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Organização deste número

Ano 11, nº 19 Jan/jun, 2022


Ivelã Pereira – Editora-Gerente

Revisão textual e gramatical


Fabricio Alexandre Gadotti – língua espanhola
Fernanda Ramos Machado – língua inglesa
Marco Marco Quirino Pessoa – resumos em língua portuguesa
Ivelã Pereira – língua portuguesa

Revisão final
Ivelã Pereira

Projeto gráfico
Glauco Borges

Editor de Layout
Luciano Adorno
Fabiani Cristina de Oliveira Santana

Capa
Renan Racinoski

Catalogação na fonte pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia

EJA em debate / Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de


Santa Catarina. - Ano 11, n. 19 (jan-jun/2022) - . - Florianópolis: Publicação
do IFSC, 2022.
115p. ; 29,7 cm.

Semestral
Inclui bibliografias
ISSN 2317-1839

1. Educação de jovens e adultos. 2. PROEJA. I. Instituto Federal de


Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina. II. Título.

CDD 374

Elaborada por: Paula Oliveira Camargo – CRB 14/1375


Sumário
Editorial 04

Seção: Currículo

Reflexões sobre concepções de currículo integrado e práticas educacionais


no PROEJA 09

Seção: Formação de professores

A educação de jovens e adultos no ensino de Ciências e Biologia: sucessos e


desafios 25

Reflexões a partir de Arroyo: trajetórias humanas e inumanas na EJA 55

Seção: Políticas Públicas

Educação de jovens e adultos: aspectos e desafios sobre o PROEJA 70

Concepções de educação de jovens e adultos na educação de Jovens e


Adultos na educação escolar: a importância de qualificar o direito à
educação 82

Seção: Reconhecimento de saberes

Educação de usuários de bibliotecas para alunos da educação de jovens e


adultos 104
Editorial
Trabalhadores (na EJA) do Brasil: desafios de quem aprende (e ensina)
enquanto trabalha

Caros leitores,

É com muita satisfação que a edição de número 19, do primeiro semestre


de 2022, está sendo lançada. Fazemos, em tal edição, uma homenagem a nossos
alunos de EJA, trabalhadores que aprendem (e nos ensinam) enquanto
trabalham.

Com esta finalidade de homenagem aos trabalhadores brasileiros na EJA,


comemorando o dia 1º de maio, dia dos trabalhadores em nosso país, e também
em deferência (e reverência) aos 100 anos da Semana de Arte Moderna em 1922,
nossa edição 19 aborda, em sua capa, uma releitura da obra de arte “Operários”
(1933), de Tarsila do Amaral.

Procuramos relacionar tal obra ao contexto histórico-social de nossos


alunos de EJA no Brasil, isto é, no quadro da pintora modernista, mostram-se as
várias faces dos trabalhadores do Brasil na década de 1930. Mas como seriam as
faces dos trabalhadores-educandos brasileiros em 2022? Este é o primeiro
número da revista em que pudemos respirar com menos medo (em sentido
literal), por conta da vacinação contra a COVID-19. Assim, as máscaras puderam
ser retiradas (também no sentido estrito) e pudemos ver integralmente as faces
dos nossos educandos de EJA em sala de aula.

Observamos (com o lugar de fala de educação atuante na EJA) que esses


educandos apresentam diversas facetas, contudo, não obstante sua
multiplicidade de etnias, idades, identidades e histórias, apresentam como ponto
em comum a característica (com raras exceções) de serem trabalhadores. Assim,
o educador que trabalha com EJA não pode agir de modo descolado a esta
realidade de seus educandos-trabalhadores, pensando estratégias de ensino que
mais se adequem a esse contexto.

Esses sujeitos que nos são destinados na EJA, além de serem aprendizes,
são também “ensinantes”, ao nos apresentarem conhecimentos a cada dia de
aula, conhecimentos empíricos, construídos na luta de seu trabalho diário. São
empregadas domésticas, pedreiros, eletricistas, agricultores e tantas outras
profissões que exercem nossos estudantes de EJA e nos possibilitam traçar
diálogos frutuosos, de intenso e imenso aprendizado multilateral em sala de aula.
Mas é exatamente essa particularidade do trabalho que os faz tão
profícuos em nos ensinar que também os impossibilita de se dedicar
integralmente aos estudos. Nesse contexto, o educador de EJA se encontra
sempre numa posição delicada, em que luta para que seus estudantes tenham
direito pleno à educação e construam o máximo possível de conhecimentos, mas
também precisa ser empático com a realidade de trabalho, muitas vezes até
extenuante, na qual tais educandos estão inseridos.

E é justamente neste aspecto que nós, educadores de EJA, continuamente


nos questionamos: como proporcionar uma educação de qualidade, que é direito
de todos, e que possibilite – aos educandos-trabalhadores – caminhos de
ascensão social, ao mesmo tempo em que se respeita a condição de cansaço da
classe trabalhadora e se compreende a limitação de tempo para estudos fora do
ambiente escolar?

Esta problemática tem constantemente angustiado educadores de EJA


comprometidos com uma educação emancipatória como direito, e esperamos
que os textos que constituem esta edição da revista possam trazer alguns
horizontes, ou, talvez, ainda mais indagações e inconformação àqueles que se
dedicam ao desafio da dodiscência (FREIRE, 1996) voltada ao público de jovens e
adultos.

Assim, a primeira seção desta edição da revista é sobre “Currículo”, e o


artigo original “Reflexões sobre concepções de currículo integrado e práticas
educacionais no PROEJA”, de Vania Barcelos Furtado (Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar) e Taniamara Vizzotto Chaves
(Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha – IFFar) traz
apontamentos sobre a experiência no Instituto Federal Farroupilha no Curso
Técnico em Cozinha Integrado ao Ensino Médio – Modalidade Proeja – com
docentes das disciplinas profissionalizantes e de Matemática. Tratou-se de uma
pesquisa realizada no âmbito do mestrado Profissional em Rede (ProfEPT), com o
objetivo geral de promover momentos de reflexões sobre o currículo integrado e
as estratégias de desenvolvimento de práticas educacionais integradas no Proeja.
Foram investigadas concepções de “currículo integrado” e “práticas educacionais
integradas” desenvolvidas na Educação de Jovens e Adultos, a partir de dados
coletados por meio de entrevistas e nos diálogos construídos nos encontros de
formação docente. Com base nessa pesquisa, foram obtidas informações a
respeito da prática docente constituída sob a perspectiva do currículo integrado,
além de um mapeamento das dificuldades para a construção do ensino e da
aprendizagem de forma interdisciplinar e das práticas educacionais
desenvolvidas. O estudo, por fim, evidencia a necessidade de construção coletiva
do planejamento e a promoção da docência compartilhada levando em
consideração a problematização, a contextualização e a interdisciplinaridade.
Na seção subsequente, de “Formação de professores”, o artigo original “A
educação de jovens e adultos no ensino de Ciências e Biologia: sucessos e
desafios”, das autoras Mariana Vaitiekunas Pizarro (Unesp/Bauru e UEL) e Simoni
Farias (IFPR/câmpus Londrina), teve como objetivo identificar pesquisas sobre
práticas pedagógicas de sucessos e os principais desafios encontrados para o
ensino de Ciências e Biologia na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Após um
breve resgate histórico da construção educacional, social e política da EJA, foi
realizada uma pesquisa bibliográfica de cunho quali-quantitativo com vistas a
mapear publicações com apontamentos acerca das práticas de ensino em
Biologia na EJA, entre os anos de 2010-2020. As análises realizadas apontaram
que o maior desafio encontrado pelos professores de Biologia é desenvolver
modelos pedagógicos diferenciados que identifiquem a diversidade do público da
EJA e suas especificidades referentes às diferentes faixas etárias, perfis e
situações de vida dos educandos. Ao final, as autoras trazem algumas
considerações/sugestões para o sucesso no desenvolvimento das práticas
docentes. como: priorizar a voz dos alunos em seus currículos; despertar nos
educandos a sua autotransformação em cidadãos críticos e reflexivos; fornecer
condições necessárias para o aluno compreender o espaço escolar como um
ambiente de trocas de experiências e saberes em Ciências que contribuam para a
sua melhoria de vida e também da sociedade.

Na sequência da mesma seção, o relato de experiência “Reflexões a partir


de Arroyo: trajetórias humanas e inumanas na EJA”, de Elzafran Santos Sousa
Lourenço (Instituto Federal de São Paulo – IFSP), Juliana Cristina Perlotti
Piunti (Universidade Federal de São Carlos) e Maria Beatriz Gameiro Cordeiro
(Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho) tem por objetivo geral
apresentar considerações sobre uma atividade proposta pelo Produto
Educacional “Proeja em pauta: uma proposta de formação continuada de
professores”, da pesquisa de mestrado intitulada “Ciclos dialógicos: fundamentos
e perspectivas para implementação de um curso do Proeja no IFSP”, do Programa
de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica em rede
nacional (ProfEPT). As reflexões foram traçadas a partir de um encontro entre o
professor Miguel Gonzalez Arroyo e os professores da instituição, cujo assunto
central da discussão foi a educação que deve ser ofertada aos jovens e adultos
oriundos da classe trabalhadora. Foram discutidos os seguintes pontos: quem são
os sujeitos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) a partir da concepção freiriana
de sujeito; a importância da cultura atrelada aos conteúdos escolares; a
necessidade de reformular os currículos da EJA de modo que atendam às
especificidades dos educandos e educandas oriundos/as da classe trabalhadora;
a urgência em superar o olhar escolarizado sobre o/a estudante trabalhador/a; e
as concepções de educação popular. Elas concluem seu relato de experiência, a
partir das reflexões apresentadas, que as concepções conservadoras de educação
já não suprem as necessidades e direitos educacionais de nossos tempos, sendo
necessário o desenvolvimento de práticas educativas mais justas e assertivas,
para a garantia da educação dos/as trabalhadores/as que retornam às escolas
pela EJA.

Na seção de “Políticas Públicas”, o artigo de revisão “Educação de jovens e


adultos: aspectos e desafios sobre o PROEJA”, de Enriete Cogo Dominguez
(Instituto Federal Farroupilha – IFFar), Maria Rosângela Silveira Ramos (Instituto
Federal Farroupilha – IFFar) e Catiane Mazocco Paniz (Instituto Federal
Farroupilha – IFFar) busca apresentar uma reflexão a respeito da educação de
jovens e adultos, analisando os seus aspectos, desafios e sua relação com a
própria história da educação, em que o educador Paulo Freire surge como uma
referência. Foi destacada a criação do Programa Nacional de Integração da
Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de
Jovens e Adultos, que se constituiu numa política educacional com a proposta de
integração da educação profissional com o ensino médio, na modalidade de
educação de jovens e adultos. Foi realizado um estudo de caráter qualitativo a
partir de revisão bibliográfica de autores dedicados à temática, o que permitiu
concluir que a educação de jovens e adultos se constitui como uma garantia do
acesso à educação, possibilitando a ampliação de acesso e permanência de jovens
e adultos na Educação Básica.

Já o ensaio dissertativo intitulado “Concepções de educação de jovens e


adultos na educação de Jovens e Adultos na educação escolar: a importância de
qualificar o direito à educação”, os autores Bruno César dos Reis Rodrigues (UFG)
e Rones de Deus Paranhos (UnB), está baseado na visão de que a educação de
jovens e adultos é marcada por tradições, concepções e paradigmas educacionais
que têm orientado as práticas pedagógicas nas salas de aula da EJA, com foco na
defesa do direito à educação. Os autores problematizam, por outro lado, que
esse direito pode se orientar com objetivos escusos e alienantes. Assim, o texto
tem por objetivo apresentar ao leitor o construto teórico da concepção
assistencialista-compensatória de educação e a concepção da educação como
direito, nas suas relações com as intencionalidades formativas por trás do direito
à educação, defendido por ambas. Os pesquisadores afirmam que ambas as
concepções defendem o direito à educação e aos conhecimentos sistematizados,
produzidos e acumulados ao longo da atividade humana, entretanto, a concepção
assistencialista-compensatória se orientaria por conservadorismos e a
manutenção das relações sociais verticalizadas da sociedade, com vias a um
projeto formativo contextual. Por outro lado, segundo os autores, a concepção da
educação como direito se orientaria com o objetivo de permitir que o educando,
por meio da apropriação dos conhecimentos sistematizados, desenvolva uma
leitura de mundo para além do aparente. Por fim, eles ratificam a importância de
defender o direito à educação, mas também de se qualificar a educação
defendida, de modo que ela cumpra o papel de humanização do homem, não de
sua alienação.
Por fim, na seção de “Reconhecimento de saberes”, o relato de experiência
“Educação de usuários de bibliotecas para alunos da educação de jovens e
adultos”, de Anderson Leonardo de Azevedo (UERJ) e Arlete Fátima Leal Duarte
(Faculdade São Camilo), é um relato baseado na aplicação de projeto elaborado
para a Biblioteca Emília Bustamante, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz, na cidade do Rio de Janeiro. O estudo
apresenta os resultados da implementação do projeto de educação de usuários
denominado “Biblioteca: aqui pode!”, após uma pesquisa realizada com alunos da
Educação de Jovens e Adultos, com abordagem quantitativa. A execução do
projeto mostrou que alunos de diferentes faixas etárias, mediante informações e
estratégias apropriadas, passam a usar, compreender melhor e aderir
adequadamente às normas e condições de uso e funcionamento da biblioteca. A
pesquisa ainda revela que o projeto colaborou para mostrar que aquele não é um
espaço restrito e de difícil acesso, mas sim de inclusão e integração,
constituindo-se como parte do direito dos educandos-trabalhadores a uma
educação de qualidade.

Esperamos que nossos leitores, trabalhadores na EJA e estudantes (na e)


de EJA, façam uma deleitosa leitura da revista, motivada pela esperança de um
Brasil com uma Educação de Jovens e Adultos cada vez mais qualificada para
nossos trabalhadores-educandos.

Desejamos a vocês, leitores e trabalhadores da EJA, profundas reflexões e


a certeza de que uma educação de qualidade é sim direito de todos os
educandos-trabalhadores no Brasil!

IVELÃ PEREIRA
Editora-chefe
Doutora em Linguística e professora em EJA-EPT (IFSC, câmpus Chapecó)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7840-0678

REFERÊNCIAS

AMARAL, Tarsila do. Operários. 1933. Pintura a óleo (120cm x 205cm).

ARROYO, Miguel Gonzalez. Passageiros da noite: do trabalho para a EJA:


itinerários pelo direito a uma vida justa. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.


São Paulo: Paz e Terra, 1996.
Seção: Currículo | Artigo original | DOI:
https://doi.org/10.35700/2317-1839.2022.v11n19.3272

Reflexões sobre concepções de currículo


integrado e práticas educacionais no
Proeja
Reflections on integrated curriculum conceptions
and educational practices in Proeja
Reflexiones sobre concepciones curriculares
integradas y prácticas educativas en el Proeja

Vania Barcelos Furtado


Mestre em Educação Profissional e Tecnológica
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha (IFFar)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8536-6113

Taniamara Vizzotto Chaves


Doutora em Educação
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Farroupilha (IFFar)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-4872-1141

RESUMO

A experiência aqui relatada foi vivenciada no Instituto Federal Farroupilha no Curso


Técnico em Cozinha Integrado ao Ensino Médio – Modalidade Proeja – com docentes das
disciplinas profissionalizantes e de Matemática. Trata-se de uma pesquisa realizada no
âmbito do mestrado Profissional em Rede (ProfEPT), com o objetivo geral de promover
momentos de reflexões sobre o currículo integrado e as estratégias de desenvolvimento
de práticas educacionais integradas no Proeja. Investigamos, junto aos professores,
concepções de “currículo integrado” e “práticas educacionais integradas” desenvolvidas na
Educação de Jovens e Adultos. Os dados foram coletados através de entrevistas e nos
diálogos construídos nos encontros de formação docente, em que obtivemos
informações a respeito da prática docente constituída sob a perspectiva do currículo
integrado, dificuldades para a construção do ensino e da aprendizagem de forma
interdisciplinar e as práticas educacionais desenvolvidas. Os encontros possibilitaram
debates e reflexões sobre formas de planejamento e necessidades de uma maior

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articulação entre áreas e conhecimentos. Evidenciou-se a necessidade de construção
coletiva do planejamento e a promoção da docência compartilhada, levando em
consideração a problematização, a contextualização e a interdisciplinaridade.
Palavras-chave: Prática docente. Dialogicidade. Currículo Integrado. Proeja.

ABSTRACT

The experience reported here took place at the Federal Institute Farroupilha in the
Technical Course in Cooking Integrated with High School – Proeja Modality – with the
Mathematics teacher and the teachers from professionalizing subjects. This research was
carried out within the scope of the Masters in Professional and Technological Education -
ProfEPT, with the general objective of promoting moments of reflection on the integrated
curriculum and the development strategies of integrated educational practices in Proeja.
In doing so, we investigated with the teachers the “integrated curriculum” concepts and
“integrated educational practices” developed in Youth and Adult Education. Data were
collected through interviews and dialogues during teacher training meetings, where we
had access to information about the teaching practice constituted from the perspective
of the integrated curriculum, the difficulties found in the construction of teaching and
learning in an interdisciplinary way and the educational practices developed. The
meetings enabled debates and reflections on forms of planning and the need for greater
articulation between areas and knowledge. The need for collective construction of
planning and the promotion of shared teaching was evidenced, taking into account
problematization, contextualization and interdisciplinarity.
Keywords: Teaching practice. Dialogicity. Integrated Curriculum. Proeja.

RESUMEN

La experiencia aquí relatada se vivió en el Instituto Federal Farroupilha en el Curso


Técnico de Cocina Integrada con Bachillerato – Modalidad Proeja con profesores de
materias de profesionalización y matemáticas. Se trata de una investigación realizada en
el ámbito de la Maestría Profesional en Red – ProfEPT, con el objetivo general de
promover momentos de reflexión sobre el currículo integrado y las estrategias de
desarrollo de prácticas educativas integradas en Proeja, investigamos con los docentes
conceptos “curriculares integrados” y “prácticas educativas integradas” desarrolladas en
la educación de jóvenes y adultos. Los datos fueron recolectados a través de entrevistas
y diálogos construidos en reuniones de formación docente, donde obtuvimos
información sobre la práctica docente constituida desde la perspectiva del currículo
integrado, las dificultades en la construcción de la enseñanza y el aprendizaje de manera
interdisciplinaria y las prácticas educativas desarrolladas. Los encuentros permitieron
debates y reflexiones sobre las formas de planificación y la necesidad de una mayor
articulación entre áreas y conocimientos. Se evidenció la necesidad de una construcción
colectiva de la planificación y la promoción de la enseñanza compartida, teniendo en
cuenta la problematización, la contextualización y la interdisciplinariedad.
Palabras-clave: Práctica docente. Dialógico. Currículo Integrado. Proeja.

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1 INTRODUÇÃO
O currículo integrado é a base que permeia a concepção de funcionamento e
organização dos cursos técnicos integrados nos Institutos Federais. É nos desafios da
formação integral no Proeja1 que surge a possibilidade de adoção do currículo integrado,
para fazer com que os cursos dessa modalidade possam integrar o trabalho, a ciência, a
técnica, a tecnologia, o humanismo e a cultura geral na elaboração de suas propostas
curriculares, de modo a apresentar os conteúdos aos estudantes de forma
contextualizada, articulada, evidenciando-se a historicidade dos conhecimentos.
No espaço da Educação Profissional Técnica, entende-se que existe uma ausência
de integração entre os conhecimentos trabalhados na disciplina de matemática e os
ensinados nas disciplinas profissionalizantes, resultando em um ensino e uma
aprendizagem fragmentada, o que dificulta o entendimento e a construção da
aprendizagem, uma vez que os conhecimentos geralmente são trabalhados de forma
descontextualizada, linear e não se costuma extrapolar os limites disciplinares.
Quando tratamos de Proeja, reconhecemos como sendo uma modalidade em
que os estudantes buscam não apenas a conclusão dos seus estudos regulares, mas
também um curso profissionalizante. Assim, cabe ao professor, tanto das áreas básicas
quanto das áreas técnicas, trabalhar conhecimentos específicos das suas áreas de
formação e propor metodologias de trabalho, tais como, por exemplo, a Prática
Profissional Integrada, que está prevista dentro dos Projetos Pedagógicos dos Cursos
Técnicos do IFFar, buscando integrar os conhecimentos específicos com os
conhecimentos técnicos, de maneira a proporcionar uma qualificação mais adequada aos
estudantes.
Com o objetivo de promover momentos de reflexões sobre o currículo integrado
e as estratégias de desenvolvimento de práticas educacionais integradas, investigamos
as concepções docentes sobre currículo integrado, estratégias metodológicas utilizadas e
a articulação entre as disciplinas básicas, no caso a matemática, e as disciplinas
profissionalizantes, no espaço da formação de Educação de Jovens e Adultos em um
Instituto Federal.
Este trabalho justifica-se pela importância de conhecer e dialogar sobre as
práticas educacionais que vêm sendo desenvolvidas na Educação de Jovens e Adultos.
Essas reflexões são fundamentais para o desenvolvimento de novas propostas
metodológicas de ensino que possam favorecer a integração dos conhecimentos e a
_______________________
1
Neste texto, será utilizada a nomenclatura “Proeja”, entretanto, a partir do 1º Encontro Nacional da Educação de
Jovens e Adultos da Rede Federal, que se realizou no período de 21 a 23 de maio de 2018, no Instituto Federal de
Goiás, convencionou-se que o Proeja passou a ser chamado de “EJA – EPT”.

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dialogicidade nas práticas educacionais.
Neste artigo, abordamos parte de resultados e análises, realizadas tomando
como base informações obtidas na entrevista e nos encontros de formação docente,
ambas desenvolvidas durante pesquisa de mestrado Profissional em Rede – ProfEPT.
Para este trabalho, utilizamos os depoimentos dos professores como forma de
estabelecer reflexões ao longo do texto.
Sendo assim, na intencionalidade de atingir tais pressupostos já descritos,
apresentamos na sequência o referencial teórico, no qual buscamos teóricos que
dialogam sobre a Educação Profissional e Tecnológica, o currículo integrado e a Educação
de Jovens e Adultos. No tópico da metodologia, descrevemos como foi o seu
desenvolvimento, a abordagem utilizada, os instrumentos escolhidos, o espaço e os
sujeitos envolvidos. Logo após a metodologia, apresentamos resultados e discussões dos
dados coletados, momento em que entender, refletir e analisar, utilizando uma base
teórica, os depoimentos fornecidos pelos sujeitos da pesquisa. Para finalizar o texto, na
conclusão, procuramos explicitar alguns resultados que foram alcançados com este
trabalho.

2 REFERENCIAL TEÓRICO
A fundamentação teórica desta pesquisa está dividida em dois tópicos que
trazem para a discussão aportes conceituais sobre a Educação Profissional e Tecnológica,
o currículo integrado e Educação de Jovens e Adultos.

2.1 A educação profissional e tecnológica e a educação de


jovens e adultos
A educação brasileira desde seu início teve características de dualismo
estrutural, em que o ensino técnico é desenvolvido de forma separada do ensino básico,
e vice-versa, porém a globalização e as novas exigências do mundo do trabalho
requerem um novo profissional. De acordo com Kuenzer (2000, p. 32), este profissional
deve assumir a postura de um trabalhador que se adeque a todos os setores da
economia, com capacidades intelectuais que lhe permitam conhecer e assimilar o saber
numa produção flexível.
Para Saviani (2003, p. 138), a concepção de profissionalização ou de ensino
profissionalizante, vem da sociedade capitalista burguesa que tem como pressupostos a
fragmentação do trabalho em especialidades autônomas, que também vai impactar na
divisão do ensino que será fornecido para determinadas pessoas.

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Em 2001, foi publicado o Plano Nacional de Educação que previa a erradicação
do analfabetismo até o final da década, objetivo esse que não se concretizou. Em 2002, o
governo do Partido dos Trabalhadores estabeleceu uma série de alterações importantes
para a educação brasileira, inclusive para a formação profissional e à Educação de Jovens
e Adultos. Desenvolveu com o Ministério da Educação e Cultura (MEC) um novo programa
para a EJA, associando a educação básica à educação profissional. Neste contexto, o
governo apresentou um projeto de ampliação da Rede Federal de Educação Profissional e
Tecnológica, implantando um Programa de Educação Profissional Integrada ao Ensino
Básico, na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos, o Proeja.
Com o Proeja, a Rede Federal passou a ofertar, além da formação técnica e
básica de nível médio, a formação inicial e continuada de trabalhadores para a conclusão
das etapas finais do ensino fundamental, integrada ao aperfeiçoamento profissional,
estabelecendo, assim, um início de concretização da necessidade de integração entre a
EJA e a Educação Profissional. Há uma grande demanda de jovens e adultos que
reconhecem a importância de conexão entre a escolarização e as exigências do mercado
de trabalho, pois, ao mesmo tempo em que o trabalho dificulta muitos jovens e adultos a
frequentar a escola, o nível de escolaridade e a capacitação são fatores
importantíssimos para manter-se no mundo do trabalho.

2.2 O Proeja e o currículo integrado no espaço dos


Institutos Federais de Educação
Atualmente, a Educação Profissional é uma importante estratégia para os
sujeitos terem acesso às conquistas tanto tecnológicas como científicas, deixando de ser
apenas um instrumento de política assistencialista ou um ajustamento às demandas do
mercado de trabalho. Nesta perspectiva, é que se tem a visão do ensino integrado nos
Institutos Federais, tendo o currículo como espaço articulador de conhecimentos. Para
Frigotto e Araújo (2018, p. 249), o ensino integrado é uma proposta pedagógica que tem
o compromisso de buscar uma formação inteira, que não comporta um ensino
fragmentado da cultura sistematizada, defendendo o direito de todos ao acesso a uma
educação que oportunize o desenvolvimento intelectual e físico dos estudantes. Através
da união de duas modalidades educativas, utilizando um currículo integral que aplica
ementas sobre o mundo do trabalho e a prática social do estudante, espera-se abordar
todos os saberes de diferentes áreas do conhecimento.

Na educação profissional, destacamos o distanciamento das atividades


curriculares e pedagógicas existentes entre os docentes que ministram
as disciplinas de formação técnica específica e os profissionais das

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disciplinas do núcleo comum e o consequente processo de fragmentação
dessas disciplinas. Essa situação decorre da dualidade da educação
brasileira enraizada na nossa história (OLIVEIRA, 2012, p. 157).

Com o objetivo de modificar essa realidade, o Programa Nacional de Integração


da Educação Profissional à Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e
Adultos (Proeja), tem a perspectiva de atender à demanda da sociedade, com ações
educacionais pensadas para sujeitos com trajetórias de vida marcadas pelo fracasso
escolar e excluídos da oferta profissional técnica. São jovens e adultos com diferentes
experiências de vida, trabalhadores que conhecem a realidade do subemprego e o
desemprego, residem em locais normalmente com ausência de serviços públicos básicos
e se apresentam, muitas vezes, inseguros e desmotivados.
Furtado e Lima (2010, p. 203) também contribuem ao afirmar que:

O PROEJA, situando-se entre as iniciativas adotadas para atender, em


particular, à população jovem e adulta trabalhadora, pouco escolarizada,
apresenta uma possibilidade inovadora e desafiadora, o que poderá
representar a criação de mais um paradigma no campo educacional,
desafio que se coloca para a modalidade, mediante a oferta de ensino
fundamental e médio integrado à educação profissional.

Assim, o estudante do Proeja precisa ter um reconhecimento antecipado de sua


realidade para assim poder participar ativamente de sua história e, mais ainda, da sua
capacidade de transformá-la. Ele tem consciência de suas dificuldades e, muitas vezes,
não se sente merecedor de uma atenção maior do professor. Por isso, toda a ação
educativa, para que seja adequada, deve ser precedida tanto de uma reflexão sobre o
homem como do meio de vida que ele leva, valorizando os seus direitos.
Para Maraschin (2019, p. 210) apresentar o trabalho como princípio educativo nas
práticas com jovens e adultos, significa “desenvolver a criticidade dos estudantes”
reforçando que “a educação não é mercadoria e negócio. É criação, e, portanto, não deve
qualificar para o mercado, mas para a vida” (MARASCHIN, 2019, p. 254). É preciso que se
faça, pois, desta tomada de consciência a respeito da educação e, consequentemente, do
ensino, uma possibilidade de provocar e criar condições para que se desenvolva o
processo de ensino-aprendizagem.
Para Ciavatta (2005, p. 20), promover a integração no ensino médio significa
“focar no trabalho como princípio educativo, superando a dicotomia trabalho
manual/trabalho intelectual, incorporando a dimensão intelectual ao trabalho produtivo e
formar trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos”. Esta perspectiva
teórica fica ainda mais evidente no espaço da Educação de Jovens e Adultos, que
historicamente se constitui como espaço onde os sujeitos trabalhadores voltam à escola

[ 14 ]
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para buscar qualificação e melhorias na vida pessoal, profissional e no próprio espaço de
trabalho.

