Teoria e Crítica Literária

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TEORIA E CRÍTICA LITERÁRIA

AULA 1

Profª Angela Maria Fernandes Pimenta


CONVERSA INICIAL

O objetivo geral deste estudo é tratarmos de aspectos pertinentes à teoria


e à crítica literária em uma perspectiva histórica e, principalmente, atualizando
tais questões.
Nesta etapa, discutiremos conceitos fundamentais para a prática da
pesquisa em Letras, ou seja, trataremos da tríade teoria-crítica-literatura.
Quando pensamos no primeiro elemento da tríade que organiza esse
estudo, a teoria, torna-se necessário abordarmos a Teoria da Literatura como
uma disciplina e também como os conhecimentos necessários para
compreendermos o fenômeno literário.
O segundo elemento, a crítica, leva-nos a discutir sobre a existência de
abordagens e níveis diferentes de crítica, do senso comum às críticas
especializadas construídas nas academias e universidades.
Pensar em teoria e em crítica não seria possível sem pensarmos no centro
do processo: a Literatura. Afinal, será que todos nós temos plena clareza sobre
o que é Literatura e como diferenciarmos os textos literários dos textos não-
literários? Essa é apenas uma pequena amostra do que discutiremos nesta
etapa.
A fim de organizarmos didaticamente sua leitura, seus estudos e
consultas futuras, esta etapa será organizada da seguinte maneira:

1. Teoria;
2. Crítica;
3. Literatura;
4. Texto literário;
5. Estudos literários hoje.

Boa leitura!

TEMA 1 – TEORIA

A Teoria da Literatura é uma disciplina institucionalizada em todos os


cursos de Letras, mas antes de explorarmos sua caracterização e os elementos
dos quais essa abordagem irá ocupar-se, vale lembrarmos que toda teoria é uma
investigação sobre um fenômeno. Cabe, portanto, à teoria, a investigação e o
questionamento sobre os fatos do mundo.

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A Teoria da Literatura não é um manual de instruções de como se deve
produzir uma obra literária, e sim uma proposta de interpretação do fenômeno
literário.
Mas, será que alguma teoria conseguiria dar conta sozinha da
complexidade de um determinado fenômeno? Parece-nos evidente que não. Em
se tratando de teorias, não existe uma mais adequada que a outra. O que ocorre
é que cada abordagem teórica analisa o fenômeno de estudo sob uma
determinada perspectiva.
Cada teoria enfatiza um aspecto de seu objeto de estudo. Ao pensarmos
na Literatura, poderíamos dar como exemplo a abordagem feita pelos formalistas
russos, a quem interessava apenas o aspecto material do texto literário,
ignorando completamente o papel do leitor. Sendo assim, nunca se pode afirmar
que uma teoria é superior à outra, pois todas são questionáveis de acordo com
os critérios que se estabeleçam.
Falar em Teoria da Literatura implica falarmos também sobre a crítica
literária, uma vez que as duas áreas se alimentam mutuamente. A teoria literária,
que se configura como uma proposta de interpretação do fenômeno literário, é
uma construção discursiva da qual participam muitos agentes, inclusive os
autores e os leitores.
A teoria que embasa os estudos sobre a Literatura, muitas vezes, precisa
também considerar as questões linguísticas envolvidas na construção dos
discursos literários, de modo que não se pode pensar que linguística e literatura
são conhecimentos dicotômicos, embora em nossos cursos de Letras seja
comum eles serem vistos como áreas específicas.
Existem diferentes correntes teóricas da Literatura, as quais serão
abordadas em nossos estudos, a saber: Formalismo, Estruturalismo,
Hermenêutica, Teoria da Recepção, Teoria Marxista, dentre outras.
Basicamente, podemos afirmar que cada uma das correntes teóricas enfatiza e
debruça-se sobre um dos aspectos de uma obra literária, ou seja: a forma, o
autor, o mundo, o leitor, o estilo, a história ou o valor.
Atualmente, entende-se que os estudos literários precisam caminhar junto
com outras disciplinas e áreas do conhecimento, em uma abordagem
transdisciplinar.
A Literatura relaciona-se diretamente com a História, ajudando-nos a
perceber as mudanças nas épocas literárias; com a Sociologia, abordando a

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função social da obra de arte e seus vínculos com a sociedade onde foi
produzida: com a Psicanálise, explorando a função psíquica do autor e dos
elementos narrativos; e com a Filosofia, aperfeiçoando e atualizando os
conceitos de arte.

