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MÚSICAS INFANTIS E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS:

Um descompasso social

Por meio da vivência de três anos na função de coordenadora pedagógica de um Centro de


Educação Infantil Municipal, foi possível obter maior contato com diversas práticas pedagógicas,
algumas muito significativas para o aprendizado e desenvolvimento das crianças, outras, clara
percepção de que precisavam de maior reflexão.

Dentre estas práticas, o uso das músicas infantis é uma atividade recorrente, utilizadas de
forma aleatória como sinais para iniciar ou anteceder novas atividades, como mecanismo de ordem
na sala, aviso da hora do lanche, da hora do descanso, e por final, hora da saída.

Nesse cenário, com músicas tão presentes na rotina da Educação Infantil, percebeu-se a
necessidade de uma análise e reflexão acerca de como é inserida esta prática, e de que forma
influenciam nas representações sociais das crianças, tanto as representações positivas como
negativas. Outra inquietação nesse contexto, objetiva conhecer a opinião dos professores sobre a
utilização das músicas infantis no cotidiano das crianças, e assim, discutir a necessidade de uma
visão crítica sobre a importância das produções musicais voltadas à Educação Infantil.

A temática das representações sociais foi escolhida pelo interesse em se investigar o


funcionamento de um sistema observado no entendimento de Jean-Claude Abric (1998, p. 28) por
“interpretação da realidade que rege as relações dos indivíduos com o seu meio físico e social”.

Assim, esse trabalho tem abordagem de cunho qualitativo e método exploratório de estudo
de caso, o qual permite a investigação de um fenômeno contemporâneo por meio de observações
diretas e entrevistas sistemáticas, tem como objetivo refletir sobre as representações sociais contidas
nas músicas infantis, sob a ótica dos professores da Educação Infantil.

Os dados são coletados através da aplicação de entrevista estruturada, direcionada a quatro


professores de uma escola da rede municipal de ensino, utilizando-se de questionário de caráter
semiestruturado e gravações com perguntas abertas para que se possa colher a opinião sobre o tema.
A organização dos dados obtidos é sintetizada para evidenciar a relação entre fatos verificados e a
teoria. Os dados primários da entrevista e questionário, tratados por meio do processo de transcrição
e compilação para obtenção das informações.

Diante de tais reflexões, propõe-se mostrar uma conexão junto ao materialismo-histórico,


por entender que tal fenômeno, contém a concepção de que, como o compreendem Bock e
Gonçalves (2009, p. 138), “os fenômenos humanos são produzidos no processo histórico de

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constituição da vida social, (...) onde sujeito e objeto transformam-se em processo histórico, onde o
sujeito atua sobre o objeto e é transformado nesse processo”. Nessa abordagem, não se pretende
fazer um ecletismo metodológico, mas a indicação de algumas aproximações que melhor possam
explicar as dinâmicas sociais dentro do contexto musical.
Quando a diversidade e o processo de elaboração são privilegiados, abre-se, então a
possibilidade de trabalhar com estudos de caso. O indivíduo, nesta perspectiva, seguindo a
tradição vigotskiana (VYGOTSKY, 1978) é sempre uma entidade social e, consequentemente,
um símbolo vivo do grupo que ele representa. Desta forma, o individuo no grupo – sujeito da
abordagem epistemológica do estudo das representações (SPERBER, 1989) que busca a
distribuição de conteúdos de uma dada população, passa a ser abordado enquanto sujeito
genérico – como o grupo no indivíduo – contanto que tenhamos uma compreensão adequada
do contexto social por ele habitado (SPINK, 1994, p. 123).

O sujeito não se constitui sozinho ele se faz na interação com o meio social, a partir dessa
relação ele se transforma e transforma o meio em que vive numa relação dialética.

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E MATERIALISMO-HISTÓRICO: UM DEBATE


DOS FENÔMENOS SOCIAIS

O conceito de representações sociais foi criado por Moscovici, em que o autor Perrusi
(1995) citado por Xavier (2002, p. 1) bem o explicou: “uma forma de conhecimento particular,
relacionada a comunicação, a interação social e a socialização”.

Essa discussão é necessária, pois é através da linguagem que o sujeito se faz ser histórico e
social, reiterada pelo conceito vigotskiano em que o pensamento e linguagem são dinâmicos e
responsáveis pela constituição “das funções psicológicas superiores e na construção da
subjetividade” (SOUZA, 1994, p. 94).
Em Vygotsky o uso da linguagem se constitui na condição mais importante do
desenvolvimento das estruturas psicológicas superiores (a consciência) da criança. O conteúdo
da experiência histórica do homem, embora esteja consolidado nas criações materiais,
encontra-se também generalizado e reflete nas formas verbais de comunicação entre os homens
sobre estes conteúdos. A interiorização dos conteúdos historicamente determinados e
culturalmente organizados se dá, portanto, principalmente por meio da linguagem,
possibilitando, assim, que a natureza social das pessoas torne-se igualmente sua natureza
psicológica (OLIVEIRA, 2012, p. 21).