3 METODOLOGIA
Neste momento, apresentamos o tipo de estudo realizado, bem como os
métodos e instrumentos de coleta de dados escolhidos, o espaço no qual a pesquisa foi
desenvolvida e os sujeitos participantes. Esses dados foram fundamentais para a
concretização do nosso objetivo geral de promover momentos de reflexões sobre o
currículo integrado e as estratégias de desenvolvimento de práticas educacionais
integradas no Proeja. Vale ressaltar que, por ser um trabalho desenvolvido com pessoas,
ele passou por avaliação e foi aceito pelo Comitê de Ética em Pesquisa cadastrado na
Plataforma Brasil sob o número de parecer 3.342.937.
A abordagem utilizada nesta pesquisa é de cunho qualitativo com a perspectiva
de entender a questão do ser humano através da dimensão educacional. Para Zanette
(2017), a pesquisa qualitativa pode proporcionar um bom trabalho científico à medida
que se utilizam metodologias mais próximas da realidade a ser pesquisada. Ademais, a
pesquisa qualitativa propicia ao pesquisador colocar-se no lugar do outro com a
perspectiva de entender a questão do ser humano através da dimensão educacional.

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se


preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode
ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados,
motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um
espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que
não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (MINAYO, 2001,
p. 21).

O espaço de investigação foi o Instituto Federal Farroupilha (IFFar), câmpus de


São Borja – RS, mais especificamente o Curso Técnico em Cozinha Integrado ao Proeja. Os
instrumentos de coleta de dados foram entrevistas semiestruturadas e encontros
virtuais com os professores. Para a entrevista, foram convidados 7 professores que
atuavam no curso, sendo 5 professores das disciplinas profissionalizantes (núcleo
politécnico e técnico) e 2 professores da disciplina de matemática.
A entrevista semiestruturada teve como proposição obter conhecimentos sobre
as concepções de currículo integrado, metodologias, dinâmica de integração entre as
disciplinas e o planejamento da prática profissional. Também foram realizados dois
encontros virtuais de formação docente, os quais aconteceram através da plataforma
Google Meet, com o objetivo de dialogar e refletir com os professores sobre as práticas
desenvolvidas, o estudante da Educação de jovens e Adultos, a necessidade de

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planejamento coletivo e da docência compartilhada. Nesses encontros, os professores
analisaram as respostas das entrevistas, debateram questões sobre seus planejamentos
e a prática docente.
Os dados coletados – tanto na entrevista como nos encontros – foram
analisados a partir da técnica de análise de conteúdo. As contribuições dos professores
foram colocadas neste artigo em forma de descritores.
Na Tabela 1, foram apresentados a área de formação dos professores
participantes da pesquisa, bem como os componentes curriculares que ministram no
Curso Técnico em Cozinha do IFFar.

Tabela 1 – Formação e atuação dos docentes entrevistados

Docentes Sexo Formação Componente curricular em que atua


Bacharel em Noções de planejamento de cardápios e
Docente 1 (D1) F
Gastronomia áreas fiscais
Docente 2 (D2) F Nutricionista Nutrição básica e Higiene
Bacharel em Cozinha Fria e Arte Culinária; Noções de
Docente 3 (D3) F
Gastronomia Panificação e Confeitaria
Docente 4 (D4) M Gastronomia Cozinha Brasileira e Internacional
Turismo e
Docente 5 (D5) F Habilidades Básicas de Cozinha
Gastronomia
Licenciatura em
Docente 6 (D6) F Matemática
Matemática
Licenciatura em
Docente 7 (D7) M Matemática
Matemática

Fonte: autoria própria (2020)

4 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS


As práticas educacionais desenvolvidas são permeadas pelos entendimentos que
os professores apresentam sobre o que é efetivamente o “currículo integrado”, ainda que
muitas vezes não tenham uma compreensão elaborada sobre o assunto. Nesse sentido, o
planejamento didático reflete esta compreensão ou a falta dela. Quando perguntados
sobre o que entendem por “currículo integrado” e como ele acontece em suas aulas, os
professores responderam:

Trabalhar as disciplinas de uma maneira que uma faça sentido com a


outra, de uma maneira que a gente tenta passar para nossos alunos.
Você trabalhar as disciplinas básicas junto com as técnicas dentro da
realidade da EJA tentando fazer o que a palavra currículo integrado traz a
integração entre elas, com atividades, como várias que a gente faz, para

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além de trabalhar única exclusivamente as disciplinas em sala de aula.
(D1)
É a proposta de um currículo que todas as disciplinas se conversem com
o intuito do aluno sair daqui formado técnico e formado sabendo por que
a matemática está dentro da parte técnica, por que o português está
dentro da parte técnica, para, então, integrar as disciplinas. (D2)
Uma integração entre as disciplinas e os conhecimentos, não só técnicos,
não somente os conhecimentos que oferecemos para eles, mas também
as bagagens que eles trazem. (D3)

Pelos depoimentos dos professores, pode-se inferir que a compreensão de


currículo integrado perpassa pelo estabelecimento de relações entre conhecimentos de
diferentes disciplinas, ou seja, trabalhar de forma interdisciplinar, tentando trazer a
aplicação de alguns conteúdos e valorizando os conhecimentos e experiências práticas
que os estudantes já possuem. A definição dada ao “currículo integrado” não é
considerada incorreta, porém a ideia de “currículo integrado” vai além da
interdisciplinaridade, uma vez que o ensino deve estar voltado para a formação humana
integral, discutir sobre o trabalho, os movimentos sociais, o meio ambiente, direitos e
deveres, enfim, dar oportunidade de desenvolvimento e conhecimento ao aluno de forma
integral.
Verificamos também que alguns professores apresentam dúvidas sobre o que é
o currículo integrado:

Eu faltei à formação pedagógica, estudei para o concurso. Não vou tentar


responder porque não lembro direito. (D4)
Na verdade, não sei se sei o correto, mas, para mim, seria trabalhar
algumas disciplinas em conjunto, por exemplo, os conhecimentos que se
aprendem na matemática tentar aplicar na técnica, geografia e português
também. (D5)

Essas incertezas são reflexos da carência de capacitações e formações


permanentes dos professores. São momentos e espaços que podem proporcionar mais
debates e reflexões sobre suas práticas e o currículo que devem desenvolver.
Percebemos, durante as entrevistas e na análise das respostas, que existe um
esforço maior por parte dos professores para o trabalho no Proeja e a tentativa de
manter os estudantes interessados e motivados nas suas disciplinas, apesar dos desafios
que são apresentados nas falas a seguir:

O Proeja tem as disciplinas técnicas, e eles querem só as técnicas. Eles


não gostam de matemática, português, geografia. Nem a minha, eles
gostam, porque eles não vão para a cozinha. (D2)
No geral, eles têm muitas dificuldades. Para desenvolver algum conceito
preciso voltar à explicação desde o ensino fundamental. Preciso sempre

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pensar em outras formas de explicar e sempre começar um conteúdo
retomando a base da base. Se pedir para eles puxarem da memória, não
funciona. (D6)

Quando questionados sobre as estratégias metodológicas utilizadas para que o


aluno do Proeja supere suas dificuldades, os professores relataram que:

Tem um ponto facilitador, que é a prática. A gente consegue trabalhar de


uma maneira lúdica algumas coisas, trazer de uma maneira diferente,
identificar as dificuldades e trazer para a prática atividades que eles
encontrem as soluções. (D1)
Como a minha disciplina é na parte de higiene, e eles trabalham na
cozinha, trabalham em casa ou fora, e muitos trabalham em casas de
outras pessoas, eles acabam assimilando o conteúdo com o dia a dia. É
mais fácil. Quando chega a parte de nutrição, é mais complicado para eles
entenderem que têm que conhecer o alimento para poder trabalhar com
o alimento. (D2)
Uma forma de lidar com as dificuldades deles é adaptar os objetivos de
cada conteúdo. Claro que pode parecer que estou subestimando a
capacidade deles, mas como estou acompanhando-os desde o início do
ano. Já conheço e sei até onde posso ir. Quando consigo, levo exemplos
da cozinha, para que eles se interessem e entendam de onde vem. (D6)

Nos depoimentos, verificamos que, quando os professores se referem às


práticas, os estudantes conseguem fazer a relação com seu trabalho e, fazendo isso,
manifestam mais interesse nas explicações, tendo em vista que o conteúdo é trabalhado
de forma contextualizada. A fragmentação do conhecimento em áreas ou em campos de
conhecimento, distribuídos na escola em disciplinas, transmite a ideia do limite, da
especialização, do saber específico, reforçando ações individualizadas de cada professor,
de maneira desarticulada das demais disciplinas. Na perspectiva do ensino integrado,
para Ramos (2008, p. 20), a integração curricular deve “possibilitar às pessoas
compreenderem a realidade para além de sua aparência fenomênica”, em que o
conhecimento deve ter uma utilidade social.
Em outro momento, eles foram questionados se as metodologias utilizadas nas
turmas do Proeja são diferentes. Nesse sentido, a docente D5 afirma que:

A metodologia utilizada nas turmas do Proeja é um pouco diferente


porque a gente tem que estar mais presente. Nesta disciplina, eu trabalho
uma parte teórica para iniciar e embasar sobre o mundo da gastronomia,
situando-os nesta área,. Temos que falar um linguajar mais simples às
vezes, explicar de outra forma, ter uma paciência maior com eles,
dificuldades de leitura, tento mostrar na atividade o que é para fazer,
fazemos leituras juntos, a maioria são carentes de atenção. (D5)

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O relato da professora nos mostra que é uma característica comum nas turmas
do Proeja, essa necessidade de o professor ter empatia, compreender que seu aluno terá
maiores dificuldades, que precisará de paciência e diferentes formas de explicações.
A partir desses apontamentos, questionamos os professores sobre como
acontece a integração entre as disciplinas do curso, se são realizadas atividades
interdisciplinares e qual era a colaboração de cada um para o seu planejamento e
realização. As falas, a seguir, denotam as práticas desenvolvidas pelos professores em
relação ao questionamento realizado.

De uma maneira geral, cada um desenvolve a sua disciplina. (D1)


Planejar junto é só na PPI, que ocorre duas vezes por ano. Temos
reuniões de conselho de classe, mas é para discutirmos sobre os alunos
de passa ou não passa, aquela “Guerra”, e outras reuniões para tratar
assuntos que surgem de extras e problemas. (D4)
A integração acontece através das PPIs, que é uma forma de desenvolver
o currículo integrado, na reunião no início do semestre se decide qual
tema será abordado e os professores são convidados a participar, nem
todos participam. (D5)

Ao se analisar os relatos, percebe-se que a integração disciplinar, acontece


somente no espaço da Prática Profissional Integrada (PPI), sendo ela planejada em
reuniões antes do início do ano letivo. Nestes encontros, os professores são convidados
pela gestão do curso a participar, definem o tema a ser trabalhado, o qual é proposto
para ser trabalhado a partir de um projeto de ensino. Ainda, neste projeto, deverão
constar as disciplinas (ou componente curriculares) que farão parte da proposta, tendo a
responsabilidade pelo desenvolvimento da PPI. A partir desse momento, cada professor
realiza seu plano de ensino, de forma isolada, ainda que exista um discurso institucional
de que a integração curricular pode e deve acontecer em outros espaços que envolvam o
ensino, a pesquisa e a extensão.

Agora, fazendo uma autocrítica, falta uma integralização entre os


próprios professores, porque às vezes a gente constrói uma PPI, a gente
da parte técnica nos preocupamos com as práticas, como os alunos vão
desenvolver aquela atividade, a gente convida alguns professores, monta
aquele documento da PPI e depois ninguém mais se conversa.
Teoricamente, cada professor trabalhou seus assuntos, e a gente acaba
não integrando de verdade. (D1)

O que a professora relata em tal depoimento demonstra que existe a


segmentação entre os conhecimentos da área técnica e conhecimentos básicos, sendo
um fator presente no pensamento e nas ações dos professores.

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Eu também vejo que, muitas vezes, a gente está só cumprindo o dever
que temos de realizar a PPI, e a gente esquece do aprendizado que é a
PPI. Nós não sentamos para conversar e, muitas vezes, também não
damos esse espaço em sala de aula para os alunos conversarem, para
eles discutirem e entenderem essa PPI. (D3)

Fica claro que existe uma falha no desenvolvimento e na efetivação das PPIs,
sendo que o seu objetivo principal parece não estar sendo alcançado, já que a integração
não acontece de forma efetiva e que não existe um processo com início, meio e fim PPIs.
A começar pela maneira como é organizada, em que os professores sentem falta de
encontros e espaços para a troca de informações, conhecimentos e do planejamento
coletivo, momento no qual aconteceria a proposta da verdadeira integração, ao buscar o
entendimento do perfil de alunos que o curso deseja formar e a aproximação dessa
formação com o mundo do trabalho.
Nos próximos relatos, observa-se, ainda, que os professores que trabalham com
as disciplinas da formação geral dialogam pouco e praticamente não efetuam
planejamento em conjunto com os professores que trabalham com as disciplinas da
formação técnica.

O que acontece é que cada um está na sua área, cada um está na sua
caixinha. É muito difícil você olhar para o lado e tentar integrar. Eu coloco
alguns textos curto, e já é um pânico para eles. É difícil para o professor
e é difícil para o aluno. (D6)

E como os professores que estão responsáveis pela execução da PPI não


costumam dialogar, o mesmo se repete com os alunos, conforme os relatos:

No ano passado na PPI, fiquei muito frustrada, porque o evento foi ótimo.
Na prática deu tudo certo, mas, no final no último dia, quando eu estava
numa sala com os professores que participavam da PPI, eu me peguei
sentada, naquele momento, pensei “o que a gente integrou aqui?” Os
alunos estavam fazendo um prato, o que a gente já faz diariamente em
sala de aula, e eu fiquei frustrada porque pensei: “o que mudou?” (D1)
Nunca tinha pensado nisso. A gente fala para os alunos que vamos fazer
a PPI, explica como acontecerá, mas a gente nunca fez essa ação de
discutir com eles sobre essa prática (D2)

O fato de a professora D1 se sentir frustrada, por não ter verificado na prática,


mudanças nas ações dos estudantes, ou que essa atividade tivesse acrescentado algo,
para o desenvolvimento deles, nos faz pensar, que é necessário resgatar a verdadeira
intenção de se realizar o projeto das PPIs, o qual deverá possibilitar a efetivação de uma

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ação interdisciplinar, mediante o planejamento integrado e coletivo, assim contribuindo
para a construção do perfil profissional de um Técnico em Cozinha.
Tais depoimentos demonstraram também que, a partir do momento em que os
estudantes recebem propostas de práticas, que são executadas diariamente, ou seja, são
atividades que eles já estão acostumados a realizar e essas práticas, como já
mencionado antes, não são do tipo ação/reflexão, fazem-nos concluir que as PPIs são
desenvolvidas no nível tecnicista do “saber fazer”, mas não do refletir sobre o “por que
aquilo foi feito”, ou ainda “que aprendizagens foram construídas” com base naquela
prática.
Segundo Maraschin (2019, p 215). “o ser humano precisa ter a compreensão
unitária da técnica em função das condições sociais em que a realiza, passando a
dominar o que executa e todas as demais, sabendo o que significa quanto vale e quais as
finalidades da técnica”.
Para Moll (2010, p. 92), as alternativas didáticas de integração precisam ser
acompanhadas e avaliadas nos seus propósitos e formas de implementação. A autora
ressalta que, a princípio, nenhuma técnica tem poder mágico. E são as pessoas que se
encontram envolvidas no processo com suas necessidades, aspirações e expectativas
que poderão aumentar seu potencial de educar, quanto mais incentivos se fizerem à
autorreflexão e autocrítica.
São práticas cristalizadas e reproduzidas, na maioria das vezes, de forma
empírica, sem uma intencionalidade aparente, apenas com repetição de modelos
eternizados e assentados em paradigmas tradicionais. Não há uma reflexão da prática, e
as situações de ensino não são planejadas para gerar a aprendizagem significativa para o
aluno, isto é, são somente executadas, tendo o conteúdo como mediação. Romper com
este paradigma se torna necessário.

Hoje, a gente faz é sair da ementa e vai pensar de forma separada, vou
tirar duas aulas para fazer a PPI e tenho que reorganizar meu conteúdo o
que a gente tem que fazer é inserir a PPI e não pensar que vou perder
duas aulas para realizá-la. (D1)
Eu também nunca relacionei com eles a PPI com meus conteúdos da
ementa. Acho que isso precisamos colocar no nosso planejamento. (D2)
A gente das técnicas, que fazemos as PPIs, nunca paramos para pensar, e
eu me dei conta disso agora com essa conversa. Este momento está
sendo bem legal por isso. (D5)

Percebe-se, em tais depoimentos, que, até o momento dos encontros virtuais,


promovidos pelas pesquisadoras, a maioria dos professores não tinha constatado que as
Práticas Pedagógicas Interdisciplinares desenvolvidas, não satisfaziam as reais
necessidades, tanto dos professores que têm em seus planejamentos uma grande

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oportunidade de trabalhar a integração, quanto as dos estudantes, os quais deveriam ser
o principal foco da realização da PPI, que estão deixando de refletir e de estabelecer
novas relações com as práticas.

Nós precisamos refletir sobre nosso papel, sobre o nosso trabalho, o


papel de mediadores. Nós temos que ouvir nossos alunos, o que eles
acham dessas experiências com as PPIs e melhorar com o objetivo de
alcançar o aprendizado entre as disciplinas técnicas e as básicas,
construir essa interdisciplinaridade e deixá-la palpável. (D3)

A proposta da docente D3 surgiu durante um dos encontros de formação, no


qual os professores colaboraram muito com as reflexões feitas naquele momento.
Através das interlocuções, perceberam que precisam assumir o papel de mediadores e
devem dar a oportunidade aos estudantes para dialogarem sobre as experiências boas e
ruins da prática, além de buscar melhorar esse processo para que realmente aconteça a
construção conjunta de novos conhecimentos.

Parar para conversar, cada um olhar para a sua prática, mas a gente não
identifica algumas coisas sozinhos. Só através do diálogo. (D5).
E então, de repente, estou aqui pensando que a gente poderia colocar
essa PPI para duas semanas: uma semana ter a PPI e na outra semana a
gente fazer a discussão. A gente coloca no Plano de ensino esse
planejamento de falar sobre os resultados da PPI com os alunos. (D2).

Finalmente, a partir das interlocuções nos encontros de formação, os docentes


pesquisados manifestaram a necessidade de realizar mais encontros, com a finalidade de
promoverem a politecnia, a formação integral, a interdisciplinaridade, integrando os
núcleos da organização curricular, fomentados pelo desejo de conhecer novos conceitos,
metodologias e práticas educativas.

5 CONCLUSÃO
Com o desenvolvimento desta pesquisa, tivemos a oportunidade de conhecer um
pouco mais um dos programas, que procura dar sentido diferenciado à Educação de
Jovens e adultos e a Educação Profissional e Tecnológica, chamado Proeja. Os encontros
e as conversas geraram movimento no modo de pensar dos professores quanto à
elaboração do planejamento e o exercício da prática pedagógica. Através do diálogo,
houve reflexões sobre as práticas de integração que são desenvolvidas no Curso de
Técnico em Cozinha Integrado (Proeja), chegando à conclusão de que, especialmente em
relação às atividades de PPI, não há a integração de fato, que é necessária uma maior

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aproximação entre os professores para planejar e para oportunizar a participação e o
protagonismo dos estudantes, despertando, assim, para a formação da autonomia e para
a compreensão do processo educativo como um todo.
É necessário que esses professores vivenciem espaços constantes de formação
continuada, de interações e trocas, preferencialmente a partir de coletivos colaborativos,
nos quais se possam realizar trocas de experiências, reflexões e construções coletivas da
docência. Entendemos que essa é uma das premissas e uma das necessidades que
permitem configurar o currículo integrado, ou seja, os professores necessitam ser
colocados em espaços de formação e reflexão que possibilitem a construção coletiva e
integrada.
Com os resultados, ficou evidente que os professores costumam desenvolver
suas aulas de forma bastante individual, ainda que os docentes sinalizem que existe
diálogo e aproximação entre o grupo que trabalha com a área profissional, entretanto,
ainda não é uma integração ideal, pois permanece somente na área, não abrange a área
básica e, por fim, não costuma provocar reflexões e modificações sobre o trabalho
desenvolvido. Ainda, apesar de evidenciarmos que os professores já realizam momentos
de interlocuções é preciso que esta não seja feita de qualquer forma, ou seja, é
necessário que todos desenvolvam uma escuta sensível sobre as especificidades dos
estudantes do Proeja, que reconheçam a importância de falar com eles e estabeleçam
relações afetivas positivas em suas práticas pedagógicas, acolhendo a diversidade
cultural, social e econômica.
Quanto ao “currículo integrado” e o trabalho como princípio educativo no Curso
Técnico em Cozinha Integrado Proeja, ainda são desafios a ser superados, constatamos
que a comunidade escolar precisa oferecer mais espaços para dialogicidade. Muitas
experiências são desenvolvidas, mas não são compartilhadas e socializadas, pois os
conceitos e atividades ficam mais no nível teórico, e poucas estabelecem relação com a
prática. A maioria dos professores pesquisados apresenta a concepção de que “currículo
integrado” é o trabalho com atividades contextualizadas e interdisciplinares, e que ele
estaria sendo desenvolvido através das práticas profissionais integradas. No entanto,
com os debates e as reflexões, os próprios professores concluíram que o currículo vai
muito além e precisa ser mais bem estudado e planejado, com o pensamento voltado ao
estudante, a partir das suas impressões e experiências, possibilitando que o educando
participe e se torne mais proativo em sua aprendizagem.

REFERÊNCIAS

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Vozes, 1993.

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
Seção: Formação de Professores | Artigo original | DOI:
https://doi.org/10.35700/2317-1839.2022.v11n19.3287

A educação de jovens e adultos no ensino


de Ciências e Biologia: sucessos e
desafios
Youth and adult education in science and biology
teaching: successes and challenges
La educación de jóvenes y adultos en la enseñanza
de ciencias y biología: éxitos y desafíos

Mariana Vaitiekunas Pizarro


Doutora em Educação para a Ciência (Unesp/Bauru)
Universidade Estadual de Londrina – UEL
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-2912-9436

Simoni Farias
Graduada em Ciências Biológicas (IFPR/câmpus Londrina)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná – IFPR/câmpus Londrina
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-2165-4172

RESUMO

Este artigo teve como objetivo identificar pesquisas sobre práticas pedagógicas de
sucessos e os principais desafios encontrados para o ensino de Ciências e Biologia na
Educação de Jovens e Adultos (EJA). Após o resgate histórico da construção educacional,
social e política da EJA, realizou-se uma pesquisa bibliográfica de cunho
quali-quantitativo a fim de mapear publicações que pudessem apontar características
específicas das práticas de ensino em Biologia na EJA. Este estudo dedicou-se às
produções levantadas entre os anos de 2010-2020. Foram identificados 98 artigos dos
quais apenas 30 foram selecionados para análise de dados, pois se encaixam no escopo
deste estudo. As análises realizadas apontaram que os maiores desafios encontrados
pelos professores de Biologia são: desenvolver modelos pedagógicos diferenciados que
identifiquem a diversidade desse público e suas especificidades referentes às diferentes
faixas etárias, perfis e situações de vida dos educandos. Outrossim, é possível inferir que
o caminho para o sucesso no desenvolvimento dessas práticas deve priorizar a voz dos

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alunos em seus currículos; despertar nos educandos a sua autotransformação em
cidadãos críticos e reflexivos; dar condições necessárias para o aluno compreender o
espaço escolar como um ambiente de trocas de experiências e saberes em Ciências que
contribuem para a sua melhoria de vida e também da sociedade.
Palavras-chave: Educação de jovens e adultos / EJA Ciências, EJA Biologia/ EJA Ciências e
Biologia.

ABSTRACT

This article aimed to identify research on successful pedagogical practices and the main
challenges encountered in the teaching of Science and Biology in Youth and Adult
Education (EJA). After conducting a historical rescue of the educational, social and
political construction of the EJA, a qualitative-quantitative bibliographic research was
carried out to map publications that could point out specific characteristics of teaching
practices in Biology in EJA. This study focused on the productions published between the
years 2010-2020. Ninety-eight articles were identified, from which only 30 were selected
for data analysis as they fit the scope of this study. Results showed that the biggest
challenges faced by Biology teachers are: to develop differentiated pedagogical models
that identify the diversity of the EJA public and its specificities regarding different age
groups, profiles and students’ life situations. Furthermore, it is possible to infer that the
path to success in the development of these practices must prioritize the voice of
students in their curricula; awaken in students their self-transformation into critical and
reflective citizens; provide the necessary conditions for the student to understand the
school space as an environment for exchanging experiences and knowledge in Science
that contribute to the improvement of their lives and also of society.
Keywords: Youth and adult education; EJA Science; EJA Biology; EJA Science and Biology.

RESUMEN

Este artículo tuvo como objetivo identificar investigaciones sobre prácticas pedagógicas
exitosas y los principales desafíos encontrados en la enseñanza de Ciencias y Biología en
la Educación de Jóvenes y Adultos (EJA). Luego del rescate histórico de la construcción
educativa, social y política de la EJA, se realizó una investigación bibliográfica
cualitativa-cuantitativa para mapear publicaciones que pudieran señalar características
específicas de las prácticas docentes en Biología en la EJA. Este estudio estuvo dedicado
a las producciones recopiladas entre los años 2010-2020. Fueron identificados 98
artículos, de los cuales sólo 30 fueron seleccionados para el análisis de datos, ya que se
encajan en el alcance de este estudio. Los análisis realizados mostraron que los mayores
desafíos que enfrentan los docentes de Biología son: desarrollar modelos pedagógicos
diferenciados que identifiquen la diversidad de este público y sus especificidades
respecto a diferentes grupos de edad, perfiles y situaciones de vida de los estudiantes.
Además, es posible inferir que el camino hacia el éxito en el desarrollo de estas prácticas
se debe priorizar la voz de los estudiantes en sus currículos; despertar en los estudiantes
su autotransformación en ciudadanos críticos y reflexivos; brindar las condiciones
necesarias para que el estudiante comprenda el espacio escolar como un ámbito de

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intercambio de experiencias y conocimientos en Ciencias que contribuyan al
mejoramiento de su vida y también de la sociedad.
Palabras-clave: Educación de jóvenes y adultos; Ciencia EJA; Biología EJA; EJA Ciencia e
Biología.

1 INTRODUÇÃO
Pensar sobre a emancipação do sujeito por meio da Educação, em qualquer fase
da sua vida, envolve pensar em práticas pedagógicas que coloquem o estudante para
refletir criticamente sobre as condições que se impõem a ele na vida em sociedade e
quais as possíveis relações entre o que aprendemos na escola e a nossa vida. Dessa
forma, os conteúdos que aprendemos na escola podem tomar vida no dia a dia em
sociedade se os estudantes forem encorajados a compreender e estabelecer as possíveis
relações entre os conteúdos que se aprende na escola e a forma como estão presentes
na vida em sociedade.
Pensando especificamente no ensino de Ciências e Biologia, vivemos um marco
histórico desafiador na História da humanidade por conta da Pandemia de COVID-19 que
modificou completamente a vida em sociedade e as relações sociais. De um dia para
outro, a Ciência entrou em nossas casas por meio das notícias, novas posturas de
convivência foram desenhadas (por exemplo: distanciamento social, máscaras, álcool
70%, entre outros), protocolos de segurança para uso de espaços públicos e privados
foram adotados, e a conscientização para a vacinação tornou-se essencial por ser a única
saída coletiva para a solução desse problema. Esse novo cenário colocou luz sobre a
importância da alfabetização científica da população em geral, independentemente da
idade, e de estarem ou não na escola, de modo que a solução da Pandemia depende de
uma compreensão pública da Ciência muito mais apurada e crítica.
Como destaca Lorenzetti (2021, p. 66):

Ser alfabetizado cientificamente e tecnologicamente é possuir um


conjunto de habilidades, atitudes e conhecimentos que compõem um
longo e complexo processo. Não é apenas um processo de aquisição de
conceitos e fatos científicos, mas um processo de emancipação e
conhecimento, desenvolvendo uma consciência crítica da sociedade e de
seus objetivos, estimulando, também, a iniciativa e a participação na
elaboração e desenvolvimento de projetos para transformar o mundo,
propiciando o crescimento e o desenvolvimento do ser humano,
contribuindo para a mudança social. [...] No contexto educacional, a
Alfabetização Científica e Tecnológica tem sido considerada como uma
atividade vitalícia e como um processo permanente.

