Teoria; Metodologia.

As estratégias retóricas e discursivas da TV são indiciadas, amiúde, como principais


responsáveis pela degeneração do senso histórico e da memória individual e coletiva –
marca registrada da vida pós-moderna. Não seria descabido incluir os críticos da televisão
entre as vítimas mais notáveis da alegada perda do juízo histórico promovida pela corrosão
catódica. Análises e teorias sobre o meio e seu aparato tendem a cingir-se ao atual, ao
contemporâneo – uma opção epistemológica que traz o risco de essencializar a televisão
num “presente perpétuo”, que desvia a atenção dos processos de mudança nos quais a
gramática dos significados e das representações é formada, e por meio dos quais
convenções de linguagem, técnicas e “práticas significantes” específicas se tornam
institucionalizadas (Caughie 2000: 14; Corner 1999: 121).
Por motivos que esmiuçarei mais adiante, a academia começa, felizmente, a
despertar para ausências e fragilidades elementares no conhecimento existente sobre a
televisão, buscando compreensão mais sólida de seu passado e de seu desenvolvimento
social e cultural. Outrora quase um monopólio de antigos profissionais do ramo e de
entusiastas de determinados gêneros ou programas, a história da TV se tornou, a partir dos
anos 90, objeto de sucessivas abordagens científicas – em especial, nos Estados Unidos e na
Inglaterra (países onde o serviço televisivo se consolidou precocemente), mas também na
Alemanha, Austrália, Espanha, Canadá, França, Itália e Escandinávia (dentro do contexto
da desregulamentação, digitalização e convergência do sistema midiático).

1
Trabalho apresentado ao NP 07 – Comunicação Audiovisual, do IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa do
Intercom.
2
Jornalista, Doutor em Literatura Brasileira pela PUC-RJ e professor-adjunto da Escola de Comunicação da
UFRJ, onde integra o NEPCOM (Núcleo de Estudos e Projetos em Comunicação), e edita a revista Eco-Pós,
publicação semestral da Pós-Graduação em Comunicação e Cultura. E-mail: [email protected].
2

Na primeira parte deste artigo, apresento um breve panorama internacional desta


emergência da história da televisão como objeto de estudo acadêmico. Examino, em
seguida, embaraços teóricos e metodológicos enfrentados pelo historiador do meio,
destacando, ainda, as linhas de investigação mais promissoras. Na conclusão, discuto
propósitos e práticas dos trabalhos acadêmicos a respeito da história da TV brasileira (uma
vasta terra incognita), refletindo acerca de minhas próprias incursões no campo.
Argumento que a pesquisa histórica teórica e metodologicamente bem fundamentada
favorece, entre outras contribuições, a clarificação ou reformulação de pressupostos e
conceitos teóricos sobre as características tecnológicas e a organização social e textual do
meio que se naturalizaram com o tempo, bloqueando a reflexão e o discurso crítico.

A “virada histórica” nos estudos televisivos

As comemorações do cinqüentenário da TV, em vários cantos do globo, de meados


da década de 1980 em diante, contribuíram, sem dúvida, para aguçar a percepção da
historicidade do meio e, por tabela, para incrementar a sondagem histórica. O aniversário
natalício não se constitui, todavia, na única e nem na mais importante justificativa para que
a história da televisão deixe de ser uma rara avis bibliográfica. Deve-se, antes mais nada,
situar a curiosidade científica sobre a história da televisão dentro do quadro mais amplo de
renovado interesse internacional pela história da mídia como um todo, tanto por parte dos
historiadores como dos pesquisadores das áreas cognatas da comunicação e dos estudos
culturais (Bondebjerg 2002; Briggs & Burke 2002; Brügger & Kolstrup 2002).
Além disso, a chegada da “neotelevisão” (para usar o influente qualificativo
cunhado por Eco (1986)) e os prognósticos mais temerários acerca do fim da “era da TV”
(Gilder 1996; Pérez 2000) incitaram um crescente interesse arqueológico pelo meio em fase
de mutação genética (ou de extinção).“Como la carta robada de Poe, no hay nada menos
visible que lo que está a la vista”, poetiza Piscitelli (1995: 45). “Si ahora empezamos a ver
a la televisión (algo muy distinto que ver televisión) es porque está empezando a
desaparecer como un rostro de arena bañado por el mar”.
As mudanças na estrutura da produção e do consumo televisivo (abundância de
ofertas de canais; desarticulação da TV da idéia de comunidade nacional; uso de
controversas estratégias de sedução e fidelização da audiência; fragmentação do público em
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nichos de mercado baseados no gosto; hegemonia de novos gêneros e formatos, como os


realitiy e os talk shows), fomentadas pelas novas tecnologias e pelo recente ambiente
regulador, levaram pesquisadores europeus a interrogarem-se, por exemplo, sobre as
circunstâncias históricas que permitiram a definição e implementação do serviço público de
televisão, pondo em perspectiva suas eventuais e específicas virtudes políticas, culturais e
estéticas (Branston 1998; Lange 2001).

