GEACH, Peter. Razão e Argumentação
GEACH, Peter. Razão e Argumentação
GEACH, Peter. Razão e Argumentação
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losof 1�1
TES & (ois. - Filosofia da biologia
Razão e
SCHAT, W. - Espinosa
AW, C. - Filósofos modernos
N & (ois. - Platão
argumentação
UR & BAKER - Filosofia: textos fundamentais comentados
HTON, J. - Descartes
& GAMEZ - Filosofia contemporânea em ação
ER, T. - Gênero: conceitos-chave em filosofia
GHAM, F. - Teoria da democracia: uma introdução crítica
T, F. - Filosofia francesa: iníluência de Foucault, Derrida, Deleuze & Cia
, F. - Gilles Deleuze & Félix Guattari: biografia cruzada
H, S. - Ciência: conceitos-chave em filosofia 1
. 1
W, D. - Ética: conceitos-chave em filosofia
TT, B. - Metafísica: conceitos-chave em filosofia
, P.T. - Razão e argumentação /
Razão e
Maria Carolina dos Santos Rocha (Presidente)
Professora e Doutora em Filosofia Contemporânea pela ESA/Paris e UFRGS/Brasil.
Mestre em Sociologia pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS)/Paris.
Fernando José Rodrigues d_a Rocha
argumentação
Doutor em Psicolinguística Cognitiva pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica,
com pós-doutorados em Filosofia nas Universidades de Kassel, Alemanha, Carnegie
Mellon, EUA, Católica de Louvain, Bélgica, e Marne-la-Valle, França. Professor Associado
do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Nestor Luiz João Beck
Doutor em Teologia pelo Concordia Seminary de Saint Louis, Missouri, EUA, com pós
-doutorado em Teologia Sistemática no Instituto de História Europeia em Mainz, Alema
P. T. Geach
nha. Bacharel em Direito. Licenciado em Filosofia. Bolsista da Fundação Alexander von
Humboldt, Alemanha.
Roberto Hofmeister Pich Universidade de Leeds, Inglaterra
Doutor em Filosofia pela Universidade de Bonn, Alemanha. Professor do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia pela PUCRS. /
Tradução
Clarissa Vido
Gustavo Coelho
Luis Fellipe Garcia
Bacharéis em Filosofia pela UFRGS.
Colaboração
Michael de Souza Cruz
Revisão Técnica
G292r Geach, P. T.
José Alexandre Durry Guerzoni
Razão e argumentação / P. T. Geach ; tradução: Clarissa Vido, Mestre em Lógica e Filosofia da Ciência e
Gustavo Coelho, Luis Fellipe Garcia ; colaboração: Michael de Doutor em Filosofia pela UNICAMP.
Souza Cruz; revisão técnica: José Alexandre Durry Guerzoni. -
Porto Alegre: Penso, 2013.
96 p.; 23 cm.
ISBN 978-85-65848-09- l
CDU 16
Copyright© 1977 Blackwell Publishing Limited. John Wiley & Sons Limited.
All Rights Reserved. Authorised translation from the English language edition
published by Blackwell Publishing Limited. Responsibility for the accuracy of the
Nota dos tradutores
translation rests solely with Penso Editora Ltda and is no the responsibility of Blackwell
Publishing Limited. No part of this book may be reproduced in any form without the
written permission of the original copyright holder, Blackwell Publishing Limited.
Em homenagem a
TADEUSZ KOTARBINSKI"
em seu nonagésimo aniversário
"N. de T.: Tadeusz Kotarbinski (1886-1981), filósofo polonês, cofundador, com Lukasiewicz e
Lesniewski, do Centro de Pesquisas Lógicas de Varsóvia .
..N. de T.: Traduzido a partir do inglês.
Prefácio
Muitos livros destinados a incutir hábitos de pensamento lógico contêm O leitor verá, entretanto, que existem métodos para provar que os esquemas
um pouco de lógica formal, mas a lógica formal que eles usam é com frequência são válidos.
a assim chamada lógica tradicional. A lógica "tradicional" consiste, de fato, em Essas inferências pertencem ao pouco conhecido campo da lógica plura
alguns poucos fragmentos do pensamento medieval (os mais valiosos feitos dos tiva ou pleonetética, a lógica de maiorias; o excêntrico, mas talentoso filósofo
escolásticos em teoria lógica foram descartados como ninharias pedantes e sem de Edimburgo, Sir William Hamilton,* deve ser considerado aquele que aten
nenhuma utilidade) junto com uma grande mistura de falácia e de absurdo. Dado tou para o fato óbvio de que "muitos" é um quantificador da mesma categoria
que professores da genuína ciência da lógica em grande parte escrevem para seus que "todo", "algum" e "não''. Os manuais "tradicionais': um após o outro, dizem
próprios colegas e para estudantes universitários que estão lendo filosofia, ou que, para propósitos lógicos, "muitos" é uma variante de "alguns" - veja-se, por
ainda para o benefício de matemáticos, lógicos "tradicionais" têm algum sucesso exemplo, Logic de A.A. Luce (Teach Yourself Books, E.U.P., 1975, p.54) - mas
ao reivindicar o campo do discurso ordinário para sua própria preservação; seus isso é uma enorme inverdade. Esse campo é ainda muito mal explorado; leitores
trabalhos vendem e vendem, são impressos e reimpressos. curiosos poderão aprender algo sobre as ferramentas necessárias para um estudo
O resultado é deplorável. Uma mente vigorosa julgará ser a lógica "tradicio mais avançado em The Logic of Plurality de J. E. J. Altham (Methuen, 1971). O
nal" uma pequena verdade em um monte de lixo. Sob a impressão natural, porém fragmento de lógica pleonetética aqui apresentado é um fragmento decidível, no
errada, de que a lógica moderna tem sentido apenas para intelectos matemáti qual há um método infalível para mostrar se a forma de um argumento é válida
cos, tal pessoa decidirá "lógica não é pra mim - devo usar o meu bom senso da ou inválida. O método de decisão não é algo novo, mas sua apresentação em co
melhor maneira possível''. Uma mente menos vigorosa pode ficar viciada para o nexão com os procedimentos de decisão similares usados para testar argumentos
resto da vida por ideias ruins do que seja lógico ou ilógico, derivadas da lógica silogísticos e afins pode sevde alguma novidade. Aqui, novamente, o leitor des
"tradicional''. O manual "tradicional" diz que é uma falácia, a falácia ad hominem, cobrirá que ele logo pode dominar as técnicas de teste e pode fazer descobertas
argumentar contra um homem partindo das premissas aceitas por ele quando que o surpreenderão até mesmo neste campo limitado.
você mesmo não as aceita; que se você não encontrar nenhuma objeção para Em descobertas posteriores da lógica pleonetética, existem surpresas ainda
lançar sobre as premissas ou sobre a forma de um argumento, você ainda assim maiores, até mesmo de algum valor prático. Em filosofia política, as pessoas geral
estará autorizado a rejeitá-lo por incorrer em uma "petição de princípio";* que mente admitem que, sob um princípio majoritário, ao menos a maioria das pes
uma proposição pode ser justamente rejeitada em uma discussão se seu propo soas deve obter o que quer, mas Elizabeth Anscombe"' estabeleceu, recentemente,
nente não pode responder ao desafio "defina seus termos!"; que há a "falácia das o seguinte resultado. Suponha que haja uma comissão de dez pessoas e que cada
muitas questões", uma falácia lógica que consiste em perguntar se duas coisas são uma delas apresente uma moção, de modo que:
válidas em conjunto - o único procedimento logicamente correto seria dividir
a questão em duas. Espero que os leitores deste livro aprendam que todas essas A moção de X foi derrotada pelo voto da maioria, e assim foi a maior parte das
regras e advertências tradicionais são logicamente inválidas. moções para as quais X votou.
No corpo do livro, não mencionei nem mesmo uma notória parte da tra
dição, a doutrina dos termos distribuídos e não distribuídos. Os dois esquemas Nesse caso, essa descrição de um membro X da comissão pode se aplicar a
de argumentos seguintes pecam ambos contra a proibição de termos médios não uma real maioria de membros da comissão. A vaga intuição que nos diz que isso
distribuídos, como foi tradicionalmente interpretado: não pode acontecer é facilmente derrubada se construímos uma tabela de votos
para tal comissão'. Esse pequeno exemplo mostra muito claramente como um
governo democrático pode causar uma grande frustração para a maioria de seus
cidadãos por uma série de medidas, cada uma das quais pode, com verdade, ser
descrita como contrariada apenas por uma minoria, por um "interesse parcial";
de fato, a menos que um bom número de "interesses parciais" prevaleça, um país
será bastante infeliz. Um pensamento consequente sobre maiorias e minorias é
Sumário
de óbvia importância prática e não é assim tão fácil. O objetivo do Capítulo 13
é dar alguns passos na tentativa de introduzir um raciocínio disciplinado sobre
tais assuntos.
Este livro originou-se de um curso para estudantes universitários, muitos
dos quais não pretendiam estudar filosofia academicamente. O objetivo do Prefácio ..................•.................................................................................. ix
curso foi aprimorar os hábitos de pensamento de meus ouvintes sem levar em
1 Argumentar e dar razões ........................................................................ 15
consideração quais seriam os seus estudos futuros. No curso, fiz uso de um.exce
lente e pequeno livro The Web of Belief, de W V Quine e J. S. Ullian (New York:
2 Consistência .......................................................................................19
Random House , 1970); o leitor encontrará no texto diversas menções a esse livro
como "Quine e Ullian''. Outro livro bastante útil, do mesmo gênero, é Thinking 3 Juízo, crença e conhecimento: dúvida e certeza .......................................... 23
about Thinking (Collins Fontana, 1975) de Anthony Flew. Uma desculpa para /
escrever outro livro do gênero é que acredito que a disciplina de pensamento pre 4 Inferência.......................................................................................... 28
gada por tais livros será alcançável na prática apenas se for usada uma pequena
dose de lógica formal e considero, portanto, que é útil para o leitor dispor desses 5 Pontos de partida: observação, memória, testemunho .................................. 33
meios de autoaperfeiçoamento na mesma medida do que é pregado. Mas, na
verdade, não é preciso se desculpar por ser um pregador da racionalidade; exis 6 Usos da argumentação .......................................................................... 35
tem pouquíssimos de tais pregadores, não muitos.
7 Validade lógica .................................................................................... 40
A Universidade de Leeds
P. T. Geach 8 Verdade e falsidade .............................................................................. 42
Novembro de 1975
9 Definição .......................................................................................... 44
Aqui, entretanto, uma dúvida pode surgir: chegar a uma conclusão teórica, mente a crenças ameaçadas. Há um poema de Thomas Hardy* sobre um homem
uma conclusão sobre como as coisas são, é realmente algo que cabe a nós decidir? que procura preservar sua crença de que uma lápide com o nome de sua amada
Sobre esse ponto, posições extremamente opostas foram sustentadas; podemos de fato cobre seus restos mortais, ainda que ele pudesse facilmente confirmar a
tomar Descartes e Shelley* como típicos defensores dessas posições. Descar verdade de um boato desagradável que ouvira - de que a garota ali enterrada é
tes parece ter considerado que crer em algo era simplesmente uma questão de na verdade uma outra garota e que a sua segue viva como uma garçonete bêba
escolha: ao menos por um período de tempo e em um momento de tranquilida da e desleixada. Aqui, a resistência à modificação da crença nos pareceria algo
de, você pode deixar de acreditar em algo que agora acredita. Algumas pessoas lamentável ou desprezível, mas podemos considerar diferentemente o herói de
parecem ter sustentado possuir o poder de adotar crenças a qualquer momento, um romance vitoriano que continua a acreditar que sua amada não cometeu o
como a Rainha Branca" que (reconhecidamente com prática) podia crer em pelo crime do qual é acusada e que não será demovido pela evidência contra ela, e,
menos seis coisas impossíveis antes do café da manhã. As palavras da Rainha são, no desenlace, quando ela é triunfantemente inocentada, ele, com orgulho, pode
provavelmente, uma alusão a um personagem de Oxford, W G. ("Ideal") Ward, dizer "eu sempre acreditei em sua inocência, mesmo quando provaram que você
outrora Fellow do Balliol; ele era um truculento ultramontano ... em religião, e era culpadá'.
conta-se que expressou o desejo de que um infalível documento papal pudesse Aqui é natural introduzir a tripla distinção: motivos para uma crença,
chegar até ele, todas as manhãs, antes do café da manhã, para que acreditasse no razões para uma crença, causas de uma crença. Por uma questão de conveniên
The Times. Em nossos dias, um oficial da cúria romana parece ter igualmente ale cia, estou, no presente contexto, restringindo "razões para uma crençá' ao se
gado que, se o Papa aparecesse com um novo decreto aprovando a contracepção guinte significado: razões exprimíveis de cuja verdade se seguiria, com certeza
artificial, ele mesmo passaria de sua certeza atual de que esta prática é errada para ou probabilidade, que a crnnça é verdadeira. Cada um de nossos dois amantes
uma igual certeza de que ela não é errada. tinha um forte motivo para crer na inocência de sua amada: a crença contrá
Motivos
Esse tipo de comando sobre nossas próprias crenças é algo que poucos de ria, se aceita, traria muita infelicidade ao amante. Mas esse motivo não pode ser
nós podem reivindicar. Shelley sustentaria que é algo que ninguém pode verda considerado uma razão para a crença. Do mesmo modo, um exilado acadêmico
deiramente reivindicar. De acordo com Shelley, quando estamos considerando de Gana, nos tempos do "Redentor" Nkrumah," teria um forte motivo para se
se algo é verdadeiro, é uma mera questão de sentimento espontâneo se assen- converter à filosofia do consciencismo de Nkrumah: um motivo para uma crença
timos ou dissentimos ou se suspendemos o juízo; sentimentos não podem ser real, não apenas declarada, pois uma declaração insincera, se detectada, poderia
comandados, tampouco crenças. Isso aparece em The Necessity of Atheism - um fazer o retorno do exílio ser muito perigoso; mas aqui também o motivo para
interessante ensaio, que lastimo ser demasiadamente inacessível para ser usado crer não pode ser tomado como uma razão. Causas
como texto no trabalho diário de departamentos de filosofia. A compreensão de Todo tipo _de coisas pode causar crenças: uma crença de que cachorros pre
Shelley das causas da crença humana veio a mostrar-se muito falha; ele esperava tos são especialmente perigosos pode encontrar sua origem em um medo es
que seu ensaio fizesse com que os professores de Oxford deixassem de acreditar quecido de infância, ou a crença de que um homem é seu inimigo mortal pode
na existência de Deus, mas, em vez disso, ele foi simplesmente mandado embora. ser devida a uma doença cerebral. Claramente, não temos aqui nem um motivo
A verdade parece estar entre esses dois extremos. Crenças não podem ser nem uma razão para crer. Algumas vezes, uma crença é adotada por motivos
"ligadas" ou "desligadas" de acordo com a nossa vontade, mas elas estão, até certo sem razões, ou surge de alguma causa psicológica ou fisiológica, também inde
ponto, sob nosso controle. Nós podemos formar hábitos de pensamento que mo pendente de quaisquer razões, mas aquele que crê.inventa posteriormente razões
dificarão nossas crenças para o bem ou para o mal, e a formação de tais hábitos em favor de sua crença. Esse processo- é chamado de racionalização. Porém, na
é certamente voluntária. É ainda mais claro que podemos nos apegar voluntaria- realidade, a apreensão de razões que, se verdadeiras, fariam com que aquilo em
'N. de T.: Percy Bysshe Shelley (1 792-1822), um dos mais importantes poetas românticos ingleses. ºN. de T.: Thomas Hardy (1840-1 928), romancista e poeta inglês do movimento naturalista.
..N. de T.: Personagem de Alice no País dos Espelhos de Lewis Carroll (1832-1 898). ..N. de T.: Kwame Nkrumah (1909-1972), presidente de Gana entre 1960 e 1966, autor de vários
...N. de T.: O ultramontanismo é a doutrina que defende a tese da infalibilidade do papa. livros, entre eles Consciencism .
18 P. T. Geach
2
que se acredita fosse certo ou ao menos provável, algumas vezes produz, de fato,
uma crença; nem todo raciocínio é uma racionalização. Alguns pensadores sus
tentaram, ou peló menos foram acusados de ter sustentado, que todo ato de dar
razões para nossas crenças é uma racionalização: as razões apresentadas nunca
determinaram o surgimento da crença, mas foram criadas após o seu surgimento.
Se alguém defende essa opinião, é tolice de sua parte alegar quaisquer razões ou
Consistência
evidências para ela, pois, se essa pessoa estiver certa, então a concordância ou
discordância de outras pessoas em relação ao seu ponto de vista se dará indepen
dentemente de considerarem quaisquer razões por ela alegadas. Este livro está
escrito na convicção contrária de que a consideração das razões para se crer em
algo em certas ocasiões resulta na crença apropriada; se alguém não compartilha Desejamos nos ater ao que é verdadeiro em nosso pensamento, ainda que, co
dessa convicção, esse alguém dificilmente pode exigir razões para adotá-la. mo vimos, haja outros desejos que podem formar crenças desconsiderando a
verdade; e, em maior medida, também desejamos comunicar a verdade aos ou
tros. Além disso, quando formamos planos, desejamos que eles sejam executá
TÓPICOS PARA DISCUSSÃO veis. Para atingir esses objetivos gerais, devemos também visar à consistência
de nosso pensamento, discurso e planejamento. Não podemos adotar a atitude
l. Quando não é razoável exigir razões? leviana de Walt Whitman I)O que diz respeito à inconsistência:
2. Deve uma boa razão ser tal que, se necessário, pode ser colocada em
palavras? Por exemplo: você tem uma boa razão e poderia colocá-la em Eu me contradigo? Pois muito bem, eu me contradigo. Sou amplo, contenho
palavras para crer que seus pais são M. e N., ou, ainda, que você nunca multidões.
esteve na Lua?
3. Em que medida dar razões de um modo honesto difere de uma raciona Pois, gostemos ou não, se tolerarmos inconsistência nos pensamentos que
lização? (Para esse tópico, o Capítulo 3 de Miracles de C. S. Lewis' é um alimentamos e transmitimos aos outros, alguns desses pensamentos serão falsos
ponto de partida útil. A edição revisada em brochura é preferível), - não estarão de acordo com o modo como as coisas são no mundo. Gostemos ou
não, se tolerarmos inconsistência em nossos planos, alguns deles serão frustrados.
Enquanto homens, estamos sujeitos, sem dúvida, a erro e frustração, mas isso não
é razão para incorrermos neles gratuitamente. A consistência não é a única virtude
do pensamento e do planejamento, mas é uma virtude muito necessária.
Porque os homens são falíveis, talvez ninguém jamais alcance consistência
completa em todo o seu corpo de crenças; e mesmo uma consistência ampla
é difícil de alcançar. Escritores de ficção, às vezes, fazem grande esforço para
contar uma história que seja consistente em todos os seus detalhes, mas quando
seus trabalhos são rigorosamente testados quanto à consistência, alguma falha é
frequentemente encontrada. Trollope;· de fato, trabalhou com um mapa de Bar
setshire, seu condado imaginário, mas Ronald Knox '* procurou mostrar que os
"N. de T.: Anthony Trollope (1815-1882), novelista inglês da Era Vitoriana, autor das Crônicas de
"N. de T.: Clive Staples Lewis (1898- 1 963), escritor irlandês, autor da famosa série de livros infantis Barsetshire.
