Boletim N° 010
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Assessores:
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Marcelo Sorrentino Neira
Paulo José de Palma
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha
1 Analista de Promotoria:
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal
Comentado – n° 010
julho 2018
Sumário
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Comentado – n° 010
julho 2018
ESTUDOS DO CAOCRIM
Após a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI 5.508-DF, na qual julgou constitucional os
parágrafos 2o. e 6o. do art. 4o. da Lei 12.850/13, reconhecendo a legitimidade de o Delegado
de Polícia celebrar acordo de colaboração premiada, foi formado, a pedido do CAOCRIM,
Grupo de Trabalho na Subprocuradoria-Geral de Justiça Criminal (ATO 43/18) para tratar dos
seus reflexos nas atribuições e os deveres do órgão de execução do Ministério Público quando
diante de um acordo policial.
Muito antes do prazo estipulado para o encerramento dos trabalhos, o Grupo apresentou ao
Procurador-Geral de Justiça os seguintes enunciados, todos aprovados por unanimidade:
ENUNCIADO N. 1
d) entendendo não existir justa causa para a ação penal, manifestar-se pela rejeição do acordo
policial, promovendo o arquivamento da investigação;
ENUNCIADO N. 2
O acordo celebrado pela Autoridade Policial não deve impedir ou restringir, direta ou
indiretamente, o direito de ação ou de punir do Estado, ficando vedada a concessão de
imunidade processual, perdão judicial, substituição de pena, regime prisional diverso daquele
ditado pelo art. 33 do CP ou efeitos de eventual condenação.
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ENUNCIADO N. 3
Não havendo previsão legal do cabimento de recurso em sentido estrito, da decisão que
homologa o acordo policial desafia recurso de apelação, com fundamento no art. 593, II, CPP;
se proferida por Tribunal, agravo interno.
ENUNCIADO N. 4
A atribuição do Delegado de Polícia para firmar acordo se limita à fase de investigação, com a
fiscalização do Ministério Público, sob pena de reclamação. Proposta a ação penal, a
Autoridade Policial fica impedida de celebrar acordo de colaboração envolvendo fatos e
pessoas constantes da denúncia-crime, sob pena de violação do art. 129, I, da CF.
ENUNCIADO N. 5
Acordo celebrado pela Autoridade Policial versando, direta ou indiretamente, sobre matérias
extrapenais deve ser recusado pelo Ministério Público.
ENUNCIADO N. 6
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O Supremo Tribunal Federal, nas Ações Cíveis Originárias (ACO) 924 e 1394, mudou seu
posicionamento e decidiu que, no conflito de atribuições entre Ministérios Públicos de
Estados diversos, ou entre o Ministério Público estadual e Ministério Público da União, é o
Procurador Geral da República quem deve solucionar a controvérsia.
Essa decisão tem merecido críticas, não sem razão, pois afronta a Constituição Federal e a
legislação infraconstitucional. O novo posicionamento rendeu MOÇÃO DE
DESCONTENTAMENTO aprovada no Conselho Nacional de Corregedores Gerais dos Estados e
da União, em agosto de 2016. Vejamos.
Nos termos do art. 128 da CF/88, o Ministério Público abrange: o Ministério Público Federal,
o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar, o Ministério Público do Distrito
Federal e Territórios e os Ministérios Públicos dos Estados. O §1o. do mesmo artigo anuncia
que o Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República (...).
Percebe-se, com certa facilidade, autonomia entre o MPU os MPEs, os últimos não sendo
subordinados funcional, financeira e/ou administrativamente ao primeiro. Essa arquitetura
montada pelo Constituinte fica confirmada pelos §§ 1o. ao 3o. do art. 127 da Carta Maior, ao
dispor que são princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a
independência funcional (§1o.), sendo que cada MP elaborará sua proposta orçamentária
dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias (§3o.).
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dar azo a uma espécie de subordinação institucional. Nessa perspectiva, sendo a federação a
forma de Estado adotada no Brasil, não é admissível, com parece a alguns, que um órgão que
atue no âmbito federal, como é o PGR, possa impor suas deliberações aos MPs dos Estados. A
resolução dos conflitos de atribuições, em sede administrativa, pressupõe a existência de um
escalonamento hierárquico entre a autoridade que irá solucioná-lo e aqueles que deverão
acatar sua decisão, pressupondo que permitirá a eventual punição do recalcitrante e que se
encontra ausente na hipótese” (Ministério Público: organização, atribuições e regime jurídico,
5a.ed, SP, Saraiva, 2015, p. 315).
Ora, não sendo possível, lógica, política e juridicamente, a tese de o PGR dirimir conflitos
envolvendo órgãos do MPU e MP dos Estados ou entre MPs de Estados diferentes, pergunta-
se: qual (a instituição) o órgão que deve assumir essa tarefa? A lacuna existe e o uso da
analogia é inevitável. Na tarefa de suprimi-la, no entanto, o intérprete deve ater-se aos
seguintes pressupostos, a saber: a existência de um conflito federativo, cuja apreciação só
pode passar por órgão institucionalmente equidistante daqueles envolvidos e, ao mesmo
tempo, colegiado.