Através das músicas infantis os professores preservam costumes e valores da sociedade.


Essas melodias são aparentemente inofensivas, poéticas e ingênuas cheias de simbolismos e através
da ludicidade disseminam os conteúdos historicamente organizados.

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As representações sociais são geradas por dois processos que Moscovici (2003, p. 61)
nomeou de ancoragem e objetivação. A ancoragem é entendida como algo diferente que causa
inquietações “em nosso sistema particular de categorias e o compara com um paradigma de uma
categoria que nós pensamos ser apropriada”, ou seja, é quando aproximamos um conceito novo a
um conceito já consolidado e esse primeiro passa a ter características do segundo e é “reajustado”
para que se enquadre nessa categoria.

Quando se nomeia alguém ou alguma coisa, ocorre uma classificação, e quando se classifica
a própria posição, esse posicionamento não é neutro, pois se atribui um valor positivo ou negativo
dentro de uma escala de hierarquia. Dessa forma, a ancoragem significa classificar e denominar os
processos.
Ancorar é, pois, classificar e dar nome a alguma coisa que não são classificadas e que não
possuem nome, são estranhas, nãos existentes e ao mesmo tempo ameaçadoras. (...) O primeiro
passo para superar essa resistência, em direção à conciliação de um objeto ou pessoa em uma
determinada categoria, de rotulá-lo com um nome conhecido. (...) Pela classificação do que é,
pelo fato de se dar um nome, nós somos capazes de imaginá-lo, de representá-lo
(MOSCOVICI, 2003, p. 62).

O segundo processo que gera as representações sociais é a objetivação, quando se


materializa o que se está no campo do pensamento.
Objetivação une a ideia de não familiaridade, torna-se a verdadeira essência da realidade.
Percebida primeiramente como um universo puramente intelectual e remoto, a objetivação
aparece, então, diante de nossos olhos”. (...) “descobrir a qualidade icônica de uma ideia, ou ser
impreciso, é reproduzir um conceito em uma imagem (MOSCIVICI, 2003, p. 71).

Ao trazer para o real o conceito que está no campo do pensamento formam-se novas
categorias, com o objetivo principal de classificar e dar nomes. Assim, as opiniões e interpretações
das ideias ou dos seres não-familiar requer a formação de categorias, que para Moscovici (2003, p.
70) “de tal modo que a entidade nomeada possa ser integrada na sociedade dos conceitos”.

Para Valençuela (2012) a representação social não pode se configurar apenas como
reprodução do comportamento, é caracterizada como uma reconstituição, uma transformação que
representa a cultura de um grupo. Essa cultura é produzida coletivamente.

Conforme apontado por Valençuela (2012, p. 3) o estudo das representações é


multidimensional, pois “a representação se caracteriza como uma forma de saber prático ligando
um sujeito a um objeto”. O objeto está relacionado aos símbolos e as interpretações que é resultado
das atividades do sujeito no meio em que está inserido.

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Em seu trabalho sobre a abordagem estrutural das representações sociais, Abric (1998)
afirma que a representação não é um simples reflexo da realidade, mas sim uma organização
significativa, com papel fundamental na dinâmica das relações e das práticas, ou seja, é um guia
para a ação. E dentro das representações existem quatro funções essenciais: função de saber, função
identitária, função de orientação, função justificadora.

Nos espaços educacionais as músicas infantis estão muito presentes, traz em seus discursos
conhecimentos do senso comum impregnados de ideologias, que são usadas como instrumentos de
dominação, de conteúdos, de valores morais.

Recorrendo-se ao conceito vigotskiano, se o desenvolvimento cultural da criança aparece


primeiro no plano interpessoal, para depois ir para o plano intrapessoal, então, primeiro a criança se
apropria daquilo que foi construído socialmente (inter), para depois internalizar (intra) e em seguida
constituir sua subjetividade.
Esse processo de internalização, ou seja, de transformação de um processo interpessoal em um
processo intrapessoal, implica a utilização de signos e supõe uma evolução complexa em que
uma série de transformações qualitativas na consciência da criança. Desta forma, estudar a
constituição da consciência da infância não se resume em analisar o mundo interno em si
mesmo, mas sim resgatar o reflexo do mundo externo no mundo interno, ou seja, a interação da
criança com a realidade (OLIVEIRA, 2012, p. 21).

E essa realidade está impregnada de ideologias, pois a palavra, além de ser um instrumento
para representar a consciência, também serve para propagar ideias que privilegiem determinados
grupos.

Bakhtin (1995, p. 37) coloca que também é necessário fazer uma análise crítica “da palavra
como signo social para compreender seu funcionamento como instrumento da consciência”.
A ideologia do cotidiano se expressa por meio de cada um de nossos atos, gestos ou palavras,
permitindo que os sistemas ideológicos constituídos (moral, arte, religião, politica, ciência...)
cristalizam-se a partir dela. Dizendo de outra maneira, os sistemas ideológicos constituídos e a
ideologia do cotidiano se reconstroem mutuamente, numa interação dialética constante
(SOUZA, 1994, p. 115).