As Crônicas de Nárnia. '"N. de T.: Ronald Knox (1888-1957), teólogo inglês autor de novelas policiais.
20 P. T. Geach Razão e argumentação 21
dados topográficos que podem ser extraídos dos romances são inconsistentes corpo de enunciados é consistente se e somente se um segundo corpo de enun
com o mapa ou entre si - dois lados de um triângulo somados resultam menores ciados é consistente; qualquer inconsistência que pudesse aparecer no primeiro
que o terceiro. E resultados similares foram alcançados no que diz respeito às his conjunto corresponderia a uma inconsistência no segundo conjunto. Agora, se
tórias de Sherlock Holmes, mesmo quando tomadas individualmente, bem como temos razões para aceitar o segundo conjunto como sendo todo ele verdadei
em Middlemarch de George Eliot • e em Guerra e Paz de Tolstoi. ro, esse conjunto certamente será consistente, e, consequentemente, o primeiro
Quando se trata de ficção, essas inconsistências importam muito pouco - se conjunto de enunciados deve, da mesma forma, ser consistente.
não incomodam o leitor, elas absolutamente não importam. Pois, numa ficção, A história da geometria não euclidiana nos dá um exemplo interessante. O
o autor não está visando (ou pretendendo visar) à verdade, nem mentindo deli Jesuíta Saccheri' acreditava que uma geometria baseada em um axioma contrário
beradamente; o autor está apenas fazendo o leitor acreditar que está escrevendo ao axioma das paralelas de Euclides incorreria em inconsistência se desenvolvida
a história de certas pessoas e lugares, com o objetivo de nos entreter ou de nos o bastante, e acreditava que, ao desenvolver as consequências de axiomas não eu
ensinar alguma coisa; e se suas inconsistências passam despercebidas, elas não clidianos, ele tinha, de fato, mostrado como tal inconsistência surge. Havia, en
frustrarão seu objetivo. A teoria do tempo esboçada em A máquina do Tempo tretanto, falhas nas provas de Saccheri, e pensadores posteriores mostraram que ·
de Wells" é claramente inconsistente; de fato, o Viajante do Tempo passeia ha ninguém poderia ter sido bem-sucedido onde ele falhou. Com efeito, um tipo de
bilmente de uma teoria a outra, e creio que nenhuma das diversas teorias que paralelismo pode ser estabelecido entre as deduções que partem de axiomas não
ele apresenta passaria por si só num teste rigoroso de consistência, mas Wells euclidianos e os teoremas euclidianos deduzidos a partir de axiomas euclidianos,
contorna esses problemas com imaginação - e o faz tão bem que um número e, em virtude desse paralelismo, qualquer inconsistência no sistema não euclidia
apreciável de filósofos está disposto a levá-lo a sério e a considerar a viagem no no seria correspondida por úma inconsistência no sistema euclidiano. Aqueles
tempo como uma possibilidade lógica genuína. que acreditaram - e Frege, por exemplo, continuou a acreditar - que a geometria
Já foi dito que uma acusação de inconsistência é uma "crítica internà' de um euclidiana é, de fato, verdadeira e, portanto, não pode ser inconsistente, viram-se
discurso, uma acusação que "não diz respeito a nada externo ao nosso discurso''. obrigados a perder a esperança de provar a falsidade da geometria não euclidiana
Essa tese, penso eu, é o exato oposto da verdade. Nos casos em que, como numa por meio de alguma inconsistência interna.
ficção, não estamos interessados em descrever, ou prescrever, alguma realidade Para qualquer assunto complicado como esse, evitar uma inconsistência
externa ao discurso, a inconsistência não importa; ela é importante em teorias, não é uma questão de apenas evitar uma pequena inconsistência - de não afir
narrativas históricas, ordens, instruções e conselhos, pois, nesses casos, a falsida mar e então negar a mesma coisa. Claramente, queremos evitar a adoção de um
de ou uma falha prática é a penalidade a ser paga pela inconsistência; portanto, conjunto de crenças (ou, de fato, um conjunto de políticas práticas) que são, por
é precisamente a referência à realidade externa que faz da inconsistência no dis implicação, inconsistentes. Entretanto, não podemos discutir o problema do que
curso algo a ser evitado, se possível. faz uma posição ser, por implicação, inconsistente, sem entender a noção do que
Se estivéssemos sempre certos, todas as nossas opiniões seriam consisten é, para uma coisa, seguir-se de outra, e aprender a aplicar essa noção em casos
tes; como insistiu Tomás de Aquino, uma verdade não pode entrar em conflito particulares. Ora, para uma mente não treinada, não é de todo óbvio o que re
com outra. Mas não estamos sempre certos, nem sempre sabemos onde repou almente se segue do quê. Quando uma falsidade surge como se seguindo apa
sa a verdade; e podemos precisar nos assegurar de que um corpo qualquer de rentemente de uma verdade, sabemos que nos enganamos em algum lugar, mas
crenças é, ao menos, consistente. antes de estarmos aptos a reconhecer que cada pode não ser fácil saber onde - e, assim, podemos ser incapazes de tirar proveito
membro desse corpo é correto. Por essa razão, lógicos e matemáticos inventa da experiência. Podemos precisar lidar com um assunto no qual não sabemos
ram provas indiretas de consistência. Algumas vezes, é possível mostrar que um quando nossas conclusões são falsas e, assim, não podemos apelar para sua óbvia
falsidade como um sinal de algum erro no raciocínio. Seria, portanto, bastante
desejável dispor de uma arte que possa testar nossos raciocínios no que r�speita
·N. de T.: George Eliot, pseudônimo de Mary Ann Eváns (1819-1880), novelista inglesa que retratou
a vida provinciana da Era Vitoriana.
··N. de T.: H. G. Wells (1866-1946), escritor inglês conhecido por suas obras de ficção científica. "N. de T.:Giovanni Saccheri (1667-1733), padre jesuíta e matemático italiano.
22 P. T. Geach
3
à sua validade sem levar em consideração a verdade concreta sobre o assunto
em questão, e que possa nos dar alguma garantia de que, se começarmos com
a verdade, não nos desviaremos para o erro. O objetivo da lógica é suprir essa
necessidade.
É claramente autofrustrante afirmar e negar uma e a mesma coisa ao mes
mo tempo, em uma e mesma ocasião. Não é tão obviamente autofrustrante se
Juizo, crença e conhecimento:
mantivermos a afirmação e a sua negação separadas, em diferentes contextos do
discurso: essa pode ser chamada a Política de Compartimentos Impermeáveis, e
dúvida e certeza
um bom número de pessoas, que parecem ser razoavelmente eficientes e felizes,
seguem essa política. Uma vez, ouvi uma história sobre um astrônomo japonês
que parecia proceder muito bem tratando, alternadamente, o sol como um corpo
natural inanimado cujas propriedades podem ser investigadas pelas técnicas da
física matemática, e como uma divindade, o ancestral da dinastia imperial japo Crença e conhecimento são estados ou disposições da mente. Dado que não temos
nesa; quando desafiado sobre o assunto por um colega europeu, ele disse "aqui na nenhuma razão para pensar que haja algo errado com sua mente ou cérebro, sem
Europa, sei que isso não faz sentido, mas, no Japão, eu acredito''. hesitação, atribuímos a um homem que está atualmente dormindo crenças e co
A longo prazo, a Política de Compartimentos Impermeáveis não pode fun nhecimentos que ele manifestou enquanto estava acordado. Mas, além dessas dis
cionar. Em uma ocasião ou outra, aqueles que a seguem estarão dizendo e pen posições, existem certos atos,mentais passageiros, que são tradicionalmente cha
sando o que não é o caso, e os confortos da falsidade são parcos e precários. mados juízos: um juízo ocorre, pelo menos, sempre que um homem é confrontado
Defender uma falsidade conscientemente, nas palavras do profeta, é abandonar a com um problema teórico ou prático e toma uma decisão - "assim é como as coisas
fonte de água viva e procurar água onde não há. são" ou "isto é o que eu devo fazer''. Quando um homem faz um juízo teórico sobre
o modo como as coisas são, podemos, posteriormente, dizer que ele sabia ou acre
ditava em (pensava) tal e tal coisa, mas pode ser muito errado dizer que ele ainda
TÓPICOS PARA DISCUSSÃO sabe ou acredita em tal e tal coisa - o assunto pode ter passado rapidamente pela
sua mente sem que seus juízos tenham deixado para trás quaisquer conhecimentos
1. A possibilidade de imaginar/figurar/descrever/conceber alguma coisa ou crenças disposicionais. Se perguntado, como em Hamlet, se certa nuvem não é
mostra que se pode, consistentemente, nela acreditar? muito parecida com uma baleia, posso julgar que de fato é, mas, uma hora depois,
(Aqui é útil pensar em figuras paradoxais como as de M. C. Escher): ocupado com assuntos mais importantes, posso ter esquecido tudo sobre a nuvem,
2. Cientistas usarão como hipóteses de trabalho, em momentos diferentes, e posso não mais acreditar ou saber que a nuvem que vi se parecia com uma ba
proposições inconsistentes entre si. Isso mostra que eles adotam a Política leia. Observar pequenos detalhes de um ambiente e formar juízos sobre eles não
de Compartimentos Impermeáveis? E, assim, essa política seria defensável é, exceto para Sherlock Holmes, um hábito geralmente útil. De fato, armazenar
apesar de tudo? permanentemente tais conhecimentos triviais pode ser positivamente perigoso -
3. Um homem, no prefácio de seu livro, diz estar certo de que ele contém cf. o livro The Mind of a Mnemonist de A. R. Luria. • Isso pode fazer com que nos
erros. Esse enunciado faz com que o todo, livro mais prefácio, torne-se tornemos, no máximo, uma atração de circo.
inconsistente, se já não o era. Segue-se que tal autodepreciação é sempre Uma crença é, às vezes, favoravelmente contrastada com uma descrença;
logicamente objetável. uma crença é uma disposição louvável, uma descrença é uma disposição deplo
rável - assim estamos acostumados a entender. O contraste é espúrio. Cristãos
"N. de T.: Maurits Cornelis Escher ( 1 898- 1 972), artista gráfico holandês conhecido por suas gravuras "N. de T.: Alexander Romanovich Luria ( 1902-1 977), neuropsicólogo soviético especialista em psi
que exploram relações geométricas. cologia do desenvolvimento.
24 P. T. Geach Razão e argumentação 25
e muçulmanos costumavam chamar uns aos outros de descrentes, mas o tema cadas por novas enquanto a viagem continua - não podemos levar o navio para
da querela não era: que lado é crente, que lado é descrente? Obviamente, tanto uma doca seca e fazer uma reforma total.
cristãos quanto muçulmanos eram crentes, muito passionalmente; eles apenas Alguns filósofos sustentaram que podemos aprender a ter consciência de
acreditavam em diferentes dogmas. Não há mais uma atividade ou condição de uma considerável diferença entre dois tipos de certeza: um tipo de certeza nun
descrer como oposta a crer do que uma de não ver como oposta a ver; crença e ca é ilusório, constituindo conhecimento genuíno; o outro é um mero "tomar
descrença com respeito ao mesmo assunto correspondem antes a maneiras opos como dado", e isso bem pode estar errado. Se estamos não. apenas certos, mas
tas de ver uma coisa - algo parece vermelho a A, verde a B, mas ambos estão também certos com o tipo correto de certeza, então conhecemos e não podemos
vendo a mesma coisa. estar errados. Tal foi o ensinamento de certos filósofos de Oxford, notavelmente
O que é oposto a um estado de crença é um estado de dúvida, hesitação ou Cook Wilson e Prichard. (Prichard, de fato, recusa-se a dar o nome "certeza''
incerteza, ou, ainda, um estado de deliberada suspensão de juízo - o que é uma àquele estado falível da mente que "podemos falhar em distinguir" da certeza
conquista sofisticada. Experimentamos graus de certeza e de incerteza, desde inequívoca, mas, uma vez que ele admite que esse estado exclui qualquer dúvida
uma certeza completa e inabalável até uma absoluta incerteza. ou incerteza, parece mais claro falar do tipo correto e do tipo errado de certeza.)
Mesmo a mais absoluta certeza pode mostrar-se equivocada. Posso estar Dada a alegação feita, da habilidade para reconhecer esse tipo inequívoco
certo de que coloquei algo em uma gaveta, mas, ao olhar na gaveta, percebo que de certeza, é justo considerar o tipo de coisas das quais Prichard disse que estava
estava errado - e, nessa ocasião, a certeza também pode ser ilusória: posso estar certo e que, portanto, "sabia''. Prichard estava certo e, portanto, "sabia'', que não
certo de que a coisa não está na gaveta porque olhei na gaveta e não a vi, mas, pode ser dito que ondas têm uma velocidade, como supunham os físicos, uma
na próxima vez que olho, lá está ela, na minha cara. Esses são exemplos comuns, vez que uma onda não é um corpo e somente corpos têm velocidade. Ele lem-
mas, também quando se trata de assuntos mais importantes, podemos vir a duvi bra, sem perceber que a história poderia ser apresentada contra ele, o fato de
dar ou negar o que aceitamos previamente com certeza - percebemos que nossa que, quando disse esse tipo de coisa aos físicos, eles pensaram que ele era apenas
certeza anterior não era justificada. um "louco": eles deveriam ter "pensado um pouco mais", mas "você não pode
Deveríamos, portanto, adotar o programa cartesiano de tentar alcançar um fazer um homem pensar mais do que pode fazer um cavalo beber". (Knowledge
estado de incerteza, suspensão de juízo, no que diz respeito a todos os tipos de and Perception, O.U.P. 1950, p.99). Além disso, ele "sabia'' que seu ego era uma
questões - ou, pelo menos, em todos os campos onde, por experiência passada, substância e que nenhuma substância pode ser gerada ou destruída - portanto,
sabemos que estivemos certos equivocadamente - até que, no final das contas, que estava no mundo nos dias de Júlio César. Ele, sem dúvida, fez essas afir
cheguemos a proposições das quais simplesmente não podemos duvidar? É, de mações de boa-fé e com um sentimento de certeza. Mas outras pessoas podem
fato, psicologicamente impossível para um pensador seguir esse programa; um levantar alguma dúvida sobre a afirmação de Prichard de que ele sempre poderia
leitor atento das Meditações pode observar muitos lugares em que Descartes, sem dizer quando teve o tipo de certeza que não pode estar errada. Do mesmo modo,
hesitação, assume coisas das quais ele teria feito bem em duvidar - de fato, teria alguns outros filósofos (inclusive eu) afirmariam estar certos de que nenhum
sido melhor do que ter duvidado daquilo que efetivamente duvidou. Descartes homem existe antes de ser concebido por sua mãe e que Prichard não foi conce
estava obcecado por uma metáfora arquitetônica: a casa do conhecimento na bido e, portanto, não existiu, até muitos anos depois de Júlio César. É claro que
qual vivemos é frágil e instável, por isso, devemos colocá-la a baixo - morando, Prichard poderia objetar que nossa certeza é do tipo errado, falível; mas como
durante o processo, numa choupana de "moralidade provisória''*- e destruir os decidir isso?
alicerces de modo a reconstruir em segurança. Mas uma melhor metáfora para De fato, ninguém que pense consequentemente pode tirar qualquer pro
a situação humana foi encontrada pelo filósofo austríaco Otto Neurath: somos veito dessa doutrina de que há uma experiência discernível de certeza que nunca
como marinheiros em um navio furado e temos de substituir as tábuas danifi- engana. O senhor A pode estar certo de que sua certeza sobre algum assunto é
o tipo correto de certeza, mas é essa certeza de segunda ordem ela mesma uma
certeza do tipo correto? Mais importante, se você realmente está certo - seja
sua certeza, de fato, "saber" ou mero "tomar como dado" -, então você não es
'N. de T.: Após colocar os fundamentos de todas as suas crenças em dúvida, minando assim os ali
tará desejando inspecionar seu estado de certeza para julgar se é ou não o tipo
cerces do edifício do conhecimento, Descartes estabelece três regras provisórias para evitar a inação
imposta pela dúvida. Cf. Discurso do Método, Terceira Parte.
26 P. T. Geach Razão e argumentação 27
correto de certeza. Tão logo desejar empreender esse. exame interno, você estará TÓPICOS PARA DISCUSSÃO
em dúvida, e a certeza que desejou examinar terá desaparecido. De fato, quando
dizemos "eu sei" ou "estou certo", isso é frequentemente uma tentativa desespera 1. Quando é razoável aplicar a máxima dos advogado� "falsus in uno Jalsus
da de nos assegurar quando não estamos certos e não sabemos. Um homem que in omnibus"" - "uma testemunha que mentiu uma vez pode ter mentido
está certo de algo não para para examinar sua própria certeza, ele apenas age de o tempo todo"? Isso se aplica ao "testemunho" de nossos sentidos ou de
acordo com ela; e então, às vezes, ele está errado - mas é pouco consolo para isso nossa memória, como argumentou Descartes?
se lhe é dito depois do evento, por um filósofo de Oxford dessa escola, "viu, você 2. Existem certezas absolutamente inabaláveis?
não sabia, você apenas tomou como dado''. 3. Que tipos de juízos feitos com certeza em um momento são menos sujeitos
Consideremos como tudo isso se aplica a um caso particular - à memória. a revisão que outros?
Lembranças, com muita frequência, vêm a nós destituídas de qualquer incerteza 4. Quanto a corroboração de outras pessoas importa no que diz respeito a
a respeito delas, mas algumas dessas lembranças nos enganam. Um homem cuja coisas das quais você está certo?
memória fosse tão falível quanto à de muitos de nós e que ainda assim decidisse 5. Como estamos todos certos de que Prichard não estava vivo em corpo
sempre confiar nela, teria de acreditar que coisas muito peculiares acontecem no 2.000 anos atrás? Existem registros de reis mesopotâmicos, e há a lenda
mundo como, por exemplo, objetos desaparecerem de_gavetas trancadas. De fato, do Judeu Errante, que implicariam vida corpórea de 2.000 anos; como
ele dificilmente poderia evitar a autocontradição. Pois ele, muito provavelmente, sabemos que isso não acontece?
iria se parecer comigo nesse aspecto: eu às vezes relembro o mesmo incidente
de modos diferentes e incompatíveis quando tento recordar-me em diferentes /
ocasiões. Em uma ou outra ocasião, então, a memória deve ter sido enganadora,
por menor que tenha sido a dúvida que senti no momento. É claro, é a minha
memória presente que me conta, agora, como me lembrei do mesmo incidente
quando me recordei dele em diferentes ocasiões, mas não preciso me apoiar em
minha memória presente para sustentar meu ponto, pois, se minha memória
presente está errada, então, novamente, ela pode ser indubitável no momento,
mas ser, ainda assim, errada. E, em outras esferas que não a memória de nosso
próprio passado, a certeza não exclui o erro.
Deveria isso nos conduzir a uma perplexa incerteza sobre tudo? Certa
mente, não precisamos ir tão longe, mesmo que, "logicamente", devêssemos.