TEMA 2 – CRÍTICA

Poderíamos iniciar nossa reflexão sobre a crítica literária, questionando-


nos: o que é criticar algo? Não estamos, de maneira nenhuma nos referindo a
uma apreciação negativa apenas, como o senso comum compreende o verbo
“criticar”. Atitudes valorativas são inerentes ao ser humano: estamos o tempo
todo interpretando, analisando, avaliando, criticando.
Partindo dessa premissa, fica muito claro que toda crítica é subjetiva, pois
baseia-se em percepções e impressões de um indivíduo ou grupo.
Acreditar que a crítica literária é a avaliação de qualidades e defeitos de
uma obra literária não é suficiente para nós, uma vez que o conceito de crítica
literária deve abranger “vários vetores distintos, linhas de desenvolvimento que
se complementam e reforçam, mas que também entram em tensão e até mesmo
se contradizem” (Durão, 2016, p. 10).
A crítica literária utiliza-se da teoria para determinar se os recursos de
expressão da obra literária são significativos e colocam-na no rol de produções
que causarão impactos nos leitores.
Para Antônio Cândido (2000), o papel do crítico literário é

Toda crítica viva — isto é, que desempenha a personalidade do crítico


e intervém na sensibilidade do leitor — parte de uma impressão para
chegar a um juízo. […] Entre impressão e juízo, o trabalho paciente da
elaboração, como uma espécie de moinho, tritura a impressão,
subdividindo, filiando, analisando, comparando, a fim de que o arbítrio,
se reduzam em benefício da objetividade, e o juízo resulte aceitável
pelos leitores. (Candido, 2000, p. 31)

A crítica literária pode ocorrer em diferentes contextos: de um jornal


semanal a uma discussão entre críticos especializados em uma universidade. O
que precisa estar claro é que toda crítica tem um propósito e que há muita
diferença entre a crítica do senso comum e a chamada crítica especializada, ou
seja, aquela para a qual estamos sendo preparados.
Durão (2016) nos traz uma importante observação sobre as diferenças
das críticas especializadas ou não, reconhecendo que, muitas vezes, o texto de
crítica acadêmica torna-se uma leitura árdua e desinteressante ao leitor comum:
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Quando postas lado a lado, a crítica acadêmica e a crítica de jornal
deixam entrever suas fraquezas: por não ter um compromisso direto
com o receptor, a crítica acadêmica é muitas vezes abstrusa e
desnecessariamente difícil; a desproporção entre a produção e o uso
– centenas e centenas de livros e milhares de artigos científicos não
têm mais do que meia dúzia de leitores cada – não é apenas um
desperdício, como também se choca com a ideia de universalidade que
subjaz à ideia de cultura. Já a crítica de jornal parece estar cada vez
mais incluída em uma lógica de mercado. Isso se manifesta em uma
tendência para beneficiar a superficialidade, reduzir o espaço de
reflexão e ignorar aquele desinteresse sem o qual crítica alguma pode
ser exercida: no limite, o jornal pode fazer o comentário de um livro
como se estivesse planejando sua campanha publicitária. (Durão,
2016, p.12-13)

A crítica especializada ou profissional é aquela construída com base em


uma fundamentação teórica consistente e adequada. A crítica literária pode
estabelecer comparações entre obras, a partir de determinados parâmetro, ou
ser imanente ao próprio texto.
Jobim (1992) alerta-nos para um fato muito interessante: tanto o crítico
literário, responsável pelo julgamento de uma obra, quanto o historiador literário,
que insere tal obra dentro de determinado período, desempenham um papel de
leitor/receptor do texto literário e, muitas vezes, para agradar a esses avaliadores
tão “exigentes”, determinados autores fazem textos exemplares, seguindo
padrões que sabem serão bem vistos pela crítica.