O processo de pesquisa: gravitando em torno de um objeto inapreensível?

O primeiro e mais evidente obstáculo, na elaboração de uma história da televisão, é


a busca e o processamento dos dados pertinentes, encontráveis em testemunhos orais,
documentação escrita e registros audiovisuais (Alonso 2004; Bignell 2003: 36-40; Caughie
2000: 11-14; Corner 2003: 277-278; Jacobs 2000: 4-5, 8, 10-14; Lange 2001; Lagny 1998).
O difícil acesso a este último de tipo de fonte representa sensível desafio, em particular,
para interessados na linguagem e nos padrões estéticos dos primórdios da TV. Enquanto os
historiadores dispõem de contínuo (ainda que incompleto) acervo de obras do primeiro
cinema, a televisão possui uma pré-história na qual os programas não eram gravados; para
piorar, mesmo depois que o uso do vídeo-tape se tornou rotina, nos anos 60, muito material
foi desgravado para reutilização das fitas, deteriorou-se devido à incúria em sua
conservação ou, simplesmente, foi descartado graças à falta de tino do seu valor histórico.
A ausência da garantia epistemológica do registro audiovisual é uma limitação para
qualquer análise que procure apreender os estilos e as formas das primícias da TV,
conforme admite Jacobs (2000: 4-5, 8, 10-14), em sua tentativa de reconstituição ou
reconstrução de um sentido visual do antigo drama televisivo inglês (1936-1955). Pondera
o autor, contudo, que a impossibilidade de contato com os programas em sua forma
audiovisual original, embora imponha dificuldades significativas, não inviabiliza,
fatalmente, a abordagem histórica de índole estética-formal, como prova a história do
teatro, marcada por lacunas similares. Dada a inexistência de fontes primárias, cabe ao
pesquisador reformular a noção de análise textual, recorrendo aos scripts e a todo “entorno
discursivo” (Klinger 1997: 109) da produção em análise – resenhas, críticas, cartas de
telespectadores, memorial de realizadores, memorandos internos da emissora, scripts, fotos
e planos de gravação etc.
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Escrever uma história da televisão não envolve, contudo, apenas a descoberta de


documentos de antanho, mas também uma reflexão sobre como se engajar, de modo
analítico e imaginativo, com aquele passado – isto é, com as conjunturas e os processos que
assentam as condições de possibilidade não só para o funcionamento das instituições, como
também para a construção dos discursos, dos imaginários, das representações e das práticas
que circundam, interpretam e interpelam a indústria televisiva e seus produtos.
A elaboração e o desenvolvimento de uma pesquisa histórica comportam diferentes
estágios que só posso recapitular, aqui, de modo bastante sucinto: a formulação de
hipóteses estruturantes; a supracitada etapa de coleta e de organização disciplinada dos
dados; a assimilação dos fatos e eventos relevantes em quadros de referência coerentes:
cronologia, periodização (o ordenamento cronológico da história em fases significativas,
em consonância com desenvolvimentos no campo tecnológico, social, institucional ou
estético); causalidade (individual, coletiva e estrutural); importância (influência,
singularidade, tipicidade). A competência na interpretação da história (criação de
estratégias inteligentes de leitura dos documentos escritos e dos registros audiovisuais,
rechaçando o empirismo ingênuo e falácias interpretativas) precisa estar aliada a certa
engenhosidade narrativa; o somatório dos dois fatores deve resultar num texto final com
timing para a suspensão do relato sintético das mudanças em benefício da pormenorização
de acontecimentos especialmente densos e ressonantes (Bondebjerg 2002; Corner 2003).
Além de confrontar-se com exigências e desafios específicos, o historiador da
televisão se depara com um problema familiar a todos os praticantes dos estudos
televisivos: a definição do seu objeto. Referências ao caráter “complexo”, “elusivo”,
“colossal”, “caótico”, “multifário”, “híbrido”, “desafiante” da TV como objeto de
investigação crítica e sociológica são de rigueur entre os analistas do meio (ver, por
exemplo, Brunsdon 1998; Casetti & Chio 1999: 13-15; Corner 2003: 275-276; Hartley
2000: 34-36; Orozco Gómez 2001: 11-12). A natureza ambígua, polimorfa da televisão se
reflete, obviamente, nos trabalhos de cunho histórico. Seguindo a trilha aventada por
Corner (2003: 275-276), é possível identificar, pelo menos, cinco aspectos diferentes da
televisão, cada um dos quais candidatos a merecer atenção especial do historiador do meio:
1) A televisão como instituição, uma indústria e suas organizações, moldada pela política
governamental e pela administração corporativa;
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2) A televisão como realização, com foco na cultura e na prática profissional, cujo


