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INTRODUÇÃO
Quando relacionamos as teorias vistas nas licenciaturas brasileiras versus as práti-
cas pedagógicas presentes nas salas de aula temos como resultado algo complexo que
muitas vezes nem as disciplinas de Estágios Supervisionados dão conta. Entrelaçar
teoria e prática na educação é algo desafiador e fonte de vários estudos no campo da
educação. Os estagiários, muitas vezes, não conseguem dialogar sobre a disciplina
com o professor supervisor e com isso, não há tempo de estreitar os laços entre a
214 Ensino de língua estrangeira na educação básica brasileira
universidade que estrutura a teoria e a escola que constitui a prática. Dessa forma,
podemos dizer o quão enriquecedor foi o projeto de extensão RULLE (Reflexões Lin-
guísticas e Literárias aplicadas ao texto na Educação Básica) que nos trouxe essa pos-
sibilidade. Além do diálogo entre formandos e formados, entre teoria e prática, entre
universidade e escola, o RULLE oportunizou aos professores participantes das ofici-
nas pensarem em conjunto com os licenciandos/organizadores destas oficinas e esco-
lherem quais temas queriam discutir e assim, que os discentes de Letras – também
integrantes do PET (Programa de Educação Tutorial) da UFPE – pudessem planejar
oficinas que ajudassem estes educadores a lidarem com algum problema teórico na
sala de aula e, desta forma, a costura entre teoria e prática fosse, de fato, real.
Nosso grupo de trabalho esteve responsável pelas discussões no âmbito das lín-
guas estrangeiras e tratar de ensino-aprendizagem de língua estrangeira no Brasil é
tratar de um assunto muito controverso. Apesar de já ser uma realidade a necessidade
de que as pessoas devam possuir pelo menos uma língua estrangeira que, nesse caso,
vai cumprir objetivos diversos, seja, acadêmico, profissional e/ou pessoal, quando se
fala do ensino de língua estrangeira na educação básica e pública brasileira, há vários
pontos em debate. A verdade é que desde o período colonial, com a pedagogia jesuíti-
ca, essa(s) disciplina(s) está(ão) envolta(s) tanto em discussões sob o ponto de vista de
escolhas de metodologias quanto a partir das mudanças de leis e reformas educacio-
nais. O que nos parece, então, é que o sistema educacional público brasileiro precisa
avançar e, em certos casos, se estabelecer para que consiga cumprir e acompanhar os
objetivos dos cidadãos que precisam dele. Em meio a tal problemática, queremos des-
tacar diretamente mais uma: as mudanças nesse ensino após a Base Nacional Comum
Curricular, doravante BNCC, de 2017, e a partir disso, chamar atenção para o ensino
de duas línguas estrangeiras em específico, o inglês e o espanhol. O inglês, a língua
estrangeira que permanece na educação básica, mas com uma proposta diferente dos
documentos norteadores anteriores à última BNCC, e o espanhol que deixou de ser
oferta obrigatória e passou para segundo plano, apenas 12 anos depois de seu ensino
ter sido oficializado dentro da grade curricular e em horário de aula, a partir da Lei
11.161/2005. Algo novo nesse documento são os chamados Itinerários Formativos,
que de maneira simplificada, seriam conjuntos de disciplinas e oficinas que os alunos
vão escolher a partir de suas necessidades, de seu planejamento para o Ensino Médio.
Há uma esperança de, nesses itinerários, acontecer a inserção do espanhol, embora
muitos docentes de língua espanhola já estejam com disciplinas afins por medo de
serem descartados ou alocados para outras funções.
Há outra questão que sempre é polêmica que envolve a escolha da abordagem me-
todológica no ensino de línguas, então, imaginem ter que escolhê-la em meio a esse
desalinho que estamos vivendo? Dessa forma, a oficina eleita que foi pensada a partir
dos temas predefinidos pelos docentes da área, e foi realizada após discutir toda essa
problemática com os professores para que depois pensássemos em possibilidades e
estratégias metodológicas. Posto isso, houve uma construção coletiva de um plano
de aula para o ensino médio que, ao fim, pudéssemos usar para qualquer língua
estrangeira.
