905-Texto Do Artigo-4156-4191-10-20210806

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RELATO DE EXPERIÊNCIA

DOI: https://doi.org/10.24933/horizontes.v39i1.905

Um relato de experiência sobre a aplicação de duas estratégias de ensino para tratar da ética
no serviço público brasileiro no município de São Francisco do Conde

Adelmaria Ione dos Santos1


Jacqueline Silva da Silva2

Resumo
Apresenta a experiência realizada em sala de aula com a aplicação de duas estratégias de ensino: aula expositiva
dialogada e Phillips 66 no processo de ensino e de aprendizado sobre ética no serviço público. A aplicação ocorreu
com servidores que ocupam a função de assistentes de classe, vinculados a uma Secretaria municipal de um
município baiano. Os resultados revelaram que as duas estratégias corroboraram para tornar as aulas mais
dinâmicas, desconstruindo o tradicional monólogo na relação professor – aluno. O estudo conclui que a estratégia
da aula expositiva traz desafios para os docentes, sendo recomendada em disciplinas de 40 ou 60 horas. Já a
Phillips 66 é adequada para resgatar pontos de um tema debatido como também revelar possíveis lacunas no
processo de aprendizagem.
Palavras-chave: Relato de Experiência; Estratégia de Ensino; Ética no Serviço Público.

An experience report on the application of two teaching strategies to address ethics in the Brazilian public
service in the municipality of São Francisco do Conde

Abstract
It presents the classroom experience with the application of two teaching strategies: dialogued lecture and Phillips
66 in the teaching and learning process on ethics in the public service. The application occurred with servers that
occupy the function of Class Assistants, linked to a municipal Secretariat of a city of Bahia. The results revealed
that both strategies collaborated to make the classes dynamic, deconstructing the traditional monologue in the
teacher - student relationship. The study concludes that the lecture strategy presents challenges for teachers,
being recommended in subjects of 40 or 60 hours. Phillips 66 is well suited to redeem points from a debated topic
as well as revealing possible gaps in the learning process.
Keywords: Experience Report; Teaching Strategy; Ethics in the Public Service.

Introdução

Trata-se de um relato de experiência que foi elaborado a partir do curso de formação


sobre ética no serviço público, ministrado para servidores públicos municipais, lotados na
Secretaria de Educação do município de São Francisco do Conde, no Estado da Bahia. O

1
Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), São Francisco do Conde, Bahia. E-
mail: [email protected].
2
Universidade do Vale do Taquari (UNIVATES), Lajeado, Rio Grande do Sul. E-mail: [email protected].

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referido curso está inserido no programa de capacitação para servidores, ofertado pela Escola
de Governo, vinculada à Secretaria de Gestão Administrativa do município. O curso apresenta
carga horária de 24 horas e ocorreu no mês de março de 2018 aos servidores que trabalham
como assistente de classe do ensino fundamental. Este teve por objetivo discutir acerca dos
conceitos de ética na atividade profissional, considerando a dimensão ética como pressuposto
fundamental para ofertar, ao cidadão, um serviço público garantidor do bem-estar de direito
social. A partir dos objetivos propostos, os conteúdos ministrados abordaram, de modo geral,
aspectos conceituais da ética, sob uma ótica filosófica e normativa. Para a abordagem dessas
temáticas, utilizamos as seguintes estratégias de ensino: aula expositiva dialogada e Phillips 66.
Para atingirmos aos objetivos deste relato de experiência realizamos uma primeira discussão
sobre as estratégias de ensino encontradas na literatura, lastrando a discussão com base em
alguns dos principais autores do tema. No segundo momento, descrevemos a metodologia e os
resultados da experiência na aplicação das duas estratégias de ensino escolhidas e, por último,
finalizamos o artigo com as principais considerações.