Para Oliveira (2012) a teoria vigotskiana pressupõe que os fenômenos são percebidos como
processos em movimento e mudança, no qual existe a mediação, decorrente do uso dos
instrumentos e dos signos, mecanismos estes, que transformam a vida social e cultural da sociedade.

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A MÚSICA INFANTIL E SUAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Reportando-se ao cotidiano da Educação Infantil, o qual é permeado de atividades musicais


que antecedem atividades propostas pelos professores, apresentam em seus repertórios, ideologias
cotidianas que expressam os valores da sociedade.

Portanto, buscou-se demonstrar alguns trechos das letras de músicas que tratam a questão do
gênero masculino e feminino, a definição dos papeis de homens e mulheres na sociedade:
Música 1: A Galinha Pintadinha e o Galo Carijó. A galinha usa saia e o galo paletó. A galinha
ficou doente e o galo nem ligou (RIBEIRO, 2007, p. 1).

Música 2: Pombinha Branca, que está fazendo? Lavando roupa para o casamento (ALMEIDA,
1998, p. 9).

Música 3: Borboletinha, ta na cozinha fazendo chocolate para a madrinha (ALMEIDA, 1998,


p. 77).

Música 4: Sapo jururu na beira do rio, quando o sapo grita, ó maninha! É que tá com frio. A
mulher do sapo, também tá lá dentro, fazendo rendinha, ó maninha! Pro seu casamento
(PERES; TATIT, 2009, p. 13).

Importante ressaltar que a escola reforça essa diferença entre meninos e meninas nas práticas
pedagógicas, em que existem os brinquedos das meninas e os brinquedos dos meninos, a fila das
meninas e dos meninos, a cor das meninas e a cor dos meninos. As músicas apresentadas acima são
muito difundidas no meio pedagógico da Educação Infantil. Nos quatros trechos apresentados,
percebe-se claramente a posição que o sexo feminino ocupa, ou seja, sempre a realizar trabalhos
domésticos lavando, cozinhando, costurando, enquanto o sexo oposto se ocupa de outros afazeres.
As representações ligadas ao gênero feminino estão, em sua grande maioria, determinadas pela
superação dos vários papéis os quais as mulheres assumem em tempos atuais, ou seja, uma
mulher deve ser mãe, trabalhar o dia todo, ser esposa dedicada, manter-se jovem e bonita e
ainda desejável ao seu parceiro. Quantos as representações masculinas, versam sobre o
sustento do lar e a atividade sexual. Um homem deve ser o provedor do lar, dar conforto a sua
família e ainda ser potente sexualmente para sentir-se um verdadeiro homem, a semelhança
com o padrão de masculinidade de séculos passados não é mera coincidência (ARAÚJO;
ANADON, 2012, p. 5).

Por mais que as mulheres tenham conquistado sua emancipação em vários setores da
sociedade contemporânea, ainda se faz presente no imaginário das pessoas, a visão de mulher
prendada, mesmo depois das conquistas dos direitos civis e de muitas mudanças no campo social.
Como explanado anteriormente, uma das funções das representações sociais é a função de
orientação, que para Abric (1998) guiam os comportamentos e as práticas, conceito este, claramente
evidenciado nos trechos das músicas.

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Esta orientação da conduta é resultado de alguns fatores essenciais: do tipo de relações do
sujeito e a tarefa que cada um assume dentro do grupo, no caso da mulher sempre a da mãe e dona
de casa, representação esta que influencia a definição de qual estratégia cognitiva deve ser seguida.
Os enunciados construídos a partir da interação verbal exprimem e realimentam a ideologia do
cotidiano. A ideologia do cotidiano é um termo utilizado por Bakhtin para explicar o domínio
da palavra interior e exterior (...) se expressa por meio de cada um de nossos atos, gestos ou
palavras, permitindo que os sistemas ideológicos constituídos (moral, arte, religião, politica,
ciência...) cristalizem-se a partir dela (OLIVEIRA, 2012, p. 25).

Entende-se dessa forma, que através da palavra todos os valores vão se cristalizar e o
professor nesse processo fica como mediador da relação, a qual reforça a diferença de gêneros no
sentido de direitos e de possibilidades dentro da cultura.

Outra questão que pode ser observada nas melodias infantis é o controle do corpo.
Conforme Craidy e Kaercher (2001, p. 126), em determinada escola as crianças ouviram a seguinte
música para aprenderem a se comportar: “tchu tchu tchu...” ou, “guarda, guarda, guarda bem
direitinho...” ou ainda, “pego a chavezinha tranco a boquinha (...)”

Em tais exemplos, é notável a forma como os professores tentam “domesticar” o


comportamento das crianças. Toda a naturalidade e espontaneidade que cada situação pode
proporcionar aos pequenos, de maneira subjetiva e através do diálogo são substituídas por ações
homogêneas, disciplinares e sempre com tom de ameaça, reforça a relação de poder, por exemplo,
senão fizer direitinho “pego a chavezinha e tranco a boquinha”. As crianças precisam de atividades
ricas, em que possam expressar todas as suas potencialidades.