Ensino de línguas propostas e relatos de experiência 215
(...) é impossível determinar de uma vez por todas a separação entre as lín-
guas que constituem o sujeito, conforme com elas se identificam, se transfor-
mam, na mistura das línguas, de outros (textos, discursos, memória, desejos):
“as línguas vão se ‘contaminando’, (es)tragando a tão desejada e impossível
pureza da língua materna”.
Como a proposta é baseada na comunicação, entende-se que há muitas regras que são
implícitas, como questões culturais e sociais, por exemplo. Ou seja, nem tudo é gra-
matical ao mesmo tempo que a gramática também se faz presente e é importante.
Segundo Melo (1997, p. 86) se o plano é trabalhar no presente do indicativo, o que
estará em jogo não será apenas os estudos das formas, isto é, atividades para formação
e conjugação do tempo e sim, além da forma, o aspecto nocional é importante, “a ex-
pressão de hábitos e modos de vida que acontecem no momento do discurso” devem
ser trabalhados. Sendo assim, há vários componentes que coadunam para a formação
dessa abordagem, são elas: a competência linguística, a competência discursiva, a
competência referencial, a competência sociocultural e a competência estratégica.
Esses componentes existem porque, como vimos, precisamos produzir dois saberes:
os linguísticos e os sociolinguísticos presentes em uma comunidade. Outra caracte-
rística importante é que o aluno tem um papel fundamental, ele é coparticipante do
processo. O estudante passa a ter uma maior autonomia e responsabilidade com sua
aprendizagem ao mesmo tempo que o professor se torna “facilitador, organizador das
atividades, conselheiro e analista das necessidades e interesses dos alunos” (SANTOS,
2020, p. 256). Há uma sequência de fases que geralmente se adota nos cursos comuni-
cativos que foram apresentadas por Vigner (1995, p. 126 e 127) apud Melo (1997, p. 87)
que podem demonstrar como essa abordagem se diferencia das outras até então: 1)
fase preparatória de sensibilização temática, de ativação do léxico específico; 2) diálo-
gos e documentos diversos que servem de referência situacional; 3) atividades visando
a exploração do tema; 4) trabalho de sistematização; e 5) abertura/transposição atra-
vés da utilização de materiais complementares. É notório que um dos avanços dessa
perspectiva é que o trabalho/processo passa ser colaborativo, ainda que em menor
grau se compararmos com as outras metodologias que virão.
Apesar de tudo isso, essa metodologia foi criticada por apresentar um rico discur-
so teórico e falhar em tecnologia, procedimento e exercícios. Para Santos (2020, p.
257) as metodologias posteriores a essa foram apenas evoluções e reformulações.
9.1.7 O PÓS-MÉTODO
O pós-método que Kumaradivelu (2001) propõe tem, a nosso ver, uma concepção
prodigiosa para a realidade do ensino de língua estrangeira no ensino básico brasilei-
ro. Ele sugere um programa tridimensional que é formado por três tipos de pedago-
gias: a de particularidade, a de prática e a de possibilidade. Com elas, o docente pode
adequar os conhecimentos teóricos, produzir teorias próprias e elaborar materiais que
atendam seu público alvo. O professor tem a possibilidade de combinar as teorias
anteriores e adequá-las a sua realidade. E para isso, além de conhecer bem várias pro-
postas metodológicas, ele precisa respeitar e conhecer seu grupo. Avaliar e reavaliar
sua abordagem. Acolher e rechaçar propostas teóricas. Ou seja, o professor tem a li-
berdade para criar o ambiente propício ao ensino.
