Relatorio Final PNE
Relatorio Final PNE
Relatorio Final PNE
RELATÓRIO FINAL
Avaliação Independente do
Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº 10.172/01
Cumprimento dos Objetivos e Metas do Capítulo
Educação Indígena
2011
Boa Vista/RR
1
Presidenta da República
Dilma Vana Rousseff
Presidente da Funai
Márcio Augusto Freitas de Meira
Apoio:
Instituto Insikiran de Formação Superior
Indígena da Universidade Federal de
Roraima – UFRR
2
Fundação Nacional do Índio
Fundação Ajuri
RELATÓRIO FINAL
Avaliação Independente do
Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº 10.172/01
Cumprimento dos Objetivos e Metas do Capítulo
Educação Indígena
Boa Vista/RR
3
CAPA
Hefrayn Lopes
PROJETO GRÁFICO
E DIAGRAMAÇÃO
Hefrayn Lopes
DESENHOS DE GRÁFICOS
Márcio Costa Gomes
REVISÃO
Áurea Lúcia Melo Oliveira Corrêa
A945
140 p.
ISBN 978-85-60215-67-6
CDU – 376.74(=-82)
4
Grupo de Acompanhamento – GA, criado pela Portaria FUNAI nº 11.312, de 04.11.2009.
NOMES INSTITUIÇÕES
*A representação indicada pelo CONSED e UNDIME não participou das reuniões realizadas, nessas ocasiões houve
a presença de diferentes membros dessas entidades.
** A representante do CNEEI esteve em Licença Maternidade durante o período de realização das duas reuniões,
sendo que a mesma foi substituída por outros representantes indígenas da CNEEI.
5
REDE DE AVALIADORES
Pesquisadores Avaliadores
Rogério Sávio Link (pólo Acre), Eliene Amorim de Almeida (pólos Amapá e Brasília,
governo federal), Jonise Nunes Santos (pólo Amazonas I*), Romy Guimarães Cabral
(pólo Amazonas II**), Rita Gomes do Nascimento (pólos Bahia e Maranhão), Maria
Regina Rodrigues (pólos Alagoas, Ceará e Sergipe), Maria Istélia Coelho Folha (pólos
Goiás e Tocantins), Adriana Werneck Regina (pólo Mato Grosso I***), Luis Carlos
Pereira Paiva (pólo Mato Grosso II****), Roberluce Oliveira Braga (pólo Mato Grosso do
Sul), Adriana Cristina Ferreira Maluf (pólos Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de
Janeiro), Maria Cristina Cabral Troncarelli (pólo Pará), Patrícia de Almeida Zuppi
(pólos Paraná e São Paulo), Carla Siqueira Campos (pólos Pernambuco e Paraíba),
Juliana Baptista Ferreira (pólos Santa Catarina e Rio Grande do Sul), Angelise Nadal
Pimenta (pólo Rondônia), Daniel Bampi Rosar (pólo Roraima).
*Vale do Javari, Região dos Rios (Alto Solimões e Madeira, Purus e Juruá).
**Baixo Amazonas e Rio Negro.
*** Escolas Municipais e Região Xavante.
**** Escolas Estaduais e Região Xingu.
Pesquisadores Indígenas*
Gecinaldo Soares de Queiros (Alagoas e Sergipe), Josiney Bastos Gabino (Amazonas I),
Alva Rosa Lana Vieira (Amazonas II), Evangelina Sônia dos Santos Jeanjacque (Amapá),
Cecília Lopes Marinheiro (Bahia), Ricardo Weibe Nascimento Costa (Ceará), Leidiane
Pego de Souza Sezinando (Espírito Santo), Cassiano Sotero Apinajé (Goiás e Tocantins),
Cíntia Maria Santana da Silva (Maranhão), Joscélio Onizokaece (Mato Grosso I), Helena
Indiara Ferreira Corezomaé (Mato Grosso II), Jabez Gabriel (Mato Grosso do Sul),
Valmores Conceição da Silva (Minas Gerais), Franciclei Corrêa Rocha (Pará), Iolanda
dos Santos Mendonça (Paraíba), Jacieli Nyg Kuita Fidelis (Paraná), Edilene Bezerra
Pajeú (Pernambuco), João Maria Fortes (Rio Grande do Sul), Algemiro Karai Mirim da
Silva (Rio de Janeiro), Manuel Filho Sabane (Rondônia), Edilce Pereira de Oliveira
(Roraima), Janete da Veiga (Santa Catarina), Ivandro Martins da Silva (São Paulo).
6
LISTA DE SIGLAS
7
PAR Plano de Ações ArticuladasPDEPlano de Desenvolvimento da
EducaçãoPNAEIPrograma Nacional de Alimentação Escolar
IndígenaPNEPlano Nacional de EducaçãoRCARede de Cooperação
Alternativa BrasilSECAD Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade UFRRUniversidade Federal de
RoraimaUNDIMEUnião Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação
8
Sumário
Apresentação........................................................................................................................................11
1. Introdução.........................................................................................................................................13
1.1. Procedimentos Metodológicos.............................................................................14
1.2. Dificuldades, limites e possibilidades dessa consulta/avaliação.....................17
1.3. Contextualizando a Educação Escolar Indígena no país e no Plano Nacional
de Educação......................................................................................................................17
9
2.8. Meta 10 - Estabelecer um programa nacional de colaboração entre a União e os Estados
para, dentro de cinco anos, equipar as escolas indígenas com equipamento didático-
pedagógico básico, incluindo bibliotecas, videotecas e outros materiais de apoio.
2.9. Meta 12 - Fortalecer e ampliar as linhas de financiamento existentes no Ministério da
Educação para implementação de programas de educação escolar indígena, a serem executa-
dos pelas secretarias estaduais ou municipais de educação, organizações de apoio aos índios,
universidades e organizações ou associações indígenas.
2.10. Meta 13 - Criar, tanto no Ministério da Educação como nos órgãos estaduais de
educação, programas voltados à produção e publicação de materiais didáticos e pedagógicos
específicos para os grupos indígenas, incluindo livros, vídeos, dicionários e outros,
elaborados por professores indígenas juntamente com seus alunos e assessores.
2.11. Meta 15 - Instituir e regulamentar, nos sistemas estaduais de ensino, a profissionalização
e reconhecimento público do magistério indígena, com a criação da categoria de professores
indígenas como carreira específica do magistério, com concurso de provas e títulos adequados às
particularidades linguísticas e culturais das sociedades indígenas, garantindo a estes
professores os mesmos direitos atribuídos aos demais do mesmo sistema de ensino, com níveis de
remuneração correspondentes ao seu nível de qualificação profissional.
2.12. Meta 16 - Estabelecer e assegurar a qualidade de programas contínuos de formação
sistemática do professorado indígena, especialmente no que diz respeito aos conhecimentos
relativos aos processos escolares de ensino-aprendizagem, à alfabetização, à construção coletiva
de conhecimentos na escola e à valorização do patrimônio cultural da população atendida.
2.13. Meta 18 - Criar, estruturar e fortalecer, dentro do prazo máximo de dois anos, nas
secretarias estaduais de educação, setores responsáveis pela educação escolar indígena, com a
incumbência de promovê-la, acompanhá-la e gerenciá-la.
2.14. Meta 19 - Implantar, dentro de um ano, cursos de educação profissional, especialmente
nas regiões agrárias, visando à auto sustentação e ao uso da terra de forma equilibrada.
2.15. Meta 20 - Promover, com a colaboração entre a União, os Estados e Municípios e em
parceria com as instituições de ensino superior, a produção de programas de formação de
professores de educação à distância em nível fundamental e médio.
2.16. Meta 21 - Promover a correta e ampla informação da população brasileira em geral,
sobre as sociedades e culturas indígenas, como meio de combater o desconhecimento, a
intolerância e o preconceito em relação a essas populações.
3. Conclusão .......................................................................................................................................114
4. Referências bibliográficas............................................................................................................117
5. Anexos .............................................................................................................................................121
10
Apresentação
A Coordenação Geral de Educação da Fundação Nacional do Índio propôs, em 2009, a
realização de uma avaliação independente dos objetivos e metas da educação indígena
constantes na lei 10.172 de 9 de janeiro de 2001, intitulada Plano Nacional de Educação, como
forma de se realizar um diagnóstico da situação atual de desenvolvimento da educação escolar
indígena no Brasil. Tratava-se, de modo geral, de avaliar as 21 metas e objetivos constantes nesta
lei para a melhoria da educação escolar indígena de modo a se verificar questões estruturantes
da oferta de programas escolares aos povos indígenas de acordo com o novo marco jurídico que
se iniciou com a Constituição de 1988.
Esta publicação traz o resultado dessa avaliação, que foi conduzida de modo independente,
pela Fundação Ajuri da Universidade Federal de Roraima, que contratou e formalizou uma
rede de avaliadores, que contou com pesquisadores indígenas e não-indígenas que visitaram
todos os Estados da Federação, com exceção do Piauí e do Rio Grande do Norte, onde até bem
pouco tempo atrás não se reconhecia a presença de povos indígenas.
A avaliação das 21 metas e objetivos do Plano Nacional de Educação (PNE) possibilita, pela
primeira vez, uma ampla visão da situação da educação indígena no país, sendo esta uma
demanda há muito tempo apresentada por representantes do movimento indígena organizado
e por pesquisadores que acompanham essa temática, face à inexistência de indicadores de
avaliação e de acompanhamento das políticas públicas.
Ainda que faça sentido pensar em recortes etnográficos para compreensão de situações
particulares, o esforço de coleta, produção e aferição de indicadores precisou, necessariamente,
estar limitado ao recorte político-administrativo do Estado brasileiro. Assim, as metas e objetivos
do Plano Nacional de Educação foram avaliados tomando por base a divisão entre as diferentes
esferas de governo (Federal, Estadual e Municipal), pois a lei foi assim configurada, estabelecendo
metas e objetivos para estas instâncias de governo, ora individualmente, ora coletivamente.
11
12
1. Introdução
1 O Legislativo e a Sociedade construindo juntos o novo Plano Nacional de Educação. Comissão de Educação e Cultura (2009, p.23).
2 As nomenclaturas pesquisador/avaliador e pesquisador indígena foram utilizadas no documento propositivo para definir o papel de cada um dos
agentes envolvidos no processo. O pesquisador/avaliador foi contratado com a responsabilidade de realizar as entrevistas e escrever o relatório final,
enquanto que o pesquisador indígena foi responsável de fazer as articulações locais, identificando os diversos agentes que deveriam ser entrevistados
nos estados e municípios, acompanhando o pesquisador/avaliador.
13
Essa rede participou de uma capacitação no período de 08 a 10 de dezembro de 2009,
na cidade de Brasília, que teve como objetivo apresentar e discutir as finalidades, metodologia e
instrumentos da pesquisa, promover o conhecimento, entrosamento e articulação dos
pesquisadores com as coordenações e as instituições responsáveis, estudar e aperfeiçoar os
instrumentos elaborados pelo consultor Dr. Luís Donisete Benzi Grupioni, que também foi o
facilitador do processo.
No momento contou-se também com a participação de membros da CNEEI e
FUNAI, além das presenças, em momentos pontuais, do MEC, CONSED e da CNPI, todos
representantes do Grupo de Acompanhamento.
14
Para avaliar cada meta do Plano foram consideradas duas variáveis que o próprio
PNE já aponta, ou seja, os prazos e as responsabilidades.
No caso dos prazos, as metas estão assim organizadas:
•Imediato – metas 1, 2, 5, 11, 12, 13, 15, 16, 20 e 21, ou seja, em 2001 já deveriam
ter sido realizadas;
•Imediato, com progressão de tempo – metas 4 e 8;
•Dez anos - meta 3, ou seja, durante todo o período do PNE;
•Um ano – metas 6, 9, e 19;
•Dois anos – metas 7, 17 e 18;
•Imediato e em até cinco anos – meta 10;
•Um ano e em até cinco anos – meta 14.
Para avaliar a meta considerando a variável prazo, ficou definido que seriam
utilizados dois critérios: teve início e não teve início, considerando a vigência do Plano.
No que se refere à variável responsabilidade, as metas/objetivos do Plano são claras
em indicar o ente federativo ou o regime de colaboração para sua execução. Assim, a lei
determina ora um esforço conjunto dos Estados, Municípios com a União, e ora que depende da
iniciativa da União. Assim, as metas estão assim dispostas:
•Corresponsabilidade dos entes federados - metas 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 10, 11, 16 e 20;
•Não tem definição de responsabilidades - metas 8, 12, 13, 15, 17, 18, 19 e 21;
•Depende da iniciativa da União - meta 14.
Essa informação corrobora com a leitura que Saviani (2008) faz acerca da divisão de
responsabilidades dos entes federados no PNE. Tratando do papel do MEC no referido Plano, o
autor identifica que cabe a União apenas realizar “atividades como elaboração de documentos,
definição de diretrizes, estabelecimento de normas e organização dos sistemas de informações” (p. 101),
confirmando-se assim o papel institucional do governo federal para com a educação básica, que
é o de coordenação da política educacional. Há que se ressaltar que no caso da modalidade de
educação indígena, para oito metas não há definição de responsabilidades dos entes federados,
“deixando margens a interpretações”, como afirma o documento propositivo da avaliação.
Para avaliar essa variável foram estabelecidos conceitos/critérios para indicar a
situação da meta em cada ente federativo:
•está em desenvolvimento de modo satisfatório;
•está em desenvolvimento de modo insatisfatório;
•foi atingida plenamente;
•foi atingida parcialmente.
Para identificar se a meta encontra-se em uma das situações de desenvolvimento
acima citadas foram estabelecidos indicadores no documento propositivo que melhor
qualificam as análises das metas e a conclusão em relação à situação de cada uma delas.
Cada pesquisador/avaliador dos estados/municípios e da União elaboraram seus
relatórios, analisando e ancorando suas afirmações por meio das declarações dos diversos agentes
pesquisados, e/ou trechos dos documentos disponibilizados, que foram anexados aos seus textos.
15
No conjunto foram elaborados 27 (vinte e sete) relatórios, sendo 26 (vinte e seis) dos
estados, tendo em vista que o Amazonas e o Mato Grosso geraram dois relatórios cada um e 1
(um) do MEC, enquanto União.