Qual é o sentido dessas músicas? Por que há ritualização das práticas pedagógicas e por que
são realizadas indiscriminadamente sem serem repensadas? Como afirmam Craidy e Kaercher
(2001, p. 125). “as regularidades observadas diariamente são incorporadas como absolutamente
normais, enquanto os conhecimentos novos são ignorados e rejeitados pelo pensamento habitual”.
A educação musical deve, antes de mais nada, desenvolver nas crianças a alegria
proporcionada pela música, a alegria pelo belo, pelo lúdico, pela auto experiência criativa nos
espaços da música. As canções e as práticas pedagógicas repetitivas. Como educadores
musicais, devemos “capacitar” nossas crianças para a alegria pessoal pela música (MELO;
ALMEIDA, 2013, p. 24163).

A segunda função das representações, para Abric (1998), é a função do saber, a qual
possibilita a compreensão da realidade, esta, permite que as pessoas aprendam novos
conhecimentos de acordo com suas capacidades cognitivas. No caso da citada música, as crianças
são conduzidas para uma “ordem”, aprendem a ser submissas, na situação de quem tem o poder é o

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professor que ensina, e quem não segue as regras será punido, similar à analogia da “chave na
boquinha”.

Para a análise do sentido de tal prática dos professores, tão recorrente nas salas de Educação
Infantil, utiliza-se de alguns questionamentos de Oliveira (2012, p. 25):
Como a criança aprende o discurso de outrem? Como ela experimenta as palavras do outro na
sua consciência? Que concepção de mundo se explicita na sua linguagem? Como sua palavra
revela a ideologia do cotidiano? Como essas manifestações da ideologia do cotidiano
questionam ou alimentam os sistemas ideológicos constituídos? Enfim, como se articula a
consciência da criança com a lógica da comunicação ideológica?

Essas indagações levam à reflexão sobre qual é a concepção que o professor tem de
educação na infância, e de que forma se utiliza o poder que possui como pessoa fisicamente mais
desenvolvida. O diálogo que deveria nortear as relações de aprendizagem torna-se um monólogo,
claro do professor, a criança fica à espera de poder se comunicar apenas quando solicitada. Essa
relação assimétrica reflete o tipo de opressão que as crianças vêm sofrendo nas escolas infantis e
também na sociedade.

A análise seguinte refere-se a questão do consumo, em que o sujeito é avaliado pelas coisas
que tem e acaba por se apropriar dos valores capitalistas de alienação.
A barata disse que tem sete saias de filó

é mentira da barata ela tem é uma só”.

Ah! Ah! Ah! Oh! Oh! Oh!

Ela tem é uma só

A barata diz que tem carro, moto e avião,

é mentira da barata ela só tem é caminhão”(...)

(ALMEIDA, 1998, p. 54).

A música segue com oito estrofes nas quais a barata continua a ostentar o que não tem,
denota-se assim, como a aquisição e posse de bens de consumo são os grandes mecanismos para
diferenciar grupos e manter a divisão das classes sociais. Essa música pode criar nas crianças uma
ilusão de que as pessoas precisam sempre ter, e não percebem que esse desejo de compra não é um
desejo seu, e sim algo externo que lhe foi incutido por outros.

Representação na qual tem como força principal manter e preservar as diferenças sociais,
pode criar estereótipos nas relações e contribuir à alienação.

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Conforme entendimento de Bakhtin (1981):
É preciso fazer uma análise profunda e aguda da palavra como signo social para compreender
seu funcionamento como instrumento de consciência. É devido a esse papel excepcional de
instrumento da consciência que a palavra funciona como elemento essencial que acompanha
toda a criação ideológica, seja ela qual for. (Apud OLIVEIRA, 2012, p. 21).

A música da barata explica a terceira função das representações, a função identitária, a qual
define a identidade e a proteção da especificidade dos grupos (ABRIC, 1998). Essa função preserva
os processos de diferentes grupos, referindo-se a música, os grupos de poder aquisitivo mais forte,
desmoraliza assim, os que não têm bens materiais.

Para Oliveira (2012, p. 27) esse tipo de situação “reforça a estratificação social e econômica
com base nas interações socioafetivas que ocorrem no interior do contexto escolar”. A competição
evidenciada na música reflete os valores de consumo presentes na sociedade.

É responsabilidade do professor, obter consciência da importância da palavra como


instrumento de interação social, pois é o mediador do conhecimento externo entre mundo e criança,
precisa ter recursos reflexivos intelectuais para poder mediar essa relação de aprendizagem
significativa.