A natureza, como observou Hume, colocou isso fora de nosso poder. Um ho
mem pode prender sua respiração por um certo tempo, mas não pode cometer
suicídio físico por prendê-la at é morrer; um homem pode suspender o juízo em
casos particulares, mas não pode cometer suicídio intelectual por uma suspensão
de juízo geral e persistente. Assim, continuaremos julgando isto ou aquilo como
sendo certamente o caso, e às vezes estaremos errados, e não há remédio para
isso, nem mesmo aprender a distinguir o tipo correto de certeza ou a suspensão
do juízo resolveria o problema. Muitas vezes, é claro, tanto teremos certeza (de
modo que não nos preocupamos) quanto estaremos corretos (de modo que não
havia nada com que se preocupar). E embora os homens errem com frequência,
eles podem corrigir os seus erros e adquirir uma disciplina mental que os torne
menos frequentes.
ºN. de T.: "Falso em uma coisa, falso em todas as coisas": princípio do direito romano que indica que
uma testemunha que mentiu uma vez pode estar mentindo sempre.
Razão e argumentação 29
4
Enunciados são verdadeiros ou falsos. Recusar-se a aceitar um enunciado
é afirmar ou sugerir que o enunciado é falso. Argumentos não são enunciados
e não podem ser verdadeiros ou falsos, mas as premissas de um argumento po
dem ser colocadas em questão como falsas ou como enunciados cuja verdade
I nferência é desconhecida. Essa é uma maneira de pôr um argumento em questão; outra
maneira é negar ou duvidar da validade da inferência das premissas para a con
clusão - "essa não é uma boa razão", "eu não vejo que se segue''. Essas são as duas
únicas maneiras possíveis de lançar dúvida sobre um argumento: questionar a
afirmação das premissas ou a validade da inferência. Algumas vezes, tenta-se
objetar a um argumento a partir de um terceiro fundamento: dizendo que a con
Argumentos são sempre muito diferentes de enunciados. Isso é reconhecido no clusão já "está implícita" na premissa, de modo que quem afirma as· premissas e
dito familiar "não estou argumentando, estou lhe dizendo!". Ao apresentar um então deriva a conclusão está supondo o que quer provar, o que chamamos uma
argumento, apresentamos certas razões, dispostas em sentenças, para derivar petição de princípio. Maus livros de lógica apresentam a petição de princípio
uma conclusão enunciada. As formulações verbais das razões são chamadas pre como uma falácia. Essa objeção, no entanto, é uma mera confusão, e na corte da
missas do argumento, e a transição das premissas para a conclusão é apresentada lógica deveria ser-lhe negada a palavra: se a conclusão está realmente implícita
por expressões como "e assim", "logo", "portanto", "consequentemente'; "segue-se nas premissas, então o argumento está logicamente perfeito - a conclusão real e
que" ou (em livros de lógica) pela palavra latina "ergo". Há uma tendência curiosa inevitavelmente se segue das premissas.
a confundir um argumento "isso, portanto aquilo" com um enunciado hipotético Um defensor da ideia de que uma petição de princípio é uma falha real
ou condicional empregando as mesmas sentenças, "se isso, então aquilo". Mas é em argumentos pode dizer: "um argumento que 'supõe o que quer provar' não
fácil encontrar exemplos para mostrar a diferença: "a guerra foi declarada, por precisa estar aberto a uma objeção de ordem lógica, mas é necessariamente inútil;
tanto, haverá pânico na Bolsa de Valores" não é o mesmo que "se a guerra foi se uma conclusão está realmente implícita nas premissas, certamente alguém que
declarada, haverá pânico na Bolsa de Valores". Um enunciado condicional, tanto conhece as premissas deve também conhecer a conclusão, de modo que a conclu
quanto qualquer outro enunciado, não é um argumento. são não lhe diz nada de novo". Aquele que faz essa objeção esquece que alguém
Neste capítulo, consideraremos apenas um uso de argumentos: a obten pode conhecer cada uma das premissas, mas jamais lhe ocorrer de pensar nas
ção de verdades a partir de premissas que você, que está argumentando, aceitou duas premissas conjuntamente e derivar a conclusão óbvia. Além disso, mesmo
previamente como verdadeiras. Você pode estar tentando descobrir verdades com as premissas diante de si, as pessoas variam muito em sua habilidade, natu
por sua própria conta; ou, por outro lado, pode estar tentando trazer alguma ral ou adquirida, de derivar conclusões a partir delas; dispor das premissas não
verdade à luz para alguém, partindo de premissas que tanto você quanto o seu in é garantia de que elas saberão como derivar a coiiclusão certa. Assim, o fato de
terlocutor aceitam .como verdadeiras. Você não pode, legitimamente, pretender uma conclusão estar implícita em suas premissas de forma alguma significa que
que o seu argumento deva convencer o outro a menos que você e ele estejam de derivá-la é um procedimento inútil. Em Pilgrim's Regress, de C. S. Lewis, a senho
acordo sobre certas premissas; e certamente haverá a possibilidade desse acordo, ra que é uma personificação da lógica responde ao questionamento urgente do
pois, sem qualquer acordo entre seus enunciados, você e o seu interlocutor não peregrino com "eu não posso lhe dizer o que eu sei, tudo o que posso lhe dizer é
poderiam falar e compreender a mesma língua. É claro que ele pode desafiar o que você sabe''. Mas, até que a lógica lhe diga, o peregrino pode não saber o que
qualquer premissa que você lhe apresentar : como Toddy Beamish • na pequena são as coisas que ele sabe.
história de H. G. Wells, The Man Who Could Work Miracles, que, a toda tentativa Nem todas as boas razões para uma conclusão são formuláveis em termos
de fazer com que ele aceitasse uma premissa, respondia com um irritante "é você de premissas nas quais a conclusão está implícita e das quais estritamente se
quem diz!''. Mas isso pode não passar de um truque para tirar vantagem. segue; podemos ter uma boa razão que não é conclusiva. Por exemplo, se o que
sabemos sobre um indivíduo X é simplesmente que X pertence a uma classe em
"N. de T.: Personagem de The Man Who Could Work Miracles.
que mais de noventa por cento dos membros têm certa propriedade, é razoável
30 P. T. Geach Razão e argumentação 31
concluir que X tem essa propriedade: afinal de contas, esse padrão de raciocínio ainda que ambas sejam verdadeiras, já que todos em Lyddon Hall falam inglês.
deve levar da verdade [ das premissas] para a verdade [ da conclusão] em mais de Podemos mostrar que a inferência é inválida substituindo "Lyddon Hall" pelo
noventa por cento dos possíveis argumentos que partem de tais pares de premis nome de alguma organização em que todos falam alguma língua, mas em que
sas verdadeiras. Mas tal conclusão pode ser negada por informações adicionais nenhuma língua é comum a todos, por exemplo, "as Nações Unidas"; nesse caso,
sobre X; nós podemos até mesmo ter argumentos que levam em direções opos haveria um argumento obviamente "tal e qual" (como dizemos) o argumento
tas, por exemplo: original, de modo que um é válido se e somente se o outro também o é; mas esse
segundo argumento não poderia ser válido tendo uma premissa verdadeira e
90 por cento dos suecos são 90 por cento dos peregrinos de Lourdes são uma conclusão falsa. Da mesma forma, os dois argumentos seguintes têm obvia
não católicos católicos mente a mesma estrutura e ambos são válidos com uma conclusão verdadeira:
Petersen é sueco Petersen é um peregrino de Lourdes
Ergo Petersen não é católico Ergo Petersen é católico Todas as garotas são mamíferos. Todas as garotas são serpentes.
Todos os mamíferos têm sangue quente. Todas as serpentes têm sangue quente.
Se as premissas são verdadeiras, devemos concluir que Petersen é católico Ergo Ergo
ou que ele não é? Todas as garotas têm sangue quente. Todas as garotas têm sangue quente.
Tais dificuldades não surgem de argumentos cujas conclusões se seguem
das premissas por implicação lógica: o que se segue logicamente de premissas mas um tem premissas verdadeiras, o outro, premissas falsas.
verdadeiras é verdadeiro, e nenhuma informação adicional pode nos dar razões
Por isso, se descobrim s que uma conclusão foi sustentada por premissas
para abrir mão de nossa conclusão, a menos que nos obrigue a revisar nossas pre
falsas ou por um argumento inválido, isso não significa que descobrimos que
missas. Quando se supõe que as premissas apresentam um fundamento lógico
a conclusão é falsa. Questionar as premissas ou negar a validade de algum ar
decisivo para a aceitação de uma conclusão, o argumento é dito válido se a con
gumento particular para a existência de Deus de forma alguma significa negar
clusão de fato se segue logicamente, caso contrário, o argumento é dito inválido.
ou duvidar da existência de Deus; negar a validade de um argumento bastante
Uma conclusão derivada validamente explicita o que está logicamente im
conhecido para a tese de que a Terra é redonda não faz de alguém um defensor
plícito nas premissas; assim, o raciocínio válido nunca pode levar de premissas
da tese de que a Terra é plana (uma suspeita que já caiu até mesmo sobre mim).
verdadeiras para uma conclusão falsa. Se uma conclusão se mostra falsa, sa
Da mesma forma, alguém pode ter bons fundamentos para suspeitar do
bemos que ou há algo de falso nas premissas ou o argumento era inválido, de
testemunho de um homem se ele apresenta um grande desejo de que algo seja o
modo que a conclusão não se seguia realmente das premissas, mas podemos ter
caso, de modo que possa se deixar levar por seu pensamento desejoso - ou ainda,
dificuldades em determinar o que houve de errado com o argumento. Se sabe
se é do seu interesse que as pessoas acreditem no que ele diz, independentemente
mos que as premissas são verdadeiras, a falha deve estar na forma do argumento
de ser verdade. Mas tais considerações não devem afetar nossa ponderação dos
empregada; se sabemos que a forma do argumento é válida, então uma ou outra
argumentos que um homem oferece; o conhecimento de suas inclinações ou de
premissa deve ser falsa; entretanto, podemos ser incapazes de dizer, de modo
seu interesse próprio pode fazer com que evitemos aceitar as premissas formu
definitivo, o que há de errado com um determinado argumento.
ladas por ele, mas que uma conclusão se siga de um conjunto de premissas pode
Por outro lado, premissas falsas ou um passo inválido na argumentação,
e deve ser julgado aparte de quaisquer opiniões que tenhamos a respeito dos
ou ambos juntos, não nos impedem de alcançar uma conclusão verdadeira. Por
processos mentais e dos motivos da pessoa que faz uso das premissas.
exemplo, a premissa:
A conclusão de um argumento pode servir de premissa em um segundo ar
gumento, e a conclusão deste, como premissa em um terceiro argumento, e assim
por diante; dessa forma, obtemos o que se chama cadeias de argumentação ou de
Todos em Lyddon Hall falam alguma 1/ngua.
raciocínio. Cadeias de raciocínio podem ser muito longas. Uma cadeia é tão forte
não sustenta a conclusão:
Há uma língua que todos em Lyddon Hall falam. quanto o seu elo mais fraco; mas uma corrente lógica, diferentemente de uma
32 P. T. Geach
5
física, não pode se romper por ser muito longa. Como podemos verificar uma
longa cadeia de raciocínio? Descartes aconselhava aumentarmos, com a prática,
a nossa habilidade de verificar mais e mais passos em uma única apreensão. Eu
temo que isso seja apenas uma maneira de você se persuadir de que você estava
certo, não uma maneira de evitar erros. A memória é, de fato, como Descartes
argumentava, perecível, mas isso sugere a verdadeira verificação - coloque o seu
Pontos de partida:
argumento no papel, e convide pessoas em quem você confia para verificá-lo
também.
observação, memória, testemunho
TÓPICOS PARA DISCUSSÃO
1. Desembarcando em um país estranho sem um dicionário, como um Muito de nossa crença racional sobre o mundo é uma inferência que parte de
homem poderia vir a aprender a língua nativa? A concordância sobre premissas, mas, se devemos crer em alguma coisa, deve haver crenças não infe
os fatos desempenha um papel essencial na comunicação entre ele e os ridas de onde possamos começar. Isso não significa que as crenças não inferidas
falantes nativos? Dê exemplos de fatos sobre os quais ele e os nativos são certas ou isentas de revisão. Tampouco os pontos de partida precisam ser
podem precisar concordar. os mesmos para todos: A e B, podem compartilhar uma crença, mas A pode ter
2. Pode haver estruturas conceituais alternativas, entre as quais não pode de chegar a ela através de uma inferência, enquanto para B ela é imediata e não
haver acordo sobre um conjunto de premissas aceitas? Se fosse o caso, inferida.
poderia um homem com tal estrutura vir a entender um homem com É bastante claro que observação e memória contrastam com inferência. A
outra? expressão de um juízo a que um homem chega quando observa algo apenas conta
3. Como podemos saber, independentemente do que é o caso, que um ar como um enunciado de observação se ele não precisa fazer uma inferência, mas
gumento, pelo menos, não está nos levando de uma premissa verdadeira chega a ele de forma imediata. (Isso será diferente para observadores treinados
para uma conclusão falsa? e para observadores não treinados; cf. Quine e Ullian, p. 19.) E se eu acredito em
4. "Não tenho uma boa capacidade de raciocínio, mas então eu sei que não algo sobre o meu passado porque alguém o disse para mim ou porque cheguei
tenho uma boa capacidade de raciocínio, e isso me dá uma vantagem; à conclusão de que tal evento deve ter ocorrido, então não estou lembrando o
quando ouço um argumento contra as minhas estimadas convicções e não evento passado em minha vida.
posso refutá-lo, eu simplesmente concluo que fui enganado por uma falácia Certamente, a memória e a observação de um homem não o levariam
plausível''. Quando é razoável decidir que um argumento deve ser falacioso, muito longe; ele começa como uma criança, confiando no testemunho de outras
em vez de decidir que uma crença, até então sustentada com firmeza, deve pessoas sem qualquer exame ou inferência, e seria impossível para um adulto
estar errada porque um argumento válido a apresenta como tal? sofisticado verificar muitas coisas. De fato, existem maneiras de descobrir se uma
autoridade em que já se acreditou não é confiável, mas, mesmo nesses casos, cada
um tem de se apoiar largamente nas considerações de outras pessoas, as quais são
conhecidas apenas por testemunho.
Obviamente, nem todo testemunho é confiável; um homem prudente terá
aprendido a aplicar certos princípios sobre o que faz de alguém um mau obser
vador ou um informante impreciso ou não veraz. Poder-se-ia dizer que esses
princípios são "aprendidos pela experiência''. Mas, novamente, não é apenas a
experiência pessoal do homem prudente que lhe ensina esses princípios; ele se
34 P. T. Geach
6
apoia na experiência geral de todos os homens sobre a confiabilidade de um tes
temunho - agora, o q ue a experiência geral de todos os homens vale é, novamen
te, algo q ue ele só pode aprender confiando em testemunhos.
Podemos nos apoiar em observações, memórias e testemunhos apenas de
um modo geral; tentar aceitar cada detalhe como verdadeiro res ultaria em posi
tiva inconsistência. Devemos, então, dizer: "um homem deve julgar por si mes
Usos da argumentação
mo"? Por um lado, isso é uma trivialidade; por outro, uma tolice completa. Se
significa q ue, o q ue q uer q ue um homem j ulg ue ser o caso, ele julga ser o caso,
então isso é uma tautologia, da q ual nada de interessante se segue; se, por o utro
lado, significa que um homem está logicamente proibido de aceitar a autoridade
de q ualq uer pessoa sobre qualquer coisa, então é um princípio claramente tolo. Extrair concl usões de premissas aceitas com o objetivo de chegar a concl usões
Um homem q ue decide confiar em uma autoridade está, de fato, fazendo um q ue você pode aceitar e submeter à aceitação é somente um uso de inferência.
j uízo sobre essa autoridade; entretanto, ao fazer isso, ele não está assumindo a Outros usos de argumentos válidos são os seguintes:
posição de um j uiz, não está se promovendo como uma autoridade superior.
Ao recomendar alguém como um bom advogado o u médico, e u não estou me 1 . Explorar as conseq uências de casos imaginários, por exemplo, em pro
j ulgando um advogado o u médico ainda melhor. blemas escolares de aritmética o u álgebra, em livros de enigmas o u na
composição de ficçõ7s. Esse uso de arg umento nos é muito familiar,
mas, ao q ue parece, alg uns homens de c ulturas primitivas consideram
TÓPICOS PARA DISCUSSÃO -no difícil de apreender; e, é claro, nós tivemos de aprender esse uso por
nós mesmos. Littlewood,• o matemático de Cambridge, nos conta uma
1. Um juízo sobre o q ue acontece u no passado está desqualificado como história de um professor q ue começo u a aula enunciando um problema:
memória se está baseado em razões. Pode uma "memória" ser desq uali "s uponha q ue y seja o número de ovos", "mas, senhor, por favor, por q ue
ficada como tal por estar baseada em causas erradas? - por exemplo, se não podemos s upor que y não seja o número de ovos?" (Por que essa
é provado que uma testemunha em um trib unal "lembro u" de alg umas questão é abs urda?)
coisas porq ue s ua esposa as contou no caminho para o j ulgamento? 2. Testar a conseq uência de uma suposição quando você ainda não se com
2. Como decidimos racionalmente que A é mais confiável em um assunto do prometeu com nada. Se, ao extrair conclusões validamente, você chega
que B, se a nossa própria opinião sobre o assunto não vale um centavo? a um res ultado falso (por exemplo, um resultado diretamente contrário
3. É comum dizermos que observamos a dor, a raiva, a s uspeição, a intenção, à observação), então, se você está certo de todas as o utras premissas em
etc., de uma pessoa mesmo q uando ela não expressa esses estados verbal pregadas, você sabe que a s uposição sob teste é falsa. Se, por o utro lado,
mente; podem os enunciados correspondentes contar como enunciados você nunca se depara com uma concl usão falsa, a suposição sob teste é, até
de observação? (Quine e Ullian, p.20) esse ponto, confirmada. (Isso é chamado de método hipotético-ded utivo:
ele é útil até mesmo em matemática pura.)
3. Arg umentos ad hominem. Esse termo latino indica q ue tais arg umentos
são endereçados a um homem partic ular - de fato, àquele com quem se
disp uta. Você toma algo em que ele acredita como premissa e infere uma
'N. de T.: John Edensor Littlewood (1885 -1977), matemático inglês conhecido por suas importantes
contribuições em teoria dos números.
36 P. T. Geach Razão e argumentação 37
rapac eou em
conclusão que ele não admitirá ser verda deira. Se vo cê não t
o brigada a asseri r sua conclusão e tampouco autorizada a dizer que deu uma
seu oponen prova del a: Mas há uma exceção importante. Considere um homem que afirme
seu raciocínio, terá mo st rado que o atual corpo de crenças de
l m lgum l gar. Esse tru que as pre missas P e Q e agora adicione uma terc eira pre missa R ap ena s como supo
te é inconsistente , e cab e a el e mo dificá- o e a u
te o
argument ativo é tão inconveniente para a vítim� q� e ela p rov �velmen sição. Se, das premissas P, Q e R todas juntas se segue l ogicamente a falsidade de
ro s de logic a fal am ate mesm da R, então a sua afirmação de P e Q o autoriza, em seguida, a afirmar que R é falsa
en c arará c omo trapaça. Antigo s maus liv
o
go stam de ser mco Então, tais e tais experimentos tiveram os resultados que M. N. relata.
deve ser modificada. É claro que as pessoas geralmente nao
que os argumento s ad Mas, se os resultados foram tais como M. N. relata, algum testemunho ocular
modadas em suas confortáveis inconsistências. É por isso é seriamente inconfiável (porque o testemunho ocular das pessoas usadas
hominem têm má reput ação. como objeto de experimento terá provado ser assim).