contexto histórico tende a ser delineado especialmente nos relatos autobiográficos;
3) A televisão como representação e forma, um enquadramento estético que toma
emprestado o vocabulário da crítica literária, teatral e cinematográfica;
4) A televisão como fenômeno sociocultural, profundamente interconectado com a
política, a esfera pública e a sociedade civil, com a cultura popular (e de massa), com o
caráter mutável do lar e dos valores domésticos;
5) A televisão como tecnologia, um experimento científico que se tornou tanto um item
doméstico como uma fonte crescentemente poderosa para uma mutação na estética
social.
Em que pese o potencial de detalhamento dos estudos focados somente em uma das
dimensões acima, os trabalhos mais profícuos são aqueles que conseguem desvelar eixos de
interconexão histórica entre vários aspectos do meio e de seu aparato, combinando pesquisa
diligente com insights argutos. Não se trata de preconizar exatamente uma (a rigor,
inexeqüível) “história total”, nos moldes da sugerida por Klinger (1997), mas sim de
salientar a importância de manter-se atento à multivascularidade do fenômeno televisivo, na
hora de buscar causalidades e explanações. Recentes estudos históricos da TV britânica
cujo espírito condutor é a investigação formal constituem exemplos auspiciosos, nesse
sentido, compatibilizando relatos detalhados de mudanças na técnica e na estética, no
sistema genérico e no regime discursivo da ficção e do entretenimento televisivo com
elucidações das estruturas institucionais, dos desenvolvimentos tecnológicos e do contexto
sociocultural e artístico (Caughie, 2000; Corner 1991; Jacobs 2000).

Principais linhas de investigação na atualidade

Enquanto que as parcas referências canônicas da história da televisão costumam


trazer à cena, de forma supinamente panorâmica e linear, as grandes invenções, os
personagens eminentes, as transmissões marcantes, os trabalhos mais instigantes publicados
a partir da década de 1990 sobressaem por buscar abordagem mais focalizada e capaz de
harmonizar a história social com indagações de orientação mais cultural.
Tais rupturas com o protocolo analítico tradicional estão afinadas com mudanças
essenciais nos rumos da pesquisa historiográfica desde os anos 1960, quando os
historiadores se afastaram dos relatos mais convencionais a propósito de líderes e
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instituições políticas, e voltaram-se para as investigações da vida cotidiana de operários,


criados, mulheres e outros grupos subalternos. Aqueles que se aproximaram da história
cultural, na década de 1970, esperavam superar, por sua vez, as limitações normativas da
perspectiva da história social, livrando-se de seu determinismo sociológico e de seus
resultados estatísticos, ao mesmo tempo em que mantinham as lentes abertas para as
pessoas comuns que haviam sido convidadas à cena histórica pela geração anterior de
pesquisadores. O interesse cada vez maior pela história cultural (ou seja, pelo estudo das
idéias, das atitudes, dos planos, das emoções, das representações ou dos artefatos por
intermédio dos quais homens e mulheres de determinada época interagem com seu
ambiente) permitiu explorar o passado de novas formas – ousar novos métodos, esmiuçar
novas fontes (textos, imagens, ações) e indagar novas e mais sutis questões a respeito da
vida cotidiana (Burke 1992, 2000; Chartier 1990; Darnton 1986; Fass 2003; Hunt 1992).
Ao constatar a fragilidade do método e do esquema interpretativo empregados, em
regra, para abordar a história da televisão, os estudos mais recentes também passaram a
enfatizar diferentes aspectos do passado, propondo novos assuntos e novas modalidades de
investigação. Três áreas de pesquisa despontam, ao meu ver, como as mais promissoras:
1. Genealogia da televisão (Delavaud 2000, 2003; Uricchio 1992). A principal
intenção, aqui, é construir uma arqueologia cultural da (nebulosa) pré-história da televisão
– suas manifestações inaugurais, seus intrincados desenvolvimentos. São exumadas as
primeiras utopias da televisão – a “televisão imaginada” (Delavaud 2000, 2003) –, a partir
do levantamento e da análise de um conjunto variado de textos ficcionais, jornalísticos e
científicos cuja preocupação comum é interrogar-se sobre as condições de emergência e de
viabilidade do meio. Examina-se como a televisão foi antecipada, sonhada e projetada em
diversos países: no período que precede imediatamente o aparecimento da instituição
televisiva, em meados do século XX, mas, também, num período bastante anterior, quando
progressos científicos e técnicos efetivados no século XIX (como a invenção do telefone e
da experiência nova de simultaneidade a ele associada) pareciam autorizar a esperança de
satisfação próxima do sonho da visão à distância, por meio da transmissão elétrica de
imagens. As hipóteses e os argumentos (visionários ou pragmáticos) de escritores,
jornalistas, cientistas, políticos e empresários foram anunciados no correr de um longo
período de maturação da TV, dentro do qual o meio emergente procurou reivindicar sua
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autonomia, distinguindo-se de outras mídias (telefone, cinema, rádio) com as quais