As estratégias de ensino no fazer docente

É importante ter em mente que o momento histórico atual conhecido como pós-
modernidade tem como principal característica a crítica à modernidade; às ideias tradicionais
deixaram de ser referências e as verdades passaram a ser questionadas. Na pós-modernidade,
o ambiente é dinâmico, complexo e cheio de incertezas. Nela, surgem novas propostas como a
valorização da subjetividade, do multiculturalismo e da pluralidade (BAUMAN, 2002).
Nas instituições de ensino, a mudança principal ocorre na relação professor/aluno, na
qual este último passou a ser reconhecido como sujeito no processo de ensino e aprendizagem
porque, de acordo com Anastasiou e Alves (2004),eles chegam às salas de aula, trazendo toda
uma bagagem de conhecimentos oriundas de suas caminhadas pelo mundo da vida, não
cabendo mais ao professor desconsiderá-las por completo, ensinando-os como se fazia no
modelo tradicional de ensino com foco apenas na transmissão de conhecimento, pois,
conforme os autores citados acima, o aprendizado deixou de ser um processo de memorização
de informação para transformar-se num processo de construção de saberes, tendo como ponto

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de partida a realidade do aprendiz.


Apesar de realidades diversas, muitos dos aprendizes que frequentam as salas de aulas
contemporâneas estão imersos numa sociedade da informação ou numa sociedade do
conhecimento, na qual as tecnologias eletrônicas e informacionais parecem possuir grandes
significados em suas vidas (MORAN, 2012). Assim, esse cenário traz enormes desafios para
todos os atores que estão inseridos no campo educacional. Aos coordenadores pedagógicos,
por exemplo, cabe o desafio de pensarem em técnicas pedagógicas que contemplem os novos
dispositivos eletrônicos; aos professores, por sua vez, é preciso incorporar novas estratégias de
ensino que levem em consideração as potencialidades das tecnologias eletrônicas. Enfim, esse
cenário, como nos propõe Anastasiou e Alves (2004), deve ser pensado desde o projeto político
e pedagógico das escolas até o processo de ensinagem.
Nesse sentido, diante de um cenário marcado por constantes transformações
tecnológicas, os professores precisam pensar constantemente em como tornar os conteúdos
trabalhados em sala de aula mais claros, objetivos e atrativos para os seus alunos, e é
justamente nesse contexto que a temática sobre as estratégias de ensino parece ganhar grande
relevância na prática docente. Entretanto, como bem enfatizam Anastasiou e Alves (2004), a
prática docente e suas estratégias de ensino não podem estar desarticuladas do projeto
político e pedagógico da escola, da organização curricular, dos objetivos interdisciplinares da
instituição (módulos, ações, eixos, problemas, projetos etc.) para não correrem o risco de
fracassar, justamente por não levarem em consideração o conjunto de elementos que
fortalecem o trabalho docente.
Quando nos deparamos com o termo “estratégia” logo pensamos em caminhos, passos,
percursos que poderão ser pensados e efetivados para atingirmos determinados objetivos
previamente estabelecidos. No âmbito comercial, a palavra estratégia está relacionada, de
modo geral, aos caminhos traçados pelas empresas e demais atores comerciais para
aumentarem a lucratividade dos negócios. Já no âmbito militar, a palavra estratégia pode ser
pensada como meios utilizados por uma nação, no sentido mais amplo do termo, para vencer
guerras e impor sua cultura e seus hábitos às nações vencidas. E no ensino, o que significa
estratégia?
A estratégia de ensino, de acordo com Anastasiou e Alves (2004), pode ser entendida

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como a arte de aplicar ou explorar os meios e condições favoráveis e disponíveis, visando a


efetivação da ensinagem. Para os autores referenciados, é importante atrelar a escolha da
estratégia ao objetivo que se pretende alcançar com o processo de ensinagem. Uma espécie de
contrato deve ser firmando entre os sujeitos envolvidos.

Segundo Anastasiou, através das estratégias aplicamos ou exploramos meios,


modos, jeitos, formas de evidenciar o pensamento, portanto, respeitando às
condições favoráveis para se executar ou fazer algo. Esses meios ou formas
comportam determinadas dinâmicas, devendo considerar o movimento e as
forças, e o organismo em atividade. Por isso, o conhecimento do aluno pelo
professor e seu crescente autoconhecimento é essencial para a escolha e a
efetivação da estratégia, com seu modo de ser, agir, estar e sua dinâmica
pessoal (ANASTASIOU; ALVES, 2004, p. 63).