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
Partindo da compreensão de que o ensino de Ciências e Biologia é o caminho
para a promoção da alfabetização científica também na Educação de Jovens e Adultos
(EJA) e reconhecendo que tal ensino também é responsável por aproximar as discussões
científicas desse público, o presente artigo tem por objetivo identificar pesquisas sobre
práticas pedagógicas de sucessos e os principais desafios encontrados para o ensino de
Ciências e Biologia na EJA.
Nossa intenção é apresentar características de práticas de ensino em Ciências e
Biologia na Educação de Jovens e Adultos visando a ampliar a compreensão da própria
comunidade científica sobre a importância dessas práticas, também nesta faixa de
escolaridade.
Consideramos particularmente importante valorizar as práticas empreendidas
neste período escolar por compreender que a emancipação do sujeito, a formação de
uma consciência crítica diante da realidade e uma compreensão mais autônoma sobre a
sua vida e a vida em sociedade, passa por compreender mais e melhor a presença da
Ciência em suas vidas.
Após as ponderações citadas, que constituem a introdução deste artigo (1),
apresenta-se, na sequência, em (2), o referencial teórico da pesquisa, tomando por base o
histórico da EJA e suas relações com o ensino e aprendizagem de Ciências e Biologia; em
(3), a metodologia, em que se apresentam as características desta pesquisa; em (4), a
análise dos dados, retomando-se o objetivo geral, os pressupostos da pesquisa e os
referenciais teóricos de modo a relacioná-los aos dados encontrados; e, por fim, em (5), a
conclusão e o fechamento do texto.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Breve história da EJA


Para compreender a identidade dos sujeitos que hoje integram a EJA, faz-se
necessária uma retrospectiva da trajetória histórica da modalidade. A ação educativa de
jovens e adultos não é nova e pode ser observada desde a chegada dos jesuítas no Brasil,
em 1549, por meio da catequização dos índios (VARGAS et al., 2013).
Liderados pelo Padre Manoel de Nóbrega, quinze dias após chegarem ao Brasil,
construíram a primeira escola elementar brasileira, situada em Salvador – BA. Dedicados
à pregação da fé católica e aos trabalhos pedagógicos, tinham como objetivo educar
adolescentes e adultos de acordo com as normas vigentes utilizadas pelos colonizadores
portugueses, que necessitavam de pessoas para trabalhar, tanto na lavoura quanto nas
atividades extrativistas. Vinte e um anos após a chegada dos jesuítas, essas ações

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formativas já eram compostas por cinco escolas de instrução elementar, situadas em
Porto Seguro, Ilhéus, Espírito Santo, São Paulo de Piratininga e São Vicente. As escolas
eram regidas por um documento denominado Ratio Studiorum, escrito por Inácio de
Loyola, que regulamentava esses colégios e visavam educar tanto no ensino escolar
quanto para a vida em sociedade. Embora fossem os burgueses os principais
mantenedores desses colégios, a orientação de Inácio de Loyola era de que a instituição
de ensino da Companhia de Jesus oferecesse ensino gratuito, seja pelo Estado, de
particulares ou entidades (VARGAS et al., 2013).
Com a expulsão dos jesuítas do Brasil, todas as escolas jesuítas foram fechadas
pelo Marquês de Pombal, uma grande desorganização do ensino e uma série de
consequências para a história da educação brasileira decorreram dessa decisão
(HADDAD; PIERRO, 2000).
Com a reforma pombalina, surge a escola pública, e os adultos de classes menos
privilegiadas ficam à margem da sociedade sem formação e estudo. Apenas a classe
burguesa da sociedade passa ter acesso à educação de qualidade e ao ensino superior.
Ao expulsar os jesuítas, Marquês de Pombal tira a administração educacional das
mãos dos missionários e passa para o Estado. A metodologia eclesiástica dos jesuítas é
substituída pelo pensamento pedagógico da escola pública e laica. (BRASIL, 2012).
Segundo Azevedo (1976, p. 56-57):

Em lugar de um sistema único de ensino, a dualidade de escolas, umas


leigas, outras confessionais, regidas todas, porém, pelos mesmos
princípios; em lugar de um ensino puramente literário, clássico, o
desenvolvimento do ensino científico que começa a fazer lentamente
seus progressos ao lado da educação literária, preponderante em todas
as escolas; em lugar da exclusividade de ensino de latim e do português,
a penetração progressiva das línguas vivas e literaturas modernas
(francesa e inglesa); e, afinal, a ramificação de tendências que, se não
chegam a determinar a ruptura de unidade de pensamento, abrem o
campo aos primeiros choques entre as ideias antigas, corporificadas no
ensino jesuítico, e a nova corrente de pensamento pedagógico,
influenciada pelas ideias dos enciclopedistas franceses, vitoriosos, depois
de 1789, na obra escolar da Revolução.

Déspota esclarecido, Pombal coloca em prática a filosofia iluminista, e os


métodos de ensino dos jesuítas passam a representar um obstáculo e uma forma de
resistência ao seu governo. A carência de professores capacitados para lecionarem
dentro dessas novas metodologias era o seu maior problema, já que os jesuítas haviam
ficado incumbidos dessa tarefa por mais de dois séculos (MACIEL; SHIGUNOV NETO,
2006).

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Em 1807, a família real deixa Portugal e muda-se para o Brasil devido à crise
mundial. Com a chegada da corte, há investimento em ensino técnico e ensino superior.
Por outro lado, a educação popular fica esquecida, e o período é de poucos avanços para
a EJA.
Com a independência do Brasil, em 1822, aparecem os primeiros sinais do ensino
como instituição. Segundo Haddad e Pierro (2000, p. 109):

A constituição 1824, estabeleceu a gratuidade da instrução primária para


todos, inclusive para os adultos. Pouco ou quase nada foi realizado neste
sentido durante todo o período imperial, mas essa inspiração iluminista
tornou-se semente e enraizou-se definitivamente na cultura jurídica,
manifestando-se nas Constituições brasileiras posteriores.

Essa distância entre o proclamado e o realizado foi agravada por outros fatores,
uma vez que, no período do Império, só possuía cidadania uma pequena parcela da
população pertencente à elite econômica, à qual se admitia administrar a educação
primária como direito, do qual ficavam excluídos negros, indígenas e grande parte das
mulheres.
Em 1890, no final do Império, 82% da população com idade superior a cinco
anos era analfabeta. Com a revolução industrial, ocorre a valorização do ensino
profissionalizante entre os imigrantes.
No ano de 1937, foi criado o INEP (Instituto Nacional de Estudo e Pesquisas), com
objetivo traçar um panorama da educação no Brasil e um plano de nacionalização do
ensino. Di Pierro, Joia e Ribeiro (2001) salientam que a EJA tem sua origem significativa a
partir de movimentos populares. Nas palavras dos autores:

Abrigadas frequentemente em igrejas, associações de moradores,


organizações de base local e outros espaços comunitários, essas
iniciativas experimentaram propostas de alfabetização e pós
alfabetização de adultos que se nutriram no paradigma da educação
popular, impulsionando a busca de uma adequação de metodologias e
conteúdos às características etárias e de classe dos educandos (DI
PIERRO; JOIA; RIBEIRO, 2001, p. 61).

A partir da década de 1930, iniciou-se no país uma campanha de alfabetização,


cujo principal objetivo era erradicar a pessoa analfabeta, e não o analfabetismo, uma vez
que esse indivíduo seria incongruente numa era de industrialização pela qual o país
transitava (FÁVERO, 2005). Ainda de acordo com levantamento do autor, houve diversas
campanhas com esse intuito: Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos – CEAA
(1947); Campanha de Educação Rural (1950); SIRENA – Sistema Rádio Educativo Nacional
(1957); MCP – Movimento de Cultura Popular (1958); De Pé o Chão também se aprende a

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ler (1961); CPC – Centro Popular de Cultura (1961); Movimento de Educação de Base –
MEB, sistema rádio educativo criado na Conferência Nacional dos Bispos do Brasil com o
apoio do Governo Federal (1961); Campanha de Educação Popular da Paraíba (1962);
Centros Populares de Cultura – CPC (1963).
Outro movimento importante para educação brasileira, criado em 1967, foi o
Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), um ensino militarizado, subalternado
ao Exército, cujos objetivos estavam focados numa didática tecnicista, formando cidadãos
funcionalmente alfabetizados, com noções básicas de leitura, escrita e matemática, mas
sem o desenvolvimento de uma consciência cidadã. O MOBRAL causou uma ruptura na
metodologia freiriana utilizada nas décadas 50 e 60, que trazia o lema “Educar para
Libertar”. Era o ensino da ditadura promovido por Getúlio Vargas, porém, com o início da
recessão econômica de 1980., o projeto foi extinto em 1985 (BELUZO; TONIOSSO, 2015).
O MOBRAL foi transformado em Fundação Escolar, que trouxe novo fôlego e
novas metodologias para a educação de adultos. A proposta pedagógica do
pernambucano Paulo Freire não teve uma boa repercussão dentro desse novo sistema,
que trazia exatamente os pressupostos contrários da educação libertadora que o autor
defendia. Apesar de Freire ser o responsável inicial pelo desenvolvimento dos programas
de alfabetização de jovens e Adultos, a partir de 1963, na década seguinte, seu programa
foi interrompido, uma vez que a educação proposta no regime militar buscava
exatamente o contrário: qualificar mão-de-obra barata e sem consciência social (BELUZO
e TONIOSSO, 2015).
O Ensino Supletivo foi Regulamentado 1971 com o objetivo de repor a
escolaridade que não havia acontecido na faixa etária considerada, na época, “apropriada
à aprendizagem”, um ponto de vista defendido pela psicologia evolutiva tradicional, um
dos paradigmas da educação na área educacional nesse período (PALACIOS, 2004). No
entanto, apenas com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que se tornou, de
fato, obrigatória a Educação de Jovens e Adultos (BELUZO e TONIOSSO, 2015).
A partir dessa obrigatoriedade, é criado, em 1991, o Programa Nacional de
Alfabetização e Cidadania (PNAC), que torna obrigatória a alfabetização de crianças,
jovens e adultos, a partir de parcerias formadas entre o governo e a sociedade civil, tendo
como objetivo final erradicar 95% do analfabetismo até 1995. Com a crescente
percepção da importância da alfabetização em todas as faixas etárias, são criados fóruns
responsáveis pelo debate e integralização das ações em todo o país (BELUZO; TONIOSSO,
2015).
A partir da década de 1990, a EJA passa a ser discutida com maior ênfase, com a
aprovação da Lei 9394/96, no seu artigo 37, substituindo de vez o então chamado
“supletivo”. Refere-se, especificamente à educação de jovens e adultos:

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Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não
tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e
médio na idade própria.
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos
que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades
educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado,
seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e
exames.
§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do
trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares
entre si. § 3o A educação de jovens e adultos deverá articular-se,
preferencialmente, com a educação profissional, na forma do
regulamento (BRASIL, 1996, p. 17-18).

A Conferência Internacional para a Educação de Adultos (CONFINTEA) de 1997


enfatiza que:
A educação de adultos torna-se mais que um direito: é a chave para o
século XXI; é tanta consequência do exercício da cidadania como uma
plena participação na sociedade. Além do mais, é um poderoso
argumento em favor do desenvolvimento ecológico sustentável, da
democracia, da justiça, da igualdade entre os sexos, do desenvolvimento
socioeconômico e científico, além de um requisito fundamental para a
construção de um mundo onde a violência cede lugar ao diálogo e à
cultura de paz baseada na justiça (UNESCO, 1997, p.3).

A Função da EJA passou a ser explicitada no Parecer CEB/CNE 11/2000. São três
as funções:
Função Reparadora: significa não só a entrada no circuito dos direitos
civis pela restauração de um direito negado: o direito a uma escola de
qualidade, mas também o reconhecimento daquela igualdade ontológica
de todo e qualquer ser humano.
Função Equalizadora: visa a reentrada no sistema educacional dos que
tiveram uma interrupção forçada seja pela repetência ou pela evasão,
seja pelas desiguais oportunidades de permanência ou outras condições
adversas, possibilitando aos indivíduos novas inserções no mundo do
trabalho, na vida social, nos espaços da estética e na abertura dos canais
de participação.
Função Qualificadora: propicia a todos a atualização de conhecimentos
por toda a vida, sendo uma função permanente da EJA. Mais do que uma
função, ela é o próprio sentido da EJA (PAIVA, 2009, p. 24, grifos do
autor).

A EJA apresenta importantes objetivos como a continuidade de estudos, a


garantia de sistematização e apropriação de conhecimentos nas diversas áreas, a
valorização de espaços educativos que privilegiem as interações de experiências do
jovem e adultos, visando a fortalecer a sua autoestima e a identidade cultural para a
construção de sua personalidade.

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Já em 2003, o Ministério da Educação (MEC) anunciou que a EJA passaria a
figurar como prioridade do Governo Federal. Assim, surge o Programa Brasil Alfabetizado
(PBA), por meio do Decreto nº 4.834, de 08 de setembro de 2003 (BRASIL, 2003), cuja
finalidade seria a erradicação do analfabetismo no país, especialmente de Jovens
Adultos, regulamentado pelo DECRETO Nº 5.475, de 22 de junho de 2005. Dentro do
programa, e a partir de suas diretrizes inclusas no Princípios, Diretrizes, Estratégias e
Ações de Apoio ao Programa Brasil Alfabetizado: Elementos para a Formação de
Coordenadores de Turmas e de Alfabetizadores (BRASIL, 2011), a alfabetização de tornou
uma política pública de inclusão de grupos excluídos, não mais de caráter compensatório
para esses estratos sociais (MACHADO, 2015).
No ano de 2007, o Programa Brasil Alfabetizado foi completamente reformulado
pelo Decreto Decreto nº 6.093, de 24 de abril de 2007, o qual passou a tratar de forma
prioritária a alfabetização de toda a população a partir dos 15 anos de idade, com a
tentativa de gerir de maneira mais eficaz os programas estaduais, evitando medidas
repetitivas (MACHADO, 2015), mas o programa funcionou até 2016.
Ainda no período a partir de 2003, diversos programas foram implementados
para tentar suprir a necessidade de alfabetização da população, por exemplo: o Programa
Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem Campo – Saberes da Terra), o Programa
Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica, na Modalidade
de Jovens e Adultos (PROEJA), Programa Nacional de Integração da Educação Profissional
com a Educação Básica, na Modalidade de Jovens e Adultos, modalidade Formação Inicial
e Continuada (PROEJA – FIC), O Exame Nacional para Certificação de Competências de
Jovens e Adultos (ENCEEJA), Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo),
Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego, modalidade Jovens e
Adultos (Pronatec – EJA) e o Programa Educação Nas Prisões (PEP).
Apesar da grande quantidade de programas, segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), nota-se a diminuição crescente do número de participantes
ocupando as salas de aula na faixa etária a partir dos 15 anos. Foram aprovadas como
metas para educação do decênio 2010-2020, em 2010, oferecer 25% das matrículas da
EJA nos ensinos fundamental e médio, e, na forma integrada, a educação profissional foi
uma delas. Mudanças significativas para a EJA foram consideradas para 2020, e, a partir
daquele ano, o tempo de conclusão da EJA passou de cinco para dois anos a cada etapa,
uma tentativa de conter tal evasão (BRASIL, 2018).
Em 2014, após grande pressão popular, o governo Federal sancionou o Plano
Nacional de Educação (PNE) por meio da Lei Nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que tinha
como propósito direcionar investimentos para a melhoria da qualidade da educação no
país (NEVES; GONÇALVES; ARAÚJO, 2020). Dentre as 20 metas a serem alcançadas num
intervalo de 10 anos, duas estão diretamente relacionadas à EJA:

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
Meta 9: elevar a taxa de alfabetização da população com 15 (quinze) anos
ou mais para 93,5% (noventa e três inteiros e cinco décimos por cento)
até 2015 e, até o final da vigência deste PNE, erradicar o analfabetismo
absoluto e reduzir em 50% (cinquenta por cento) a taxa de
analfabetismo funcional.
Meta 10: oferecer, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) das
matrículas de educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e
médio, na forma integrada à educação profissional (BRASIL, 2014).

Embora os investimentos na EJA tenham ocorrido, no Brasil ainda existem 11,5


milhões de analfabetos, segundo o IBGE. Esse número implica que três em cada dez
jovens e adultos são considerados analfabetos, conforme dados da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicilio (PNAD) de 2017. O analfabetismo absoluto ou funcional no Brasil é
resultado da exclusão do passado. Segundo Boff (2020, s/p):

[...] podemos ser: não só sapiens, portadores de amor, empatia, respeito e


devoção, mas também demens, odientos, agressivos, cruéis e sem
piedade. Este nosso lado sombrio parece dominar a cena social de nosso
tempo e também de nosso país.” Ainda segundo Boff, referindo-se o
estatuto da escravidão como exemplo, esta foi “uma das realidades mais
perversas da história humana [...].

O Brasil foi campeão do escravagismo fontes do IBGE, refletindo num cenário em


que o analfabetismo entre os negros no Brasil é duas vezes maior do que entre os
brancos, dados que revelam que o analfabetismo tem cor. Portanto, a desigualdade
permanece, sobretudo, para com essa população de homens e mulheres negras, sendo a
modalidade de EJA talvez a única “porta de entrada de conhecimento cientifico” para
esses sujeitos. (BOFF, 2020, s/p).
Neste cenário histórico no qual é possível notar a importância da educação para
a superação da alienação e tendo em vista ampliar a percepção sobre a relevância de
ensinar e aprender Ciências e Biologia também como ferramentas de emancipação, os
próximos itens deste artigo se dedicarão a estreitar relações entre o ensino de Ciências e
Biologia e a EJA como uma interlocução necessária não apenas para o avanço escolar,
mas também para a vida em sociedade.

2.2 EJA e suas relações com o ensino e aprendizagem de


Ciências e Biologia
Para Cachapuz et al (2005, p. 14), “vivemos numa situação de autêntica
emergência planetária, marcada por toda uma série de graves problemas estreitamente

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relacionados: contaminação e degradação dos ecossistemas, [...] perda de diversidade
biológica e cultural”.
Nessa perspectiva, o ensino de Ciências e Biologia vem ganhando destaque
segundo argumentação de Futuyma (2002, p. 5):

O século vinte um será o “Século da Biologia”. Impulsionadas por uma


convergência de preocupações públicas em aceleração, as ciências
biológicas serão convocadas cada vez mais para tratar de questões vitais
para o nosso bem-estar futuro: ameaças a qualidade ambiental,
necessidades de produção de alimentos devido a pressões populacionais,
novos perigos para saúde humana gerados pelo aparecimento de
resistência a antibióticos e de novas doenças, a explosão de novas
tecnologias na biotecnologia e na computação. A Biologia Evolutiva em
particular está destinada a prestar contribuições muito significativas. Ela
contribuirá diretamente para desafios prementes da sociedade, bem
como para informar e acelerar outras disciplinas biológicas.

O ensino de Ciências da Natureza (que envolve as áreas de Biologia, Física,


Química e Matemática) é orientado atualmente pela Base Nacional Comum Curricular
(BNCC), um “documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e
progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver”
(BRASIL, 2017b, p. 8).
A BNCC em 2015 tem sua primeira versão disponibilizada e sua última versão
homologada em 2018, abrangendo todas as etapas de ensino do infantil ao ensino médio
da educação brasileira.
Outro documento importante, de caráter não obrigatório, que antecede a BNCC
são os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), tendo suas propostas preliminares
discutidas em âmbito nacional nos anos de 1995 e 1996, “do qual participaram docentes
de universidades públicas e particulares, técnicos de secretarias estaduais e municipais
de educação, de instituições representativas de diferentes áreas de conhecimento,
especialistas e educadores“ (BRASIL, 1997, p. 15).
Os PCNs propõem para o ensino das Ciências Naturais 3° e 4° Ciclos, os seguintes
eixos temáticos: “Vida e Ambiente”, “Ser Humano e Saúde”, “Tecnologia e Sociedade” e
“Terra e Universo” (BRASIL, 1998, p. 62). Além disso, nas “diretrizes e parâmetros que
organizam o ensino médio, a Biologia, a Física, a Química e a Matemática integram uma
mesma área do conhecimento” (BRASIL, 1998, p.23).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) propunham
seis temas estruturadores na área de Biologia:

1. Biologia: A vida como fenômeno e seu estudo

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2. Biodiversidade: Organização, caracterização e distribuição dos
organismos vivos
3. Organismo: sistema complexo e autorregulável
4. Hereditariedade: Padrões e processos de armazenamento, transmissão
e expressão de informação
5. Evolução: Padrões e processos de diversificação da vida
6. Ecossistemas: Interações organismo-meio (BRASIL, 2016, p. 600).

Na BNCC, o ensino de Ciências, na etapa fundamental dos anos finais, as


unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades, estão organizados em três
unidades temáticas: Matéria e Energia, Vida e Evolução, Terra e Universo. Já no ensino
médio a área de Ciências da Natureza Matemática e suas Tecnologias trabalham com os
eixos: Material e Energia e Vida, Terra e Cosmos (BRASIL, 2018).
Segundo a BNCC, a área de Ciências da Natureza tem um compromisso:

[...] com o desenvolvimento do letramento científico, que envolve a


capacidade de compreender e interpretar o mundo (natural, social e
tecnológico), mas também de transformá-lo com base nos aportes
teóricos e processuais das ciências. Em outras palavras, apreender
ciência não é a finalidade última do letramento, mas, sim, o
desenvolvimento da capacidade de atuação no e sobre o mundo,
importante ao exercício pleno da cidadania (BRASIL, 2018, p. 321, grifo dos
autores).

Ambos documentos, PCNs e BNCC, têm a função de orientar a educação servindo


como um referencial comum para garantir a formação escolar aos estudantes. Diante
disso, todas as escolas, inclusive as que trabalham com a modalidade EJA, devem usar a
BNCC como um norte na construção de suas propostas pedagógicas e currículos,
apropriando-se de todas as competências e habilidades previstas no documento, fato que
provocou muitas críticas e debates entre os educadores que defendem o currículo da
EJA.
Ferreira e Catelli Jr. (2016) chamam atenção pelo descaso das secretarias
estaduais sobre a modalidade EJA. Segundo os autores, o Estado, alegando escassez de
recursos, trabalha com currículos impróprios adaptados de crianças e jovens que não
cabem na vida do adulto, colocando, assim, a EJA num lugar marginal. Outra questão
crítica é o fato de a BNCC não dar orientações específicas sobre a modalidade EJA em seu
documento preliminar na última versão, e nas versões anteriores citá-la de forma muito
sucinta. Ferreira e Catelli Jr. (2016) alegam que a EJA deveria ter um capítulo especial na
BNCC e relatam que a falta de orientações curriculares compromete o campo pedagógico
da modalidade.
Para Ferreira (2014, p. 187), os currículos são “construções sócio históricas que
produzem e hegemonizam significados sobre quem somos e sobre aquilo que sabemos”.

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Apesar de a EJA apresentar um arcabouço de leis nacionais e ser signatário de
legislações internacionais, a diversidade da população brasileira traz indicadores sociais
complexos para políticas públicas que vão além de ofertar vagas nas escolas e formular
currículos. De acordo com Paiva (2019, p. 1146):

Trata em compreender as especificidades questões imbricadas com o


viver dos sujeitos nas sociedades contemporâneas, identificadas por
características de gênero, faixa etária (juventudes e terceira idade), etnia e
origem racial, entre muitas outras que caracterizam a diversidade de
formas de ser e estar no mundo, de toda uma população.

Sob essa ótica, os professores da EJA precisam desenvolvem propostas


pedagógicas profundamente conectadas com os saberes culturais, experiências pessoais
e projetos de vida de seus alunos, pois “não há prática pedagógica que não parta do
concreto cultural e histórico do grupo com quem se trabalha” (FREIRE, 2004, p. 57). Ou
como afirma Arroyo (2012), “se são outros sujeitos, requerem outras pedagogias”.
A introdução do ensino de Ciências na escola ocorreu no início do século XX
(CANAVARRO, 1999 apud NARDI; ALMEIDA, 2004). Desde então, a presença da Ciência e da
Tecnologia, têm influenciado o modo como vivemos, pensamos e agimos:

Do transporte aos eletrodomésticos; da telefonia celular à internet; dos


sensores óticos aos equipamentos médicos; da biotecnologia aos
programas de conservação ambiental; dos modelos submicroscópicos
aos cosmológicos; do movimento das estrelas e galáxias às propriedades
e transformações dos materiais. Além disso, questões globais e locais
com as quais a Ciência e a Tecnologia estão envolvidas – como
desmatamento, mudanças climáticas, energia nuclear e uso de
transgênicos na agricultura – já passaram a incorporar as preocupações
de muitos brasileiros. Nesse contexto, a Ciência e a Tecnologia tendem a
ser encaradas não somente como ferramentas capazes de solucionar
problemas, tanto os dos indivíduos como os da sociedade, mas também
como uma abertura para novas visões de mundo (BRASIL, 2018, p.547).

E como destaca Lima (2006, p. 124 apud BERTOGLIO 2013, p. 17):

A nova configuração econômica e social coloca a aprendizagem no centro


de todas as atividades humanas, pois o conhecimento torna-se
necessário não só para a inserção no mundo do trabalho, mas também
para usufruir outros benefícios decorrentes do progresso da ciência e da
tecnologia.

Diante dessas influências, o indivíduo precisa, cada vez mais, entender esses
processos que decorrem, principalmente do fenômeno da globalização, “[...] que trouxe
transformações para todos os setores da sociedade. Portanto, destaca-se aqui o papel

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
essencial da disciplina de ciências na educação referente às temáticas relacionadas à
ciência e à tecnologia” (BERTOGLIO , 2013, p. 17).
Segundo Limberger et al (2014), em seu estudo sobre práticas pedagógicas na
EJA, verificou-se que o ensino de ciências nesta modalidade é pouco eficiente por
priorizar o estudo de conteúdos conceituais e pelo baixo reconhecimento dos professores
de Ciências sobre práticas pedagógicas que incentivem o desenvolvimento das
capacidades de pensamento crítico dos alunos.
Como já mencionado, o ensino da Biologia encontra-se inserido na área de
“Ciências da Natureza”, juntamente, com a Física e a Química, e hoje ocupa lugar de
destaque nos currículos escolares, porém, nem sempre foi assim. O espaço conquistado
para o estudo dessas Ciências é consequência do status que adquiriram, principalmente
no século XXI, por conta dos avanços sociais propiciados pelo desenvolvimento científico,
responsável por grandes invenções. (NARDI; ALMEIDA, 2003).
Por todas as razões aqui expostas e também reconhecendo que as Ciências em
geral ocupam lugar de relevância não apenas dentro dos muros da escola, mas também
fora dela, na própria vida em sociedade, valorizar reflexões e ações por elas
empreendidas também na EJA, é valorizar o desenvolvimento do pensamento crítico,
autônomo e bem fundamentado de todo o cidadão.

3 METODOLOGIA
Esta pesquisa configura-se como uma pesquisa quali-quantitativa. Com o intuito
de se identificar quais são as características dos artigos que vêm sendo produzidos
dentro da perspectiva da EJA para as aulas de Ciências e Biologia, caracterizando-se
como uma revisão bibliográfica sistemática (SNYDER, 2019), cuja pergunta a ser
respondida foi: qual a atual situação da Educação de Jovens e Adultos nas aulas de
Ciências Naturais?
De acordo com Lakatos e Marconi (2002), a finalidade dessa metodologia é
entrar em contato com os temas publicados sobre determinado assunto, sendo possível
examiná-los, chegando a conclusões diferentes dos problemas estudados. A principal
vantagem do método é permitir o acesso a uma maior gama de temáticas, que seria
inviável numa pesquisa primária (GIL, 1999).
Utilizou-se como método de busca a busca booleana “[...] é a aplicação da Lógica
de Boole a um tipo de sistema de recuperação da informação, no qual se combinam dois
ou mais termos, relacionando-os por operadores lógicos, que tornam a busca mais
restrita ou detalhada. (SAKS, 2005, p. 4). Nesse sentido, foram combinados os seguintes
termos com os operadores AND entre as palavras “EJA”; “Ciências” e “Biologia”, no Google

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Acadêmico. Foram coletados trabalhos entre os intervalos temporais de 2010 a 2020, em
todas as revistas de interesse que publicam sobre o tema, encontrando-se um total de
98 artigos (“EJA Ciências” 96 resultados; “EJA Biologia” 54 resultados e “EJA Ciências e
Biologia” 11 resultados).
Após a leitura flutuante dos resumos (BARDIN, 2011), foram excluídos artigos
repetidos, de acordo com os seguintes critérios de exclusão: (a) práticas correspondentes
ao ensino do 1º ao 5º ano do Ensino Regular (anos iniciais do Ensino Fundamental); (b)
relacionadas ao trabalho (funcionários); (c) workshop, coletâneas por tratarem de muitos
artigos num mesmo documento; (d) pesquisas voltadas para a ações específicas como a
formação de professores; e (e), artigos que não permitiam acesso.
A partir da leitura e análise dos artigos selecionados, realizou-se o fichamento
individual, contendo: autor; tipo de pesquisa; instituição/periódicos/evento; ano e práticas
pedagógicas abordadas. Então, os artigos foram separados em dez diferentes temáticas,
baseadas na abordagem de trabalho utilizada pelos autores ao longo de suas pesquisas,
conforme ilustra o Quadro 1.