mantinha interações recíprocas complexas. No atual estágio de convergência (de
dispositivos e de interesses) das mídias, a investigação dos processos históricos de
formação (e afirmação) da identidade da TV representa, sem dúvida, um subsídio valioso
para as reflexões sobre o futuro do meio – sejam aquelas engendradas sob ótica tradicional
sociológica ou socioeconômica, sejam as formuladas a partir de uma perspectiva semiótica
centrada no novo conceito de intermediação.
2. Formação e desenvolvime nto dos gêneros programáticos (Caughie 2000;
Corner 1991; Forman 2003; Jacobs 2000). O mergulho no período formativo da televisão
ambiciona, neste caso, esquadrinhar o processo histórico mediante o qual convenções
genéricas foram concebidas e homologadas, enfocando o desenvolvimento das estratégias
estéticas e discursivas e das práticas de produção de uma categoria de programa em
particular. Tal qual assinalei antes, a meta é uma abordagem de caráter mais holístico que
enfatize a complexidade das forças e das mediações sociais, culturais, econômicas e
tecnológicas que envolvem o processo de formatação dos programas. A investida histórica
na seara da apreciação qualitativa (técnica e estética) de gêneros ou programas típicos
pressupõe (e oferece elementos para) uma revisão crítica da tendência de rejeição da análise
textual profunda de programas individuais em favor de considerações mais abstratas sobre
o “mysterium televisionis”, sobre a “televisão em si mesma” que redundam, amiúde, em
repetitivas descrições da fenomenologia da televisão. Como acentua Bondebjerg (2002:
68), a estrutura e a organização da programação, do fluxo e do “supertexto” televisivos são
importantes parâmetros para os estudos midiáticos, e podem ajudar a discernir mudanças
significativas e confirmar periodizações; todavia, não devem excluir da análise aquilo que
constitui o cerne da história cultural da produção e do consumo da TV – os programas.
3. Arqueologia da recepção televisiva (Grimson et al 1999; Longo Elía 1999;
Spigel 1992; Thumim 1995; Tichi 1991; Varela 1999). Como as pessoas experienciaram a
chegada da TV em seu país? Quais as condições, os locais e as rotinas de consumo
televisivo? De que maneira estes padrões se relacionam com desigualdades de classe e com
a divisão genérica do lazer e do trabalho doméstico? Em que medida o contexto social e
cultural da recepção ajudou a moldar as práticas institucionais e textuais da televisão? Estas
são algumas das indagações fundamentais que a arqueologia da recepção televisiva
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tenciona responder, em sintonia com a nova historiografia do cinema e sua insatisfação com
os relatos psicanalíticos abstratos, ahistóricos e universalizadores da relação texto/sujeito.
Um dos marcos da área é a análise de Spigel (1992) a respeito de como as famílias brancas
de classe média aprenderam a conviver com a televisão como um objeto e um meio
doméstico, nos Estados Unidos do pós-guerra. Dignos de notas são, também, neste campo,
os trabalhos de Grimson et al (1999), Longo Elía (1999) e Varela (1999), que investigam a
primeira década da TV na Argentina, realçando as estratégias adotadas para tornar a nova
tecnologia familiar (nas diversas acepções do termo). Os vestígios da construção gradual do
vínculo da audiência com a televisão são descobertos a partir da leitura da imprensa da
época (jornais, revistas técnicas e culturais, de espetáculo e de atualidade) e da recuperação
da memória (por intermédio de entrevistas abertas de tipo biográfico e de análise qualitativa
de cartas) de pessoas que vivenciaram a pré-história do meio.

A televisão no Brasil: por uma nova agenda de investigação histórica

As (escassas) histórias da TV brasileira tendem a concentrar-se na dimensão


institucional do meio, a exemplo do que ocorre com as pesquisas efetuadas em outros
países latino-americanos. O volume coordenado recentemente por Orozco (2002) é um caso
paradigmático: a rigor, o que encontramos, nestas Historias de la televisión en América
Latina, são histórias da indústria televisiva na Argentina, no Brasil, na Colômbia, no Chile,
no México e na Venezuela; quem imaginava encontrar, no conjunto dos seis ensaios,
maiores elucidações acerca do desenvolvimento da TV como forma tecnológica e estética e
como experiência cultural, decerto, saiu decepcionado.
No caso específico brasileiro, a trajetória histórica da televisão é, em geral,
delineada sob uma visada sociológica que prioriza – como parâmetro de análise e
periodização – a influência (direta ou indireta; problemática; por vezes, espúria) do Poder
(democrático/ ditatorial) e do Capital (nacional/ estrangeiro; em particular, estadunidense)
na estruturação e no desenvolvimento do serviço de TV e de suas organizações. Assim, o
quadro de referência causal e explanatório (“Como surgiu a televisão? Quando, em que
aspectos e por que mudou?”) e crítico (“Quais as influências destas mudanças na vida
social e política?”) é informado por questões ligadas à teoria da dependência; ao
imperialismo e à homogeneização cultural; a projetos de governo desenvolvimentistas,
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nacionalistas ou neoliberais; ao processo de modernização autoritária; à difusão e ao