co que merece destaque e que aparece na última revisão da BNCC, também de 2017, é
sobre o inglês, que deixa de ser LE (Língua Estrangeira) e passa a ser ILF (Inglês como
Língua Franca). Muitas polêmicas e muitos problemas. Primeiro, é o grande retroces-
so que há com essa reformulação, já que a política linguística volta a ser uma política
monolíngue e hegemônica, na qual tanto o português aparece como única possibili-
dade de língua materna e o inglês como única possibilidade de língua não materna,
dentro de um país que é claramente multilíngue e multicultural que é o Brasil, em que
se falam, além do português, línguas indígenas, línguas de herança e tantas outras e
que, inclusive, o professor deveria estar preparado para lidar ou em processo de pre-
paração para tal abrangência linguística que permeia na atualidade. E segundo, tão
complexo quanto o primeiro, seria o inglês posto na BNCC como língua franca, que
deve ser trabalhado com um teor de neutralidade, dissociado de aspectos políticos e
ideológicos. Analisando tais características, seria possível uma língua dessa forma ser
ensinada nas escolas brasileiras? Uma língua como única possibilidade para interação
e mobilidade, descartando outras línguas que poderiam cumprir este papel. Seria esse
inglês, de fato, neutro? É possível uma língua neutra num mundo cada vez mais plural
e globalizado? Não seria algo paradoxal?
Nesse novo formato de Ensino Médio, a proposta é que haja uma flexibilização dos
currículos e com isso, a possibilidade dos alunos escolherem o que desejam estudar.
Essa é a teoria. Sendo assim, nos dois últimos anos do Ensino Médio, pelo texto
aprovado no Senado, foram definidos os chamados Itinerários Formativos que seriam
caminhos de aprofundamento distintos aos estudantes em uma ou mais áreas de co-
nhecimento e/ou na formação técnica e profissional. São divididos em Linguagens,
Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Formação Técnica e Profis-
sional. Em Linguagens, temos o seguinte no documento:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todo o exposto e toda discussão, entendemos que conhecer as diversas
abordagens é de suma importância e isso é um ponto inegociável, no entanto, nem
tudo que é imposto pelas metodologias deve, obrigatoriamente, ser trabalhado. Essa
decisão sobre a metodologia apropriada não é fácil e ela precisa partir de reflexões
Ensino de línguas propostas e relatos de experiência 223
prévias. Necessita ser tomada pelo professor como um ponto de referência e deve ser
adaptada de acordo com a situação em que estiver sendo utilizada. Outra considera-
ção é sobre a atual conjuntura que nós, professores de línguas do ensino básico, esta-
mos vivenciando. A partir de escolhas políticas, chegou a lei do novo ensino médio e
a formulação de uma BNCC em que o espanhol deixou de ser uma oferta obrigatória
no ensino médio e o inglês passou a ser a única língua não nativa ofertada e obrigató-
ria, ou seja, estamos vivenciando um retrocesso na medida em que o que está em vigor
é uma política de ensino monolíngue dentro de um país multilíngue e multicultural.
No caso do inglês, ainda que permaneça, deixa o status de língua estrangeira e ganha
o status de língua franca em que carrega o peso de uma falsa neutralidade e dissocia-
da de aspectos políticos e ideológicos. Tentando relacionar tudo isso, elaboramos nos-
sa oficina e como principal resultado tivemos a percepção que os docentes entendem
que estão diante de documentos norteadores e que podem planejar levando em conta
sua autonomia docente, e isso nos trouxe mais tranquilidade em meio ao caos atual.
Nós, educadores, percebemos que enquanto responsáveis diretos na formação dos jo-
vens cidadãos podemos planejar respeitando as variedades, contextualizando os con-
teúdos e entendendo que trabalhar a pluralidade, seja na escolha metodológica, seja
na tentativa de seguir as orientações documentais é a melhor saída.
REFERÊNCIAS
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lis: Editora da UFSC, 1988.
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www.hottopos.com/videtur6/selma.htm. Acesso em: 25 jan. 2022.
CINCO PERGUNTAS SOBRE O NOVO ENSINO MÉDIO. Inovações
em educação, 2021. Disponível em: https://porvir.org/5pergun-
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MELO, Ticiana. O ensino de Línguas Estrangeiras sob a ótica da Abordagem Comuni-
cativa. Rev. de Letras. v. 19, n. 1/2 - jan/dez 1997. p. 84-87.
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