Quadro 1 – Artigos selecionados por categoria e ano

Instituição Práticas
Tipo de / Pedagógicas
Grupos Cód. Autor (es) Ano
Pesquisa Periódico Abordadas
/ Evento
Abordagem
C1 POMPÉU Mestrado Unb 2010 Histórica e
1
Filosófica
Abordagem
Abordagem
Interdisciplinare C2 LOPES Especialização UTFPR 2011
interdisciplinar
s
NASCIMENTO et Trabalho em Abordagem
C3 ULBRA 2015
al. evento Interdisciplinar
Artigo
2 C4 RAMALHO et al. REMOA 2015 Atividade Prática
Científico
Atividade
Atividades
Práticas C5 MOTA TCC IFSC 2015
Lúdicas
COSTA; Práticas
C6 Mestrado P. UnB/R 2012
BIZERRIL Dialógicas
3
Dialógica/Proble-
Práticas C7 SILVA Mestrado UTFPR 2018
matizadora
Dialógicas
Dialógica/Proble-
C8 AMARAL Mestrado UnB 2019
matizadora
Ciência &
MOREIRA; Artigo Seminários
4 C9 Educação 2011
FERREIRA Científico Interativos
Comunicação (UNESP)
Científica

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Textos de
OLIVEIRA, Artigo REVISTA
C10 2015 Divulgação
ZANCUL Científico PRÁXIS
Científica
5 Artigo Práticas
C11 FERREIRA et al ARETÉ
Práticas Laborais Científico 2015 Laboratoriais
Visitação ao
C12 BERTOGLIO et al. Mestrado PUCRS 2013
6 Museu da PUCRS
Visitas em IV
SANTOS; Trabalho em Visita ao Museu
Museus C13 COLBEDUC 2018
FALAVIGNA evento Virtual
A II CIEE
Cinema na Sala
C14 CAVALCANTE Mestrado UnB 2011
de Aula/Prisões
Trabalho Em Recursos
Encontro
7 C15 SANTOS 2014 Audiovisuais
Evento SENAC
Recursos Filmes
TCC Documentários/
Audiovisuais C16 LOURENÇO UFCG 2015
(Graduação) Prisões
Artigo Documentários
C17 MACIEL et al. RPI 2016
Científico Didáticos
Trabalho Em
C18 PORTO;TEIXEIRA X-ENPEC 2013 Enfoque CTS
Evento
BORGES; Artigo Estratégia
C19 LSP 2015
ALMEIDA Científico Mnemônica
COZENDEY; Trabalho Em
C20 X-ENPEC 2015 Audiodescrição
COSTA Evento
Revista
Ensino,
Artigo Estudo
C21 TERNES et al. Educação 2015
8 Científico Intervenção
e Ciências
Estratégias de
Humanas
Aprendizagem
Estudo
C22 ALBUQUERQUE Especialização UnB 2015
Intervenção
TCC A Utilização do
C23 BATISTA UFPB 2017
(Graduação) Livro Didático
Revista Tradicional,
Artigo
C24 PEREIRA et al. Eletrônica 2018 Tradicional e
Científico
Araguaia Lúdico
Modelos
C25 KRAUSE Mestrado UnB 2012
Tridimensionais
Etnografia
9 C26 KUTTER Mestrado UFRGS 2012
Biocêntrica
Metodologias de
Modelo
Ensino C27 SANTANA Especialização UFMG 2019
Biopsicossocial
10
Artigo Rev. Cien.
Lixo Resíduos C28 VALÉRIO et al. 2014 Lixo Eletrônico
Científico Exat. Tec
Sólidos

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REMOA Ed
Artigo
C29 SILVA et al. Especial 2015 Resíduos Sólidos
Científico
IFMT
Artigo Revista
C30 BARRA, FREITAS 2018 Lixo Doméstico
Científico UNIABEU

Fonte: própria autoria (2021)

Na Figura 1, apresentamos os principais temas abordados nos artigos:

Figura 1 – Principais práticas relatadas nos artigos selecionados

Fonte: própria autoria (2021)

Por fim, na Figura 2, apresentamos um gráfico gerado a partir das prevalências


das práticas, por ano:

Figura 2: Prevalência de temas abordados por ano

Fonte: própria autoria (2021)

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Podemos observar, através dos gráficos que localizam os mesmos temas, que
tais assuntos são explorados, em sua maioria, por vivências práticas das mais variadas. É
possível notar também que as estratégias de aprendizagem se destacam como temática
de maior incidência em diversos anos, demonstrando a necessidade da divulgação e
troca de experiências para práticas de ensino em Biologia na EJA.
No item a seguir, exploramos com mais detalhes as contribuições apresentadas
por esses trabalhos sobre o ensino de Biologia na EJA por meio da análise detalhada dos
dados.

4 DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS


No primeiro grupo, Práticas Interdisciplinares, encontram-se três artigos: (C1, C2 e
C3). Pompeu (2010) propôs o uso de uma abordagem histórico-filosófica para examinar
as visões dos alunos sobre as disciplinas de Ciências Naturais e de Biologia. Após o uso
da abordagem, conclui-se um maior interesse pela Biologia e melhor compreensão da
disciplina pelos alunos. No entanto, no ensino de Ciências, houve pouco impacto com o
uso da abordagem histórico-filosófica, talvez devido ao pouco tempo de uso da
abordagem.
Lopes (2011), abordou os temas saúde e consumos, mais precisamente,
alimentação, além do ensino da Matemática. Lopes conclui que o processo pedagógico
pode promover o desenvolvimento da percepção, o pensamento crítico e a autonomia
dos alunos da EJA. Já Nascimento et al (2015), teve como desafio buscar estratégias
didáticas para trabalhar a Educação Ambiental. Notou-se que o estudo propiciou o
contato com os mecanismos de produção do conhecimento científico na
interdisciplinaridade das disciplinas de Biologia e de Artes, contribuindo de forma
significativa para a formação dos estudantes da EJA.
No Grupo 2, Atividades Práticas, há dois artigos: C4 e C5. As teorias do
construtivismo (PIAGET, 2005) e a teoria sócio-histórica (VYGOTSKY, 2007) embasaram
as escolhas dos experimentos de Ramalho et al (2015). Verificou-se, com dados obtidos
por meio de questionários, que as práticas foram validadas por meio de experimentos
interacionistas e sociointeracionistas. Mota (2015) se propôs a investigar o lúdico e a
proposta apresentou resultados positivos na intervenção. A hipótese levantada, de que o
lúdico age como facilitador na aprendizagem corresponde aos resultados positivos em
relação ao jogo de cartas com a temática da dengue então proposta.
No Grupo 3, Práticas Dialógicas, estão inseridos os artigos C6, C7 e C8. Para Costa
e Bezerril (2012), utilizando práticas dialógicas, houve a melhora na autoestima dos
estudantes, e uma maior autonomia no processo de ensino-aprendizagem. Silva (2018)

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relata que o ensino de Ciências, quando fundamentado nas práxis da educação
libertadora de Freire, proporciona o diálogo entre os sujeitos envolvidos, o estímulo à
produção de conhecimento científico e crítico e o olhar conscientizador/transformador da
realidade. A estratégia desenvolvida por Amaral (2019), sobre a temática de
automedicação, foi aprovada pelos estudantes. Constatou-se a alteração do
comportamento deles quanto à prática da automedicação. Os textos produzidos pelos
alunos resultaram na construção de um livro paradidático que foi aprovado pelo Comitê
de Ética.
No Grupo 4, Comunicação Científica, há dois artigos: C9 e C10. Moreira e Ferreira
(2011) produziram uma pesquisa sobre seminários interativos e relatam que, apesar de
não se tratar de uma prática inovadora, quando bem aplicada, tira o educando da
margem e o coloca no centro da produção e socialização dos conhecimentos.
Os textos de divulgação científica (TDC) para abordar a temática alimentação
foram a proposta de Oliveira e Zancul (2014). Os resultados indicaram que os textos de
divulgação científica despertam o interesse e uma participação efetiva dos alunos nas
discussões, uma vez que relacionavam os assuntos de saúde com o cotidiano dos
estudantes, favorecendo a partilha de suas experiências e a troca de saberes.
Há apenas um artigo no Grupo 5 (Práticas Laborais), o C11. Tal trabalho, de
Ferreira et al (2015), objetivou discutir a realização de atividades experimentais no ensino
de Biologia O estudo evidenciou o potencial pedagógico das práticas experimentais.
Destacou que outros trabalhos práticos devem ser realizados, no entorno da escola, no
jardim, e não apenas nos laboratórios, pois nem todas as escolas detém de um espaço e
equipamentos necessários à aplicação de aulas laboratoriais.
Visitas a Museus é a temática do Grupo 6, em que aparecem dois artigos C12 e
C13. Bertoglio (2013) realizou sua pesquisa junto ao Museu de Ciências e Tecnologia da
PUCRS (MCT, PUCRS), onde a pesquisadora atua como funcionária. A autora reconhece
que museus e centros de ciências são espaços educativos que podem contribuir para a
formação de indivíduos com visão crítica, um recurso pedagógico lúdico e interativo
capaz de trazer muitas contribuições ao ensino de ciências. Para Santos e Falavigna
(2018), o uso do museu virtual como metodologia foi pensado para educandos
pertencentes aos turnos que não os favorecem em participar de atividades culturais de
cunho científico. Comprovou-se a relevância do recurso utilizado proporcionando
cenários de ampliação da cidadania de forma democrática.
No grupo 7, Recursos Audiovisuais, há quatro artigos: do C14 ao C17. Segundo
Cavalcanti (2011), o filme estimulou o diálogo e a reflexão não só sobre os conteúdos de
biologia, mas também sobre a leitura do mundo desses sujeitos. A pesquisa de Santos
(2014) constatou que os recursos audiovisuais são um grande aliado do professor no
processo de ensino-aprendizagem. Lourenço (2015) teve por objetivo compreender a

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
relevância da utilização de filmes e documentários na EJA Prisional. Constatou-se que
essa prática proporcionou uma aprendizagem significativa, possibilitando, assim, uma
maior reflexão sobre os diferentes temas abordados na intervenção pedagógica. Maciel
et al. (2016) reconhecem a eficácia da prática pedagógica pela associação do cotidiano
dos alunos por meio do documentário.
O Grupo 8, Estratégias de Aprendizagem, foi o grupo com maior número de
abordagens com oito artigos. Porto e Teixeira (2013) abordaram a temática da AIDS como
um problema social sob análise de três categorias: articulação da tríade CTS; prática
didático-pedagógica; percepções dos sujeitos. Ressaltou-se a viabilidade da
implementação do enfoque, embora, neste trabalho, tenha sido enfatizada somente a
primeira categoria onde evidenciou-se “que a transposição das relações CTS para o
contexto educacional resulta em ênfases diferenciadas em relação aos aspectos da
Ciência, Tecnologia e Sociedade” (PORTO; TEIXEIRA, 2001, p. 1).
Borges e Almeida (2015) trazem a musicalização como estratégia mnemônica.
Ao utilizar a musicalização por meio de paródias que elucidassem os conceitos
estudados em Biologia, os resultados permitiram constatar que houve maior
compreensão dos conteúdos de Biologia. Cozendey e Costa (2015) desenvolveram um
trabalho com a turma do oitavo ano do ensino fundamental da EJA onde doze alunos
participaram das discussões, um dos alunos tinha baixa visão. Primeiramente, foi
utilizado vídeo sem a audiodescrição e em uma segunda aula foi apresentado aos alunos
o vídeo com audiodescrição. Segundo a opinião dos alunos, o vídeo audiodescrito é mais
repetitivo e explicativo, o que favorece a aprendizagem, e o aluno com baixa visão pode
participar adequadamente das discussões. Ternes et al. (2015) propõe uma mudança na
abordagem conceitual e estratégica para o ensino de ciências, que leve em consideração
os conhecimentos adquiridos pelos alunos ao longo da vida. Já a prática pedagógica
docente de Albuquerque (2015) teve como principal objetivo a aprendizagem, por meio
do entendimento para a elaboração do conhecimento. Nas duas pesquisas, a investigação
por meio de questionários, pôde diagnosticar e intervir por meio de ações pedagógicas
mais eficientes. Batista (2017) evidenciou que o livro específico para a modalidade de
ensino possui insuficiência/limitações de conteúdo para o ensino de Biologia, sendo
necessário para suprir as carências do livro didático da EJA, os professores elaborarem
novos materiais didáticos e utilizarem o livro didático do ensino regular para ministrar
suas aulas. Pereira et al. (2018) objetivou aplicar três metodologias de ensino: tradicional,
tradicional/lúdico e somente o lúdico, em que cada metodologia foi aplicada em turmas
diferentes. Os desempenhos dos alunos foram mensurados através de testes (pós-teste).
Os resultados apontaram que a metodologia tradicional/lúdica obteve 50% dos acertos
médios, sendo a mais indicada. Krauser (2012) propôs uma abordagem baseada no uso
conjunto de modelos tridimensionais reais (3DR) e virtuais (3DV), os resultados

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apontaram para as potencialidades dos modelos como auxílio no processo aprendizagem
significativa, desde que seu planejamento elaboração seja criterioso e reflita sua forma
de utilização, isolada ou concomitante.
As pesquisas C26/C27 convergem para as Metodologias de ensino, Grupo 9. A
meta de Kutter (2012) em descrever aspectos culturais do ambiente escolar ressaltam a
validade do uso da Etnografia na área de Ciências, apresentando a linha pedagógica da
educação Biocêntrica em Biologia, que “estimula nos estudantes, prioritariamente, a
valorização da consciência corporal, dos cuidados com a saúde do corpo”, sendo um
campo de pesquisa ainda pouco explorado sob o ponto de vista da Educação em Ciências.
O estudo de Santana (2019) teve como finalidade discutir sobre as (IST’s) infecções
sexualmente transmissíveis na Educação de Jovens e Adultos. Através do modelo
biopsicossocial, evidenciou-se a relevância em explorar questões de caráter social,
especificamente o papel do gênero. Mostrou ser também importante para os docentes
refletirem suas práticas, valorizando o diálogo e sanando possíveis dúvidas que
ultrapassem os limites do viés biológico-centrado.
O último grupo foi Lixo, Resíduos Sólidos. As temáticas de Valério (2014), Barra e
Freitas (2018) e Silva et al. (2015) estão relacionadas ao Lixo Eletrônico, Lixo Doméstico e
Resíduos Sólidos Urbanos. As três propostas reconhecem a alta relevância que as
temáticas propostas tiveram no contexto da comunidade local. Percebe-se, também, que
ao trabalhar com uma problemática de alcance local, de maneira adequada, temas como
Resíduos Sólidos Urbanos, segundo Silva et al. (2015), passam a ganhar maior
importância no processo de construção de conhecimento desses educandos e
oportunizando o protagonismo do sujeito, abrindo espaço para a formação de cidadãos
muito mais comprometidos com a causa social ao seu entorno.
Após a análise dessas pesquisas, é possível notar que o ensino de Ciências e
Biologia é um importante elemento a ser valorizado, entendido e pesquisado também na
Educação de Jovens e Adultos. Esse público, cada vez mais exposto às influências do
volume de informações geradas todos os dias e veiculadas por diferentes meios,
também constrói suas opiniões, pontos de vista e percepções da realidade, inclusive
sobre o conhecimento científico, no dia a dia de uma sociedade que está imersa nesse
cenário. Saber manejar essas informações, ter um ponto de vista pessoal embasado em
fontes confiáveis e buscar saber mais sobre o que se conhece pouco, são habilidades que
a escola também pode ajudar a desenvolver para colaborar na emancipação de seus
estudantes, valorizando o conhecimento científico tão presente no dia a dia e em
sociedade.

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5 CONCLUSÃO
Este artigo teve por objetivo identificar pesquisas sobre práticas pedagógicas de
sucesso e os principais desafios encontrados para o ensino de Ciências e Biologia na EJA.
Nossa intenção foi apresentar características de práticas de ensino em Ciências e Biologia
na EJA visando a ampliar a compreensão da própria comunidade científica sobre a
importância dessas práticas, também nesta faixa de escolaridade.
Sob o ponto de vista histórico, é possível compreender a identidade dos sujeitos
da Educação de Jovens e Adultos que consolidaram essa modalidade ao longo da
História. No passado e no presente, a modalidade enfrenta diversas modificações que
cada novo governo impõe, sendo constituída por um contexto secular de desigualdade e
exclusão, visto que há sempre um discurso político-eleitoral por trás de cada lançamento
de programa educacional em nosso país.
A multiplicidade de modalidades de trabalho que têm escolhido a EJA como
campo de pesquisa demonstra o quão necessárias são as socializações de experiências
que permitam aprimorar e avançar no ensino de Ciências e Biologia para esta modalidade
de ensino.
Por meio da análise dos artigos e pesquisas, em cada categoria, nota-se que os
maiores desafios encontrados pelos professores foram desenvolver modelos
pedagógicos diferenciados que identifiquem a diversidade desse público e suas
especificidades referentes às diferentes faixas etárias, perfis e situações de vida dos
educandos que podem também impactar no ensino e na aprendizagem em Ciências. É
possível inferir também que o caminho para o sucesso na aplicação dessas práticas deve
priorizar a voz dos alunos em suas práticas e nos currículos.
Por fim, torna-se relevante destacar a importância do papel do educador, de
modo que sua prática docente seja capaz de despertar em seus educandos a sua
transformação em cidadãos críticos e reflexivos também a partir do ensino de Ciências e
Biologia, dando-lhes as condições necessárias para compreender o espaço escolar como
um ambiente de trocas de experiências e saberes que contribuem para a sua melhoria de
vida e para a sua emancipação social.
Esperamos que este trabalho inspire pesquisas vindouras, para que possam
ampliar propostas, práticas e ações na formação científica de jovens e adultos, tendo
sempre como foco a emancipação do sujeito, a tomada de consciência para que este
público tome para si o conhecimento científico e que sintam-se reconhecidos nele e o
ajude também a avançar, nas mais diversas esferas sociais.

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Reflexões a partir de Arroyo: trajetórias


humanas e inumanas na EJA
Reflections from Arroyo: human and ihuman
trajectories in EJA
Reflexiones desde Arroyo: trayectorias humanas e
ihumanas en EJA

Elzafran Santos Sousa Lourenço


Mestre em Educação Profissional e Tecnológica (IFSP)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-7732-8878

Juliana Cristina Perlotti Piunti


Doutora em Educação (Universidade Federal de São Carlos)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-4595-540

Maria Beatriz Gameiro Cordeiro


Doutora em Linguística e Língua Portuguesa
(Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-8351-0377

RESUMO

Este relato de experiência tem por objetivo geral apresentar considerações sobre uma
atividade proposta pelo Produto Educacional “Proeja em pauta: uma proposta de
formação continuada de professores”, da pesquisa de mestrado intitulada “Ciclos
dialógicos: fundamentos e perspectivas para implementação de um curso do Proeja no
IFSP”, do Programa de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica em
rede nacional (ProfEPT). Tratou-se de um encontro entre o professor Miguel Gonzalez
Arroyo e os professores do IFSP, que teve como assunto central da discussão a educação
que deve ser ofertada aos jovens e adultos oriundos da classe trabalhadora. Dessa
maneira, discutiu-se, entre outras questões, quem são os sujeitos da Educação de Jovens

[ 55 ]
EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: ISSN: 2317-1839
e Adultos (EJA) a partir da concepção freiriana de sujeito, a importância da cultura
atrelada aos conteúdos escolares, a necessidade de reformular os currículos da EJA, de
modo que atendam às especificidades dos educandos e educandas oriundos/as da classe
trabalhadora, a urgência em superar o olhar escolarizado sobre o/a estudante
trabalhador/a e as concepções de educação popular. Essa prática visou a ampliar a
compreensão do campo da EJA na perspectiva da educação emancipadora. Concluímos, a
partir das reflexões apresentadas, que as concepções conservadoras de educação já não
suprem as necessidades e direitos educacionais de nossos tempos, sendo necessário o
desenvolvimento de práticas educativas mais justas e assertivas, para a garantia da
educação dos/as trabalhadores/as que retornam às escolas pela EJA.

Palavras-chave: Educação de jovens e adultos. Educação emancipadora. Prática


educacional.

ABSTRACT

This experience report has the general objective of presenting considerations about an
activity proposed by the Educational Product (title) of the master's research (title) of the
Professional Master's Program in Professional and Technological Education on a national
network (ProfEPT). It was a meeting among teacher Miguel Gonzalez Arroyo and teachers
(institution), whose central subject of discussion was the education that should be
offered to young people and adults from the working-class. In this way, it was discussed,
among other issues, who are the subjects of Youth People and Adult Education (EJA)
from the Freirean concept of subject, the importance of culture linked to school contents,
the need to reformulate the EJA's curricula from so that they meet the specificities of
students from the working class, the urgency of overcoming the schooled view of the
working student, and the conceptions of popular education. This practice aimed to
broaden the understanding of the field of EJA in the perspective of emancipatory
education. We conclude, from the reflections presented, that the conservative
conceptions of education no longer supply the educational needs and rights of our times,
being necessary the development of more just and assertive educational practices, to
guarantee the education of the workers who return to schools through EJA.
Keywords: Youth people and adult education. Emancipatory education. Educational
practice.

RESUMEN

Este relato de experiencia tiene como objetivo general presentar consideraciones sobre
una actividad propuesta por el Producto Educativo (título) de la investigación de maestría
(título) del Programa de Maestría Profesional en Educación Profesional y Tecnológica en
red nacional (ProfEPT). Fue un encuentro entre el docente Miguel González Arroyo y
docentes (institución), cuyo tema central de discusión fue la educación que se debe
ofrecer a los jóvenes y adultos de la clase trabajadora. De este modo, se discutió, entre
otros temas, quiénes son los sujetos de la Educación de Jóvenes y Adultos (EJA) desde el
concepto freireano de sujeto, la importancia de la cultura ligada a los contenidos

[ 56 ]
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escolares, la necesidad de reformular los currículos de la EJA a partir de que atienden las
especificidades de los estudiantes de la clase obrera, la urgencia de superar la visión
escolarizada del estudiante trabajador y las concepciones de la educación popular. Esta
práctica tuvo como objetivo ampliar la comprensión del campo de la EJA en la
perspectiva de la educación emancipatoria. Concluimos, de las reflexiones presentadas,
que las concepciones conservadoras de la educación ya no suplen las necesidades y
derechos educativos de nuestro tiempo, siendo necesario el desarrollo de prácticas
educativas más justas y asertivas, para garantizar la educación de los trabajadores que
regresan a las escuelas a través de EJA.
Palabras-clave: Educación de jóvenes y adultos. Educación emancipadora. Práctica
educativa.

1 INTRODUÇÃO

1.1 Uma breve análise histórica


Recorremos a alguns episódios e marcos da história brasileira da Educação de
Jovens e Adultos (EJA) para evidenciar itinerários de ações e programas descontínuos e
fragmentados, que visavam a erradicar o analfabetismo. Em alguns casos, certos
programas incentivavam a profissionalização, ainda que de forma tímida e
aparentemente secundária, para fornecer mão de obra, devido ao crescimento
urbano-industrial no Brasil, que impunha a questão da profissionalização, tal como
elucidam Almeida e Corso (2015).
Primeiramente, destacamos a Primeira Campanha Nacional de Educação de
Adolescentes e Adultos (CEAAA), lançada em 1947, por iniciativa do Ministério da
Educação e Saúde, conforme aponta Beisegel (1974). De acordo com Mumbach (2020), tal
iniciativa decorreu de uma pressão internacional, pois, no Brasil, considerava-se o sujeito
“não alfabetizado" como um ser ignorante e incapaz, que poderia ser alfabetizado por
qualquer metodologia, inclusive com os mesmos métodos empregados para ensinar
crianças.
Em sequência, já nos anos de 1950, aconteceu a Campanha Nacional de
Erradicação do Analfabetismo (CNEA), seguida do II Congresso Nacional de Educação de
Adultos, no qual Paulo Freire destacou-se com uma perspectiva de educação
progressista. Em 1960, Freire inspirou os programas de Educação de Adultos e organizou,
em 1963, o Programa Nacional de Alfabetização de Adultos (PNAA).

Aprovado pelo Decreto 53.465, de 21 de janeiro de 1964, o Plano Nacional


de Alfabetização de Adultos orientados pela proposta de Paulo Freire
previa a instalação de 20 mil círculos de cultura, que alfabetizariam 2
(dois) milhões de pessoas (EUGÊNIO, 2004, p. 42-43).

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Infelizmente, o golpe militar de 1964 extinguiu o PNAA, pois era um programa de
transformação social, e houve o exílio de Paulo Freire. A partir de então, a educação de
adultos passou a ser ofertada por meio de programas assistencialistas e conservadores,
a exemplo do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) nos anos 1970, cujo
objetivo, segundo Niskier (1989), era preparar mão-de-obra para o mercado. Essa
educação de caráter tecnicista estendeu-se até 1985 (STRELHOW, 2010, p. 37).
A metodologia de ensino de Paulo Freire e o MOBRAL baseiam-se em filosofias e
metodologias totalmente opostas, pois, enquanto o primeiro procura partir dos
conhecimentos prévios dos alunos, levando em consideração suas experiências de vida,
suas particularidades e, a partir destes pontos, promover o trabalho com os conteúdos
de ensino, no segundo, houve uma massificação e imposição dos conteúdos, sem atentar
às diferenças regionais e singularidades dos alunos (HORIGUTI, 2009). Tais discrepâncias
metodológicas desnudam o antagonismo desses dois projetos de EJA: o freiriano, que
busca uma educação libertadora, intencionando no diálogo com os trabalhadores uma
consciência de contexto social e possível reconfiguração de “lugar no Mundo”, em
oposição à educação funcional, em que apenas treinava-se mão de obra útil ao projeto de
desenvolvimento nacional dependente e restringia o ato de alfabetizar ao ensino da
leitura e escrita, conforme destaca Mumbach (2020). Com a ditadura civil-militar, os
desdobramentos dessa tensão foram abafados, mas não extintos.
A Constituição Federal de 1988 trouxe, em seu artigo 205, a ampliação do dever
do Estado para a EJA, quando definiu a obrigatoriedade e gratuidade do ensino
fundamental para toda a população:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será


promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).

Já o artigo 37 da Lei nº 9394/96 explicita que a EJA era destinada àqueles que
não tiveram acesso ou oportunidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade
própria, deixando claro, assim, o caráter inclusivo e compensatório dessa modalidade de
educação (BRASIL, 1996).
Observamos que, com a Constituição de 1988, a EJA começou a tomar, de fato,
novos rumos. A partir do ano de 2003, sob um novo governo, criou-se o Programa Brasil
Alfabetizado que, de acordo com Lopes e Souza (2005), foi lançado para cumprir a meta
de superar o analfabetismo entre jovens e adultos e, por meio do qual, o Ministério da
Educação (MEC) contribuiria com órgãos públicos estaduais e municipais, instituições de
ensino superior e organizações sem fins lucrativos que desenvolvessem ações de

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alfabetização. Na sequência, em 2005, por meio do Decreto 5.478 de 24 de junho, foi
criado o Programa de Integração de Educação Profissional ao Ensino Médio na
Modalidade Educação de Jovens e Adultos (Proeja) e implantado na Rede Federal de
Educação Profissional e Tecnológica – RFEPT (BRASIL, 2005). O Proeja representa um
grande marco para a Educação de Jovens e Adultos no Brasil ao se constituir uma
proposta de política de formação integral para os trabalhadores.
Segundo a Lei 11.892/2008 (BRASIL, 2008), que institui a rede federal de
educação, no seu artigo 7º, são objetivos dos Institutos Federais (IFs) ofertar educação
profissional técnica de nível médio, prioritariamente na forma de cursos integrados, para
os concluintes do Ensino Fundamental (EF) e para o público de Educação de Jovens e
Adultos (EJA). Além disso, o Decreto nº 5.478/2005, que institui o Proeja foi ampliado
pelo Decreto nº 5.840/2006 (BRASIL, 2006), o qual, por sua vez, obriga os Institutos
Federais a destinar 10% do total de vagas para os cursos integrados de Educação
Profissional (EP) em nível médio na modalidade Educação para Jovens e Adultos (EJA).
Dentre os pesquisadores que se dedicam ao estudo da Educação de Jovens e
Adultos (EJA) no Brasil, destacam-se as publicações e produção do professor da
Universidade Federal de Minas Gerais, Miguel Gonzalez Arroyo, cujos trabalhos
pautam-se na visão humanista e dialogam com a concepção de educação libertadora de
Paulo Freire.
Este relato, portanto, objetiva partilhar uma fala do professor Miguel Arroyo
dirigida, especialmente, a docentes do IFSP ão sobre a centralidade dos
sujeitos/estudantes da educação de jovens e adultos (EJA) integrada à educação
profissional e tecnológica (EPT), bem como sobre suas condições existenciais e materiais.
Nesta reflexão, também ampliamos conceitos e categorias que aparecem na fala de
Arroyo e nos permitem compreender as especificidades desta modalidade de educação
na perspectiva emancipadora.
Além desta introdução e breve análise histórica, o presente texto apresenta, a
partir da fala do Professor Miguel Gonzalez Arroyo e de outros referenciais que têm
investigado a EJA no Brasil: (i) o contexto atual marcado por ataques à educação em
todas as suas modalidades, à cultura e às ciências humanas em especial; (ii) caminhos
para a educação dos sujeitos da EJA, centralizando a compreensão dos sujeitos, homens
e mulheres e suas histórias de vida, enquanto trabalhadores-estudantes; e (iii)
apontamentos para superação de concepções conservadoras da educação de jovens e
adultos no Brasil.
A seguir, apresentamos reflexões sobre as falas do professor Miguel Arroyo em
diálogo com os professores do IFSP durante um encontro remoto ocorrido em abril de
2021, visto que se enfrentava ainda o distanciamento social devido à Covid-19, como uma
atividade proposta pelo Produto Educacional “Proeja em pauta: uma proposta de

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formação continuada de professores”, da pesquisa de mestrado intitulada “Ciclos
dialógicos: fundamentos e perspectivas para implementação de um curso do Proeja no
IFSP”, do Programa de Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica em
rede nacional (ProfEPT).