reforço da ideologia dominante; à propaganda de produtos e de estilos de vida (Caparelli
1982; Jambeiro 2001; Mattos 1990, 2002; Oliveira 2001).
Sirva de exemplo, aqui, a exposição de motivos alinhavada por Mattos (2002: 15),
na introdução de sua História da televisão brasileira:
Por isso, nos cortes realizados para pontuar cada fase do desenvolvimento da
televisão, levamos em conta principalmente as mudanças das políticas nacionais,
suas tendências gerais ou particulares. Foram consideradas as decisões e
implementação de ações que acabaram por influenciar o desenvolvimento da nossa
televisão. Em síntese, sob nosso ponto de vista, a história da TV brasileira reflete as
fases do desenvolvimento e as políticas oficiais adotadas e por isso este veículo não
pode ser analisado como objeto independente do contexto no qual está inserido.

O aludido “contexto” (quer dizer, as características da sociedade circundante que


presumivelmente modelam o sistema televisivo) é reconstruído, por Mattos, com base em
breve recapitulação da história do país (ciclos econômicos; fatos políticos); em informações
acerca de procedimentos governamentais de natureza estratégica, regulamentar ou censória,
cujas fontes são artigos, decretos e capítulos constitucionais, pronunciamentos, declarações
e reportagens publicadas na grande imprensa (amiúde, já citadas e interpretadas por outros
autores); dados e quadros estatísticos socioeconômicos, demográficos, de análise
quantitativa do conteúdo programático (1971), do número de televisores preto-e-branco e
em cores em uso no país (1950-2001), da procedência dos equipamentos utilizados pelas
emissoras de televisão (1971), entre outros do mesmo feitio.
A proposta do livro (“de caráter eminentemente descritivo e fundamentado no
conhecimento existente” (16)) é, como indica o seu subtítulo, traçar “uma visão econômica,
social e política” da história da televisão brasileira. Na prática, o que é efetivamente
apresentado, ao leitor, é uma revisão cronológica das políticas governamentais de
telecomunicação e do ordenamento jurídico da TV brasileira, conjugada com uma crítica
ideológica do impacto deste modelo televisivo (por intermédio dos programas, seu produto
final) no incremento do consumo e na manutenção do status quo.
Não há espaço, aqui, para esmiuçar os equívocos das abordagens que tratam, de
forma monolítica, os programas televisivos, admitindo a existência de um significado
ideológico transparente e singular na superfície de sua representação, negligenciando as
múltiplas camadas de comunicação, os diversos (e, às vezes, conflitantes) valores e ideais
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sociais registrados em toda produção cultural massiva. Restrinjo-me a assinalar


desdobramentos indesejáveis deste pressuposto teórico, na pesquisa historiográfica. Embora
seja importante contextualizar a indústria e os textos televisivos dentro de seu sistema de
condicionamentos econômicos e políticos, é errado supor que a análise histórica do
“contrato” ideológico e pecuniário forjado entre poderes de Estado, instituições políticas e
organizações midiáticas ofereça explicação cabal para o desenvolvimento da forma e do
conteúdo dos programas e para a codificação e decodificação do discurso televisivo.
Em virtude do caráter multifacetado (industrial, social, cultural e estético), a
televisão é moldada tanto por fatores internos como por influências externas, abarcando um
grande número de atores e instituições sociais na criação, na realização, na programação, na
divulgação, na regulamentação, na crítica, no debate e no consumo de seu serviço e de seus
produtos. Logo, qualquer estudo a propósito da formação e do desenvolvimento de uma
cultura televisiva no país (cultura entendida, aqui, no sentido antropológico, como modo
peculiar de viver e fazer a TV, a partir da imitação, apropriação, reinvenção de formas
transnacionais), tem obrigação de contemplar, independente de qual seja o âmbito da
pesquisa, outros elementos, além de notáveis agentes políticos e econômicos.
Quando decidi, cerca de cinco anos atrás, aventurar-me a estudar a TV sob uma
perspectiva histórica, planejava documentar e analisar os encontros episódicos e as
tentativas mais duradouras de interação dos literatos brasileiros com o moderno meio
audiovisual (Freire 2002; 2003; 2004a). Julgava que as negociações e os conflitos que
envolvem a presença efetiva e sui generis dos homens de letras dentro da indústria
televisiva nacional permitiriam repensar a relação entre o intelectual, o popular e o massivo
no país e, ao mesmo tempo, iluminar o desenvolvimento de nossa teledramaturgia – em
especial, da telenovela, gênero fundamental sob o ponto de vista cultural e comercial. Não
pretendia somente descrever o processo de adaptação dos escritores às exigências
profissionais e ideológicas da nova forma de expressão cultural. A partir da análise
qualitativa de biografias, cartas, crônicas, depoimentos e entrevistas (publicadas na
imprensa ou reunidas em livros), almejava, também, caracterizar a formação, no seio da
elite cultural, de representações e paradigmas críticos sobre a TV, enfatizando tópos,
metáforas e demais artifícios retóricos que informam este terreno discursivo complexo.
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O contato mais estreito com as fontes primárias – vasculhadas na Biblioteca