Na análise seguinte vê-se a representação de família. Mesmo hoje, tendo-se as famílias


várias configurações, as escolas ainda continuam com a visão de que família deve ser composta por
pai, mãe e filhos. Esse ângulo de visão pode gerar em uma sala de aula um conceito distorcido da
atual realidade.
A família aqui alegre pessoal,
família tão original, um pai

uma mãe, uma irmã, um irmão

nenê miudinho e gentil...

tão forte é o papai polegar

tão meiga a mãezinha do lar,

a mana é tão alta

o irmão é menor nenê

vamos já embalar (...)

(CRAIDY; KAERCHER, 2001, p. 125).


Para Craidy e Kaercher (2001) essa música não leva em consideração as famílias que são
compostas por outras configurações, como as crianças que moram com os avós e dois primos, ou a
criança que não conhece os pais. Na nossa cultura a imagem da mamãezinha meiga e o pai forte são
evidenciados na literatura.

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Precisamos estar atentos às funções educativas das canções folclóricas na infância, para que
assim compreendamos o valor que elas têm na formação das crianças, pois as canções também
estabelecem comunicação e diálogo, quando ouvimos uma música internalizamos e dialogamos
de forma simples e natural, muitas das representações sociais presentes na superfície ou
inclusive nas entrelinhas de cada verso (MELO; ALMEIDA, 2013, p. 24158).

As músicas infantis, carregadas de representações ideológicas, denota a cultura de um povo,


contém um conjunto de práticas que constituem os valores, as condutas, as formas de conhecimento
que são transmitidas ao grupo escolar das crianças.

A quarta função das representações, a função justificadora, conforme Abric (1998, p. 30)
permite a justificativa das tomadas de posição e dos comportamentos, “a representação tem por
função preservar e justificar a diferenciação social, e ela podem estereotipar as relações entre os
grupos, contribuir para a discriminação ou para a manutenção da distância social entre eles”.
Explica a conduta de um grupo frente a outro, tem relação de competitividade entre os diferentes
grupos, em que novas representações de grupos vão ser criadas, e sob o aspecto da análise da
família, podem criar comportamentos hostis.

Em algumas representações sociais contidas nas músicas infantis, percebe-se a forte


presença da violência e da discriminação contra os negros. Nas últimas semanas foram noticiadas
nos diversos meios de comunicação várias situações de violência que envolvia pessoas negras.
Como por exemplo, o rapaz que foi confundido com um assaltante por ter um cabelo black power e
ficou preso por 15 dias injustamente. Ou uma mulher negra baleada na comunidade em que vivia e
foi levada pelos policias, mesmo ferida foi colocada no porta-malas do carro e arrastada por
quilômetros.

Situações como essas mostram a violência, principalmente sob a ótica desse paradigma que
envolve a condição de ser negro no país, ponto observado na letra dessa cantiga popular que tem
um ritmo acelerado e convidativo a dançar:
Plantei uma sementinha no meu quintal,

Nasceu uma neguinha de avental.

Dança neguinha! – eu não sei dançar!

Pega o chicote que ela dança já!

(MELO; ALMEIDA, 2013, p. 24159).

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O chicote é o símbolo dos açoites, do tronco, das chibatadas, sempre trazendo a ideia que o
negro foi escravizado e devido a isso, deve ter condição inferior; e novamente a condição da mulher
está subjugada, o avental remete a condição de doméstica.

Para Melo e Almeida (2013, p. 24159) é claramente perceptível nesta música a


desvalorização do negro, em que há construção de “barreiras morais, físicas e psicológicas que
contribuem significativamente para a construção da violência com modelos de comportamento que
expressam as relações de uma sociedade”.
As representações sociais negativas, carregadas de preconceitos e estereótipos, são
internalizadas desde a primeira infância por meio de uma educação infantil e escolar imbuída
das ideologias do patriarcalismo e do racismo. Elas são capazes de tolher o desenvolvimento da
personalidade, da autoestima e da autonomia da mulher e do negro (NASCIMENTO, 2001
apud MELO; ALMEIDA, 2013, p. 24161).

Ao longo dos tempos, foi ocorrendo a construção das estruturas sociais, unindo-se duas
forças grandiosas, de um lado, tem-se os conteúdos construídos socialmente e que circulam pela
sociedade, e de outro se encontram as forças resultantes do próprio processo de interação social e as
pressões para manter as identidades coletivas.

Conforme Spink (2004, p. 122), “o contexto, neste sentido, é essencialmente “intertextual”,


ou seja, justaposição de dois textos: o texto sócio-histórico que remete as construções sociais que
alimentam nossa subjetividade, e o texto do discurso, versões funcionais constituintes de nossas
relações sociais”.
Essas discrepâncias têm consequências práticas. Pois, se minhas observações estão corretas,
então todos nossos “preconceitos”, sejam nacionais, raciais, geracionais ou quaisquer que
alguém tenha, somente podem ser superados pela mudança das representações sociais da
cultura, da “natureza humana” e assim por diante. Se, por outro lado, é a visão dominante que é
a correta, então a única coisa que precisamos fazer é persuadir os grupos ou indivíduos
contrários, que eles possuem uma quantidade enorme de características comum, que eles são,
de fato, espantosamente semelhantes e com isso nos livramos de classificações profundas e
rápidas e de estereótipos mútuos (MOSCOVICI, 2003, p. 66).