1.2 O contexto atual e a educação de jovens e adultos


A primeira colocação da reflexão do professor Arroyo aponta para o momento
em que se verifica um ataque à educação em todas as suas modalidades e às ciências
humanas em especial. O fato de educadores se reunirem em circunstâncias adversas,
como a pandemia da Covid-19, que assola o Brasil e o mundo, já constitui um movimento
de resistência. Arroyo também destaca que vivenciamos, ainda, “pandemias inumanas
políticas” desastrosas não somente no âmbito educacional, por isso, uma discussão sobre
a EJA configura-se, por si, uma representação política que vai de encontro ao
rebaixamento que a educação brasileira vem sofrendo. Nas palavras de Arroyo, um
evento, mesmo a distância, possibilitado pela tecnologia avançada, nesse tempo de
“pandemias não só viróticas, mas, sobretudo, pandemias políticas”, compreende
“representações políticas que dizem ‘não’ a tantas destruições e rebaixamento da
educação brasileira, a tanta desconstrução da cultura”.
Paulo Freire (2006) compreende a cultura como aquisição sistemática da
experiência humana, na permanente transformação do mundo pelo trabalho e nas
relações entre sujeitos. Nesse sentido, todos os seres humanos, letrados ou não,
escolarizados ou não, são capazes de elaborar cultura. Segundo Freire (2006, p. 49):

Herdando a experiência adquirida, criando e recriando, integrando-se às


condições de seu contexto, respondendo a seus desafios, objetivando-se a
si próprio, discernindo, transcendendo, lança-se o homem num domínio
que lhe é exclusivo – o da História e o da Cultura..

A cultura na escola, sistematizada pela ciência e por meio das relações


dialógicas, possibilita aos sujeitos/educandos, em sua permanente condição de
inacabamento, transitar entre a curiosidade ingênua em direção à curiosidade
epistemológica. Daí a centralidade de uma educação de jovens e adultos que não nega a
cultura popular, como um direito social, humano, inalienável. É, sobretudo, espaço da luta
pela humanização, ameaçada constantemente pelas opressões que conduzem a
objetificação e alienação dos seres humanos. Na construção teórica da “Pedagogia como
Prática da Liberdade”, Freire afirma:

A partir das relações do homem com a realidade, resultantes de estar


com ela e de estar nela, pelos atos de criação, recriação e decisão, vai ele

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dinamizando o seu mundo. Vai dominando a realidade. Vai
humanizando-a. Vai acrescentando a ela algo de que ele mesmo é o
fazedor. Vai temporalizando os espaços geográficos. Faz cultura (FREIRE,
2006, p. 51, grifo nosso).

Nesse ensejo, o professor nos convidou a refletir, dentre outras questões, por
que a cultura, em tempos de “pandemias políticas” e estado de exceção, é tão atacada e
deixada de lado, revelando que a cultura incomoda mais que o conhecimento científico,
por isso, as ciências humanas e a cultura, por tratarem com mais realismo os seres
humanos, são as mais afetadas negativamente. As ciências exatas e tecnológicas, por
outro lado, são bem-vindas ao desenvolvimento tecnológico, para a acumulação de mais
capital.
Ainda sobre o tema do momento dialógico entre educadores da Rede Federal,
bem como as concepções de educação e de sujeito apropriadas à EJA, o professor Arroyo
procurou destacar a educação de jovens e adultos e a concepção de educação mais
próxima de jovens e adultos trabalhadores, que vêm de passagens humanas e inumanas,
tratando-se aqui o termo “inumano” (ARROYO, 2017) de traduzir trajetórias que esses
trabalhadores percorrem até chegarem ou retornarem à escola pela EJA, que são
marcadas pela desigualdade social.
Se, antes da pandemia, já havia milhares de “trajetórias inumanas”, a crise
sanitária, causada principalmente pelo momento pandêmico, agravou ainda mais essa
situação, gerando uma realidade extrema, a qual exige que nós, educadores, repensemos
os currículos simplórios que não conseguem corresponder à nossa realidade. Para o
professor Arroyo, primeiro, precisamos pensar sobre que educação oferecer, segundo, é
necessário refletir sobre a formação docente para atuar na EJA nos Institutos Federais e,
principalmente, sobre uma organização curricular que garanta o direito à educação de
jovens e adultos no IFSP.
A respeito do conceito de educação, o professor Arroyo nos convida a centralizar
o olhar sobre os sujeitos, pois, normalmente, a visão dos envolvidos na educação
centraliza-se no currículo, na organização, no tempo e nos espaços e, raramente,
pensa-se nos sujeitos, homens e mulheres, seres humanos. E quando se trata de EJA,
entender quem são esses adultos, que passagens humanas e inumanas eles carregam, é
fundamental. A educação é uma relação de sujeitos, não é uma relação, nem sequer de
conhecimentos, nem de metodologias, nem de atividades, mas uma relação de sujeitos.
Quando falamos em uma formação de jovens adultos, em passagens humanas e
inumanas, estamos falando de sujeitos, e este é o ponto fundamental. Podemos sair dos
cursos de licenciaturas dominando o que ensinar, como ensinar, como aprovar e como
reprovar; tudo isso faz parte da formação que recebemos, todavia, pouco discutimos a
respeito dos sujeitos com os quais vamos trabalhar, e este é um ponto que merece nossa

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atenção especial, alerta Arroyo, questionando-nos: quem são estes sujeitos jovens e
adultos que chegam ao IFSP? Como vemos esses sujeitos? Será que os vemos? A
tendência é não nos preocuparmos com isso, mas sim em dominar o que ensinamos,
como aprovamos e reprovamos. Esta questão constitui uma problemática muito séria,
inclusive na hora de organizar os currículos.
Segundo Arroyo, nós, educadores, estamos olhando mais para os educandos e
tentando nos aproximar deles, mas ainda sob um olhar escolarizado. Inclusive, é muito
frequente enxergar os jovens e adultos nas nossas escolas com esse olhar, tal como as
próprias diretrizes curriculares da EJA insistem. Entretanto, precisamos superar esse
olhar escolarizado, se queremos encontrar o caminho para a educação da EJA. Vencer
esse olhar escolarizado significa compreender a fundo quem são esses sujeitos que,
geralmente, vêm das periferias, acordam muito cedo, dependem do transporte público,
pegam mais de uma condução para conseguir chegar à escola, a EJA é a última jornada
antes de voltarem tarde da noite para casa depois de um dia de trabalho. Arroyo enfatiza
ainda que, não apenas moram na periferia, mas são tratados como periféricos pelas
estruturas sociais de poder, de economia e até de educação. Estão na periferia da
educação como reprovados, como mulheres negras pobres, empregadas domésticas,
babás, esta é a realidade desses trabalhadores e trabalhadoras. Os espaços são
produtores não só de diferenças espaciais, são produtores de diferenças sociais, raciais,
produtores de diferentes coletivos e são eles (os estudantes da EJA) que chegam nas
escolas como periféricos.
O professor Arroyo aponta que Paulo Freire pode nos auxiliar a superar esse
olhar escolarizado se observarmos que ele não se refere a jovens e adultos sem a
educação básica, como “analfabetos”, mas como “oprimidos”. E esclarece que, os
oprimidos não são, para Paulo Freire, indivíduos isolados; para ele, os oprimidos são
coletivos, sujeitos sociais, raciais, de classe, de gênero, e segregados como sujeitos
coletivos, eles chegam à escola sabendo e tendo consciência disso. Para Arroyo, a nossa
educação trabalha cada aluno como se fosse uma “ilha”, e nós somos educadores de
coletivos. Assim, também devemos nos identificar, nós educadores, como coletivos.

A vida é o grande direito humano, o maior de todos os direitos humanos.


O trabalho tem que ser visto como o direito à vida dando direito para a
produção da vida. A terra, o espaço, são as condições materiais que os
seres humanos têm para trabalhar. E por que trabalhamos? Por que o
jovem, o adulto sai de casa para trabalhar? Por que até crianças saem
para trabalhar nas ruas, nos faróis, nos mercados? Trabalhamos por vida,
para podermos viver. O que dá a dimensão mais forte da educação para o
trabalho, é que o trabalho é pré-condição da vida, pois o primeiro direito
humano é o direito à vida. O direito à terra, ao trabalho, à saúde são
pré-condições para viver. É nesse sentido que devemos trabalhar.
Estamos economicamente em uma situação muito difícil em que

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perdemos o estado de direito, onde cada um é por si e o diabo por todos.
Formação técnica e profissional é direito de todo trabalhador e dever do
Estado (informação verbal, ARROYO, 2021).

O movimento docente é um movimento de coletivos de educadores e


educadoras. Educadores coletivos, de coletivos sociais, étnico-raciais. Isso é fundamental,
em todos os tempos escolares, mas sobretudo, na EJA. Referindo-se aos educandos da
EJA como oprimidos, Paulo Freire transforma o olhar escolarizado em um olhar humano
sobre os sujeitos, tal como se verifica na dedicatória que ele escreve em “Pedagogia do
oprimido” (FREIRE, 2002), quando dedica sua escrita aos “esfarrapados do mundo e aos
que neles se descobrem e, assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com
eles lutam” (FREIRE, 2002). Devemos nos perguntar se os jovens e adultos, que chegam
às nossas escolas pela EJA, são diferentes desses oprimidos aos quais Freire se referiu
em seu livro há mais de 60 anos. Ademais, é importante entendermos que esses jovens e
adultos já eram oprimidos antes, na infância, na adolescência, como filhos de
trabalhadores pobres que acumulam vivências em suas trajetórias até chegarem para
nós, educadores da EJA. Talvez, por isso, o tempo dedicado ao trabalho com a EJA seja o
que mais nos custa, pois é diferente formar educadores para trabalhar com crianças ou
adolescentes e formar docentes para esse público específico de jovens e adultos
trabalhadores vindos de passagens humanas e inumanas. É preciso buscar os
significados dessas passagens, desses movimentos que trazem esses sujeitos do
trabalho para a escola, encontrar, nesses itinerários, os significados formadores. Esses
trabalhadores voltam à escola na esperança de mudarem suas realidades a partir de
uma formação profissional, e nós, educadores, sabemos que a escola, sozinha, não é
capaz de mudar as estruturas sociais, argumenta Arroyo.
Um aspecto fundamental a ser considerado quando utilizamos o antagonismo
oprimidos/opressores é que a fundação destes polos está no fato de se constituírem
classes sociais. Homens e mulheres reais e concretos relacionam-se “enquanto classes
que oprimem e classes oprimidas” (FREIRE, 2002, p.126). É inegável, na relação dialética
em que se encontram o “antagonismo indisfarçável que há entre uma classe e outra”
(FREIRE, 2002, p. 141). Nesse recorte, Arroyo nos chama a atenção para a questão da
precarização do trabalho docente que aparece também na dedicatória de Freire, “[...] aos
que neles se descobrem e, assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com
eles lutam” (FREIRE, 2002).

Ele está falando dos movimentos sociais, aqueles que se descobrem


nesses oprimidos, nesses esfarrapados, creio que ele esteja referindo-se,
também, aos educadores da EJA que se descobrem, não com um olhar
escolarizado, mas com um olhar de esfarrapados. Paulo Freire vê a

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opressão como sofrimento, um sofrimento humano, um sofrimento
social e um sofrimento político (informação verbal, ARROYO, 2021).

Dessa forma, Arroyo esclarece que os professores e professoras da EJA


refletem as imagens quebradas de seus educandos em suas próprias imagens, também
quebradas de educadores, por tantas questões que envolvem o trabalho docente com a
EJA. Uma obra que nos auxilia nessa reflexão é o livro citado pelo professor “Imagens
quebradas, trajetórias de alunos e mestres” (ARROYO, 2004), que agrupa reflexões em
torno dos alunos, dos mestres e de seus tempos. Para Freire (1979), o processo de
conscientização alcança o estágio propriamente crítico quando os
oprimidos/esfarrapados do mundo se identificam como sujeitos sociais, como classe: “a
consciência crítica dos oprimidos significa, pois, consciência de si, enquanto “classe para
si” (FREIRE, 1979, p. 48).
Portanto, a formação docente para a EJA deve perpassar pela compreensão
desses sujeitos, buscando, em seus itinerários, os temas com os quais esses educandos
se identificam. Outro aspecto essencial, destacado por Arroyo, é a construção dos
currículos e, em se tratando de EJA, talvez seja preciso romper com os currículos oficiais
e avançar no sentido de uma nova organização curricular que supere a visão escolarizada
da própria estrutura escolar. Para o professor Arroyo, é necessário outro norte para a
construção dos currículos da EJA. A melhor forma de trabalhar educação profissional é
partindo dos coletivos de trabalho, das profissões que os estudantes já têm, das suas
vivências como trabalhadores e de suas demandas pela formação técnica, intelectual,
ética e cidadã. É preciso que nos perguntemos: que organização curricular construiremos
para garantir o direito à educação de jovens e adultos no IFSP?

1.3 Caminhos para a educação dos sujeitos da EJA


Ao partilhar uma experiência exitosa do Projeto de Educação do Trabalhador
1
(PET) , o professor Arroyo apontou caminhos para a educação dos sujeitos da EJA
possibilitando-nos compreender melhor, com a práxis (no sentido freiriano da unidade
indissociável entre teoria e prática que funda a condição humana, social e histórica), as
questões que envolvem a construção do currículo, de onde devemos partir e que direção
seguir.
O Projeto de Educação do Trabalhador (PET) mencionado por Arroyo foi
idealizado a partir de uma escola sindical2 que formava operários e, ao se constatar que
___________________
1
O Projeto de Educação de Trabalhadores – PET – constitui-se em uma experiência de Educação de Jovens e Adultos
cuja centralidade da ação pedagógica é o trabalho e, em decorrência a cultura, nos processos formativos do adulto
trabalhador.
2
Ver: Escola Sindical 7 de Outubro – 15 anos. Belo Horizonte, 2002, CUT-Brasil.BH:2002.

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muitos operários não haviam sequer concluído a educação básica, foi iniciada uma
parceria entre a escola sindical e a prefeitura para se pensar como educar esses jovens e
adultos trabalhadores. Assim, surgiu um projeto que rendeu bons frutos e constatou que
a EJA sozinha não é suficiente, que precisamos de parcerias, de estudos que nos rendam
dados para nos orientar como devemos fazer a educação desses trabalhadores.

A escola não dá conta sozinha, temos que nos articular para essa
formação de jovens e adultos trabalhadores, incluindo até os
movimentos sociais. Nesse projeto, a forma de organizar as turmas foi
diferente, rompendo com o modelo tradicional. Quando o aluno chegava
para a EJA, não se perguntava a ele em que ano havia parado de estudar,
mas sim onde ele trabalhava; essa é a pergunta adequada, uma vez que
todos são trabalhadores que vêm do trabalho para a escola. Assim, foi
possível descobrir os diversos coletivos de jovens e adultos que
trabalhavam na mesma função, como pedreiros, serralheiros, manicures,
cabeleireiras, costureiras, por exemplo, e, dessa forma, aproximar esses
coletivos. Então, as turmas eram formadas por alunos que tinham
trabalhos semelhantes, sendo colocados dois professores trabalhando
com cada coletivo. Esses professores faziam com que os alunos
narrassem suas vivências de trabalho, suas dificuldades e esperanças de
mudar para uma situação melhor, mais favorável. A partir dessas
narrativas é que os temas teóricos a serem trabalhados iam sendo
construídos e, assim, entravam as diversas áreas do conhecimento nos
currículos, ou seja, partindo das próprias necessidades dos alunos, do que
eles precisavam aprender para se desenvolverem em suas profissões
(informação verbal, ARROYO, 2021).

Ao ressaltar o êxito de partir da vivência, do trabalho do estudante, Arroyo


dialoga com Freire, quando destaca a indissociabilidade entre a teoria e a prática: “A
reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria/prática” (FREIRE,
1996, p. 22). Essa discussão pode remeter, ainda, à capacidade de aprender, que se torna
mais efetiva, segundo Freire, quanto mais se desenvolve a “curiosidade epistemológica”.
Em nossa compreensão, quando se parte da vivência do estudante para discutir
a teoria, desperta-se essa curiosidade epistemológica; diferentemente da educação
bancária, que coloca o estudante em uma posição de aprendizado passivo, em que os
conteúdos teóricos, dissociados de sua realidade, não lhe fazem sentido. Assim, para o
patrono da educação brasileira, “Ensinar não é esgotar o conteúdo ou o objeto, mas se
estende à produção das condições em que aprender criticamente é possível [...]” (FREIRE,
1996, p. 26).
Outro aspecto envolto nesse relato é que quando se parte da vivência do
educando, respeita-se seu saber e discute-se com ele as razões de ser de alguns desses
saberes, tal como defende Freire (1996), sugerindo que aproveitemos a experiência que o
estudante carrega, os problemas que enfrentam nos bairros e discuti-los embasados na

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teoria, pois: “Transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é
amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu
caráter formador”. (FREIRE, 1996, p. 33).
Ainda ao partilhar essa experiência, o professor Arroyo insistia que é urgente
romper com a estrutura curricular tradicional para a EJA, que reproduz a mesma
organização da escola, tratando os estudantes como “ilhas”.

Eu diria que, se continuarmos organizando a EJA por séries, ou


somatórios de séries, estamos reproduzindo a mesma visão escolarizada
da escola, mas não no olhar do educador, pior ainda, no olhar da própria
estrutura escolar. Eu diria que não é somente possível romper com isso,
mas que é urgente que se rompa (informação verbal, ARROYO, 2021).

Entendemos que essa experiência aponta inúmeros caminhos a serem seguidos


em cursos de jovens e adultos, tais como: as parcerias com a comunidade, a elaboração
de um currículo que parte da vivência dos estudantes e rompe com a estrutura curricular
tradicional, visando à interdisciplinaridade, dentre outras práticas que corroboram para
um ensino efetivo. Essa necessidade de superar a visão escolarizada da escola pode,
ademais, remeter à discussão feita por Freire (1996, p. 26) sobre a “verdadeira
aprendizagem”, que ocorre quando os educandos se tornam “sujeitos reais da construção.
e reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito no processo”.
Outro caminho apontado pelo professor Arroyo, que complementa a questão
dos temas a serem construídos para as turmas de EJA, é que esses temas devem ser
trabalhados sempre atrelados à cultura, pois ela nos ajuda a entender os significados dos
itinerários desses sujeitos que vêm do trabalho para a escola por passagens humanas e
inumanas. Muitas letras de músicas, poemas e filmes podem fazer com que esses alunos
se reconheçam, se identifiquem. Esses materiais podem e devem entrar para as
atividades a serem feitas com os alunos de EJA, como o professor Arroyo disponibiliza no
livro “Passageiros da noite – do trabalho para a EJA” (ARROYO, 2017). A partir dessas
ideias, é possível construirmos um outro currículo, mais justo e próximo a esses
estudantes trabalhadores, sem perder de vista o direito que estes sujeitos possuem de
finalizar a educação básica, lugar em que se insere o Proeja.
Na obra de Paulo Freire, bem como nas obras de Arroyo, o trabalho é concebido
nas dimensões ontológica (enquanto condição de humanização, de atividade
fundamental do gênero humano) e histórica (que se revela nas diferentes manifestações
das sociedades humanas ao longo do tempo). Neste sentido, sendo o trabalho princípio
educativo, de educadores e educandos, base da formação de seres humanos nas tramas
da cultura, na perspectiva da práxis, não há distinção entre trabalho manual e intelectual.
Logo, a dimensão do trabalho compõe a pedagogia libertadora, comprometida com a

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emancipação social e engajada na superação de todas as formas de opressão que negam
a condição humana de ser mais, inclusive aquelas implícitas nos projetos educacionais
que conformam a dualidade estrutural que acompanha sistemas de ensino que separam
a formação técnica/profissional da formação geral humanística.

2 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para Silva (2018), falar sobre o Proeja exige, antes de tudo, uma reflexão sobre o
que é a EJA e sobre quem são os seus sujeitos, compreendendo que os sujeitos da EJA
são aqueles que agem, que transformam, participam e produzem as suas histórias.
Portanto, esses sujeitos são, além dos educandos, os educadores e pesquisadores que
vêm, há vários anos, estudando essa temática. Dessa forma, pensamos que, esse
encontro entre os docentes do IFSP com o professor Miguel Arroyo constituiu um ponto
de partida para reflexões a respeito de uma modalidade tão complexa e desafiadora para
a rede federal de ensino. E, assim como defende Moll (2017), um dos passos para
democratizar a educação é a democratização do debate, não apenas de seu acesso, tal
como este relato propõe.
O diálogo de Arroyo com Paulo Freire é mantido em toda a discussão sobre a
questão da educação específica para os adultos trabalhadores na perspectiva
emancipatória e libertadora, conforme a pedagogia do oprimido, que defende a educação
em diálogo com a realidade de vida de seus educandos, especialmente, quando estes são
trabalhadores expropriados de seus direitos que buscam na educação uma afirmação de
cidadania e melhores condições para existirem no mundo do trabalho.
Reconhecemos, nesta reflexão, que as concepções conservadoras de educação
não conseguem atender às demandas educacionais de nossos tempos e procuram
reafirmar os modelos educacionais tendo como referência as necessidades imediatas do
mercado, das políticas neoliberais hegemônicas (LAVAL, 2019). Tais concepções ainda
persistem entranhadas em nossa mentalidade de educadores da EJA e dificultam as
mudanças indispensáveis ao desenvolvimento de práticas educacionais, mais justas e
assertivas para a garantia da educação dos trabalhadores, jovens e adultos que tiveram
negados os seus direitos de escolarização.

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Seção: Políticas Públicas | Artigo de revisão | DOI:
https://doi.org/10.35700/2317-1839.2022.v11n19.3265

Educação de jovens e adultos: reflexões e


desafios sobre o Proeja
Youth and adult education: aspects and challenges
about Proeja
Educación de jóvenes y adultos: reflexiones y
desafíos sobre Proeja

Enriete Cogo Dominguez


Mestranda (Instituto Federal Farroupilha – IFFAr)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7537-1410

Maria Rosângela Silveira Ramos


Doutora em Educação (Instituto Federal Farroupilha – IFFAr)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8960-0827

Catiane Mazocco Paniz


Doutora em Educação em Ciências
(Instituto Federal Farroupilha – IFFAr)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-2999-796

RESUMO

Busca-se, através deste estudo, apresentar reflexões a respeito da educação de jovens e


adultos, analisando os seus aspectos, desafios e sua relação com a própria história da
educação, no qual o educador Paulo Freire surge como uma referência. Neste contexto,
merece destaque a criação do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional
com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos, que se
constituiu numa política educacional com a proposta de integração da educação
profissional com o ensino médio, na modalidade de educação de jovens e adultos. Para
alcançar os objetivos propostos, realizou-se um estudo de caráter qualitativo a partir de
revisão bibliográfica de autores relacionados à temática, o que permitiu concluir que a
educação de jovens e adultos se constitui como uma garantia do acesso à educação,

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possibilitando a ampliação de acesso e permanência de jovens e adultos na Educação
Básica.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Educação Profissional. PROEJA.

ABSTRACT

The aim of this study is to present a reflection on Youth and Adult Education, analyzing
its aspects, challenges and its relationship with the history of education, in which the
educator Paulo Freire appears as a reference. In this context, it is worth mentioning the
creation of the Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a
Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (National Program for
Integration of Professional Education with Basic Education in the Youth and Adult
Education Modality), which constituted an educational policy with the aim to integrate
professional education with high school in the EJA modality. To achieve the objectives
this study pursues, a qualitative study was carried out based on the review of literature
of several authors related to the subject, which allowed us to conclude that youth and
adults education constitutes as a guarantee of access to education, enabling the
expansion of access and permanence of young people and adults in Basic Education.
Keywords: Youth and Adult Education. Professional Education. EJA.

RESUMEN

Este estudio presenta una reflexión sobre la educación de jóvenes y adultos, analizando
sus aspectos, desafíos y su relación con la historia de la educación, en la que el educador
Paulo Freire aparece como referencia. En este contexto, cabe mencionar la creación del
Programa Nacional para la Integración de la Educación Profesional con la Educación
Básica en la Modalidad de Educación de Jóvenes y Adultos, que constituyó una política
educativa con la propuesta de integrar la educación profesional con la educación
secundaria, en la modalidad de educación de jóvenes y adultos. Para lograr los objetivos
propuestos se realizó un estudio cualitativo a partir de una revisión bibliográfica de
varios autores relacionados con la temática, lo que permitió concluir que la educación de
jóvenes y adultos constituye una garantía de acceso a la educación, posibilitando la
expansión de ingreso y permanencia de jóvenes y adultos en la Educación Básica.
Palabras-clave: Educación de jóvenes y adultos. Educación profesional. PROEJA.

1 INTRODUÇÃO
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Brasil parece ser um fato
contemporâneo, porém, esse processo educativo teve início na época de sua colonização.
Desde sua implantação, vem passando por vários momentos de grande significado
político-social e se mostrou, até hoje, um sistema resistente e significativo. Nesse sentido,

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a trajetória da EJA no Brasil foi marcada por muitas transformações, demonstrando estar
diretamente relacionada às mudanças sociais, políticas e econômicas que caracterizam
cada período da história.
Nessas mudanças e transformações, emerge a necessidade de integrar a
educação profissional com o ensino médio na modalidade de Educação de Jovens e
Adultos, sendo assim criado o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional
com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA). O
referido programa, inicialmente, restringia-se às Instituições Federais de Educação
Tecnológica e ao nível médio de ensino.
Conforme enfatiza Pacheco (2015), o contexto dos Institutos Federais (IFs),
apresentam modelo inovador em termos de proposta político-pedagógica referente à
educação de jovens e adultos. Assim, em seus documentos legais, apresenta como
objetivo centrado na formação plena dos sujeitos, os quais, até então, excluídos dos
sistemas de ensino. Além disso, proporciona uma formação contextualizada, que abrange
conhecimentos, princípios e valores potencializando a ação humana na busca de
caminhos de vida mais dignos.
Sendo assim, cabe destacar que essa nova concepção, focada na formação
omnilateral, propõe profundas mudanças, abrindo oportunidades para jovens e adultos
provenientes da classe trabalhadora. Neste viés, ressaltamos:

[...] o que se busca é garantir ao adolescente, ao jovem e ao adulto


trabalhador o direito de uma formação completa para a leitura do mundo
e para a atuação como cidadão pertencente a um país, integrado
dignamente à sua sociedade política (CIAVATTA, 2005, p. 85).

Portanto, devido às mudanças nas concepções da educação profissional,


podemos considerar o PROEJA como um instrumento para diminuir as desigualdades
sociais, pois oferta um ensino de qualidade, que permite aos sujeitos usufruir de uma
educação integral que possibilita a formação de cidadãos autônomos, éticos, críticos e
conscientes da sua função perante a comunidade na qual estão inseridos.
Essa proposta de educação, ofertada pelas redes federais, de formação humana
integral na perspectiva da formação omnilateral a partir do trabalho, apresenta-se como
uma nova concepção que deve garantir o desenvolvimento dos sujeitos em todas as suas
dimensões – intelectual, física, emocional, social e cultural.

2 METODOLOGIA
Para a realização desta pesquisa, foi utilizada a metodologia de abordagem
qualitativa, uma vez que, “para se realizar uma pesquisa é preciso promover o confronto

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entre os dados, as evidências, as informações coletadas sobre determinado assunto e
conhecimento teórico a respeito dele” (LÜDKE E ANDRÉ, 1986, p. 1-2).
A pesquisa foi realizada de maneira exploratória, por meio de consultas de
caráter qualitativo, através de revisão bibliográfica de vários autores. A temática
proposta é desenvolvida abordando as seguintes questões: a configuração do campo da
EJA, a sua história e memórias, o pensamento de Paulo Freire e a relação do PROEJA com
a Educação Profissional e Tecnológica.
O presente trabalho emerge da etapa inicial, vinculada à pesquisa de dissertação
de mestrado em Educação Profissional em Rede PROFEPT – polo Jaguari, com a temática
voltada para o papel social das políticas públicas educacionais no IFFar – câmpus São
Vicente do Sul, a partir de um olhar sobre o PROEJA.

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1 A configuração do campo EJA


A luta pelo direito à EJA implica, não somente o acesso à escola, mas também à
produção do conhecimento que se dá no mundo da cultura e do trabalho. No entanto, são
nesses diversos espaços de convívio social, em que jovens e adultos seguem
constituindo-se como sujeitos.
As ações voltadas para EJA constituem-se como política pública de Estado, na
garantia do acesso à educação como direito de todos. Os estudantes da EJA são sujeitos
antes afastados do sistema educacional, numa sociedade que exclui grande parcela da
população desfavorecida econômica, social e culturalmente.
Nesse contexto, os Institutos Federais propõem a ampliação da atuação em EJA,
tendo em vista o atendimento à sua lei de criação 11.892/2008, pois o PROEJA
constitui-se como uma proposta de educação na modalidade de educação de jovens e
adultos integrada à educação profissional (EP). Tal modalidade se propõe a romper com
a histórica dualidade estrutural entre a educação propedêutica e a educação profissional,
que no Brasil se construiu respectivamente sob uma base de educação para a classe
dirigente e para a classe trabalhadora.
Embora essa modalidade de ensino seja oferecida gratuitamente e garantida
pela legislação, é fundamental a permanente inquietação e mobilização de todos os
sujeitos envolvidos na EJA, inquietação, pelos seus mais diversos motivos, pela
libertação, pelos saberes que possam contribuir, garantindo, assim, que o cumprimento e
aprimoramento das leis seja uma constante.