Reductio ad absurdum [redução ao absurdo] . Se a pessoa qu
e argu menta
Então, algum testemunho ocular é seriamente inconfiável.
somente p ara �ns de
emprega alguma ou algumas premissas que ela assumiu
argu me ntação, el a n ão e stá e m geral
comp�o metida em afirr�ar,,� conclusao �ue Esse argumento é uma reductio ad absurdum válida, e est aríamo s autori
,
e xtraiu de las; c omo Alic e,* que prote
stou eu disse somente �e , ela pod� dize� z ado s- a afirmar a sua conclusão. No te que, ao e xt rair a conclusão, eu não assiro
"eu disse somente 'suponh a _ se ela não asseriu suas
"' premissas, ela nao est a
'N. de T.: Por asserção entende-se o ato ou o conteúdo do ato de declarar ou de tomar como verdadeira
'N. de T.: Personagem de Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll. uma determinada proposição, quer afirmativa quer negativa, quer verdadeira quer falsa.
38 P. T. Geach
Razão e argumentação 39
a premissa de que o testemunho ocular é confiável com o objetivo de extrair a
todos os números primos até P, incluindo P, e some l.' O número resultante, di
conclusão de que ele não é; o que eu afirmo sobre M. N. não é que ele deu tal e
gamos N, claramente não tem como um fator primo qualquer dos números pri
tal testemunho de modo confiável, mas somente que ele deu um testemunho - e,
mos até P, já que, da divisão, sempre haverá o resto 1 . (O próprio 1 não é contado
se ele foi impreciso ou mentiroso ao fazê-lo, então, longe de lançar dúvida sobre
como número primo). Então, esse número N terá algum fator primo maior que
a minha conclusão, isso a confirma.
P; N pode, é claro, ser ele mesmo primo, mas então N é obviamente maior que P,
Por outro lado, as pessoas frequentemente parecem preparadas para acredi
assim, não faz diferença se N é seu próprio e único fator primo. Dessa forma, P
não é o maior número primo. Nós chegamos a esse resultado assumindo (não as
tar sem questionar as explicações dadas para tais resultados experimentais e para
serindo) que P é o maior número primo e usando ao longo do percurso' algumas
dizer que aqui há "prova científica" de que o testemunho ocular, por exemplo, em
tribunais de justiça, é inconfiável. É muito difícil dar sentido a uma posição como
verdades óbvias sobre números, que nós asserimos; agora, estamos autorizados a
asserir que P não é o maior número primo, independente de que número seja -
essa. Provavelmente, aqueles que a mantiverem serão levados por boatos que, sob
qualquer ponto de vista, são menos confiáveis que testemunhos oculares; mas,
ou seja, que não há o maior número primo.
mesmo no caso mais favorável em que eles tenham ouvido ou lido um testemu
nho ocular dos experimentos, eles são indefensavelmente inconsistentes. Pois,
para estarem autorizados a afirmar que os experimentos ocorreram como foram TÓPICOS DE DISCUSSÃO
descritos, eles tinham de afirmar a confiabilidade desse testemunho ocular, mas a
conclusão final lança dúvida sobre os testemunhos oculares; e então o que torna 1. Qual é a diferença entre derivar validamente uma conclusão e prová-la?
diferente a posição da testemunha ocular desses experimentos? O mero fato de 2. Aristóteles disse que as regras para derivar conclusões eram exatamente
que sua evidência, como vimos, provê uma prova válida por reductio ad absur as mesmas para o raciocínio demonstrativo (a partir das premissas que
dum de que testemunhas oculares podem ser muito inconfiáveis; mas, então, por são conhecidas como certas) e para o raciocínio dialético (a partir de
essa explicação, nós podemos e devemos ser cuidadosos em acreditar em todos premissas que são assumidas somente para fins de argumentação). Aris
os relatos que emanam dos laboratórios de psicologia. (Alguns deles - como o tóteles estava certo?
relato que ouvi uma vez sobre um jovem macaco que podia falar tal como uma 3. Se você argumenta ad hominem a partir de uma premissa que o seu opo
criança humana - trazem a marca da fraude ou autoengano estampada em sua nente acredita ser verdadeira, mas você sabe ser falsa, por que isso não é
face). uma trapaça? Por que isso é melhor que usar um método de argumentação
A reductio ad absurdum é uma ferramenta para obter conhecimento, não que você sabe ser inválido embora o seu oponente possa tomá-lo como
apenas um bom truque dialético. G. H. Hardy: o matemático de Cambridge, válido?
disse que a reductio ad absurdum é um movimento muito mais brilhante que 4. "A reductio ad absurdum é um procedimento ridículo. Você pretende ter
qualquer sacrifício no xadrez; para vencer o jogo, você oferece não alguma peça provado uma conclusão, mas, se você a provou, então, nos seus próprios
importante, mas o jogo. Um exemplo de um movimento particularmente bri termos, uma das premissas que você utilizou é falsa; e como você pode
lhante vem de Euclides. Euclides ataca o problema de se os números primos - provar algo a partir de uma premissa falsa? Deduções a partir de premis
que se tornam cada vez mais raros à medida que se avança na série dos números sas falsas podem tanto ser verdadeiras quanto falsas''. Isso mostra que o
- finalmente se extinguem: se há um maior número primo, além do qual não método é inválido?
existam outros números primos. Ele prova que não há o maior número primo as
sumindo que há! Suponha que P seja o maior número primo. Então, multiplique
"N. de T.: Godfrey Harold Hardy (1877-1947), matemático inglês conhecido por sua contribuição à
'N. de R.T.: O autor está implicitamente lançando mão de uma propriedade elementar da divisão e
teoria dos números e à análise matemática, ramo da matemática que lida com os conceitos introdu-
da soma, qual seja, se um número divide a soma e um dos membros da soma, então divide o outro
zidos pelo cálculo diferencial.
membro.
Razão e argumentação 41
7
ções são contraditórias. Você pode mecanicamente formar a contraditória co
locando "não é o caso que" na frente de uma proposição. Outra palavra para a
contraditória de uma proposição é: a negação de uma proposição. Uma vez que a
negação significa trocar de sim para não ou de não para sim, como uma resposta
Validade lógica a uma determinada questão, a dupla negação cancela a troca e nos leva de volta à
resposta com a qual começamos.
EXERCÍCIOS
Se, partindo da verdade, somos conduzidos à falsidade, sabemos que a nossa 1. Veja se você pode construir um argumento "tal e qual" o seguinte argu
conclusão foi extraída por um processo inválido. Por outro lado, é às vezes óbvio mento plausível, mas inválido:
em uma instância particular que a conclusão se segue das premissas - não preci Tudo é causado por algo outro; ergo algo causa tudo o mais.
samos saber se a conclusão e as premissas são verdadeiras ou não. (O argumento construído deveria ser manifestamente inválido.)
Quando não é óbvio que uma conclusão se segue das premissas, nós 2. O argumento seguinte é válido ou inválido? Como você decidiria a
podemos nos satisfazer construindo uma corrente de poucos elos das premissas questão?
para a conclusão, cada um deles óbvio. "Um passo me basta!''. A maioria dos suecos é protestante;
Grosso modo, nós podemos testar a validade/invalidade de um argumento, A maioria dos suecos que visita Lourdes não é protestante;
quando estamos em dúvida, observando que é "tal e qual" um argumento mani Logo, a maioria dos suecos não visita Lourdes.
festamente inválido. "Você bem poderia dizer. . .''. Mas esse é um procedimento
de tentativa e erro. O único método em que podemos confiar é criar uma ma 3. Esses pares de proposições são contraditórios? São essas proposições as
neira de mostrar a forma lógica comum a argumentos que são semelhantes. Essa respostas sim e não para as mesmas questões?
foi uma conquista de Aristóteles; ninguém, até onde sabemos, pensou em algo Para que B sobreviva, ele deve beber a água da sua garrafa.
assim antes; nós ainda usamos seu termo "esquema" [do grego, schema; plural Para que B sobreviva, ele não deve beber a água da sua garrafa.
schemata] para a maneira de exibir um modelo lógico abstrato. Esquemas lógicos (Você pode imaginar o pobre B em um apuro que torne ambas as sentenças
são o verdadeiro esqueleto da lógica - nós os discutiremos no capítulo 10. Antes verdadeiras?)
de chegar aos esquemas lógicos, precisamos de uma ideia clara de proposições e O museu está aberto até outubro.
contraditórios. O museu não está aberto até outubro.
Como vimos no último capítulo, quando um argumento é proposto por
A expressão "não está" está nesta sentença.
alguém que pretende que a conclusão se siga, essa pessoa não está necessaria
A expressão "não está" não está nesta sentença.
mente garantindo a verdade nem das premissas nem da conclusão. Desse modo,
deveríamos dizer que as regras lógicas de inferência dizem respeito a proposições,
teses apresentadas para consideração, e não necessariamente a enunciados, isto é,
proposições asseridas. Uma proposição é verdadeira ou falsa independentemente
de você asseri-la. Quando você garante que uma conclusão se segue, você não
garante a sua verdade, a menos que se comprometa com a asserção as premissas.
Qualquer proposição pode ser considerada como uma das duas respostas
possíveis a uma questão "sim-ou-não". A contraditória de uma proposição é a
outra das duas respostas possíveis. Muitas vezes não é óbvio se duas proposi-
Razão e argumentação 43
8
é transposto, o problema da verdade como tal desaparece. Seja A a proposição
"nosso real Senhor e Soberano faleceu"; uma vez que sabemos que A significa
apenas "nosso rei está morto", atribuir verdade a A suscita todos e apenas os
problemas de atribuir a morte ao rei. A morte é, de fato, um problema filosófico
Verdade e falsidade - mas a verdade dos obituários não é um problema extra.
Outra razão para explorarmos a ideia de tipos ou sentidos de "verdadeiro"
pode aparecer se considerarmos a figura de discurso denominada asseveração.
Nós dizemos "tal-e-tal é tão certo quanto qual-e-qual" - afirmamos com vee
mência a verdade da primeira proposição enunciada ligando�a, dessa maneira, à
supostamente óbvia verdade da segunda. "Ele é culpado, isso é tão certo quanto
Até aqui viemos usando a palavra "verdadeiro" sem explicação ou definição; isso eu estar em pé aqui; ele será logo capturado, isso é tão certo quanto ovos serem
não significa que não tínhamos o direito de usá-la, tampouco que a compreende ovos; e então ele vai dançar, tão certo quanto Deus ter criado as maçãzinhas''. A
mos tão bem que nenhum problema possa resultar daí. efetividade das asseverações depende apenas de que as proposições colocadas
"Verdadeiro" é aplicado com variações; nós estaremos preocupados com o após "tão certo quanto" sejam aceitáveis como verdades óbvias: não importa que
uso de "verdadeiro" - ou, se for o caso, "falso" - para caracterizar o que as pessoas uma verdade seja de observação, outra, lógica e a última, religiosa.
dizem. O que as pessoas dizem é verdadeiro ou falso apenas se estão afirmando o Os lógicos recentemente introduziram o termo "o valor de verdade de uma
que dizem: se digo "é falso sustentar que a Terra é plana'', a subsentença "a Terra proposição" para significar sua verdade se é verdadeira e sua falsidade se é falsa.
é plana'' é falsa, isso porque o que eu mesmo afirmo - "é falso sustentar que" - é Eles também falam de condições de verdade significando condições necessárias
verdadeiro. Ninguém precisa realmente ter afirmado que a Terra é plana - muito e suficientes para que uma proposição seja verdadeira: por exemplo, uma con
embora, na verdade, algumas pessoas o tenham feito - para tornar verdadeiro o junção - uma proposição com a conjunção "e" - é verdadeira se e somente se
que eu digo. cada uma das conjuntivas é verdadeira. A expressão "sse" é a abreviação de "se e
Conforme a explicação de "contraditório" ou "negação" apresentada no Capí somente se''.
tulo 7, uma proposição é falsa se e somente se sua negação ou contraditória é
verdadeira e verdadeira se e somente se sua negação ou contraditória é falsa.
Assim, de quaisquer duas contraditórias, uma é verdadeira e a outra é falsa - a TÓPICOS DE DISCUSSÃO
menos que se possa dizer que a questão de tipo "sim-ou-não" para a qual ambas
são respostas é uma questão que não vem ao caso. (Exatamente quando isso pode 1. "É verdade que Smith bebe muito" significa o mesmo que "Smith bebe
ser propriamente dito é um ponto de grande disputa entre filósofos; eu não posso muito"? E "é falso que a Terra é plana" significa o mesmo que "a Terra
entrar na disputa aqui.) não é plana"?
Alguns filósofos pensam haver diferentes tipos de verdade - verdade empí 2. Pode um critério de verdade ser dado - por exemplo, "um enunciado é
rica ou factual, verdade lógica, verdade matemática, verdade religiosa, etc. Mas verdadeiro sse é útil acreditar nele", ou "sse se encaixa em um sistema
alguns princípios tais como o de que uma falsidade não pode ser inferida de um coerente de enunciados"?
conjunto de verdades são anteriores a essas supostas diferenças entre os tipos de 3. Os lógicos estão justificados em abstrair do tipo de verdade em questão
verdade. e enunciar princípios como "de verdades somente verdades podem ser
Se tomamos qualquer proposição específica, vemos que atribuir verdade inferidas"?
a ela dificilmente gera algum problema concernente à verdade - ainda menos
sobre os supostos tipos de verdade ou sentidos de "verdadeiro''. Se a proposição
nos é dita em uma língua estrangeira ou em um jargão não familiar, então de fato
não sabemos o que significa atribuir verdade a ela, mas, quando esse obstáculo
Razão e argumentação 45
9
Sócrates costumava sustentar que ninguém tem o direito de defender uma
tese a menos que esteja preparado (se desafiado) pará dar uma definição das
palavras-chave usadas no enunciado da tese: a incapacidade de fazê-lo significa
que você não sabia o que estava falando ao enunciar a tese. Isso poderia muito
bem se aplicar a ele se uma de suas vítimas replicasse: "ora, Sócrates, por favor,
Definição defina 'definição'!", dando-lhe uma prova de seu próprio remédio; "então você
não pode definir 'definição' satisfatoriamente? Muito bem então: você não sabe
o que você está falando quando diz que devemos ser capazes de dar definições
- ·nesse caso, eu não preciso mais perder meu tempo com a sua dialética inútil".
Em instâncias concretas, a demanda socrática é extravagante. Eu certamente não
Em uma obra como esta, o tópico definição pode ser apenas brevemente e, por poderia definir "carvalho" ou "elefante", mas isso não elimina o meu direito de
tanto, inadequadamente discutido. Uma valorosa contribuição para ampliar o afirmar que nenhum carvalho é um elefante, e meus leitores não achariam difícil
conhecimento nesse tema é o livro Definition (O.U.P., 1972) de Richard Robin compreender essa tese, nem, provavelmente, estariam inclinados a desafiá-la.
son - um livro de muita perspicácia e discernimento, adornado com uma rica Sócrates não pedia meramente uma definição, mas uma que nos capacitas-
variedade de exemplos bem selecionados, tanto das próprias definições quanto , se a decidir em casos marginais ou duvidosos. Essa demanda é ainda mais des
das regras e teorias formuladas a respeito da definição. cabida. Retornemos ao meu exemplo: poderia muito bem haver por aí animais e
Em debates não acadêmicos, orais ou em colunas de jornais, "defina seus plantas sobre os quais eu foss'e absolutamente incapaz de decidir se são elefantes
termos!" é uma moção frequente: "concordemos, primeiramente, na definição de ou carvalhos, como pode ser o caso, mas qualquer coisa que possa, ainda que
nossos termos" é mais polido e menos incisivo, mas não é logicamente diferente. vaga e imprecisamente, contar como carvalho certamente não é um elefante, e
Mas claramente esse não é um pedido que pode ser sempre legitimamente aten qualquer coisa que possa, ainda que vaga e imprecisamente, contar como elefante
dido. Se uma definição é dada em palavras, pode ser pedido novamente que essas certamente não é um carvalho.
palavras sejam definidas - e não haveria um fim para isso, ou então a discussão A dialética socrática foi tomada em seu tempo como moralmente pernicio
não poderia sequer começar, nunca tomaria um caminho. "Defina seus termos!" sa. De fato, pode-se muito bem imaginar que um homem seja moralmente ofen
é um meio tão efetivo de parar uma discussão quanto a maneira de Toddy Be dido se decidiu que, até ter definições incontestáveis de "fraude" e "injusto", deve
amish • reagir a cada premissa apresentada para seu assentimento com "é você suspender o juízo sobre se fraudar é injusto. Na filosofia moral do nosso tem
quem está dizendo!", mas é tão descabido quanto, pois é óbvio que a nossa habi po, podem ser encontrados argumentos no estilo socrático. O qu� segue mostra
lidade para compreender nossos companheiros e o nosso direito de assentir ao claramente o tipo de coisa que encontramos. "O que é a vida? Nós podemos defi
que eles dizem não podem depender ?ª
formulação de definições torm�is e� nir o momento da morte? Nós podemos, além disso, definir a real diferença entre
palavras para os termos empregados. E claro que nossa compreensao mutua e, matar e falhar em preservar a vida? E o que é um bebê? Cãezinhos saudáveis
com muita frequência, imperfeita, mas, então, produzir uma definição formal em nascidos de uma mãe humana poderiam ser considerados bebês? - se você não
palavras não é necessariamente nem a única nem a melhor maneira de eliminar pode responder a essas questões, você não tem o direito de dizer com confiança
o mal-entendido. que é errado matar bebês, uma vez que você não sabe o que significa "matar" ou
"bebê''. O pedido "defina seus termos !" não é prejudicial somente na teoria.
A maneira correta de replicar a um filósofo moral que argumenta assim não
é tentar responder às suas questões, mas lembrá-lo dos carvalhos e dos elefantes;
há espécies claras destes, ainda que também haja casos marginais; e, do mesmo
modo, há casos em que, claramente, o ato proposto é matar um bebê, mesmo se
também houver casos marginais. Tampouco alguém é logicamente obrigado a
"N. de R.T.: Personagem do conto "Toe M an Who Could Work Mi racles" (O Home� q u e Realizava
Milagres) de H. G. Wells, posteriormente ampliado para o roteiro do filme de mesmo titulo, ?e grnn�e
sucesso na Inglaterra à époc a (1936), q ue, num a disc ussão sobre m� agres, opunha-se a pos1çao
_ dizer como aplicaria seus termos nos casos fantásticos inventados por filósofos
advers ár ia com um "monótono, mas efetivo 'é você q uem esta dizendo
46 P. T. Geach Razão e argumentação 47
morais e dizer, por exemplo, se estaríamos lidando com bebês caso uma mãe ender palavras usadas em sentenças, as quais elas mesmas têm sentido enquanto
humana de.sse à luz cachorrinhos; ele pode simplesmente responder, no estilo complexos no ambiente dos seres humanos e em conexão com atividades prá
Tommy Traddels de Dickens:' "mas você sabe que isso não aconteceria; então, ticas; e, depois de um tempo, as crianças passam a compreender novas combi
por favor, não suponhamos isso''. nações de palavras e a produzir novas combinações por elas mesmas. Teorias
Na teoria, na especulação, as ideias socráticas sobre definições foram muito filosóficas do conhecimento e do significado, e teorias psicológicas do aprendi
nocivas. Uma maneira útil de compreender o significado de um termo imper zado da linguagem estarão condenadas à futilidade se esse fato for esquecido ou
feitamente claro é produzir algum bom exemplo em que o termo claramente se negligenciado.
aplica. Platão representa Sócrates como objetando a esse procedimento: a menos É uma tradição de longa data distinguir entre definições reais e nominais.
que já saibamos muito bem o que o termo significa, não haveria exemplos in Definições reais visam a delimitar uma classe de coisas que corresponderão a uma
questionáveis que pudessem mostrá-lo; então, exemplos são inúteis de qualquer espécie natural, como ouro ou ácidos. Locke desistiu de procurar espécies natu
maneira. A verdade é que, se o mal-entendido surge, ele pode ser resolvido tanto rais no mundo, mas o fez prematuramente; a irregularidade no comportamento
pela produção de critérios para usar um termo quanto pela apresentação de de algumas substâncias químicas chamadas por um nome dado, que foi tão frus
bons e claros exemplos: podemos nos valer de exemplos para obter critérios a trante para bs químicos na época de Locke, foi removida por melhores métodos
que eles se ajustam e podemos usar os critérios para aplicar o termo a novos de preparo e purificação de substâncias. Locke concebeu as espécies de coisas
exemplos. Mas, se não temos nem critérios nem exemplos, o mal-entendido ori no mundo como formando um espectro contínuo, em que os homens fariam
ginal pode persistir; na típica investigação socrática, uma definição está ainda divisões arbitrárias com propósitos práticos; mas, na verdade, o próprio espectro
por ser encontrada, mas exemplos são rejeitados - então, não surpreende que o mostra a falha dessa concepção - linhas espectrais correspondem a radiações
propósito ostensivo da investigação seja frustrado no impasse resultante, embora de elementos químicos definidos, cujas propriedades, nós acreditamos, perma
os oponentes tenham uma genuína diversão filosófica ao longo do caminho. necem as mesmas mesmo em estrelas remotas cujos espectros nós observamos.