Nacional (RJ), na Fundação Casa Rui Barbosa (RJ), no Museu da Imagem do Som (RJ e
SP) e nos arquivos do jornal O Globo e da extinta revista Manchete (RJ) – foi evidenciando
que a intelectualidade nativa nem sempre encarou a televisão como o inimigo público
número um da literatura e do humanismo. Nas duas primeiras décadas de existência do
veículo no Brasil, houve escritores e jornalistas culturais que, em contraste com as análises
fatalistas de praxe, apostaram numa convivência mutuamente enriquecedora entre a galáxia
de Gutenberg e a da imagem eletrônica, procurando assimilar as regras da linguagem
televisiva, a fim de utilizá-las em prol da arte literária e da cultura livresca. Na busca de
explanações comparativas, constatei que, ao longo dos anos 50 e 60, membros das
comunidades intelectual, literária e cinematográfica européia e estadunidense também
levantaram, a seu modo, a bandeira da “televisão como a oitava arte” (Delavaud 2000b;
Grasso 2002; Herms 2003; Lochard 2003; Rossellini 2001; Spigel 1998). Detectar
similaridades e diferenças nas diversas tentativas de enlace crítico ou profissional com o
novo meio se tornou, desde então, um dos aspectos centrais de minha abordagem.
A pesquisa sobre o período formativo da TV brasileira me proporcionou outras
surpresas. Devido ao fato de, entre 1950 e 1964, o televisor ser um bem de consumo
circunscrito aos endinheirados, idealiza-se o perfil “cultural” (na acepção ilustrada do
termo) da programação do período, classificado de “elitista” pelos historiadores.
Teleteatros, óperas e balés não lastreavam, sozinhos, a televisão da “era dourada”;
pululavam no vídeo atrações mais afinadas com a tradição lúdico-festiva dos
entretenimentos populares – circo; folhetim; imprensa sensacionalista; melodrama; jogos;
teatro de revista (Freire Filho 2003; 2004b).
É difícil escapar dos enquadramentos emocionais e afetivos, quando contemplamos
o passado – os historiadores da televisão, por exemplo, se mostram inclinados a manter
relação sentimental com certos períodos ou programas antigos; mais raramente, manifestam
um senso exacerbado de distanciamento, a partir do qual o passado é avaliado, com base
em critérios atuais, como limitado ou anedótico (no plano social, tecnológico ou estético)
ou mesmo indigno de ser estudado (Corner 2003: 274). No caso da historiografia praticada
no Brasil, a razão principal da visão romantizada dos primórdios da TV é a assimilação
acrítica dos relatos autobiográficos dos “pioneiros” (Barbosa Lima, 1991, Barbosa Lima &
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Clark 1988; Loredo 2000; Silva Júnior 2001), submetidos ao trabalho de inflexão, seleção
ou transmutação da memória (Girardet 1987; Ong 1983).
Concorre, ainda, para o juízo enganoso acerca do “alto nível cultural da
programação”, a teima em confundir capital econômico e capital cultural, na hora de inferir
o gosto da audiência. Para entender a heterogeneidade das atrações levadas ao ar, já na
“fase elitista”, não basta, porém, relativizar o gosto dos afortunados proprietários de
televisor, que não desperdiçavam a chance de pavonear seu novo símbolo de status – “Hoje,
na Paulicéia, entre os elegantes da sociedade, existe uma nova fórmula de convite, para os
encontros da tarde: Célia Maria telefona a Maria da Glória dizendo: – Venha tomar chá
comigo e assistir à televisão” (O Cruzeiro, 28/10/1950: 37-38). É preciso considerar,
também, o interesse precoce das emissoras em seduzir um contingente populacional que se
familiarizava com a TV por intermédio de seu consumo em espaços públicos:

Na capital paulista, hoje, pode-se assistir, de qualquer ponto da cidade, aos


programas normais da televisão que a PRF-3TV manda para o ar diariamente das
17h às 19h. Centenas de aparelhos receptores foram instalados nas vitrines dos
grandes estabelecimentos comerciais, e nas prateleiras dos bares, cafés e
confeitarias. Diante desses receptores, há uma multidão de espectadores
acompanhando “shows” que se desenrolam nos estúdios da TV no Sumaré, ou
então assistindo (sic) os “shorts”, desenhos animados, atualidades, transmitidos em
filmes como no cinema (idem, ibidem).