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3.2 História e memórias
Para melhor compreendermos o presente da EJA, é preciso conhecer a sua
história. A EJA se manifesta no Brasil desde o período de sua colonização com os jesuítas
que se dedicavam a alfabetizar (catequizar) crianças indígenas e índios adultos.
Conforme Fávero e Freitas (2011) a função supletiva foi assumida a partir de 1947 através
da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), organizada pelo Ministério
da Educação e Saúde (MES), em que os alunos analfabetos eram atendidos em classes de
emergência, designadas como de ensino supletivo.
Já na década de 1960, com a promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, em 1961, e a aprovação do Plano Nacional de Educação, em 1962,
criaram-se condições para novas experiências de educação de adultos. Foi neste período
que Paulo Freire apresentou uma abordagem diferenciada numa proposta de
alfabetização de adultos, considerando o educando como centro do processo de ensino e
aprendizagem.
A década de 1970, até meados dos anos 1980 foi marcada por duas ações
complementares, embora pouco articuladas: a Lei nº 5692/71, que criou os ensinos de 1º
e 2º Graus e sistematizou o Ensino Supletivo, em termos de exames e cursos, e o
Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL).
Nos anos 1980, foi implantada a Fundação Nacional para Educação de Jovens e
Adultos (Fundação Educar), vinculada ao Ministério da Educação. Em 1988 a
promulgação da nova Constituição Federal previa o término do MOBRAL, a criação da
Fundação Educar.
Nos anos 1990, aconteceu a extinção da Fundação Educar, que mantinha apoio
financeiro e técnico às empresas governamentais, entidades civis e empresas, gerando
um enorme vazio na EJA. Nessa perspectiva, alguns estados e municípios assumiram a
responsabilidade em oferecer programas de EJA.
Cabe destacar, no entanto, que esse período foi marcado pela promulgação da
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº. 9.394/96), que reafirmava o
direito dos jovens e adultos trabalhadores ao ensino básico e ao dever público de sua
oferta gratuita. A partir da Resolução CNE/CEB Nº 1/2000, são estabelecidas as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a EJA a serem obrigatoriamente observadas na oferta e na
estrutura dos componentes curriculares de ensino fundamental e médio.
O Plano Nacional de Educação (PNE) instituído pela Lei nº 10.172 de 2001 incluiu a
modalidade EJA nas formas de financiamento da Educação Básica, apresentando como
metas: a erradicação do analfabetismo no prazo de dez anos e assegurar a oferta de EJA
para o Ensino Fundamental.

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A partir de 2002, o governo federal criou o Exame Nacional para Certificação de
Competências de Jovens e Adultos (ENCEJA), por meio do qual pôde, mediante convênio
com estados e municípios, substituí-los na realização de exames supletivos.
Em 2003, o Governo Federal criou a Secretaria Extraordinária do Analfabetismo,
lançando então o “Programa Brasil Alfabetizado”. Nele, estavam incluídos o Projeto Escola
de Fábrica, o PROJOVEM e o Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino
Médio para Jovens e Adultos (PROEJA), que perpassou por vários redesenhos e
prolonga-se até os dias atuais.
Inicialmente, o PROEJA foi instituído com a intenção de atender a uma demanda
de jovens e adultos por meio da educação profissional técnica de nível médio. De acordo
com o Documento Base do PROEJA, ele constitui-se em um desafio político e pedagógico
para todos aqueles que desejam transformar esse país dentro de uma perspectiva de
desenvolvimento social (BRASIL, 2007). O documento também evidencia a importância
da formação humana dos sujeitos envolvidos, isto é, dos jovens e adultos aos quais se
destinam a implementação desses programas. Assim, foi nesse período que se
constituíram as bases para que o PROEJA fosse inserido no contexto educacional do
Brasil como uma ação permanente (BRASIL, 2007).
A Educação de Jovens e Adultos alcança o século XXI com importante desafio de
superação de velhas práticas e concepções equivocadas. As relações que se
estabeleceram no Brasil impactaram de forma diferenciada na EJA, conforme os arranjos
políticos nos municípios, nos estados e também no governo federal.
Nessa perspectiva, Freire (1996) afirma que o sistema educativo adotado e as
Políticas Públicas direcionadas para a educação são elementos que demonstram a
preocupação do país com o seu futuro, pois somente o ensino público gratuito, inclusivo
e de qualidade pode construir uma sociedade em que as diferenças socioculturais e
socioeconômicas não sejam tão díspares.

3.3 O pensamento de Paulo Freire


Considerado um dos pensadores mais notáveis na história da educação brasileira
e um dos mais importantes teóricos da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, Paulo
Freire, autor de diversos livros sobre educação, onde se destacam “Pedagogia do
Oprimido”, “Pedagogia da Autonomia” e “Pedagogia da Esperança”, explicita que o objetivo
da escola era ensinar os alunos a "ler o mundo" para poder transformá-lo. Nesse
contexto, afirmava que os alunos deveriam passar necessariamente pelo
reconhecimento de sua identidade cultural, sendo o diálogo a base de seu método.
Um dos principais livros do autor (“Pedagogia do Oprimido”) e os conceitos nele
contidos são base de boa parte do conjunto de sua obra. Neste livro, o autor faz uma

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proposta em que a concepção da educação surgiria como prática da liberdade, a partir
dos próprios oprimidos. Nas palavras de Freire (1996), é de fundamental importância a
dimensão cultural no processo de transformação, pois a educação é mais do que uma
instrução; para ser transformadora, deve enraizar-se na cultura dos povos.
Na obra “Pedagogia da Autonomia'', o autor ressalta os saberes necessários à
prática educativa, trazendo uma reflexão a respeito da formação de docentes, faz uma
análise de saberes fundamentais, enumerados através de exigências de um ensino em
favor da autonomia do educando.
Em “Pedagogia da Esperança”, faz uma reflexão sobre “Pedagogia do Oprimido”,
analisando suas experiências pedagógicas e procurando reacender a crença no ser
humano oprimido, como opção de lutar contra sua opressão em favor da vida e da
liberdade.
Freire coordenou projetos de alfabetização de jovens e adultos, nos quais, com
sua metodologia de ensino, recomendava que não bastava ler e escrever mas possibilitar
a continuidade dos estudos, tomando como base o contexto social e cultural do aluno,
sua realidade de vida, de modo a permitir que os estudantes desenvolvessem maior
autonomia e senso crítico. Apoiando-se na concepção de educação freiriana, a qual está
voltada para a conscientização de que se faz necessário atingir esses sujeitos excluídos, e
propiciar a leitura do mundo e a da palavra, a partir da sua experiência/vivência, de sua
cultura, de sua história. Assim, Freire (1987, p. 17) defende:

Quem, melhor que os oprimidos, se encontrará preparado para entender


o significado terrível de uma sociedade opressora? Quem sentirá, melhor
que eles, os efeitos da opressão? Quem, mais que eles, para ir
compreendendo a necessidade da libertação? Libertação a que não
chegarão pelo acaso, mas pelas práxis de sua busca; pelo conhecimento e
reconhecimento da necessidade de lutar por ela. Luta que, pela finalidade
que lhe derem os oprimidos, será um ato de amor, com o qual se oporão
ao desamor contido na violência dos opressores, até mesmo quando esta
se revista da falsa generosidade referida.

Nesse sentido, a EJA, deve buscar e oportunizar uma educação com prática
libertadora para os sujeitos inseridos, ao mesmo tempo, inserindo-os no mundo e sendo
desafiados ao ensino contextualizado, ao contrário de uma educação bancária, a qual,
‘deposita’ os conteúdos, de maneira fragmentada. Segundo Freire, "não há saber mais ou
menos; há saberes diferentes” (FREIRE, 1991, p. 49).
Diante do exposto, Freire torna-se uma referência na Educação de Jovens e
Adultos, pois apresenta a educação pensada de maneira emancipatória, colocando vários
argumentos em favor de um ensino mais democrático entre educadores e educandos, de
maneira a defender uma pedagogia fundamentada na ética, no respeito, na dignidade e

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na autonomia, reafirmando a opção da educação para a humanização, para a
emancipação e libertação, uma vez que a educação é concebida como uma forma de
intervenção no mundo.

3.4 A EJA e a Educação Profissional e Tecnológica


No decorrer da história da EJA, em 2005, ocorreu uma mudança muito
significativa com a criação do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional
com a Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA, com
objetivo de ofertar cursos de EJA com Educação Profissional.
O Programa constituiu-se numa política educacional do governo federal,
implantada através do Decreto nº 5.478/2005 e teve inicialmente como base de ação a
Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica (BRASIL, 2005). Foi revogado
posteriormente pelo Decreto nº 5.840/2006 e ampliado em termos de abrangência e
aprofundado em seus princípios pedagógicos (BRASIL, 2006). Nesse sentido, Moura e
Henrique (2012, p. 116) explicitam:

Houve a ampliação da oferta dos espaços educacionais para o PROEJA, já


que o Decreto Nº 5.478/2005 determinava a oferta somente à Rede
Federal de Educação Profissional e Tecnológica (RFEPCT), enquanto que o
Decreto Nº 5.840/2006 passou a incluir as instituições públicas estaduais
e municipais de educação como um novo espaço para essa oferta.

Aconteceu, também, a ampliação da abrangência do Programa, porque o Decreto


Nº 5.478/2005 limitava o PROEJA ao Ensino Médio, e o Decreto Nº 5.840/2006 passou a
incluir o Ensino Fundamental, constituindo-se como um marco para a aproximação entre
a escolarização e profissionalização e também por possibilitar a ampliação de acesso e
permanência de jovens e adultos na Educação Básica (BRASIL, 2005; BRASIL 2006).
Apropriando-se de Ferreira (2020, p. 220), o PROEJA objetiva “integrar, dessa
maneira, a Educação de Jovens e Adultos e a Educação Profissional, como política
educacional, foi inédita no país. Foi adotado pelo sistema público educacional e pelo
Sistema S”. No entanto, o PROEJA não é um currículo de EJA e nem da Educação
Profissional, mas um currículo que esteja essencialmente para os sujeitos que trabalham,
ou que buscam pelo trabalho, e ainda para os “excluídos” de “acesso e permanência na
escola regular” (SANTOS, 2010).
O funcionamento do PROEJA, em seus aspectos gerais, são apresentados em
seus documentos-base, cabendo a cada instituição a oferta de cursos e desenvolvimento
de sua aplicação. De acordo com o Documento Base (2007) a consolidação dessa
proposta tem como fundamento a integração entre trabalho, ciência, técnica, tecnologia,
humanismo e cultura geral com a finalidade de contribuir para o enriquecimento

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-4417
científico, cultural, político e profissional como condições necessárias para o efetivo
exercício da cidadania (BRASIL, 2007).
O PROEJA busca o resgate e reinserção no sistema escolar brasileiro de jovens e
adultos, possibilitando-lhes o acesso à educação e à formação profissional numa
perspectiva de formação integral. Pode ser considerado mais que um projeto
educacional, pois é um importante instrumento de resgate da cidadania de uma grande
parcela de brasileiros em grande parte excluídos do sistema escolar no Ensino
Fundamental “regular”. Apropriando-se de Freire (2007, p. 47), compreende-se que:

Há uma pluralidade nas relações do homem com o mundo, na medida


em que responde à ampla variedade dos seus desafios. Em que não se
esgota num tipo padronizado de resposta. A sua pluralidade não é só em
face dos diferentes desafios que partem do seu contexto, mas em face de
um mesmo desafio. No jogo constante de suas respostas, altera-se no
próprio ato de responder. Organiza-se. Escolhe a melhor resposta.
Testa-se. Age. Faz tudo isso com a certeza de quem usa uma ferramenta,
com a consciência de quem está diante de algo que o desafia. Nas
relações que o homem estabelece com o mundo há, por isso mesmo,
uma pluralidade na própria singularidade.

O autor reafirma a importância de promover o educando como um sujeito, o


qual possa atuar no seu contexto social com dignidade. O EJA – EPT possibilita a
realização de sonhos/objetivos na busca de uma educação profissional. Desse modo,
trata-se de um programa que aproxima das necessidades do ser humano, além da sua
capacitação profissional, mas, também, na interação dos mais diferentes campos de
atuação do serviço técnico, em que os estudantes têm a oportunidade de cursar essa
modalidade de ensino tanto para o conhecimento e sequência de seus estudos quanto
para a formação profissional.
Desse modo, o PROEJA também possibilita a realização de sonhos/objetivos na
busca de uma educação profissional, consistindo num programa que se aproxima das
necessidades do ser humano, além da sua capacitação profissional, bem como na
interação dos mais diferentes campos de atuação do serviço técnico. O estudante do
PROEJA, tem a oportunidade de cursar essa modalidade de ensino tanto para o
conhecimento e sequência de seus estudos quanto para a formação profissional.

3.5 O PROEJA e seus desafios contemporâneos


Considerando que a sociedade se caracteriza por grandes diferenças sociais e
conflitos, percebe-se que é necessário administrar essa situação, e as políticas públicas
educacionais constituem-se um meio para fazê-lo. Este trabalho constitui-se em um
desafio, considerando a abrangência da temática e o objetivo de debatermos e

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-4417
refletirmos acerca da EJA, tendo em vista a necessidade de compreendermos as
transformações, aspectos e desafios nas políticas educacionais voltadas para a área de
educação de jovens e adultos, que chegam à atualidade sem superar a problemática do
analfabetismo.
Cabe ressaltar que relacionar os conceitos e ideias da EJA no âmbito da
educação profissional e tecnológica (EPT) é bastante relevante, porque nos permite
repensar as possibilidades de novas metodologias e novos comportamentos. Porém,
mesmo constituindo-se uma meta do Plano Nacional de Educação 2014-2024, ampliar a
oferta de EPT, articulada com a educação básica, é um grande desafio ainda a ser
superado.
Na perspectiva de Paulo Freire, entende-se que a alfabetização de jovens e
adultos não é um processo simples de ensinar apenas a leitura e a escrita, não devendo
limitar-se a algo completamente mecânico e de memória. A alfabetização do EJA é um
processo de ensino que deve ser acompanhado do processo de conhecimento e
construção de práticas sociais importantes com o objetivo de conscientizar o sujeito
sobre sua realidade, a fim de transformá-la.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo possibilitou refletir sobre o ensino de EJA, buscando
evidenciar sua importância como um meio para inserir aqueles alunos que foram
impedidos de concluir os estudos quando adolescentes.
Ao realizar uma análise da trajetória da EJA, percebemos que consiste em uma
modalidade de ensino marcada por diversos desafios. Apesar de cada etapa apresentar
características distintas, em todas elas, encontramos em comum o propósito de
recuperar o direito dos jovens e dos adultos à educação.
Assim, tratar sobre a EJA é evidenciar as principais ações voltadas para o acesso
dos jovens e adultos ao sistema escolar. Porém, Machado (2016) enfatiza que a
modalidade não se reduz à escolarização. Sua história na realidade brasileira abarca a
luta pelo direito de acesso, permanência e conclusão da escolarização com qualidade, em
consonância com inúmeras outras lutas: pelos direitos à saúde, ao trabalho, à moradia
digna, à igualdade de gênero, ao respeito às diversidades, dentre tantas outras, que a
configuram como educação ao longo de toda a vida e pela construção de uma sociedade
que, de fato, seja espaço de vivência e convivência de todas e todos.
Percebe-se, outrossim, que ainda há muito que se avançar com relação ao
ensino de EJA, pois ela não se constitui como prioridade na sua efetiva implementação e
continuidade. Sendo assim, para que se atendam às necessidades da EJA é preciso de

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investimentos que favoreçam a continuidade da oferta de estudos e a permanência do
aluno na escola.
Entende-se, portanto, que é importante que uma política pública como o PROEJA
possa contemplar a elevação da escolaridade com profissionalização no sentido de
proporcionar a esse grande número de jovens e adultos o direito à educação básica e
uma formação profissional de qualidade.
Por fim, nesse contexto de possibilidades e desafios, a EJA ainda é uma questão
de luta que precisa ser engajada por todos, pois, apesar de todas as políticas públicas
educacionais desenvolvidas e muitas mudanças nessas últimas décadas, continuamos
com muitas incertezas, consistindo em um capítulo da história da educação que deverá
ser permanentemente reinventado.

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Seção: Políticas públicas | Ensaio dissertativo | DOI:
https://doi.org/10.35700/2317-1839.2022.v11n19.3295

Concepções de educação de jovens e


adultos na educação escolar: a
importância de qualificar o direito à
educação
Youth and adult education conceptions in school
education: the importance of qualifying the right
to education
Concepciones de educación de jóvenes y adultos en
la educación escolar: la importancia de calificar el
derecho a la educación

Bruno César dos Reis Rodrigues


Mestre em Educação em Ciências e Matemática – UFG
Universidade Federal de Goiás
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-9672-4318

Rones de Deus Paranhos


Mestre em Educação – UnB
Departamento de Educação em Ciências, Instituto de Ciências
Biológicas da Universidade Federal de Goiás (ICB/UFG)
E-mail: [email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-2661-1235

RESUMO

A educação de jovens e adultos é marcada por tradições, concepções e paradigmas


educacionais que têm orientado as práticas pedagógicas nas salas de aula da EJA. Tais
concepções se assemelham por fazerem a defesa do direito à educação. Entretanto, a
finalidade pré-determinada para esse direito pode se orientar com objetivos escusos e
alienantes. Nesse sentido, o presente texto tem por objetivo apresentar ao leitor o
construto teórico da concepção assistencialista-compensatória de educação e a

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concepção da educação como direito, nas suas relações com as intencionalidades
formativas por trás do direito à educação, defendido por ambas. Lançamos mão de
autores como Duarte (2013), Paranhos (2017), Saviani (2017), Pereira (2006), Costa e
Machado (2017), Kramer (1982), entre outros, para construir as ideias centrais do texto,
apresentando pontos de dissonâncias e concordâncias das duas concepções. Ambas as
concepções defendem o direito à educação e aos conhecimentos sistematizados,
produzidos e acumulados ao longo da atividade humana, entretanto, a concepção
assistencialista-compensatória se orienta por conservadorismos e manutenção das
relações sociais verticalizadas da sociedade, com vias a um projeto formativo contextual.
A concepção da educação como direito se orienta com o objetivo de permitir que o
educando, por meio da apropriação dos conhecimentos sistematizados, desenvolva uma
leitura de mundo para além do aparente. Desse modo, defendemos que tão importante
quanto defender o direito à educação é qualificar a educação defendida, de modo que ela
cumpra o papel de humanização do homem e não de sua alienação.
Palavras-chave: Educação assistencialista-compensatória. Educação como direito.
Educação escolar.

ABSTRACT

The education of young people and adults is marked by traditions, conceptions and
educational paradigms that have guided the pedagogical practices in EJA's classrooms.
Such conceptions are similar in that they defend the right to education, however, the
pre-determined purpose for this right can be guided by hidden and alienating objectives.
In this sense, this text aims to introduce the reader to the theoretical construct of the
compensatory-assistentialist conception of education and the conception of education as
a right, in its relationship with the formative intentions behind the right to education,
defended by both. We launch from authors such as Duarte (2013), Paranhos (2017),
Saviani (2017), Pereira (2006), Costa and Machado (2017), Kramer (1982), among others,
to build the central ideas of the text, presenting points of dissonances and concordances
of the two conceptions. Both conceptions defend the right to education and to
systematized knowledge, produced and accumulated throughout human activity,
however, the compensatory-assistance concept will be guided by conservatism and
maintenance of verticalized social relations in society, with paths towards a contextual
training project. The conception of education as a right will be guided with the objective of
allowing the student, through the appropriation of systematized knowledge, to develop a
reading of the world beyond the apparent. In this way, we demarcate that as important as
defending the right to education is to qualify the defended education, so that it fulfills the
role of humanization of man and not of his alienation.
Keywords: Compensatory assistance. Education as a right. Schooling.

RESUMEN

La educación de jóvenes y adultos está marcada por tradiciones, concepciones y


paradigmas educativos que han guiado las prácticas pedagógicas en las aulas de la EJA.
Tales concepciones se asemejan porque defienden el derecho a la educación. No

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obstante, el propósito predeterminado de este derecho puede estar guiado por objetivos
ocultos y alienantes. En este sentido, este texto tiene como objetivo presentar al lector el
constructo teórico de la concepción asistencialista compensatoria de la educación y la
concepción de la educación como un derecho, en sus relaciones con las intenciones
formativas por detrás del derecho a la educación, defendido por ambos. Hemos utilizado
autores como Duarte (2013), Paranhos (2017), Saviani (2017), Pereira (2006), Costa y
Machado (2017), Kramer (1982), entre otros, para construir las ideas centrales del texto,
presentando puntos de disonancias y concordancias de las dos concepciones. Ambas
concepciones defienden el derecho a la educación y al conocimiento sistematizado,
producido y acumulado a lo largo de la actividad humana. Sin embargo, el concepto
asistencial compensatorio estará guiado por el conservadurismo y el mantenimiento de
relaciones sociales verticalizadas en la sociedad, con caminos hacia un proyecto de
formación contextual. La concepción de la educación como derecho se orientará con el
objetivo de permitir al alumno, mediante la apropiación de conocimientos sistematizados,
desarrollar una lectura del mundo más allá de lo aparente. De esta manera, defendemos
que tan importante como defender el derecho a la educación es calificar la educación
defendida, para que cumpla el rol de humanización del hombre y no de su alienación.
Palabras-clave: Asistencia compensatoria. La educación como derecho. Enseñanza.

1 INTRODUÇÃO
A educação de jovens e adultos (EJA), ao longo de sua história, foi permeada por
diversas tradições e concepções de EJA (DI PIERRO, 2017) e paradigmas (ELSAS, 2012) que
moldaram e orientaram as práticas pedagógicas nas salas de aula da modalidade e para
além delas.
A literatura especializada apresenta concordâncias e dissonâncias sobre quantas
e quais seriam essas concepções de EJA, bem como seus respectivos projetos
formativos. Di Pierro (2017) apresenta três tradições e concepções: a educação
compensatória, a educação popular e a educação ao longo da vida. Elsas (2012), por sua
vez, identifica na história da EJA as concepções: “assistencialista, compensatória, o
conceito de educação ao longo da vida e os paradigmas da educação popular” (ELSAS,
2012, p. 6).
Para pensar as concepções de EJA, em espaços escolares, é preciso considerar a
educação que é operacionalizada nesses espaços, ou seja, um processo educativo
pedagogicamente estruturado. Para Saviani (2017), a educação pedagogicamente
estruturada é marcada por três elementos: a filosofia da educação, uma teoria da
educação e os procedimentos de ensino. As concepções de EJA adentram o campo da
filosofia da educação, da finalidade do ato educativo, dos motivos e intenções por trás
delas e, nem sempre, o olhar imediato, para o procedimento de ensino, dará condições ao

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observador de identificar a orientação filosófica de determinada prática. É preciso olhar
as mediações, ater-se mais além do aparente.
As concepções de educação, implícitas ou explícitas, sofrem influência direta do
momento histórico pelo qual a sociedade passa. No período colonial, a educação
firmava-se no campo da caridade e era ofertada com vias à colonização do pensamento;
no período imperial, servia às transformações oriundas da mudança no modo de
produção do feudalismo ao capitalismo; no Brasil república, passa a atender às
demandas de um capitalismo em consolidação (SAVIANI, 2017). Esse acúmulo histórico
de significados e finalidades atribuídos ao fenômeno educativo, contudo, é importante
para compreender o panorama atual da EJA, pois, embora tenha havido rupturas com o
outrora concebido e praticado, há, ainda, elementos que permanecem.
O direito à educação e a necessidade da educação expressam o que chamamos
de concepções de EJA. Ter clareza sobre tais concepções, entretanto, é deveras
importante para se estudar a modalidade, dadas as suas marcas históricas e sua ligação
com a estrutura verticalizada da sociedade. A compreensão do que está por trás das
concepções de EJA permite qualificar algo pelo qual diversos setores da sociedade
organizada lutam: o direito à educação. Entretanto, como mostrado por Saviani (2017) e
Costa e Machado (2017), o sistema produtivo também defende tal direito.
É preciso demarcar, contudo, que o fenômeno educativo se dá em um sistema
de relações de poder e de dominação. Nesse sentido, é preciso compreender as razões
pelas quais um direito é defendido, tanto quanto é preciso qualificar os limites e
possibilidades dessa defesa.
Nas concepções apresentadas por Di Pierro (2017) e Elsas (2012), identificam-se
dois caminhos, que, segundo Fisher (1992), apresentam-se de forma muito contundente
na EJA: o caminho instituinte (que não se consolidou como políticas públicas de
educação), caminho em que se situa a corrente da educação popular, por exemplo, que
admite o caráter emancipador da educação e se distancia da educação enquanto
instituição formada no seio do Estado; e o caminho instituído, no qual se situam as
práticas pedagógicas sistematizadas pelo Estado a fim de “suprir” a não escolarização de
um grupo específico da sociedade: os jovens e adultos.
Tais caminhos, conforme Fisher (1992), apresentam-se de forma antagônica. O
caminho instituído, nascido dos ideais do modo de produção capitalista e da sociedade de
classes, não admite a existência das ideias do caminho instituinte (orientado por um
ideário contra-hegemônico), sobretudo por intencionar uma formação crítico-política.
A educação popular, ao fazer a crítica quanto aos métodos praticados e a defesa
de que se considerasse a pedagogia nascida dos próprios sujeitos, representa, então, um
marco, uma ruptura com a forma da educação até então praticada e dá bases para a
criação de um novo modo de educar os jovens e adultos1.

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A filosofia da educação popular percorreu um caminho oposto à
institucionalização, mesmo que tenha influenciado o caminho instituído da EJA. As
políticas e os programas educacionais que foram criados, a partir de então, procuraram
deixar de tratar o adulto como crianças e lançaram mão de procedimentos pedagógicos
oriundos da educação popular.
Entretanto, mesmo que se tenha mudado a aparência da educação
institucionalizada, a essência permaneceu, de modo que a finalidade formativa não foi
alterada. Incorporou-se somente a primeira parte das ideias da educação popular, a
metodológica, e deixou-se de lado o sentido da formação política desejada pelo
movimento.
Diante do exposto, consideram-se, neste texto, concepções que seguem
caminhos presentes na educação institucionalizada, ou seja, a educação escolar, na qual
concebemos a existência duas concepções distintas: educação
assistencialista-compensatória (EAC) e educação como direito (ED).
Partindo disso, o presente texto é um ensaio que objetiva apresentar: um
construto teórico2 acerca das concepções de EJA presentes na educação escolar; sua
relação com seus projetos formativos; e o lugar que o direito à educação ocupa no centro
dessas concepções.

2 A CONCEPÇÃO ASSISTENCIALISTA-COMPENSATÓRIA
DE EJA
Caracterizar essa concepção, inicialmente, não se apresentou como uma tarefa
fácil. A literatura pesquisada, embora apresente as concepções assistencialista e
compensatória, por vezes as apresenta de forma dissociável, como concepções distintas.
Para Di Pierro (2017), a educação compensatória e a educação ao longo da vida
são concepções distintas. Neste ensaio, contudo, consideramos que são formas
diferentes de se manifestar a mesma concepção. Elsas (2012) aborda a educação
compensatória e o conceito de educação ao longo da vida como uma única concepção,
ideia discutida de forma aprofundada por Ventura (2013).

______________________
1
Os movimentos de educação popular apontavam para a necessidade de se considerar o universo vocabular do
adulto durante o processo de alfabetização e para o abandono de práticas de alfabetização voltadas para crianças e
até então praticadas em salas de aula de adultos.
2
Este texto é desdobramento de dissertação de mestrado defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação
em Ciências e Matemática da Universidade Federal de Goiás.

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Ventura (2013) se propõe a discutir o conceito de educação ao longo da vida
fazendo uma relação com as orientações de organismos internacionais, como UNESCO e
o Banco mundial, “desenvolvidas como resposta à nova materialidade do capitalismo
internacional e suas influências nos debates e nas formulações relativas à educação
básica e profissional de jovens e adultos trabalhadores, no Brasil, na atualidade”
(VENTURA, 2013, p. 1).
Segundo Ventura (2013), ao relacionar as orientações dos organismos
internacionais com o parecer n. 11/2000 CNE/CEB (2000), a função qualificadora da EJA
(uma das três funções da EJA) relaciona-se com o conceito de educação ao longo da vida
no sentido de compensar as necessidades do capitalismo internacional no que tange à
formação de mão de obra. Para a autora, a educação ao longo da vida está ligada à
adaptação do trabalhador às condições e exigências do mercado de trabalho. Para
desenvolver essa ideia, Ventura (2013) se utiliza das ideias de Canário (2003):

Canário (2003), ao situar o caráter central que o conceito de


aprendizagem ao longo da vida adquiriu na Europa, a partir dos anos
1990, aponta que este se articula com a relação direta estabelecida entre
educação e atividade econômica, ou seja, a política de formação como
resposta às políticas de emprego. Este autor nos mostra que os
argumentos que sustentam a aceitação e expansão em torno do conceito
de aprendizagem ao longo da vida são: 1) a evolução tecnológica,
“transição para uma ‘Era do Conhecimento’, concomitante com uma ‘nova
economia’ que tornaria obsoletas as competências atualmente
existentes” (p. 194); 2) a eficácia produtiva “em torno da trindade
(santíssima?) da produtividade, competitividade e empregabilidade apela
para uma outra gestão global da mão-de-obra” (op. Cit.); e, por fim, 3) a
coesão social “traduz a preocupação central de combater ou prevenir
formas de conflitualidade social que poderiam abalar o sucesso da nova
ordem econômica” (op. Cit.). Desta forma, demonstra o caráter de
subordinação das políticas de formação contínua à racionalidade
econômica dominante, justificando a aprendizagem ao longo da vida
como fator de busca de empregabilidade e adaptabilidade, como resposta
individual aos desafios da mundialização (VENTURA, 2013, p. 10).