Na citação acima é possível perceber, que o estabelecimento de uma estratégia de


ensino precisa levar em conta a realidade nas quais os alunos estejam inseridos. Assim, uma
estratégia de ensino pensada para um grupo de crianças pode não ter o mesmo efeito, por
exemplo, quando aplicada para um grupo de adolescentes ou mesmo para um grupo de
adultos, assim como uma estratégia de ensino pensada para um grupo de alunos da zona rural
pode não ter a mesma recepção em um grupo de alunos da zona urbana, isto é, antes de se
pensar em uma estratégia de ensino, o professor precisa conhecer muito bem o perfil dos seus
alunos.
Para além do conhecimento do perfil dos alunos, os professores também precisam ser
coerentes consigo mesmos, já que além de terem que conhecer as potencialidades e as
limitações de cada uma das estratégias para assim escolherem aquela que melhor se adeque à
realidade dos seus alunos, eles também devem possuir um conhecimento acumulado sobre
determinada temática para optarem pela melhor estratégia, que lhes permita dar maior brilho
ao seu saber acumulado. É nesse sentido, que Anastasiou e Alves (2004), na citação anterior,
chamam à atenção para a necessidade do autoconhecimento do professor.
Observa-se que a literatura registra uma série de estratégias que podem ser utilizadas
pelos professores para tornar o processo de ensino e aprendizagem mais eficaz para os seus
alunos. A aula expositiva dialogada, por exemplo, é uma estratégia na qual o professor expõe o
conteúdo, promovendo uma participação mais ativa dos seus alunos. A estratégia do estudo

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dirigido consiste numa proposta de promover o estudo sob a orientação de um professor para
sanar dificuldades específicas. Já a estratégia do estudo de texto consiste na exploração das
principais ideias de um autor a partir do estudo crítico de um texto. Por sua vez, a estratégia de
ensino e pesquisa busca instigar o aluno para a prática da pesquisa, da curiosidade,
provocando-o para que ele não seja apenas um reprodutor de conhecimentos, mas que gere
novas interpretações sobre a realidade.
As estratégias supracitadas são apenas um pequeno recorte das variadas possibilidades
de ensinagem que um professor pode utilizar para abordar o conteúdo didático em sala de
aula. Anastasiou e Alves (2004), por exemplo, trazem um universo de 20 (vinte) estratégias de
ensino que podem subsidiar os professores em seu fazer didático, sendo que a escolha delas
depende muito das habilidades que o docente quer desenvolver em seus alunos. No quadro a
seguir, apresentamos uma síntese conceitual de cada uma das estratégias de ensino
encontradas na literatura.

Quadro 1 – Definição das Estratégias de Ensino


Estratégia Descrição Descrição
Consiste numa exposição do conteúdo com a participação ativa dos estudantes,
Aula expositiva
cujo conhecimento prévio deve ser considerado e pode ser tomado como ponto
Dialogada
de partida.
Consiste na exploração de ideias de um autor a partir do estudo crítico de um
Estudo de texto
texto e/ou a busca de informações e exploração de ideias dos autores estudados.
Consiste na identificação e a construção de registro, análise, seleção e reflexão
das produções mais significativas ou identificação dos maiores
Portfólio
desafios/dificuldades em relação ao objeto de estudo, assim como das formas
encontradas para superação.
Tempestade Consiste numa possibilidade de estimular a geração de novas ideias de forma
cerebral espontânea e natural, deixando funcionar a imaginação.
Consiste na construção de um diagrama que indica a relação de conceitos em uma
Mapa conceitual perspectiva bidimensional, procurando mostrar as relações hierárquicas entre os
conceitos pertinentes à estrutura do conteúdo.
Consiste no ato de estudar sob a orientação e diretividade do professor, visando
Estudo dirigido sanar dificuldades específicas. É preciso ter claro: o que é a sessão, para que e
como é preparada.
Lista de discussão Consiste na oportunidade de um grupo de pessoas poder debater, à distância, um
por meios tema sobre o qual sejam especialistas ou tenham realizado um estudo prévio, ou
informatizados queiram aprofundá-lo por meio eletrônico.