Uma maneira de explicar termos muito diferente da definição verbal é a Precisamos, então, reconhecer as espécies naturais de coisas, e conceitualizar esse
explicação ou definição ostensiva: apontar para um caso típico da aplicação cor reconhecimento em forma de palavras descrevendo uma espécie dada: tal é a
reta do termo e dizer "isto é assim-assim''. Ao perceberem que, se todos os termos definição real, que cientistas continuam naturalmente atualizando.
devessem ser definidos somente por meio de definições verbais, nunca poderí A definição nominal, por sua vez, diz respeito ao uso de um termo. Um
amos sequer começar, filósofos algumas vezes sustentaram que devemos partir tipo de definição nominal aceita o uso estabelecido e se ocupa de selecionar e ca
de definições ostensivas, e então definir outras palavras, direta ou indiretamente, racterizar tão precisamente quanto possível os verdadeiros usos de uma palavra;
nos termos destas. Mas há uma dificuldade em atribuir à definição ostensiva esse esse é o tipo de definição que você encontra em um bom dicionário - embora
papel primitivo e fundamental. Se o aprendiz já apreende que tipo de palavra está dicionários contenham também um certo número do que contaria como defi
sendo ostensivamente explicada, por exemplo, que é um nome de uma pessoa, nições reais, como as já descritas. Outro tipo de definição nominal não apenas
um adjetivo de cor, uma palavra para uma direção (como "norte"), etc., então aceita o uso corrente, qualquer que seja ele, mas constitui uma proposta para
o ensinamento ostensivo pode torná-lo apto a preencher uma lacuna em sua fixar o uso de um termo; sob a proposta, o termo seria aplicado, na maioria das
compreensão; se ele falha em apreender isso, ele pode ridiculamente se confun vezes, como ele o é nos dias de hoje, mas com critérios mais estritos; ou então, o
dir. Agora, que tipo de palavra uma palavra é, é uma questão sobre seu uso no proponente da definição pode sugerir que abandonemos alguns usos correntes e
contexto de uma sentença; e seria um milagre se um ensinamento ostensivo de permaneçamos apenas com um uso preferido. Finalmente, a uma velha palavra
palavras isoladas indicasse isso. Foi suposto, algumas vezes, que a definição os pode ser arbitrariamente dado um significado totalmente novo - como quando
tensiva desempenha um papel crucial no aprendizado da língua materna. Mas, Humpty-Dumpty' estipulou que "glória" significaria "um argumento demolidor''.
na verdade, ela desempenha um papel muito menor: crianças passam a compre- Isso é inofensivo enquanto o novo significado conferido arbitrariamente estiver
ºN. de.T.: Personagem de Alice nos País dos Espelhos de Lewis Carrol! (1832-1898).
ºN. de.T.: Personagem do livro David Copperfield de Charles Dickens (1812-1870).
48 P. T. Geach
Razão e argumentação 49
longe o bastante do velho s ign ificado; mas filósofos têm introduzido, geralmente O fato de haver uma instância da notação de potênc ia na expl icação dessa
de modo insensato, termos assim defin idos por estip ulações em contextos em notação claramente não nos leva a um regresso vicioso; pois, dado q ua is são os
q ue o leitor poderia facilmente escorregar, de modo inconsc iente, para o velho números a e n, podemos desenvolver, em um número fin ito de passos, q ue nú
s ign ificado fam il iar; e eu rece io q ue alg uns filósofos tenham ass im enganado eles mero a11 é - por exemplo, 35 é 3 x 3 x 3 x 3 x 3 o u 243.
mesmos, tanto q uanto confund ido se us le itores. Além d isso, expl icações rec ursi vas são freq uentemente usadas em lógica
Matemáticos têm um velho háb ito de pegar palavras no varejo e dar a elas para caracterizar a classe de fórm ulas bem formadas (fbfs)' em certas áreas da
novos s ignificados no est ilo H umpty-D umpty. "Esferá', "cone", "c il indro", "p irâ lógica, em certos cálc ulos lógicos restritos. Por exemplo, as fbfs do cálc ulo de
mide", vêm do grego; os geômetras gregos usaram as palavras comuns para "bola", eq uivalências, na notação polonesa," podem ser caracter izadas como se seg ue:
"p inha", "rolo de jardim" e "bolo de trigo': e isso, é claro, não ca uso u confusão.
No jargão matemát ico moderno encontramos palavras como "grade", "anel': 1. As letras "p, q, r" - com o u sem o s inal " ' " j unto a elas - são fbfs.
(Cada
"corrente" e "filtro". Mas, mesmo em matemát ica, o risco de s urg ir confusão do uma dessas letras é um res umo para uma propos
ição arb itrariamente
uso famil iar de palavras não é de todo negligenciável: poderia ser mostrado, escolh ida.)
acred ito, que int uições fundamentalmente confusas em teoria dos conj untos 2. A letra "E" seg uida por d uas fbfs do cálc ulo de eq uivalentes é u
ma fbf
s urgem da associação dos termos matemát icos "conjunto" e "classe" com usos ("Epq" é l ida como "p se e somente se q".)
tão famil iares q uanto em "conjunto musical" e "classe de relig ião''. 3. Não há o utras fbfs no cálc ulo.
É necessár io um c uidado espec ial com a defin ição de termos relativos -
palavras q ue expressam relação, como "pa i". Nós devemos primeiro explicar o Dada essa explicação rec ursiva, nós podemos determ inar passo a passo q ue
q ue é para A ser pa i de B; então podemos explicar o q ue é ser um pai - "ser um seq uênc ias de letras são fbfs. Por exemplo, "E'p'q", "pqEr': "EEpqrs" não são fbfs;
pai" sign ifica "ser pai de alguém''. Q uem é pa i de q uem determ ina q uem pertence mas "EEpq'Eq'p" é uma fbf, q ue s ignifica " (p se e somente se q') se e somente se
à classe dos pa is, não o contrár io; nós não poderíamos começar apenas com a (q' se e somente se p)".
ide ia de ser um pai, e então explicar o ser pa i de A em termos de alg um modo
q ue A tenha o u possua o "se u" ser pai. (Esse é o ponto do velho sofisma grego
seg undo o q ual se um cão é um pai e é se u, ele é seu pai: por q ue isso não se seg ue, TÓPICOS PARA DISCUSSÃO
uma vez q ue um cão q ue é um dálmata e é se u é o se u dálmata?) Nesse caso, a
q uestão talvez seja bastante óbvia, mas muitas definições falhas de termos, q ue 1. O objeto de uma definição real deve, de fato, exist ir? (Poder ia haver uma
pecam contra o pr incíp io aq ui il ustrado, foram dadas; por exemplo, ao pretender defin ição real de uma s ubstância q uímica q ue não ocorre naturalmente
defin ir o termo "número" em vez de "o número de As", o u o termo "amor" e não e q ue ainda não fo i sintet izada?)
"amor de uma pessoa X por uma pessoa Y". 2. Q ual é a objeção à definição circ ular? Por q ue ela não se apl ica a definições
Uma classe importante de defin ições é a de defin ições recursivas. Pode-se, rec urs ivas?
por exemplo, definir "ancestral" como seg ue: A é ancestral de B se e somente 3. Frequentemente o uvimos q ue A é B "por definição''. O q ue isso s ign ifica?
se: o u bem A é pa i de B, o u A é pa i de alg um ancestral de B. O termo a ser Pode uma defin ição tornar uma proposição verdadeira?
definido reaparece na definição, mas isso de forma alg uma a torna inút il; é uma 4. Disc uta algumas das definições oferecidas por filósofos que, pode ser s us
conseq uência imed iata q ue os pa is de B são se us ancestrais, e pode ser mostrado tentado, pecam contra o nosso cânone para a definição de termos relativos.
em po ucos passos que a mãe do pa i da mãe do pa i de B é uma ancestral de B.
Defin ições rec urs ivas são de uso freq uente em lóg ica simbólica e em mate
mát ica. Por exemplo, a notação de potência pode ser explicada assim, se "n" está
"N. de'.T.: Tradução do inglês "wffs" ("well formed formula
s").
por um número inteiro:
··N. de. R.T.: A notação polonesa é uma maneira de escrever as
fórmulas nas quais os operadores
ocorrem no início da expressão, antecedendo seus argumentos. Trata-se
de uma maneira pouco usual,
mas qu: tem a virtude de dispensar o uso de parênteses. Para o leitor
se n = O, a11 = l; se n > O, a 11 = a x a 11· 1
ter uma ideia da diferenç a entre
a notaçao polonesa e a usual, pode pensar como ficaria a expressã
o aritmética usual "(2+3)-2 " em
notação polonesa: "-+2,3,2" ; ao passo que "2+(3-2) " seria "+2-3,2''.
Razão e argumentação 51
10
dif er ent e d a cat egoria d e nomes próprios. As l et ras m aiúscul as "F " e "G" repre
s entam pr edicados.
A p al avr a "é" é um a m er a concessão a ce rtos idiomas e não d esemp enh a
pap el lógico ess enci al alg um (no russo, por ex emplo, pod e -s e dizer ap en as: "John
Esquemas lógicos m ais int eligente", "John velh aco"). Em lógica, um nome próprio e um p redicado
articul am-se p ara forma r um a s ent enç a; lógicos no rm alment e us am a not ação
Fa em v ez d e "a é F", que t enho us ado. Assim, não há p robl em a alg um em toma r
"Edith inv ej a H erb ert" e "Sócrat es é mort al'' como d uas int erp ret açõ es concretas
d e Fa, m esmo q ue um a cont enh a o t ermo "é" e a o utr a não.
A m an ei ra m ais rápid a e fácil d e d ar int erpr et açõ es d e l etr as p redicativas é
Os t rês arg umentos s eguint es, embo ra obviam ente dif er entes quanto à form a acr escent ando um ast erisco, "*", q ue é um m ero sin al p ara o p reenchim ento d e
g ram atical, são instâncias d e um a m esma form a lógica: um a l acun a - a l acun a pode s er preenchid a com o nom e d e qualquer bom e v elho
obj eto do universo. Assim, d ado:
1. Todo filósofo é mort al; Sócrates é filósofo; po rtanto, Sócr ates é mo rt al.
2. Edith inv ej a todos q ue são m ais sort udos do que Edith; He rb ert é m ais a = Edith, F* = * inv ej a H erb ert ou ainda
so rt udo do q ue Edith; portanto, Edith invej a H erb ert. a = H erbert, F* = Edith inv eja *
3. H erbe rt é menos sortudo do q ue todos que inv ejam H erbert; Edith inv ej a
H erbert; port anto, H erb ert é m enos sortudo do q ue Edith.
/
consid eramos "Edith inv ej a H erb ert" como a leit ura d e Fa o u "a é F". (Ambas as
int erp ret ações v al em.)
A única m aneira prática de rep resent ar um a form a lógica é aq uel a invent a E com as l eitur as:
d a po r Aristót el es; n ess e caso, nós d ev emos t er:
F* = * é m ais sort udo do q ue Edith G* = Edith inv eja *
4. Todo F é G; a é F; port anto, a é G.
As l et ras "F ", "G" e "a" são cham adas de letras esquemáticas e (4) é ch am ado "Todo F é G" s erá int erp retado como "todo ( aquel e q ue é) m ais sort udo
um esquema ( um t ermo q ue remont a a A ristót el es). Os m an uais freq uent ement e do que Edith, Edith inv eja''. O "aq uele" de "todo aq uel e" exp ress a a escolh a do
usam a p al av ra "v ariáv e is", m as eles s e v al em d ess e t ermo t ambém p ara o ut ros Univ erso e o "que é" é um a exigênci a g ram atical de certos idiom as - ess es t ermos
usos d e l etr as sing ul ares - o qu e não nos int eress a aqui. pod eriam s er suprimidos em o utras línguas (como em l atim, po r exemplo).
Cad a l et ra esquemática t em certo domínio d e interpretações: a l et ra mi "Todo", "alg um" e "n enh um" não p ertencem n em à cat egoria dos nomes
núscul a "a " é uma letr a que repr es enta nom es p róp rios. Q uando p ass amos d e " a nem àq uel a dos predicados; el es são quantificadores. Exp ressões como "todo ho
p ara G" p ar a "Sócrat es é homem", nós est amos inte rp ret ando "a" por "Sócrat es". mem" (todo mundo) e "algum homem'' ( alg uém) p arecem mais com nom es do
F al amos d a categoria dos nom es próprios. q ue predicados ou quantificadores, m as piad as sobre "ning uém'' como um nome
É conv eni ent e considerar, em um p rimeiro momento, argum entos q ue di têm m ais d e 3 mil anos e não é difícil v er que, enq uanto "Sócrat es" nomei a Sócra
zem resp eito a obj etos contidos d ent ro de alg um a class e d efinid a. Ess a cl ass e tes, "todo mundo" não nom ei a todo mundo n em "alg uém", alguém.
é ch am ad a de Univ erso do Discurso. P ar a os arg umentos o ra consid erados, o Um esq uem a pod e s er válido e, n ess e caso, todas as suas int erp ret açõ es são
Univ erso é a cl ass e dos s er es h um anos. válid as. ( 4) é um esq uema válido. Qualq uer arg um ento bom e conclusivo é re
Em um Universo como ess e, há vár ias cois as q ue v al em ou não v al em p ara dutív el a um esquem a válido. Isto não significa: a alg um dos esq uem as válidos
c ada obj eto; po r ex emplo, q ue el e/el a é filósofo(a), q ue Edith o/a inv ej a, q ue el e/ discutidos nos capít ulos 10- 1 3 d est e liv ro. Post eriorm ent e, consid er aremos es
el a é mais sortudo(a) do que Edith. Exp ressõ es pa ra o que vale o u não v al e p ara quemas nos quais as int erpret ações d as l etr as esq uemáticas p ert encem à cat e
obj etos em um Unive rso são ch am ad as predicados. P redicados são uma categori a gori a das proposiçõ es, e não à dos p redicados o u à dos nomes próprios; e há
52 P. T. Geach Razão e argumentação 53
ainda muitos esquemas que introduzem expressões de ainda outras categorias Passo 1 - introduza uma menção ao Universo no esquema.
como as interpretações requeridas. Mas qualquer argumento válido é redutível Resultado: qualquer pessoa que é AB é C'.
em princípio a algum esquema válido; se nossa lógica existente não pode suprir Passo 2 - expanda todas as conjunções de letras predicativas.
tal esquema, isso significa apenas que precisamos desenvolver a lógica um pouco Resultado: qualquer pessoa que é A e (que) é B é C'.
Passo 3 - o predicado gramatical do esquema original é "* é C , onde
"'
mais.
"'
Deve ser necessário adicionar uma premissa truísta, que pode ser tomada o asterisco marca um lugar vazio. Interprete "* é C .
como geralmente admitida: por exemplo, "todo homem é animal" é um truís Resultado: já que "C*" ou o equivalente "* é C" deve ser lido como: a
mo necessário para reduzir "Sócrates é homem, portanto Sócrates é animal" ao esposa de * terá dinheiro o bastante para manter a casa, o contradi
esquema (4). Um argumento que pretende ser conclusivo, mas não redutível a tório "* é C"' deverá ser lido como: a esposa de * não terá dinheiro o
um esquema válido, é inválido. O uso de esquemas serve para nos fornecer testes bastante para manter a casa.
de validade distintos do método de tentativa e erro de encontrar um argumento Passo 4 - no lugar vazio (marcado com o asterisco) do resultado do
obviamente válido ou inválido que seja suficientemente parecido com o argu passo 3, insira a frase usada no passo 2, "qualquer pessoa que é A e
mento sob teste. que é B''.
Representamos uma conjunção de predicados escrevendo as letras predicati- Resultado: a esposa de qualquer pessoa que é A e que é B não terá
vas lado a lado. Assim, se "F*" representa "* é filósofo" e "G*" representa "Murdoch dinheiro o suficiente para manter a casa.
não gosta de *", então "FG*" representa "* é filósofo e Murdoch não gosta de *". Passo 5 - use o "dicionário" para interpretar as cláusulas relativas "que
Todo predicado, como toda proposição, tem uma negação ou contraditó é X' e "que é B". ,
rio, o qual representamos colocando um sinal " ' " depois do sinal do predicado. Já que "* é X' deve ser lido como "* é marido", "que é X' tor�a-se "que
Assim, se "K*" representa "* admira Wittgenstein'', então "K'*" representa "* não é marido". Já que "* é B" deve ser lido como "* bebe muito': "que é B"
admira Wittgenstein". deve ser lido como "que bebe muito''.
Lendo as letras como acima e tomando o Universo como o das pessoas, o Resultado do passo 5:
esquema categórico "Todo FK' é G" será como segue: A esposa de qualquer (pessoa que é) marido (e) que bebe muito não
[ Com] Toda pessoa que é um filósofo e não admira Wittgenstein, Murdoch terá dinheiro suficiente para manter a casa.
antipatiza. II. Expressar em um esquema lógico a sentença:
ou A esposa de qualquer marido que bebe muito não terá dinheiro o bastante
Murdoch antipatiza com todo filósofo que não admira Wittgenstein. para manter a casa.