A educação permanente e a educação ao longo da vida, contudo, nem sempre


estiveram colocadas como resposta às expectativas de acumulação do capital. Segundo
Silva (2020), o paradigma de educação permanente e ao longo da vida, em sua gênese,
“teve sua origem na Europa, no século XVIII, associado aos ideais críticos, prevendo uma
educação para cidadania, emancipação” (SILVA, 2020, p. 6), e partia do pressuposto de
que as pessoas podiam se educar ao longo da vida, independentemente de sua idade. No
século XX, contudo, a “elocução esteve mais afinada com as políticas educativas em
perspectivas de formações profissionais, atentas às demandas de capacitações que o

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
capital exigia” (SILVA, 2020, p. 6). Tais apontamentos demonstram a capacidade do
capital de se apropriar e ressignificar pautas sociais, colocando-as a seu serviço.
A concepção da educação ao longo da vida está em marcos regimentais,
documentos oficiais e orientadores, como o Documento Nacional Preparatório à VI
Conferência Internacional de Educação de Adultos, emitido pela extinta Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação e
Cultura (MEC). Um dos trechos de tal documento evidencia o claro compromisso com
essa concepção ao dizer que um dos maiores desafios da EJA na atualidade “é o de
avançarmos para uma concepção de aprendizagem ao longo da vida” (BRASIL, 2016, p.
30).
O conceito de educação ao longo da vida, relacionado ao de educação
permanente, dará subsídios para a perpetuação da crueldade empregada pelas práticas
compensatórias, ou seja, a compensação não tem fim. O movimento de alinhamento da
educação ao longo da vida com as demandas do capital fez-nos considerá-lo uma das
formas da educação compensatória.
Antes, contudo, de aprofundar a questão da educação compensatória, cabe
elencar a escolha por apresentar as duas concepções – assistencialista e compensatória
– de forma indissociável, pois admitimos que a educação compensatória é a forma da
educação assistencialista no modo de produção capitalista.
A educação assistencialista, segundo Nóvoa (2009) e Libâneo (2012), demarca
seu lugar na sociedade em função das carências sociais de determinados grupos. A
instituição escolar, nesse sentido, assume o papel de redentora da sociedade, admitindo
como seu papel a “correção” de problemas sociais, como fome, pobreza, maus tratos,
drogas, entre outros (LIBÂNEO, 2012). Tais características são herança da influência de
práticas assistencialistas muito presentes na educação brasileira e na própria
constituição da sociedade.
Pereira (2006) apresenta duas vertentes para as práticas assistencialistas: a
corrente que defende o assistencialismo como forma generosa de apoio aos pobres e
redenção dos detentores das dádivas; e a corrente que acredita na prática assistencialista
como forma de controle social dos excluídos. Entretanto, as duas vertentes apresentadas
pela autora apresentam uma linha muito tênue de dissociabilidade, pois as práticas
caridosas assumem também o sentido de controle social e de dívida.
As duas correntes apresentam dois personagens: o detentor e o receptor de
uma dádiva – nesse caso, a educação. Mesmo a ação assistencialista parte da ideia
cristão de dividir o que tem, e a relação de poder não se dissolve, de modo que o receptor
sempre se sentirá em dívida, o que propicia um controle social. Essa lógica só é superada
se o sujeito, foco do ato educativo, tiver consciência de que o que lhe é dado é seu por
direito.

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Pensando na EJA, as práticas assistencialistas carregam os elementos
apresentados por Pereira (2006): o educando é frágil e se vê na posição de
desfavorecido, que quer “ser alguém na vida”. Ao receber a educação de quem a detém, o
educando terá uma eterna dívida com o doador da dádiva sem, porém, compreender que
o que lhe é dado intenciona sua subalternidade (MACHADO, 2019; ARROYO, 2014). A
modalidade é, então, marcada por uma visão assistencialista que não a enxerga
“enquanto direito a ser garantido, mas [como] ação a ser empreendida e segundo a
voluntariedade de alguns indivíduos ou grupos organizados” (ELSAS, 2012, p. 6).
Tal concepção irá se materializar em um ensino centrado no sujeito e em sua
história de vida sofrida e marginal. A escola assume posição de instituição de assistência
social, em que o objetivo final é a satisfação de necessidades imediatas. A apropriação do
conhecimento, então, assume lugar secundário. Nesse contexto, a educação será
entendida como a satisfação de um sonho, uma conquista individual de quem visa à
obtenção de um diploma. Qualquer coisa que impeça o aluno de atingir esse objetivo será
excluída, inclusive os conhecimentos sistematizados, complexos por natureza (MARTINS,
2016).
As ideias apresentadas por Pereira (2006) encontram seu lugar na organização
da pedagogia brasílica implementada pelos jesuítas ao chegarem ao Brasil. A lógica que
se estabelece na relação educativa entre os jesuítas e os nativos da colônia pauta-se nas
ideias da assistência religiosa e da oferta da luz e da verdade divina aos educandos
(SAVIANI, 2017).
A ética cristã, orientadora das práticas educativas jesuíticas, segundo Pereira
(2006), acredita na caridade como manifestação dos ensinamentos de Deus e como
sinônimo da própria conversão: forma de dividir as bênçãos dadas por Ele com quem
delas necessita, segundo a lógica do “amai o próximo como a ti mesmo”, do “dai o que
recebeis”. As ações caridosas, contudo, se “avaliadas de forma apressada, apresentam-se
como favoráveis ao lado mais frágil – o do pobre – envolvido no processo” (PEREIRA,
2006, p. 2), mas são cruéis, uma vez que relegam a este a posição onde se encontra, mas
de forma eterna, estabelecendo um vínculo de subserviência velada.
Essa ética “é difundida e praticada com intensidade, principalmente nos moldes
assistencialistas, em sociedades que produzem miséria ao mesmo tempo em que
desenvolvem a riqueza e o conforto material (PEREIRA, 2006, p. 3). Em suma, é uma
prática que produz a desigualdade que tentará compensar por meio de ações
assistencialistas.
Saviani (2017), ao apresentar as práticas pedagógicas jesuíticas, permite ao leitor
perceber as ideias do assistencialismo e o poder da educação nos dois primeiros séculos
da colonização. O caráter assistencialista da educação e o discurso da caridade pregado
pelos jesuítas permitiram que houvesse o controle social dos indígenas, que trabalhavam

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sem remuneração e contribuíam para o acúmulo de riqueza pelos religiosos. A relação
entre os jesuítas e os indígenas, em certa medida, assemelha-se à relação estabelecida
entre senhores de terras e pessoas escravizadas, mas de forma diferente: enquanto os
senhores exerciam o controle dos escravizados por meio da força e dos castigos, os
jesuítas o faziam por meio da estruturação da educação e do assistencialismo.
O sucesso da pedagogia jesuítica, segundo Saviani (2017), resultou em acúmulo
de poder e influência na então colônia portuguesa, o que ameaçava o poderio da coroa e
de pequenos comerciantes, que alegavam ser desleal a forma de comércio e acúmulo de
riquezas adotada pelos religiosos – sem pagamento de impostos e com trabalho braçal
executado por indígenas catequizados, resultando em menor custo em relação à
manutenção do sistema escravagista.
A expulsão dos jesuítas em 1759 denota a ruptura com a pedagogia até então
institucionalizada e dava sinais das transformações sociais – e, consequentemente,
pedagógicas – que a sucederiam: se antes o poder dos jesuítas se sustentava na
educação, passando a servir a interesses de ordem macroeconômica.
Pensando na EJA, a partir do exposto, pode-se afirmar que a modalidade
experimenta nuances da educação assistencialista e confessional desde a gênese da
educação brasileira. Costa (2013) afirma que:

no período colonial, raízes históricas da EJA, bem como no período


imperial, a educação missionária como perspectiva de evangelização
reforçou a conduta comportamental, sustentou a continuidade lógica de
conformação social e legitimou a lógica desigual, no que diz respeito à
formação profissional, formavam artesãos e outros ofícios
desempenhados no Brasil Colônia (COSTA, 2013, p. 60).

Tais fatos corroboram a afirmação de Machado (2019, p. 157) de que “a educação


de jovens e adultos experimenta em sua historicidade, em diferentes contextos, o que
podemos aqui denominar de processos de subalternização dos sujeitos”. Em suma,
tem-se que a educação destinada aos jovens e adultos, desde os tempos coloniais, já
intencionava uma formação dicotomizada entre trabalho manual e intelectual.
Assim, no entender de Kramer (1982), tal característica irá se materializar nas
práticas compensatórias, uma vez que estas também possuem a intencionalidade de
manter o sujeito na condição em que se encontra.
Cabe, neste ponto, colocar em relevo que, na EJA, a relação da cultura do
benefício, introduzida pelas práticas assistencialistas, se apresentará de forma intrínseca
às próprias características da educação compensatória, como fator importante do
processo de atribuição de significados para a atividade de estudo pelo sujeito da EJA.

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Assim, tem-se um educando marginalizado pela história e estrutura da
sociedade, visto como “pobre e coitado” pelos que o relegaram a essa situação; mas ele
também se identificará como tal, pois esta é a característica mais cruel da educação
assistencialista: a de incutir, de forma convincente, a ideia da subalternização como se
esta não existisse.
Afinal, em que lugar, no universo da concepção assistencialista, a educação
compensatória se situa?
Pelo apanhando teórico realizado, podemos definir a concepção compensatória
de educação como a que se desdobra a partir da consolidação do capitalismo,
reproduzindo as concepções de mundo, de sociedade e de homem desse modo de
produção. Seu principal objetivo é o de manter as relações desiguais da sociedade,
embora a partir de discursos que aparentemente não as explicitem. É a educação
assistencialista com contornos mercantis, uma vez que as características
assistencialistas não são extintas – pelo contrário, se mantêm, mas absorvendo novas
proposituras formativas e formas de se manifestar.
Segundo Trópia (2009), a escola, no capitalismo, tem sua função socialmente
econômica, ou seja, deverá atender às necessidades formativas do modo de produção,
produzindo e formando o homem que, uma vez formado, reproduzirá os ideais daquele.
Entretanto, como ressalta Pereira (2009), há uma intrínseca relação entre a classe
dominante, o assistencialismo e o trabalhador, permeada pela lógica do cristianismo e do
capital.
Para Trópia (2009), a estrutura educativa nascida no seio dos ideais capitalistas
produziria uma educação em que não haveria espaço para crítica, contestação ou
percepção das contradições e da emancipação intelectual dos sujeitos.
A educação compensatória nascida daí, então, terá como objetivo central não a
formação de um sujeito, mas de uma “mão de obra”. O homem, nesse sentido, é
entendido como uma ferramenta, uma engrenagem lubrificada na extensa máquina de
produção capitalista, capaz de estar, o quanto antes, pronta para adentrar no mercado de
trabalho e produzir (em outras palavras, ter sua força de trabalho explorada). O homem,
nessa lógica, é entendido como objeto, não como sujeito do processo.
Segundo Kramer (1982), as pedagogias compensatórias se instalaram no Brasil,
mais incisivamente, a partir de 1975, embora seja possível perceber a elaboração de
programas compensatórios nos governos de Getúlio Vargas e de Juscelino Kubitschek.
Corrobora a afirmação de Kramer (1982) a institucionalização do Movimento Brasileiro de
Alfabetização (MOBRAL) enquanto política pública do governo militar. A afirmação da
autora encontra lugar na dissertação de mestrado de Silva (2019), intitulada “Você
deveria ter vergonha de viver num país com tantos analfabetos: a campanha publicitária
do MOBRAL na Revista Veja (1970-1975)”.

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A pesquisa realizada por Silva (2019) apresenta elementos que corroboram a
tese deste texto de que há indissociabilidade entre a educação assistencialista e a
compensatória. O MOBRAL, como apresentado pela autora, traz em seu seio as
características das pedagogias da compensação recheadas de ideias assistencialistas –
como o discurso do sujeito (da EJA) incapaz e da caridade cristã – ao mesmo tempo em
que delimita o corpo de conhecimentos que deveriam ser incorporados pelos alunos (ler,
escrever contar e ter uma profissão) aliados à promoção humana e à construção de uma
sociedade harmônica.
O MOBRAL tinha como objetivo erradicar o analfabetismo3, integrar o
alfabetizado à força de trabalho e possibilitar ao alfabetizado uma educação continuada.
A educação continuada, proposta pelo movimento, tinha como marca o fato de
considerar o jovem e adulto não alfabetizado como um ser desarticulado da sociedade e
improdutivo; portanto, a partir dos seus princípios, propunha integrar os sujeitos à força
de trabalho, o que o promoveria enquanto ser humano. O oferecimento de oportunidades
para a promoção humana, contudo, ocorreria através do treinamento para a mão da obra
necessária aos setores de trabalho. Presumia o não alfabetizado como um ser
improdutivo economicamente, eram 18 milhões de improdutivos, aproximadamente 34%
da população. O MOBRAL pretendia “melhorar esses números”, ao passo que intentava
incentivar o desenvolvimento comunitário através da promoção do civismo, da pátria e
do Estado militar, de modo a manter as estruturas de organização do regime (SILVA,
2019).
Nota-se, nessa descrição, a clareza dos ideais assistencialistas, como
apresentados por Pereira (2006), ao mesmo tempo em que as noções da pedagogia da
compensação também se manifestam (KRAMER, 1982). O discurso da pedagogia da
compensação, conforme definida por Kramer (1982), é convincente para os dois lados, o
dos dominantes e o dos dominados. Quanto aos dominantes, tem-se a ideia de garantia
de sua posição por meio de educação operacionalizada aos seus subalternos. Quanto aos
dominados, há a falsa ideia de que seu direito à educação é garantido. O trabalhador, com
jornadas duplas ou triplas, submetido a um trabalho desgastante e explorador, aceitará
de bom grado a educação que lhe fora negada; melhor ainda será se esta vier de forma
simplificada, compensatória da sua rotina desgastante – afinal, abandonar o trabalho
para estudar não é uma possibilidade.
A educação compensatória, firmada na sociedade capitalista, promoverá uma
mudança: surge então o paradigma do acesso. Se a pedagogia elitista era privativa do
acesso dos dominados à educação escolar, a pedagogia liberal parte da ideia de que as
_____________________
3
Termo utilizado nas peças publicitárias analisadas na pesquisa de Silva (2019).

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oportunidades devem ser dadas a todos. O sistema passará, então, a defender que todos
têm o “direito à educação”.
O paradigma do acesso se apresentará como um fatalismo social, na medida em
que dá oportunidade a todos, mas confere aos problemas pedagógicos o fator de
patologia; com isso, produz a cultura do individualismo e impossibilita o reconhecimento
do sujeito como parte de uma classe. Tal paradigma não coloca a escola em questão e
produz e incorpora em seu público o discurso da meritocracia (KRAMER, 1982). Segundo
essa concepção,
[...] a escolaridade passa a significar degrau para ascensão social; as
práticas se realizam segundo a reprodução do ensino regular de forma
acelerada; a história se constitui como traço verticalizado em direção à
evolução e os indivíduos já possuem responsabilidade delimitadas
(ELSAS, 2012, p. 7).

A contradição central, então, das pedagogias da compensação é a intenção de


corrigir a desigualdade social negando-a, (re)produzindo consensos e criando a ilusão da
igualdade de oportunidades quanto ao acesso à educação, sem necessariamente relegar
qualidade social a esse acesso. Carregam a característica de controle social atribuída à
educação assistencialista; a falsa ideia de instrução do povo é seu discurso e prática, e
sua intencionalidade é dar condições de manutenção das desigualdades existentes
(ELSAS, 2012).
Nessa perspectiva, o sistema precisa que alguém (um ou outro) suba no estrato
social, criando a ilusão de que a mobilidade e a ascensão social existem. Para Arroyo
(2014), todavia, ao se pensar em alguém que se situa às margens, pressupõe-se a
possibilidade de este atravessar de uma margem a outra, de transpor-se do seu lugar a
uma posição melhor. A educação pensada para esses coletivos populares
marginalizados, como os sujeitos da EJA, entretanto, não tem essa finalidade. Ela cria,
nas palavras de Arroyo (2014), “pontes ou pinguelas”, de modo que apenas poucos
conseguem atravessá-las, pois o sistema carece dessa travessia para manter-se
convincente e verossímil.
Os programas compensatórios, ao fazerem a defesa de que o acesso à educação
escolar é fundamental, nos sentidos quantitativo e qualitativo, não consideram que a
característica qualitativa da educação escolar na sociedade capitalista é cruel, pois a
qualidade é mercantil, e não social. Propostas compensatórias de educação, em suas
características clássicas, no que concerne à EJA, propiciarão a criação de programas e
propostas formativas aligeiradas, com carga horária reduzida, com linguagem
simplificada e simplificação das próprias atividades em que os alunos irão se envolver.
A educação aligeirada e simplificada apresenta-se como risco para o
desenvolvimento humano e a formação do psiquismo, uma vez que o desenvolvimento

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psíquico dos sujeitos se dá pela ascensão dos conhecimentos da vida cotidiana,
tipicamente espontâneos e assistemáticos, em conhecimentos científicos, complexos,
que requerem maior grau de desenvolvimento (MARTINS, 2016). As propostas
compensatórias (aligeiradas e simplificadas), na EJA ou em qualquer outro espaço
educativo, são o elemento mediador do sujeito com a sociedade e com o conhecimento.
O que se tem, entretanto, é que a educação historicamente destinada aos
sujeitos da EJA é compensatória (COSTA, ECHEVERRÍA, 2010; DI PIERRO, 2017; MACHADO,
2019) e, consequentemente, supletiva, simplificada, marginalizante dos conhecimentos
mais complexos e sistematizados.
A história da EJA, permeada por essa concepção, apresentará diversos
elementos contraditórios. O parecer n. 11/2000 CNE/CEB (BRASIL, 2000), ao dar as
diretrizes curriculares para a educação de jovens e adultos, apresenta em seu texto as
funções da modalidade: reparadora, equalizadora e qualificadora. Agudo e Teixeira (2017)
apontam para a questão de que,

numa perspectiva histórico-crítica, é importante realizarmos a crítica


acerca dessas dimensões “reparadora”, “equalizadora” e “qualificadora”,
que estão relacionadas a uma perspectiva gerencialista de educação, que
busca “qualidade total”, vinculada de maneira orgânica à perspectiva
neoliberal de desenvolvimento (AGUDO; TEIXEIRA, 2017, p. 173).

A função equalizadora refere-se à equalização das oportunidades de acesso e


permanência, embora sejam raros programas e políticas públicas voltados para sua
efetivação. Contudo, a garantia de equidade e condições de acesso, em um documento
oficial, não foi capaz de assegurar a permanência dos educandos da EJA na escola,
sobretudo no ensino médio, em que os índices de evasão permaneceram altos após
promulgação do parecer (COSTA; MACHADO, 2017). Por sua vez, a função qualificadora
refere-se à qualificação para o mercado de trabalho e tem em seus ideais o paradigma
da educação ao longo da vida.
Há a manutenção também das práticas compensatórias, pois a democratização é
entendida por acesso, verbalismo simplificado, mas não necessariamente reparador.
Nesse sentido, a educação compensatória nada mais seria do que o assistencialismo
carregado das marcas do modo de produção capitalista, ou seja, um assistencialismo
mercantil. Pensando na EJA, é preciso ter clareza de que a concepção de educação
assistencialista-compensatória, nome pelo qual a chamaremos a partir deste ponto,
manifesta-se em discursos contraditórios, que se situam para além dos marcos
regimentais, demarcadas em suas características de: suplência, celeridade dos estudos,
recuperação do tempo perdido, marginalização dos conteúdos. Isso é o que está
aparente.

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Tal concepção se caracteriza, sobretudo, pelo seu projeto formativo. Para
reconhecê-la em discursos e práticas pedagógicas, é preciso se questionar: a proposta
educativa apresentada se “posiciona politicamente enquanto instrumento de legitimação
e reprodução das relações sociais existentes ou enquanto reveladora das formas de
dominação das camadas populares, mirando sua transformação?” (ELSAS, 2012, p. 6).
Paranhos (2017), em sua tese4, categorizou os projetos formativos presentes nas
produções científicas em três: projeto formativo contextual, projeto formativo plural e
projeto formativo crítico-político. De acordo com o autor:

O Projeto Formativo Contextual marca o compromisso com uma


formação que considere o preparo dos educandos para as mudanças
sociais, políticas e tecnológicas do século XXI, para isso, aposta num
currículo que considere a abordagem de temas ligados à pluralidade
cultural e questões de ordem social. Note que essa perspectiva não
expressa a relação que tem com o conhecimento científico, embora não o
marginalize. Já o Projeto Formativo Plural tem no seu cerne a
preocupação com a pluralidade dos educandos e suas necessidades, o
que demanda da instituição escolar flexibilidade formativa para atender
esse público. Nessa acepção, o conhecimento científico possui o papel de
instrumentalizar os educandos para a percepção da complexidade do
mundo (PARANHOS, 2017, p. 157, grifos do autor).

Para Paranhos (2017), nenhum dos dois projetos formativos demarca de forma
resoluta a relação entre a escola e os conhecimentos sistematizados. Tais projetos
formativos são “revestidos de conservadorismos, pois não questionam a organização
econômica da sociedade da forma como está posta” (PARANHOS, 2017, p. 157). Ao não
questionar a sociedade como está posta, a educação, nesse sentido, corrobora o projeto
formativo que produz consensos e conformidades, o que é próprio de uma concepção
compensatória de educação. As ideias apresentadas por Paranhos (2017) nos dão base
para situar os projetos formativos contextual e plural na concepção
assistencialista-compensatória.
O traço mercadológico desses projetos formativos baseia-se na formação para
flexibilidade, participação, trabalho em equipe, competência, competitividade e qualidade
total (PARANHOS, 2017); além disso, orienta-se pelos ideais da teoria do capital humano,
engendrado na concepção de educação ao longo da vida e nos valores do capital
internacional (ELSAS, 2012; VENTURA, 2013).
O projeto formativo crítico-político, nas palavras de Paranhos (2017),
_____________________
4
Paranhos (2017) ocupou-se de investigar o pensamento pedagógico brasileiro nas produções científicas (teses,
dissertações e artigos), que pesquisaram o ensino de Biologia na EJA.

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considera a organização societal que se desdobra do modo de produção
capitalista, traçando para a escola a pauta formativa de desvelar as
contradições da sociedade do capital. Portanto, esse projeto reconhece a
existência de classes (burguesa e trabalhadora) e coloca na sua pauta
formativa os interesses da classe trabalhadora. Firma para a instituição
escolar o compromisso com os conhecimentos sistematizados para
instrumentalizar os educandos com vistas à transformação da realidade
(PARANHOS, 2017, p. 157-158, grifos do autor).

Tal projeto formativo se distancia da concepção assistencialista-compensatória


de educação, situando-se na perspectiva da concepção da educação como direito.

3 A CONCEPÇÃO DA EDUCAÇÃO COMO DIREITO


O direito à educação, na esfera legal, tem como marco a Constituição de 1988,
especificamente o artigo 205. Esse direito, evidentemente definido pela carta magna
brasileira, irá se legitimar e se efetivar de forma contraditória aos pressupostos da
ontologia do ser humano enquanto ser social, pois ela garante o acesso à educação
escolar, mas não necessariamente aos conhecimentos eruditos. Para pensar a forma
como esse direito se manifesta na sociedade, é preciso considerar a organização da
sociedade brasileira.
O acesso à educação e, consequentemente à educação escolar, se dará no seio
de uma sociedade organizada verticalmente. A escola, nesse contexto, cumpre duas
finalidades: produção de consensos (FRIGOTTO, 2001) e instrumento de formação de mão
de obra (FRIGOTTO, 2001; SAVIANI, 2013). Nesse sentido, a educação se operacionaliza
como agente reforçador das desigualdades, da pobreza e da manutenção das relações de
dominação e controle, através da oferta de uma educação para a subsistência, formando
o homem para um trabalho alienado.
Não há dúvida de que o surgimento do paradigma do acesso tem como
consequência a redução do número de pessoas não alfabetizadas e o aumento dos
índices de escolarização. Entretanto, trata-se de uma “maquiagem” usada para embelezar
e esconder as imensas desigualdades existentes nas sociedades capitalistas.
O paradigma do acesso à escola reproduz os ideais da pedagogia da
compensação e incute nos sujeitos o discurso da meritocracia, ao passo que o
responsabiliza por sua situação marginal. Logo, não se deve reduzir o direito à educação
ao acesso à educação escolar, mas fazer a clara defesa do direito ao conhecimento
sistematizado. Deve-se questionar: Qual é a forma da educação acessada? Qual é o
projeto formativo dessa educação? De que forma essa educação corrobora a superação
das estruturas desiguais da sociedade?

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A concepção da educação como direito parte do pressuposto de que o sujeito
tem direito de acessar não somente a educação escolar, mas os conhecimentos
sistematizados, produzidos ao longo da atividade humana e acumulados ao longo de sua
história.
Consideramos que a concepção da educação como direito (ED) tem intrínseca
relação com o que Duarte (2013) chamou de processos de ontocriação da natureza
humana e dos processos e suas respectivas categorias ontocriativas, sobretudo, “o
trabalho”.
Nessa perspectiva, a educação escolar, operacionalizada e materializada na sala
de aula, firma-se como um elemento ontocriativo da natureza humana, ou seja, é um
elemento através do qual se organizam espaços, tempos e atividades que propiciarão a
construção e formação do gênero humano (MARTINS, 2016).
A educação escolar, enquanto atividade organizada e orientada por finalidades
demarcadas, nessa concepção, se organizará a partir de uma lógica dialética com outros
desdobramentos da atividade humana. Por desdobramentos, entendem-se, sobretudo, os
conhecimentos eruditos, acumulados ao longo da história (conhecimentos
historicamente sob o poder das classes dominantes e negados às classes subalternas).
Do trabalho, enquanto elemento criador da natureza humana, desdobram-se as
objetivações humanas (as ciências, as tecnologias, as artes). A apropriação de tais
objetivações é fator determinante na constituição do ser social, pois assume caráter
humanizador ou alienante (DUARTE, 2013).
Não se deve perder de vista, por outro lado, que a educação escolar, ao mesmo
tempo em que pode constituir-se em espaço privilegiado para o desenvolvimento, “pode
promover a reiteração da cultura socialmente valorizada em lógicas legitimadoras de
opressão” (ELSAS, 2012, p. 3). Nesse sentido, como destaca Martins (2016), é preciso
reconhecer a natureza da educação escolar quanto ao seu objeto e fins.
A educação escolar carrega todas as características da atividade humana
acumuladas no trabalho e nas objetivações humanas e possui, concomitantemente, seu
caráter transformador. Assim, não reduz o trabalho à mera atividade laboral ou emprego,
pois este é produto do sistema capitalista enquanto opressor dos processos
humanizadores.
Pensando especificamente na EJA, a modalidade é marcada pela
intencionalidade formativa da alfabetização e pela relação com o mundo do trabalho
(COSTA, 2013; MACHADO, 2019). O mundo empírico é o início e o fim das propostas. As
contradições dessas intencionalidades se materializam nos contornos
assistencialistas/compensatórios que estão engendrados em sua intencionalidade de
inclusão social (LIBÂNEO, 2012) ao mundo letrado e, consequentemente, ao mundo do
trabalho (emprego). A instituição escolar, mediadora de conteúdos e formas (MARTINS,

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2016), orientada pela atividade laboral do educando, permitirá a apropriação alienante
dos conhecimentos sistematizados (DUARTE, 2013).
A ontologia do ser social, possibilitada pelo trabalho tomado como atividade
ontocriativa da natureza humana, permite ao homem objetivar determinados aspectos
da realidade para compreendê-los em níveis mais complexos. Segundo Duarte (2013), ao
se tomar um elemento da natureza, um objeto, e inserir nele as características de sua
prática social e da própria natureza humana, no sentido de reconfigurar a forma e a
organização desse objeto, produz-se uma objetivação. A relação é dialética, pois sujeito e
objeto estão em constante movimento de transformação provocada por ambos.
O caráter social das objetivações humanas apresenta aspecto contraditório na
sociedade do capital, pois é elemento fundamental no processo de humanização e
formação do homem. Contudo, por existir em uma sociedade organizada verticalmente,
tem em seu cerne a essência das relações sociais coexistentes, ou seja, é fator alienante
das camadas tomadas como inferiores.
Ao transformar os diferentes objetos e produzir a sua existência, o homem
produz elementos como as artes, a própria cultura, as tecnologias e as ciências.
Entretanto, segundo Frigotto (2006),

a forma histórica dominante da ciência, da técnica e da tecnologia que se


constituíram como forças produtivas, destrutivas, expropriadoras e
alienadoras do trabalho e do trabalhador, sob o sistema do capital, não é
determinação a elas intrínseca, mas depende de como elas são
dominantemente decididas, produzidas e apropriadas social e
historicamente sob esse sistema (FRIGOTTO, 2006, p. 244).