No entendimento do autor supracitado, esses preconceitos só podem ser alterados se houver


mudanças nas representações sociais, e a escola é o lugar para que essas transformações possam
ocorrer. O professor como pessoa mais experiente neste processo de aprendizagem, deve direcionar
e problematizar as músicas para novos olhares reflexivos. Quando algumas músicas são percebidas
com um olhar crítico, não significa que se quer seu fim, no entanto, é necessário o olhar
problematizador às práticas pedagógicas, para que assim, os professores não fomentem a criação de
novas e falsas classificações sociais.

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A próxima análise apresenta a relação de agressividade do poder presente na sociedade.
Pai Francisco entrou na roda

Tocando seu violão

Pararão, dão, dão

E vem de lá seu delegado

E pai Francisco foi pra prisão

Como ele vem todo requebrado

Parece um boneco desengonçado

(ALMEIDA, 1998, p. 20).

Sob a ótica de Melo e Almeida (2013, p. 24160) a música Pai Francisco é a “representação
social dos marginalizados e excluídos sociais”, enquanto que Seu Delegado representa a lei
daqueles que usam da força física e da legitimidade do Estado para manter a ordem e os bons
costumes. E nessa relação, para conseguir a “ordem” oprimem, usam da violência física. As
crianças ao cantarem, sempre desejam ser o Delegado, pois, este tem o poder, assim, os pequenos se
apropriam da ideia de poder, dominação e preconceito.
As representações sociais devem ser estudadas articulando elementos afetivos, mentais, sociais,
integrando a cognição, a linguagem e a comunicação às relações sociais que afetam as
representações e à realidade material, social e ideativa a qual elas intervêm (SPINK, 1994, p.
121).

É importante ressaltar que as músicas refletem os conceitos de cada época da sociedade, e


caso ainda se continua a cantar tais músicas, carregadas de representações de dominação, violência,
discriminação, esses valores povoam de maneira determinante as relações sociais.

Conforme Souza (2000, p. 27) “ao retornar para si o olhar e as palavras impregnadas de
sentidos que o outro lhe transmite, a criança acaba por construir sua subjetividade a partir dos
conteúdos sociais e afetivos que este olhar e estas palavras lhe revelam”.

PROFESSORES DE EDUCAÇÃO INFANTIL E SUAS REPRESENTAÇÕES

Entende-se necessário ouvir alguns professores da Educação Infantil, para que se possa
conhecer o que eles pensam das músicas destinadas ao público infantil. Para tal, fundamentou-se a
análise em entrevistas individuais com 4 professores de Educação Infantil de uma escola da Rede
Municipal de Ensino.

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A entrevista foi realizada apenas com mulheres, devido ao número de homens na Educação
Infantil serem inexpressivos. Na escola, objeto de estudo, as entrevistas foram aplicadas somente às
professoras regentes, por meio de gravação e transcrição dos dados. Para melhor entendimento e
observação de cada resposta, as perguntas foram separadas por categorias. As professoras foram
denominadas como sujeito 1, 2, 3 e 4, para preservar a identidade das mesmas.

Antes, porém, faz-se uma análise breve do que se está estabelecido no Referencial
Curricular Nacional para Educação Infantil, obtendo-se uma visão mais ampla e critica a respeito da
linguagem.
A música é a linguagem que se traduz em formas sonoras capazes de expressar e comunicar
sensações, sentimentos e pensamentos, por meio da organização e relacionamento expressivo
entre o som e o silêncio. A música está presente em todas as culturas, nas mais diversas
situações: festas e comemorações, rituais religiosos, manifestações cívicas, políticas etc. Faz
parte da educação desde há muito tempo, sendo que, já na Grécia antiga, era considerada como
fundamental para a formação dos futuros cidadãos, ao lado da matemática e da filosofia. A
integração entre os aspectos sensíveis, afetivos, estéticos e cognitivos, assim como a promoção
de interação e comunicação social, conferem caráter significativo à linguagem musical. É uma
das formas importantes de expressão humana, o que por si só justifica sua presença no contexto
da educação, de um modo geral, e na educação infantil, particularmente (BRASIL, 1998, p.
47).

A música é a expressão de uma cultura, envolvem sentimentos, linguagens, expressão, está


em todos os setores da sociedade. Como elemento de uma sociedade faz parte também dos
currículos da Educação Básica, portanto, essa linguagem não pode deixar de ser discutida nos meios
educacionais.

Norteado pelo conceito proposto no Referencial, pretendeu-se coletar as opiniões dos


professores, visando perceber se os professores conhecem a real importância da linguagem musical
direcionada à Educação Infantil, de que forma estão sendo utilizadas as músicas infantis como
estratégias pedagógicas, se estão inseridas em momentos não planejados, como forma de controle
disciplinar e transmissão de valores e conteúdos.