TEMA 3 – LITERATURA

Literatura é um conceito relativamente recente no mundo ocidental,


datando do século XVIII e consolidando-se como disciplina escolar a acadêmica
somente no século XIX.
Souza (2007, p. 45) apresenta-nos 5 acepções modernas para o termo
literatura:

a) Conjunto de produções escritas de uma época ou país;


b) Conjunto de obras distintas pelo seu tema, origem ou público-alvo;
c) Bibliografia sobre um determinado assunto;
d) Ficção;
e) Disciplina dedicada ao estudo das produções literárias.

A Literatura, dentre tantas outras artes, é um produto social de seres


histórica e culturalmente situados. Através de um uso específico de linguagem,
é um repositório do saber humano.

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Em um ensaio bastante popular chamado “A arte como procedimento”, o
formalista russo Viktor Schklovski afirma que aquilo que define o que é ou não
literatura está relacionado com a sua própria função, ou seja, a elaboração da
linguagem de modo e ressignificá-la e torná-la “estranha” ao leitor.
Para Compagnon (1999), toda definição do que seria ou não literatura
está sempre ligada a uma avaliação, valor ou norma, portanto alterna-se ao
longo dos tempos. “Todo julgamento de valor repousa num estado de exclusão”
(Compagnon, 1999, p.33). O que o crítico afirma é que intelectuais,
universidades e críticos, ao longo do tempo, definem o que é ou não literatura.

3.1 O fenômeno da literariedade

A questão essencial que diferencia um texto literário de um não literário é


a literariedade, ou seja, a “organização da linguagem que torna a Literatura
distinguível da linguagem usada para outros fins” (Culler, 1999, p. 35).
Basicamente, poderíamos apontar alguns fatores que diferenciariam os
textos literários dos não literários:

a) Oposição à linguagem comum, com uso de uma linguagem


plurissignificativa;
b) Ênfase na função poética e na elaboração dos discursos do texto;
c) Os textos literários constroem uma relação ficcional com o mundo;
d) São textos cujos sentidos podem ser potencializados ou subvertidos pelos
leitores;
e) São textos capazes de provocar prazer estético e fruição entre seus
interlocutores.

Mais do que estabelecermos juízos de valor e definirmos o que pertence


ou não à Literatura (lembrando que tal julgamento é sempre parcial), é essencial
que nos questionemos qual a função, o valor da Literatura em nossa sociedade.
Quando se pensa sobre as funções da Literatura, alguns questionamentos
são inevitáveis: para que serve a Literatura em nossa sociedade? A Literatura
sempre provoca prazer e satisfação? É possível que um texto literário modifique
a sociedade, através da denúncia que realiza? Todas essas questões nos levam
a pensar sobre as funções da Literatura.
Não se pode mencionar os estudos sobre as funções da Literatura sem
citarmos o grande Antônio Cândido (1982). Para ele,

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as camadas profundas da nossa personalidade podem sofrer um
bombardeio poderoso das obras que lemos e que atuam de maneira
que não podemos avaliar. Talvez os contos populares, as historietas
ilustradas, os romances policiais ou de capa-e-espada, as fitas de
cinema, atuem tanto quanto a escola e a família na formação de uma
criança e de um adolescente. (Cândido, 1982, p. 84)

A emocionante citação de Antônio Cândido nos traz a função


humanizadora da Literatura, que vem do contato com a fruição proporcionada
pela obra literária e é uma espécie de direito básico do ser humano.
Para além da função humanizadora, Antônio Cândido nos traz outras
importantes funções do texto literário: função psicológica, transformadora,
educativa, de representação da realidade.
O texto literário é polissêmico, múltiplo de sentidos e não pode ser
trabalhado como uma verdade absoluta. O que se percebe é que muitas vezes
quando ocorre a escolarização de um texto literário, há uma deturpação,
falsificação ou engessamento da mensagem que ele quer nos trazer e de seu
poder transformador.
A Literatura, muitas vezes, pode ser encarada apenas como algo
pragmático e utilitário, uma espécie de discurso pedagogizante que ignora seu
principal valor e sua função estética.
É importante também que façamos algumas reflexões sobre o papel do
leitor diante de uma obra literária. O leitor de um texto literário não é um mero
decodificador do texto, mas em um ato de entrega ao texto, constrói ativamente
seus significados. As noções de leitura, leitor e texto vêm sofrendo alterações ao
longo do tempo, e a chamada Estética da Recepção atribui um papel ativo ao
leitor na construção dos sentidos do texto.
Falar em Literatura implica falarmos sobre o valor das obras literárias ao
longo dos tempos e como tais valores não são fixos, mas transitivos.