Em outras palavras, as objetivações humanas produzidas serão responsáveis


pela construção do psiquismo do sujeito, no processo de apropriação da natureza
humana, da transformação do ser biologicamente humano em gênero humano. Mas a
objetivação por si só não é fator determinante nesse processo, pois há relação intrínseca
com as formas de apropriação das objetivações, visto que elas têm sentido social,
carregam a essência das relações sociais desiguais. Em suma, a objetivação é conteúdo, a
apropriação é forma, e estes são indissociáveis por natureza. Mas a forma determinará a
finalidade do conteúdo, se alienante ou humanizador.
A apropriação, por sua vez, não se refere a apropriar-se somente da objetivação
enquanto ferramenta utilitarista, como intenciona a concepção
assistencialista-compensatória de educação, mas também da história e da natureza
humana que essa objetivação leva em seu cerne. Seguindo essa lógica, Duarte (2013)
explana que,

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assim como a linguagem e os instrumentos, a objetivação das relações
entre os seres humanos significa acúmulo de experiência, síntese de
atividade humana; de tal forma que cada indivíduo, apropriando-se
dessas objetivações, passa a agir no âmbito das condições sociais, isto é,
no âmbito das condições que não resultam da natureza, mas, sim, da
história da atividade dos outros seres humanos (DUARTE, 2013, p. 35).

Nesse sentido, negar a apropriação da atividade humana compendiada nas


objetivações é negar o próprio sentido da natureza humana, reduzir o homem a uma
ferramenta manipulável e alienado em sua própria atividade, incapaz de reconhecer-se
como gênero humano.
A relação entre objetivação e apropriação, contudo, se dá em “condições
determinadas pela atividade passada de outros seres humanos” (DUARTE, 2013, p. 37). É
neste contexto que a educação escolar é inserida: com finalidades pré-determinadas pela
lógica de mercado e assumindo um objetivo claro – a formação de mão de obra (para o
trabalho alienado) (FRIGOTTO, 2001; SAVIANI, 2013). Mas esse também é o lugar onde a
classe trabalhadora pode ter acesso ao saber científico, sistematizado, erudito e
acumulado ao longo da história (COSTA, 2013; SAVIANI, 2013; PARANHOS, 2017). Paranhos
(2017) ressalta, ainda, que

parece haver redundância em compreender a ciência como atividade


humana, mas é necessário marcar essa compreensão, sobretudo porque
ela dá lugar à dimensão ontológica que perpassa o conhecimento
científico. É necessário marcar o lugar do homem e suas
intencionalidades na produção do conhecimento científico. Trata-se de
abordar, no ensino, a atividade científica, compreendida aqui como um
elemento de humanização do homem proporcionado pelo par dialético
objetivação-apropriação (PARANHOS, 2017, p. 54).

A perspectiva da concepção da educação como direito (ED) se orienta a partir da


compreensão do trabalho ontocriativo, dos desdobramentos da atividade humana em
objetivações e da apropriação destas e da contraditória história da sociedade de classes.
Também se orienta pela intencionalidade de superação da descaracterização do trabalho
ontocriativo e sua conversão em trabalho alienante. Além disso, parte do homem, em
seu contexto e realidade objetiva (SAVIANI, 2013) e de suas atividades ontocriativas
(COSTA, 2013; DUARTE, 2013), até chegar à educação escolar (ELSAS, 2012; MARTINS,
2016).
A educação, na perspectiva da ED, é entendida como ferramenta de superação
das relações verticalizadas presentes na sociedade de classes. Por essa razão, orienta-se
a um projeto formativo crítico-político, segundo o qual reconhecer a condição marginal

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
do homem, na sociedade de classes, é fator fundamental para posicionar-se perante tal
realidade.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As ideias contidas neste ensaio caracterizaram as concepções de educação
assistencialista, educação compensatória e educação como direito. Pelos traços
caracterizadores das duas primeiras, o texto defende a complementaridade entre ambas,
uma vez que a educação compensatória mantém as características da assistencialista,
incorporando os ideais do modo de produção, o que nos possibilitou denominá-la de
concepção assistencialista-compensatória. Em seu cerne, essa concepção faz defesas
pelo direito à educação; contudo, esse direito está marcado pelo paradigma do acesso. A
educação é defendida por diversos grupos, setores, governos, desde os primórdios do
Brasil, sempre atendendo aos interesses dominantes, subalternizadores, excludentes e
conservadores.
Logo, a contradição das intencionalidades formativas demarcadas nas
concepções de EJA apresentadas neste texto demonstram a importância de se qualificar
o direito à educação, tanto quanto sua defesa. A operacionalização e a materialização da
educação escolar na sala de aula não se dão de forma simples, sobretudo nas salas de
aula da EJA, uma vez que a relação entre a educação escolar e a atividade laboral do
educando é contraditória e atende a determinadas concepções e interesses hegemônicos.
A atividade laboral do educando, no sentido de sua inserção no mercado de
trabalho, de seu pertencimento à classe trabalhadora, tem em seu cerne as
características do trabalho alienante. A ED, por outro lado, orienta-se à superação desse
trabalho e se organiza a partir do trabalho ontocriativo, pois parte da premissa de que é
esse tipo de trabalho que permitirá o desenvolvimento da humanidade do educando, pois
trata-se de sua atividade principal, é o que o vincula à natureza e permite seu
desenvolvimento. É através dela que se dá a apropriação dos conhecimentos
sistematizados e da atividade e da história humana acumuladas neles. A educação, nesse
sentido, é um processo de humanização.
A intencionalidade de apropriação do conhecimento científico também está
presente nas práticas orientadas pelos ideais da concepção da educação
assistencialista-compensatória. Tal apropriação, contudo, devido ao caráter conservador
da concepção, irá se orientar com fins à alienação do sujeito. Por sua vez, a concepção da
educação como direito se guiará pela humanização do homem.
Nesse sentido, torna-se imperativo destacar a necessidade de cuidado ao se
propor qualquer análise quanto à concepção a qual determinadas práticas pedagógicas

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
se alinham. Olhares imediatos podem induzir ao erro de se considerar que uma proposta
pedagógica se orienta a determinada perspectiva crítica por esta não marginalizar o
conhecimento científico e defender sua apropriação. Entretanto, não se deve perder de
vista o caráter dual e contraditório do processo de apropriação.
Dessa forma, consideramos que as concepções de EJA se distanciam uma da
outra por meio dos projetos formativos que defendem. Se a EAC se orientará com fins a
um projeto formativo contextual, a concepção da educação como direito se posicionará a
favor de um projeto formativo crítico-político. Por essa razão, não basta defender o
acesso e o direito à educação, é preciso qualificar o que se acessa, sobretudo, numa
perspectiva de qualidade social e de classe.

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https://doi.org/10.35700/2317-1839.2022.v11n19.3246

Educação de usuários de bibliotecas para


alunos da educação de jovens e adultos
Education of library users for youth and adult
education students
Educación de usuarios de bibliotecas para alumnos
de la educación de jóvenes y adultos
Anderson Leonardo de Azevedo
Doutorando em História – UERJ
Mestre em Educação – Fiocruz
Graduado em Biblioteconomia – UFMG
[email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-2787-0236

Arlete Fátima Leal Duarte


Graduada em Administração Hospitalar – Faculdade São Camilo
[email protected]
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-9184-7236

RESUMO

Este texto é um relato de experiência baseado na aplicação de projeto elaborado para a


Biblioteca Emília Bustamante, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da
Fundação Oswaldo Cruz, na cidade do Rio de Janeiro. O objetivo do estudo é apresentar os
resultados da implementação do projeto de educação de usuários denominado
“Biblioteca: aqui pode!”, após pesquisa com alunos da Educação de Jovens e Adultos. Para
tanto, foi realizada uma pesquisa aplicada e descritiva, com abordagem quantitativa. A
execução do projeto mostrou que alunos de diferentes faixas etárias, mediante
informações e estratégias apropriadas, passam a usar, compreender melhor e aderir
adequadamente às normas e condições de uso e funcionamento da biblioteca. A pesquisa
ainda revela que o projeto colaborou para mostrar que aquele não é um espaço restrito e
de difícil acesso, mas sim de inclusão e integração.
Palavras-chave: Educação de usuários de biblioteca. Educação de jovens e adultos.
Biblioteca escolar.

ABSTRACT

This text is an experience report based on the application of a project developed for the
Library Emília Bustamante, located in the Joaquim Venâncio Polytechnical School of

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Health, from Oswaldo Cruz Foundation in Rio de Janeiro. The objective of the study is to
present the results of the implementation of the library user education project called
‘Library: here you can!’, which counted with the participation of students from Youth and
Adult Education. To reach this objective, an applied and descriptive research was carried
out, adopting a quantitative approach. The execution of the project showed that students
from different age groups start using, better understanding and adhering to the rules
and conditions of use and operation of the library after receiving appropriate information
and guidelines. The research also reveals that the project has contributed to show that
the library is not a restricted and difficult-to-access space, but a space of inclusion and
integration.
Keywords: Education of users of libraries. Youth and adult education. School library.

RESUMEN

Este texto es un relato de experiencia basado en la aplicación del proyecto elaborado


para la Biblioteca Emília Bustamante, de la Escuela Politécnica de Salud Joaquim
Venâncio, de la Fundación Oswaldo Cruz, en la ciudad de Rio de Janeiro. El objetivo de la
investigación es presentar los resultados de la implantación del proyecto de educación
de usuarios denominado ‘Biblioteca: ¡aquí se puede!’, tras una investigación con alumnos
de la Educación de Jóvenes y Adultos. Para ello, se realizó una encuesta aplicada y
descriptiva, con un enfoque cuantitativo. La ejecución del proyecto reveló que alumnos de
diferentes edades, a través de información y estrategias apropiadas, empiezan a utilizar,
a comprender mejor y a adherir adecuadamente a las normas y condiciones de uso y
funcionamiento de la biblioteca. La investigación aún revela que el proyecto ha
colaborado para enseñar que no se trata de un espacio restringido y de difícil acceso, sino
de inclusión e integración.
Palabras-clave: Educación de usuarios de biblioteca. Educación de jóvenes y adultos.
Biblioteca escolar.

1 INTRODUÇÃO
A biblioteca, no âmbito escolar, tem função de apoio e suporte à educação, bem
como de fonte de conhecimento e informação (QUEIROZ, 2006). Para que uma biblioteca
cumpra a sua função de forma eficaz, atendendo seja aos objetivos pedagógicos das
instituições, seja às necessidades de conhecimento e informação do seu público
frequentador, esses espaços normalmente desenvolvem projetos voltados para a
educação de seus usuários.
Diversos autores, entre eles Andrade et al. (2012), Gomes et al. (2013), Martins et
al. (2010) e Moreira e Coutinho (2011) ressaltam que, em vista disso, várias bibliotecas de
instituições de ensino criam um conjunto de ações voltadas para os usuários, visando a

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estimular comportamentos adequados ao ambiente, como, por exemplo, redução de
ruídos e conservação do acervo, entre outros.
Isso é corroborado por Belluzzo e Macedo (1990), que destacam que,

Em resumo, a orientação preocupa-se com a capacitação ao usuário para


torná-lo cônscio da importância da biblioteca e dos recursos nela
disponíveis, e aprender sobre o seu uso em geral: horário de
funcionamento, onde obter/tomar emprestado o material desejado,
regulamento da biblioteca etc (BELLUZZO; MACEDO, 1990, p. 87-8).

Tais ações não extrapolam a visão tradicional dos regulamentos de


funcionamento dessas unidades, que são frequentemente marcados por proibições e
penalidades para os casos de descumprimento, estigmatizando o espaço como o local do
“não pode!”.
Um aspecto da educação contemporânea é traduzido pela observação de que
estudantes, em diferentes níveis, apresentam comportamentos inadequados, reportados
frequentemente como ‘sem limites’. O limite pode ser entendido de maneira negativa e
restritiva ou positiva e de superação. Os limites restritivos trazem como principal traço a
imposição de uma regra ou norma. O seu aspecto de superação leva, portanto, à
compreensão dessa limitação, de seus fundamentos, o que induz ao
autoaperfeiçoamento. Os limites são uma necessidade da vida em sociedade e também
para a evolução desta, na medida em que implicam a abordagem ao bem-estar e
desenvolvimento de cada indivíduo e dos demais membros da sociedade (LA TAILLE,
2001).
O ambiente físico de uma biblioteca enseja uma oportunidade para explorar os
aspectos positivos das limitações, buscando introduzir orientações aos usuários, com
vistas a alterar condutas e comportamentos, estreitar as relações entre bibliotecários e
usuários, como também preservar as instalações, os equipamentos e o acervo local. Ao
mesmo tempo, busca-se atuar por meio de ações amigáveis e que sensibilizem os
usuários, sem, contudo, enfatizar imposições ou limitações agressivas, ou seja, a
biblioteca é um espaço de múltiplas funcionalidades em que, tendo bom senso e cautela,
“‘tudo pode”.
O objetivo deste texto é apresentar os resultados da implementação do projeto
denominado “Biblioteca: aqui pode!”, mediante pesquisa com alunos da Educação de
Jovens e Adultos (EJA), por meio da adoção de normas de conduta e de uso dos materiais
e do espaço implementadas pela Biblioteca Emília Bustamante (BEB), da Fundação
Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), com os estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA).

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2 BIBLIOTECA: AQUI PODE!
O projeto “Biblioteca: aqui pode” foi elaborado para a Biblioteca Emília
Bustamante (BEB), da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), Fundação
Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), na cidade do Rio de Janeiro. A decisão de reforma do layout
surgiu da necessidade de adequação do ambiente às normas de acessibilidade dos
usuários, conforme ABNT NBR 9050:2015, que visa a estabelecer parâmetros e critérios
para adaptação de espaços para a acessibilidade de todas as pessoas. Essa reforma
exigiu que a BEB suspendesse suas atividades por vários meses entre 2017 e 2018. Nesse
período foi elaborado o projeto de educação de usuários, com sinalizações e orientações
para o uso do espaço, a ser aplicado em todas as turmas de alunos na ocasião de sua
reabertura (AZEVEDO; DUARTE, 2018).
O projeto “Biblioteca: aqui pode!” buscou elucidar todas as restrições,
frequentemente presentes nesse espaço, por meio de uma abordagem positiva,
incentivando a manutenção e o cuidado, aspirando à preservação do local, da estrutura,
acervo e equipamentos, bem como, ainda, ao reconhecimento de que a biblioteca atende
a diferentes usuários e que essa condição deve ser respeitada (AZEVEDO; DUARTE, 2018).
O desenvolvimento do referido projeto decorreu do fato de que, em geral, os
usuários não procuram conhecer, entender e/ou aplicar o conteúdo das normas de
funcionamento da biblioteca. A apresentação de orientações no próprio espaço da
biblioteca funcionou como lembrete de conduta e comportamento desejado dos usuários
(AZEVEDO; DUARTE, 2018). Como exemplo, pode-se apresentar a mensagem criada para
o controle do uso de celulares no ambiente da biblioteca (Figura 1).

Figura 1 – Sugestão de mensagem para controle do uso de celulares

Os celulares são imprescindíveis nos dias de hoje, mas precisamos saber usá-los de maneira
adequada aos ambientes em que nos encontramos.

Você pode usar o celular para fazer suas pesquisas, porque a biblioteca oferece wi-fi.

Você pode atender ou fazer alguma ligação dirigindo-se à parte externa do prédio.

Assim, não haverá incômodo para ninguém e você poderá manter sua privacidade para tratar
de assuntos do seu interesse.

Fonte: Azevedo e Duarte, (2018, n. p.)

Na oportunidade, optou-se por renovar as diretrizes, levando em conta a


obtenção de maior aderência às normas da instituição, e, também, por conscientizar os

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frequentadores do espaço quanto à necessidade de conservação da sua estrutura física,
dos recursos tecnológicos e do acervo disponível, além da adequação do comportamento
pessoal.
A reabertura da biblioteca trouxe como novidades aos usuários não somente um
espaço físico com nova estruturação, mas também quadros com sinalização de
comportamentos com limitações positivas e adequados a cada ambiente em espaços
visíveis, levando os usuários a compreender o porquê das normas existentes para o bom
uso e funcionamento do local, conforme alguns exemplos apresentados no Quadro 1.

Quadro 1 – Sinalização da Biblioteca

Sinalização Orientação

Lembre-se que outras pessoas estão estudando,


Aqui pode! Conversar sobre os temas estudados!
tenha moderação!
Aqui pode! Consultar e manusear os livros com O manuseio adequado preserva o acervo e evita
cuidado. Eles são resultado do esforço de muitos prejuízos à biblioteca, à instituição e aos outros
estudiosos para a organização do conhecimento. usuários.
Para fazer ligações, utilize a área externa da
Aqui pode! Usar o celular, pois temos Wi-Fi! biblioteca. Assim garantimos o silêncio e você
pode ficar mais à vontade para conversar.
Aqui pode! Usar os computadores para fazer suas Navegue em sites seguros e tenha zelo pelo
pesquisas. Eles são ferramentas importantes para equipamento, para garantir a sua durabilidade e
consulta ao acervo e acesso à internet! acesso futuro!
Para fazer o seu lanche, utilize a área externa da
biblioteca. Os alimentos podem cair nos livros,
Aqui pode! Alimentar seu espírito e mente! nas mesas, no chão, nos computadores,
sujando-os e causando danos, atraindo insetos e
roedores!
Aqui pode! No guarda-volumes você pode deixar
Bolsas e outros objetos deixados no chão ou em
bolsas e sacolas. Assim você tem mais liberdade para
lugares inapropriados podem causar acidentes!
usar a biblioteca.
Aqui pode! Estudar confortavelmente. As mesas têm
Tenha zelo, preserve mesas e cadeiras para sua
espaço suficiente para seu material de estudo e as
utilização futura!
cadeiras são confortáveis!

Fonte: Azevedo; Duarte, (2018, n. p.)

Esperou-se com o projeto apresentado demonstrar a eficácia dos limites


positivos para a modificação da conduta e do comportamento de usuários de bibliotecas,
contribuindo, assim, para o aprimoramento dos serviços prestados e o desenvolvimento
da instituição de ensino que abriga a biblioteca.

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3 METODOLOGIA
De acordo com Sousa, Cancela e Machado (2017), os alunos da EJA carregam
uma bagagem diferente daqueles que frequentam o ensino regular, uma vez que já são
adultos e trazem consigo experiências de vida definidas muitas vezes pela falta de
oportunidades na sociedade. Concordando com essa afirmativa, Bezerra (2009) observa
que os alunos da EJA têm uma visão de mundo inerente às suas experiências, que
moldaram suas crenças e valores numa sociedade desigual. Esses alunos buscam
recuperar a defasagem escolar, relembrando os conteúdos já estudados nos anos
anteriores, e ainda se atualizar, adquirindo novos conhecimentos, com o intuito de
conquistarem uma vida melhor por meio dos estudos.
Diante disso, optou-se por uma pesquisa aplicada, voltada para aspectos
práticos, e descritiva, que buscou expor as características de determinado fenômeno ou
população. A abordagem adotada foi quantitativa, que permitiu a quantificação dos
resultados obtidos, mediante uso de cálculos estatísticos (VERGARA, 2004).
O instrumento utilizado foi o questionário, que foi composto por sete questões
fechadas e aplicado aos estudantes após o início das aulas, momento em que ocorre
também a visita orientada, com apresentação do espaço destinado à biblioteca, e são
indicadas as informações de funcionamento e condições para seu uso. A apresentação da
biblioteca é feita mediante uma sequência de slides montados por meio do aplicativo
Power Point, da Microsoft®, seguida por visita aos espaços físicos indicados.
Após a visita orientada, os alunos foram convidados a responder ao instrumento
de pesquisa, manifestando sua opinião acerca das novas instalações e dos limites
positivos apresentados em cada espaço. A adesão foi espontânea, sendo respeitados os
alunos que declinaram de participar da pesquisa. Todos foram informados de que a
referida pesquisa teria seus dados revertidos para a própria instituição e seriam
divulgados em trabalho acadêmico dos autores. A pesquisa foi realizada durante os
meses de março e abril de 2019.
Os dados coletados foram organizados e analisados com auxílio do aplicativo
Excel, da Microsoft®, para a elaboração de banco de dados, tabelas e gráficos. A sua
discussão foi realizada mediante confronto com a literatura.

4 RESULTADOS
Participaram da pesquisa 120 alunos da EJA, sendo 56 (46,67%) do Ensino
Fundamental e 64 (53,33%) do Ensino Médio.

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
O Gráfico 1 apresenta a faixa etária dos pesquisados, mostrando que, no Ensino
Fundamental, houve predomínio de indivíduos com idades mais elevadas, variando entre
36 e 55 anos, enquanto no Ensino Médio predominaram as faixas etárias mais jovens, ou
seja, entre os 16 e os 45 anos.

Gráfico 1 – Faixa etária dos pesquisados – 2019

Fonte: própria autoria (2019)


NR = Não respondeu

Houve predomínio de indivíduos do sexo feminino entre os pesquisados,


conforme demonstrado na Tabela 1.

Tabela 1 – Sexo dos pesquisados – 2019

Sexo EJA – Fundamental (%) EJA – Ensino Médio (%)

Feminino 67,86 76,56

Masculino 30,36 21,87

NR 1,79 1,56

Total 100,01* 99,99*


Fonte: própria autoria (2019)

*Diferença decorrente de arredondamentos

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Na Tabela 2, pode-se observar que, entre os alunos da EJA de ensino
fundamental, 78,57% dos pesquisados não tinham o hábito de frequentar bibliotecas,
enquanto, na EJA de ensino médio, esse percentual cai para 51,56%.

Tabela 2 – Opinião dos pesquisados sobre a biblioteca e as informações – 2019

Questão EJA Fundamental (%) EJA Ensino Médio (%)

Já frequentava alguma biblioteca?


Sim 21,43 48,44
Não 78,57 51,56

Já conhecia a Biblioteca Emília Bustamante?


Sim 14,29 23,44
Não 85,71 75,00
NR - 1,56

As informações apresentadas sobre o que pode ser


feito em cada setor da biblioteca são claras?
Sim 92,86 100,00
Não 3,57
Ainda tenho dúvidas 1,79
NR 1,78

Compreende por que alguns comportamentos são


inapropriados na biblioteca?
Sim 89,29 89,06
Não 10,71 4,69
Ainda tenho dúvidas 4,69
NR 1,56

Antes de conhecer essas informações adotava algum


comportamento inadequado em biblioteca?
Sim 12,50 14,06
Não 85,71 85,94
NR 1,79

Acredita que as informações recebidas podem


contribuir para a mudança de comportamento dos
usuários de bibliotecas?
Sim 92,86 95,31
Não 3,57 -
Não sei 1,79 4,69
NR 1,79 -

Fonte: própria autoria (2019)

*Diferença decorrente de arredondamentos

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EJA em Debate | Ano 11, n. 19, JAN. /JUN. 2022 | ISSN: 2317-1839
Um dos pontos de destaque, nesses resultados, é que a maior parte dos
pesquisados de ambos os grupos informou que não conhecia a Biblioteca Emília
Bustamante.
Em relação às informações sobre o que pode ou não ser feito em cada setor da
biblioteca, transmitidas durante a visita orientada, a maior parte dos pesquisados
declarou que estas foram claras. Apenas 1,79% dos pesquisados relataram que ainda
ficaram com dúvidas sobre o assunto.
Em relação à compreensão dos motivos que levam à restrição de alguns
comportamentos na biblioteca, apesar grande parte dos pesquisados ter respondido
afirmativamente, ressalta-se que 10,71% dos alunos da EJA de ensino fundamental e
4,69% da EJA de ensino médio responderam negativamente, enquanto 4,69% dos alunos
da EJA EJA de médio responderam que ainda têm dúvidas.
Ao serem questionados se, anteriormente à visita orientada, adotavam
comportamentos inadequados em bibliotecas, 12,50% dos alunos da EJA de ensino
fundamental e 14,06% da EJA de ensino médio responderam afirmativamente.
Por fim, ao serem instados a opinar se as informações recebidas durante a visita
orientada contribuiriam para alterar o comportamento dos usuários da biblioteca, a
maior parte respondeu afirmativamente. Entretanto, 3,57% dos alunos da EJA de ensino
fundamental responderam negativamente e 1,79% disseram não saber, enquanto 4,69%
da EJA de ensino médio informaram que não sabiam.
Nesse sentido, a pesquisa realizada mostrou que parte dos usuários adotavam
comportamentos impróprios e inadequados em bibliotecas, porém a maior parte dos
pesquisados revelou não ter conhecimento ou hábito de frequentar tais espaços. Pode-se
inferir, portanto, que um dos motivos para comportamentos inadequados e impróprios
deriva do desconhecimento de normas de conduta aplicáveis especificamente a tal
espaço.
Com base nesses resultados, defendemos que a educação de usuários de
bibliotecas se refere ao seu entendimento em relação ao “[...] processo pelo qual o
usuário interioriza comportamentos adequados com relação ao uso da biblioteca e
desenvolve habilidades de interação permanente com o sistema de informação”
(OLIVEIRA, 1998, p. 5 apud SILVA et al., 2013, p. 3). Assim, de acordo com Santiago e Netto
(2012), a educação de usuários de bibliotecas contribui para que estes alterem seu
comportamento naquele ambiente e também desenvolvam habilidades e aptidões para o
seu uso.
Os mesmos autores defendem a educação dos usuários como fonte de interação
entre as partes, “[...] com a finalidade de projetar esforços para possivelmente atingir um
número considerável de indivíduos que possam utilizar de forma efetiva e eficaz os
serviços e produtos oferecidos pela biblioteca” (SANTIAGO; NETTO, 2012, p. 248).

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Ainda, os referidos autores destacam a subutilização das bibliotecas, decorrente,
em muitos casos, de despreparo e falta de hábito em frequentar tais ambientes, o que
torna fundamental a atuação do bibliotecário como educador desses usuários, para que
possa oferecer o treinamento necessário, inclusive aquele relativo a comportamentos
apropriados ao ambiente (SANTIAGO; NETTO, 2012).
Monsani (2016) reforça o exposto, afirmando que a educação de usuários
permite que estes tenham conhecimento acerca da importância da biblioteca, dos seus
regulamentos e horários de funcionamento, entre outros aspectos, de forma a que
adquiram maior familiaridade e se tornem mais independentes nas suas atividades
naquele ambiente.
Adicionalmente, deve-se considerar que, conforme Silva et al. (2013), a formação
do usuário de bibliotecas e seu gosto e hábito de frequência ao espaço e leitura são
iniciados nos primeiros anos escolares, o que, pode-se perceber, não foi o caso dos
pesquisados.
A pesquisa mostrou também a presença de indivíduos em faixas etárias mais
avançadas, o que, provavelmente, explica a pouca interação e não frequência a
bibliotecas. Sujeitos privados do desenvolvimento de atividades próprias do ambiente
escolar nos primeiros anos de formação apresentam menor familiaridade com
ambientes que, aparentemente, oferecem restrição ao acesso.
Monsani (2016) destaca que uma das estratégias adotadas para a educação de
usuários de bibliotecas é a visita orientada e que tal atividade tem por objetivo “[...]
mostrar que a unidade de informação é um local amigável” e que os profissionais que ali
atuam estão capacitados e disponíveis para as orientações necessárias (MONSANI, 2016,
p. 96).
O referido autor destaca que as atividades de educação de usuários, no seu
planejamento, devem levar em consideração o perfil da população que utilizará tal
serviço e sua motivação em participar das atividades e interagir com a biblioteca, de
forma a que as informações sejam adequadas à sua necessidade e capacidade.
Independentemente do público a ser atingido e das estratégias adotadas, é importante
que haja uma avaliação da atividade, visando à sua adequação, quando necessário, e
melhoria futura.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A implementação do projeto “Biblioteca: aqui pode!”, da Biblioteca Emília
Bustamante, da Fiocruz, mostrou que alunos de diferentes faixas etárias, mediante
informações e estratégias apropriadas, passam a compreender melhor e aderir às

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normas e condições de funcionamento da unidade. Os pesquisados demonstraram
interesse na visita orientada e total adesão à pesquisa, motivos que levam ao
entendimento de sua compreensão das normas e regras vigentes na biblioteca, como,
ainda, à desmistificação de que aquele é um espaço de difícil acesso. Assim, a maior
parte dos pesquisados revelou que as informações foram claras e que poderão contribuir
para a adoção de comportamentos adequados pelos usuários do espaço e também para
a alteração de comportamentos anteriores e não adequados.
Contudo, no caso específico da EJA, observou-se que a ausência de vivências em
espaços como o da biblioteca cria uma impressão errônea de que aquele local não
pertence ao seu mundo. Assim, considera-se importante sugerir que sejam realizadas
novas ações de inclusão informacional envolvendo esses alunos, com o intuito de
integrá-lo, bem como os estudantes de outros níveis e a comunidade em geral.
Como resultado, foi percebido que, na medida em que os estudantes tiveram
contato com o desenvolvimento do projeto, houve melhora considerável na conduta, no
comportamento e aumento da frequência no ambiente da nova biblioteca. Além das
palestras, a sinalização usou linguagem positiva e inclusiva, de fácil leitura e
compreensão, seguindo as orientações de uso existentes em cada local, o que despertou
nos usuários da EJA um sentimento de inclusão, integração e participação nos cuidados e
manutenção do referido recinto, bem como de seu acervo e equipamentos.

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