Esta publicação toma como base os relatórios de campo desses pesquisadores, mas
não é uma simples síntese. Cada pesquisador chegou às suas conclusões sobre a situação da
3
meta nos estados e municípios utilizando os critérios já citados acima. Por sua vez, a
coordenação pedagógica, responsável pelo documento final, fez suas análises associando as
informações trazidas pelos pesquisadores nos estados, com a história das políticas,
legislações e documentação que tratam da educação escolar indígena no Brasil, considerando
que o PNE não pode ser analisado isoladamente, sob risco de não se dar conta de toda
complexidade que é a educação escolar indígena neste país.
Como forma de demonstrar, ilustrar, esclarecer as nossas análises e conclusões
utilizou-se trechos das entrevistas contidas nos relatórios elaborados pelos pesquisadores.
Nesta publicação se considera que a educação escolar indígena pós Constituição
Federal de 1988 ganhou uma vasta documentação legal que define diretrizes, estabelece
princípios, normas e orienta as ações governamentais junto aos povos indígenas, disciplinando o
direito a uma educação diferenciada no país. O princípio geral estabelecido na Constituição
Federal de que os povos indígenas têm direito à manutenção de suas identidades e que é dever do
Estado brasileiro proteger e fazer respeitar os modos de vida e visão de mundo particulares desses
povos encontrou desdobramento em sucessivos textos legais e normativos, como a LDBEN, de
1996, o PNE de 2001, as normas emanadas do Conselho Nacional de Educação, de 1999, e a
Convenção da OIT, ratificada pelo Brasil em 2004. Portanto, realizar uma “leitura crítica” da
execução das metas da lei 10.172/2001 exige colocá-las nesse contexto mais amplo de mudança do
paradigma jurídico em relação aos índios, de um lado, e da configuração da política educacional
brasileira, em que a educação escolar indígena torna-se uma modalidade, de outro.
Esta publicação, que se pretende como uma síntese de todo o esforço de avaliação
empreendido ao longo de 2010 em todo o país por essa equipe de avaliadores, está organizada em
quatro partes. A primeira é uma Introdução, onde se faz uma retrospectiva do processo de
Construção da Proposta de Avaliação mostrando os procedimentos para coleta e análise dos
dados. Na segunda, intitulada “Contextualizando a Educação Escolar no Brasil”, procura-se fazer
uma breve retrospectiva dessa modalidade de ensino a partir da data em que o MEC assume essa
responsabilidade, até a publicação do Plano Nacional de Educação; na terceira parte apresenta-se
a análise das metas, às vezes uma por uma, outras vezes conjuntamente, levando-se em
consideração as aproximações possíveis e facilitando a compreensão ampla da política anunciada
na meta. E por último, a Conclusão e as Referências Bibliográficas que serviram para dar
consistência às argumentações que fundamentam nossas análises e conclusões.
Além disso, há várias tabelas anexas onde estão apresentados os dados da pesquisa
coletados em campo referentes aos entes federativos.
3 O que pode ser verificado nos gráficos no anexo: Situação das Metas por estados.
16
1.2. Dificuldades, limites e possibilidades dessa consulta/avaliação
A década de 1990 foi marcada pela publicação de uma série de documentos oficiais
que definiram princípios, diretrizes e ações para que a educação escolar indígena pudesse se
17
desenvolver a partir do novo paradigma de relacionamento estabelecido entre o Estado
brasileiro e os povos indígenas tendo por base a Constituição de 1988.
Em 1991, a responsabilidade pela condução da educação escolar indígena no Brasil
transferiu-se do órgão indigenista oficial, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI, para o
Ministério da Educação, integrando-se, assim, à organização da educação brasileira4. O Decreto
Presidencial nº 26 atribuiu ao Ministério da Educação - MEC “a competência de coordenar”, e
aos “estados e municípios desenvolver as ações referentes à Educação Escolar Indígena, em
todos os níveis e modalidades de ensino, ouvida a FUNAI, e em consonância com as Secretarias
Nacionais de Educação do Ministério da Educação”. Isso gerou vários conflitos entre estas
instâncias e os povos indígenas e, para alguns estudiosos da temática, provocou, de imediato,
uma “acefalia” no atendimento a educação escolar indígena no país.
Visando resolver, no plano legal, essa situação, em 1999, o Conselho Nacional de
Educação - CNE, através da Câmara de Educação Básica - CEB, publicou o Parecer 14 e a
Resolução nº 03, fixando normas e diretrizes para o funcionamento das escolas indígenas. Desde
então, a gestão da política de educação básica para os povos indígenas compete às Secretarias
Estaduais de Educação, sendo que os municípios poderão assumir essa tarefa, desde que
respondam alguns requisitos preceituados pela lei.
Assim, diferentemente da esfera estadual, que é obrigada por lei a assumir a
educação escolar indígena, os municípios, para incumbir-se dessa tarefa, precisam criar as
condições objetivas para desenvolver esse papel e ouvir os interesses das comunidades. No caso
da União, o CNE reafirma sua tarefa institucional de legislar, definir diretrizes das políticas
nacionais e apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino.
Em 2001, o governo federal, obedecendo a Constituição Brasileira de 1988, a Lei de
Diretrizes e Base da Educação Nacional – LDBEN, n. 9394/96 e a Declaração Mundial de
Educação para Todos, sancionou o Plano Nacional de Educação - PNE, Lei nº 10.172/2001.
No caso da educação escolar indígena, o PNE trouxe como novidade tratar o tema
como uma modalidade de ensino e estabelecer metas para que a educação escolar indígena fosse
desenvolvida segundo as diretrizes e princípios estabelecidos oficialmente durante toda a década
de 1990. O antropólogo Luis Grupioni durante o I Encontro Nacional de Coordenadores de
Projetos na Área de Educação Indígena, que aconteceu em Brasília em outubro de 1997, afirmava
que, no PNE, se procurou estabelecer metas que podem ser resumidas em cinco itens, a saber:
18
curriculares indígenas, enquanto documento norteador dos
princípios que devem reger a oferta da educação escolar nos povos
indígenas; garantir o acesso das escolas indígenas aos programas e
benefícios de auxilio ao desenvolvimento da educação já existente e
criar outros específicos que contemplem os objetivos e
necessidades das escolas; garantir programas de formação em
serviço aos docentes indígenas, procurando a qualidade e a
continuidade sistemática desta formação, e sua regulamentação e
reconhecimento público como carreira do magistério (GRUPIONI,
1997, p.04).
Como pode ser observado, não há novidades quanto aos diversos documentos
publicados anteriormente ao PNE, o que levou Silva (2002) a fazer a seguinte crítica ao Plano, no
seu texto o “Estado brasileiro e a Educação (escolar) indígena: um olhar sobre o Plano Nacional
de Educação”. Diz a autora:
Percebe-se, contudo, que, ao invés de ir além do que já está
garantido em outros textos da legislação atual, explicitando a real
responsabilidade do Estado frente aos desafios da educação escolar
indígena, o PNE repete questões já tratadas em leis anteriores e,
inclusive, traz - em diversos pontos que veremos mais adiante -,
retrocessos significativos com relação ao direito dos povos
indígenas em ter uma educação escolar que reconheça, respeite e
fortaleça seus processos próprios de ensinar e aprender e que sejam
parte de seus projetos de presente e futuro (p.06).
19
Essa meta será analisada sob dois focos: em que medida os estados assumiram a
execução da política de educação escolar indígena no Brasil e o segundo onde essa modalidade
de ensino está sob a responsabilidade da esfera municipal se houve termos de cooperação entre
os diversos entes federativos. Para isso, nesses Entes procurou-se identificar:
A) instrumentos legais e normativos consolidados e em vigor;
B) ações de coordenação desenvolvidas pelo MEC, e
C) termos de cooperação e /ou compartilhamento de responsabilidade assinados.
A existência e o desenvolvimento desses indicadores pelos entes federados é que
determinaram a conclusão sobre a situação da Meta, que tem prazo imediato e para sua
execução é exigida a colaboração da União. A seguir, será explicitado cada um desses
indicadores e feito seu cotejamento com a consulta realizada nos estados, municípios e União.
20
O Governo Federal, através do CNE/CEB, e com esforços do MEC, publicou a
Resolução n.03/1999, definindo o que é escola indígena e responsabilizando os Estados e
Municípios pela execução e oferta da política de educação escolar indígena no Brasil, como pode
ser observado no seu artigo 1:
Referente à União, atendendo aos dispositivos legais, o CNE definiu que lhe cabe
Por conseguinte, fica definido, no plano legal, as atribuições dos três entes
federados para com a educação escolar indígena. Assim, a nosso ver, o MEC, por meio dessa
Resolução, cumpriu com a meta 1, mesmo antes do prazo estipulado. Além disso, durante toda a
vigência do PNE, vem desenvolvendo uma série de ações no sentido de cumprir suas
atribuições relativas a essa meta.
Ao definir o papel de cada esfera do poder público e orientar para que a educação
escolar indígena seja implementada de acordo com os princípios da legislação vigente e como
“unidades próprias, autônomas e específicas nos sistemas estaduais”, o CNE considera a
necessidade de criação de normas, de condições administrativas, pedagógicas e políticas
dentro das Secretarias de Educação para o desenvolvimento e condução de ações
coordenadas e articuladas.
No caso dos estados e municípios os dados demonstram que alguns deles
publicaram diferentes tipos de documentos oficiais, tais como: Portarias, Decretos, Resoluções
indicando que, pelo menos no plano legal, assumiram a responsabilidade para com a educação
escolar indígena. Mas, quando se trata do exercício efetivo do que dispõe a documentação, a
situação no Brasil é bastante heterogênea , como pode ser visto nos exemplos que seguem.
21
Na Paraíba encontramos a seguinte situação:
No Acre,
6
[...] antes mesmo da publicação da Deliberação , o estado do Acre
assumiu, em março de 1999, a educação escolar indígena através
da criação do Setor de Educação Escolar Indígena, ligado, na
época, ao Setor de Ensino Fundamental. No entanto, por questões
políticas locais, três municípios mantêm até hoje parte da
educação escolar indígena municipalizada, a saber, Marechal
Thaumaturgo, Jordão e Santa Rosa do Purus, o que perfazia, em
2008, 31% das escolas indígenas.
6 Segundo o Relatório do Acre, trata-se da Deliberação do Conselho Estadual de Educação Nº 02/99, de 10 de novembro de 1999, que normatiza a
educação escolar indígena no estado.
22
políticas e ações inovadoras, na área da aplicação dos recursos, na
organização, funcionamento, gestão e regularização das escolas
indígenas e na autonomia pedagógica das escolas indígenas. A
implementação dos direitos educacionais dos povos indígenas
não foi acompanhada da produção de novos referenciais legais e
normativos. Nesse caso, muitas especificidades pedagógicas e
organizacionais das escolas indígenas precisam ser normatizadas
pelos Sistemas de Ensino para assegurar sua autonomia
pedagógica e de gestão (2009 p. 18-19).
Outra informação que a pesquisa/avaliação traz é que a maioria das escolas indígenas
ainda está sob a responsabilidade dos municípios brasileiros, confirmando assim, os dados do
Instituto Nacional de Pesquisa Anísio Teixeira - INEP quando, analisando os dados de 2006,
afirmou que:
23
A Câmara Municipal elaborou e colocou em vigor as seguintes
políticas públicas: a Lei nº. 087 de 24 de maio de 1999 que trata da
organização do Sistema Municipal de Ensino, e nesta a educação
escolar indígena é compreendida como um subsistema de ensino,
com diretrizes próprias; a Lei nº. 139 de 12 de dezembro de 2001
reorganiza o Conselho Municipal de Educação, constituindo seus
partícipes, além dos representantes legais do Ministério Público,
da Câmara Municipal, da Secretaria de Educação e das escolas.
o
QUADRO N . 01 - UNIDADES DE ENSINO - ESTADUAIS E MUNICIPAIS
No que diz respeito a sua tarefa normativa, desde o final da década de 1990 o MEC,
por meio de sua Coordenação de Educação Escolar Indígena, empreendeu uma série de
esforços junto ao Conselho Nacional de Educação para produzir um documento com o objetivo
24
de disciplinar a educação escolar indígena no Brasil, o que veio ocorrer em 1999, com a
publicação da Resolução no. 03, da Câmara de Educação Básica, como pode ser observado no
artigo 1º da referida resolução:
Publicações
25
subsidiar os diversos agentes da educação escolar indígena no Brasil. Além daquelas que já
foram publicadas na década de 1990, aqui nos referimos ao livro 'Formação de Professores
Indígenas: repensando trajetórias', 2006, da Coleção Educação para Todos com o apoio da
UNESCO. A publicação é organizada pelo antropólogo Luís Donizete Benzi Grupioni.
Ainda, foi publicado o 'Caderno da SECAD 3 - Educação Escolar Indígena:
diversidade sociocultural indígena ressignificando a escola'. O caderno tem como objetivo
documentar as políticas públicas da SECAD e traz um conjunto de informações sobre o que o
MEC vem desenvolvendo desde 2004.
Criação da SECAD
7 Suzana Martelletti Grillo Guimarães, técnica do MEC/SECAD/CGEEI, em entrevista. Brasília, janeiro de 2010.
26
Como pode ser observado no texto do CNE, outra condição importante para que a
educação escolar indígena seja desenvolvida pelos municípios é a concretização do pacto
federativo, para isso é preciso que haja compartilhamento de responsabilidades. Na pesquisa
identificou-se que nos estados onde há escolas municipalizadas, apenas 5 (cinco) - nos estados
de AM, PA, MA, BA e GO - afirmaram que existem esses Termos, mas os pesquisadores não
tiveram acesso à documentação que constatasse tal afirmação.