Universo = pessoas; A* = * é esposa, B* = o marido de * bebe muito, C*
A habilidade de traduzir esquemas para sentenças na nossa língua materna, = * terá dinheiro o bastante para manter a casa. (Note que este não é de
ou da nossa língua materna para esquemas, com a ajuda de um "dicionário" que modo algum o mesmo "dicionário" que o do Exercício I.)
especifica o Universo do Discurso e interpreta as letras esquemáticas, é algo que Passo 1 - uma reflexão rápida mostra que esse exemplo não contém
pode ser adquirido apenas pela prática - como aprender uma língua estrangeira. uma "descrição definidà' que pretenda descrever apenas uma esposa
Os seguintes exercícios são trabalhados em velocidade reduzida, passo a como na sentença:
passo. Com a prática, especialmente em exercícios mais simples, a maior parte A esposa de Sir Isaac Harman foi presa,
do trabalho tornar-se-á trabalho mental; você não precisará então anotar cada mas é sobre qualquer esposa, qualquer pessoa que é esposa e qpe (etc.).
passo no papel. Podemos, de fato, parafrasear a sentença introduzindo o Universo
explicitamente como segue: qualquer pessoa que é uma esposa e cujo
"'
I. Traduzir para o português o esquema "Qualquer AB é C . marido bebe muito não terá dinheiro o bastante para manter a casa.
Universo = pessoas; A* = * é marido, B* = * bebe muito, C* = a esposa Passo 2 - substitua as orações relativas "que é esposa" e "cujo marido
de * terá dinheiro o bastante para manter a casa. bebe muito" por orações contendo letras esquemáticas.
54 P. T. Geach Razão e argumentação 55
Já que "* é esposá' é a interpretação de "A*" ou de "* é K, reescrevemos 2. Que esquemas obtemos a partir do (5) e (6) por meio da
seguinte chave
"que é esposá' como "que é X'. de interpretação: F* = * é filósofo, G* = * é dinamarquês, K *
= * é mortal ?
Já que "o marido de * bebe muito" é a interpretação de "B*" ou "* é B", 3. Represente as duas sentenças que seguem com a seguinte
chave de in
nós reescrevemos "cujo marido bebe muito" por "que é B''. terpretação: Universo = seres humanos; F* = * é filósofo; G*
= Murdoch
Resultado do passo 2: antipatiza com *; K* = * admira Wittgenstein.
Qualquer pessoa que é A e (que) é B não terá dinheiro o bastante para Todo aquele que admira Wittgenstein é filósofo.
manter a casa. Murdoch não antipatiza com todo aquele que não é filósofo.
Passo 3 - substitua o predicado restante da língua materna no resultado Qual é a interpretação de "Todo FG' é K "' ?
do passo 2 usando uma letra esquemática do "dicionário".
Resultado do passo 3:
Qualquer pessoa que é A e é B é C';
pois, tendo em vista a ocorrência no dicionário para "C*" ou "* é e:
"* é C'" resultará em: " * não terá dinheiro o bastante para manter a
casa.
Passo 4 - nós contraímos "é A e é B" em "é AB".
Resultado: Qualquer pessoa que é AB é C'
Passo 5 - Nós agora omitimos a menção ao Universo, a qual não é /
EXERCÍCIOS
1. Se usarmos a chave ilegítima de interpretação - Universo = seres huma
nos; a = todo dinamarquês (ou a = algum dinamarquês); F* = * é filósofo;
G* = * é mortal - , parece que obtemos estes argumentos a partir do
esquema (4):
(5) Todo filósofo é mortal; todo dinamarquês é filósofo;
portanto, todo dinamarquês é mortal.
(6) Todo filósofo é mortal; algum dinamarquês é filósofo;
portanto, algum dinamarquês é mortal.
Os argumentos (5) e (6) são válidos ou inválidos? Se são ambos válidos,
por que este método de interpretação deveria ser rejeitado como ilegíti
mo?
Razão e argumentação 57
11
ness a sal a compre endem lógic a p erfeit ament e''. (Um ex emplo lógico não precis a
s er v erd adeiro. Proposiçõ es fals as pod em figur ar como premiss as e concl usõ es
num tr ab alho lógico; com ef eito, é extr aindo conclusõ es fals as d e uma proposi
ção fals a q ue d escobrimos s er fals a.)
Importação existencial Alg uns t extos d e lógic a (L ewis C arroll em Symbolic Logic e The Game of
Logic) us am esta conv enção - q ue "todo F é G" implic a "alg um F é G''. N ess e c aso,
de esquemas categóricos os exemplos do fim do arco-íris e do mo end eiro hon esto não s erão r epresent ados
como "todo F é G", mas como "nenh um F é G"', enq uanto o exemplo d as pesso as
n est a s ala s erá repr es ent ado po r "todo F é G''. (Crie um a esp ecific ação do Univ er
so e d a int erp retação d e "F*" e "G*" p ar a ess e último exemplo.)
T extos m ais r ec ent es s eg uem um a conv enção dif erente - q ue "todo F é G"
é s empr e equiv al ent e a "n enh um F é G e nad a mais. Ness e c aso, o ex emplo d as
"'
Est e tít ulo formidável signific a ap en as: o q ue um a proposição cat egóric a, esq ue pesso as n est a sal a s erá r epr es ent ado não po r "todo F é G", m as por "Todo F é G
m atic amente r epr es entad a, implic a q uanto ao que há o u que não há p ara s er e alg um F é G''.
encontr ado no Univ erso d ado? Isso é uma q uestão pur amente de convenção. Ao consider ar ex emplos, sig a
Esquemas com "nenhum'' são fác eis; "n enhum F é G" signific a q ue �ão esta prátic a:
ocorre nada no Univ erso q ue s eja F e G. "Algum F é G" é t rat ado como verd ad eiro
s e pelo menos uma cois a é F e G e não implic a �ad a mais do q ue !sso. E� ��ng uagem 1. No q ue diz resp eito a uma proposição "todo" d a ling uag em ordinária,
,
ordinária, "alg um" pod e t er ac epção d upla: alguns homens s ao sa, b10� po�e s:r consid er e s e el a t em o s entido provável s egundo o q ual a proposição
to mado como implic ando "... e outros não o são''. M as, s e s e pr et end e t al 1mphc aç ao "al gum" é t ambé m implic ad a; est ab el eç a isso ant es d e p ass ar do po rt uguês
em lógic a for mal, isso deve s er f eito explicit ament e: "alg um F é G e alg um F é G . p ar a os esquemas.
_
"'
_
No q ue diz r esp eito às formas "todo", há dif er ent es conv ençoes. E� l �ng u� 2. D ecl are q ual conv enção você está empr eg ando para as form as "todo" nos
gem ordinária, há expr essõ es prov erbiais c ujo ponto é ex at ament e nao mfenr esquem as e p erman eç a com esta conv enção.
"alg um F é G" d e "todo F é G":
Q ualq uer um a d as form as c at egó ric as pod e s er reduzid a a um a proposição
1. Todo fim de arco-ír is t em um pote de o uro escondido sob el e. existencial no s entido d e q ue no Univ erso há ou não há cois as q ue respond em
2. Todo mo end eiro honesto tem um pol eg ar d e o uro. algum a d esc rição co mpl ex a. Assi m, s e nós esc rev emos "= O" p ar a most rar q ue
não há nenhuma cois a no Univ erso respond endo a uma d esc rição d ad a e " * O"
Há aqui implic ad a uma l eit ur a d e "todo F é G" c ujo signific ado é simpl es par a most rar q ue há alguma(s) d ess as coisas, nós obt emos os s eg uint es result ados:
mente "n enh um F é G"'.
Alg um F é G FG * O
pot e
1 . Univ erso = l ug ares n a T err a; F* = * é o fi m de um arco-í ris; G* = um N enh um F é G FG = O
de o uro está escondido sob *. Todo F é G FG' = O
um
2. Univ erso = p esso as; F* = * é um mo end eiro hon esto; G* = * t em (ou s egundo a convenção de L ewis C ar roll: FG' = O e FG * O).
pol eg ar d e o uro.
E é em s eg u ida insinuado ( embo ra não implic ado logic ament e) que "n e TÓPICO PARA DISCUSSÃO
nh um F é G "' torna-s e verd ade iro, pois nada no Univ erso é F. Po r o utro l ado,
muit as proposiçõ es "todo" d a ling uag em ordinária são cl aram ente tom a��s co N a mane ir a exist encial de l er as proposições cat egó ric as, uma proposição com
mo implic ando as proposições "alg um'' corr espondentes, po r exemplo: todos "nenh um" r es ult a do fato d e c ert a d esc rição compl exa, formad a a p artir de pr edi-
58 P. T. Geach
um trata-
12
(Qual é o objetivo de escrever - como um químico de fato o fez -
do de química sobre compostos não existentes?)
Uso de diagramas no teste
da validade de esquemas
Se temos dois predicados que se aplicam ao nosso Universo, podemos ter coisas
de quatro tipos diferentes descritas por meio desses predicados; para uma dada
coisa a no universo, há quatro possibilidades:
l. a é F e a é G 3. a é F' e a é G
2. a é F e a é G' 4. a é F' e a é G'
Assim, o objeto a pode estar em uma das quatro diferentes células ou com
partimentos do Universo.
G G'
F FG FG'
O formato das células claramente não tem importância lógica, o que im
porta é ·apenas a natureza exaustiva da divisão do Universo em quatro células. Se
tivermos três predicados, serão necessárias-oito células:
60 P. T. Geach Razão e argumentação 61
· célula FG - mas isso não nos diz se devemos colocá-lo na célula FGH ou FGH'.
Nós poderíamos usar a artimanha de Lewis Carroll e colocar o X na divisa entre
G G' as duas células:
FGH' FG'H'
FGH
mas é possível que não precisemos fazê-lo caso a célula FGH já esteja marcada
F F'GH F'G'H
F'G'H' como vazia, já que X e O não podem estar na mesma célula (não dividida): deve
mos então marcar o diagrama assim:
F'GH' F'G'H'
Diagrama de Venn Diagrama de Lewis Carrol!
FGH'
Célula 1 para FGH'; Célula 2 para FGH; FGH
Célula 3 para FG'H; Célula 4 para F'GH'
X
o
Para quatro predicados, são necessárias 16 células e assim por diante.
Exemplos de esquemas válidos e inválidos:
Até aqui, os diagramas não nos dizem nada sobre o Universo - apenas
Todo F é G; todo F é H; ergo, algum G é H .
mostram uma possibilidade lógica de classificação de seus conteúdos. Para mos
trar categóricos em um diagrama, colocamos uma marca em uma célula para Na forma existencial, as premissas são: FG' = O, FH' = O, e a contraditória
mostrar que está vazia (O) ou não vazia (X). Se nos são dadas premissas e uma da conclusão é GH = O. Vejamos como representar essa informação.
conclusão:
G G'
1 . Se as premissas e a contraditória da conclusão podem ser representadas
o o
juntas no diagrama, isso será assim porque existe uma interpretação.que
torna as premissas verdadeiras e a conclusão falsa: portanto, a forma do
F
o o
argumento é inválida.
2. Se as premissas e a contraditória da conclusão não podem ser repre H
EXERC(CIOS
(Depois de inserir os Os, resta apenas um
lugar para colocar o X dentro da célula FG
1. Rotule os quadrado.s deixados em branco no diagrama de quatro termos.
2. Interpretando as letras predicativas "F, G, H" em um Universo de pessoas,
ou da célula FH.)
--
G G' H
FGH'K' FG'H'K'
1 FGH'K FG'H'K 1
1 F'GH'K F'G'H'K 1
F
F'GH'K' � - F'G'H'K'
Razão e argumentação 65
13
Exemplos:
1 . A maioria dos Fs são Gs; todo G é H; ergo a maioria dos Fs são Hs.
Teste de consistência:
Há mais FGs do que FG's, então, a + c > b + d (1)
Proposições plurativas: uso de Todo G é H, então, a + g = O,
então, a = O, g = O (2)
diagramas para esquemas plurativos Não (a maioria dos Fs são Hs), isto é,
não há mais FHs do que FH' s então, c + d :s; a + b - (3)
Mas, agora, temos: c > b + d,
De (1) e (2) assim, c > b } contradição
e (2) e (3) c + d :s; b,
Podemos usar diagramas para testar a validade de argumentos que contêm as ex assim, c :s; b
pressões "maioria" ou "metade" assim como "todo'; "algum" e "nenhum''. "A maioria Portanto, o esquema é válido.
dos Fs são Gs" significa:
2 . A maioria dos Fs são Gs; a maioria dos Gs são Hs; ergo algum F é H.
Mais objetos no Universo são FG do que FG'. / Teste de consistência:
"Metade dos Fs são Gs" significa: Há mais FGs do que FG's, então, a + c > b + d (1)
Há pelo menos tantos objetos no Universo que são FG como que são FG'. Há mais GHs do que GH's, então, c + e > a + g (2)
plu
Proposições usando os quantificadores "maioria" e "metade" são chamadas Nenhum F é H então, c + d = O, c = O, d = O (3)
rativas.
Agora temos:
Há um método de decisão para esquemas contendo proposições categóricas De (1) e (3) a >b
de tipos comuns e também para proposições plurativas. Inserimos em cada célu De (2) e (3) e > a +g
la de um diagrama uma letra, significando o número de indivíduos do Universo Obviamente, podemos encontrar números a, b, e, g, para preencher essas
que estão designados para aquela célula. Então, construímos, a partir dos nossos condições: por exemplo, a = 2, b = l, g = 1, e = 4. Portanto, o esquema é
dados, um conjunto de proposições sobre as somas desses números e sobre se inválido.
uma soma é ou não maior do que outra. Como antes:
Se podemos representar consistentemente as premissas e a contraditória da con 3. A maioria dos Fs são G; a maioria dos Gs são Hs; a maioria do Hs são Fs;
clusão, temos um esquema inválido. ergo algum F é GH.
Se não podemos fazê-lo, temos um esquema válido. Teste de consistência:
Há mais FGs do que FG's, então, a + c > b + d (1)
Há mais GHs do que GH's, então, c + e > a + g (2)
G G'
a b
Há mais HFs do que HF's, então, c + d > c + f , (3)
F Não há nenhum FGH então, c = O (4)
e d
Por (1) e (4), a > b + d, então, a > d
H Por (2) e (4), e > a + g, então, e > a
e f
Por (3) e (4), d > e + f, então, d > e
F'
Assim, temos que a > d, d > e, e > a - uma contradição. Portanto, o ar
gumento é válido.
g h
7
66 P. T. Geach
14
EXERC(CIOS
1. As pr emissas do argum ento sobr e s uecos no Ex ercício 2, Capítulo 7,
podem s er r epr es entadas p elo s eguinte esq uema (com um Univ erso de
p essoas):
A maioria dos Fs são Gs; a maioria dos FHs são G's.
Transformando argumentos válidos
Mostre que a conclusão "a maioria dos Fs são H's" não s e seg ue , mas q ue
a conclusão "a maioria dos FH's são Gs" s e segu e. Dada a sua chav e de
em novos argumentos (temas)
int erpretação para as l etras, como essa conclusão dev e s er lida?
2. Usando um diagrama de q uatro t ermos, mostr e qu e o s eguint e esq uema
é válido:
Todo F é G; a maioria dos Gs são Ks; todo K é H; a maioria dos Hs são
Fs; Nos últimos dois capít ulos, trabalhamos com padrõ es d e argum entos, válidos
ergo algum F é K. e inválidos. Vamos agora trabalhar com métodos para transformar tipos de ar
3. D e um r elatório do Rev er endo J eremiah Prodnos e sobr e a moral dos gum ento válido de qu e já dispomos em novos arg um entos válidos. Os lógicos
estoicos chamavam essa r egra ou método d e tema (do gr ego, thema; plural the
est udant es na Univ ersidad e d e Shr ewsb ury:
mata). Essa é uma palavra cupa qu e você pode usar caso qu eira: não confunda
"Os maus hábitos de fumar, b eber e diz er obscenidades são todos predo
temas, qu e são métodos para formar argumentos a partir d e argumentos, com
minant es; ademais, a maioria dos fumant es b ebe, a maioria dos qu e b eb em
esquemas, que são padrõ es para inf erir proposições a partir de proposições. Os
usa ling uag em obsc e na e a maioria dos q ue usam ling uagem obsc ena
pontos de partida e os res ultados são dif er ent es. Um arg um ento, cujo padrão
fuma. Alguns estudant es, de fato, têm todos os três maus hábitos; mas
é um esqu ema de argum ento, parte de pr emissas e t ermina com uma conclu
est es, felizm e nt e, são comparativam e nt e poucos - em m enor núm ero, com
são. Qualq uer premissa ou conclusão não é ela m esma um argumento, mas uma
ef eito, do q ue a class e dos q ue apenas fumam e não b eb em n em usam
proposição - qu er uma proposição afirmada o u alguma ap enas assumida para
linguagem obsc ena, e do qu e a class e dos q ue ap enas b eb em e não fumam desenvolver o argumento. Jamais uma proposição é, ela própria, um argum ento;
n em usam ling uag em obsc ena, e igualment e m enor do qu e a class e dos então, um proc e dim ento para passar de um o u mais argumentos r econhecidos
q ue ap e nas usam linguagem obsc ena e não fumam nem b eb em". como válidos para a formulação de outro argumento válido não é, em si mesmo,
Essas declaraçõ es são logicame nte consist ent es? um argum ento q ue parte de premissas e vai para a conclusão. Essa é a razão por
que é melhor usar um nome esp ecial para ess es proc edimentos.
(1) O tipo mais simples de t ema é a ordenação encadeada de argum entos:
o qu e q uer qu e s e siga de uma conclusão s eg ue -s e de suas pr emissas. Se t emos
um bom argumento de A e B para C, e o utro de C e D para E, e outro de E para
F, então temos um bom argumento de A, B e D para F.
.,
A
•
e
,
B
�
E
tF
Razão e argumentação 69
68 P. T. Geach
br ar o u porque t em um a (3) A s regr as (1) e (2) ap enas no s diz em como enc aix ar arg um ento s par a
Como eu di sse antes, um a c ad eia físic a pod e que
a lógic a pod e q u�br ar ap enas formar um maior; as outr as r egr as q ue vamo s estud ar no s diz em como obter
lig ação fr ac a o u porq ue é muito lo ng a; uma c ad ei arg um entos com pr emi ss as e /o u co ncl usõ es diferentes a p artir de arg um ento s
ção é boa, a c ad eia como um
pel a prim eir a r azão - se (e som ent e se) c ad a lig a q ue já t emo s.
todo é boa.