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Consiste no enfrentamento de uma situação nova, exigindo pensamento


Solução de reflexivo, crítico e criativo a partir dos dados expressos na descrição do problema;
problemas demanda a aplicação de princípios, leis que podem ou não ser expressas em
fórmulas matemáticas.
Consiste numa atividade grupal em que são feitas uma análise e uma discussão
Phillips 66
sobre temas / problemas do contexto dos estudantes.
Grupo de
Consiste na análise de tema/problemas sob a coordenação do professor, que
verbalização e de
divide os estudantes em dois grupos: um de verbalização (GV) e outro de
observação
observação (GO).
(GV/GO)
Dramatização Consiste numa apresentação teatral, a partir de um foco, problema, tema etc.
Consiste num espaço em que as ideias devem germinar ou ser semeadas.
Seminário Portanto, espaço, no qual um grupo discuta ou debata temas ou problemas que
são colocados em discussão.
Consiste na análise minuciosa e objetiva de uma situação real que necessita ser
Estudo de caso
investigada e é desafiadora para os envolvidos.
Consiste na simulação de um júri em que, a partir de um problema, são
Júri simulado
apresentados argumentos de defesa e de acusação.
Consiste na reunião de palestras e preleções breves apresentadas por várias
pessoas (duas a cinco) sobre um assunto ou sobre diversos aspectos de um
Simpósio assunto. Possibilita o desenvolvimento de habilidades sociais, de investigação,
amplia experiências sobre um conteúdo específico, desenvolve habilidades de
estabelecer relações.
Consiste na discussão informal de um grupo de estudantes, indicados pelo
professor (que já estudaram a matéria em análise, interessados ou afetados pelo
Painel
problema em questão), em que apresentam pontos de vista antagônicos na
presença de outros.
Consiste num espaço do tipo “reunião”, no qual todos os membros do grupo têm
Fórum
a oportunidade de participar do debate de um tema ou problema determinado.
Oficina Consiste na reunião de um pequeno número de pessoas com interesses comuns,
(laboratório ou a fim de estudar e trabalhar para o conhecimento ou aprofundamento de um
worshop). tema, sob orientação de um especialista.
Consiste num estudo direto do contexto natural e social, no qual o estudante se
Estudo do meio
insere, visando a uma determinada problemática de forma interdisciplinar.
Consiste na utilização dos princípios do ensino associados aos da pesquisa:
Concepção de conhecimento e ciência em que a dúvida e a crítica sejam
Ensino com
elementos fundamentais; assumir o estudo como situação construtiva e
pesquisa
significativa, com concentração e autonomia crescente; fazer a passagem da
simples reprodução para um equilíbrio entre reprodução e análise.
Fonte: Anastasiou e Alves (2004)

A partir da análise do quadro acima, o leitor pode imaginar as possibilidades e as


limitações de cada uma das estratégias de ensino, pensando em como aplicá-las no seu cotidiano
escolar. O quadro evidencia, ainda, as interações entre as estratégias que poderão ser adaptadas,
modificadas ou mesmo combinadas pelo docente, conforme julgar conveniente ou necessário.

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A estratégia escolhida para ministrar o curso sobre ética no serviço público com
servidores municipais da cidade de São Francisco do Conde, no recôncavo da Bahia, recaiu
sobre a aula expositiva dialogada e Phillips 66.
A aula expositiva dialogada surge como uma alternativa ao modelo tradicional da
educação bancária, denunciada por Paulo Freire, na qual o professor deposita o conhecimento
no aluno que o recebe passivamente. Dessa forma, a aula expositiva dialogada

[...] é uma estratégia que vem sendo proposta para superar a tradicional
palestra docente. Há grandes diferenças entre elas, sendo que a principal é a
participação do estudante que terão as suas observações consideradas,
analisadas e respeitadas, independentemente da procedência e da pertinência
das mesmas. O clima de cordialidade, parceria, respeito e troca são essenciais
(ANASTASIOU; ALVES, 2009, p.86).

Como revela a citação acima, o diálogo entre professor e aluno torna-se fundamental no
processo de ensino e aprendizagem dentro da sala de aula. Nessa concepção, o professor deixa
de ser apenas um transmissor de conhecimento, aquele que possui a maior autoridade
epistêmica dentro da sala, para transformar-se num sujeito libertador, questionador, indagador
que permita construir conhecimentos a partir da realidade dos seus alunos e, nesse processo,
os alunos passam a ser os principais protagonistas na construção de novos conhecimentos.
Já a estratégia de ensino denominada Phillips 66 tem por objetivo provocar a
participação de todos os alunos na discussão de um determinado tema trabalho pelo professor
em sala de aula. É uma estratégia recomendada para ser aplicada em turmas numerosas, uma
vez que permite o agrupamento de estudantes em número de 6 (seis) que, num intervalo de 6
(seis) minutos e, por isso 66, deverão apresentar uma síntese sobre determinado tema
trabalhado em sala de aula.
A referida estratégia é um excelente instrumento na consecução do levantamento de
opiniões e apreciação de problemas de natureza social, política, educacional e cultural, sendo
utilizada tanto para os momentos de mobilização, quanto para a elaboração de sínteses. A
Phillips 66 possibilita um ótimo feedback ao professor sobre a aquisição de conhecimentos do
tema trabalhado em sala, como também permite ao mesmo catalogar as possíveis dúvidas
ainda existentes nos alunos sobre o assunto discutido em sala.