27
A pesquisadora do Mato Grosso, refletindo sobre a situação encontrada entre os
diversos municípios desse estado, chega a seguinte conclusão:
28
des/lideranças, movimento organizado indígena) com gestores
dos sistemas de ensino e superar os limites e dificuldades presentes
no Regime de Colaboração que rege a relação entre os entes federa-
dos no campo educacional, baseado na autonomia destes entes.8
Mas, com esses esforços, o MEC nem sempre atingiu os resultados previstos na sua
Política de Concertação, como pode ser observado no Relatório do estado do Maranhão:
8 Susana Martelletti Grillo Guimarães. Texto para documentação e acompanhamento da Política de Concertação entre gestores responsáveis pelas
ações de desenvolvimento da educação escolar indígena, SECAD/MEC. Brasília, fevereiro de 2007.
29
representantes de sete municípios: Santarém, Moju, Paragominas,
Paraupebas, Bannach, São Félix do Xingu e Belterra. Na ocasião foi
entregue aos gestores municipais que compareceram um conjunto
de leis da educação escolar indígena. [...] O fracasso deste evento,
[...] se configura como um indicador significativo da ineficácia da
política de municipalização das escolas indígenas, uma vez que os
gestores municipais não consideram a educação escolar indígena
uma prioridade, nem mesmo quando convocados pelo Ministério
da Educação.
9 Informações da Câmara dos Deputados (2004); do Conselho Nacional de Educação (2005), da Secretaria de Educação Básica/MEC (2005-2006); do
Centro de Planejamento e Desenvolvimento Regional (CEDEPLAR 2006) e do INEP/MEC (2005). O Legislativo e a Sociedade construindo juntos o
novo Plano Nacional de Educação. Comissão de Educação e Cultura, 2009 e INEP, p. 24.
30
Em seguida à Política de Concertação, a Coordenação Geral de Educação Escolar
Indígena – CGEEI/MEC, em 2009, criou a Política de Implantação dos Territórios Etno
Educacionais por meio da qual se propõe a tratar dois grandes problemas da gestão da política
educação indígena: o primeiro refere-se ao respeito à situação territorial dos povos indígenas, e
o segundo, ao não cumprimento do Regime de Colaboração. E faz isto sem alterar a forma como
está organizada a educação brasileira.
Com o Decreto nº. 6.861/09, o MEC propõe que se faça uma articulação entre os entes
federados, a partir de uma pactuação que deve ser efetivada em um Plano de Ação. Para o MEC, os
governos estaduais e municipais devem elaborar um Plano de Ação Articulado (PAR) com vários
sujeitos sociais, indígenas, universidades e entidades de apoio, para ofertar a Educação Escolar
Indígena, “observada a sua territorialidade, respeitando suas necessidades e especificidades”.
Não há nenhuma menção quanto à criação de uma nova estrutura organizacional para dar conta
da desejada especificidade, até porque isso não poderia ser feito por um Decreto.
O Decreto repete os princípios e as diretrizes que já estão explícitos em vários
documentos oficiais, não traz nenhuma novidade quanto ao que já existe hoje no Brasil, só a
proposta de pactuação, porquanto os entes federativos continuarão com as atribuições já
definidas em documentos anteriores, inclusive no PNE.
Não há nenhuma exigência para que os estados e municípios atuem seguindo as
diretrizes da educação escolar indígena, com exceção daquelas ações que o MEC irá apoiar,
como afirma o inciso II do Artigo 5º: “As ações apoiadas pelo Ministério da Educação deverão
estar em conformidade com as diretrizes curriculares nacionais da educação escolar indígena,
estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação”.
Retorna-se, portanto, à discussão sobre a autonomia federativa, questionando-se se
isso que está posto no Artigo 5º do Decreto nº 6.861/09, quer dizer que os estados e municípios
podem desenvolver ações para educação escolar indígena sem estar em conformidade com as
diretrizes nacionais da política dessa modalidade de ensino, desde que o façam com recursos
10
próprios. Segundo Drª. Déborah Duprat :
Mesmo que o MEC tenha como objetivo com esse Decreto que se desenvolva uma
política de educação escolar indígena que leve em conta a situação territorial dos povos indígenas,
a forma como se organizam, articulam e estabelecem as relações inter societárias, históricas,
10 Entrevista realizada por Eliene Amorim de Almeida durante a pesquisa realizada em 2007 para Conselho Nacional de Educação e UNESCO com a
Dra. Débora Duprah sub- Procuradora Geral da República, coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal –
MPF, Índios e outras Minorias Étnicas.
31
políticas, econômicas, filiações linguísticas e práticas culturais, não há nada no documento que
possa garantir que os entes federados cumprirão o estabelecido no Plano de Ação.
Para concluir, considerando que o foco para análise dessa meta foi identificar em
que medida os estados assumiram a execução da política de educação escolar indígena no
Brasil, procurou-se identificar: 1) as normas e legislações específicas publicadas pelos entes
federativos, assim como, as ações desenvolvidas pelo MEC para assumir seu papel de
coordenação e, 2) no caso onde as escolas indígenas estão sob a responsabilidade do município
se existiam/existem termos de cooperação entre os entes federados.
Procuramos demonstrar que tanto o MEC como os estados, publicaram vários
documentos oficiais, legislações e normas para assumirem a responsabilidade com a educação
escolar indígena no Brasil. Entretanto, constatou-se também, que a maioria das escolas indígenas
ainda continua sob a responsabilidade dos municípios, embora a meta seja explícita ao afirmar
que se deve “atribuir aos Estados a responsabilidade legal pela educação escolar indígena” e os
municípios só poderiam assumi-la através de “delegação de responsabilidade”.
Essa delegação de responsabilidade deveria ser efetivada por meio de Termos de
Cooperação, e essa não foi a tônica dominante no período de vigência do PNE. Assim,
concluímos que a meta 1 está em desenvolvimento de modo insatisfatório.
Meta 2 e 14
Universalizar imediatamente a adoção das diretrizes para a
política nacional de educação escolar indígena e os Parâmetros
Curriculares estabelecidos pelo Conselho Nacional de Educação
e pelo Ministério da Educação.
32
As duas metas tratam do mesmo objetivo que é proporcionar que as diretrizes para
a educação escolar indígena sejam implementadas pelos estados, municípios e União em suas
políticas educacionais para os povos indígenas, por isso elas serão analisadas ao mesmo tempo,
respeitando as responsabilidades institucionais dos entes federados, já que exige a participação
dos três. Os prazos estabelecidos para a meta 2 é imediato e para a meta 14 é de 1 (um) ano,
considerando os cinco anos para as diretrizes serem aplicadas aos projetos pedagógicos.
Para analisá-la, procurou-se identificar:
A) Documentos com diretrizes da educação escolar indígena no Brasil elaborados
entre os anos 1990 e 2000; B) Procedimentos de divulgação e aplicação dessas diretrizes nos
projetos políticos pedagógicos - PPP.
Cabe lembrar que mesmo a meta apresentando denominações diferentes para os
documentos que tratam dessas orientações, ora nomeados como “Diretrizes para a Política
Nacional de Educação Escolar Indígena”, ora como “Parâmetros (Referencial) Curriculares” ou
ainda “Diretrizes Curriculares Nacionais para as Escolas Indígenas”, são textos publicados em
momentos e com objetivos diferentes, porém com conteúdos complementares e que se
reforçam e reafirmam.
É importante lembrar que, historicamente, o Estado Brasileiro, desenvolveu
políticas no sentido de garantir a homogeneização da sociedade brasileira, entendida como
necessária para a constituição de uma nação única. A imposição de uma língua única, nacional,
foi um importante instrumento nesse sentido (ver, entre outros, Marés (2003) e Heck (1996)).
Por conseguinte, tivemos no Brasil séculos de desenvolvimento de políticas
homogenizantes e apenas alguns anos, ou seja, desde a Constituição Federal de 1988, de respeito
à diversidade e de entendimento de que as diferenças culturais são qualidades importantes da
sociedade brasileira e por isso, devem ser valorizadas e protegidas pelo Estado.
Essa leitura questiona em que medida essa meta poderia vir a ser cumprida
“imediatamente” ou mesmo ser “implantada dentro de um ano”, como está definido no PNE,
tendo em vista que mudanças de paradigmas e de práticas homogenizantes exigem muito mais
do que apenas mudanças na lei, como diz a representante do MEC,
33
A) Documentos com diretrizes da educação escolar indígena no Brasil elaborados
entre os anos 1990 e 2000
Esse indicador nos permite identificar que o governo federal, entre 1990 e 2004,
publicou vários documentos que estabelecem as diretrizes e os princípios da educação escolar
indígena no país, como pode ser observado no quadro que segue:
Ano Documentos
1991 Decreto Presidencial nº. 26
1991 Portaria Ministerial nº. 559
1993 Diretrizes para a Política Nacional de Educação Escolar Indígena
1996 Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional – LEI 9.394
1998 Referencial Curricular Nacional para Escolas Indígenas
1999 Resolução 03 do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica
1999 Parecer 14 - Diretrizes Curriculares Nacionais para Escolas Indígenas
2001 Plano Nacional de Educação – Lei 10.173
2002 Referenciais para a Formação de Professores Indígenas
2004 Decreto Presidencial 5.051 - Promulga a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho/OIT
•a escola indígena, deve ser criada como uma categoria autônoma, com normas e
ordenamentos jurídicos próprios, para que fortaleça os projetos societários dos
povos indígenas;
•a gestão e os calendários devem seguir os processos organizativos e as praticas
socioculturais de cada povo;
•o currículo deve ser intercultural, valorizando os saberes indígenas, em diálogo
com outros conhecimentos que nos embates históricos, políticos e ideológicos
conquistaram o status de universais;
•é a esfera estadual o ente federativo que deve responsabilizar-se pela oferta e
34
execução da educação escolar indígena, podendo dividir esta responsabilidade com
os municípios, sob algumas condições, já tratadas na meta anterior;
•o professor da escola indígena deve ser prioritariamente um índio da mesma etnia;
sua formação inicial e continuada deve ser específica e intercultural que, quando for
o caso, deve se dar em serviço, concomitantemente com sua escolarização e ainda
que as formas para sua contratação devem ser flexibilizadas;
•é garantida a participação ativa dos indígenas nos processos decisórios, através de
espaços concretos de deliberação das políticas e de controle social.
Para difundir essas diretrizes o MEC realizou várias ações, assumindo sua tarefa de
coordenação. Realizou oficinas, no contexto dos “Parâmetros Curriculares Nacionais em Ação”,
Seminários Regionais e Nacionais no sentido de publicizar os princípios e diretrizes postos nos
documentos oficiais.
Com relação aos estados e municípios procuramos identificar como estavam sendo
implementadas essas diretrizes, se constavam nos seus Planos de Educação, nos Projetos
Políticos Pedagógicos, nos currículos das escolas indígenas e na formação do professor como
pode ser observado no quadro que segue:
35
QUADRO 3 - PLANOS DE EDUCAÇÃO, CURRÍCULOS PRÓPRIOS E
PROJETOS POLÍTICOS PEDAGÓGICOS
36
programa e ação de maneira intensiva. Nos cursos de Formação
de Professores Indígenas trabalhamos alguns destes aspectos.'
37
A não elaboração de Planos Estaduais de Educação não é só um problema vinculado à
temática da educação escolar indígena, mas um problema da educação brasileira como um todo.
Azevedo (2001, p.33), tratando do PNE, faz o seguinte comentário:
Como mostra o relatório, a existência desses PPPs ou currículos existentes pode ter
sido resultado do apoio de entidades não governamentais, que ajudaram na elaboração. Outro
38
destaque é que alguns pesquisadores relatam que não tiveram acesso aos PPPs existentes; dessa
forma não puderem avaliar em que medida estão de acordo com as diretrizes e princípios
estabelecidos na documentação oficial. Em alguns casos, como o de Minas Gerais, mesmo a
Secretaria afirmando e mostrando o documento, nas entrevistas com os indígenas, a
pesquisadora identificou que,
Segundo a SEE de Minas Gerais, as Escolas Indígenas possuem
Projeto Político Pedagógico, inclusive nos disponibilizou dois
[...]. Entretanto, durante a entrevista com a comunidade Maxacali,
os professores afirmam desconhecer a existência do Projeto
Político Pedagógico e afirmam que não construíram nenhum
documento; na verdade não existe nenhum tipo de documento na
escola, nem de aluno, nem administrativo e pedagógico.
39
Metas 3, 4 e 17
40
Ampliar gradativamente a oferta de ensino de 5ª a 8ª série à
população indígena, quer na própria escola indígena, quer
integrando os alunos em classes comuns nas escolas próximas, ao
mesmo tempo em que se lhes ofereça o atendimento adicional
necessário para sua adaptação, a fim de garantir o acesso ao
ensino fundamental pleno.
Junto ao MEC, foram avaliadas as ações de apoio aos outros entes federados
voltados ao cumprimento dessas metas. As perguntas para esse órgão foram sobre a existência
de diretrizes e programas para cursos de professores indígenas no ensino superior,
estruturados e em funcionamento.
41
É nesse período, década de 1990, que também se consolidam as reivindicações mais
sistemáticas dos povos indígenas pelo direito à educação de qualidade e específica. O INEP
sinalizou o crescimento da primeira etapa desse nível de ensino, como pode ser observado:
42
A evolução da oferta de ensino de 5ª a 8ª série, durante a vigência
do PNE Indígena, demonstra uma preocupação com o cumpri-
mento da meta. De forma que, em 2000, o número de alunos era
zero e em 2008 já atinge 790. No entanto, considerando a evolução
do número de alunos de 1ª a 4ª série, a taxa de atendimento escolar
ainda está aquém da demanda. A baixa evolução explica-se pela
falta de infraestrutura e, principalmente, pela falta de professores.
Apenas em 2008, foram formados em nível superior os 05 primei-
ros professores indígenas. Não existe uma política oficial para
atender os alunos indígenas fora das Terras Indígenas. Quando
não há possibilidade de formação dentro das Terras Indígenas, a
Coordenação tem auxiliado esporadicamente. Esses auxílios são,
geralmente, para passagens ou combustível para o deslocamento.
Mas, não há nenhum documento oficial ou mesmo legislação que trate da educação
escolar indígena que exija que o professor indígena tenha completado sua escolarização para
ensinar em suas escolas, pelo contrário a Resolução 03 do CNE quando se refere à formação do
professor indígena em relação ao exercício do magistério, afirma no artigo 12 que
43
Parece-nos, portanto, que a exigência para que professores indígenas tenham
concluído sua habilitação para ensinar nas suas escolas não encontra respaldo legal, tratando-se
de uma interpretação equivocada das secretarias de educação.