Quando dois MPs de Estados diferentes (ou MP estadual e MPF) colidem nas suas teses,
instaurado está um conflito federativo. Por esta razão, parece-me que o STF é o órgão
competente para dirimir a controvérsia, na esteira do já mencionado artigo 102, I, “f”, da
nossa Bíblia Política”. E não seria a primeira vez que se recorreria à Corte Maior na salvaguarda
da federação. Sabemos que a ação popular deve ser proposta, originariamente, no primeiro
grau da Justiça comum, não existindo competência originária dos Tribunais para julgar ações
dessa natureza, ainda que movida contra alguma autoridade detentora de foro por
prerrogativa de função. Contudo, como bem lembram Juliano Taveira Bernardes e Olavo
Augusto Vianna Alves Ferreira, o STF, na ACO 622/RJ e Rcl 2.833/RR, já decidiu a ele competir
julgar originariamente ação popular quando envolver conflito federativo estabelecido entre a
União e Estado-membro ou Distrito Federal, aplicando o art. 102, I, “f”, da CF (Direito
Constitucional Positivo, T II, 2017, Salvador: Juspodivm, versão digital).
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colegiado. Aliás, suas decisões em futuros conflitos não vinculam o Judiciário, bem como os
MPs sobre os quais não exerce tem função de chefia.
Existem ações institucionais visando reverter esse quadro, como, por exemplo, a reunião do
CONACRIM (Centros de Apoio de todos os Estados), a ser realizada no dia 17/8, em Goiânia,
tendo como um dos temas da pauta exatamente o conflito de atribuições entre MPs.
Por ora, enquanto não se reverte a decisão aqui combatida, os colegas devem observar o
AVISO 150/17, subscrito conjuntamente pela Procuradoria-Geral de Justiça e Corregedoria-
Geral do Ministério Público, nos seguintes termos:
Considerando que, nos casos de conflito de atribuições entre Ministério Público Federal e
Ministério Público Estadual, ou entre Ministérios Públicos de Estados diversos, não há como
se reconhecer simples conflito entre membros dos Ministérios Públicos envolvidos, mas entre
as próprias Instituições;
Considerando que as decisões proferidas nas ações cíveis originárias não possuem efeito
vinculante em relação à parte dispositiva e mesmo em relação aos chamados fundamentos
ou motivos determinantes, pois, de conformidade com o disposto no artigo 102, § 2o, da
Constituição Federal, essa força cabe apenas às Ações Declaratórias de Constitucionalidade
(ADC) e às Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI); e,
Avisam aos senhores membros do Ministério Público do Estado de São Paulo que, em casos
concretos, desde que formada a convicção no sentido da necessidade de instauração de
conflito de atribuições entre o Ministério Público do Estado de São Paulo e o Ministério Público
Federal, ou Ministérios Públicos de outros Estados, provoquem a instauração do conflito
mediante representação fundamentada dirigida à Procuradoria-Geral de Justiça.
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Avisam, ainda, que a provocação não deve ser encaminhada diretamente, pelo membro do
Ministério Público, ao E. Supremo Tribunal Federal ou à D. Procuradoria- Geral da República,
para fins de instauração do conflito, dada a atribuição exclusiva do Procurador-Geral de Justiça
para representação judicial da instituição.
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Para STJ, o reconhecimento fotográfico do réu, quando ratificado em juízo, sob a garantia
do contraditório e ampla defesa, pode servir como meio idôneo de prova para fundamentar
a condenação.
Comentários do CAOCRIM:
Pode se definir o reconhecimento como o cotejo entre elementos atuais e passados, capazes
de propiciar a identidade de determinada pessoa ou coisa. Nesse sentido pronuncia-se Enrico
Altavilla, citado por Adalberto Camargo Aranha, para quem o reconhecimento “é um juízo de
identidade entre uma percepção presente e uma percepção passada” (Da prova no processo
penal. Saraiva: São Paulo, 2007, p. 168). Numa definição mais estrita, formulada por Hélio
Tornaghi, “reconhecimento é o ato pelo qual alguém verifica e confirma a identidade de
pessoa ou coisa que lhe é mostrada, com pessoa ou coisa que já viu” (Curso de processo penal,
1990, vol. 1, p. 429).
Considerando que se trata de meio de prova que pode realmente contribuir para a imputação
da autoria delitiva, o Código de Processo Penal estabelece, no art. 226, diversos requisitos
para que o ato de reconhecer alguém seja seguro e livre de induzimento ou sugestionamento.
Uma das formas pelas quais o reconhecimento se dá sem a observância do art. 226 é a
fotográfica, não contemplada.