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De acordo com Anastasiou e Alves (2004), a objetividade é bastante estimulada nessa


estratégia pela sua forma de organização que toma por base o número 6 (seis): 6 (seis)
participantes, 6 (seis) minutos para discussão e 6 (seis)minutos para a socialização. Como o
tempo é distribuído entre os grupos, o professor e os próprios estudantes conseguem formular
uma visão global dos avanços e dificuldades da classe. Aspectos atitudinais são sempre objeto
de avaliação nas atividades grupais e podem ser estimulados e implementados gradativamente
ao longo do trabalho escolar.

Da teoria à prática: vivenciando o fazer docente a partir da inserção das estratégias de ensino
em uma sala de aula

Este relato de experiência discorre sobre a utilização de duas estratégias de ensino


aplicadas em uma turma de 36 servidores municipais que participaram do curso de capacitação
sobre ética no serviço público, ofertado pela Escola de Governo no município de São Francisco
do Conde, no Estado da Bahia. O curso teve duração de 24 horas e foi desenvolvido no período
de 6 a 13 março de 2018. Para o desenvolvimento do curso foram utilizadas as seguintes
estratégias de ensino: aula expositiva dialogada e Phillips 66. Estas estratégias foram
escolhidas, levando-se em consideração o tempo para a realização do trabalho, o público-alvo,
as estruturas disponíveis e os objetivos que pretendíamos alcançar.
Nesse sentido, o trabalho foi planejado e desenvolvido em três momentos. No primeiro,
momento tínhamos como objetivo promover uma integração da turma. A ideia foi criar um
ambiente de entrosamento e descontração e, para isso, utilizamos a dinâmica de grupo
conhecida pelo nome de “quebra-gelo” ou “apresentação”. No decorrer de boa parte do curso,
adotamos a estratégia da aula expositiva dialogada e, na parte final do curso, adotamos a
estratégia de ensino Philips 66 para fazermos uma síntese do que foi discutido em todo o curso,
bem como percebermos as lacunas na abordagem do tema.
Tudo começou quando convidamos os alunos para reorganizar a sala de aula, formando
um grande círculo com as cadeiras. Em seguida, pedimos aos mesmos que permanecessem de
pé e solicitamos a cada um deles que se apresentassem, revelando o nome, idade, setor de
trabalho, função que ocupada dentro da estrutura administrativa da Prefeitura, motivo que o

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levou a escolher um curso como o nosso e o que eles mais gostavam de fazer no tempo vago
ou no lazer. Não foi estipulado um tempo limite para a apresentação, uma vez que a nossa
intenção era permitir que todos se sentissem à vontade para interagirem na dinâmica.
Após a apresentação com a dinâmica de grupo verificamos que muitos já se conheciam
e mantinham relação de amizade desde o tempo da infância; alguns eram vizinhos de bairro.
Tivemos situações em que as pessoas trabalhavam na mesma instituição, em setores
diferentes, mas não se conheciam, ainda que a cidade seja pequena com cerca de 36.000
habitantes. A dinâmica nos serviu para realizarmos um breve diagnóstico do perfil da turma e
vale ressaltar que esta foi de grande valia para se criar um ambiente propício ao
desenvolvimento da empatia e do entrosamento entre todos nós.
Ao finalizarmos a dinâmica apresentamos o plano de aula e a metodologia que seria
utilizada. Nesse momento, uma série de acordos foram firmados entre todos nós, como, por
exemplo, que a aula poderia ser interrompida a qualquer momento para perguntas referentes
ao tema abordado; que os alunos deveriam se comprometer em colaborar com as discussões,
fazendo intervenções a partir de suas experiências, uma vez que a estratégia escolhida foi a
aula expositiva dialogada.
A aula foi planejada de modo a produzir o livre debate, já que a nossa intenção foi
associar o conteúdo teórico com as experiências dos alunos, trazendo para dentro das
discussões situações corriqueiras do seu cotidiano numa perspectiva crítica.
Como forma de ilustrar o conteúdo abordado utilizamos textos on-line “o jeitinho
brasileiro”, referências audiovisuais, entrevistas com o professor Mario Sérgio Cortela, filósofo
brasileiro, que trata sobre diferentes temas contemporâneos como a ética e a vergonha na
cara, bem como matérias de telejornais que abordam sobre o tema da ética na administração
pública.
Iniciamos a aula expositiva dialogada, pedindo aos alunos para darem uma definição de
ética, partindo da seguinte pergunta: O que é ética para vocês? Muitos conceitos apareceram,
tais como: “ética é não pegar nada dos outros”; “ética é chegar no horário no trabalho”; “ética
está relacionada as escolhas que as pessoas fazem na vida”; outros associaram a ética a
“prática do bem e do mal”. Ainda houve um conceito de ética atrelado, digamos assim, a uma
concepção metafísica da existência humana como “ética é seguir as vontades de Deus”. Esses