No caso do Amapá
A situação do Amapá difere da realidade da Bahia, tendo em vista que pela ausência
de curso de formação não há professores indígenas habilitados e nem mesmo alguma iniciativa de
suprir tal demanda por meio de professores não indígenas. Já em outras áreas indígenas, a
Secretaria do Amapá mantém um número expressivo de professores não-índios, inclusive atuando
nas primeiras séries do ensino fundamental, como é o caso do Parque Indígena do Tumucumaque.
Estas duas situações demonstram que no que diz respeito à segunda etapa do ensino fundamental
para os povos indígenas, sua oferta ainda é um desafio para os gestores públicos.
Quanto à especificidade do atendimento, a própria meta indica que, para essa etapa
do ensino fundamental, isso seria relativizado, já que ela admite que o ensino deveria ser
ampliado mesmo que fosse “integrando os alunos em classes comuns nas escolas próximas”.
Silva (2002) já alertava que,
44
A localização das aldeias é de difícil acesso, a cidade mais
próxima fica a aproximadamente 11 km. Não há oferta do Ensino
de 5º ao 9º ano nas aldeias. Alguns alunos já tentaram cursar esse
nível em escolas fora das Aldeias, mas como a SEE-MG não
oferece nenhum tipo de suporte para a inserção destes alunos em
escolas fora das aldeias, como transporte, por exemplo, os alunos
acabam desistindo e retornam para a escola da comunidade, onde
continuam estudando nas turmas de 1ª a 4ª série.
13
B) Formação de Professores em nível médio
45
O censo de 1999 trouxe a informação de que 45,5% dos professores indígenas
haviam recebido algum tipo de formação em nível médio. Já em 2005, os dados revelaram que o
percentual de professores indígenas com ensino médio era de 64,8%. Esse aumento representou
o resultado das políticas de formação de professores indígenas, desenvolvidas pelos sistemas
de ensino e também por Organizações Não Governamentais, com apoio do MEC
Entre os anos de 2003 a 2006 a SECAD financiou 67 (sessenta e sete) propostas de
formação para professores indígenas, distribuídas por todas as regiões do país, aplicando o
valor total de R$b 9.655.847,67 (nove milhões, seiscentos e cinqüenta e cinco mil, oitocentos e
quarenta e sete reais e sessenta e sete centavos).
Em 2007, no contexto do PAR, foram empenhados recursos para operacionalização
de projetos apresentados pelas Secretarias Estaduais, ONGs ou Universidades, totalizando R$
47.234.431,54 (quarenta e sete milhões, duzentos e trinta e quatro mil, quatrocentos e trinta e um
reais e cinquenta e quatro centavos). Esse recurso foi empenhado para ser executado no período
de 2008-2011, com ações de formação inicial, formação continuada, ensino médio integrado e
formação superior em licenciatura.
Com relação a esses números, a primeira vista expressivos, é preciso registrar que as
secretarias de educação têm demonstrado baixa capacidade operacional, não conseguindo
utilizar os recursos disponibilizados pelo MEC. O primeiro ano de cumprimento do PAR
indígena revelou a baixa capacidade de execução dos sistemas de ensino em empregarem os
recursos alocados pelo MEC na formação de professores indígenas, tal como informado pelos
representantes do MEC em reuniões da Subcomissão de Educação Indígena da Comissão
Nacional de Política Indigenista. Tal situação agravou-se em anos recentes com a interrupção,
por parte do MEC, do financiamento de programas de formação de professores indígenas
conduzidos por organizações indígenas e indigenistas, o que ocasionou a paralisação de alguns
programas de formação considerados referenciais em certas regiões.
Considerando que oferecer formação inicial para professor indígena é papel
institucional das Secretarias Estaduais de Educação, na pesquisa foi possível identificar que
apenas os estados de Pernambuco, Paraná, Alagoas, Sergipe, Bahia, e Pará não realizaram
cursos de magistério específicos. Em todos os demais foram registrados a existência de
diferentes programas de formação, com escopo, metodologias e alcances variados.
Até o presente momento, não foi empreendido nenhum esforço de avaliação sobre
os cursos de formação de professores indígenas conduzidos pelos sistemas de ensino, de modo
que se possa aferir suas qualidades e adequação ao que preceitua a legislação vigente, nem
quanto ao impacto da formação de professores indígenas em sua prática docente, isto é, sobre o
ensino ministrado nas salas de aulas das aldeias indígenas.
E a pesquisa no Amapá alerta:
46
UF NORTE
AC Programa de Formação em Magistério Indígena para escolas estaduais e municipais, desde 2000.
AP SOMEI - Sistema Organizacional Modular de Ensino Indígena; Curso de Formação de Professores
Pesquisadores –Iepé.
AM São Gabriel da Cachoeira: São 310 professores na 5ª etapa do magistério indígena. Manicoré:
Programa de Formação: única turma formada com 40 professores;
Atalaia do Norte: Programa: primeira turma de 50 professores, paralisado desde 2006.
PA Projeto Ibaorebu de Ensino Médio, formação de 110 professores Munduruku (Seduc/FUNAI);
RO 119 professores formados entre 1998 e 2004; segunda turma iniciou em 2009 com 174 cursistas.
RR Projeto Tamik’an - CEFOR; Projeto Yarapiari (Yanomami) – ISA
TO Formação Inicial em Magistério Indígena em andamento.
NORDESTE
AL Previsão de início para agosto de 2010.
CE II Magistério para Professores Indígenas em nível Médio.
BA
Curso Magistério Indígena, nível médio, está em sua segunda edição. Com 185 cursistas e o Curso
de Graduação Licenciatura Intercultural em andamento conta com 108 cursistas.
MA 1ª. Turma do Curso de Magistério Indígena formou 146 professores em 2002; 2ª. Turma tem 247
em formação desde 2006.
PB Curso de Magistério Indígena com 120 professores, não concluído em razão das
descontinuidades.
PE Não há curso específico e sim uma adaptação do Proformação
SE Não tem.
SUDESTE
ES Magistério Indígena 1999: parceria entre o estado e o município de Aracruz, 34 professores
formados.
MG Curso de Formação Inicial de Magistério Indígena, em 1996, já habilitou 141 professores
indígenas.
RJ Protocolo Guarani: 7 professores em formação.
SP Em 2003 a SEE formou 61 professores indígenas no nível médio.
SUL
PR Dos 211, considerando os que já são graduados e os que estão frequentando os cursos de
formação de docentes , apenas um número bastante reduzido não conseguiu vagas porque, na
ocasião, tais professores ainda estavam concluindo a escolaridade necessária para o ingresso.
RS Curso de Complementação de estudos para professores Kaingang- Normal Bilíngüe e Programa
de Formação de Professores Guarani das regiões sul e Sudeste do Brasil (Protocolo Guarani).
SC Curso de Formação Continuada em 2008 atendendo 105 professores Kaingang. Em 2009, Curso
de Formação para os professores Xokleng.
CENTRO-OESTE
GO Existe curso de formação em magistério indígena
47
atuar nas áreas indígenas do Amapá. A equipe da SEED
responsável pela formação de professores não índios conta com
assessoria pedagógica e uma unidade linguística, mas não há
assessoria antropológica no quadro de funcionários do NEI.
14 Suzana Martelletti Grillo Guimarães, em entrevista à pesquisadora Eliene Amorim de Almeida, em janeiro de 2010.
48
Nesse sentido, destaca-se o Prolind - Programa de Apoio à Formação Superior e
Licenciaturas Indígenas, criado no ano de 2005, apoiando projetos de cursos de licencia-
turas específicas,
Contemplando estudos de temas relevantes como línguas
maternas, gestão e sustentabilidade das terras e culturas dos
povos indígenas. Os projetos também devem promover a
capacitação política dos professores indígenas como agentes
interculturais na formulação e realização dos projetos de futuro
das comunidades indígenas (Idem p.39).
Esta iniciativa foi discutida com a Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena
(CNEEI) e com a Comissão Especial de Educação Superior, como mostra o texto da SECAD 2007:
A ação está fundamentada no tratamento sistêmico da educação
intercultural indígena, tanto na formação superior de docentes,
quanto na expansão da oferta de educação básica intercultural
nas escolas indígenas. A manifestação explícita de interesse por
parte das comunidades, sua participação na elaboração das
propostas de cursos de licenciaturas específicas e adequação à
realidade social e cultural de cada povo são diretrizes para a
apresentação dos projetos (p.39)
49
QUADRO N.05 - LISTA DE UNIVERSIDADES QUE OFERTAM
CURSOS DE LICENCIATURA INTERCULTURAL
UF INSTITUIÇÃO
16
D) Construção de Prédios escolares
50
O MEC, em conjunto com as Secretarias Estaduais de Educação, tem sido desafiado
a construir ações que proporcionem a redução desse déficit. Para tanto, a SECAD ampliou os
recursos disponibilizados para estruturação da rede física das escolas indígenas, passando de
R$ 514.480,00 (quinhentos e quatorze mil, quatrocentos e oitenta reais) em 2004 para R$
2.600.000,00 (dois milhões e seiscentos mil reais) em 2006. Além de R$ 18.000.000,00 (dezoito
milhões de reais) para execução entre 2005 e 2007. Aqui, novamente, cabe o registro de que
apesar do volume expressivo de recursos disponibilizados, tem sido baixa a capacidade
operacional dos sistemas de ensino na utilização desses recursos para a reforma e construção de
escolas nas terras indígenas.
De acordo com dados do Inep, relativos ao ano de 2008, dos 2.698 estabelecimentos
de ensino de educação indígena, somente 1.917 funcionavam em prédio escolar próprio. Destes
apenas, 122 contavam com laboratório de informática, 11 com laboratório de ciências e 203 com
bibliotecas ou salas de leitura, revelando a precariedade das condições de infra-estrutura das
escolas indígenas país afora. Registre-se que 781 escolas indígenas funcionam em condições
precárias, sem prédios próprios, atendendo alunos em galpões improvisados, casa de
professores, salões de igrejas, entre outros. Segundo o MEC, o objetivo das ações voltadas para a
reestruturação da rede física é o de
51
A responsável pela educação escolar indígena no estado de Santa Catarina cita o
caso de duas escolas que foram ampliadas com verba do MEC, mostrando a importância do
aporte federal na construção de escolas indígenas no estado.
Lá na minha área tem escola que não tem nem a parede, acabou
tudo. Pra não perder, a comunidade ta fazendo de palha... a escola
caiu, caiu. Dezesseis anos a escola sem reforma não vai segurar
né? Ainda mais com a empresa que foi construir em vez de
comprar madeira de lei foi comprar aquela madeira frágil, que
com dois, três anos já não presta mais. Então estamos sentindo na
pele e estamos cobrando isso porque precisa mesmo.
A análise das metas 3, 4 e 17 foi realizada a partir dos três indicadores quais sejam: os
níveis de ensino ofertados pelos estados e municípios; programas de formação de professores
indígenas em nível médio e superior que estavam em desenvolvimento, e a construção de
prédios escolares.
Em relação à universalização das séries iniciais do ensino fundamental observamos
que fica comprometida a avaliação devido à ausência de um censo populacional que subsidie a
conclusão sobre o atendimento dessa demanda de escolaridade, mas identificamos que houve
um crescimento substancial de estudantes nessa etapa do ensino fundamental.
No que se refere à ampliação da 5ª a 8ª série nota-se um crescimento da demanda
considerando o contingente de estudantes que vem concluindo os anos iniciais, sem que haja o
devido atendimento nas aldeias, o que demonstra a necessidade de um maior investimento dos
gestores públicos nessa etapa do ensino fundamental. Nas secretarias estaduais não foi possível
identificar dados que mostrem a quantidade de estudantes que freqüentam as escolas das
cidades próximas, como orienta a meta, o que de novo, nos impede de fazer afirmações mais
precisas acerca da avaliação da meta.
Um outro indicador estabelecido pela avaliação que poderia demonstrar se a
demanda de ensino fundamental nas áreas indígenas foi atendida ou não seria a construção de
novos prédios escolares. Quanto a esse tópico observamos que houve um incremento de
52
recursos por parte do MEC, mas que não se reverteu em ações concretas por parte das
secretarias de educação.
Com relação à formação de professores indígenas em nível superior é substancial o
aumento da oferta de cursos de licenciaturas específicas, considerando-se que a meta previa
apenas a criação de programas especiais, e não uma política para esse setor.
Sabe-se, no entanto, que o desafio é ainda a institucionalização desses cursos pelas
universidades públicas tendo em vista que a maioria ainda são desenvolvidos como projetos
específicos, com orçamentos vinculados ao PROLIND e não se inserem no orçamento regular
das universidades.
Considerando-se todos esses aspectos e buscando uma síntese que abranja todos
os dados envolvidos e todos os estados brasileiros consultados, concluímos que as metas 3, 4
e 17 estão em desenvolvimento de modo insatisfatório.
53
Meta 5
54
As educadoras, educadores, antropólogos/as e lingüistas dessas organizações começam, então,
a participar de forma propositiva no conteúdo e nos procedimentos de elaboração dos
documentos oficiais e na legislação sobre Educação Escolar Indígena no país, inclusive
garantindo a participação de professores indígenas nesses processos, de forma que a "agenda
histórica" do movimento indígena e indigenista foi incorporada, em grande parte, pela
legislação educacional para os povos indígenas no país e tornou-se referência para as políticas
públicas que foram gestadas em anos recentes para essa modalidade de ensino.
Entende-se assim que a documentação oficial que trata hoje da educação escolar
indígena no Brasil foi publicada pelo MEC, mas escrita em parceria com organizações da
sociedade civil, como revela esse documento da SECAD.
O MEC também apoiou esta articulação, via FNDE, firmando convênios com
diferentes ONGs indígenas e indigenistas, com vistas a formação de professores e publicação de
material didático diferenciados.