Hipérboles à parte, encontramos informações similares acerca da penetração


amplificada da TV (mediante a exibição fora da esfera privada), em fontes menos suspeitas
do que O Cruzeiro (parte do conglomerado midiático capitaneado por Assis
Chateaubriand). À medida que me conscientizava da vitalidade das discussões públicas
sobre a nova tecnologia, fui chegando à conclusão de que minha versão dos debates
históricos acerca do valor cultural da televisão – ainda que continuasse prioritariamente
focada nas ações, nos julgamentos normativos e nas perspectivas ideológicas da
comunidade artística e intelectual – deveria refletir, também, o pensamento e as práticas
dos donos e do staff das emissoras, de governantes e legisladores e das audiências,
destacando divergências e alianças provisórias nos esforços para definir o significado e
mediar ou conter a ascendência do moderno dispositivo audiovisual no Brasil.
Baseado nesta premissa, alarguei consideravelmente o escopo da pesquisa e o
perímetro das fontes primárias, arregimentando notícias, reportagens, editoriais, artigos,
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crônicas, fotos, charges e anúncios veiculados na imprensa feminina e em publicações


especializadas na indústria da diversão (rádio e cinema, sobretudo). A versão final do
projeto (intitulada Os intelectuais, as massas e a TV no Brasil: história cultural de um
relacionamento complexo) ambiciona contemplar, portanto, o debate intelectual e popular
acerca das funções e dos efeitos sociais e culturais da televisão (diversão/saber;
declínio/incentivo da leitura; rebaixamento/elevação da qualidade das expressões culturais
concorrentes; fortalecimento/erosão dos laços domésticos e da identidade nacional;
alienação/conscientização das massas etc) – desde a chegada do veículo, ao país, como
mera curiosidade técnica até sua consolidação como instituição, indústria, linguagem e
forma hegemônica de entretenimento.
Embora se concentre nas décadas de 1950 a 1980, minha pesquisa recua, de forma
estratégica, até os anos 30, quando foram realizadas as primeiras experiências e
demonstrações com a nova tecnologia da TV, em território nacional (arrefecidas, na década
40, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, em função da Segunda Guerra). Dou
destaque, especialmente, à 1ª Exposição de Televisão, instalada, em 1939, no pavilhão de
entrada da Feira de Amostras do Rio de Janeiro. No dia de 03 de junho, o presidente
Getúlio Vargas inaugurou o evento, organizado pelo Ministério dos Correios da Alemanha,
com patrocínio do Departamento Nacional de Propaganda. Compareceram, ao recinto
abarrotado da exposição, jornalistas, figuras de proa da política, membros da alta sociedade
e insignes representantes da comunidade científica nativa. Movidos por interesses políticos
e econômicos, também estiveram, por lá, engenheiros e autoridades germânicas, como
Hans Pressler, conselheiro do Instituto de Pesquisa dos Correios do Terceiro Reich, e Von
Lebetzow, encarregado de negócios da Alemanha no Rio de Janeiro.
Coube ao Dr. Arthur Hehl Neiva, destacado junto à missão germânica, detalhada
apresentação oral do processo científico da TV. Logo depois, iniciou-se o aguardado
espetáculo da “visão à distância”. Receptores da marca Telefunken transmitiram, para
centenas de curiosos, não apenas a voz, mas também fisionomias e gestos de celebridades
do rádio carioca, que se apresentavam num estúdio montado em outro extremo do pavilhão
da Feira. Francisco Alves, o Trio Dalva de Oliveira e as Irmãs Pagãs (que interpretaram um
samba, acompanhadas pelo conjunto regional de Benedito Lacerda) tiveram a honra de ser
os primeiros artistas televisionados.
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A atração seguinte foi o visiofone – conjugação de aparelho telefônico e de