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foram alguns dos vários conceitos de ética apresentados pelos alunos, numa espécie de
tempestade de ideias. A partir deles, buscamos associar as percepções diversas sobre ética ao
arcabouço epistemológico desenvolvido pela filosofia sobre o tema, calçando as nossas
abordagens sobre as concepções de Platão e Sócrates.
Em seguida, abrimos para o debate com os seguintes questionamentos: Vocês se
consideram pessoas éticas? Pode uma pessoa ser ética e antiética ao mesmo tempo?
Os questionamentos apresentados se propuseram a provocar uma reflexão e ao mesmo
tempo incitar a criticidade dos alunos para que eles pudessem fazer as conexões com sua
realidade e seu contexto.
O resultado foi bastante interessante, visto que a maioria da turma participou
ativamente das discussões, sendo perceptível o entrosamento no grupo. Vale destacar que o
mais interessante dessa prática foi perceber a vontade deles em compartilhar as suas
experiências, querendo saber se poderiam ou não ser considerados pessoas éticas ou
antiéticas. Outra situação bem interessante foi quando trabalhamos com alguns dos conteúdos
do código de ética dos servidores públicos municipais, sobretudo as seções que tratam dos
direitos e deveres. Assim, solicitamos aos alunos que descrevessem uma conduta praticada por
eles considerada indevida. O curioso foi que muitos alunos relataram que sequer conheciam a
existência de um código que regia, eticamente, o seu fazer enquanto servidores públicos. O
próprio desconhecimento de um documento como esse impossibilitava que o servidor
promovesse uma reflexão mais crítica sobre os seus hábitos cotidianos, como, por exemplo, a
forma de tratamento aos usuários do serviço público com uma linguagem informal, utilizando-
se de gírias para denominar pessoas como: “diga aí, B”, quando deveriam tratar esses usuários
por “senhor ou senhora”.
Outra prática bastante relatada por eles era o fato de não compensarem efetivamente
os horários de ponto facultativo dado pela prefeitura nos dias que antecediam os feriados.
Outra conduta não ética muito citada pelos alunos foi o fato dos mesmos deixarem de fazer os
seus deveres funcionais para ficarem à disposição de seus chefes para trabalhos particulares.
Quando trabalhamos com o texto “jeitinho brasileiro” as discussões foram bastante
calorosas na medida em que, para muitos alunos, o “jeitinho brasileiro” já faz parte da nossa
própria cultura e não temos mais o que fazer diante desta situação, já que os políticos, que