18
Segundo dados do MEC , com relação ao material didático foram publicados entre
2004 e 2006, 20 (vinte) títulos elaborados em seis estados (AC, AM, MA, TO, MT e PE) por
Organizações Não Governamentais indígenas e indigenistas, com o apoio da Comissão
Nacional de Apoio à Produção de Material didático indígena – Capema. Porém, antes desse
período, registra um número expressivo de publicações produzidas por ONGs que vieram a
público com aportes do MEC, o que permitiu uma intensa circulação de materiais diferenciados
entre várias escolas indígenas e programas de formação de professores.
No que se refere aos cursos de formação para professores indígenas, no mesmo
período, houve várias iniciativas contempladas também com apoio financeiro do MEC. Parte
dessas formações foi realizada nos mesmos estados e pelas mesmas organizações que estiveram
envolvidas na produção do material didático, como mencionado anteriormente.
Sobre esse assunto Grupioni (2002) informa que,
55
Com a mudança de governo em 2002, essa situação foi aos poucos sendo
transformada. O governo federal passou a priorizar o investimento nos sistemas de ensino,
perspectiva esta que foi consolidada com a instituição do PAR Indígena e a consequente
mudança na forma do financiamento da educação brasileira. O MEC condicionou o apoio
financeiro apenas para as Secretarias de Educação porque entendia que com isso iria mobilizar
“fortemente o sistema nacional de educação para o tratamento da educação escolar indígena
(2007, p. 18)” já que, segundo o Ministério,
Parece que o MEC, mesmo reconhecendo a importância das ONGs, entendia que
havia um antagonismo entre apoiar essas organizações e, ao mesmo tempo, fortalecer a ação dos
entes federativos, como pode ser observado no trecho do mesmo caderno citado anteriormente:
19
A Rede de Cooperação Alternativa – RCA ressentindo-se do afastamento das
ONGs nas decisões das políticas e mesmo do apoio financeiro aos seus trabalhos, o que
ocasionou, em muitos casos, a interrupção nos processos formativos já iniciados, enviou, em
2008, um documento para a SECAD, afirmando que,
19 A Rede de Cooperação Alternativa é hoje constituída por 10 organizações indígenas e indigenistas, são elas; Associação dos Povos Timbira do
Maranhão e Tocantins – Vyty Cate; Associação Terra Indígena Xingu - ATIX; Centro de Trabalho Indigenista – CTI; Comissão Pró-Índio do Acre –
CPI/Acre; Hutukara – Associação Indígena Yanomami; APINA – Conselho das Aldeias Wajãpi, Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – Iepé;
Instituto Socioambiental – ISA;Organização dos Professores Indígenas do Acre – OPIAC. No encontro onde foi elaborada a carta acima citada
estiveram presentes, como convidados, o Centro de Cultura Luiz Freire, a Comissão dos Professores Indígenas do Amazonas – COPIAM, a
Organização dos Professores Indígenas de Mato Grosso – OPRIMT, a Organização dos Professores Indígenas de Roraima - OPIRR e a Organização
Geral dos Professores Ticuna Bilíngue – OGPTB, tendo em vista que essas instituições não fazem parte da RCA.
56
assumindo uma posição de que a parceria não está em seu
horizonte ideológico e administrativo. No nosso entender, essa
posição fechada ao diálogo e à parceria, que sempre marcou a
execução das políticas de educação indígena no país, contraria o
compromisso do próprio Presidente da República que, desde seu
primeiro mandato, afirma acreditar na ação conjunta entre o
Estado e a sociedade, condição para a conquista e ampliação da
cidadania e democracia em nosso país.
57
processo administrativo que permita a liberação dos recursos para o
início dos projetos. Tal situação se arrasta desde dezembro de 2009.
Nós lutamos e lutamos pra isso, fazer parceria com Iepé, mas não
sei por que a Secretaria não fez parceria com o Iepé assim, porque
é ONG, porque o Iepé, é terceiro setor né? Então é muito problema
com o Iepé e a Secretaria, muito, muito, muito mesmo. Até nós
estamos lutando ainda pra fazer parceria com o Iepé e Secretaria,
mas não conseguimos não.22
Em outros estados, como o de São Paulo, a pesquisadora revela mais uma vez, que a
situação é semelhante:
22 Entrevista com membros da Associação de Povos Indígenas Tiryó e Katxuayana e Txikuyana- APITIKATXI.
58
Não se verifica nenhuma articulação da SEE (Secretaria Estadual de
Educação) com experiências promovidas por organizações
indígenas e indigenistas voltadas para a construção de uma
educação escolar indígena diferenciada. Verifica-se que há no
Núcleo de Educação Indígena – NEI, uma vaga reservada para os
representantes das ONGs, ocupada por um antropólogo e
professor aposentado da UNESP; mas não há participação de
representantes do CTI, IDETI ou ISA nas reuniões do NEI, o que
efetivamente corresponde a uma lacuna a ser prioritariamente
revista.
Essa experiência nos ensina que práticas de ONGs não são necessariamente
concorrentes ou antagônicas com as dos gestores públicos.
59
É bom lembrar que a educação escolar indígena baseada em princípios do
plurilinguismo, especificidade, diferenciação e interculturalismo, participação direta dos
índios na formulação e no controle social da política de educação foram princípios trazidos das
aprendizagens de algumas entidades da sociedade civil organizada, como já foi dito
anteriormente. Essas práticas sociais das ONGs além de serem baseadas em um referencial
teórico, foram desenvolvidas a partir de metodologias baseadas no contato direto com a
comunidade, ouvindo, aprendendo, ensinando. Porém, o que foi transferido para a ação
governamental foi o discurso e os princípios; mas a metodologia de ação da sociedade é
incompatível com a máquina administrativa brasileira, da forma como está secularmente
estruturada. Como comenta a Dra. Déborah Duprat,
23 Deborah Duprat, Subprocuradora-Geral da República, Coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal –
Índios e outras Minorias Étnicas. Palestra realizada no Seminário Bases para uma política indigenista, promovido pelo Laced/Museu Nacional, em
agosto de 2004.
24 Quadro n. 11 Lista dos estados que criaram CEEI ou tem representantes indígenas em Câmara Técnica do CEE.
60
No MEC foi criado o “Comitê de Educação Escolar Indígena”, instituído e
regulamentado pelas Portarias no. 60/92 e 490/93, constituído por representantes de entidades
da sociedade civil, órgãos de classe e de organizações indígenas. Em 2001, o Comitê foi
substituído por uma comissão só de professores indígenas, a Comissão Nacional de Professores
Indígenas (CNPI).
A Comissão Nacional de Professores Indígenas foi criada pela Portaria do
Ministério de Estado da Educação no. 1.290 de 27 de junho 2001 e, segundo o artigo 2°:
o
Em 2010, por meio da Portaria n . 734, do Ministério da Educação, institui-se a
Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena – CNEEI, como órgão colegiado de caráter
consultivo, com a atribuição de assessorar o Ministério da Educação na formulação de políticas
para educação escolar indígena. Essa Comissão
61
o
O Decreto n . 6.861, de 27 de maio de 2009, deverá ser modificado
o
alterando a redação do art. 7 . com a substituição da palavra
“Comissão” por “Conselho”, o qual será composto por no mínimo
um representante de cada povo do território, garantindo-se no
mínimo uma composição paritária, com a possibilidade de ter
maioria indígena, considerando a diversidade sociocultural da
região e o tamanho da população. Esse Conselho deve ser delibera-
tivo, consultivo e fiscalizador e formado também por representan-
tes do MEC, das Secretarias Estaduais e Municipais de Educação,
da FUNAI, das organizações indígenas, das Universidades e das
Organizações Não Governamentais que trabalham com educação
escolar indígena. Este Conselho terá representação nos Conselhos
Estaduais de Educação Escolar Indígena (2009).
62
QUADRO NO. 6 – ESTADOS QUE CRIARAM CONSELHOS ESTADUAIS DE
EDUCAÇÃO INDÍGENA – CEEI E/OU NÚCLEOS DE EDUCAÇÃO INDÍGENA - NEI,
TÊM REPRESENTANTES INDÍGENAS EM COMISSÕES TÉCNICAS - CT, E/OU NOS
CONSELHOS ESTADUAIS – CEEI
63
Os problemas que temos são vários, desde a regulamentação das
escolas indígenas junto ao Conselho de Educação Escolar
Indígena, que necessita de uma reestruturação para executar o
seu papel institucional no atendimento às demandas de criações
das escolas indígenas.
Com relação à meta 5, mesmo considerando que houve avanços significativos, por
parte do MEC, no sentido do “fortalecimento das experiências de construção de uma educação
diferenciada e de qualidade”, isso foi realizado de forma bastante frágil, ora garantindo a
participação e apoio, ora excluindo as organizações da sociedade civil que
desenvolviam/desenvolvem essas experiências. No que diz respeito aos estados, além de não
se identificar parceiras consolidadas, percebe-se um acirramento de conflitos ou não
reconhecimento das secretarias de educação para com as entidades de apoio aos índios, além
disso, há poucos ou nenhum espaço de participação da sociedade civil para controle social dessa
política pública nos estados. Sendo assim, consideramos que a meta está em desenvolvimento
de modo insatisfatório.
64
Meta 6 e 7
A meta 6 tem prazo de 1 (um) ano e a 7 de 2 (dois) anos para serem implementadas e,
segundo o PNE, devem ser desenvolvidas em corresponsabilidade pelos três entes federados.
Essas metas também serão analisadas conjuntamente por suas afinidades e
complementaridade, já que no entendimento do Conselho Nacional de Educação, tanto na
Resolução no. 03 quanto no Parecer 14 - Diretrizes Curriculares Nacionais, ambos de 1999,
constam que,
65
.13).
E ainda, na Resolução 03, artigo 9, no capítulo que trata das competências dos
estados, alínea “b”, o CNE afirma também que eles devem,
No que diz respeito ao MEC, quando o PNE foi lançado, atribuindo aos Estados a
responsabilidade legal pela educação escolar indígena e decretando a criação, em um ano, da
categoria 'escola indígena', a meta 06 já havia sido cumprida pela Resolução nº. 03 e com o
Parecer nº. 14 do Conselho Nacional de Educação.
Diante disso, o MEC investiu na sensibilização das Secretarias de Educação Estaduais
e Municipais, na perspectiva de consolidar essa normativa. A realização de seminários e encontros
possibilitou a discussão sobre o tratamento dado a essas escolas e sobre os princípios da
especificidade e interculturalidade, necessários para garantir uma educação de qualidade.
Outro mecanismo utilizado foi a ampla divulgação das Diretrizes Curriculares
Nacionais, que resultou na criação, por parte das Secretarias de Educação, das Resoluções
estaduais e municipais, baseadas na Resolução 03.
66
26
tratamento [...].
Em 1999 foi realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (INEP) um Censo direcionado para a educação escolar indígena, em parceria
com as Secretarias de Educação dos estados, que deu visibilidade a essas escolas, possibilitando,
pela primeira vez, um retrato da situação da educação indígena no país, com informações não só
sobre número de alunos e professores, mas também sobre as condições de infra-estrutura e de
práticas pedagógicas nas escolas, evidenciando a situação do uso das línguas indígenas e de
materiais didáticos diferenciados. Este foi o único censo específico realizado até hoje.
Atualmente, o cadastro nacional das escolas indígenas é feito através do censo
escolar, que é realizado para todas as escolas brasileiras. É com base nesses dados que as escolas
indígenas podem acessar os financiamentos e programas. As estatísticas levantadas sobre a
educação escolar indígena neste processo também servem para diagnosticar várias situações: o
uso de material didático, a formação de professores, a infraestrutura utilizada, escolas
bilíngues, entre outros aspectos.
A Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena recebe parte do censo,
especialmente os dados relacionados ao número total de escolas e de alunos indígenas,
distribuídos em todos os níveis de ensino e, com base nessas informações, acompanha o
crescimento da oferta da educação básica nas aldeias e elabora a política educacional específica.
A partir desses dados de realidade, são destinados os valores do FUNDEB para merenda escolar
diferenciada e recursos para construção de escolas indígenas.
Outro impacto importante resultante dos dados apontados pelo censo escolar, com
tratamento pela CGEEI, seria o controle social que poderia ser realizado pelo movimento
indígena na execução da política nas esferas municipais, estaduais e nacional. A precária
publicização dessas informações impossibilita essa possível utilização dos dados do censo
escolar pelos índios e seus aliados.
Mesmo assim, no Relatório da Pesquisa no estado de Roraima os pesquisadores
fazem um alerta com relação aos dados do INEP:
67
A pesquisadora do estado de Alagoas também encontrou disparidades nos dados
do INEP. Segundo ela,
A regulamentação está em andamento, porém nenhuma escola completou o
processo, no entanto, de acordo com o Censo de 2008, das 16 escolas existentes no estado, 09
escolas estão regulamentadas no Conselho e 05 escolas estão em tramitação. Os dados do
Norte
Acre Sim
Amapá Sim
Amazonas Situações diversas nos municípios
Pará -
Rondônia Não
Roraima Não
Tocantins Sim
Nordeste
Alagoas Sim / 2003
Bahia Sim / 2004
Ceará Sim / Resolução 382/2003
Maranhão Não
Paraíba Resolução CEE nº 207/2003
Pernambuco Sim / 2007
Sergipe Não
Sudeste
Espírito Santo Sim / município de Aracruz / 2004
Minas Gerais Sim / 1997
Rio de Janeiro Sim / 2003
São Paulo Sim
Sul
Paraná Sim / 2008
Rio Grande do Sul Não / 2002
Santa Catarina Sim / 2005
Centro- Oeste
Goiás Sim / 2002
Mato Grosso Sim / 2004
Mato Grosso do Sul Sim / 2004
68
escolas nos programas oficiais de assistência e apoio educacional,
permanecendo como escola rural, mesmo em terras indígenas.
27 Quadro n. 10 identifica os critérios utilizados pelos estados para reconhecimento das escolas indígenas.
69
o
postos para as escolas dos não índios. Isso apesar da Resolução n . 03 de 1999, no capítulo 9, que
trata das competências afirmar que cabe aos Conselhos Estaduais de Educação,
Além disso, alguns estados têm exigido para regularizar a escola que a Terra Indígena
esteja homologada e regularizada pelo Governo Federal, o que dificulta ainda mais esse processo.