Se ao reconhecimento pessoal já são apontadas restrições, com muito mais razão doutrina e
jurisprudência nutrem enormes ressalvas quanto à validade do chamado reconhecimento
fotográfico. Há quem simplesmente lhe negue a natureza probatória, enquanto outros
defendem sua utilização, como José Frederico Marques ao alertar que “não nos parece muito
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Com efeito, embora precário, o reconhecimento fotográfico submete-se, como de resto toda
e qualquer prova penal, a uma análise global, dentro de um contexto probatório forjado nos
autos e, como tal, deve ser tomado pelo juiz, na formação de sua convicção, dentro da
liberdade que orienta tal raciocínio. Não tem, é óbvio, valor absoluto – que, aliás, não tem
nem a confissão judicial – e, portanto, não pode isoladamente fundamentar um decreto
condenatório. Deve ser recebido com as ressalvas decorrentes de sua natureza precária e
cotejado com os demais elementos probatórios que compõem o processo, especialmente
aqueles produzidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. É neste sentido a tese
firmada pelo STJ:
(…) V – O reconhecimento fotográfico não é inválido como meio de prova, pois, conquanto
seja aconselhável a utilização, por analogia, das regras previstas no art. 226 do Código de
Processo Penal, as disposições nele previstas são meras recomendações, cuja inobservância
não causa, por si só, a nulidade do ato. Precedentes. VI – In casu, consta que o reconhecimento
fotográfico não foi o único elemento de prova a fundamentar a condenação, pois foi
corroborado por outros elementos, como ‘termos de reconhecimento pessoal’ e os ‘relatos
efetuados pelos ofendidos em juízo’” (HC 427.051/SC, j. 05/04/2018).
Para o STJ, é válido e revestido de eficácia probatória o testemunho prestado por policiais
envolvidos em ação investigativa e/ou responsáveis por prisão em flagrante, quando estiver
em harmonia com as demais provas dos autos e for colhido sob o crivo do contraditório e
da ampla defesa.
Comentários do CAOCRIM:
A regra geral estabelecida no Código de Processo Penal é de que toda pessoa pode ser
testemunha (art. 202), assim considerada a pessoa física que narra em juízo qualquer
circunstância a respeito de determinada prática delituosa de que tenha conhecimento.
Ao dispor que toda pessoa pode servir como testemunha, procurou o Código afastar qualquer
espécie de preconceito, deixando a critério do julgador, em uma análise global do conjunto
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De fato, não há razão plausível para colocar sob suspeita o relato de um agente público
legitimado para o combate ao crime simplesmente em razão de sua condição. Seu testemunho
deve ser tomado sem nenhuma espécie de reserva a esse respeito, e deve ser cotejado – como
qualquer outro – com outros elementos probatórios que integrem o processo. Se não há
indicação de vício no relato apresentado, é plenamente possível sua utilização para
fundamentar a sentença condenatória. O simples fato de que a testemunha é policial não
pode jamais servir para desacreditá-la.
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DIREITO PENAL:
Comentários do CAOCRIM:
Com o advento da Lei nº 11.464/2007, alterou-se a redação do artigo 2º, §1º da Lei de Crimes
Hediondos, não mais prevendo o regime integral, mas sim inicial fechado.
Com a mudança, a maioria entendeu não haver mais óbice (implícito ou explícito) à
substituição da pena em se tratando de crimes hediondos ou equiparados.
Restava, contudo, a vedação expressa na Lei de Drogas (Lei 11.343/06), que foi também
declarada inconstitucional pelo STF (HC 97.256) e teve sua eficácia suspensa por meio de
resolução do Senado Federal (Resolução nº 5 de 2012).
Diante desse quadro, cabe ao magistrado, na análise do caso concreto, aquilatar se estão
presentes os requisitos que autorizam a substituição, observando, ainda, o princípio da
suficiência da pena alternativa diante da gravidade do crime hediondo (ou equiparado)
cometido pelo sentenciado, evitando, assim, insuficiente intervenção do Estado. Aliás, em
várias oportunidades, o STF vem reafirmando o seu posicionamento sobre a
inconstitucionalidade de qualquer cláusula legal que veda, apenas com base na gravidade em
abstrato do crime, benefícios penais (restritivas de direitos, por exemplo) ou processuais
(como a liberdade provisória). Vislumbra, nessas situações, um abuso do poder de legislar por
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parte do Congresso Nacional que, na verdade, culmina por substituir-se ao próprio magistrado
no desempenho da atividade jurisdicional.
O caso ora comentado se resume num processo em que o réu é acusado de tráfico, mais
precisamente, de buscar introduzir drogas no sistema prisional. O juiz, analisando o caso
concreto, negou a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos,
julgando ausentes os requisitos subjetivos permissivos da benesse legal. Não sem razão,
entendeu que a pena diversa da prisão, no caso, era insuficiente para atingir as finalidades da
retribuição e prevenção.
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3- Ação pede que STF afirme direito de transexuais e travestis de cumprir pena em presídio
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de violência doméstica
5- Liminar suspende ação penal contra sócios de rede varejista acusados de crime tributário
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9- Terceira Turma não admite novas provas sobre fato antigo apresentadas em momento
processual inoportuno
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10-Alteração de marco para concessão de benefícios da execução penal, por unificação das
penas, não tem respaldo legal
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