Ari stót el es). Es sa é um a A r egra (3) é a r egra p ara usar a reductio ad absurdum, a q ual já vimo s no
(2) A regr a si ntétic a (d escob er ta p elo s pupilo s d e
ualq uer co nclusão ex tr aíd a a p artir
do no sso Capít ulo 6 (U so s d a arg um entação). S e as pr emi ssas, P, Q, R, . . . , j unt as, l ev am a
elabor ação d a r egra d a c ad ei a. Q
e ser adicio nad a às no ssas pr emiss
a s p ar a _ al um a co ntr adição, não co ncl uímo s (s e temo s essa sens ibilid ad e) q ue provamos
estoque origi nal d e pr emi ssas pod
so estoque pod e s er r ep et�do um a co ntradição, m as, s im, q ue há algo errado com as pr emi ssas . A ss im, s e
c anç ar nov as concl usõ es, e esse aum ento no no s
são co nt ad as como concluso es r et emo s Q, R, . . . , pod emo s , a p artir d ela s , d erivar a n egação, o u contr aditória,
livrem ent e: tod as a s co ncl usõ es assim alcanç ad as
emo s ob ter D a p ar tir d e A e d a premissa r est ante P. Já vimo s es se movim ento no Capít ulo 13. Vi sto q ue as
do primeiro estoq ue d e pr emi ssas. Por ex emplo, pod pr emi ssas:
E e F; d e modo q ue D, E, F e
B, e assim E d e A e D, então F d e B e D, então G d e A,
m ais t er o padrão cl ar am ente
G todas se seguem d e A e B; assim, não precis amos a m aiori a dos A s são B s;
em form a d e árvor e d a Regr a (1). a maiori a do s B s são C s;
a maiori a do s C s são As;
nenh um A é BC
j unt as prod uz em uma contradição, seg ue - se, poi s , q ue a p ar tir d as premis sas:
a m aiori a do s A s são B s;
Note que repetimos
(ou reiteramos, como
a maiori a do s Bs são C s;
se diz em linguagem
a m aioria do s C s são A s
técnica) o uso de A e
B como premissas; as
setas de A para A ou pod emo s inferir o contr aditório opo sto da pr emi ss a r esta nt e " nenh um A é BC",
a s ab er:
B para B estão certas
alg um A é BC.
porque, obviamente,
l
-,, qualquer proposição
segue-se de si mesma.
não é de forma alg uma a utoevid ente. (Com efeito, algumas pessoas far ejaram
aqui uma antinomia lógica insolúvel pela lógica - já que assumem q ue poderia
haver tal barb eiro. Digamos q ue s eu nome seja "Juan": então, Juan barb eia-se a si
mesmo o u não? Em ambos os casos, t emos uma contradição ! Mas o q ue a lógica
mostra é q ue não pod e haver tal barbeiro; então, não há com o q ue se preoc upar
- não há base para dizer: digamos que seu nome seja "Juan''.) Entretanto, todas
oevid ent es ou b em s e s eg uem, mét od os d e p rova q ue a mat emáti ca p rog redi u. Gõd er p rovou q ue essa nã o é
as verd ad es da lógi ca ou be m sã o elas mesm as aut ap enas uma questã o d e ig norâ ncia h umana: dad os quaisquer mét od os d e pr ova
t oevid ent es d a lóg ica; e, p or iss o
p or mét od os d e p rova evide nt es, d e verd ad es au d efi nid ament e esp ecifi cad os, h averá necessariamente verd ad es mat emáti cas q ue
mes mo, s uas cont raditó rias most ram-s e fals as.
lóg ic a ou d a mat emática p o- nã o p od em s er p rovad as us and o tais mét od os, mas ap enas a cres centa nd o novos
É errado sup or que ap enas verd ad es abstrat as da
que prop osiçõ es sob re existê nci as mét od os. E m lógi ca, iss o acont ece d e out ra man ei ra : o id eal lógi co é enc ont rar
dem ser al canç adas como conclusõ es lógicas; ou um rep ertór io d e mét od os d e p rova q ue abr anj a todas as verd ad es lógi cas q ue
reais nã o p odem ser l ogi cament e
d erivadas. É ap enas uma questã o d e quais são suas
e realm ente, emb ora nã o aut oevi p od em s er exp ress as em cert o vocab ulá ri o - e, p ara g rand es á reas d a lógi ca, s a
premissas; e premiss as relacionad as com o que exist
mplos sob re ca ch orros e s ap at os. b emos q ue ess e id eal p od e d e fat o s er realiz ad o.
dent es, p od em s er evident es e i negáveis, como os exe E nunciad os qu e p ert en cem à lógi ca e à mat emáti ca sã o us ual ment e
esp ecial a fo rmas vá lid as d e
Verd ad es lógi cas estã o vinculad as d e um mod o d es crit os como "verdad ei ros em virt ud e d o q ue as p alavras signifi cam''. M as é
r" (como p rop osiçõ es) d e m od o
i nf erê ncia. S up onh a que leiam os as l et ras "p, q, a da ro q ue os enunci ad os fa ct uais menos refi nad os sã o verd ad ei ros ou fals os em
ament e válid a. E ntã o, p el o t em
q ue "p, q, p ort ant o r" s ej a uma i nf erê nci a l ogic bé r vi rt ude d o q ue as pal avras sig nifi cam; p or exempl o, "el e esq ue ceu a cart ei ra no
ant o s e q, entã " t
d a condi cional iz açã o (ver C apítulo 13), "p, p ort
o r am m e
xempl os concret os, us ualment e d e Y enq uant o amb os viverem. (Qui ne ch ama iss o d e t es e da s emp at er
t end e us ar um d il ema. D ilemas sã o, d e fat o, em e nid ad e ).
st ruir argument os s ej a dúbi a,
fal acios os - nã o p orq ue a reg ra d o d ilema pa ra con
a pa ra encad ear m aus a rg umen-
m as p orq ue na p rát ic a ela é freq uent em ent e us ad M as d e A e B s eg ue -s e q ue nenh um h omem q ue é p ai p od e d eix ar d e s er
t os, c uj o res ult ad o, entã o, é invál id o. h omem d ura nt e a vid a d e s ua p rol e: e iss o nã o é s eq uer verd ad ei ro, muit o menos
vid ent es; p or ex emp lo, a
Verd ad es mat emát icas nã o sã o usual ment e aut oe verd ad ei ro em vi rt ud e d o q ue as pal avras sig nifi cam. Você p od eria m odifi car A
nú mero p ri mo exist e um m aior
d es cob ert a d e Euclid es d e que p ara q ualquer
nt rad a ap en as ex aminand o o
d o que ele. A p rova diss o nun ca p od eri a s er enco
mo" e "maior d o q ue" - E ucli
que real me nt e q ueremos diz er com " nú mero p ri
var iss o. F oi encont rand o novos
d es t eve d e p ensa r nu m t ruq ue esp eci al p ara p ro ·N. de.T.: Kurt Gõdel (1906-1978), matemático austríaco naturalizado americano, autor de importantes
trabalh_os em lógica matemática. Possivelmente, seu resultado mais conhecido é um dos teoremas de
incompletude (apresentado em 193 1), segundo o qual nenhum sistema axiomático formal, satisfa
zendo a certas condições, entre as quais ser suficiente para formalizar a aritmética elementar, pode
_
"N. de.T.: Joseph-Pierre Hilaire Belloc (1870-1953), escritor, historiador e crítico literário de educação ser su;1u1taneame.'.1te completo e consistente; assim, se o sistema for consistente, haverá proposições
antmet1cas que nao poderão ser nem demonstradas nem refutadas no sistema.
britânica e origem francesa.
76 P. T. Geach
ou B ou poderia dizer que o termo "pai" não significa exatamente a mesma coisa
em ambas as proposições, embora cada uma delas Seja verdadeira em virtude
do que o termo significa ali. Mas, se fizer qualquer uma dessas coisas, você terá
de admitir que intuições sobre o que é verdadeiro em virtude do significado das
16
palavras são bastante duvidosas: isso será certamente assim se "pai" em A tiver
um significado diferente de "pai" em B - como é possível ver que a verdade é
Lógica proposicional:
determinada pelo significado quando não se está certo do próprio significado
dos termos?
funções de verdade
a expressão reapareça no curso do argumento. É por isso que palavras de Note também que se proposições são assim compostas, a composição é ela
referência ambígua como "eu", "você", "aqui", "Smith" e "Elm Street" são usu�l mesma apta a ser composta com outras proposições para gerar proposições mais
mente admissíveis sem qualificação em argumentos lógicos; sua interpretaçao complexas.
é indiferente à validade lógica de um argumento, desde que permaneçam as Proposições identificáveis como orações de proposições maiores podem ou
mesmas durante todo o argumento. não ser tais que seus valores de verdade determinem os valores de verdade das
proposições maiores. Em uma obra menor, Lewis Carroll descreve um professor
Na gramática ordinária estamos familiarizados com a ideia de uma conjun que faz uma grande coleção de pares de bilhetes presos juntos com informações
ção que une duas orações para formar uma sentença. (Lógicos preferem a palavra tais como:
"conectivo", pois "conjunção" é usada como um termo técnico.) A explicação que (7) O chefe de cozinha recuperou-se da febre.
ouvimos no primário de que uma conjunção é qualquer palavra singular que (8) O chefe de cozinha tomou uma dose dupla de remédio para febre.
faz sentido entre duas sentenças (por exemplo, "mas", "embora", "antes", "depois", Se abreviamos (7) em "p" e (8) para "q': então, mesmo que ambos sejam
etc. no contexto: eu corri para estação... o trem havia partido) é boa o suficiente verdadeiros, isso não determina o valor de verdade de "p porque q", ou de "q e
para começar. Mas não podemos sempre considerar uma sentença fo_r �ada de então p". Mas "é o caso que p e que q" deve ser verdadeiro se tanto "p" quanto "q"
suborações como uma proposição formada a partir de duas propos1çoes. Por são verdadeiros, e deve ser falso se um ou ambos forem falsos.
exemplo: Como muitas coisas em lógica, isso nem sempre foi óbvio. Aristóteles uma
(3) Um homem casado deve trabalhar ou sua família sofrerá. vez - nem sempre - pensou ser um erro lógico exigir uma simples resposta
A primeira metade de (3), antes de "ou", parece uma proposição muito cor "sim ou não" para uma questão "é o caso que p e que q?", porque nenhuma das
reta. Mas não podemos tratar "sua família sofrerá'' como uma proposição porque respostas seria apropriada se, por exemplo, "p" fosse verdadeiro e "q': falso.
não tem sentido tentar encontrar seu valor de verdade. Ser verdadeiro ou falso Maus livros contemporâneos de lógica algumas vezes repetem o erro de Aris
que eles sofrerão depende de quem são as pessoas significadas por "sua família" tóteles e chamam o suposto erro lógico de Falácia das Muitas Questões. (Se
- mas é claro que não estamos pensando em nenhuma família em particular, de você encontrar essa "falácia'' - ou a "falácia" do argumento ad hominem, veja o
modo que não se coloca a questão de se "eles" sofrerão ou não. Do mesmo modo, Capítulo 6 - apresentada como uma falácia em um manual de lógica, não compre
considere: esse manual!) Tal questão dupla não precisa nos embaraçar de modo algum. Se
(4) Se um pedaço de ferro é aquecido, ele se dilata. você pensa que "p" é verdadeiro e "q" é falso, então a resposta que você dá para "é
É verdadeiro ou falso que um pedaço de ferro é aquecido? Ou ainda: que o caso que p e que q? Sim ou não?" deve ser um simples "não''. E se seu interlo
esse pedaço de ferro se dilata? (Qual pedaço?!) Não podemos considerar iss_o cutor tenta fazer com que você admita que você negou "p", então ele está apenas
como tendo uma estrutura "se p, então q", onde as letras representam proposi sendo sofístico.
ções com valores de verdade; a real estrutura é: Chamamos o modo de compor proposições que nós encontramos em "é
Qualquer pedaço de ferro / expande quando dilatado. o caso que p e que q" de veri-funcional. Aplicamos o mesmo termo para "não é
Por outro lado, há muitos casos em que podemos representar uma propo o caso que.. :', porque o resultado de aplicar essa expressão a uma proposição é
sição em um esquema com letras esquemáticas (proposicionais) para suas subo verdadeiro/falso se a proposição original é falsa/verdadeira.
rações. Por exemplo: Como vimos, "não é o caso que p" é chamado de negação ou contraditó
(5) Sócrates era sábio e virtuoso ou Platão era um grande mentiroso. rio da proposição escrita como "p''. Podemos usualmente obter um equivalente
Esquema "(p e q) ou r"; chave de interpretação: inserindo "não" em algum lugar da proposição a ser negada, mas esse não é um
procedimento mecânico ou infalível; por exemplo, "alguns homens não são sá
p = Sócrates era sábio, q = Sócrates era virtuoso, r = Platão era um grande menti
bios" não é o mesmo "não é o caso que alguns homens são sábios''.
roso. Note a importância dos parênteses: "p e (q ou r)" resultaria em: "(É o caso que) p e q (e r...)" é chamado de conjunção das proposições abre
viadas como "p", "q", ("r''...), e essas proposições são chamadas de conjuntivos da
(6) Sócrates era sábio; e ele era virtuoso também, ou então Platão era um
conjunção.
grande mentiroso.
Razão e argumentação 81
80 P. T. Geach
e o val or de x é 0, 1, 8, 27, 64
us ad os p r incip alm ent e p ara "ou" n o s entid o n ão excl usivo, e O l atin o "aut" e 0
3
p ol �nês "al ��", �a ra "ou" n o s entid o excl usivo. Em notaç ão lógic a, escr evem os "p
s val or es d e uma funç ão numé
Obviam ente , t ab el as não p odem fo rn ec er o d ad e v q p ar a o ou n ao _ excl usivo, c uj a tab el a d e verd ade é:
ric a p ara todos os arg um entos.
M as há s omente d ois val ores d e verd ade - ver
s s m ente
p ar de p rop osiçõ es, tem o
(V) e falsid ad e (F). D ess e mod o, p ara um p V F V F
o
rd ad e:
q uatr o atrib uiçõ es p ossíveis d e val ores d e ve q V V F F
pvq V V V F
p V F V F
q V V F F d: �od o q ue "tanto p ou q" ("p v q") e "n em p n em q" (",p /\ ,q") s ão c ontradi
ton os. (C onfir a iss o c om tab el as d e verd ad e !) O "ou" excl usivo p ode s er expr ess o
a p arti r d e "p" e ''q" c uj o val or
S e tem os, ag ora, um a p rop osiç ão form ad a p or:
d os val or es d e verd ad e de "p" e "q",
d e verd ad e é d etermin ad o a p artir ap en as
sto veri-funcional d e "p" e "q". P or (p V q) /\ -, (p /\ q).
ch am amos ess a pr op osiç ão d e um c omp o s f az er
ex emplo, a c o �j unç ão é um
c omp osto veri-funci on al, p orq ue p od em o
iat r p "é o Nã o há um sin al p ad rão p ara iss o, se pr ecis am os d e um p od em os esc rever
um a t ab el a c ompl e t a d os val o
res d e verd ad e p ara "p /\ q" ( abrev u a ara
v rd ad e p aut q .
)
e e
d
e
((
p
))
e q :
(( ))
Consequências veri-funcionais
p V F V F
q V V F F S up onh a que tenh amos um esquem a d e argum ento s atisfaz end o as s eg uintes
V F F F c ondiçõ es:
pAq
pr op osiç ão neg ad a; temos esta 1. O esq ue1:1a c onsiste em letras esq uemátic as proposicionais q ue ap arec em
A negaç ão é um c omp osto veri-funcion al d a
fix o signific a "n ão é o c as o q ue.. :'): n a pr emiss a ou pr emiss as e n a c oncl us ão d o esq uem a ou is ol ad amente
tab el a d e verd ad e p ara a neg aç ão ( ond e o pr e ou em c omp ostos ver i-funci on ais.
2. Nenh um a l eitur a d as letras torn ará as pr emissas verd ad ei ras e a c oncl us ão
p V F
fals a.
,p F V
c omp or pr oposiçõ es é a disjun Assim, a c oncl us ão é um a consequência veri-funcional d a (s) premiss a (s) e
O ut ro imp ortante mod o veri- func ion al d e n a tab el a d e qualquer arg um ento c oncr eto obtid o pel a interpr etaç ão d as l etr as s erá l ogic a
om o preench er um l ug ar
ção. Aqui há um p robl em a men or d e c m ente válid o.
verd ade:
82 P. T. Geach
Razão e argu mentação 83
Poderemos saber se a condição (ii) é satisfeita se soubermos que a condição
o sentido da oração, mas somen
(i) é satisfeita. Pois, pelo próprio significado de "composto veri-funcional", não te a destaca de um modo peculiar" (Fre
ATE NÇ ÃO.· orações umd . as por ge). -
precisamos saber nada exceto os valores de verdade das proposições que usa _ qualquer desses conectivos, até mesmo
pl es "e,,, podem nao ser proposiço
· es com valores de verdade atrib
O si m-
mos como leituras para as letras a fi m de deter minar os valores de verdade das nao estar e
_ uíveis e podem
ior mando um composto veri-funci
pre missas e das conclusões do esquema; então, precisa mos somente verificar as onal.
A di.sjunção pode ser representada
(finitamente muitas) atribuições possíveis de valores de verdade às letras a fim por "a menos que" e m vez de "ou "·
Voces colocarão aquele canhao . _
- em pos1çao ·
de ver se a condição (ii) é satisfeita - se há alguma atribuição que faz as pre mis leados. ou metade de vocês serão ba-
sas aparecerem todas com V e a conclusão com F. Do contrário, o esquema do
A menos que vocês coloquem o can . - , metade
argu mento é válido. hao
- e m pos 1çao de vocês serão
baleados.
ATENÇÃO. Seria um erro grosseiro supor que um esque ma de argu men
to que não dê lugar a uma consequência veri-funcional é inválido em todas as
suas instâncias - é claro, um que dê lugar a uma consequência veri-funcional EXE RCÍ CIO S
é válido e m todas as suas instâncias. Qualquer argu mento de duas pre missas é
uma instância do esquema "p, q, portanto r", e, é claro, isso não dá lugar a uma 1. Verifique por tabelas de verdade
que "p /\ q" é a contradit ona, . de " ,p v
consequência veri-funcional, pois podemos escolher proposições verdadeiras (p /\ ,q) ", !.sto e,, que " ,(p /\ q)" é
con sequ ência veri-funcional de ",p
para "p" e "q" e uma falsa para "r"; mas alguns argumentos com duas premissas v (P /\ •q) , e, conversamente, ",(,p
são válidos. v (p /\ ,q))" é conseque• ncia. ven.-
-funcional de "p ;(q''.
2. Considere a chave de interpretaçã
o:
p = Sócrates uma vez chutou u m cach
Tautologias veri-funcionais orro q = o cachorro mordeu
Sócrates
Com essa chave de interpretação "p
Esse termo significa: esquemas veri-funcionais que assumem sempre o valor V, /\ q" e " _ contra-
·P v (P /\ ,q) " sao
d .1tor
, ias? Se não, por
que não ? '
não importando quais valores de verdade são atribuídos às letras nele contidas.
3. Pod e a seguinte proposição ser colo
U m exemplo simples é "p v ,p''. Se ''/\' representa u ma pre missa (ou a conjunção . rpretada cada na forma "p /\ q"<. Se s1m . , como
sen·am mte s as letras?
das premissas) de um esquema de argumento veri-funcional, e "B" representa a
Um enca�ador ligou essa manhã e
conclusão, e se "B" é uma consequência veri-funcional de ''/\', então ",A v B" seu companheiro voltou para pegar
algumas 1erra mentas.
e equivalentemente ",(A /\ ,B)" representarão u ma tautologia veri-funcional;
4. Pode a seguinte proposição ser
pois, pela definição de "consequência veri -funcional", nenhu ma interpretação colocada na forma "p v q" ou "p aut
Nenhum estranho pode ter vm q";,·
das letras na fórmula abreviada como ''/\' e "B" fará co m que ''/\' seja verdadeira · do a, noit. e, ou o cachorro teria latid
po ha �m contexto apropriado de o. (Su -
e "B", falsa, por conseguinte ",A v B" e ",(A /\ ,B)" resultarão sempre verdadei � enunciação, de modo que saibamo
q�a ,�01te e qual cachorro estão em s
ras. Por exemplo, "p, q, ergo (p aut q) aut (p v q)" é válido - a conclusão é u ma ,, questão.)
5. Sao p /\ q" e "q /\ p consequ • .
consequência veri-funcional das premissas - então ",(p /\ q) v ((p aut q) aut encias veri-funcionais uma da outr
usarmos a chave de interpretação· a se
(p v q))" é u ma tautologia veri-funcional. (Confira que o esquema dado é u m · p = rrom e Mary se casaram; q = Tom
:; ary tiveram u m bebê? Se não,
1'
r por que não?