Essa exigência não encontra respaldo no art. 2º, da Resolução do CNE, que defini como um dos
elementos básicos para a organização, a estrutura e o funcionamento da escola indígena,
Desse modo se constata que a maioria das escolas indígenas no Brasil não está
oficialmente reconhecida, concluindo-se que elas não têm usufruído dos direitos adquiridos,
como pode ser observado a seguir.
O pesquisador constatou que em Roraima,
28 Entrevista realizada com as professoras da Escola Indígena Ancelmo Bispo de Souza. Inhapi, 22 de fevereiro de 2010.
29 Cf. Decreto nº 1272/2003. “Institui no Âmbito da Educação Básica no Sistema de Ensino do Estado, a Categoria Escola Indígena, e dá
Outras Providências”.
70
as comunidades que estavam relativamente isoladas e com
número pequeno de alunos. Descolando as escolas do projeto
(sócio) político destes povos, que passaram a criar novas
comunidades a partir do processo de disputa territorial
71
as e de segurança de uso do espaço físico, o acervo de materiais
pedagógicos existentes, a estrutura administrativa, discriminando
os recursos humanos e a habilitação deles conforme o cargo de
diretor, coordenador, professor, secretário e outros. Até mesmo a
história do nome escolhido para a escola deve ser apresentada.
Metas 8 e 11
72
escolar, livro didático, biblioteca escolar, merenda escolar, TV
Escola, de forma a contemplar a especificidade da educação
indígena, quer em termos do contingente escolar, quer quanto aos
seus objetivos e necessidades, assegurando o fornecimento desses
benefícios às escolas.
73
estabelecida na legislação educacional vigente. Dessa forma, será considerado que a meta 8
exige um esforço conjunto entre Estados, Municípios e a União enquanto a meta 11 informa que
é exigida a colaboração da União.
Para analisar e avaliar essas metas procurou-se identificar nos entes federativos
as ações de: A) capacitação para formulação e execução de projetos políticos pedagógicos
próprios; B) programas de financiamento da educação que chegam às escolas indígenas e
aqueles criados ou adaptados especificamente para as escolas indígenas; C) presença de
conselhos escolares e de unidades executoras nas escolas indígenas.
A autonomia das escolas foi uma das discussões mais importantes no Brasil na
década de 1980. Profissionais e teóricos da educação que compreendiam a escola como espaço
plural onde o ensinar e o aprender deveria acontecer de forma criativa e livre, reivindicavam a
autonomia pedagógica e financeira da instituição escolar, como uma das condições para
garantir a liberdade do ensino e da aprendizagem, de maneira que pudesse contribuir na
formação de cidadãos críticos e participativos e atuantes em suas realidades.
Essa conquista foi assegurada na Lei nº. 9.394/96, mesmo com conotações políticas
ideológicas diferentes das reivindicadas pelo movimento social.
Assim, a autonomia escolar tanto no que se refere à utilização de recursos, quanto ao
Projeto Político Pedagógico, não é uma inovação do PNE e também não é uma prerrogativa
apenas das escolas indígenas, como pode ser verificado no texto da LDB, em seu artigo 15
Isso também vale para os programas de apoio financeiro às escolas indígenas que,
segundo o MEC, são beneficiárias de todos os programas educacionais existentes gerenciados
pelo FNDE, a partir do momento em que estão cadastradas no censo escolar.
Os diversos textos orientadores publicados pelo MEC expressam o que esse órgão
entende por autonomia:
A proposta de uma Educação Escolar Indígena de qualidade –
intercultural, específica, diferenciada, bilíngue / multilíngue –
pressupõe que os próprios índios e suas respectivas comunidades
estejam à frente como professores e gestores da prática escolar.
Para que a escola indígena seja autônoma e fortaleça os projetos
societários e identitários dos povos indígenas é fundamental
desenvolver práticas de formação docente considerando cenários
de diversidade sociocultural (MEC/SECAD, 2007, p. 42).
74
Em relação à elaboração dos projetos políticos pedagógicos, o MEC, publicou, em 2002,
os “Referenciais para a Formação de Professores Indígenas”, que contribuíram para que os estados
30
começassem a discutir a temática dos PPP com os professores indígenas. Segundo Guimarães,
Ainda que em alguns estados se verifique esforços para a discussão e elaboração dos
PPPs das escolas indígenas, essa não é uma situação generalizável para todo o país. Dos 24
30 e 31 Idem
75
(vinte e quatro) estados pesquisados, 13 (treze) informaram que não há Projetos Políticos
Pedagógicos das escolas indígenas; 06 (seis) afirmam que possuem, e os demais ou não
informaram, ou estão com os PPPs em construção.
Nos estados que afirmaram que há PPPs prontos, os pesquisadores não tiveram
acesso ao documento. Aconteceu também de, nas entrevistas com os interlocutores indígenas,
esses negarem ou questionarem o processo de elaboração, principalmente no que se refere à
participação da comunidade na sua formulação.
Além disso, alguns pesquisadores encontraram situações nas quais os estados
entendem que a autonomia das escolas indígenas vai além da elaboração de PPPs e programas
de financiamento. É o caso de Pernambuco, em cujo relatório a pesquisadora, a partir da fala dos
índios entrevistados, faz a seguinte afirmação:
76
B) Programas adaptados e/ou específicos que chegam às escolas indígenas
O PNAEI, foi criado em 2003 no contexto do PNAE, como pode ser observado por
meio da Resolução nº. 045 de 31 de outubro de 2003, do FNDE:
77
Programa Nacional de Transporte Escolar – PNTE
A situação desse programa é diferente, ele tem como finalidade melhorar o ensino
nas escolas rurais garantindo a permanência e acesso dos estudantes da escola rural (LIBÂNEO,
2003). Foi criado em 2004, pela Lei 10.880/04 e é anualmente regulamentado por Resoluções
ministeriais. Tem como objetivo o repasse, em caráter suplementar, de recursos aos municípios
e estados para a realização do transporte dos alunos das respectivas redes de ensino que são
residentes em área rural, matriculados no Ensino Fundamental. O texto não faz nenhuma
referência à especificidade das escolas indígenas.
Os livros não são específicos, mas, a gente sabe que parte desses
livros os professores usam para planejar, a biblioteca é
importante, agora o grande problema é uma falta de controle na
chegada desse material.
Nós temos visto situações em que muitas vezes esse material, para
chegar em escolas rurais - que envolvem indígenas, do campo e
quilombola - o endereço a ser entregue é o da Prefeitura
Municipal mais próxima. Nós não conseguimos mudar isso, a
gente não conseguiu isso, ter um agente de correio com uma caixa
de correio postal para cada escola. Então, as escolas quilombolas,
do campo e as indígenas não recebem (do mesmo jeito que as
demais escolas, ou seja, pelo correio) como as urbanas recebem,
que é direto, sai da editora direto pra escola. As rurais vão pra
Secretaria Municipal mais próxima. E se você não tem um
professor avisado e informado de que chegou o material, muitas
escolas não recebem.
Outro programa que o MEC informa que tem chegado às escolas indígenas é o
Programa Nacional de Tecnologia Educacional - ProInfo, criado pela Portaria nº. 522/MEC,
78
1997, para promover o uso pedagógico de Tecnologias de Informática e Comunicações (TICs) na
rede pública de ensino fundamental e médio. O MEC compra, distribui e instala laboratórios de
informática, em contrapartida, os governos locais providenciam a infraestrutura das escolas
para receber o programa. Para Guimarães,
Em Goiás, a pesquisadora mostra que o único programa que chega a uma determi-
nada escola é o da merenda escolar. Mas, essa comunidade mantém um Programa voltado ao
fortalecimento cultural com aulas que ocorrem fora do horário oficial da escola, entretanto a
Secretaria de Educação oferece apenas merenda aos estudantes no horário convencional.
Em alguns municípios de Mato Grosso, a pesquisadora relata outros problemas
com a merenda escolar:
79
etnias que recebem pouca visita dos técnicos e a falta de carro e
recursos próprios da aldeia resultam na falta da merenda escolar.
35 O nome correto é Conselho Estadual de Educação Indígena . Por ocasião do Decreto o nome foi erradamente grafado como Conselho Estadual
de Educação Indigenista e, desde então, nunca foi corrigido.
36 ESTELLES, Reinaldo Soares, etl all. In. Transporte Escolar Indígena: favorecendo a inclusão social por meio da educação. Centro de Formação
de Recursos Humanos em Transportes – CEFTRU2007 - Universidade de Brasília – UnB.
80
categorias – filhos de agricultores, ribeirinhos, posseiros,
quilombolas, assentados, fazendeiros etc. Tal situação evidencia
uma primeira constatação: os alunos indígenas podem não estar
sendo atendidos de forma satisfatória pelo transporte escolar que
lhes é oferecido, já que as especificidades educacionais indígenas,
conforme demonstrado, são diferenciadas.
Além desses problemas inerentes ao fato dos programas não serem adequados à
realidade indígena, há também aqueles relacionados às configurações político-partidárias entre
a gestão dos estados e a União.
Essa seria uma explicação para o quadro encontrado em São Paulo, onde segundo a
pesquisadora:
37
C) Conselhos Escolares e/ou Unidades Executoras
81
Conselhos Escolares tais como: a APMs para gerir os recursos
recebidos pelas escolas; Conselho Escolar e Conselho de
Lideranças que participam nas decisões do funcionamento da
escola, discutem e encaminham os problemas da educação.38
Há outros que veem como positivo a existência desses espaços, como é o caso dos
professores entrevistados na Bahia, o que levou a pesquisadora a concluir que os indígenas
estariam,
Exercitando também a gestão de recursos financeiros, a
comunidade educativa de algumas escolas se organiza em
Associações de Pais e Mestres, Conselhos Escolares, Caixas
Escolares ou Unidades Executoras (UEx).
82
As metas 8 e 11 foram analisadas conjuntamente, para realizar sua avaliação
procurou-se identificar nos entes federativos as ações de capacitação para formulação e execução
de projetos políticos pedagógicos próprios; os programas de financiamento da educação que
chegam às escolas indígenas e aqueles criados ou adaptados especificamente para as escolas
indígenas e a presença de conselhos escolares e de unidades executoras nas escolas indígenas.
Fizemos a avaliação dessas metas partindo do entendimento que a autonomia
carrega em si um atributo político e outro pedagógico e que esses dois fatores associados é que
podem indicar o grau de autonomia da escola.
Assim, indagamos se as escolas indígenas haviam construído os seus PPPs e se
contavam com a participação da comunidade de forma a garantir que o projeto pedagógico
estivesse associado ao societário. Foi possível identificar que a maioria ainda não construiu tal
documento e naqueles estados onde se constata que o mesmo já foi elaborado, os professores
indígenas questionam os procedimentos efetuados.
Os programas de financiamento da educação que chegam às escolas indígenas com
o objetivo de favorecer a sua autonomia na verdade não cumprem com essa função, tendo em
vista seu formato desvinculado das realidades indígenas, em alguns caos ocorrendo vários
transtornos às comunidades.
As formas atuais de gerenciamento dos recursos e participação da comunidade na
vida escolar, como e o caso das Uex e dos Conselhos escolares, são modelos que precisam ser
repensados de modo a atender os objetivos e as necessidades das comunidades indígenas.
Assim, mesmo que a autonomia pedagógica e financeira esteja no discurso ou na
letra das normas administrativas publicadas pelos gestores públicos, a sua observância como
exercício prático é a ainda um desafio. Portanto, concluímos que as metas 8 e 11 estão em
desenvolvimento de modo insatisfatório.
83
Meta 9
Essa meta tem o prazo de 1 (um ano) e exige a participação da União. Para avaliá-la,
foi definido que a pesquisa deveria identificar se nos entes federativos havia: A) programas
governamentais para construção de escolas, e B) definição de critérios e regulamentação
específicos para construção de prédios escolares.
84
comunitários, igrejas, espaços externos às casas de professores e
de lideranças indígenas, entre outros. Em alguns lugares, têm
sido alugadas casas de moradores não índios, localizadas nas
proximidades das aldeias para realização das atividades
escolares (SECAD, MEC. 2007, p. 82)
O MEC tem apoiado a construção de escolas nas aldeias, mas o déficit revelado pela
demanda das comunidades indígenas por espaços escolares se mantém, apesar de ter crescido,
40
nos últimos anos, o número de projetos de construção de escolas.
40 Vide quadro em anexo os dados sobre construção de escolas no contextos do PAR INDIGENA.
85
precária, quando chove os alunos ficam molhados, os cadernos
ficam molhados.
Em São Paulo, a pesquisadora relata que,
O relatório de Alagoas revela uma situação bastante emblemática para todo o Brasil.
Primeiro a constatação de que o MEC ainda é o agente principal no financiamento de construção
de prédios escolares em terras indígenas e, portanto, revela ainda a incipiente iniciativa dos
estados em alocar recursos para essa finalidade.
41 Cf. Entrevista realizada na Escola Indígena Pajé Francisco Queiroz Suira. Porto Real do Colégio, 23 de fevereiro de 2010.
42 Cf. Entrevista realizada na Escola Indígena Pajé Miguel Selestino da Silva. Palmeira dos Índios, 21 de fevereiro de 2010.
86
são construções improvisadas, submetendo os alunos e seus
materiais escolares à água da chuva, pois muitas delas não têm
paredes, são abertas. Em algumas tem mesas e carteiras de tábua,
construídas pela comunidade como improviso. Outras são
desprovidas destes recursos. Há uma escola sem parede em que a
lousa fica pendurada num caibro e solta no ar.
87
Educação (quando houver), no Conselho de acompanhamento do
FUNDEF e Conselho de Alimentação Escolar;
3- A localização e projeto da escola definidos em comum acordo
com a comunidade indígena beneficiada.
A União tomou a iniciativa no sentido de adequar alguns programas à realidade dos
povos indígenas, mas em alguns estados os pesquisadores afirmam que
43 Relatório do Ceará. Cf. Escola Diferenciada de Educação Infantil Ensino Fundamental e Médio. Entrevista. Caucaia, 25 de fevereiro de 2010.
88
pré-definidos, desconectados das realidades ambientais e função
social atribuída pelo grupo, cabendo aos povos, no máximo, a
decisão sobre o local a ser construído e o tamanho.