3.2 O cânone literário

Em nossos estudos, muito iremos falar sobre o cânone literário. Mas, qual
o real sentido dessa expressão?
O cânone refere-se a uma espécie de conjunto de obras que representam
o que de melhor existe em termos de literatura. Pode-se dizer que o cânone
demanda um processo de elitização entre os autores e as obras, definindo
algumas como “obras-primas” ou “clássicos” e atribuindo a outras o papel de
literatura de menor qualidade.
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Falarmos em formação do cânone implica nos questionarmos sobre os
critérios de seleção e legitimação de algumas obras e exclusão de outras. Quem
determina tais critérios? Que jogos de interesse e poder estão implícitos nesse
rol de “melhores obras”?
O cânone brasileiro foi muito influenciado pelas artes europeias, uma vez
que, por sermos colônia de um país europeu, ficamos muitos séculos
subordinados cultural e economicamente à Portugal, que por sua vez, consumia
modelos literários ingleses e franceses.
Os autores e obras legitimados pelo cânone têm destaque, servindo de
referência para muitos estudos e pesquisas e também para a organização de
propostas curriculares para a educação básica.
Nesse processo de valorização do cânone, alguns grupos foram
praticamente eliminados da tradição dos estudos literários, como, por exemplo,
os negros e as mulheres.
Jobim (1992) problematiza essa questão da “elitização” associada à
formação do cânone:

Ao olharmos para as obras canônicas da Literatura ocidental


percebemos de imediato a exclusão de diversos grupos sociais, étnicos
e sexuais do cânon literário. Entre as obras-primas que compõem o
acervo literário da chamada “civilização” não estão representadas
outras culturas (isto é, africanas, asiáticas, indígenas, muçulmanas),
pois o cânon com que usualmente lidamos está centrado no Ocidente
e foi erigido no Ocidente, o que significa, por um lado, louvar um tipo
de cultura assentada na escrita e no alfabeto (ignorando os
agrupamentos sociais organizados em torno da oralidade); por outro,
significa dizer que, com toda a probabilidade, o cânon está impregnado
dos pilares básicos que sustentam o edifício da saber ocidental, tais
como o patriarcalismo, o arianismo e a moral cristã. (Jobim, 1992, p.
73)

Os estudos literários na atualidade vão tentar minimizar tais exclusões,


como veremos na sequência dos nossos estudos.

TEMA 4 – TEXTO LITERÁRIO

Definir literatura, apesar de todos os critérios já discutidos, não é tarefa


tão simples. O que é considerado literatura em um período pode ser muito
distinto do que a concepção de texto literário de um período anterior.
A fim de discutirmos algumas questões importantes e retomarmos
aspectos já apresentados, vamos realizar uma breve análise de um dos mais
famosos poemas de Carlos Drummond de Andrade, poeta modernista que viveu

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de 1902 a 1987, tendo produzido uma obra grandiosa e valorizada pelo cânone
literário.

Saiba mais

Para ler o poema “No meio do caminho” (que, aliás, você já deve
conhecer), acesse <https://www.culturagenial.com/poema-no-meio-do-caminho-
de-carlos-drummond-de-andrade/>.