.
esquema válido.)
om e Mary se casaram" pode ser colo
cada sob a forma "p /\ q"?
tz"?
Essa pergunta nem sempre é razoável. No que diz respeito a �ma afir �a u, era necessário que isto acon-
tecesse.
ção matemática, por exemplo, não faz sentido perguntar por que e verdadeira 2. Porque isto é o que sempre ou regularm
- pode-se somente perguntar como se sabe que ela é verdadeira. " �or quê?", por ente acontece.
3. Porque alguém (Deus ou o homem) simp
vezes, d iz respeito ao que os medievais chamaram de causas eficientes (c �usas lesmente escolheu.
4. Porque este é o melhor modo para que
que dão existência às coisas) e por vezes ao que chamar �m de causas finais (os as coisas tenham acontecido.
_
fins ou objetivos pelos quais as coisas acontecem), mas foi corretamente dito n �s A princ ipal dificuldade sobre as explicaç
ões de t ipo (i) é que relação causal
tempos med ievais que nenhum desses tipos de explicação tem lugar em �atema difere da relação lógica do seguinte mod
o: se A se segue logicamente de B e C, A
tica. (Nada acontece em matemática: a dramática linguagem da geometria - cor segue-se log icamente de B, C e D; mas, se
A se segue causalmente de fatores B e
tar, reduzir, etc. - é meramente um estímulo à atenção dos pupilos.) C, a presença de um fator ulterior D pode
impedir que A se s iga.
Além disso, jamais pedimos explicações de fatos negativos. Um hóspe �e O tipo (iv) é um caso infrutífero de explicaç
ão. Dificilmente se poderia calcu
de hotel poderia perguntar "por que não há sopa?", mas dificilmente perguntaria lar a resposta para a pergunta "quanta água
há no mar ?" part indo de "há apenas
"por que não há cobras?" - espera-se que haja sopa, não cobras Frequenteme�;e, o quanto deve ter''. Leibniz disse que Deu
: s criou este mundo porque era o melhor
a resposta apropriada para "por que não A?" é "por que deveria haver um A? - dos mundos possíveis, mas "melhor mun
do possível" é uma descrição autocon
mas que papel "por que" e "deverià' desempenham nessa resposta? trad itór ia como "linha mais curva poss
ível"?
Há uma história judaica sobre a qual é frutífero meditar nesse contexto. Parte do problema filosófico da liberdade
de escolha é se devemos aceitar o
Dois estud iosos rabinos estavam lendo a Lei. Eles não foram muito longe - na tipo (ii) ou o tipo (i ii) de expl icação. O Czar
da Rússia não ficou satisfeito com a
verdade, não passaram do Gênesis 1 , 1 : que contém a palavra "eretz" �"terra"). A explicação de que havia um soldado em
guarda no jardim porque sempre houve
pergunta inicial do diálogo que segue é como perguntar em portugues: por que um - esperando ordens; ora, na verdade
ele obedecia a vontade da Imperatriz
'N. de T.: Gênesis 1,1 - "No princípio Deus criou o céu e a terra:'
'N. de.T.: Carl Gustav Jung ( 1 875- 1 961), psiquiatra suíço fundador da nsirnlno;, ,n,1/t;r,
86 P. T. Geach
Razão e argumentação 87
Catarina de que u m guarda protegesse u ma ca mpai nha-de-inverno: assi m, pas projeções na ciência; e a ciê ncia ava n
. se1a çad ª pode ter um valor negativo para a
sa mos do tipo (ii) para o tipo (iii) de explicação. Poder-se-ia dizer, é claro, que brev1ve· • ncia, . pe1a polu so-
ição, seja pela guerra.
há algu mas regras do que sempre acontece que poderia m explicar o capricho Ta mpouco é verdadeiro que nós ho .
mens si mplesmente não podemos
i mperial de Catari na - e mbora ne nhu ma dessas regras seja, de fato, enunciável. ter esses ha'b 1tos,
· que de fato temos, de fiormar . , evitar
Do mes mo modo, a teoria da Criação Co ntí nua é preferida por algu ns à teoria h1poteses (sobre o que aco ntece
pre e �m odo lugar): u ma cultura
;:: _ � que tem hábitos radicalmente difere ntes
do Big Bang porque o hidrogênio poderia ter escoado de u m modo regular até o e existir �rescer. Os astecas, como nos
. ue a e � diz Prescott,. acreditava m que a cada
ser - por oposição a u m único evento de te mpos atrás. cm ois a nos ocorre u ma crise cósmica
1 � após a qual o curso da natureza
(Cf. Tractatus de Wittgenstein, 6.372:º mu ª
· esse modo, tra ncafiavam todas as mulheres grávidas (pois
Assi m, [as pessoas] detê m-se diante das leis naturais co mo diante de algo poderia . m nascer) e apag monstros
avam todas as fogueiras - e à meia-noit
i ntocável, como os antigos diante de Deus e do Desti no. tentava m acender uma fog ue1r e do fi do ciclo
· a. S e e1a acendesse, o curso da
m
natu reza estaria
E u ns e outros estão certos e estão errados. Os antigos, poré m, são mais ?ª:�nt'�do pelos pro, �.mos ci nquenta e dois anos. Foi muito rui m
claros, na medida e m que reconhecem u m ter mo final claro, e nquanto, no caso m 1c10 e u novo Ciclo, os espa nhóis que, logo após o
, � tenham chegado com cavalos, armaduras
do novo siste ma, é preciso aparentar que está tudo explicado.) polvora, coisas que nunca tinha m sido e
vistas antes . . · Mas, co mo eu d 1sse,
' noss
U m tipo de explicação ulterior, cuja i mportância e relação a outros tipos ha' bitos
' de fior mar h1po . , teses cien os
tíficas podem ta mbém nos levar ao desa
são muito questionadas, é a explicação teleológica: responder u ma pergu nta "por stre.
quê?" com "com o fim disso e daquilo". ("Por que veias tê m válvulas? Para que o
sa ngue flua por elas so me nte na direção do coração:') Respostas desse tipo são de TÓP ICOS PARA DIS CUSSÃO
valor heurístico e m biologia: recente mente, J. Z. Young descobriu como o corpo
*"
pineal funciona supo ndo que ele te m algu ma função. (''A ocorreu com o fim de 1. O valor da sobrevivê ncia pode ser usad
o:
que B pudesse ocorrer" não está de ma neira algu ma e m conflito co m "B ocorreu a) para explicar o fato de que órgãos
de coisas vivas parecem ser úteis
por que A ocorreu''.) para determinados fins?
A explicação por "o que se mpre acontece" incorre na dificuldade de que há b) para justificar algum hábito hu ma n
o de crença ou prática? Até o nde
muitos modos e m que o que acontece recente e local me nte pode ser tra nsforma ele pode ser assi m usado?
do em uma regra sobre o que acontece sempre e e m todo lugar - essas diferentes 2. U ma for a de explicação pode ser
_ 1:1 reduzida a outra? Uma é superior ou
projeções sendo completa mente inco mpatíveis. Escolher o que nos parece a pro a nterior a outra?
jeção mais si mples dificil mente pode ser algo mais do que uma questão de pre ( Confira no Fédon de Platão, os difere n
tes modos de Sócrates explicar
guiça. Ta mpouco resolverá dizer que nossas projeções devem se basear em bons por que ele per manece na prisão.)
hábitos, sem os quais não tería mos sobrevivido. Pense na galinha de Bertrand
Russell: com base em experiências passadas, ela corre até o fazendeiro para co
mer todo dia; u m dia ele torce o pescoço dela - mas e ntão ela já havia propagado
sua espécie. A extensão na qual nossas projeções de experiê ncia prese nte devem
ser acuradas para que a raça hu ma na te nha sobrevivido é muito me nor que os
a nos-luz do espaço e os milhões de anos no te mpo acerca dos quais fazemos
'N. de T.: Flor do gênero Galanthus, originária da Ásia e típica de regiões frias.
"N. de T.: W ITTGENSTEIN, L Tractatus Logico-Philosophicus. Tradução de LOPES DOS SANTOS,
L H., Edusp, São Paulo, 200 1 . 'N. de T.: William Hickling Prescott (1 796-1 · .
859) ' h1ston
· ador norte-amencan o especialista na história
"'N. de T.: John Zachary Young (1907-1,9 97), zoólogo e neurofisiologista inglês. da América Espanhola.
Razão e argumentação 89
18 d a vitó ri a/d err ot a d e B onnyb oy n o dia seg uinte. Mas con sider e a form a d e infe
rên ci a (cham ada d e modus t ollens) "se p, entã o q; m as nã o q: ergo nã o p". I sso é
cl ar amente válid o; m as, d e ac ord o c om a tese d os condi ci on ais q ue estam os di s
c utind o, i sso nã o p od eria ser válid o, p oi s , a o extr air a con cl usã o "nã o p'; acab arí
Co ndicio nais am os p or transform ar a afirmaçã o d a pr emi ssa "se p, entã o q" em um a nulidad e.
Há term os té cni cos p ara outr os d oi s m od os válid os e d ua s faláci as:
entã o el a cosp e n el e. a Ingl aterr a em 194 1 nã o torn a v erd ad eir a a pr op osiçã o "se Hitl er tiv esse inv a
condi ci on al "se p did o a Ingl aterra em 194 1 , el e a teria conqui stad o''. ("S ubjuntiv o" é um n om e
om em q ue afirm a um
F oi defendida a te se d e q ue um h- ,, · a verd ad eir o, e q ue, se melh or d o q ue "c ontrafactual'; p oi s tod os os condici onais d essa cla ss e teriam
,, - esta, afi r and o n ad a a na o se r q ue "p seJ
entã o q n ao
n:a diz . end o al go v rdad eir o /fals o dep end end o d a v erd ad e/ antec ed ente e c on seq uente n o m od o s ubj untiv o em l atim - p or m ais inútil qu e
"p" é v erd ad eir,,o, el e est � . ost as.· "s e B onnyb oy v en- sej a e ss a inform açã o p ar a q uem nã o conh ec e l atim -, enq uanto nã o é p arte
. I fun i n no q ue diz resp eito a ap
f al s id ad e d e " ·q , ,,
_ . O s R $ 1 5 est arã o salv os a d as c ondiçõ es d e verd ade q ue o antec ed ente dev a s er falso. "SP Rill th,PccP tirl"
R $ 1 5 que el e v encer a amanh a
sso c o a
além do tratamento racional ("se você fosse um urso, você não gostaria de ser
atormentado") . E obtêm-se tais pares conflitantes como: A coisa certa a ser dita penso eu, é que há um uso
. . . _ de "se" para o qua1 a re-
Se Bizet' e Verdi*' tivessem sido do mesm o país, Bizet teria sido italiano - gra de cond1c10n ahzaçao e, valid
',
a (e para esse uso "se p, enta-0 q" p o de ser escnta
Ve rdi teria sido francês. c�m � " · �P � ,q) ,, (ou "P q'; que, por definição,
; é a mesma coisa ), mas que esse
nao e o un co uso de "se, nos condicionais da
Mas algumas vezes tais conflitos surgem em contextos bastante delicados, � lingu agem ordinária. A disputa
como em R. contra Merrifield: co�temporan ea sobre qual é o uso correto de "se"
_ é simplesm ente tola _ como
a d1sp�ta anti a (e não completamente resolvida)
� sobre o uso correto de "ou":
Defesa: se não tivesse sido dado veneno de rato à falecida, ela teria morrido na exclusivo ou nao exclusivo?
mesma época de doença de fígado.
Promotoria: se a fal�cida não tivesse tido doença de fígado, ela teria mo rrido na
mesma época po r veneno de rato.
EXERCÍCIOS
Às vezes, muita coisa depende de qual condicional subjuntivo nós escolhe 1. Quais dos condicionais seguintes são: (a) gerais;
(b) próprios; (c) ambíguos
mos; nesse caso, era a sorte do prisioneiro que dependia disso. quanto ao m odo com o devem ser tomados?
(ii) ",(p /\ ,q)" é um composto veri-funcional de "p" e "q''. (Cf. Capítulo (i) Se o Sol está em Áries, é primavera na Europa.
16). Podem os verificar por tabelas de verdade que as seguintes formas de infe (ii) Se um hom em é enganado, ele se torna sábio depoi
s disso.
rência são válidas (escrevendo "p 7 q" para ",(p /\ ,q)"): ( �ii) Se S ? crates esteve na rua até tarde, sua mulher r
esmungou.
(1v) Se Socrates era um homem mau, Platão era um menti
roso.
a) (p /\ q) 7 r; ergo (p 7 r) v (q 7 r) 2. Três home ns, Allen , Brown e. Carr, têm uma barbearia.
Há sempre um
b) (p 7 q) 7 r, ,p, ergo r deles trabalhando no horário comercial. Allen , que teve
febre (de modo
c) p 7 r, (p /\ q) 7 ,r, ergo p 7 ,q. que suas mãos treme m), só sai da barbearia com Brown. Carr
é o melhor
na tarefa de barbear. Um lógico, querendo se convencer que,
de quando
Mas, se lemos "p 7 q" como "se p, então q'; parece haver contraexemplos do telefonar, encontrará Carr dispo nível, raciocina da seguin
te m aneira:
senso comum para todas as três formas: (i) Se Carr está fora da barbearia, então, se Allen está
fora da barbearia,
Brown está na barbearia.
a') p = Jim gira a chave às 6h, q = Bill gira a chave às 6h, r = o míssil é dis (ii) Se Allen está fora da barbearia, B rown não está na barbe
aria.
parado logo após as 6h. (iii) Assim, se Carr está fora da barbearia, (ii) é falso. (Comp re (ii) o
a e
b') p = vai chover am anhã, q = os engenheiros não jogarão manhã, r = os consequente complexo de (i).)
(iv) Portanto, Carr não está fora da barbearia - modu tollens (iii)
s
engenheiros não são bons no futebol. (Im agine o t reinador do tim e de
de e (ii).
futebol dos filósofos usando esse caso de (b) em um discurso animador Seu raciocínio é válido?
um dia antes do jogo contra os engenheiros: ele afirma a premissa ",p"
92 P. T. Geach
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Vendedor: Mas vamos supor que, se você comprar o carro, então eu darei ga Cliente: Mas eu disse que comprarei o carro somente se
voce· der garant 1a.
·
rantia: e então? Assim, se eu vou comprar o carro - como você p
retende ter prova-
Cliente: Então eu comprarei o carro. do que devo - você tem que dar garantia.
Vendedor: Posso acreditar em ambas as coisas que você acabou de dizer? Vendedor: Eu não preciso aceitar isso. Você disse que eu pod ·
er1a acred 1"tar no
Cliente: É claro. que você disse: isso é tudo o que venho fazendo ·
ObVI·amffit � W
Vendedor: Então você está logicamente comprometido a comprar o carro de nao estou obn. g do a nada pel que você disse.
_
� � Assim chegamos
qualquer maneira, mesmo se eu não der garantia. a um acordo. VeJo que voce. esta com o seu cartão,
senhor. Muito
Cliente: O quê?! obrigado, senhor. Por favor, assine aqui.
Vendedor: Você diz que comprará o carro somente sob a condição de que, se
você comprar o carro, então eu darei garantia? (Devido a Robert Hambourger)
Cliente: Sim, eu digo isso. Eu não sou um completo idiota!
Vendedor: Bem, então: se você comprar o carro, você comprará o carro
somente se eu der garantia. Certo?
Cliente: Aham.
Vendedor: Mas, em lógica, "p somente se q" é apenas uma variante de "se p,
então q"; assim, "se p, então p somente se q" é equivalente a "se p,
então se p então q" - e isso é equivalente a "se p, então q". /
19 teó rica s. M as , é cl aro, nó s de fat o c onc orda mos em g rand e med id a em n ossa
próp ria c omun id ad e sob re o q ue d eve ser f eito, d o c ont rá rio, n ossa s vid as s eri am
p ob res, só rd ida s, b rut ais e curtas; e, a d esp ei to d e ac ont ec imentos rec ent es, há
u m acord o int ern ac ion al g eral sob re o q ue é ch amad o d e "o p act o d as naçõ es",
Raciocinio prático p or ex empl o, qu e os emb aix ad ore s estã o im un es a at aques, d o c ont rário, tod as as
rel açõ es inte rnac ion ais se ria m uma g uerr a se m li mite s.
Nã o ad ianta tent ar d isc rimin ar ent re d isc urso t eó ric o e prátic o n esse t ip o
d e te rreno. D iz em q ue se p od e ch eg ar a um ac ord o em q uestõe s c ientífic as, mas
nã o em q uestõ es mor ai s; mas, se c on sult ad a a opin ião d a p opul açã o, é provável
coi sas sã o ; raci ocíni os p ráticos
, ao
R ac iocíni os teó ric os d iz em resp eit o a c omo as qu e h aja divergênc ia q uant o a i sso; e p or q ue a lg ué m d everia se preoc upar mai s
q ue deve ser fe ito. . c om as p ervert id as c oncepçõ es mora is d os c an ib ai s d a N ova G uiné ou dos c ien
.
ma s cla sses t ais c omo. enu� _
G ramátic os d ivid em nos so di scurso em algu tist as c ristã os d o que c om as p ervertid as c onc epçõ es ci entífica s d el es?
açõe s. � lóg ic a d i?ciln:ient e �e apli
c iad os, q uestõ es, c omand os, d esej os e exc lam Va mos sup or q ue um h omem ac eit e um c onjunto d e in st ruçõ es A, B, C,... ,
ções ( c omo aq u�l o foi t�l o .1 �; e no
c a a d esej os ("qui sera eu ter as as!") ou excl ama fo rmuland o s eus fin s e d esej os p ara inf er ir dele s o q ue d eve faz er. Vamos supor
o estej a p rog redmd o, n ao h � ��
q ue diz re sp eito a q uestõe s , emb ora o t rab alh també m q ue os seus fin s sã o tod os c on sisten tement e rea liz ávei s n este mund o
a
m d d q . -
resp osta lóg ic a s eg ura p ara "o
q ue c ont a c omo r esp osta a u a a
� uesta o
c ruel. Entã o, o p roced iment o d e rac iocíni o p rát ic o adeq uad o a esse c aso p ode
nv ig d g vez es te.111 d e to � ar ser d esc rit o como seg ue: sup onh a q ue D é uma in struçã o ex eq uível c uj a sati s
um p roble ma a respe it o d o qua
l al uma s
o voc e se mantem
i est a ores
ci on a l). S h n li sta um item que ac eitar D ou D' c omo n orma p ara açã o.
det et ive (que é uma espéci e d e funçã o prop osi
e á a
das 5h30 não colidiria com nossas outras informações; portanto, Jones
deve ter perdido trem das 5h30". O ra.ciocínio prático do conspirador é
sensato; o raciocínio teórico do detetive é tolo.
3. Uma premissa adicionada nunca pode invalidar um raciocínio teórico,
mas pode invalidar um raciocínio prático, pois, se há mais um fim a ser
assegurado, uma prescrição expressando uma política adequada aos
nossos outros fins pode não ser reconciliável com esse fim.
m
cial, não o raciocínio moral. Há uma diferença no estilo de raciocínio,
ou antes, na escolha das premissas?
2. Há uma justificação para considerar diferentemente assuntos de ciência
e assuntos morais? Se há, qual é?
3. Construa um raciocínio prático e considere qual premissa adicional
nele poderia invalidá-lo.