89
Meta 10
90
Cachoeira existem experiências de Organizações Não
Governamentais de apoio com a criação de pequenas bibliotecas
comunitárias, que ainda vão atingir algumas comunidades.
Ainda não se tem equipamentos suficientes e nem material
didático apropriado e específico. E não há programa específico
45
para a Educação Escolar Indígena.
O que pode ser evidenciado nesses programas é que maioria atende somente
às escolas com um número de alunos acima daqueles que de fato existem nas escolas das
terras indígenas.
Como o objetivo dessa meta era criar um programa nacional de colaboração entre a
União e os Estados para, dentro de cinco anos, equipar as escolas indígenas com equipamento
didático-pedagógico básico, incluindo bibliotecas, videotecas e outros materiais de apoio e,
como foi observado, as escolas indígenas contam apenas com parcos recursos e não foi
instituído nenhum programa específico, e os programas preexistentes não dão conta da
demanda e realidade das comunidades indígenas considera-se que a meta esta em
desenvolvimento de modo insatisfatório.
91
Meta 12
Essa meta tem prazo imediato e trata do financiamento do MEC para secretarias de
educação e entidades da sociedade civil de apoio aos índios e sua execução é atribuição da
União. Essa meta, também está associada a outras metas que tratam de programas e projetos
financeiros para educação escolar indígena tais como as metas 05, 08 e 11. A pergunta básica
para averiguação do cumprimento desta meta foi sobre a existência de programas e projetos
para financiamento dessa modalidade de ensino.
92
Educação. Mesmo que o PDE venha promover uma eventual
melhoria qualitativa nos indicadores educacionais – e torcemos
para isso – pouca coisa do Plano encontra-se correlacionada às
metas do PNE, tornando-o mais uma vez limitador.
Para ter acesso ao PAR é necessário que os entes federados assinem o Termo de
Adesão ao Plano de Metas do PDE. O PAR se baseia na demanda apresentada pelos
estados/municípios e possibilita a ampliação dos recursos investidos para o desenvolvimento
da educação escolar para os povos indígenas.
Com os dados disponibilizados pelo MEC, é possível observar que a partir de 2007,
no contexto do PAR, a maioria dos estados passou a contar com recursos específicos para
desenvolver sua política. Dos recursos solicitados pelas secretarias de educação em Planos de
Trabalhos Anuais, preparados para convênios, o MEC tem para os anos 2008, 2009, 2010 e 2011,
empenhados o montante de R$ 116.204.804,43. Com exceção dos estados de Roraima, São Paulo
e Minas Gerias que até dezembro de 2007 não havia assinados os termos de compromissos, os
demais contarão com esses recursos para formação inicial e continuada de professores,
produção de materiais didáticos e construção de escolas.51
Em relação aos estados observou-se que apenas 4 (quatro) afirmaram dispor de uma
rubrica específica para tratar dessa modalidade de ensino. No geral, os pesquisadores
identificaram que os recursos que as Secretarias de Educação contam para desenvolver ações
com educação escolar indígena são aqueles destinados pelo MEC para assumir seu papel
supletivo na política de educação básica do país.
Assim, considerando que a meta teve como objetivo fortalecer e ampliar as linhas de
financiamento existentes no Ministério da Educação para implementação de programas de
educação escolar indígena, e que houve uma ampliação desses recursos por parte do MEC,
inclusive saindo de um modelo fragmentado dos Editais para um mais sistemático como do
PAR, mas que esse modelo ainda está em processo de implantação e que tem ocorrido uma
baixa execução orçamentária nos estados considera-se que a meta está em desenvolvimento de
modo insatisfatório.
93
Meta 13
Essa meta tem prazo imediato e, mesmo não indicando os entes responsáveis,
devemos interpretá-la como de responsabilidade da União e da esfera estadual. As questões que
nortearam as entrevistas procuraram entender se havia uma política definida, com diretrizes e
financiamento para produção de materiais didáticos específicos para as escolas indígenas.
Constatou-se que, no MEC, foi criada a CAPEMA – Comissão Nacional de Apoio à
Produção de Material Didático por meio da Portaria MEC/SECAD nº. 13, de 21 de julho de 2005,
no âmbito da Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena. A CAPEMA tem como objetivo
94
Reconhecimento da autoria coletiva, os saberes e as formas de
transmissão de conhecimento indígenas, considerando esses
saberes como ciência; divulga os conhecimentos tradicionais
indígenas, tendo como foco as escolas do entorno de seus territórios
e também a sociedade nacional e internacional; reconhece a
oralidade como forma privilegiada de expressão, apoiando
materiais didáticos em diferentes linguagens e suportes, tais como
vídeo, Cds, rádios, livros e outros (idem, p. 17).
Não obstante todas essas prerrogativas desde sua instituição, a CAPEMA foi
convocada poucas vezes pelo MEC, e além de avaliar propostas referentes a dois editais,
lançados no período, não avançou em nenhuma outra formulação, que pudesse apontar para a
formulação de uma política nacional de produção e publicação de materiais didáticos. A rede de
produção de materiais didáticos não foi constituída, nem foi formulada qualquer proposta para
implantação de um programa de bibliotecas específico para escolas indígenas.
Por sua vez, na maioria dos estados a consulta/avaliação mostrou que não há
programas criados especificamente para esse fim. Normalmente a produção de material
didático são ações isoladas e intermitentes, como pode ser identificado nas falas dos
pesquisadores.
95
Em Minas Gerais,
96
minação, a gente precisa ter material didático que dê subsídio
para que os professores não índios se apoderem das informações
de como se encontram hoje os povos indígenas, depois de 500
anos de contato, como é o caso do Nordeste. Então, para dar conta
disso é preciso criar materiais didáticos específicos, livros especí-
ficos, jogos paradidáticos que dêem conta dessa realidade (Repre-
sentante da COPIPE).
Meta 15
97
particularidades linguísticas e culturais das sociedades indígenas,
garantindo a esses professores os mesmos direitos atribuídos aos
demais do mesmo sistema de ensino, com níveis de remuneração
correspondente ao nível de qualificação profissional.
98
Quanto à criação da categoria de professor indígena e a realização
de concursos específicos, a realidade é mais complicada. Não
existe essa categoria de professor e até agora só foi realizado um
concurso específico, no ano de 2002. Em 2007, houve outro
concurso para professores de escolas indígenas, mas que foi
aberto em edital universal, ocasionando um problema com
professores não indígenas que passaram e depois buscaram
transferência para as escolas nas cidades. Os processos seletivos
para escolas indígenas são específicos.
O que se percebe é que mesmo com a publicação e a difusão das diretrizes nacionais,
esta meta não avançou. Pode-se observar que, passados quase dez anos do PNE, a maioria dos
estados não criou a categoria professor indígena, primeiro requisito para que a carreira do
magistério indígena fosse instituída.
No município de Aracruz, no Espírito Santo e nos estados do Tocantins e da Bahia
identificaram-se algumas iniciativas de regularização da situação dos professores indígenas,
mas são encontradas várias dificuldades, conforme aponta a pesquisadora daquele município,
Na Bahia,
99
magistério indígena. A construção deste projeto, segundo a
coordenadora da Educação Escolar Indígena da Secretaria de
Educação do Estado, foi iniciada no segundo semestre de 2007 e
discutida até o ano passado junto a outras Secretarias e instâncias
jurídicas do estado. Sendo assim, foram dois anos de discussões,
com a participação efetiva das associações do movimento social
dos índios no estado, e reformulações seguindo as orientações da
Procuradoria Geral do Estado até a elaboração do texto final do
projeto de lei ainda a ser votado pelos deputados baianos.
100
destituírem o professor. Além disso, a proposta de concurso público específico tem recebido
questionamento por outros setores da sociedade que alegam a sua inconstitucionalidade no que
se refere à especificidade do ato. A realização de concurso público seria uma garantia do não
favorecimento do Estado a determinadas pessoas; assim, todos devem ser tratados igualmente
pelo Estado, sem discriminações ou benefícios. Dito de outra forma, baseado no que diz a
Constituição brasileira, quando estipula que a participação em concursos públicos é direito de
qualquer pessoa habilitada para concorrer ao cargo proposto, o fato de fazer um concurso para
um grupo específico estaria infringindo a lei maior do país.
No parecer jurídico do Procurador Geral da FUNAI Dr. Luiz Fernando Villares e
52
Silva indagando se os requisitos para realização do concurso público para professor indígena
seriam “atentatórios ao princípio da igualdade” ou “uma discriminação contra os professores
não-índios”, o procurador chega à seguinte conclusão:
Meta 16
51 Parecer Nº 07/PGF/PG/FUNAI/06. Interessado: Coordenação Geral de Educação – CGE. Assunto: Concurso Específico para Professores
Indígenas - Brasília, 01 de fevereiro de 2006.
101
Essa meta tem prazo imediato de implantação sob o regime de colaboração entre
União, Estados e Municípios. Foram levantadas questões acerca da existência, número de
programas de formação inicial e continuada para professores indígenas e, ainda, se haveria
processo de avaliação desses programas.
Como dito anteriormente, o apoio financeiro do MEC aos estados e municípios se
dava via projetos específicos, por meio de editais do FNDE. A partir de 2007, os recursos
destinados à formação continuada de professores indígenas foram alocados dentro do Plano de
Ação Integrada – PAR Indígena. O MEC já investiu cerca de R$: 7.061.834,0053 nos programas de
formação continuada, por meio de convênios firmados com os Estados do Acre, Amazonas,
Amapá, Pará, Tocantins, Maranhão, Rondônia, Ceará, Pernambuco, Bahia, Sergipe, Alagoas,
Paraíba, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Segundo a representante do MEC/SECAD, muitos programas específicos foram
criados e mantidos com regularidade, com currículos próprios e aprovados pelos Conselhos
Estaduais de Educação.
Entretanto, no que se refere a um sistema de avaliação de tais programas, não foram
construídos indicadores com esse fim. A ação do MEC tem se restringido a reiterar a importância
da avaliação, a partir da mobilização para que ela seja realizada no âmbito de cada curso de
formação continuada. Além disso, Guimarães defende que a função de avaliação não pode ser do
órgão executivo, que teria atribuições de coordenação, mas sim construída com o INEP.
Em relação à formação inicial em magistério indígena, os únicos estados que não
apontaram se realizaram são Alagoas, Pernambuco, Sergipe e Bahia.
Nem todos os relatórios trazem o número de estudantes nesses cursos. Mas,
segundo Mattos e Monte (2006, p. 108-111), até 2005, havia na Região Nordeste 660 professores
em formação, no Sul 395, Sudeste 450, Centro Oeste 840 e no Norte 3005. Já com relação à
formação continuada, em São Paulo, a pesquisadora afirma,
53 Execução dos recursos do PAR indígena – 2007 e 2008 – Situação em setembro de 2009.
102
Entretanto, não se verifica no estado programas de formação
sistemática e contínua, assim como qualquer participação do
MEC nas propostas de formação de professores indígenas. A
demanda no estado por professores indígenas formados é bem
superior à quantidade de professores já habilitados.
103
Meta 18
Essa meta tem prazo de dois anos para usa execução, mas não tem identificado o
responsável por sua implementação. Porém, como a própria meta indica que os setores devem ser
criados nas Secretarias Estaduais de Educação, será analisada como responsabilidade do ente
federativo estado. A pergunta básica que foi feita para consulta em campo foi se haviam sido
criados setores específicos para tratar dessa modalidade de ensino e se eles tinham condições
objetivas para seu funcionamento.
Todos os estados entenderam a importância da criação de um setor específico para
tratar da temática, como o exemplo do Rio Grande do Sul que, segundo a pesquisadora,
Foi criada a Seção de Educação Escolar Indígena, órgão responsável pela gestão da
educação escolar indígena no âmbito do Estado e pela proposição de diretrizes educacionais e pela
implementação de uma escola que contemple os princípios de especificidade, diferença,
interculturalidade e bilingüismo. Com relação ao orçamento e a capacidade operacional de realizá-
lo, a Seção de Educação indígena possui um Plano de Trabalho específico com financiamento do
FNDE e FUNDEB. Todas as ações são executadas pela Seção juntamente com as Coordenadorias
Regionais (CREs). O que também pode ser verificado no quadro que segue:
NORTE AC AM AP PA RO RR TO
Núcleo Estadual de sim sim ?
Educação Escolar Indígena
Divisão de Educação Escolar sim
Indígena na Secretaria
Estadual de Educação
Coordenação Estadual de sim ?
Educação Escolar Indígena
Gerência de Educação Estadual e ?
Escolar Indígena Municipal
Setor Indígena na secretaria Manicoré; ?
municipal Benjamim
Constant;
Tabatinga;
Barcelos;
Autazes.
Setor Indígena na secretaria Sim ?
estadual
Secretaria de Assuntos Atalaia do ?
Indígenas Norte
NORDESTE AL BA CE MA PB PE SE
Núcleo Estadual de 104
sim ? ?
Educação Escolar Indígena
Coordenação Estadual de Sim ? ?
Autazes.
Setor Indígena na secretaria Sim ?
estadual
Secretaria de Assuntos Atalaia do ?
Indígenas Norte
NORDESTE AL BA CE MA PB PE SE
Núcleo Estadual de sim ? ?
Educação Escolar Indígena
Coordenação Estadual de Sim ? ?
Educação Escolar Indígena
Gerência de Educação sim ? ?
Escolar Indígena
Supervisão de Educação sim ? ?
Escolar Indígena
Núcleo de Educação e ? ? sim
Diversidade e Cidadania
SUDESTE ES MG RJ SP
Núcleo Estadual de sim
Educação Escolar Indígena
Temática especial da SEED Sim
Setor Indígena na secretaria sim
estadual
Assessoria de Educação sim
Indígena da SEED
SUL PR RS SC
Coordenação Estadual de sim ??? ???