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deveriam dar exemplos, são os primeiros a praticá-lo para levar vantagem em tudo. Já outra
parte da turma, considerou o “jeitinho brasileiro” um problema sério para o país, que extrapola
o serviço público, uma vez que vários outros exemplos de condutas não éticas foram citados e
o mais corriqueiro esteve relacionado ao fato de não se respeitar o sinal de trânsito.
Por fim, encerramos o curso com a aplicação da estratégia de ensino Philips 66.
Dividimos a turma em 5 grupos com 6 membros. Explicamos como seria a atividade e em
seguida passamos um vídeo do filósofo Mário Sérgio Cortela sobre a ética e pedimos para os
grupos discutirem sobre a diferença entre ética e moral, vícios e virtudes.
Observamos que durante a realização da atividade os cursistas discutiram não somente
as ideias apresentadas no vídeo disponibilizado, mas também conseguiram resgatar muitos dos
conteúdos trabalhados durante todo o curso. Conseguiram realizar análises críticas de suas
práticas profissionais; admitiram que precisavam abandonar velhos hábitos para se tornarem
pessoas virtuosas; refletiram sobre a necessidade de conhecerem as normas e legislações que
regulamentam as suas condutas éticas como servidores públicos. Todavia o mais interessante,
digamos assim, de todas essas manifestações, foi o fato dos alunos perceberam que a ética não
está restrita apenas à execução dos seus serviços dentro da estrutura administrativa da
Prefeitura, mas também está imbricada em toda as suas vidas. Pensar em ética, a partir do
curso, passou a ser pensar o eu a partir do outro, isto é, pensar no meu bem-estar sem me
despreocupar com o bem-estar do outro. Assim, podemos crê que diante dos momentos
críticos atravessados pelo nosso país, pensar eticamente seria uma grande possibilidade para
construirmos uma nação mais sustentável ao longo do tempo.

Considerações finais

Neste relato foi possível descrever uma experiência vivenciada em sala de aula a partir
de um processo de ensinagem, utilizando duas estratégias de ensino em um curso de formação
de servidores. No planejamento do curso, várias variáveis foram consideradas para que
pudéssemos alcançar o nosso objetivo. Um dos fatores mais relevante foi o quantitativo de
participantes, o tempo disponível e a estrutura física existente, já que se tratava de um curso
direcionado para a formação de profissionais que trabalham como assistente de classe nas

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escolas de ensino fundamental. Nosso propósito foi criar um ambiente em que a maioria se
sentisse provocado a participar sem receio da exposição individual, refletindo sobre o tema,
opinado a partir do seu lugar e de suas experiências, interagindo com os colegas,
compartilhando situações do cotidiano e trabalhando em grupo.
Ressaltamos que, tanto na etapa de elaboração e planejamento do curso como em sua
execução tivemos a preocupação com a aplicação estrita das estratégias escolhidas. Como essa
foi a primeira vez que a utilizamos, a sensação de medo, incerteza e insegurança nos assustou,
assim como é assustador a experiência do novo, porém necessário para se romper com os
modelos e os padrões que não inserem os sujeitos como protagonistas de suas formações.
É necessário registrar também que não existe planejamento perfeito em sala de aula,
pois estamos nos relacionando com o sistema vivo, dinâmico e complexo, que exige do
professor flexibilidade, capacidade de lidar com o inesperado, ser autoridade sem exercer
autoritarismos, capacidade de mediar conflitos, valorizando e encorajando a opinião e o
pensamento dos alunos. O professor, como diria o grande filósofo iluminista Montaigne, pode
até não concordar com a opinião do seu aluno, mas deve defender o direito dele dizê-la até o
final.
A nossa análise em relação ao uso da estratégia da aula expositiva dialogada é que não
é uma estratégia simples e fácil de ser aplicada. Na verdade, é uma estratégia que demanda
tempo para aplicá-la e talvez seja mais apropriada para disciplinas com carga horária de 40 ou
60 horas, pois fica difícil ter que dar conta do conteúdo da aula propriamente dita e dar conta
ao mesmo tempo das intervenções dos alunos. Já a estratégia de ensino da Phillips 66 é muito
eficiente para trabalhos em grupos, uma vez que, como já dito, permite fazermos sínteses
sobre os assuntos tratados numa aula, bem como percebermos possíveis lacunas no processo
de ensino e aprendizado dos alunos.
À guisa de conclusão, esperamos que novas pesquisas possam ser realizadas no sentido
de dar continuidade às investigações que se proponham a relatar as experiências de aplicação
das estratégias de ensino em diferentes contextos educacionais, de modo a se revelar as suas
potencialidades e as suas limitações, alimentando ou realimentando a literatura teórica sobre o
tema.

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DOI: https://doi.org/10.24933/horizontes.v39i1.905

Referências

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Recebido em janeiro 2020.


Aprovado em março 2021.

Periódico Horizontes – USF – Itatiba, SP – Brasil – e021042

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