A primeira pergunta feita as professoras foi:

1. Você utiliza músicas infantis em suas aulas?


Sujeito 1: Olha, logo que a gente entra né, tem música tem oração ai as crianças cantam, a
gente faz dinâmica, logo no início né para as crianças darem uma relaxada, da uma
descontraída para a gente começar a aula.

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Sujeito 2: Sim bastante. Bom geralmente na acolhida, ai depois se tiver alguma atividade assim
no meu planejamento eu já faço uma musiquinha de acordo, aí a gente já canta eu uso violão
também né, às vezes faço encenação a própria música da para fazer um teatro, ai eu já chamo
por exemplo “A Linda Rosa Juvenil” eu já chamo quem vai ser o belo rei, quem vai ser a flor,
ai nisso já trabalha oralidade tudo, eles se expressam né.

Sujeito 3: Sim utilizo. É na roda né cantamos músicas, cantigas de roda e com planejamento
também eu coloco lá, eu gosto de trabalhar músicas todos os dias para que as crianças possam
relaxar e tomar gosto pela música.

Sujeito 4: Sim. Em vários momentos utilizo às vezes no momento da entrada da roda, às vezes,
nos momentos de brincadeiras como cantigas de roda e também quando surge algum texto
coletivo que a gente vai fazer ou ligado alguma aprendizagem acaba a gente buscando alguma
música relacionada.

Ao longo do tempo, a música na Educação Infantil vem atendendo a vários propósitos. Para
antecipar momentos da rotina, para trabalhar datas comemorativas, para trabalhar conteúdos como
números, alfabeto, dias da semana, etc. como citados nos depoimentos das professoras. A música é
utilizada de maneira indiscriminada, sem objetivos claros. Em nenhum momento nesses discursos
percebe-se o enfoque na importância da música como linguagem que ajuda a promover o
desenvolvimento cognitivo, expressivo, afetivo. A música é vista como recurso disciplinador e
como reprodutora de valores e gestos estereotipados.
A música no contexto da educação infantil vem, ao longo de sua história, atendendo a vários
objetivos, alguns dos quais alheios as questões próprias dessa linguagem. Tem sido, em muitos
casos, suporte para atender a vários propósitos, como a formação de hábitos, atitudes e
comportamentos: lavar as mãos antes do lanche, escovar os dentes, respeitar o farol etc.; a
realização de comemorações relativas ao calendário de eventos do ano letivo simbolizado no
dia da árvore, dia do soldado, dia das mães etc., traduzidos em canções costumam ser
acompanhadas por gestos corporais, imitados pelas crianças de forma mecânica e estereotipada
(BRASIL, 1998, p. 46).

A música traz ludicidade às aulas e deve ser utilizada em momentos prazerosos, bem como
torna a aprendizagem mais significativa. Para tanto, o professor deve ficar atento aos conteúdos
dessas canções e não tornar a música apenas um instrumento de organização e transmissão de
conteúdo.

É uma linguagem, um conhecimento que se constrói, não vem pronto. No entanto, o que se
vê na prática escolar, não se configura numa ligação entre a música e as demais práticas do
conhecimento, mas se evidencia a reprodução e imitação (BRASIL, 1998).

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Em relação à segunda pergunta direcionada aos professores, estes, não demostraram saber as
diversas possibilidades de conhecimento que se pode construir com o auxílio da música. As
crianças precisam vivenciar diferentes estilos, explorar a expressão corporal, oral, cognitiva,
afetiva. Não como reprodutoras, mas como criadoras.

2. Por que se utiliza da prática musical?


Sujeito 1: Olha é para aumentar o repertório da criança, trabalhar linguagem também, trabalhar
também Linguagem Oral, para a criança desinibir porque a partir do momento que a gente
trabalha uma dinâmica a criança já está sendo trabalhada.

Sujeito 2: A música é perfeita, ela pode... ela tem o poder de transformar o ambiente, você
pode conseguir uma agitação e também aquela calma dependendo da música e eu quero utilizar
ainda porque tem mais coisa pra fazer.

Sujeito 3: Porque hoje em dia existe vários tipos de músicas né, então eu acho importante que
as cantigas de roda que foi passada pra mim quando eu era criança e hoje os pais não tem o
costume de cantar para as crianças e tá se desvalorizando, então como professora da educação
infantil eu acho importante que as crianças conheçam esse tipo de música.

Sujeito 4: Porque eu acho muito encantador essa atividade essa aprendizagem liga muito as
crianças ao que tá aprendendo e também amplia o repertório musical das crianças que nem
sempre é escolhido por eles né, a gente escolhe um cantor, um compositor a gente acaba
utilizando as músicas.