Educação Escolar Indígena
CENTRO OESTE GO MS MT
Núcleo Estadual de sim Sim
Educação Escolar Indígena
Gerência de Educação sim
Escolar Indígena
105
56
No Amapá, região Norte do país , a pesquisadora mostra que
106
Nós temos um Núcleo de Educação Indígena; ele faz parte da
estrutura da Secretaria, está dentro do organograma e é este
núcleo que é responsável pelo trabalho, pelo atendimento [...]
agora não só o Núcleo, porque ele é apenas o apoio, mas também
todas as gerências de ensino de 1º e 2º grau e do EJA. Fazem
atendimento porque é uma educação indígena, e também é uma
escola que faz parte do sistema.
O Parecer nº. 14/99 do CNE indica que, para a educação escolar indígena ser
viabilizada no âmbito de ensino estadual, faz-se necessário:
107
indicadas pela Secretária. Quem entende das questões indígenas
são os indígenas
Portanto, como a meta tinha por objetivo, criar e fortalecer e setores responsáveis pela educação
escolar indígena, no sentido de garantir a educação escolar especifica diferenciada e intercultural
para os povos indígenas, e verificou-se que esses setores, apesar de criados, estão bem fragilizados,
considera-se, pois, que a meta está em desenvolvimento de modo insatisfatório.
Meta 19
Essa meta tem prazo de 1 (um) ano para implantação e não há na lei do PNE
definição de quem é a responsabilidade. Em campo, procurou-se identificar se havia
Referenciais para formação profissional estabelecidos pelos entes federados e se havia cursos
em nível médio sendo desenvolvidos.
A educação profissional, ou melhor, a Educação Tecnológica e Formação de
Professores é uma modalidade de ensino no PNE, por isso, tem seu próprio diagnóstico, metas,
diretrizes e objetivos próprios.
Em 2006, o MEC criou um grupo de trabalho institucional com representação
indígena para discutir o Ensino Médio Integrado à formação profissional regular ou Educação
de Jovens e Adultos - EJA.
Em setembro de 2007, o MEC, por meio da Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade (SECAD), e da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
108
(SETEC), publicou um documento base do Programa Nacional de Integração da Educação
Profissional com a Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos - Educação
Profissional e Tecnológica Integrada à Educação Escolar Indígena - PROEJA Indígena.
O documento apresenta, enquanto diretriz do Programa, “a oferta de uma formação
integral que prepare para o exercício profissional indígena na comunidade indígena” (2007,
p.16). Além disso, o documento explicita que os cursos de educação profissional e tecnológicos
integrados à educação escolar indígena precisam ser formulados considerando-se as diversas
realidades. Nesse sentido, poderão compreender os seguintes níveis da educação: (i) inicial e
continuada; (ii) técnica de nível médio e (iii) tecnológica de graduação e pós–graduação.
O PROEJA Indígena tem como objetivo a formação profissional em consonância
com os contextos, significados e necessidades indígenas e tem como diretriz a oferta de uma
formação integral, que prepare para o exercício profissional indígena na sua comunidade
57
(PROEJA, SECAD\MEC, p.21).
O PROEJA é desenvolvido no contexto do Programa Brasil Profissionalizado, que
foi criado em 2007 e propõe a modernização e a expansão das redes públicas de ensino médio
integradas à educação profissional. No que se refere aos índios esse programa deve seguir os
princípios estabelecidos em âmbito nacional para essa modalidade de ensino.
Os recursos destinados a este programa ultrapassam os R$ 500 milhões e devem ser
empregados em obras de infraestrutura, desenvolvimento de gestão, práticas pedagógicas e
formação de professores. A perspectiva é que, até 2011, o programa invista recursos na ordem
de R$ 900 milhões aos estados e municípios que ofertam educação profissional no país.
A representante da SECAD informa que o programa
109
Há também uma proposta de oferta de Ensino Médio Profissional para o povo
Xacriabá, que aguarda resposta do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Minas
Gerais - IEFET.
Em Santa Catarina, os alunos Guarani também têm Ensino Médio
Profissionalizante. No Mato Grosso do Sul, a escola Ivy´Poty, no município de Caarapó, com
cursos voltados à auto-sustentação e ao uso da terra de forma equilibrada.
No estado do Rio Grande do Sul a pesquisadora informa que não há oferta de ensino
médio em nenhuma das escolas indígenas, acrescentando que depois que os estudantes
concluem o ensino fundamental eles se inserem “na rede regular”.
Os dados de 2008 do INEP, mostram que há 1.367 matrículas na Educação
Profissional (2009 p. 17)59, concentradas na região norte. E que “naqueles lugares onde existe a
preferência são na área de saúde, mas não se percebe o mesmo empenho para a diversificação de
outros conhecimentos profissionalizantes”, segundo ainda esse órgão de pesquisa, em 2008,
havia 1.571 alunos matriculados em cursos profissionais.
Assim, no que se refere à União, mesmo começando com atraso, e considerando
apenas o aspecto do financiamento e seu papel de elaborar diretrizes, via Institutos Federais de
Educação Tecnológica percebe-se algumas iniciativas sendo realizadas. Já com relação à
maioria dos estados, não acontece o mesmo. Dos 25 consultados, apenas 05 (cinco) apresentam
algum tipo de experiência com ensino médio profissionalizante e informam que o processo se
deu em consonância com as demandas da comunidade; os demais não tomaram nenhuma
iniciativa, mesmo havendo demandas nesse aspecto da política educacional.
Assim considerando as iniciativas do MEC e as poucas iniciativas dos estados
avalia-se que a meta está em desenvolvimento de modo insatisfatório.
59 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira – INEP - Diretoria de Estatísticas Educacionais – Um olhar sobre a educação
Indígena com base no Censo escolar de 2008. Estudo realizado a partir dos resultados do Censo Escolar da Educação Básica. Brasília 2009.
110
Meta 20
111
Essa meta teve como objetivo promover, com a colaboração entre a União, os
Estados e Municípios e em parceria com instituições de ensino superior, a produção de
programas de formação de professores de educação a distância de nível fundamental e médio,
como foi constatado pelos pesquisadores/avaliadores não foram elaboradas diretrizes em EAD
para formação à distância de professores indígenas, e também não se verificou programas
desenvolvidos para professores indígenas. Além disso, constata-se a inadequação de se
desenvolver processos de EAD em comunidades indígenas. Conclui-se, portanto, que a meta
não teve início.
Meta 21
Essa meta tem prazo imediato, entretanto, não há definição dos entes federados
responsáveis por sua execução. As atividades que se relacionam com o cumprimento desta
meta, no que se referem às ações do governo federal, segundo Guimaraẽs60, foram realizadas a
partir de programas já existentes no âmbito do Ministério da Educação, a exemplo do TV
Escola, que produziu e veiculou programas sobre os índios do Brasil.
A própria criação da Lei 11.645, em 2009, mesmo fora do prazo estabelecido na meta,
significou uma iniciativa importante no sentido de promover a disseminação de informações e
combater o preconceito e o desconhecimento em relação às populações indígenas.
112
Para a implementação dessa lei o MEC:
•Lançou edital para produzir material para as escolas do ensino
fundamental e médio;
•Criou uma rede de educação para a diversidade, em parceria
com a Universidade Aberta do Brasil, com ofertas de cursos sobre
as temáticas da diversidade para professores e técnicos das redes
de ensino. Um desses cursos, com duração de duzentas e quarenta
horas, é voltado para implementação da Lei 11.645.
Já nos estados, as poucas medidas tomadas pelas Secretarias de Educação são ações
isoladas, ou mesmo inexistentes, sem fazer parte de um programa com essa intenção, como
exigia a meta do PNE. Isso pode ser observado nos trechos dos relatórios que seguem.
Em Minas Gerais,
Segundo a SEE-MG, essa é uma responsabilidade do setor, em
cumprimento da Lei Nº 11.645, de 10 de março de 2008, mas não
apontou ações efetivas realizadas pelo setor.
Ou ainda no Acre,
113
Conclusão
A Avaliação Independente de Cumprimento dos Objetivos e Metas do capítulo da
Educação Indígena do Plano Nacional de Educação – PNE foi realizada em todo Brasil, com
exceção dos estados da federação em que os povos indígenas ainda não foram reconhecidos
oficialmente pela FUNAI (Piauí e Rio Grande do Norte). Como resultados desse trabalho, foram
gerados 27 (vinte e sete) relatórios, que deram base para sistematização desse documento final.
A consulta mostrou que as escolas indígenas estão majoritariamente sob
responsabilidade da administração municipal, mesmo que o CNE tenha conferido tal tarefa
institucional às Secretarias Estaduais de Educação. A maioria dos municípios que tem escolas
indígenas sob a sua jurisdição não dispõem das condições exigidas para assumir essa
atribuição. Quando as escolas indígenas estão situadas nos municípios, existe uma maior
dificuldade para que as políticas sejam executadas de acordo com as diretrizes nacionais, assim
como o acompanhamento/monitoramento dessa política.
Na maioria dos estados, não há termos de compartilhamento de responsabilidades;
tomando-se por base a autonomia federativa, cada município e/ou estado segue ou não as
diretrizes e princípios da política nacional.
Considerando as demandas específicas da educação escolar indígena, o MEC
aumentou significativamente os recursos destinados ao apoio para os estados e municípios para
essa modalidade de ensino. Muitos estados, porém, não tem mostrado capacidade operacional
para empregar tais recursos na melhoria da educação escolar indígena, e uma parcela
significativa de recursos financeiros empenhados, são devolvidos sem serem gastos. Outros
estados, onde a gestão pública tem uma orientação política partidária diferente a da União, não
houve adesão a convênios, inclusive financeiros, estando excluídos de acessar tais recursos.
Como os estados e municípios não têm orçamento específico para educação escolar indígena, o
financiamento dessa modalidade fica submetido aos parcos recursos preexistente nos estados
para a educação em geral.
114
Os estados têm mostrado muitas dificuldades em desenvolver normas específicas
para a educação escolar indígena. Em alguns estados, mesmo tendo sido criada oficialmente a
categoria de escola indígena, estas não estão regularizadas pelos CEE e, na maioria destes, não
foram criados critérios específicos para seu reconhecimento e regularização. Os indígenas que
assumem o papel de professores em suas comunidades também não gozam de direitos
específicos porque sua carreira ainda não é reconhecida oficialmente.
Os currículos, Projetos Políticos Pedagógicos, calendários, modelos de gestão
específicos, ou seja, os elementos que caracterizam uma escola indígena, quando existem,
elaborados com apoio de técnicos das SEDUCs e/ou Organizações Não Governamentais - não
são reconhecidos pelos Conselhos Estaduais de Educação, que colocam as mesmas exigências
das escolas dos não índios. A interculturalidade de saberes, que deveria nortear a elaboração
curricular, parece ser entendida apenas como a introdução de alguns conhecimentos dos
indígenas dentro do contexto dos chamados “saberes universais escolares”.
Os Setores Específicos criados nas Secretarias de Educação, mesmo aqueles que têm
indígenas na direção, são fragilizados, têm poderes limitados e não possuem orçamento próprio
para desenvolver a política com a qualidade necessária. Esta situação é agravada pela
inexistência de processos contínuos de formação para os técnicos das Secretarias para
compreensão e tratamento da temática.
O atendimento da primeira etapa do ensino fundamental cresceu como assim o foi
o o
para a população brasileira, mas ainda não está resolvida a situação do 6 O 9 ano e do Ensino
Médio, o que significa que jovens continuam saindo de suas aldeias para estudar nas cidades
próximas, trazendo todas as consequências negativas, tantas vezes denunciadas pelas
lideranças do movimento indígena no Brasil.
Se considerarmos que os índios praticamente não tinham acesso +a universidade
pública, nos últimos dez houve investimento e essa realidade começa a melhorar, já que em
vários estados foram criados cursos específicos para formação de professores indígenas, sendo
que essa área foi a que mais contou com investimentos governamentais. Entretanto, as
condições em que esses cursos funcionam precisam ser revistas, exigindo que as próprias
estruturas dessas instituições de ensino possam ser readequadas à diversidade de situações dos
povos indígenas.
Constatou-se que o desenvolvimento da política de educação escolar indígena nos
estados e municípios encontra-se em situação muito diversa, confirmando que as diretrizes e
princípios ainda não direcionam as políticas, mas dependem das vontades dos governos e da
mobilização indígena, ou seja, a educação escolar indígena com suas diretrizes e princípios
ainda não é uma política do Estado brasileiro.
As metas do PNE estão elaboradas com objetivo de “universalização” e enfrentam
grandes problemas na sua execução. Seguindo o modelo da educação brasileira, para educação da
população nacional, tais metas não consideraram os desafios da educação escolar indígena, a
história e realidade dos povos indígenas. As metas também não levaram em conta a necessidade
de preparação da administração pública brasileira para lidar com as especificidades desses povos.
115
Mas, de uma forma geral, pode-se dizer que a educação escolar indígena, com seus
princípios e diretrizes, não é de todo desconhecida, como acontecia há dez anos. Porém, não se
pode dizer que isso é uma responsabilidade do PNE, já que suas metas e objetivos reproduzem
grande parte dos documentos já publicados nos anos anteriores.
Em 2009 foi realizada a primeira Conferência Nacional de Educação Escolar
Indígena – I CONEEI. Nela, além de fazer um diagnóstico da situação em que se encontrava a
educação escolar indígena no Brasil, foi possível identificar quais a expectativas que
representantes indígenas, indigenistas e gestores públicos têm para a educação escolar para os
próximos anos.
Então, nos parece fundamental que, para elaborar o novo Plano, além de considerar
a avaliação que vem sendo feita nos Estados pelos próprios índios e esta, realizada pela
Rede de Avaliadores/Fundação AJURI, deva-se levar em conta os resultados da I CONEEI, de
modo a aproximar-se do desejo e expectativas dos representantes indígenas para com sua
educação escolar.
Em uma leitura apurada das propostas da I CONEEI percebe-se a necessidade do
Estado brasileiro, na sua máquina administrativa, tomar medidas para que possa se reorganizar
levando em consideração o pluralismo cultural inerente à população brasileira. Não apenas
reconhecer a diferença como princípio para desenvolvimento da política, mas também para
mudar as estruturas onde elas são executadas. Por isso a importância de, dentro da discussão
realizada hoje no Brasil acerca da criação de um sistema nacional de educação, também se possa
criar um Sistema Próprio para desenvolver a educação escolar indígena no país.
116
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