O poema “No meio do caminho” foi publicado originalmente na Revista de


Antropofagia (veículo de divulgação das ideias modernistas) em 1928 e,
posteriormente, passou a integrar a obra Alguma poesia (1930). Trata-se de um
poema escrito em linguagem simples, sem rimas, métrica, musicalidade ou
figuras de linguagem.
Por ocasião de sua publicação, em 1928, o poema ganhou bastante
repercussão e foi muito criticado devido à sua simplicidade e excessiva
repetição, porém, com o passar dos anos, passou a ser considerado uma
verdadeira obra-prima do autor pela crítica especializada. Essa mudança na
avaliação do poema pelos críticos ocorre também no processo de recepção do
texto: o que um leitor adolescente ou jovem compreenderá do texto em seu
contato com ele na educação básica poderá ser muito diferente da visão desse
mesmo leitor quando voltar ao texto, com outra vivência, em outra época ou
momento histórico.
O exemplo do poema de Carlos Drummond de Andrade serve para
ilustrarmos que os juízos de valor que são construídos sobre as obras literárias
variam historicamente e se relacionam com visões de mundo, ideologias e com
os grupos detentores do poder.
Toda obra é produzida no interior de uma cultura e de um momento
histórico e pode, portanto, receber uma interpretação totalmente diferente
daquela pretendida pelo autor, se for lida em um outro contexto ou por leitores
com outra bagagem cultural.
O que a crítica literária busca, de fato, é desenvolver-se sempre a partir
das potencialidades do texto literário em diferentes momentos de sua produção
e recepção.

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TEMA 5 – ESTUDOS LITERÁRIOS HOJE

Os estudos literários remontam à Grécia Antiga e permanecem como uma


realidade até a atualidade, tanto na educação básica quanto nos cursos de
Letras na Educação Superior, tendo assumido diferentes ênfases.
Hoje, percebe-se uma articulação interdisciplinar entre os estudos
literários e outras áreas do conhecimento. Nessa parte do nosso estudo,
trataremos, ainda que brevemente, de algumas dessas relações possíveis, a fim
de fornecer-lhe um painel geral sobre a situação dos estudos literários na
atualidade.
Há muitas leituras possíveis para um texto literário, e tais leituras
dependem do tempo, do espaço, do leitor e das possibilidades polissêmicas de
uma obra, em um constante processo de permanência e atualização. Por isso,
pode-se afirmar que um dos princípios dos estudos literários na atualidade é um
resgate e uma reconfiguração do papel do leitor enquanto um coautor dos
sentidos de um texto.
Qualquer texto é passível de um trabalho de análise, mas esse trabalho
requer instrumentos, recursos, teorias e metodologias próprias. Uma mesma
obra pode passar por um processo de ressignificação ao ser avaliada sob
determinada perspectiva teórica.
Poderíamos iniciar apresentando as inegáveis relações entre os estudos
literários e a história, uma vez que essa talvez seja a relação mais clara, pois
cada obra é produzida em um determinado momento e as características desse
momento podem ser percebidas em maior ou menor grau na leitura. Por outro
lado, a literatura e a história, mesmo que por caminhos e metodologias
diferentes, produzem narrativas sobre o mundo e as percepções dos indivíduos.
Os estudos literários cognitivos, mais recentemente, avaliam a Literatura
como uma atividade significativa para estudar a mente humana e os processos
de cognição.
A chamada Psicologia da Literatura estuda os fatores psicológicos do
escritor, bem como o próprio processo de criação artística e os efeitos da obra
literária sobre os leitores.
Pode-se pensar também em uma articulação entre os estudos literários e
a ciência, na medida em que ambos surgem de uma dificuldade e até

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incapacidade humana de explicar o mundo, levando a uma representação por
meio da linguagem.
A literatura comparada é um profícuo terreno para a construção de uma
abordagem literária que estabelece diálogo interculturais, promovendo a
aceitação do outro, do diferente.
Vale destacarmos ainda a relevância dos estudos ecocríticos no cenário
atual. Os estudos ecocríticos analisam textos que trazem questões ambientais e
as diversas maneiras pelas quais a Literatura aborda o tema da natureza.
Outro aspecto considerado pelos estudos literários hoje é a relação
intrínseca entre a Literatura e a educação, na medida em que se considera o
papel formador da Literatura e sua contribuição para a formação integral dos
indivíduos e emancipação dos sujeitos. Significa tratar a Literatura como um
valioso legado cultural que precisa ser conhecido e acessado através da
educação formal ofertada na escola.
Não se pode deixar de comentar também que, desde os anos de 1960,
vivemos uma reformulação na cultura do país, com a chegada dos meios de
comunicação de massa e a paulatina desvalorização da Literatura entre alguns
setores da sociedade. Uma prova disso é a perda de espaço do texto literário
nos jornais. Sendo assim, a crítica literária, inegavelmente, transforma-se e
passa a produzir conteúdos voltados a atender aos interesses do mercado.
É inegável também que, na atualidade, existem diferentes concepções
que podem ser adotadas diante de uma obra literária. Por isso, a disciplina de
teoria e crítica literária é plural, flexível e, de certa forma, polêmica, a fim de dar
conta de todas essas abordagens possíveis para o texto literário.