televisão, que permitia aos interlocutores conversar e trocar olhares simultaneamente.
Getúlio e o ministro da Justiça Francisco Campos experimentaram, risonhos, a invenção. A
fim de demonstrar todas as possibilidades da TV, a inauguração oficial foi encerrada com
transmissão de um discurso do presidente, filmado pelo DNP, em dezembro de 1938,
durante a Exposição do Estado Novo.
No dia 04 de junho de 1939, a Exposição de Televisão foi aberta ao público, assim
permanecendo, com sucesso, por quinze dias. A imprensa deu ampla cobertura a todo o
evento – posteriormente ignorado pela maioria dos historiadores (Federico 1982; Sampaio
1984; Vampré 1979), não obstante sua poderosa dimensão simbólica. Jornais e revistas
saudaram, em regra, a chegada da “extraordinária invenção”, do “prodígio moderno”, da
“maravilha do século”, do “mais genial processo de comunicações até hoje inventado pelo
gênio humano” – a televisão, “em toda a sua impressionante realidade”. A despeito do
preço elevado (mais o menos o dobro do custo de um aparelho de rádio), observadores da
época previam que a TV estava destinada a reformar, dentro de pouco, todo o andamento
do “broadcasting”, não tardando a incorporar-se “aos gozos triviais da existência”.3
Todavia, pareceres menos favoráveis também emanavam dos periódicos. Artigo
assinado por J. Seabra, na revista Careta (08/07/1939: 38 e 43), advertiu que o governo
estava prestes a realizar um péssimo negócio, “levando gato por lebre” – “A geringonça
que se instalou na Feira de Amostras e que vinham chamando televisão está muito longe de
ser o que circula com designação igual nos países mais adiantados e mais felizes do que o
nosso”; “a aparelhagem caduca que pretendem vender como coisa nova a um de nossos
ministérios é uma caricatura grotesca e monumental”; “coisa obsoleta e que não convence”.
No Jornal das Moças (15/06/1939: 22), o colunista Paulo Roberto manifestou inquietação,
por sua vez, quanto a duas das possíveis alterações determinadas pela “revolucionária
aparelhagem da nova técnica do rádio”: De que viverá o futebol, caso possamos assistir aos
jogos em casa? E a indústria cinematográfica, como vai sobreviver, se pudermos desfrutar

3
Informações e comentários extraídos de Gazeta de Notícias, 02/06/1939: 9; idem, 04/06/1939: 1, 20; Jornal
do Comércio, 03/06/1939: 7; idem, 04/06/1939: 9; Jornal do Brasil, 03/06/1939: 13; idem, 04/06/1939: 7;
Correio da Manhã, 04/06/1939: 4; O Jornal, 04/06/1939: 7; Revista da Semana, 10/06/1939: 24; Revista
Carioca, 10/06/1939: 34-35; Diário de Notícias, 15/06/1939: 4; Jornal das Moças, 15/06/1939: 22; Cine-
Rádio-Jornal, 15/06/1939: 3; e Careta, 08/07/1939: 38 e 43.
15

de filmes, “na comodidade de um pijama”? O autor, porém, logo tratou de tranqüilizar as


leitoras: os “encarregados de equilibrar a complicada balança da vida social” que
pensassem nos problemas ocasionados pelo advento da TV – “Nós, que nada temos com
estes altos assuntos, nem ganhamos para resolvê-los, podemos ficar serenamente pensando,
só e sempre, na maravilhosa inovação que a ciência nos trouxe em boa hora”.
É desnecessário frisar a atualidade política, econômica e cultural das questões
levantadas naqueles longínquos anos 30 – período em que a transmissão televisiva a partir
de uma unidade central para o consumo privado e doméstico ainda não havia sido
naturalizada. Como argumenta Caughie (2000: 13), a pesquisa histórica sobre a televisão
nos oferece um registro das diferenças do passado que serve para lembrar-nos o que o
presente pode ser – ou poderia ter sido. As possibilidades alternativas ou experimentais de
uso interativo e de recepção coletiva sumariadas acima ratificam que a definição da TV
como meio centralizado de comunicação de massa – experienciada e conceituada como
axiomática, lógica, genética, universal – foi determinada historicamente por estruturas
socioeconômicas e pelos modos de vida dominantes nas sociedades modernas ou em fase
de modernização (Allen 1983; Corrigan 1990; Gripsrud 1998; Gumbrecht 1998; Uricchio
1992; Williams 1975; Winston 1990), estando, portanto, aberta a mudanças.
Presumo que o exame (altamente seletivo, claro) de expectativas e temores
veiculados durante a Exposição de Televisão tenha servido para ilustrar, um pouco melhor,
o tipo de enfoque de minha pesquisa – centralizado na busca de representações e
paradigmas interpretativos sobre a televisão já esquecidos ou ainda proeminentes no debate
público. Como acontece (de maneira menos ou mais consciente) em toda investigação
histórica, minha apreciação das polêmicas envolvendo a função social, as formas de
propriedade e controle, as potencialidades expressivas e o valor cultural da televisão está
condicionada por inquietações pessoais e problemas hodiernos. Espero, mais
concretamente, que do meu relato da intricada sedimentação de uma cultura televisiva no
país (modos específicos de ver e julgar) possam ser extraídas lições proveitosas para o
enriquecimento da agenda crítica dos (tão em voga) debates sobre a qualidade da TV –
perigosamente ameaçados por teorização precária, superficialidade analítica e amnésia
histórica (Freire 2001; 2004b).
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