Diante das falas, percebe-se a presença constante das músicas na prática pedagógica, sem,
entretanto, a consciência da importância da música no processo de desenvolvimento. Para os
sujeitos a música serve para aumentar o vocabulário, agitar ou para acalmar, para manter a tradição.
Mas não mencionam o desenvolvimento de processos cognitivos, afetivos, motores, estéticos
conforme preconiza o Referencial Curricular: “de modo a garantir à criança a possibilidade de
vivenciar e refletir sobre questões musicais, num exercício sensível e expressivo que também
oferece condições para o desenvolvimento de habilidades de formulação de hipóteses e de
elaboração de conceitos” (BRASIL, 1998, p. 48).

3. Como se dá a escolha dessas músicas?


Sujeito 1: Então eu já tenho um repertório que há muitos anos que eu trabalho na área né, então
a gente trabalha várias músicas e também os CDs quando tem um tema específico a gente
busca o CD. Olha têm do palhacinho que fala venha todos venha ver o palhacinho, essa música
é legal porque a gente pode trabalhar também uma, você trabalha no início você canta com eles
para trabalhar o texto escrito depois você faz à mímica e essa mímica quando a criança... está
muita bagunça, você pode está trabalhando isso ai para as crianças se acalmar, eles adoram
fazer mímica.

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Sujeito 2: Além do planejamento eu procuro assim como posso dizer, coletânea, a cultura de
Mato Grosso do Sul né, aquelas cantigas de roda, porque cada região do Brasil tem uma
característica de musicas né, porque através da música você pode trabalhar diferentes culturas.

Sujeito 3: É eu busco em livros né, as cantigas geralmente são de roda né ciranda cirandinha,
atirei o pau no gato coisas que já não existem muito, apenas na escola né, então eu faço esse
critério o que eles conhecem conhecimento prévio também, para trazer sempre uma novidade
de música.

Sujeito 4: Então como eu disse a partir do momento que tem uma atividade relacionada a essas
músicas com texto da “Dona Aranha” ou uma linguagem do estudo da dengue a gente acaba
buscando uma música relacionada a isso, ou o estudo de uma obra de um CD de um
compositor.

O último questionamento foi sobre qual critério era utilizado para escolha das músicas. Nas
respostas foi denotado um empobrecimento dos repertórios musicais, privilegiam-se poucos estilos
musicais e não se evidenciou um olhar critico às letras musicais, as quais vieram carregadas de
preconceitos e ideologias negativas.
A escuta é uma das ações fundamentais para a construção do conhecimento referente à música.
O professor deve procurar ouvir o que dizem e cantam as crianças, a “paisagem sonora” de seu
meio ambiente e a diversidade musical existente: o que é transmitido por rádio e TV, as
músicas de propaganda, as trilhas sonoras dos filmes, a música do folclore, a música erudita, a
música popular, a música de outros povos e culturas (BRASIL, 1998, p. 68).

A música na Educação Infantil é uma linguagem tão importante quanto às demais


linguagens do saber, o que requer do professor um atento olhar crítico e consciente de sua prática.
Não se objetiva desmerecer quaisquer músicas, mas sim, propor que haja mais reflexão aos valores
e conceitos reproduzidos e direcionados às crianças. O professor como mediador nesse processo de
conhecimento, entre o mundo e a criança, precisa constantemente se aprofundar e aprimorar suas
práticas pedagógicas, de maneira que se torne significativa e possam contribuir para a valorização
de todos os seres.

Mediante as informações obtidas nas entrevistas, tornou-se claro a necessidade de haver


investimento na formação continuada aos professores, a qualificação profissional permite
desenvolver competências cada vez mais complexas e de maior responsabilidade, indispensável, em
resposta aos desafios frente evolução da Educação Infantil e de toda sociedade.

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RESUMO
Reflexão sobre o processo de construção social dos fenômenos contidos em algumas músicas infantis, as
quais propagam ideias que determinam lugares e papéis na sociedade. Apoia-se na Teoria das
Representações Sociais articulada com a Teoria Histórico-Cultural, pautada no princípio dos fenômenos
humanos como produção do processo histórico da formação social para fazer uma abordagem empírica, com
alguns professores que trabalham com música na Educação Infantil. Conclui-se, há não consciência do
professor da importância da representação social contida na música mediante o processo de desenvolvimento
da criança. Os dados obtidos nas entrevistas revelaram a necessidade de investimento na formação
continuada do professor, para desenvolver competências mais complexas e de maior responsabilidade.
Palavras-chave: Educação Infantil. Representação Social. Linguagem Musical.

SONGS FOR CHILDREN AND SOCIAL REPRESENTATIONS: A social mismatch

ABSTRACT
Reflection on the process of social construction of phenomena contained in some children's songs, which
propagate ideas that determine places and roles in society. It is based on the social representations theory
articulated with the Historical-Cultural Theory, based on the principle of human phenomena as production of
the historical process of social formation to There was an empirical approach, with some teachers working
with music in kindergarten. It follows that there is no consciousness of the teacher of the importance of social
representation contained in music by the child development process. The data obtained from the interviews
revealed the need to invest in continuing education of teachers to develop more complex skills and greater
responsibility.
Keywords: Childhood Education. Social Representation. Musical Language.

Submetido em jun. 2015


Aprovado em nov. 2015

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