NA PRÁTICA

A fim de que possamos refletir um pouco mais sobre a tríade teoria-crítica-


literatura, convidamos você para um exercício de análise.
Utilizando o buscador de sua preferência na internet, localize uma crítica
literária sobre um importante romance nacional.
Como sugestão, você pode buscar pelo texto “Romance é mais seco e
mantém jogos duplos”, de Heitor Ferraz Mello, publicado no jornal Folha de São
Paulo, em 2005 (Disponível em:
<https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1308200508.htm>. Acesso em: 25

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abr. 2022). No texto em questão, o crítico analisa dois romances de Milton
Hatoum: Relato de um certo oriente e Dois irmãos.
Após uma leitura atenta da crítica que você escolheu, reflita sobre as
seguintes questões:

a) Algum trecho da crítica lida traz explicitamente um juízo de valor do autor


sobre a obra literária sobre a qual discorre o texto?
b) Reflita e procure responder: qual seria o papel de um pesquisador em
Teoria da Literatura?
c) Que perguntas um pesquisador poderia fazer ao autor da crítica lida para
que ela pudesse ser considerada pelos estudos literários?

FINALIZANDO

Nesta etapa, discutimos sobre três questões essenciais: a teoria, a crítica


e a literatura.
Pensar sobre elas é fundamental em nossa formação de profissional de
Letras. Tais conceitos são a base das discussões acerca dos estudos literários.
É importante que você sempre tenha em mente que a crítica e a teoria
caminham lado a lado e as duas debruçam-se sobre o fenômeno da Literatura,
buscando compreender a natureza do texto literário e seus efeitos de sentido.
Para que um texto seja considerado como literário, ele deve apresentar
uma elaboração especial e peculiar, com traços que não são encontrados nos
textos não literários. A linguagem do texto literário é elaborada e
plurissignificativa, enfatizando-se as funções estética e poética da linguagem.
A definição do que é Literatura é uma questão complexa e determinada
por diversos fatores. A partir de determinadas valorações subjetivas,
determinados autores e obras são inseridos em uma tradição canônica e outros
são relegados a uma posição inferior. E tais critérios de seleção são
questionáveis.
A crítica literária situa-se num local intermediário entre o texto e o leitor e
pode utilizar-se de diferentes recursos de acordo com a época em que se realiza:
tratados, cartas, artigos em jornais e revistas, ensaios, debates, blogs, revistas
virtuais etc.

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É importante também frisarmos que nenhuma teoria ou crítica é capaz de
dar conta de todos os aspectos do texto e que elas sempre são fruto de
interesses e de seleções feitas por quem detém o poder no momento.
Entender os meandros da crítica e da teoria literária é essencial para a
formação do profissional de Letras, seja ele voltado para a Licenciatura na
Educação Básica e no Ensino Superior, bem como para as atividades de
pesquisa.

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REFERÊNCIAS

CANDIDO, A. A literatura e formação do homem. In: Textos de Intervenção.


São Paulo: Duas Cidade/Editora 34, 2002

_____. Formação da Literatura Brasileira. 6. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 2000.

COMPAGNON, A. O demônio da teoria. São Paulo: Editora UFMG, 2001.

CULLER, J. Teoria Literária: uma introdução. Tradução Guardini T.


Vasconcelos. São Paulo: Beca Produções Culturais Ltda., 1999.

DURÃO, F. A. O que é crítica literária? São Paulo: Nankin/Parábola, 2016.

JOBIM, J. L. Palavras da crítica: tendências e conceitos da literatura. 1. ed. Rio


de Janeiro: Imago, 1992.

MELO, H. F. de. Romance é mais seco e mantém jogos duplos. Folha de São
Paulo, 13 ago. 2005.

SOUZA, R. A. de. O império da eloquência: retórica e poética no Brasil


oitocentista. Rio de Janeiro: EDUERJ / EDUFF, 1999. In: SOUZA, R. A. de.
Teoria da literatura. 10. ed. São Paulo: Ática, 2007.

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